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Os povos bárbaros

Os povos bárbaros ou germânicos aterrorizaram Roma por muito tempo,


e sua influência ficou marcada no Império e na vida das pessoas. Mas será que
eles eram realmente bárbaros? O que define barbárie? Como eles viam os
romanos? Como eles viam os cristãos? Essas perguntas, vou tentar responder
ao longo deste livro. Para começar o que os romanos e os gregos chamavam
de bárbaros era qualquer um que não tivesse a sua cultura. Os gregos
chamavam qualquer um que não falasse grego de bárbaro, e os romanos
qualquer um que não tinha cultura latina. Normalmente a gente se refere-se
como bárbaros as tribos germânicas ao norte do Reno, que guerreavam com
Roma várias vezes, e que derrubaram o Império Ocidental em 476. Mas como
a complexidade das tribos é gigante, vamos focar naquelas que conseguiram
derrubar o Império, e estabeleceram os seus reinos em antigas províncias
romanas. Então vamos falar sobre os Vândalos, os Suevos, os Visigodos, os
Ostrogodos, os Burgúndios, os Francos, e os Anglo-Saxões.
(Europa em 508)

Evolução da relação romana-bárbara e a queda de Roma

Os povos germânicos já invadiam o território romana há muito tempo,


desde a Guerra Címbria (113-101 a.C.). No entanto, é a partir de 378 que
começam as invasões que vão derrubar o Império Ocidental aos poucos. Em
378 os visigodos cruzam o Danúbio e ocorre a batalha de Adrianópolis, uma
pesada perda para os romanos, onde o imperador oriental Valente (328-378),
morre em batalha. Em 396 os visigodos devastam a Grécia, e em 402 a Itália.
Em 406-407 ocorre o inverno sombrio, onde 5 tribos conseguem cruzar o Reno
congelado e invadir o território, que são os suevos, vândalos, alanos,
ostrogodos e visigodos, e só os ostrogodos são repelidos. Em 410 os francos
também invadem e em 411 os burgúndios. Em 409 os vândalos, suevos e
visigodos invadem a Hispânia. Em 410 os visigodos tomam e saqueiam Roma,
que não era mais a capital, que era Ravena. No mesmo ano a Britânia é
abandonada pelos romanos, para mandar o exército patrulhar outras áreas. Em
429 os Vândalos e Alanos invadem o Norte da África. Em 439 os Vândalos
tomam Cartago e estabelecem seu reino no Norte da África. Em 452 a.C. os
hunos são finalmente vencidos na batalha dos Campos Cataláunicos, e os
francos, burgúndios e visigodos ajudam os romanos a vencê-los. Mas no
mesmo ano os hunos saqueiam Aquileia e Mediolano. Em 454 os germânicos
se revoltam contra os hunos e acabam de vez com a ameaça de Átila e dos
hunos em junho na batalha de Nedao. Em 476 o último imperador Rômulo
Augusto, ainda criança, é deposto por Odoacro, que forma seu reino na Itália.
Em junho de 480, Júlio Nepo é assassinado na Dalmácia e seu reino é
anexado ao reino de Odoacro. Em 486 cai o último bastião do Império
Ocidental, que era o reino de Soissons, tomado pelos francos.

Os bárbaros era qualquer povo que vivia ao norte do rio Reno e do


Danúbio. Então dá até para entender um pouco porque eles queriam tanto
invadir o Império romano. A região deles era fria, cheia de florestas, a
agricultura é mais limitada, enquanto os romanos basicamente tem todas as
terras boas da Europa e do Norte da África. Além disso, desde cerca de 3000
a.C., sempre vinha povos da Ásia mais ou menos como os hunos, que
saqueavam, estupravam, escravizavam, qualquer um que encontrasse. E o
povos germânicos estavam sempre no caminho deles, e sofriam com esses
ataques que os faziam fugir de sua terra e buscar lugares melhores, muitas
vezes nos territórios mais ao sul. Então é importante frisar a diferença entre
migrações bárbaras e invasões bárbaras, porque havia uma enorme
quantidade de germânicos que entravam no Império romano de forma
totalmente pacífica, assim como também havia que entrava para saquear e
destruir e buscar escravos.

Soma-se a isso, o fato de que antigamente as mudanças nos ciclos de


temperatura da Terra faziam um efeito muito maior do que fazem hoje, era
comum nas eras mais frias, as pessoas descerem para regiões mais quentes.
E nas eras mais quentes, elas costumavam ficar na sua região.

Podemos ver pelo gráfico acima que durante a era romana de mais ou
menos 200 a.C. até a vinda de Cristo vamos ter uma época mais quente, e que
lá para 200 volta a crescer. E há uma queda leve lá para o final do século IV e
começo do V, além de ter uma grande queda no começo da Idade Média, até o
ano 750.
No entanto, o clima não é o único fator que interfere, mas também é
importante os dados sobre as chuvas do período. Por exemplo, na Pequena
Idade do Gelo vivida pela humanidade de mais ou menos 1300 até 1800, nós
não sentimos tanto a diferença, porque as chuvas não variaram muito, e
porque também já estávamos com uma tecnologia superior na agricultura e
indústria que fez com aguentássemos mais.

Outros exemplos são: em cerca de 3000 a.C. povos itálicos invadem a


Itália; em cerca de 1200 a.C. os dórios invadem o território da Grécia moderna;
em 400 a.C. vários celtas migram para a Itália, e em 390 a.C. eles saqueiam e
queimam completamente Roma; em 383 a.C. Filipe da Macedônia impedem
que os celtas invadam a Grécia; em 323 a.C. a morte de Alexandre, o Grande é
seguida por saques celtas; em 279 a.C. há uma grande invasão celta onde eles
queimam e pilham onde passam; em 277 a.C. Antígono II derrota os celtas e
eles nunca mais se metem com os gregos.

Durante as Guerras Címbrias (113-101 a.C.), os germânicos vindos da


Dinamarca vão para o sul e deslocam os celtas pelo norte e centro da Europa.
Os germânicos e os celtas vão para o sul e começam a atacar os romanos, que
os vencem em 101 a.C.. Os romanos fazem centenas de milhares deles de
escravos, e matam centenas de milhares também nas batalhas. A partir daí os
romanos decidiram que tinham que se preocupar com os germânicos. Eles
passaram a expandir seu império através das fronteiras naturais (rio Reno e
Danúbio), e passaram a romanizar todos os bárbaros das áreas que
conquistassem.

Depois, na batalha da Floresta Teutoburgo em 9 d.C., os romanos


perderam e sofreram pesadas baixas pelos germânicos liderados por Armínio.
Nessa batalha, os germânicos pegaram os romanos de surpresa e 3 legiões
foram quase totalmente destruídas, mostrando que os romanos não eram
invencíveis. Muitos desses germânicos tinham lutado no exército de César na
Gália, então eles também sabiam as táticas romanas. Mas os romanos
escolheram deixar suas fronteiras no Reno, porque não conseguiriam derrotar
os germânicos. No entanto a Gália foi tão romanizada, que em 100 você
poderia ir da Itália para a Gália que não veria diferença nenhuma na cultura,
além de todos falarem latim.
A revolta judaica deu muito mais trabalho para os romanos do que a
revolta na Britânia por volta do ano 60, porque se os judeus conseguissem
independência política, eles provavelmente teriam convidado os partos, como
contrapeso à Roma, e uma outra grande potência rival de Roma teria saída
para o Mediterrâneo.

O que o historiador Tácito (56-117) escreveu sobre os germânicos é em


grande parte confirmado pelos historiadores posteriores. Ele fala que os
germânicos nunca se contaminaram com casamentos com estrangeiros, e
permaneceram de sangue puro. As características física ele elenca como:
olhos azuis ferozes, cabelos avermelhados, são violentos mas também
capazes de suportar tarefas fatigantes, e não suportam calor ou sede, mesmo
que seu clima garanta períodos de frio e fome por causa da pobreza de seu
solo. Quando não estão em guerra passam boa parte do tempo caçando, e só
comem e dormem. Para os homens mais ousados e guerreios não há emprego
regular. O cuidado da casa e dos campos ficam para as mulheres, velhos e
fracos. Eles amam a indolência e odeiam a paz. Então podemos concluir que
eram nômades e tinham um certo desdem pelo trabalho fixo. Para Tácito os
germânicos são um povo desorganizados, com algumas qualidades e defeitos.

Além disso, o que Tácito diz sobre as instituições políticas germânicas


tem um toque de verdade. Segundo ele havia um certo de grau de democracia
entre eles, obviamente sem a participação de mulheres, estangeiros e
escravos. Era uma democracia dos armados, e podiam nomear reis, que eram
tirados de uma família em particular. No entanto, os reis não tinham o mesmo
poder que um imperador romano, e os reis tinham autoridade mas não poder.
Assuntos de governo interno e de guerra e paz eram resolvidos pela
assembleia da comunidade como um todo, ou na assembleia dos comuns. O
povo iria aprovar ou rejeitar a decisão, batendo suas lanças nos escudos se
aprovarem. Acusações criminais são ouvidas pela assembleia, não há juízes
em tempo integral. Você tinha a ideia da liberdade como algo que foi trazida
pela tribos bárbaras das florestas alemãs. Os anglo-saxões levaram essa ideia
de Assembleia do povo para a Inglaterra, a ideia de prestação de contas, e a
ideia de justiça como algo que é propriedade do povo como um todo, e não de
qualquer classe dominante em particular, e onde o povo participa da sua
administração. Até o século XIX eles tinham a ideia de que a liberdade é um
direito inato dos povos bárbaros.

Mesmo no lado germânico há cidades que até parecem romanas, e as


pessoas falam latim. Quando você vai mais para o norte, você encontra vilas
romanas, onde as pessoas não falam latim todo dia, mas com estrangeiros. E
se você for mais ao norte ainda, as vilas desaparecem, mas as pessoas ainda
tem algumas familiaridade com o latim, e podem falar para fazer negócios com
você. Até você chegar no Báltico, onde você compra âmbar e peles e volta. E
no lado romano, também várias pessoas que falam alguma das várias línguas
germânicas. Os romanos deixavam os germânicos entrarem no Império porque
não achavam que eles eram uma ameaça.

Por volta do ano 150, há uma queda de 1 ou 1,5 graus na temperatura


da superfície do mar. E depois de cerca de 180, há uma queda significativa das
chuvas no Mediterrâneo. Além disso, depois de 150 há uma série de epidemias
e as pandemias da peste antonina e da praga de Cipriano, que abalam o
Império. As epidemias parecem ter sido de varíola e sarampo, e podem ter
reduzido a população em um quarto ou até um terço.

Além disso, você tem a inflação gerada pelos imperadores que também
vai assolar o Império e ser um dos grande motivos de sua queda. Por volta de
68, o denário tinha quase 100% de prata. A quantidade de prata foi caindo até
que em 200 tinha cerca de 60%, e durante o final da crise do século III tinha
menos de 5% em 268. O preço do trigo do Egito também subiu imensamente a
partir de 260, passando de cerca de 25 dracmas por artaba (unidade persa que
representa de 50 a 55 litros) para 250 dracmas por artaba em 290, e 300
dramas em 320.

Para a maioria das pessoas que viviam no Império Romano do Ocidente,


a vida não mudou quase nada quando o Império caiu. Essa ideia de queda do
Império vem desde a Renascença no século XVI, sendo que o Império Oriental
continuou firme e forte, e eles se consideravam romanos tanto quantos seus
companheiros do oeste. Para esses renascentistas houve um grande declínio
na civilização depos que o Oeste caiu, e foram eles que a partir do século XIV
reergueram a civilização depois de oito século de Trevas. Nada poderia estar
mais errado.

O primeiro historiador sério que combateu essa ideia ridícula foi o


historiador belga Henri Pirenne (1862-1935), que olhou para as evidências
literárias e arqueológicas, e concluiu que não houve um colapso até o final do
século VII. Os bárbaros entraram, assumiram a administração em frangalhos
do Império, e continuaram administrando até as invasões islâmicas, que são o
que cortam de vez as rotas comerciais mediterrâneas, e levam a um repentino
encolhimento da economia ocidental.

Na década de 530 teve um desastre que foi quando os verões pararam


por alguns anos, houve fome generalizada, e um colapso geral da população.
O que houve no século V foi um colapso total de uma estrutura política unida
na Europa Ocidental, se dividindo em uma série de reinos germânicos.

Além disso, a partir do século III o Império Sassânida, que era persa,
estava pressionando as fronteiras orientais do Império, pois, queria uma saída
para o mar Mediterrâneo. E boa parte das tropas romanas ficavam nas
fronteiras do Reno e do Danúbio com os germânicos, e eles tiveram que levar
um grande exército para o leste, maior do que o Império poderia gerenciar
facilmente. Em 224 o moribundo Império parta é substituído pelo Império persa
revivido e com interesses expansionistas.

Os romanos passam a acumular os problemas desde 150. Em cerca de


150 os godos se movem para o sul, e deslocam os bárbaros que estavam
assentados perto do Império, que passam a pressionar o Império. Com isso,
Roma tem que deixar metade do exército ao longo do Reno e do Danúbio, que
não são mais fronteiras abertas. Você teve uma resposta no reinado do
imperador Septímio Severo (193-211), que estabiliza as fronteiras, mas para
isso ele dobra os gastos com o exército, e como não conseguia isso com os
impostos, ele começa a degredar a moeda para pagar por isso. Também houve
dificuldade em recrutar novos soldados para o exército, em especial depois das
devastadoras pandemias da peste antoniana (165-180) e peste de Cipriano
(240-270), o que levou os romanos a contratarem mercenários germânicos
para seu exército.
Em 235 o imperador Severo Alexandre é morto por suas próprias tropas,
e assume Maximino Traço, começando a terrível crise do século III que durará
até 285. Em 250 os góticos (godos) cruzam o Danúbio e devastam várias áreas
da Trácia, nos Balcãs do Norte, e em 267 eles além de cruzar ao Danúbio, eles
chegam no mar, constroem barcos e saqueiam Creta, Atenas, Esparta, e o
Chipre.

As coisas começam a melhorar quando o imperador Cláudio II assume o


poder em 268, que inflinge uma série de derrotas devastadores sobre os
invasores. E depois ele é seguido por Aureliano (270-275) que além de
conseguir combater todas as tribos bárbaras, também vence os Impérios que
se separaram de Roma, o Império Gálico e o Império de Palmira. Então quando
Diocleciano assume em 284, e governa até 305, saindo do poder pacificamente
e morrendo muito depois de velhive, ele faz uma série de reformas. Ele
identifica que os problemas do Império eram: um governo central muito fraco; a
ideia fraca de um estado romano; má gestão financeira; não há orçamento do
Estado; há um controle muito fraco sobre as províncias; não existe lealdade
comum; não há sucessão clara; e uma capital no lugar errado.

Então Diocleciano cria uma ditadura militar de direito divino. Não há a


ideia de que há uma república com um primeiro cidadão eleito, que era a ideia
de Augusto. Ele estabelece um novo sistema de arrecadação de impostos, e
um orçamento do Estado. Não há mais a ideia de que as províncias mandam
tributos para Roma, e a base tributária é bastante ampliada. A incidência de
impostos é bem reduzida no começo, porque mais dinheiro vem dos impostos,
mas cada pessoas pagava menos. Ele estabelece uma nova cunhagem de
ouro, o Solidus, inicialmente 60 por libra, e depois 72 por libra, e valeria algo
como 150 libras hoje. A maioria das pessoas que eram pobres, jamais veria
essa moeda na vida, e veria só moedas de cobre e às vezes a de prata,
chamada Siliqua. Ele também cria novas regras para o recrutamento de
soldados e para administração das províncias. Em 305 ele é o primeiro
imperador a se aposentar, e saí do cargo.

Constantino (306-337) continua as reformas de Diocleciano, e


estabelece o Cristianismo como a religião oficial do Estado. Ele funda
Constantinopla, para ser a “Nova Roma”, como a nova capital. Os senadores,
alguns deles se mudaram para Constantinopla, e outros continuaram em
Roma, mas o Senado não tinha nenhum poder desde Aureliano. E quando o
Império estava dividido entre um imperador em Roma e outro em
Constantinpla, cada um iria nomear dois cônsules.

As coisas começam a piorar quando a dinastia Valentiniana toma o


poder em 364, com Valentiniano I no Ocidente e Valente no Oriente. Vamos
imaginar a vida de um civil normal, no Império Romano de 364 a 476. Antes de
364, ele podia praticar esportes, tomar banhos públicos, etc. Agora, a
desigualdade era imensa, e só os mais ricos podiam encontrar emprego em
uma cidade, ou frequentar esses espaços. Os anfiteatros estão sendo usados
como pedreiras, porque os civis roubam as pedras, sendo que Valentiniano III,
que governou de 425 a 455, teve até que decretar a proibição do roubo de
pedras. As corridas de bigas ficaram desatualizados, e as gladiaturas foram
proibidas em 399 pelo imperador Honório.

Nos últimos 200 anos do Império, a classe média do império quase


desapareceu, e 90% da população romana era pobre no século V. O povo
miserável trabalhava no campo, onde pagava impostos, e você ganhava
diaramente duas moedas de bronze, chamada Follis, que vale cerca de 2 pães.
Se você tiver sorte, de vez em quando pode ganhar uma de prata, Siliqua, que
vale 300 Follis. Cedo ou tarde, você terá que se submeter ao escambo, já que
até as moedas de prata e bronze vão inflacionar e perder o seu valor. Seu
maior medo não são os bárbaros, mas sim o coletor de impostos romano. Entre
375 e 400 os impostos subiram cerca de 300%, o que significa que tudo será
do Estado (nada contra o Estado, nada fora do Estado). E você ainda será
obrigado a fornecer ao Estado, madeira, carvão, e trigo. E reparar estradas e
prédios públicos, trabalhando de graça. A única arma que você tem contra os
coletores de impostos é o suborno.

Um jeito de ganhar dinheiro era vender os próprios filhos como escravos,


o que é completamente imoral, mas as pessoas não tinham escolha. De 300
em diante, há uma série de decretos dos imperadores, proibindo os cidadãos
de vender seus filhos como escravos, mas até meados dos século V, esses
decretos vão ser amplamente ignorados. A infinidade de decretos que te
proibiam de fazer qualquer coisa não é pouca. Então você se muda, vende sua
terra, só que em 390, o imperador Teodósio I proibe qualquer tipo de migração
dentro do reino. Então você e sua família são obrigados a viver onde estão
para sempre. Se você quiser mudar de emprego para tentar melhorar de vida,
não pode, porque o mesmo decreto proibe que as pessoas mudem de
emprego. A única forma de mudar de emprego, era se um soldado lhe recrutar,
e você terá que servir 25 anos no exército. Se você evitar o recrutamento, você
será queimado vivo. A última possibilidade de se livrar disso tudo é você entrar
nos serviços de algum senador ou proprietário rico, e se tornar um arrendatário.
Ele vai ter proteger dos funcionários romanos, recrutadores e cobradores de
impostos, mas você será um escravo softcore do proprietário de terra. E
quando você se tornar inútil para ele, ele vai te jogar a céu aberto, e não vai
mais te proteger.

(porcentagem de prata nas moedas imperiais de 31 a.C. até 280 d.C.)


(outro gráfico da inflação do denário)

(preço do trigo egípcio em dracmas por artaba)


Outros fatores que contibuiram com a queda do Império é que não havia
um sistema de sucessão clara quando um imperador morria, e também com o
tempo as legiões romanos foram ficando ultrapassadas.

No começo, apenas um membro da Dinastia Júlio Claudiana podia se


tornar imperador. Mas em 69 um não membro da dinastia flaviana tomou o
poder, que era Vespasiano, após uma guerra civil. Trajano abriu um
precedente, com suas raízes hispânicas, em 98, e agora o imperador podia vir
de qualquer província. Em 196, Septimius Severus mostrou que vencer todo
mundo que está no seu caminho é o suficiente para se tornar imperador.
Macrinus em 217, mostrou que você nem precisava ser senador, bastava matar
o imperador antecessor. E podia até eleger um trácio, como Maximinus Thrax,
em um escritório imperial, por suas legiões. A partir de 235, qualquer um podia
se tornar imperador.

A maior parte dos recursos e tempo do imperador era para se prevenir


que seus generais lhe matassem, e usurpassem o poder. Reconstruir estradas
significa que o usurpador poderá marchar mais rápido para te depor, reviver a
economia pode significar que você não terá dinheiro o suficiente para
desencorajar os motins dos soldados, e em vez de nomear pessoas capazes
para administrar as províncias e afastar os bárbaros, você irá nomear os servos
mais inofensivos, fornecendo pouco dinheiro. Pessoas capazes são uma
ameaça, porque se eles liderarem uma campanha bem sucedida contra os
bárbaros, ou administrassem muito bem uma província, podem acabar se
declarando imperadores, e liderarão forças contra você.

No final do Império, eles gastavam cerca de 50-60% para manter as


tropas militares. Além disso, muitos legionários adotaram o padrão de matar
seus imperadores e se juntarem ao usurpador, para evitar uma guerra civil. Na
batalha de Mursa, em 351, Constâncio II derrotou o usurpador Magnêncio, mas
naquele dia, cerca de 60.000 romanos morreram, dos dois lados. Mesmo
quando você não força os soldados a lutar contra seus compatriotas, e não
corta o seu pagamento, você ainda pode ser morto por qualquer um de seus
soldados, por qualquer motivo. Aureliano foi morto por ser severo, Severo
Alexandre por ser covarde, Elagabalus era muito degenerado, Constante era
muito gay, Graciano negligenciou suas responsabilidades, Maximino sitiou uma
cidade por muito tempo, Probo forçou os soldados a fazerem trabalhos
manuais, e Carino ficou com a esposa de seu centurião. Então o imperador
passará pelo menos metade do seu tempo se protegendo de possíveis
usurpadores. Além disso, agir como uma pessoa normal na frente das pessoas
simples como Augusto fazia é perigoso, porque você pode perder a sua aura
divina, que de o protege de ser deposto.

Além disso, as legiões romanas se tornaram incapazes de proteger o


Império, e careciam de mão-de-obra pra suprir a crescente demanda de novos
soldados. Um documento chamado Notitia Dignitatum de 420, dizia que tinham
600.000 soldados. Esse numero é bem exagerado, e muitos desses eram não
combatentes, pessoal de fronteira, etc. O número real, era mais ou menos
metade, 300.000, 125.000 para o do Ocidente, e 175.000 para o do Oriente. No
século I os italianos foram completamente isentos de ter que servir ao Exército,
já que eram considerados muito fracos para serviço militar. O imperador
Valentiniano III declarou que nenhum cidadão italiano é obrigado a servir no
Exército em 395. Os melhores soldados eram recrutados na Panônia e na
Mésia, mas boa parte dessas províncias estavam no lado Oriental do Império.
Além disso, a Britânia e boa parte da Hispânia foram perdidas em 410, e os
impostos africanos só podiam ser usados para proteger um suprimento vital de
grãos da África. O principal ponto de recrutamento ficou na Gália, que era
propenso ao separatismo.

Os romanos ainda tinham mais gente nas tropas, mas tinham


equipamentos e treinamento piores. Já os bárbaros adotaram o estilo de luta
romano, e os equipamentos também, de modo que na Antiguidade Tardia, você
não encontraria quase nenhuma diferença entre as tropas romanas e bárbaras.
Além disso, os alemães se tornaram a espinha dorsal do exército romano, que
começaram a confiar mais nos mercenários góticos, francos, ou hunos, do que
no seu próprio povo. Os benefícios de ser um militar romano acabaram, e os
salários ficaram baixos, não havia mais chances de ficar rico pilhando os
outros, e nem a chance de mudar seu status social depois dos 25 anos de
serviço militar. Com isso, ninguem mais se alistava, e ficava só germânicos no
exército praticamente.

Desde 212 todo habitante livre do Império recebia cidadania romana


completa. Os senadores enviavam seus trabalhadores mais dispensáveis para
servir ao exército, e esses ficavam geralmente bebendo, brincando e
intimidando civis, em vez de defender o Império. Então no final das contas, a
administração romana apenas pegou o ouro e contratou pra eles, mercenários
bárbaros.

Os germânicos também vão aos poucos se convertendo ao Cristianismo,


e em 325 eles já eram cristãos. No entanto, eles eram outra denominação do
que os católicos apostólicos romanos. Os germânicos que se converteram, se
converteram ao arianismo, uma heresia cristã que negava a Santíssima
Trindade, e acreditava que o filho é subordinado ao Pai.

A partir do século IV você começa a ter uma germanização de Roma,


porque além de mercenários bárbaros serem contratados por Roma, muitas
vezes germânicos eram contratados para o exército como recrutas normais.
Além disso, as classes mais altas, começam a assimilar alguns costumes
germânicos como o de beber cerveja e de usar calças.

Essa estabilidade trazida por Cláudio II, Aureliano, Diocleciano e


Constantino, continua até 376. Nesse ano, uma confederação de visigodos
estão desesperadamente implorando para entrar no Império, no Danúbio perto
de Constantinopla. E os romanos deixam eles entrarem, só que o imperador do
oriente Valente (364-378) comete abusos contra os visigodos, que reagem e
destroem os romanos na batalha de Adrianópolis, e matam Valente na batalha.

Além disso, ainda tem a grande ameaça dos hunos que eram um povo
caçador-coletor da Mongólia. Eles decidem em certo ponto começarem a
invadir outros povos, e invadem a China, a Índia e depois partem para o oeste
para invadirem a Europa. Os hunos eram basicamente que nem os Dothraki do
Game of Thrones, soldados montados à cavalos, que saqueiam, matam e
estupram quem estiver na sua frente. Os hunos pressionam as tribos
germânicas que passam a fugir para o sul e a entrarem no Império, às vezes
pacificamente, às vezes violentamente. Pelo mapa abaixo, podemos ver que os
ostrogodos ficavam na região da Rússia perto do Caúcaso. No outro mapa,
podemos ver a região em que os hunos chegaram na Europa, pressionando
esse povo. Os hunos inflingem uma série de derrotas terríveis nos ostrogodos,
e eles eram tão brutais, que o rei ostrogótico cometeu suicídio para não cair
nas suas mãos.
Os visigodos também são completamente derrotados, e depois que
verem o que os hunos faziam com os cativos, eles fogem desesperadamente
até atingir a fronteira com o Danúbio. Os romanos passam a perder a
confianças nos visigodos, que começam a saquear, queimar, e fazer as
habituais barbaridades nos Balcãs. E na batalha de Adrianópolis eles trucidam
os romanos, junto com os ostrogodos.

Depois, no reinado de Teodósio I (379-395), o imperador que se


converteu ao Cristianismo, ele neutraliza os godos. Ele não expulsa os godos,
mas oferece terra para eles, no sistema de colonato, ou foederati, que
futuramente irá se tornar os feudos. Esses foederati era um federado que tinha
desde os primórdios da República Romana, em que  identificava uma tribo
associada a Roma por tratado (foedus), mas que não tinha foro nem
de colónia romana nem de cidadania romana (civitas) mas que ainda assim
estava obrigada a fornecer um contingente de soldados, caso isso lhe fosse
solicitado. Os latinos eram considerados aliados de sangue, mas os demais
eram federados ou sócios (socii). Quando Teodósio morre em 395 ele divide o
império entre seus dois filhos, Honório e Arcádio, e desta vez a divisão é
definitiva. Honório fica com o Ocidente e governa até 423, e Arcádio fica com o
Oriente e governa até 408. Os dois eram muito jovens, com Honório tendo
apenas 10 anos, e Arcádio 18 anos. O Ocidente tinha a capital em Roma, e o
Oriente em Constantinopla. No entanto, depois a capital do Ocidente é movida
para Milão em 401, porque é mais perto do Reno. E quando as condições se
deterioram ainda mais, a capital é movida para Ravena, que é cercada de
pântanos, o que torna difícil conquistar por terra, e é ligada pela Via Ignatia a
Constantinopla, tem um porto e é uma viagem relativamente curta até
Constantinopla pelo mar.

Com isso o Império perde um tesouro em comum e uma zona militar em


comum. E com isso o leste rico é capaz de se tornar uma nova civilização, mais
avançada. O governante de verdade do leste era Rufinus, que era da Gália, e
não falava bem o grego. O governo oriental é um governo civil, e reduziu o
tamanho de suas forças armadas, e confia na sua diplomacia cada vez mais
elaborada para garantir sua defesa. Eles subornam os bárbaros, não envia
exércitos contra eles, e suborna para eles lutarem uns contra os outros. O leste
prospera tanto, que em uma geração, que o governo imperial em
Constantinopla estava abaixando impostos e abolindo impostos.

Enquanto isso, o oeste só decai. Os impostos da Síria, do Egito, da Ásia


Menor, fluiam para Roma, e agora não fluem mais. O império oriental estava
disposto a subsidiar a corte ocidental, mas não em questões militares, pois eles
não estavam preocupados com a fronteira com o Reno. E como Honório era
muito novo, quem estava no comando nos primeiros anos de seu reinado era o
chefe germânico das forças armadas, Stilicho (Estilicão).
(Honório, Imperador Romano Ocidental, 395-423, Jean-Paul Laurens (1838-
1921))
(Divisão feita por Teodósio em 395)

E a germanização dos romanos se aprofunda. Stilicho era casado com a


irmã de Teodósio, Arcádio se casa com uma alemã, e seu filho Teodósio II é
meio alemão, meio romano.

As coisas pioram quando em 401 os governantes do oriente resolvem se


livrar dos visigodos. O governo oriental dá um grande suborno para Alarico, o
líder dos visigodos, para ele tentar a sorte na Itália. Então em 401 os visigodos
liderados por Alarico vão para a Itália, e com isso a capital do Ocidente é
movida para Milão. Nenhum desses bárbaros queriam destruir o Império, eles
queriam é receber os benefícios de estar no Império. Stilicho agora estava com
sérios problemas, porque estava com exércitos inadequados, e tinha que
proteger a fronteira do Reno e Danúbio e ainda lidar com os visigodos. Por
mais que todas as vezes que as tropas de Stilicho encontram as de Alarico,
Stilicho vence, ele nunca consegue dar o golpe final. Em 406 Stilicho decide
ficar com a Ilíria, nos Balcãs, porque achava que era província do Ocidente
porque falavam latim, e na divisão de Teodósio, essa parte ficou com o Oriente.
Então parece que o plano era Stilicho se juntar a Alarico e conquistar essa
província, e Alarico ser feito governador dessa província, e em troca forneceria
soldados a Stilicho e defenderia a Itália.

Apesar desse plano realmente ser brilhante, em 406 uma vasta


confederação de bárbaros cruzam o Reno no inverno, conforme já foi falado.
Não há recursos para empurrá-los de volta, e eles se espalham pela Gália,
para Espanha, Norte da África. Então o esquema de Stilicho vai por água
abaixo, ele é preso e executado em 408. Parece ter sido um golpe com
colaboração do Oriente. Então há um massacre de alemãs na Itália, e muitas
dessas pessoas mudam de lado, e vão para o lado de Alarico. O Senado em
Roma e o imperador em Ravena, se recusam a fazer negócios com Alarico.
Alarico aparece três vezes nos portões de Roma, e três vezes lhe foi dado
muito dinheiro para ir embora. Mas em 410, Alarico entra na cidade, e Roma
cai pelos visigodos, com a cidade sendo saqueada. Isso causa um tremendo
choque para o lado ocidental e oriental do Império. No norte da África, Santo
Agostinho ao ver isso começa a escrever o seu livro “A Cidade de Deus”, de
tão chocado que ficou, e observando esses fatos de perto, e escreve que não
tem mais como reerguer o Império, por causa do que ele se tornou. Apesar de
chocar muito esse acontecimento, os visigodos apesar de saquear a cidade e
levar todo o ouro que puderam carregar, não há muitas perdas de vidas, não
há muita destruição de propriedades, e os visigodos já eram cristãos arianos
faz um bom tempo. Alarico tem uma reunião longa e amigável com o papa, as
Igrejas são sacrossantas e não são saqueadas, e passados alguns dias,
Alarico e seus soldados saem de Roma. A queda da cidade de Roma em 410 é
mais marcante pelo psicológico abalado que deixou as pessoas, já que Roma
não era saqueada desde 390 a.C. pelos gauleses, mas não é grande coisa em
comparação aos acontecimentos que levaram a queda do Império.

Apesar dos bárbaros que entraram no Império não serem selvagens,


eles não estão dispostos a sair, e convivem de forma bastante instável com os
administradores romanos. Eles não podem ser expulsos porque o Estado
romano não tem forças para isso, mas também muitos passam a desertar para
o lado dos bárbaros. O que os germânicos oferecem aos provincianos romanos
da Hispânia, Gália, e Itália, é impostos muito menores, e nada muito mais que
isso, e a vida vai continuar da mesma maneira. Além disso, o Império Romano
do Ocidente era muito pouco povoado, e tinha alguns vazios demográficos, e
terras sem ninguém também.

(Alarico entrando em Roma)


No entanto, apesar dos germânicos não serem bárbaros e violentos com
as pessoas normais, e já terem um grau superior de civilização porque já eram
cristão, mesmo que arianos, o mesmo não podemos dizer dos hunos. Os
hunos eram tipo os mongóis do final da Idade Média, e esses eram bárbaros no
stricto sensu do termo. Quando os hunos conseguem entrar na Itália em
meados do século V, sua primeira conquista foi a total destruição e Aquileia,
uma cidade muito grande e rica, que permaneceu em ruínas por século depois
que os hunos a destruíram. Átila, o grande líder dos hunos leva eles até Roma,
e é um pouco misterioso o que acontece. O papa Leão I em 452 foi para fora
dos portões de Roma e se encontrou com Átila, e depois de horas de conversa,
convenceu Átila e seus hunos a desistirem de tomar a cidade, e eles foram
embora.
(A reunião entre Leão Magno e Atilla (Stanza di Eliodoro), 1512, por Raffaelo
Sanzio da Urbino)

O general Aécio foi o último grande general romano, e conseguiu ganhar


dos Hunos na batalha dos Campos Cataláunicos, em 451. E graças a ele, os
romanos conseguiram colocar algumas tribos umas contra as outras. Visigodos
contra suevos, suevos contra vândalos, hunos contra burgúndios, francos
contra outros tipos de francos. Sua luta contra as hordas húnicas de Átila,
terminou exatamente quando Aécio repeliu as forças hunas na batalha dos
Campos Cataláunicos. A coalizão entre romanos, francos, burgúndios e
visigodos foi vitoriosa, mas Aécio se recusou a dar o golpe mortal nos hunos,
porque sabia que a ameaça huna era a única coisa que mantinha as tribos
germânicas na linha. O Império Huno se dissolveu depois da morte da Átila em
453, assassinado por uma espiã romana. Na batalha de Nedao, os hunos são
derrotados de vez e dispersam. No entanto, ainda tinha 6 tribos germânicas
para lidar, e Valentiniano III um ano depois mata Aécio, num ato
completamente estúpido e insano. O medo germânico dos hunos, e o
pragamatismo de Aécio eram as únicas coisas que mantinham o Império ainda
de pé, mesmo que em frangalhos.
(Átila, o huno devastando a cidade de Aquileia, Itália, 452 dC - Ilustração de
Tancredi Scarpelli (1866-1937) em "Storia d'Italia")

(O assassinato de Flávio Aécio, por Jarek Nocon)

Com o fim da ameaça dos hunos em 454, os bárbaros já dentro do


Império vão terminar de conquistar o Império do Ocidente. Em março de 455
Valentiniano III é assassinado em Roma, e assume Petrônio Máximo, que era
fantoche dos bárbaros. Durante esses últimos 20 anos vamos ter imperadores
fantoches dos bárbaros, que não vão conquistar o que restou do Império,
porque queriam o reconhecimento do Império do Oriente. Em maio os vândalos
que já tinham seu reino estabelecido no norte da África desde 442, saqueiam
Roma e o imperador Petrônio é morto, e assume Ávito, general proclamado
imperador pelos visigodos e galo-romanos. Ávito é derrotado e deposto por
Ricímero em outubro de 456, que é quem realmente mandava nesses últimos
suspiros do Império. Em 457 o general Júlio Valério Majoriano é apontado
como imperador pelo exército e apoiado por Ricímero. Majoriano merece um
destaque porque mesmo sendo um imperador fantoche, ele conseguiu algumas
vitórias contra os bárbaros em seu pequeno reinado até 461, e conseguiu
recuperar alguns territórios. Em junho de 457 os alamanos invadem a Itália, e
são derrotados em agosto na batalha de Campi Cannini. Em outubro de 458 os
romanos derrotam os visigodos na batalha de Arelate, no sul da França. Em
fevereiro de 459 os alamanos invadem a Gália, e os burgúndios atacam. Em
abril os romanos derrotam os burgúndios, e reconquistam Lugduno. Em janeiro
de 460, os romanos invadem a Hispânia e fazem os visigodos perderam parte
considerável de seu território e voltarem a ser foederati em setembro, tem uma
anarquia na Hispânia, e as Astúrias e a Cantábria se tornam livres. Em janeiro
de 461 a Sicília é libertada do dominínio dos Vândalos. No entanto, os romanos
são pesadamente derrotados pelos vândalos na batalha naval de Cartagena
em abril de 461, e Majoriano é assassinado em agosto.

Em novembro de 461 o reino de Soissons é fundado no norte da Gália,


em torno de Paris, pelos soldados romanos que restaram lá. Líbio Severo é
declarado imperador por Ricímero, e morre de causas naturais 4 anos depois.
A partir de 462, gradualmente os suevos, visigodos, francos, alamanos,
burgúndios, invadem o que sobrou do Império Ocidental. Em outubro de 462 o
reino independente visigótico é fundado, e em julho de 463 atacam o reino de
Soissons, mas são derrotados em setembro na batalha de Orleans. Depois que
Líbio Severo morre em lugar desconhecido, fica 2 anos sem nenhum imperador
fantoche ser proclamado. Em abril de 466 os Rúgios invadem a Récia e
formam seu pequeno reino em dezembro. Em novembro os vândalos saqueiam
a Acáia, no império oriental. Antêmio é declarado imperador em abril de 467
por Leão I, imperador oriental. Em março de 468 o que sobrou do Império
Ocidental e o Império Oriental invadem o reino vândalo, mas em julho o Império
Oriental é pesadamente derrotado na batalha de Cape Bon. Em abril de 469,
os ostrogodos capturam uma grande parte da Panônia e da Dalmácia, e em
julho os vândalos retomam as ilhas da Sardenha e Córsega. Em outubro o
reino Ostrogótico independente é fundado. Em maio de 472 há uma guerra civil
com Ricímero e Antêmio é morto por Gundebaldo, rei dos burgúndios. E Olíbrio
assume, proclamado por Ricímero. Mas Olíbrio morre em novembro do mesmo
ano, e os visigodos tomam o que sobrou da Hispânia, que era Tarraconensis.
Em fevereiro de 473, Glicério se torna o imperador apontado por Gundebaldo e
derrota uma invasão dos visigodos na Itália. Em maio de 474, Júlio Nepos que
foi proclamado imperador por Leão I, desembarca em Roma e depõe Glicério.
Em outubro de 475, o comandante Orestes nomeia seu filho Rômulo Augusto
como imperador, e Júlio Nepos foge para a Dalmácia. Em março de 476, os
vândalos tomam a Sicília, e em julho o comandante Odoacro se revolta contra
Rômulo Augusto, que é deposto em setembro de 476. Odoacro funda o reino
da Itália. Em 480 Júlio Nepos é assassinado na Dalmácia, e seu reino é
anexado ao reino de Itália. Em 486, o último bastião do exército romano no
reino de Soissons é conquistados pelos francos, sob o comando de Clóvis I. E
este é o fim do Império Ocidental.

Depois que Rômulo Augusto é deposto por Odoacro, os bárbaros pegam


as insígnias imperiais e mandam para Constantinopla para o imperador Zeno.
Isso significava que o oeste não tem mais um imperador, e Zeno tomaria o
controle nominal do oeste, mas deve nomear Odoacro como protetor da Itália.
E Zeno aceita a oferta de Odoacro.

A feudalização da Europa

No século IV, o Império Romano enfrentava uma forte crise na produção


agrícola, por causa dos altos impostos e burocracia romana. Então os grande
proprietários de terras, passaram a emprestar áreas rurais de suas
propriedades para que rendeiros agrícolas trabalhassem nelas cultivando a
terra, e recebiam parte da produção, e o trabalhador recebia proteção do seu
senhor. Essa relação recebeu gradativamente a escravidão no Império
Romano, e recebeu o nome do Colonato, onde o colono e sua família ficavam
perpetuamente presos a terra que cultivavam, e foi um predecessor do
feudalismo.

As invasões dos povos bárbaros só fazem acelerar esse processo de


ruralização, já que era muito perigoso permanecer nas cidades, que eram
saqueadas pelos bárbaros. Os povos germânicos também tem sua contribuição
para a formação do feudalismo, porque eles forneceram os ideias de honra e
de lealdade, que são essenciais para o funcionamento do feudalismo. A
instituição germânica que representava isso era o Comitatus, que era um grupo
formado por guerreiros e por um chefe, com obrigações mútuas de serviços e
lealdade. Os guerreiros juravam lealdade ao seu chefe quanto à sua defesa,
em retribuição o chefe fornecia cavalos e armas para que eles lutassem. O alvo
era a pilhagem, tida como uma das maiores glórias pelos povos germânicos.
Essa relação de honra, vai ser a base de toda relação entre suseranos e
vassalos, a vassalagem.

Então basicamente o feudalismo é a junção do Colonato romano com o


Comitatus germânico e com a Igreja Católica mediando tudo e estando acima
de todos os nobres e reis. Qualquer feudalismo pode ser definido como um
sistema jurídico descentralizado onde você tem uma certa rede de hierarquia
de nobres, que todos obedecem ao rei, mas todos tem uma grande autonomia.
A Grécia se reergueu depois do colapso da civilização micênica de um modo
muito parecido com o feudalismo, e Roma até mais ou menos a Segunda
Guérra Púnica, também era bem parecida com esse sistema.

O único modo de ter proteção basicamente era se subordinar a um


poderoso proprietários de terras que viria a ser um nobre, então começamos a
ter uma relação hierarquica. Essa é a vassalagem, mas tanto o suserano
quanto o vassalo são nobres. O feudo era um território concedio ao vassalo
pelo suserano, para que seja o senhor feudal e governe os servos com justiça
e honra. Já o suserano é vassalo de um senhor mais poderoso ainda do que
ele, e a cadeia hierárquica vai subindo até barão, visconde, conde, marquês,
duque, infante, príncipe, e finalmente o rei, o suserano dos suseranos (ou
imperador no caso franco).
Então é um sistema extremamente descentralizado, onde o poder é
distribuido pelo rei à nobreza. Os barões e os cavaleiros são a baixa nobreza.
O suserano tinha que principalmente fornecer proteção à seus vassalos. Em
troca o vassalo deve prestar apoio político (Consilium) e apoio militar
(Auxilium). Essas obrigações são consumadas num rito chamado Homenagem,
onde um vassalo deve ajoelhar diante de um suserano visando cumprir as suas
obrigações, e o suserano lhe consede a investidura de seus bens, ou seja, o
feudo, que era hereditário. Mas havia também feudos autônomos, como os
alódios, que eram livre de direitos senhoriais, "livre de foros, vínculos, pensões
e ônus".

Os servos eram acolhidos no feudo pelo senhor feudal, e moravam em


pequenas vilas. Eles plantavam, colhiam, produziam azeite, vinho, pão, farinha,
queijo, manteiga, caçavam, pescavam, e trabalhavam numa rudimentar
indústria artesanal. O uso da terra pelo servo, no entanto, precisava de
impostos, que eram com mercadorias e prestação de serviços. A agricultura
era de subsistência, e os servos produziam o suficiente para si mesmos e para
o senhor feudal. O excedente era estocado em caso de crise da produção (um
grande inverno, ou a pequena Idade do Gelo que teve em 300 anos na primeira
metade da Idade Média). Durante alguns dias do ano, as famílias eram
obrigadas a trabalhar exclusivamente nas plantações do senhor feudal, e o
pagamento era dado por meio da permissão para que se usasse os fornos e os
moinhos, etc.

Mesmo que isso pareça tirânico, lembre-se que o contrato de servidão


era na maioria das vezes voluntário, apesar de sair desse contrato não ser
muito fácil, e muitas vezes o servo precisar pagar por sua liberdade. E os filhos
dos servos, infelizmente nasciam servos porque não era feito outro contrato de
servidão voluntária. Mas apesar de ser parcialmente voluntário, os servos não
pareciam se importar muito em dar parte da sua produção pro senhor feudal,
porque eles teriam proteção no castelo e no feudo, porque estavam ocorrendo
várias invasões bárbaras, e depois dos Vikings, dos magiares e dos sarracenos
(muçulmanos). Tudo isso na primeira metade da Idade Média (século V ao X).
No ano 1000, as invasões vikings e magiares vão cessar quando estes povos
forem cristianizados, e os espanhóis e portugueses vão aos poucos
reconquistando a península ibérica dos muçulmanos. E cai entre nós que você
paga muito mais impostos ao governo hoje, do que o servo pagava pro senhor
feudal na época.

Do século XI ao XIII tem um renascimento cultural e urbano, onde as


cidades voltam a crescer (as cidades não deixaram de existir na primeira parte
da Idade Média, mas eram bem menores, por exemplo Roma tinha 1,2 milhões
de habitantes no ano 0, e 40.000 a 100.000 pessoas no começo da Idade
Média). Surge também nesse período a burguesia, as cidades livres italianas,
as Universidades (a primeira europeia é a de Bolonha em 1088). O comércio
ressurge fortemente, mas de uma forma bem melhor do que era no Império
Romano, e vão florescer cidades como Gênova, Pisa, Lucca, Augsburg, Paris,
Veneza, Marselha, Provence, Roma, Florença, Sevilha, Lisboa, Toledo,
Constantinopla, Kiev, Novgorod, Moscow, Oslo, Estocolmo, Bruges, Londres,
Hamburgo, Leipzig, etc. Ligas Comerciais como a Liga Hanseática, Liga Catalã,
Liga Genovesa, Liga Veneziana, Liga de Champagne. Áreas totalmente livres
de regulação e tributação como as feiras de Champagne na França, que
atraíam comerciantes do mundo inteiro, a ilha de Brie, etc.

Vários servos vão migrar para essas cidades onde estava se


desenvolvendo o capitalismo, e vão passar obter lucros e comprar a sua
liberdade do senhor feudal. Fora que com centenas de milhares de nobres indo
lutar nas Cruzadas, ficou um vácuo de poder, que fez com que milhares, e
talvez milhões de servos conseguissem a liberdade.

O que acabou com o feudalismo foi a centralização do poder em torno


da figura do rei. Na Inglaterra por exemplo, o feudalismo nunca foi muito forte,
onde o poder real sempre foi muito dominante. Na França, com a dinastia
Capetingia (987-1328), eles começam lentamente a centralizar o poder, e
começam a impor a sua autoridade sob o controle das finanças, da defesa e da
justiça, que estavam descentralizadas nas mãos dos nobres e senhores
feudais.

A Cristianização dos Bárbaros

Segundo Edward Gibbon no livro “A História do Declínio e Queda do


Império Romano”:
“O progresso do Cristianismo foi marcado por duas
vitórias gloriosas e decisivas: sobre os cidadãos eruditos e
luxuosos do Império Romano e sobre os bárbaros guerreiros da
Cítia e Germânia, que subverteram o Império, e abraçaram a
religião dos romanos.” (GIBBON, Edward, 1776).

Gibbon era um mestre da ironia e dizer exatamente o que ele pensava


sobre o Cristianismo podia levá-lo ao tribunal. Segundo ele a nova Europa
Ocidental que emerge após 400 é bárbara mas ainda cristã. O que ele quer
dizer é que os bárbaros conquistaram o Império e não a Igreja. A Igreja não é a
vítima dos bárbaros, e como podemos ver eles já eram cristãos desde a
década de 320, apesar de seguirem uma heresia do Cristianismo, o arianismo.
Quando Alarico saqueia Roma em 410, ele só rouba a cidade, não mata quase
nenhuma pessoa, e não mexe com a Igreja.

Como o Império Romano era bastante tolerante com as religiões dos


povos que eles conquistavam, desde que não intrometam nos negócios de
Roma, tinham uma variedade imensa de cultos pagãos no Império. Havia quem
fazia rituais para Mitra, ou para a deusa egípcia Ísis, ou o culto a Alma Invictus,
etc. Mas é o Cristianismo que vai se destacar, vai conseguir mais fiéis, e vai
irritar mais os imperadores, e a que vai ser mais perseguida. Para um
convertido ao Cristianismo você tinha um pacote completo de recompensas e
punições, uma teoria completa da história como um desenvolvimento linear,
uma abertura à especulação filosófica, uma tradição literária impressionante,
uma liderança forte e inspiradora, laços estreitos de unidade entre os fiéis, uma
rede de comunidades com governança interna, e uma visão ambígua sobre o
Império Romano, sem proibição do serviço, mas não totalmente obediente.

No entanto, geralmente era nas cidades que os cristãos iam pregar, e


onde iam surgindo os fiéis. Nos distritos rurais do Império Romano, não havia
ninguém ou quase ninguém que soubesse sequer o que era o Cristianismo. Em
598, quase 300 anos depois de Constantino declarar o fim da perseguição aos
cristãos, no livro De Correctione Rusticorum de Martinho de Braga, ele reclama
que as pessoas do campo ainda adoram pedras e árvores em Portugal. No
mesmo ano, o papa Gregório o Grande, lamenta que as pessoas no campo a
apenas 50 milhas de Roma estejam fazendo o mesmo. Em 633 ocorre o
Concílio de Toledo, que proíbe bispos, diáconos, ou qualquer outra ordem
clerical de consultar magos, áugures (sacerdotes romanos), adivinhos, ou
videntes. Era comum as pessoas do campo acreditarem em duendes,
demônios, bruxas, e toda forma de paganismo.

No entanto, no oriente você ve um impressionante registro de


conversão. Quando você vai para a Mesopotâmia, Índia, China, você está indo
para zonas civilizadas e com grande urbanização. E o Cristianismo chega
nesses lugares e floresce nas cidades. Na Mesopotâmia, que era governada
pelos partos e depois pelos persas o Cristianismo se espalhou muito rápido,
porque os persas eram bem mais tolerantes com os cristãos do que os
romanos. Além disso, os persas eram bem mais tolerantes com as heresias do
Cristianismo que iam surgindo. Nas vésperas da conquista muçulmana, a
Pérsia estava pronta para uma conquista cristã.

Os germânicos não queriam destruir o Império, eles queriam fazer parte


dele, as vezes com alguns privilégios legais. Eles admiravam o Império,
trocavam mercadorias com os romanos, e serviram muito bem no exército
romano após o século III. Tanto que os bárbaros se tornaram cristãos arianos
na mesma época que Constantino acabou com a perseguição e foi batizado no
seu leito de morte. Só que quando os hunos começam a pressionar as tribos,
junto com o clima desfavorável, eles entram no Império para fugir do terror
huno. Destruir o Império e saquear era o plano B dos germânicos, por isso
você tem regiões do Império Ocidental que ficaram intactas, enquantos outras
foram devastadas, normalmente pelos hunos.

Apesar de geralmente os bispos não terem interesse repentino em


cristianizar os bárbaros, havia pessoas que tinham e fizeram com relativo
sucesso. Quando os godos saqueiam Atenas, Esparta, Creta e o Chipre em
267, eles fazem muitos escravos que serão vendidos em seus territórios.
Muitos desses escravos eram cristãos, e conseguem converter seus mestres.
Uma das crianças de um desses cativos era Ulfilas (311-383), que traduziu a
Bíblia para a língua gótica, inventando um novo alfabeto para fazer isso.
Inicialmente ele não teve um sucesso enorme, mas depois ele pede para que o
imperador Constâncio II (337-361), filho de Constantino e cristão ariano, para
ele e seus seguidores entrarem no Império. Eventualmente Ulfilas, que também
era ariano, tem sucesso e a sua tradução da Bíblia se torna a Bíblia oficial para
os godos.

O Cristianismo garante salvação para qualquer tipo de pessoa, desde o


que recebe educação clássica greco-romana até o analfabeto, bastando que
ele siga a doutrina. Além disso você tem rituais em todas as etapas da vida,
como o batismo, o casamento, e a extrema unção. Você tem a noção de
esperança e toda uma tecnologia de consolo como livros, relíquias, cruzes, e
que ajudam a entender a vida. E se você fosse um governante pagão, um
governante bárbaro, a conversão também era uma garantia que você entraria
na civilização romana, mesmo que se fosse para uma versão herética.

Após dois séculos de disputas entre os cristãos arianos bárbaros e os


católicos apostólicos romanos, as coisas começam a melhorar no século VI. Os
francos eram pagãos e vão ser os primeiros a se tornar católicos em 496, e em
499 ocorre o batismo de Clóvis I. Em 510, os burgúndios sobre o rei
Sigismundo largam o arianismo e se tornam católicos. Nos anos 530, os
Vândalos também vão largar o arianismo e se tornar católicos, quando seu
reino for totalmente conquistado pelo imperador bizantino Justiniano. Entre 535
e 554 durante as guerras góticas, os ostrogodos da Itália vão se tornar
católicos depois de caírem sob domínio bizantino. Em 560, os suevos de
Portugal vão largar o arianismo e se tornarem católicos. E em 580, os visigodos
vão largar o arianismo e se tornar católicos.
(A Cristianização da Europa do século I até o XIX)

Outro fato muito importante na Alta Idade Média (século V-X) é a


conversão dos irlandeses. São Patrício (387-461) foi um cidadão romano da
Britânia, que foi sequestrado quando criança, e levado até a Irlanda onde foi
vendido como escravo. Após seis anos sob cativeiro ele escapa e volta para a
Grã-Bretanha, só que os exércitos romanos foram retirados, apesar de ainda
continuar sendo uma província romana. Quem habitava essa região era os
celtas, que já eram romanizados e cristianizados. São Patrício tem uma visão
que diz que ele tinha que voltar e evangelizar os irlandeses. Palladius é
apontado bispo da Irlanda em 431, só que ele morre e é substituído por
Patrício. E São Patrício durante toda a sua vida fez um trabalho excepcional e
converteu toda a Irlanda. Seu trabalho foi tão bem sucedido que os monges
irlandeses foram responsáveis pela conversão ou pela reconversão do norte da
Inglaterra, e o mosteiro de Lindisfarne vai ficar bastante famoso por ser o
começo do trabalho da reconstruir a civilização. Essa é a primeira vez que a
Igreja formalmente vai em um território além dos limites do Império Romano
para fazer um trabalho de evangelização. Assim começa a fundação de
mosteiros, que vão ser os lugares onde os monges vão copiar e preservar
todas as obras clássicas de todo o período romano e antigo, os quais muitas só
temos acesso por causa deles. Esse cristianismo irlandês é conhecido como
Cristianismo celta.

Os monges irlandeses são tão bem sucedidos que vão até começar um
renascimento monástico na Inglaterra, porque os mosteiros eram fortificados
para resistir às invasões dos anglo-saxões, jutos e frísios, que eram pagãos e
não arianos. A Inglaterra deixou de ser parte da Cristandade por dois séculos
depois que foi abandonada pelos romanos. Os anglo-saxões vão dar um certo
trabalho para os monges, mas depois da conversão de Etelberto de Kent em
597 ao catolicismo, as coisas começam a melhorar, e o restante dos reinos
anglo-saxões (Sussex, Essex, Wessex, Mércia, Ânglia Oriental, e Nortúmbria)
vão todos se tornar católicos até 686, e vai ter um renascimento monástico na
Inglaterra que durará até as invasões vikings em 796. Etelberto (Aethelbert) foi
convertido junto com 10.000 de seus seguidores no natal de 597, por Agostinho
de Canterbury, que foi mandado pelo papa Gregório Magno. Em 604, o rei
Seberto (Saebehrt) de Essex se converte e constrói uma igreja em Londres.
Em 605, o rei de Redualdo (Redwald) da Ânglia Oriental se converte ao
catolicismo, mas parece que depois abandonou a religião e ele pode ser o rei
pagão enterrado em Sutton Hoo. Em 627, o rei Eduíno (Edwin) é batizado sob
a influência de sua esposa católica. Bento Biscop (628-690) funda um convento
de monges em Jarrow, na Nortúmbria. O santo Beda, o Venerável (672-735), é
um grande historiador da Idade Média, que escreveu o Historia ecclesiastica
gentis Anglorum (732), que escrevia em prosa latina, e preservou a cultura
saxã. A diferenças dos católicos da Inglaterra e Irlanda para os do continente é
que eles ainda escreviam em línguas bárbaras como o inglês, e quando
escreviam em latim, tinham que aprender a língua como se fosse estrangeira.

Até os hunos a Igreja tentou converter, só não conseguiu porque os


hunos são nômades e se movem muito rápido de um lugar para outro. A
primeira tentativa foi feita pelo bispo Theótimo de Tomi (X-407), que em 392 foi
feito bispo de toda a Cítia até sua morte em 407. Ele tentou converter os hunos
oferendo presentes e comida, mas não teve sucesso. Kardutsat, bispo de Aran
(hoje Geórgia), manda sete sacerdotes para o território huno, afim de tentar
ajudar os prisioneiros romanos que estavam lá. Ele conseguiu converter alguns
hunos, e traduziu partes da Bíblia para húnico. Mas em geral a missão foi um
fracasso, porque poucos missionários eram capazes de acompanhar a dureza
da vida nômade dos hunos.

São Bonifácio (675-754) começa um novo passo na conversão dos


bárbaros. Os missionários ingleses foram enviados para a Alemanha, que foi
amplamente evangelizada a partir da Inglaterra. E assim os missionários
alemães são mandados para o norte e para o leste, para continuar o trabalho
de evangelização. Até 597, antes da conversão de Etelberto de Kent, o
trabalho de evangelização dos bárbaros era feito praticamente por pessoas
privadas. A partir dessa data, a Igreja passa a adotar como missão principal a
evangelização de todos os povos bárbaros que ainda faltavam. Os missionários
vão para uma área, costroem os monastérios, educam os garotos, cristianizam,
e quando seu trabalho básico estiver fetio, os locais recrutam mais
missionários, que são enviados para um novo território, e continua assim até
hoje.

Vão ter alguns intelectuais que eram considerados bárbaros como


Alcuínio de York (735-804), que era inglês e foi chefe da reforma educacional
feita na França por Carlos Magno. Outros como Paulo o diácono (720-799) que
era um historiador dos lombardos e monge beneditino. Ou ainda Liuprando de
Cremona (920-972), um escritor de grande distinção, da Itália. Depois de 700, a
distinção entre romano e bárbaro desapareceu, e eles formam agora uma única
nação. E o nível de alfabetização dos bárbaros não devia ser muito diferente do
dos romanos e dos gregos, onde menos de 5% da população era alfabetizada.
Os ostrogodos na Itália (493-552)
(reino ostrogótico no seu auge sob Teodorico o Grande)

Devido ao feudalismo, e às novas relações criadas, a cidade de Roma


vai continuar existindo, mas vai perder muitos de seus habitantes. A ruralização
que começa no século IV e V, acentua-se durante os reinos bárbaros. Roma
em 493 tinha em torno de 126.000 pessoas, para cerca de 30.000 em 555
quando os bizantinos conquistam o reino ostrogótico.

Odoacro tinha expulsado os vândalos da Sicília em 477, toma a


Dalmácia do leste, e ele governa a Itália cooperando com o Senado e com a
administração imperial. Para os ricos na Itália a vida continua a mesma coisa
na Itália.

Teodorico se chamava Dietrich, quando foi batizado na Igreja ariana,


mas aos oito anos de idade é mandado para Constantinopla como refém como
garantia de uma aliança do Império Oriental com seu pai Thiudimir. Em
Constantinopla ele é educado e recebe o nome de Teodorico e se torna o
favorito dos imperadores orientais Leão I (457-474) e Zeno (474-491), e é
apontado como general nos exércitos imperiais. Em 488 ele se torna um súdito
muito poderoso e então Zeno faz um acordo com ele. Zeno não gosta de
Odoacro que está reinado de forma muito independente, e manda Teodorico
para o oeste e se ele derrotar Odoacro, ele poderá governar a Itália. Teodorico
aceita e vai para a Itália, e conquista facilmente. Eles pensam em governar a
Itália como reis conjuntos, mas em 15 de março de 493, Teodorico apunhala
Odoacro num jantar formal para celebrar o tratado. Então Teodorico será o rei
da Itália e poderá nomear um dos cônsules.

Os italianos foram autorizados a viver sob suas leis e maneiras


tradicionais, mas os exércitos de defesa eram góticos. A aristocracia senatorial
continuaria rica e semi-autônoma, e os godos tomariam mais de um terço das
terras da Itália, o que fizeram mas ainda tinha algumas terras vagas no norte
do país. Os godos não eram cidadãos romanos, mas eles eram legalmente
reconhecidos como presentes na Itália e suas terras foram legalmente
reconhecidas. Teodorico governa em Ravena como chefe de um tribunal
multinacional, seu primeiro ministro é um senador romano chamado
Cassiodoro (490-581), cujas cartas e outros documentos são nossas principais
fontes sobre o reinado de Teodorico. Cassiodoro fundou o monastério de
Monte Cassino durante sua aposentadoria.

Teodorico assume a responsabilidade de manutenção e reparação dos


monumentos em Roma e em outras cidades. Ele poem os aqueodutos em
ordem, mantém as estradas, resconstrói os muros da cidade, recomenda
distribuição de comida para romanos pobres, e embora seja um cristão ariano,
ele impõe uma tolerância de todas as seitas e religiões na Itália.

Ele manteve um bom relacionamento com os outros reinos bárbaros,


com seu reino estando no centro de um sistema de casamentos dinásticos que
costura os ostrogodos na Itália, os francos na Gália, os Visigodos na Hispânia.
E além disso, ele permanece em termos amigáveis com o imperador bizantino
e com os vândalos na África.

Teodorico encomendou a Basília de Santo Apolinário em Ravena, e está


praticamente inalterada até hoje. Vários mosaicos tinham a sua figura e de sua
família mas que foram removidos pelos bizantinos durante a conquista de
Justiniano, ao melhor estilo Stalin mandando retirar Trotski de todos os
registros históricos e imagens e fotografias.
(Basílica de Santo Apolinário em Ravena)
(retrato de Teodorico, o Grande)

De 395 até 518, os bizantinos não estavam muito dispostos a ajudar o


Ocidente. Eles não estavam dispostos a gastar dinheiro defendendo o Império
do Ocidente ou de gastar dinheiro para expulsar os bárbaros. Eles ficaram na
deles, subornando líderes bárbaros para não saqueá-los, e para manter em
paz, e eles enriqueceram bastante nesse período. Só que quando Justino I
assume em 518, as coisas mudam. Justino era tio de Justiniano, o Grande, que
foi quem reconsquistou boa parte do território romano. Em 533, o general de
Justiniano, Belisário conquista o reino vândalo no norte da África em uma
campanha e em três batalhas. Cartago se rende e o rei vândalo é levado de
volta para Constantinopla, onde recebe uma casa e pensão, e vive o resto da
vida em paz.
(mosaico de Justiniano na basílica de São Vital em Ravena)

O próxima alvo de Justiniano é a Itália, e Teodorico é perfeitamente


capaz, poderodo e popular para um ataque direto. Mas a Igreja italiana e a
aristocracia senatorial são usados pelos bizantinos contra Teodorico. Teodorico
então começa uma série de expurgos de quem ele acredita que está traindo
ele, e um desses é Boécio, o último grande filósofo romano. Teodorico estava
preparando campanhas para lutar contra os outros reinos bárbaros, mas ele se
sentiu pressionado por Constantinopla, e então não arrisca. Teodorico morre
em 526, recebe um bom funeral, e sua morte é lamentada em toda Itália,
mostrando que ele era querido. Assume seu neto Atalarico, supervisionado por
sua mãe, Amalasunta, como regente. Amalasunta encoraja seu sobrinho a
beber até a morte, e ela governa como rainha até ser estrangulada no banho
em 534, e a Itália cai num caos que pode ter sido orquestrado por
Constantinopla. Nesse caos, Justiniano ordena uma invasão que vai durar de
535 até 554, as chamadas Guerras Góticas.

Belisário parte de Cartago em 535, chega em Reggio no extremo sul da


Itália em 536, e em Roma no mesmo ano, e em 540 ele chega em Ravena e
toma a capital. Quando Belisário toma Ravena ele abre a tumba de Teodorico e
joga seus ossos para os cachorros. No entanto, não acabou ainda, e os
ostrogodos ainda resistem, e de 541 a 553 sob a liderança de Totila, fazem
alianças com a Pérsia para atacar o Império Bizantino em duas frentes. E os
persas respondem ao chamado e atacam, não porque eles gostavam dos
ostrogodos, mas porque viram uma oportunidade de atacar os bizantinos.
Então Justiniano tem que retirar boa parte das tropas da Itália e se voltar para o
leste. Roma é ocupada 5 vezes e sitiada, ora pelos godos, ora pelos bizantinos.
Uma hora toda a população é expulsa pelas muralhas, outra os aquedutos são
cortados e só são reestabelecidos no Renascimento. Muitas pessoas morreram
da praga de Justiniano entre 541 e 544, onde estimam que de 25 a 100
milhões de pessoas tenham morrido ao longo de dois séculos, algo em torno
de 40% da população do Mediterrâneo e das regiões do Norte que estão
concetadas.  A doença foi transmitida pelas pulgas, que vieram junto com os
ratos em navios com carregamento de grãos do Egito. Pensa-se que a praga
justiniana matou talvez metade da população da Europa e facilitou a aquisição
árabe das províncias bizantinas no Oriente Médio e na África. A área mais
atingida foi Constantinopla, onde documentos escritos sugerem que a praga
matou até 300 mil pessoas na cidade, mais de metade da população daquela
época. Estudos genéticos apontam que a doença teria se originado na China e
seria causado pela bactéria Yersinia pestis, assim como as outras grandes
pragas.

Depois Narses, outro general bizantino em 551, inflinge uma derrota nos
ostrogodos que fazem eles se retirarem para além dos Alpes, e Narses
governa a Itália a partir de Ravena, mas governa uma Itália despovoada e
despedaçada. A Itália não se recupera em termos populacionais até 1100.
(Conquistas de Justiniano em 565)

Até 535, Roma era cheia de bibliotecas grandes e razoavelmente bem


mantidas, mas por volta de 550, a maioria dessas bibliotecas era um monte de
escombros. Justiniano normalmente é culpado por todos os desastres que
aconteceu na Itália nesses 20 anos. Mas será que tudo é culpa dele? Em 536,
um vulcão na Islândia entra em erupção escurecendo o Sol por cerca de 18
meses, e as temperaturas do verão caem cerca de 1,5 a 2,5 graus celsius. De
536 a 545 é considerada a década mais fria nos últimos 2000 anos até esse
ponto, e as colheitas falham na Irlanda, Escandinávia, Mesopotâmia e China.
Em 541 há uma segunda erupção do vulcão, e as temperaturas caem de novo
algo em torno de 1,4 a 2,7 graus celsius. Entre 536 e 537 foi um ano sem
verão. Justiniano ficou conhecido como a “Mão de Deus” por causa disso,
porque muitas pessoas morriam e não sabiam o porque, achando que era
punição divina.
(principais áreas afetadas pela praga de Justiniano)

Narses governa a Itália até 568, e já está velho e é dispensado e volta


para Constantinopla. Conta Paulo o diácono, que Narses perde a calma e
convida os lombardos, uma raça mais selvagem de bárbaros, e partes da Itália
vai ser governadas por eles. Os lombardos também eram arianos, e vão
completar a desgraça da Itália na época. Mais tarde eles vão se converter ao
catolicismo, e será fundado os estados papais no centro da Itália em 754, em
que Roma se situará até 1870, e a situação começa a melhorar com os
lombardos.

Os vândalos no norte da África (435-534)


Os vândalos são um povo que sabemos pouco porque só vai surgir o
interesse de estudar esse período quando os franceses e os italianos dominam
o norte da África no final do século XIX. E mesmo assim eles estavam muito
interessados no período romano, e não no reino vândalo. Sabemos muito
pouco sobre este período histórico, mas as pouquíssimas fontes que temos,
podemos ter uma noção de várias coisas surpreendentes sobre esse povo.

No século III a.C. o norte da África era dominado por Cartago, uma
potência semítica, e logo seria o maior inimigo de Roma. Após as três guerras
púnicas de 264 a.C. até 146 a.C., Roma destrói completamente a cidade de
Cartago em 146 a.C., queimando a cidade e salgando a terra para nada
crescer ali. Depois o território se torna província romana, e Cartago é
reconstruída em 49 a.C. por Júlio César só que agora com arquitetura e
admnistração romana, com uma população de 500.000 pessoas 150 anos
depois, sendo a segunda maior cidade do Ocidente e uma das mais ricas.
As cidades do norte da África depois de serem romanizadas, ainda
falavam púnico e bérbere além do latim. As cidades grandes falavam latim,
mas quando você ia para as cidades pequenas, as vilas, e os distritos rurais, é
bem provável que ninguém entenderia você falando em latim. Além disso a
literatura latina no norte da África tinha seu próprio ramo, com pessoas como
Santo Agostinho de Hipona, São Cipriano de Cartago, Tertuliano, etc.

Vale lembrar que o deserto da Saara foi se formando aos poucos. Cerca
de 8000 anos atrás o eixo de inclinação da Terra começou lentamente a ir de
24,1° para os atuais 23,5° e isso fez com que lentamente ao longo de milhares
de anos, o norte da África fosse ficando mais seco e o deserto fo Saara fosse
avançando ao norte, até chegar no que é hoje. Hoje apenas uma certa região
costeira do norte da África não é deserto e tem o clima mediterrâneo, com
verões secos e invernos chuvosos. Mas antigamente o Saara era uma savana
de clima tropical, que foi lentamente se transformando em um deserto.

Por volta do ano 100, a África produzia cerca de um milhão de toneladas


de grãos por ano, e um quarto era exportado. E também era exportadora de
feijões, figos, uvas, azeite, mármore, madeira, pecuária, cerâmica, etc. De
acordo com Josefo, a África alimentava Roma por cerca de 8 meses ao ano e
os outros 4 meses vinha do Egito.

O norte da África também foi a região onde o Cristianismo se espalhou


mais e se espalhou primeiro. Em 258 São Cipriano de Cartago é o primeiro
bispo a ser martirizado. Além disso, conforme já falamos temos cristãos
proeminentes na literatura latina como Santo Agostinho, o próprio São Cipriano
e Tertuliano. E antes de Constantino acabar com a perseguição aos cristãos,
teve no norte da África a última grande perseguição feita por Diocleciano. Você
tinha os cristãos que entregaram escritos religiosos para serem queimados, e
que fariam os sacrifícios humanos pedidos, e tinha aqueles que se recusavam
a fazer. Isso gerou uma guerra semi-civil na província, e além disso tinha o
problema dos donatistas, que era uma heresia assim como o arianismo.

Os vândalos são germânicos que vinham da região da Polônia, e são


empurrados ao oeste e sul pelos hunos e entram no Império Romano em 406.
Os vândalos eram arianos assim como a maioria das tribos bárbaras depois de
312. A grande disputa teológica era: Cristo é idêntico a Deus? Cristo é
simplesmente uma outra manifestação de Deus? Ou foi Cristo uma pessoa
criada por Deus? Se a Igreja na época tivesse falado que Cristo era
simplesmente uma criação de Deus, havia a possibilidade de que os pagãos
simplesmente abraçassem o Cristianismo dizendo que é só mais um culto de
Cristo, que é a manifestação do único deus verdadeiro, junto com Júpiter,
Apolo e todos os outros. E com isso o Cristianismo iria ser absorvido pelo
paganismo romano-bárbaro, e as pessoas iriam para a Igreja assim como iriam
para o templo de Júpiter, de Apolo, ou fazer o culto de Mitra, de Ísis, etc. Mas a
Igreja tinha a ideia de que não há salvação fora da Igreja Católica. Então o
arianismo era uma perigosa concessão ao paganismo, e foi combatido pela
Igreja e suprimido dentro das fronteiras do Império Romano. Então os bárbaros
no começo, eles eram arianos e iam para a Igreja Católica, não combatiam ela,
mas também faziam outros ritos pagãos.

Em 409 junto com os alamanos, os vândalos cruzam os Pirineus, mas


são impedidos de criar assentamentos estáveis. Em 417 os vândalos são
pesadamente derrotados pelos visigodos, e em 422 as autoridades romanos
derrotam os vândalos na Hispânia. Em 428 Gunderico morre em batalha e foi
sucedido por Genserico, que assume como rei dos vândalos e dos alamanos.
Genserico se une a Teodorico e Clóvis, os maiores de todos os líderes
bárbaros, transformam os vândalos de uma nação menor e moribunda, para a
grande potência naval no Mediterrâneo. Em 429, Bonifácio o governador da
África convida Genserico para ajudar numa revolta contra o imperador. Depois
Bonifácio muda de ideia, mas 80.000 vândalos e alamanos já tinham cruzado o
estreito de Gilbratar. Em 430 eles tomam Hipona, onde São Agostinho era
bispo, e ele morre durante o cerco. Lá eles estabeleceram a capital de seu
novo reino. Em 435, Genserico faz um tratado com o imperador em Ravena e
lhe é dado o controle de todos os territórios da metade ocidental da África. Em
439, Genserico quebra o tratado e invade Cartago, que estava completamente
indefesa, e a maioria das pessoas estava num antiteatro, e toma a cidade. Ele
ainda completa tomando a Sicília, Sardenha, Córsega, Malta, e outras ilhas
pequenas do Mediterrâneo Ocidental.
Segundo Henri Pirenne, os bárbaros não fizeram nada para pertubar os
fundamentos da civilização antiga no sentido cultural e econômico. E ele
conclui que os bárbaros eram minoria onde eles invadiam, tirando a Inglaterra,
o que não impacta na linguagem. Eles assimilam a cultura das áreas
conquistadas, e também são assimilados. E as conquistas islâmicas no século
VII, que é quando o comércio no Mediterrâneo é fechado e o relógio histórico é
resetado, e tem um impacto muito pior do que o Império Ocidental se
fragmentar em reinos bárbaros. O padrão de vida de quase todas as pessoas
ficou na mesma com as invasões, inclusive melhorando um pouco com o
feudalismo e os impostos bem menores do que os do Império.

Nós temos duas fontes principais que descrevem os vândalos. Uma


delas é Procópio de Cesareia (500-565), o secretário jurídico de Belisário, que
escreveu a história da reconquista da África e da Itália, e Victorino de Vitter,
que é um bispo católico. Ambos não gostam dos vândalos, Procópio porque ele
é bizantino, e Victorino porque não gosta dos arianos. Eles falam que os
vândalos perseguiram severamente os cristãos católicos do norte da África,
diferentemente do que aconteceu na França dos francos, na Itália dos
ostrogodos. Mas o quanto essa descrição é verdade, ou apenas exagero do
lado dos vencedores?

Bom, os vândalos provavelmente construiram a sua frota baseando nos


conhecimentos dos nativos da Hispânia e do norte da África, que eram mais
acostumados com assuntos navais. Assim como, em 717, quando os árabes
muçulmanos sitiam Constantinopla, eles usam remadores egípcios para sua
marinha, e como os egípcios eram cristãos, eles deserdam para o lado
bizantino. Quando você usa mercenários, há um limite do que você pode fazer
com eles. Genserico parece ter total controle da sua marinha, então
provavelmente ele tinha lealdade completa e um grau de cooperação entre os
nativos romanos e os vândalos. Além disso, quando Belisário invade o reino
vândalo em 535, os bizantinos não são recebidos sempre como os libertadores
de um governo tirânico dos vândalos. Teve um momento que Belisário teve que
pegar um nobre romano chamado Laurus e empalá-lo em público, porque
grande parte da classe latifundiária romana, estava perfeitamente feliz em
continuar do lado dos vândalos. E ainda tinha um número considerável de
casamentos mistos entre vândalos e as elites romanas, e os vândalos
passaram a usar as roupas romanas porque estavam em um lugar mais quente
do que sua terra natal, e não há evidência da língua vândala em qualqer
inscrição ou na limitada literatura do norte da África.

Há uma história de que o imperador fantoche Majoriano queria resolver


as coisas com Genserico e quer resolver pessoalmente, mas ele se disfarça,
porque ele tinha cabelo loiro, ou seja, parecia um germânico.

E ainda parece que o período vândalo foi de considerável prosperidade


e paz. A vantagem de estar sob o comando de um rei bárbaro, é que ele na
maioria das vezes vai cobrar bem menos impostos do que o Império Romano
unificado. Além disso, os impostos que ele coleta vão ser gastos quase sempre
localmente, e quando Genserico assume o norte da África, de repente, todos
os impostos coletados lá eram gastos lá. Genserico foi rei por 40 anos, e não
teve nenhuma rebelião orquestrada por seus súditos romanos. Sua marinha
deve ter sido predominantemente composta por romanos. Há alguma evidência
de fabricação e exportação de cerâmica em grande escala, há algumas
evidências de vilas luxuosas sendo construídas. Além disso, não precisava
mais mandar um terço ou um quarto dos grãos produzidos para Roma.
Genserico retomou os embarques de grãos em um tratado em 442, mas por
um preço.

Sobre as perseguições, Victorino de Vitter, fala que elas foram


acontecendo ano após ano e que foram violentas. No entanto, se Genserico
quisesse ele poderia acabar com todas as Igrejas Católicas e padres do norte
da África em 18 meses. Não podemos descartar totalmente a hipótese que
houve perseguição, mas é improvável por este motivo. Genserico mandou
confiscar todas as igrejas, que foram entregues aos arianos, e os bispos
católicos eram expulsos do país.

Em 455, o imperador Valentiniano III morre assassinado, e o usurpador


se casa com sua irmã Licínia Eudóxia, e força sua filha e se casar com seu
filho. Eudóxia apela para Genserico para pedir ajuda, e fala que uma de suas
filhas já foi prometida a um dos filhos de Genserico. Genserico transporta um
grande exército até a Itália, marcha até Roma, e o papa Leão Magno,
novamente impede que Roma seja destruída convencendo Genserico, que fala
que não queria destruir a cidade, queria ir atrás do usurpador. Mas Genserico
saqueia a cidade em 455 e pega tudo que é de ouro e valioso, até a arca da
aliança, que tinha sido retirada de Roma pelo imperador Tito. Genserico leva a
família imperial sobrevivente de volta a Cartago, casa a sobrinha do imperador
com seu filho, e manda o resto da família imperial para Constantinopla.

Genserico irrita bastante os imperadores do Ocidente e Oriente, e em


460, o imperador Majoriano, o último imperador eficiente do Ocidente, pega
uma frota na Hispânia para invadir a África. Genserico lança um ataque
preventivo e queima toda a frota romana e assim acaba as rixas. Majoriano não
tem mais dinheiro para tentar fazer nada, e desiste da reconquista. Em 468 há
um ataque coordenado pelos dois impérios contra Genserico, com o oriente
enviando 1113 navios, e 100.000 homens, e desembarcam em Trípoli.
Genserico espera, e no momento certo ele ataca com navios de guerra e
destrói toda a frota invasora, e persegue os sobreviventes de volta ao Império,
chegando até o Peloponeso, e leva 500 cidadãos como prisioneiros. No meio
de caminho de volta até Cartago ele fica enjoado e mata os prisioneiros, corta
eles em pedaçinhos e joga no mar, e celebra sua grande vitória em Cartago.
Em 476 há um reconhecimento formal de paz com Constantinopla. Genserico
morre no ano seguinte, e assume seu filho Hunerico.

Hunerico governa até 484, que mistura uma política de tolerância com
uma de perseguição aos católicos. Até 482 ele tolera, mas começa a perseguir
por temor a Constantinopla, proibindo o culto católico e expulsando boa parte
do clero, com muitos sendo torturados ou tiveram a língua cortada. Foi por
causa dessa perseguição que surgiu o termo vandalismo. De 484 até 496,
reina Guntamundo que buscou a paz com os católicos e acabou com a
perseguição mais uma vez. Durante seu reinado os vândalos vão perder a
Sicília para os Ostrogodos. De 496 até 523 reina Trasamundo, que devido o
seu fanatismo ariano, volta a perseguir os católicos, mas se limita a
perseguições sem derramamento de sangue. No entanto, ele incentivou
debates teológicos entre arianos e trinitários e quem se destacou foi Fulgêncio
de Ruspe (460-533), pela defesa da Santíssima Trindade. Seu sucessor,
Hilderico, que governou até 530, foi o mais tolerante de todos, e os sínodos
católicos foram mais uma vez realizados no Norte da África. Ele era sobrinho
de Valentiniano III, mas ele tinha pouco interesse em guerra, e deixou isso a
um membro de sua família, Hoamero. Quando Hoamero sofreu uma derrota
contra os mouros, a facção ariana dentro da família real liderou uma revolta,
erguendo a bandeira do arianismo nacional, e seu primo Gelimero. Gelimero é
o último rei vândalo, reinado até 533. O imperador Justiniano declarou guerra
com a intenção de colocar Hilderico de volta no trono.

Enquanto uma expedição de Justiniano estava em curso, uma grande


parte do exército e marinha vândala foi liderada por Tzazo, irmão de Gelimero,
para a Sardenha para lidar com uma rebelião liderada pelo nobre godo Godas.
Com isso, os exército bizantinos comandados por Belisário aproveitaram a
situação e desembarcaram sem oposição 16 km de Cartago. Gelimero
rapidamente montou um exército, e encontrou Belisário na batalha de Ad
Decimum, onde os vândalos estavam vencendo a batalha, mas Amatas e
Gibamundo, respectivamente irmão e sobrinho de Gelimero, caírem em
batalha. Gelimero então perdeu a coragem e fugiu, e Belisário rapidamente
tomou Cartago enquanto os vândalos sobreviventes ainda lutavam. Em 15 de
dezembro de 533, Gelimero e Belisário novamente se enfrentaram na batalha
de Tricamaro, a cerca de 32 km de Cartago. Novamente os vândalos lutaram
bem mas quebraram, desta vez quando Tzazo caiu em batalha. Belisário
rapidamente avançou para Hipona, segunda cidade do Reino Vândalo, e em
534 Gelimero, sitiado no monte Pápua pelo general hérulo Faras, rendeu-se
para os bizantinos, encerrando o reino dos vândalos.

O reino se tornou uma província do Império Bizantino, e os vândalos


foram expulsos. Muitos deles fugiram para Saldas, onde se integraram com os
bérberes, e outros foram colocados em serviço imperial, ou fugiram para o
reino visigótico e ostrogótico. Os melhores guerreiros vândalos foram
colocados em cinco regimentos de cavalaria, conhecidos como Vândalos
Justinianos (Vandali Iustiniani), e foram estacionados na fronteira persa. Alguns
entraram no serviço privado de Belisário. O próprio Gelimero foi tratado
honoravelmente e recebeu grandes propriedades na Galácia onde viveu até a
velhice. Foi também oferecido o posto de patrício mas ele recusou porque não
estava disposto a mudar sua fé ariana.
(figura retratando Genserico, rei vândalo)

Depois disso, a África vai continuar rica, e vai ser uma das regiões bizantinas
mais ricas, e com uma alta cultura, experimentando até um renascimento com
a patrística. Cartago vai cair para os muçulmanos em 698, dando fim a era
romana e cristã em todo o norte da África.
Visigodos na Espanha (418-711)
O reino visigótico foi formado em 411, ocupando quase toda a Espanha
e o sudoeste da França. No entanto, em 507 na batalha de Vouillé, Clóvis
derrotou os visigodos, matando Alarico II e conquistando as posseções na
França. Sob o governo de Leovigildo, a capital foi estabelecida em Toledo, e
ele subjulgou o reino do Suevos em 585, que já eram católicos desde 550.
Hermenegildo (564-585) foi o primeiro rei a se tornar católico, mas ele foi
derrotado em 584 e morto em 585. Em 587, Recaredo I tornou o credo nicênico
a religião oficial do reino.

A monarquia visigótica era muito instável, visto que o fraticídio era


relativamente comum, e dos 34 reis visigóticos, apenas 15 morreram em
campo de batalha ou de morto natural, com os outros sendo assassinados. O
arcebispo de Toledo se tornou a segunda pessoa mais importante do reino, e o
personagem mais icônico deste período e Santo Isidoro de Sevilha (560-636).
O concílio mais importante foi o Concílio de Toledo em 633, que apoiou
Sisenando, que tinha usurpado o trono do rei Suintila, e Isidoro o ungiu como
rei e excomungou e exilou Suintila. O Concílio também reforçava que os judeus
não deveriam ser forçados a ser converter, e os já convertidos não podiam
voltar ao judaísmo.

As novas leis foram aplicadas tanto às populações góticas como às


hispânicas que estavam sujeitas a diferentes leis no passado, e substituíram
todos os códigos de direito antigos. Entre as leis antigas eliminadas estavas as
leis severas contra os judeus. O Código Visigótico mostrou que o velho sistema
de divisões militares e civis na administração estava mudando,
e duques (duces provinciae) e condes (comes civitatis) começaram a receber
mais responsabilidades fora de seus deveres civis e militares originais. Os
servos ou escravos do rei tornaram-se muito proeminentes na burocracia e
exerceram amplos poderes administrativos. Com os códigos de direito
visigótico, mulheres poderiam herdar terra e título e administrá-la
independentemente de seus maridos ou parentes masculinos, dispor de
propriedade em testamentos levais, e podiam representar-se e testemunhar em
tribunal aos 14 anos e organizar seus próprios casamentos aos 20.

Os reinados de Quindasvinto e seu filho Recesvinto (r. 553–572) viu a


compilação do mais importante livro do direito, o Código Visigótico (Liber
Iudiciorum), que foi concluído em 654. O código incluiu leis antigas de reis
passados, tais como Alarico II em seu Breviário, e Leovigildo, mas muitas
também foram leis novas. O código foi baseado quase inteiramente no  direito
romano, com alguma influência do direito germânico em raros casos.
Quindasvinto fortaleceu a monarquia em detrimento da nobreza, executou
cerca de 700 nobres, exilou outros, forçou dignitários a jurar, e no Sétimo
Concílio de Toledo afirmou seu direito de excomungar clérigos que atuaram
contra o governo. Ele também foi capaz de manobrar seu filho Recesvinto ao
trono, o que provocou uma rebelião da nobreza gótica que aliou-se com os
bascos, que acabou debelada. Recesvinto realizou outro concílio de Toledo,
que reduziu sentenças de traição e afirmou o poder dos concílios para eleger
reis.
A coroa já estava enfraquecida com as lutas intestinas da nobreza. Em
711, Tárique, um berbere muçulmano cliente de Muça ibne Noçáir, o
governador da Ifríquia, invadiu a Hispânia com cerca de 7 000 homens,
enquanto Rodrigo estava no norte lutando com os bascos. Historiadores
muçulmanos, tais como ibne Caldune, contam a lenda de um nobre ibérico
baseado no Norte da África, Juliano, que pediu a ajuda de Tárique, um líder
militar muçulmano no Norte da África, para derrubar Rodrigo. Além de ser um
tirano opressivo, Rodrigo havia sequestrado e estuprado a filha de Juliano. Tal
história, no entanto, presumidamente alude ao grupo opositor do rei, que teria
feito acordo com os futuros conquistadores para ajudar em sua derrubada. Ao
final de julho, uma batalha ocorreu no rio Guadalete na província de Cádis.
Rodrigo foi traído por suas tropas, que apoiaram seus inimigos, e o rei foi morto
em batalha. Os muçulmanos então tomaram muito do sul da Hispânia com
pouca resistência, e continuaram para capturar Toledo, onde eles executaram
vários nobres visigóticos. Em 712, Muça, o governador de Ifríquia, chegou com
outro exército de 18 000 homens com grandes contingentes árabes. Ele tomou
Mérida em 713 e invadiu o norte, tomando Saragoça e Leão, que estava ainda
sob Ardão, em 714.

Após ser chamado de volta pelo califa, Muça deixou seu filho Abdalazize
ibne Muça no comando. Cerca de 716, muito da Península Ibérica estava sob
comando islâmico, com a Gália Narbonense tomada entre 721 e 725. A única
resistência efetiva foi nas Astúrias, onde um nobre visigótico chamado Pelágio
revoltou-se em 718, aliado com os bascos e derrotou os muçulmanos
na Batalha de Covadonga. A resistência também continuou em regiões ao
redor dos Pireneus e as regiões montanhosas do norte da Hispânia, onde os
muçulmanos estavam desinteressados em mantar a autoridade. Os berberes
se estabeleceram no sul de Meseta Central, em Castela. Inicialmente, os
muçulmanos geralmente deixaram os cristãos sozinhos para praticar a religião
deles, embora não-muçulmanos fossem sujeitos a lei islâmica e foram tratados
como cidadãos de segunda classe.
Os anglo-saxões na Inglaterra (410-1066)

(Os sete reinos anglo-saxões em 800)

A Britânia sempre foi a mais estranha das províncias romanas. Foi a


última província romana a ser conquistada, nunca teve muita população, e
quase não sabemos o que aconteceu lá. Temos um pouco dos relatos de
Tácito, que falam da conquista do norte da Inglaterra e da Escócia, ou da
revolta de Boadiceia, a rainha celta, e alguns imperadores do século III
ocasionalmente se referem à Britânia. Em 358, três bispos britânicos
comparacem no concílio de Rimini, mas mesmo assim não sabemos muito
sobre a Britânia romana. Poucas fontes sobreviveram e ainda poucas fontes
literárias foram sequer produzidas. E depois da chegada dos anglo-saxões, o
ambiente construído da britânia romana foi ou destruído ou caiu em ruínas.
Cidades como Londínio e York eram grandes, mas não sabemos o quanto. Os
romanos tomaram a Britânia simplesmente para impedir que alguém ficasse
com as costas de Kent, Sussex e Essex, para que não possa atacara a Gália
facilmente.

Mais tarde, depois da Segunda Guerra Mundial, mudamos para uma


visão melhor da Britânia romana, que mostra que um lugar relativamente
próspero e tranquilo. As primeiras incursões romanas na Grã-Bretanha foram
feitas por Júlio César em 55 e 54 a.C., mas ele não conquista nada. Em 43
d.C., o imperador Cláudio começa a conquista da Britânia, e 61 tem a revolta
da rainha dos icenos Boacideia, em 71 o norte da Inglaterra é conquistado, e
em 78 Wales é conquistada. Em 122 é construída a muralha de Adriano, para
impedir que os escoceses invadam o sul. E em 142 é construída a muralha
Antonina mais ao norte. Em 196 o governador Clódio Albino se declara
imperador. Em 212 o imperador Septímio Severo morre em York. Em 250 os
pictos emergem como um novo inimigos que vinha do norte, da Escócia. Em
260 a Britânia se junta ao Império Gálico que se separou de Roma na parte
mais feia da crise do século III, e volta a ser parte de Roma em 273. De 287 a
296 a Britânia foi um império independente durante o reinado de Diocleciano e
a tetrarquia. Em 306, Constantino é declarado imperador em York. Em 358,
três bispos britânicos participam do concílio de Remini. Em 367 a Britânia sofre
uma série de invasões bárbaras coordenadas que causam muito dano à
província. Em 400 e pouco, Estilicão retira as forças da Britânia para mandar
para defender o Reno. Em 410, Honório pede ajuda, e fala para os bretões se
defenderem sozinhos.
(mapa da muralha de Adriano e da muralha Antonina)

Do ano 400 até 550, nós temos muitas poucas fontes sobre o que
aconteceu com a Britânia, então é considerada uma era obscura, uma Era das
Trevas. As fontes que temos são Gildas (500-570), um monge britânico que
escreveu em 530 o On the Ruin of Britain com denúncias retóricas sobre os
vícios que os britânicos tinham, que fez com que os bárbaros conseguissem
invadir o país. Não ajuda. Então temos alguém chamado Nennius, um
historiador britânico do século IX, que escreveu o Historia Brittonum e também
pode descartar, porque foi produzido 400 anos antes do evento, e é cheio de
alegações sem sentido, mas parece ter uma certa quantidade de informações
verdadeiras. Então você tem Beda, o Venerável (673-735), que escreveu o
História Eclesiástica do Povo Inglês, a grande obra de história produzida na
Idade Média, que realmente merece o título de história. É uma obra escrita com
muito cuidado, e tem uma agenda que exige a supressão silenciosa de uma
grande quantidade de informações muito importantes. Você tem referências
dispersas em grego, latim e línguas galêgas. Procópio de Cesareia menciona a
Britânia, mas de forma muito ambígua.

Não é que Gildas não seja um historiador confiável, é que ele não é um
historiador, e não estava querendo noticiar as coisas, apenas ficava apontando
os vícios dos britânicos. Beda é o mais confiável, mas ele trata o povo inglês
como se fosse o povo escolhido por Deus, para deslocar os habitantes
aborínges da Grã-Bretanha, porque eles se tornaram corruptos. Beda descreve
a colonização dos anglo-saxões em três etapas. A primeira é a fase de
exploração, quando mercenários saqueiam tudo. Quando Honório fala que não
consegue ajudar os britânicos, provavelmente os britânicos levantaram um
exército deles mesmos. Mas na real eles contrataram mercenários bárbaros, e
olharam para a região com interesse. Então você tem a fase de migração, e a
fase de estabelecimento, onde os anglo-saxões começaram a controlar áreas.

No final do século IV, o livro Notitia Dignitatum menciona “Contagem da


costa saxônica”, que sugere que a Britânia estava sendo atacada por bárbaros
da Germânia e da Escandinávia. Depois de 410, os saxões são empregados
pelos governantes de uma Britânia desmilitarizada, para os defenderem. Há
alguma evidência de um identidade celta re-emergente no século V, onde
parece que o rei da Cornualha e de Devon, se chamavam Rex Dumnoniorum.
Mas isso é especulação. O que podemos dizer com certeza é que a
administração central romana cai e é substituída por uma colcha de retalhos de
reinos nativos, chamados algumas vezes de Reinos Britônicos. Há evidências
de obras de construção em Cirencester, Wroxeter, Carlisle, e evidências de
novos canos de água e banhos em St Albans. E quando os anglos, os saxões e
os jutos vão migrar para a Britânia, eles vão empurrando esses bretões para o
oeste até eles ficarem só com Wales e Cornwall, e formando seus próprios
reinos.
(Migrações dos anglo-saxões no século V)

Quando os anglo-saxões vieram para a Britânia, parece que eles


começaram um processo bem sucedido de limpeza étnica e genocídio, ou eles
eram uma minoria, mas dominante. Segundo o Instituto Max Planck na
Alemanha, a evidência genética, a população moderna da Inglaterra é de cerca
de 25 a 40% anglo-saxã. As evidências parecem nos mostrar que houve uma
imigração muito substancial. Ao mesmo tempo, boa parte da ascendência
moderna inglesa, tem continuidade com o passado pré-bárbaro. O que
provavelmente aconteceu é que houve sim limpeza étnica, houve assassinatos
em massa, mas também houve muitos casamentos mistos e forçados, porque
muitas vezes os anglo-saxões estupravam mulheres celtas jovens. Então
provavelmente houve um pouco de cada, no entanto a grande declínio
populacional foi causado pela Praga de Justiniano que assolou toda a Europa
de 541 a 750, com maior incidência entre 541 e 544 no Império Bizantino e
entre 541 e 560. Para se ter uma ideia, a população da Inglaterra romana em
390 era de 3,2 milhões de pessoas. Em 540, um ano antes da Praga de
Justiniano, a população da Inglaterra era de 2,6 milhões, ou seja, o decréssimo
populacional foi de 19% ao longo de 150 anos, o que não é muito grande, visto
que muito disso é da imigração dos celtas romanizados da ilha para a
Normandia na França. Mas apenas em 10 anos, entre 541 e 551, a população
da Inglaterra vai cair para 1,4 milhão e vai continuar caindo até o ano 700 e só
vai voltar a crescer em 770. Vale lembrar que em 541 apenas existia o reino de
Kent com outros quatro reinos britônicos pequenos como vassalos, o reino de
Wessex bem menor e com um vassalo, o pequeno reino de Lindsay, e o
pequeno reino de Iclingas, com boa parte da Inglaterra ainda era formada
desses reinos britônicos. Desses reinos britônicos os mais importantes eram o
de Venedócia (Gwynedd) no País de Gales, que permaneceu intacto e
independente de 410 até 1216, e o reino da Dumnônia, que permaneceu
intacto de 410 até 528, sendo atacado por Wessex, mas só sendo anexado em
711. Apenas em 1333 que a população da Inglaterra vai voltar a ter 3 milhões
de habitantes.

O primeiro reino foi o de Kent, fundado pelos Jutos em 455, no extremo


sudeste da Inglaterra. Em 477 é fundado Sussex (saxões do sul); em 480 é
fundado o reino de Lindsay pelos anglos, que mais tarde seria absorvido pela
Nortúmbia; em 519 é fudando Wessex (saxões do oeste); em 520 é fundado o
reino de Iclingas por Icel, um possível primeiro rei da Mércia; na Escócia os
pictos vão fundar seu reino em 553; em 559 é formado o reino da Bernícia e de
Deira, mais ao norte onde será a Nortúmbria; em 561 Essex (saxões do leste)
se torna independente dos domínios de Kent; em 571 é fundada a Ânglia
Oriental pelos anglos entre o reino de Lindsay e Essex; e em 606 Ceorl é
coroado como o primeiro rei da Mércia. O reino de Deira se expandiu até
conquistar os pequenos reinos britônicos em volta, assim como o reino da
Bernícia até formar o reino da Nortúmbria em 655. E Wessex, Sussex, Essex,
Kent, Mércia, Ânglia Oriental e Nortúmbria são os sete reinos anglo-saxões que
inclusive inspiraram os sete reinos da série e livro Game of Thrones.
Desses reinos, os que mais brigavam era Nortúmbria e a Mércia, com a
Nortúmbria dominando a Mércia em 655 até 657, e em 731 a Mércia conquista
a Ânglia Oriental e Essex, e dois anos depois Wessex. Wessex voltaria a ser
independente em 753, e Kent seria anexado à Mércia em 764 e Sussex em
771. Em 779 a Mércia conquista Wessex, Kent volta a ser independente em
776, mas é novamente anexado em 786. A Ânglia Oriental voltaria a ser
independente em 793, apenas para ser reanexada em 796, mesmo ano em
que Kent voltou a ser independente apenas por mais 2 anos. Wessex volta a
ser independente em 802, e Kent e seus vassalos Essex e Sussex e mais outro
voltariam a ser independentes em 826. A Ânglia Oriental seria mais uma vez
independente em 828. Em 839, Wessex anexa Kent e seus vassalos, e os
anexa formalmente em 860.

Em 400 a maioria da população da Britânia falava celta, porque latim era


só a língua da elite. Em 700, a maioria das pessoas no antigo território do
Império Ocidental falava latim. Enquanto que na Britânia, em 700, a maioria
das pessoas falavam o inglês primitivo.

Antes de Agostinho de Cantebury vir para a Inglaterra a mando do papa


Gregório Magno, e converter Aethelbert de Kent em 597, a Inglaterra era um
deserto uivante de paganismo. Os celtas que viviam antes dos saxões já eram
católicos, provavelmente desde o século III, só que eles vão sendo cada vez
mais pressionados para o oeste. Em 604, o rei Seberto (Saebehrt) de Essex se
converte e constrói uma igreja em Londres. Em 605, o rei de Redualdo
(Redwald) da Ânglia Oriental se converte ao catolicismo, mas parece que
depois abandonou a religião e ele pode ser o rei pagão enterrado em Sutton
Hoo. Em 627, o rei Eduíno da Nortúmbria é batizado sob a influência de sua
esposa católica. Em 688, Caedwalla de Wessex (659-989) visita Roma para ser
batizado pelo papa. Em 704, Aethelred se retira para um monastério. Em 709,
Coenred da Mércia se retira para um monastério em Roma. De 660 até 796 vai
ser a Idade de Ouro da Inglaterra, com o monasticismo, com o florescimento de
várias escolas e monastérios.

Os evangelhos de Lindisfarne são produzidos em cerca de 698, para


marcar a exumação de Cuthbert como um santo. Eles mostram as conquistas
culturais impressionantes para a Igreja Inglesa, colocando no contexto a
conquista de Beda, e também ilustra a natureza especial da Inglaterra como
nação legitimada pela fé cristã.

(Mateus Evangelista)
(O fólio 27r dos Evangelhos de Lindisfarne contém o incipit do Evangelho de
Mateus)

Sabe aquele mito que seu professor comunista falava, de que na Idade
Média não tinha limpeza nenhuma e por isso que a peste negra matou tanta
gente, enquanto o Império Romano tinha as suas famosas termas públicas?
Mais uma mentira para denegrir a Idade Média, a qual eu chamo de Idade da
Luz. Tomar banho na Inglaterra era bastante comum até 1520, e havia uma
gigantesca doença da transpiração, que parece ter matado um terço da
população. Uma das formas de controlar a doença do suor, era fechar todas as
casas de banhos públicas, e as pessoas passaram a ser bem mais sujas.

Abaixo podemos ver um retrato de como era Londres na era anglo-saxã,


de 770 até 950.

Possivelmente Londres foi abandonada em 500, ou não. Na década de


550 é incorporada ao reino de Essex. Em cerca de 600, tem o primeiro
assentamento anglo-saxão Covent Garden, e em 603 Essex se converte ao
catolicismo, e Londres recebe Mellitus o primeiro bispo de Londres após a
queda de Roma, e constrói a Basílica de São Paulo no local do Templo de
Diana. Em 675, após um grande tumulto, o bispado é dado estabelecimento
permanente quando Teodoro de Tarso instala Earconwald. Em cercade 730,
Londres se chama Lundenwic, e era descrita por Beda como um centro de
comércio para muitas nações que visitam por terra e por mar. Em 796, Londres
vai ser disputada entre a Mércia e Wessex. E em 978, Londres se torna a
capital do novo estado unificado, a Inglaterra. Em 200, Londres tinha cerca de
60.000 habitantes, e em 400, cerca de 500, e em 500, Londres vai ser
abandonada. Em 700, a alguns metros da Londres original, a Lundenwic anglo-
saxã tinha cerca de 3000 habitantes. Em 900, a parte da cidade que era
romana volta a ser habitada, e junto com a parte medieval, Londres tinha 7000
habitantes. Em 1100 tinha cerca de 15.000 habitantes, e em 1346, pouco antes
da peste negra chegar na Inglaterra, Londres tinha 70.000 habintates. Após o
desastre da peste negra, Londres vai voltar a ter 50.000 e depois 30.000, mas
não necessariamente tudo isso de gente morreu, já que muitos também saiam
da cidade. Em 1453, último ano da Idade Média, Londres tinha 75.000
habitantes. As cidades mais importantes dessa época vamos começar a ficar
maiores em 800, e são Wintancaester e Londres em Wessex, Tamworth e
Lincoln na Mércia, Thetfort na Ânglia Oriental, e Eoforwic (futura York) na
Nortúmbria.

Em 1939, nas escavações de Sutton Hoo, enterradas em Suffolk, foi


encontrado alguns artefatos de qualidade e quantidade nunca antes vistos. A
coleção de 263 objetos incluindo armas, talheres de prata, fivelas de ouro,
moedas, e um capacete integral, de um tipo nunca recuperado na Britânia.
Também incluia objetos da Itália e do Império Bizantino, e possivelmente era a
tumba de Redualdo da Ânglia Oriental, que se converteu ao catolicismo, mas
parece ter abandonado a religião e voltado a ser pagão. Alguns afirmam que o
elmo na real não era anglo-saxão e que vinha da Escandinávia, e que já tinha
uns 150 anos quando foi enterrado.
(O elmo de Sutton Hoo é um elmo anglo-saxão decorado descoberto durante a
escavação de 1939 no funeral do navio Sutton Hoo.)
(armaduras típicas anglo-saxãs)

Apesar das cidades na Europa Ocidental em geral decaírem bastante e


perderam boa parte de sua população, a maioria da população que você
encontrasse vivendo no campo e nos feudos, estaria com um padrão de vida
um pouco melhor do que nos últimos 200 anos da época romana. E os
bárbaros como já demonstramos várias vezes não era selvagens, eles tinham
leis, literatura, literatura escrita, padrões de educação muito bons para época, e
uma riqueza que não é totalmente desprezível para sua época. Novas cidades
vão surgir, e a população vai ficar mais distribuída nessas cidades e no campo.

(Inglaterra em 650)
(cidade de York em 1060, no final da era anglo-saxã)

No período anglo saxão (455-1066) as relações sociais eram reguladas


pelos costumes locais, aplicados pelas County Courts ou Hundred Courts,
tribunais regionais mantidos pelo High Sheriff ou administrador principal de
cada condado. Posteriormente, houve um desenvolvimento e aprimoramento
das funções judiciais com as jurisdições senhoriais, exercidas por tribunais
descentralizados do período feudal, a exemplo das Courts Baron, da Court Leet
e das Manorial Courts, instituídas para atribuições materiais específicas.

Podemos dizer que o período bárbaro da Europa vai de 400 até 800. A
partir de 400 os bárbaros entram no Império e começam a estabelecer seus
reinos que vão se completar por volta da metade do século V. Uma vez que o
Império Ocidental terminou de cair, os reinos bárbaros vão ter uma certa
ascenção, um ápice e depois vão cair. O reino burgúndio vai ser conquistado
pelos francos em 535, um ano antes o reino vândalo é conquistado pelo
Império Bizantino, o reino de Odoacro é conquistado pelos ostrogodos em 493,
e o reino Ostrogótico vai ser conquistado pelos bizantinos em 553. Os anglo-
saxões vão pressionando os celtas cristãos para o oeste na Inglaterra, até 838,
quando os celtas são conquistados e formam os estados Welsh e Strathclyde.

Em 568 chega à Europa o Grão-Canato Avar, e começa uma nova série


de invasões bárbaros, onde eles começam a guerrear com os bizantinos, na
mesma regiao que os hunos chegaram. No mesmo ano é formado o reino
lombardo no norte da Itália, e se espalha para algumas regiões do centro da
Itália. Em 585, o reino visigótico conquista o reino suevo. Em 711, o califado
Rashidun invade a península ibérica e conquista todo o reino visigótico em 9
anos. A única resistência cristã é um pequeno reino no norte da Espanha, o
reino das Astúrias. Em 740 começa a reconquista pelo reino das Astúrias. O
califado Rashidun invade parte da Aquitânia (sudoeste da França), mas é
parado finalmente em 733 na batalha de Poitiers, por Carlos Martel. Em 774,
Carlos Magno começa a expansão do Império Carolíngio (franco), e conquista
o reino lombardo. Bulgária vai anexar o Grão-Canato Avar em 804-806,
formando o Primeiro Império Búlgaro. Carlos Magno atinge o auge do seu reino
onde toda a Europa Central estava sob seu reino (Boêmia, Morávia, Marcha
Panonia, Croácia, etc). Ele é coroado sacro imperador em 800.

Aqui acaba um ciclo civilizacional, e começa outro. Os bárbaros


formaram seus reinos, muitas vezes brigavam entre si e anexavam outros
bárbaros, como os francos anexando os burgúndios e depois os lombardos. Ou
foram conquistados pelo Império Bizantino, como os vândalos e ostrogodos.
Quando o reino visigótico é conquistado em 711 pelos muçulmanos liderados
por Abdalazize ibne Muça ibne Noçáir, que fundou o califado de Al-Ândaluz, a
coisa muda de natureza. Agora a ameaça é bem maior, porque o califado
Rashidun conquistou todo o norte da África, Síria, Pérsia, Espanha, e está
batendo nas portas dos francos e dos bizantinos. E quando Carlos Magno é
coroado Sacro Imperador no natal de 800, pelo papa Leão III, agora não é mais
romano contra bárbaro, ou bárbaro contra outros bárbaros. A cultura romana e
bárbara foi misturada completamente ao longo desses 300 anos, e não há mais
como definir cada uma, porque surgiu uma nova cultura, vinda da mistura da
cultura romana, germânica e com o Catolicismo. Agora a maior ameaça é o
Islã, e agora a guerra é Católicos contra Muçulmanos, agora é Guerra Santa.
Os lombardos na Itália (558-774)

A principal fonte que temos sobre os lombardos é Paulo, o diácono, que


escreveu o “História dos Lombardos” em 790. Os lombardos começaram como
um tribo chamada Winnili que veio da Escandinávia em cerca do ano 150.
Nessa época eles encontram os vândalos, que estavam um número maior,
exigiram tributos deles. E os lombardos disseram: “Melhor morrer livre e
armado do que viver como escravos tributários”. Na mitologia deles, Odin
ficaria a favor de quem aparece primeiro na janela de seu palácia na
madrugada. Odin ao ver um monte de lombardos do lado de fora, e lhes dá a
vitória. Então os Winnili mudam de nome para Langobardi, que é uma versão
latinizada do qualquer coisa que longa barba significa em lombardo. E Narses
que comandou a Itália depois da conquista bizantina, ele convida os lombardos
para o território.

Em 568, sob o comando do rei lombardo Alboíno, os lombardos entram


na Itália, ajudados pelo que sobrou das forças ostrogóticas. As forças
bizantinas não tem condição de repelir o ataque, e então, os lombardos
conquistam parte do território da Itália, e uma faixa no centro e no sul fica com
os bizantinos, conforme o mapa da página anterior. Os bizantinos conseguem
manter Roma e Ravena. Os lombardos e os moradores da região parecem ter
chegado a um acordo, mesmo que um acordo tácito. Eles vieram como
saqueadores, mas ficaram como conquistadores e permaneceram como
governantes. Apesar disso, eles tiveram um período de saques, estupros e
assassinatos, antes de se estabeleceram como um governo, que os italianos
preferiam, ao invés dos bizantinos.

Alboíno era um grande líder militar e alguém que ajudou a integrar os


lombardos para um vida italiana. Mas ele ainda tem alguns costumes
questionáveis, como o fato de ter espancado seu sogro em uma batalha até a
morte, e tinha o crânio dele como um copo. Quando ele estava bêbado, ou
seja, quase sempre, ele oferecia esse crânia para sua esposa beber nele. Um
dia, sua esposa Rosamunda se cansou de ser humilhada e decide se livrar
dele. Ela começa uma conspiração com o escudeiro do rei e seu irmão adotivo,
e eles precisam da ajuda de um homem chamado Perédio, que um dos
principais líderes militares, mas este não se envolvia nesses assuntos. Então
Rosamunda descobre que Perédio estava tendo um caso com a camareira da
rainha, e uma noite, Rosamunda manda a camareira cuidar de outros negócios,
e foi para a cama dela. Então no escuro e com Perédio bêbado, eles fazem
sexo, e quando termina, Rosamunda “acende a luz”, e fala que ele acabou de
cometer adultério com a rainha, e chantageia ele para matar o rei. Rosamunda
costura a espada de Alboíno na cama, para que ele não conseguisse puxá-la, e
quando Perédio chega para matá-lo ele se defende, mas eventualmente é
morto. Rosamunda e Perédio fogem de Pávia, a capital lombarda, e chegam
até Ravena, onde vivem o resto da vida no exílio.
(O rei Lombard Alboin (cerca de 526- 572) força a sua esposa, a princesa tíbia
Rosemonde (falecida em 572); Tancredi Scarpelli)

Nas próximas décadas, os lombardos tiveram uma tendência à


descentralização política e ao localismo, assim como em todo o resto da
Europa feudal. Em 653, os bizantinos liderados por Constante II, partiram de
Ravena e chegaram em Roma, prenderam o papa Martinho I, e o mandaram
como um prisioneiro para o leste. Isso porque o papa está se recusando a fazer
qualquer coisa para ajudar o Império Bizantino a resolver o problema da
heresia monofisita no leste. Em Constantinopla, Martinho é maltratado e depois
morre. Em 663, Constante II, que era odiado pelos bizantinos, muda a capital
para Siracusa, e tenta invadir a Itália, partindo da Sicília. Ele aparece na Itália e
se consulta com um certo eremita, que dizem que tinha habilidades de um
oráculo. Ele pede a Deus para derrotar os lombardos, e o eremita fala que os
lombardos não podem ser derrotados, porque uma certa rainha vinda de outra
província construiu as Igrejas, e João Batista intercede pela nação lombarda.
Constante II invade a Itália com um grande e preparado exército, e perde todas
as batalha contra os lombardos. Mas ele invade Roma e saqueia a cidade mais
impiedosamente do que qualquer outro que tentou, e vai embora.

Os lombardos eram em sua maioria pagãos, e as classes governantes


eram arianos. No entanto, rapidamente o povo lombardo vai se converter
diretamente do paganismo ao catolicismo, e as classes governantes vão largar
o arianismo. Por volta de 650, todos os lombardos já eram católicos. E por volta
do ano 700, eles já eram indistinguíveis de qualquer outro povo da Itália. No
entanto, os lombardos governavam através de autoridades seculares, do que
por meio da Igreja.

Em 751, os lombardos finalmente tomam Ravena, mas depois os reis


lombados brigam com o papa por causa do espólio. É prometido ao papa um
monte de cidades no norte da Itália, e os reis lombardos não cumprem a sua
parte do acordo. Em 754 é fundado os Estados Papais, nos territórios centrais
da Itália, que eram possessões bizantinas. Em 774, o papa Adriano I pede
ajuda à Carlos Magno, rei dos francos, para ajudá-lo contra os lombardos.
Carlos Magno conquista os lombardos no mesmo ano, exceto as partes ao sul
dos Estados Papais, que continuam como o Ducado de Espoleto e o Ducado
de Benevento até a época da Primeira Cruzada (1095-1099), mas não há mais
um reino lombardo unificado.
Reino Franco (481-987)

Os francos eram a tribo que habitava mais ou menos a região da


Holanda e entraram pela primeira vez no Império Romano na forma de
foederatti no extremo norte da Gália, na década de 350, sob a permissão do
imperador Juliano (361-363), curiosamente o último imperador pagão. Ou seja,
os francos não invadiram o Império, e sim foram recrutados, porque eles
pareciam adequados para serviço militar.

Os francos ainda erão pagãos, e não havia um governo centralizado, um


monarquia franca. Eles ainda eram governados por chefes, que vinham de uma
única família, porque os reis também eram sacerdotes. Eles viviam como uma
confederação de tribos, que tinham uma língua e instituições em comum. No
ano 400, eles começam a pressionar o norte da Gália. Por volta de 430, eles
ocupam o rico território agrícola entre Soissons e Cambrai. Em 451, os francos
são uma parte considerável dos soldados que lutam junto ao exército do
general romano Aécio, e vencem Átila o huno na batalha dos Campos
Cataláunicos. Depois que o general Aécio é assassinado por Valentiniano III
em 454, os francos quebram sua lealdade com os romanos. Eles não vão
quase nada até 486, quando vão invadir o reino de Soissons, conquistá-lo, e o
reino franco será proclamado.

Clóvis I (466-511) foi o primeiro rei dos francos, e o homem mais


importante para a história franca, se tornando rei em 481. Clóvis era neto de
um homem chamado Meroveu, e por isso, a dinastia de Clóvis ficou conhecida
como dinastia Merovíngia. Clóvis começa a matar todos os seus parentes do
sexo masculino, ou seja, matando todos os outros chefes tribais dos francos.
Com isso, ele consegue unir todas as tribos francas sob seu comando no final
do século V. Em 486, ele conquista o reino de Soissons, que era a última
resistência romana ocidental, reino este comandado pelo general Siágrio (430-
486). Clóvis então muda a capital do seu reino para Paris. E ele começa a
expandir o que virá se tornar o Império Franco, e de 507 a 511 ele conquista a
Aquitânia, sudoeste da França, que era dos visigodos.

A esposa de Clóvis era Clotilde da Borgonha (474-545) também


conhecida como Santa Clotilde, uma mulher católica muito devota, que tentou
converter seu marido. No entanto, com a morte do primeiro filho deles, e a
morte prematura do segundo, Clóvis achava que o Deus cristão era ineficiente.
Em 496, confrontando os alamanos perto de Colônia, de acordo com um
historiador posterior chamado Gregório de Tours (538-594), Clóvis se volta em
última instância para Cristo, se lhe for garantida a vitória na batalha. E com a
ajuda de outros vice-reis francos ele consegue derrotar os alamanos na batalha
de Tolbiac em 496. Então, com isso, Clóvis é batizado no natal de 496 pelo
bispo Remígio de Reims, sendo o primeiro rei bárbaro a se converter ao
Catolicismo, e o primeiro rei a se converter diretamente do paganismo ao
Catolicismo.
(O batismo de Clóvis por Remígio de Reims)
(representação do rei dos francos Clóvis I)

A significância desse ato é gigantesca, porque agora um grande território


estava sob o comando de um rei católico, com cerca de 5 milhões de pessoas
em 508. A igreja ocidental prega obediência a Clóvis e sucessores como
governantes plenamente legítimos, e a obediência ao imperador em
Constantinopla agora é puramente teorética.

No entanto, os francos eram diferentes dos outros povos germânicos,


porque quando um rei morria, eles dividiam o reino entre os filhos do rei.
Quando Clóvis morre em 511, o reino franco é dividido entre seus filhos
Clodomiro (495-524), Quildeberto I (496-558), Clotário I (497-561),
Teodequilda, e Clotilde (500-531). Gradualmente três reinos separados
emergem dentro do reino franco mais amplo. Os territórios originalmente tribais
se torna a Austrásia. As terras conquistadas na França central por Clóvis, se
tornam a Nêustria. E por fim a Borgonha, que era o reino da Burgúndia,
conquistado em 534 quando Gundemaro é derrotado por Quildeberto I e
Clotário I na batalha de Autun, mas que mantêm sua identidade. Por mais de
dois séculos, esses reinos eram governadores nominalmente governado pelos
descendentes de Clóvis, em várias combinações, como por exemplo quando a
Nêustria e a Burgúndia eram governadas juntas. Ocasionalmente vai ter algum
rei que vai reunificar o reino como Clotário II, que governou de 613 a 629, ou
Dagoberto I, que governou de 629 a 639, Pepino o Breve, que governou de 751
a 768, e Carlos Magno, que governou de 768 a 814, sendo o último que
governou um Império Franco unificado.

Depois da morte de Dagoberto, os reis francos gradualmente perderam


poder para seus próprios subordinados, num padrão similar ao que aconteceu
no Japão no mesmo período, onde era regido pelos shoguns. E é nesse
período após a morte de Dagoberto que há um desenvolvimento notável, onde
o poder de verdade estava na mão do prefeito do palácio, um equivalente a um
primeiro-ministro, que era um cargo hereditário, chamado de Major Domus.
Eles eram inicialmente os mordomos chefes, depois os tutores dos príncipes,
depois os conselheiros de política, e depois o comandante das forças armadas.
Em 687, você tem um prefeito do palácio comandando os três reinos, que é
Pepino, e seu neto, Carlos Martel, em 727 também se torna o prefeito do
palácio. Então no século VIII você tinha a situação estranha de três reinos com
três reis e um prefeito do palácio.

Na economia vamos continuar tendo a cunhagem de moedas, e os reis


francos vão colocar sua efígie na moeda, e ainda haverá comércio entre os
reinos bárbaros. No entanto, a partir do final do século VI, as moedas emitidas
pelos reis merovíngios declinam em valor artístico e em teor de metais
preciosos junto. Há várias casas da moeda em território franco, algumas
controladas pelos reis, e outras eram privadas, e qualquer um podia criar sua
casa da moeda e cunhar moedas de prata.

No entanto, entra um novo inimigo na jogada, desta vez um muito mais


poderoso, e que vai fazer o mundo partir para um novo ciclo civilizacional, o
islã. Em 632, depois da morte de Maomé, surge o califado ortodoxo que vai
conquistar boa parte do Império Bizantino e vai conquistar todo o Império
Persa. De 634 a 635, o califado conquista a Síria, e em 640 e 641 conquista o
Egito, ambos territórios bizantinos. De 637 a 642 os muçulmanos conquistam
toda a Pérsia, e no final do século VII eles vão conquistar todo o norte da África
que era bizantino desde as conquistas de Justiniano em 535. Em 711, os
árabes cruzam o Estreito de Gilbatrar e invade a Espanha que era parte do
decadente reino visigótico.

De 709 a 711 quem era o rei visigótico era Rodrigo (Roderico). Segundo
os muçulmanos, Rodrigo, que se tornara rei por um golpe contra Achilla II, filho
do antigo rei Wittiza, teria estuprado Florinda, filha do conde Julião de Ceuta.
Devido a isso, um dos nobres partidários de Achilla II decidiu cruzar Gibraltar e
pedir apoio a Tariq Ibn Ziyad, para que com os seus homens derrotassem
Rodrigo e restabelecessem a ordem. Então em 710, o chefe berbere Tarif ben
Ziyad, com a conivência de um dignitário visigodo rebelde de nome Julian,
conduz uma força invasora através do Estreito até Tarifa. Em 711 ocorre a
batalha do Guadalete, onde Rodrigo perde para Tariq Ibn Ziyad e todo o reino
visigótico cai nas mãos do califado Omíada. Tariq governava agora a Espanha
e cobrava impostos dos chefes militares visigóticos, que se mantiveram como
governantes das cidades. Mesmo que fosse verdade que os nobres pedissem
ajuda aos muçulmanos, as terras tinham que voltar para as mãos dos
visigodos, e não dos muçulmanos.
De 711 a 714, Tarif ben Ziyad e Musa ibn Nusair, são emires na
Península Ibérica, tirando um pequeno território no norte, chamado reino das
Astúrias, que vai começar a Guerra de Reconquista. De 711 a 756 há a
penetração e instalação de sucessivos grupos bérberes e árabes na península.
Em 712, o general árabe Musa ibn Nusair toma Medina, Sidônia e Sevilha,
além de cercar Mérida, que resiste por muitos meses, rendendo-se, sob pacto,
em junho de 713. Em 713, Musa ibn Nusair instala-se, com a ajuda dos judeus
revoltados, na capital (Toledo), submete também Huelva, Ossónoba (Faro) e
Beja. Os visigodos de Niebla e Beja ocupam Sevilha, mas são dominados por
Abd al-Aziz (filho de Musa ibn Nusair). Em 714, ocorre a segunda campanha de
Musa ibn Nusair: após ter-se reunido com Tarif ben Ziyad em Toledo (aí
passando o inverno de 713–714), toma Burgos, Leão, Astorga, Lugo e talvez
Viseu. Musa retorna a Damasco, cai em desgraça e é substituído pelo seu filho
’Abd al-Aziz (com o título de váli da Hispânia): realiza novas campanhas no
território da Lusitânia — Évora, Santarém e Coimbra. De 714 a 717, Abd al-
Aziz é o emir da Península.

No entanto, eles não param por aqui. Após conquistar a Península


Ibérica, eles cruzam os Pirineus e invadem o reino franco, tomando parte da
Aquitânia e governando com a capital em Narbona. Em 731, os muçulmanos
fazem uma grande invasão comandada por Ab er Rahman, que devasta boa
parte do sudoeste da França. Em 10 de outubro de 732, os muçulmanos são
finalmente vencidos por Carlos Martel na batalha de Poitiers, a batalha que
salvou o Ocidente, e que fez os francos reconquistarem o sul da França. Em
717, os bizantinos tinha conseguido conter o avanço dos muçulmanos no
segundo cerco de Constantinopla, onde os bizantinos mandam navios
equipados com lança-chamas projetando fogo grego, que destrói essa grande
força de invasão.

Os muçulmanos vão continuar invadindo até 750, quando o califado


Omíada atinge sua máxima extensão, chegando até o Cabul no atual
Afeganistão, Multan e Almançora no atual Paquistão, e Samarcanda e Bucara
na Sogdiana e Corásmia, na Ásia Central. Em 750 o califado Omíada é
desposto e dá origem ao califado Abássida, que transferiu a capital para
Bagdá, e concentrou os interesses muçulmanos no Oriente Médio ao invés da
Europa.

(expansão muçulmano com o Califado Ortodoxo e o Califado Omíada)


(Iluminura do "Escilitzes de Madrid" (século XI mostrando navios bizantinos
usando fogo grego))
(A Batalha de Poitiers (732), aqui representada num pintura de Charles de
Steuben (1788–1856))

Apesar dessa grande e primeira vitória da Cristandade contra os mouros


invasores, um grande problema surge aqui, a escravidão. Quando o Império
Romano foi tendo cada vez maior influência do Cristianismo, a escravidão foi
decaíndo, principalmente depois de Constantino. Como a economia de Roma
dependia da escravidão, Roma criou a política do Colonato, para substituir
essa relação, e junto com o Comitatus germânico e o Cristianismo, foi a base
para as relações feudais de vassalagem e suserania, e de servidão.

Quando os muçulmanos vão cruzar a Península Ibérica e conquistar o


reino visigótico, as rotas comerciais pelo Mediterrâneo vão cessar, e agora vai
começar a Idade das Trevas de verdade. Em meados do século VIII, o
comércio no Mediterrâneo vai renascer entre os francos e os árabes, porém a
escravidão vai ter um leve ressurgimento na Europa por causa disso. Os
francos negociavam madeiras, peles, armamento e escravos para os Árabes,
em troca de sedas e vários géneros de tecidos, especiarias e metais preciosos.
O primeiro registo de venda de escravos ao mundo muçulmano - pelos
venezianos - data a cerca de 748. Durante os dois séculos seguintes, o tráfico
de escravos iria tornar-se um negócios lucrativo tanto para europeus como
para árabes, apesar da desaprovação da Igreja. Somente no século X e XI com
o fim das incursões vikings e magiares, e com a Igreja controlando o poder dos
reis, é que a escravidão na Europa cristã vai acabar completamente.

Depois da morte de Carlos Martel, o rei Pepino, o Breve, continua a


política dos merovíngios, e aponta Quilderico III como o rei fantoche. No
entanto, em 751, aparentemente permitido pelo papa, Pepino depõe o último
rei merovíngio, e se proclama rei. Na época do Império Romano, se você
tivesse um opositor político ou um usurpador do trono, as coisas sempre eram
resolvidas matando o opositor. Enquanto que na Europa Medieval e no Império
Bizantino, as coisas eram resolvidas normalmente mandando o perdedor para
o monastério, e foi o que aconteceu com o último rei merovíngio Quilderico III.
Só que agora, Pepino o Breve era rei de todos os francos, então houve uma
grande centralização do poder. No entanto, Pepino não faz muita coisa, e quem
nos interessa aqui é seu filho Carlos Magno que é coroado imperador dos
francos em 768.

Carlos Magno, uma das maiores figuras da Idade Média, acabou com a
desordem que estava nos últimos anos do reino merovíngio, e também acabou
com a ameaça externa de bárbaros não cristianizados do norte e do centro da
Europa. Os saxões apesar de invadirem a Inglaterra, ainda estavam no
continente, e os que estavam na Saxônia ainda eram pagãos, e faziam
incursões contra os francos. Então de 777 a 797, Carlos Magno esmaga a
Saxônia, conquistando seu território, fazendo vários massacres, e promovendo
conversões forçadas de pagãos ao Cristianismo. O mesmo ocorreu com a
Bavária e a Caríntia em 788. Em 774 Carlos Magno conquista os lombardos e
é coroado como rei dos lombardos, anexando seus territórios acima dos
Estados Papais. E ele continua a expasão territorial para o leste, fazendo a
mesma coisa que fez com a Saxônia com os Abroditas, Veletos, Sorábios,
Tchecos, Morávios, Ávaros, Croatos e Sérvios. No entanto, esses 8 últimos,
apesar de sofrerem a cristianização forçada, não foram integrados diretamente
ao Império Carolíngio, mas eram territórios dependentes.

(conquistas de Carlos Magno)

É nesse contexto de Carlos Magno que surge um poema épico que teve
enorme influência na Idade Média, a Canção de Rolando. O poema narra o fim
heroico do conde Rolando, sobrinho de Carlos Magno, que morre junto aos
seus homens na batalha de Roncesvales, travada no desfiladeiro do mesmo
nome contra os sarracenos. A base histórica do poema é uma batalha real,
ocorrida em 15 de agosto de 778 entre a retaguarda do exército de Carlos
Magno, sob o comando de Rolando, um dos Doze Pares de França, que
abandonava a Península Ibérica, e um grupo de montanheses bascos, que a
chacinou.
(Batalha de Roncesvales (778): a morte de Rolando (iluminura de Jean
Fouquet, "Grandes Chroniques de France", 1455-1460, BNF).)

Em 799, o papa Leão III estava em disputa com a aristocracia romana,


que chega a capturá-lo e tentam cegá-lo. O papa é trancado em um castelo, e
ele pede a ajuda de Carlos Magno, que ve como uma oportunidade e resgata o
papa. Agora Carlos Magno tinha o papa nas suas mãos, e ele faz o papa jurar
lealdade. Então no Natal de 800 numa missa, Leão III coroa Carlos Magno
como imperador romano. E isso é muito significativo, porque ele não coroa ele
como imperador romano do Ocidente, ou do Oriente, ele coroa Carlos Magno
como O imperador romano. O Império Bizantino, que era governado por Irene
de Atenas, não liga muito, e ri da situação, falando que ele não era o imperador
deles. Esse é o fim da era bárbara, já que agora o Império Romano estava
restaurado, ou pelo menos o Império Carolíngio representava boa parte dos
territórios do antigo Império do Ocidente.
A partir de 750 ocorre um renascimento da cultura ocidental e da
civilização, tanto no Ocidente cristão medieval, quanto no Império Bizantino. O
mundo islâmico parece decair depois dessa data com o fim do califado
Omíada. Carlos Magno chama para sua corte pessoas como Alcuíno de York,
Paulo o Lobardo, e vários outros que vão ser responsáveis por criar novas
bibliotecas, escolas monásticas, e recuperar o aprendizado. Há um grande
projeto de transmissão - livros à beira da desintegração final copiados em
pergaminho e novos roteiros mais pontuação desenvolvidos. A maioria da
literatura pagã, latina ou cristã recuperada na Renascença, vem das cópias que
os monges faziam nessa época nos mosteiros, e quase nada sobreviveu
diretamente da Antiguidade Tardia. Será criado um novo alfabeto, desta vez
com letra cursiva, pontuação decente e espaçamento entre as palavras, que
facilitará muito a padronização de um alfabeto e comunicação acessível a
todos os lugares do mundo. Inclusive Alcuíno de York era matemático e
considerado o pai da análise combinatória, parte da matemática
importantíssima para a atual computação, e além disso, como ele era um
monge, ele dava vários sermões para Carlos Magno sobre o fato dele matar
pagãos e promover a sua conversão forçada, dizendo que a verdadeira
conversão ao Catolicismo é voluntária.
(Carlos Magno com a espada em uma mão e o símbolo da Igreja na outra)
(Coroação Imperial de Carlos Magno, por Friedrich Kaulbach, 1861)
(Alcuíno de York à direita)

Apesar de Carlos Magno ser muito importante para a Idade Média e para
a história da Cristandade, ele também fez coisa abomináveis. Para começar,
ele matou muitos pagãos e forçou a cristianização de muitos outros nos lugares
que ele conquistou. Segundo que ele promoveu uma centralização política
tentando recriar o Império Romano, e os impostos e o controle governamental
foram aumentados, além de uma certa expansão monetária, que em certo nível
gerou ciclos econômicos. Além disso, Carlos Magno era mais ou menos que
nem o Constantino, que era católico, mas queria usar a Igreja a seu favor.
Magno vai interferir nos assuntos da Igreja, nomeando ele mesmo os bispos e
cardeais, coisa que depois a Igreja vai ter que combater, para não virar um
braço do Estado. A escravidão vai retornar nesse período devido ao comércio
de escravos com os árabes, mas a Igreja que sempre combateu, vai voltar a
combater mais fortemente até ela ser extinta na Europa cristã no século X e XI.
No mais é isso, Carlos Magno fez muitas coisas boas, mas também fez coisas
ruins apesar de não ser um demônio na Terra, e bem melhor do que qualquer
coisa que veio depois da formação dos Estados Nacionais.

Com a morte de Carlos Magno em 814, assume seu filho Luís, o


Piedoso, que foi um rei bom, que restaurou mosteiros e igrejas. No entanto, a
partir de 830 estoura uma guerra civil entre seus filhos para ver quem iria
assumir o trono. Após uma série de intrigas políticas e briga entre seus filhos, é
assinado em 843 o Tratado de Verdun, que divide o Império em três: a Frância
Ocidental, que ficou com Carlos o Calvo, e que disputava a Aquitânia com
Pepino II; a Lotaríngia, a parte central que ficava com Lotário I; e a Frância
Oriental, que ficava com Luís, o Germânico.

Após vários ataques e saques dos vikings e dos magiares no século IX e


X, o reino franco vai se fragmentar cada vez mais até atingir seu ápice com a
dinastia Capetingia a partir de 987. A Frância Ocidental vai se fragmentar em
vários reinos menores, ou seja, o feudalismo clássico. A Lotaríngia vai deixar
de existir e vai se fundir com a Frância Oriental para formar o Sacro Império
Romano Germânico, que é um confederação de centenas de pequenos
ducados, condados, bispados, arcebispados, principados, cidades livres, que
durará até 1806.
A Segunda Onda de Invasões
A ameaça Viking (793-1000)
Os vikings eram o povo que vinha da região da Escandinávia, mais
especificamente Noruega, Suécia e Dinamarca. A maioria deles eram
dinamarqueses, e iam de barco através de rios e mares, saqueando qualquer
lugar que encontrassem fora de seu mundo. A primeira invasão deles ocorreu
em 793 quando eles chegarem na ilha de Lindisfarne na Nortúmbria, e fizeram
um massacre, saqueando o mosteiro, matando ou escravizando muitos de
seus monges. Um ano depois, Jarrow, o mosteiro onde Bede escreveu, foi
atacado; em 795 Iona; e em 804 o convento na Lyminge Kent foi concedido
refúgio dentro das muralhas de Canterbury.

(Ataque Viking a Lindisfarne em 793 por Tom Lovell à Revista Life)

Esses sim podemos chamar de bárbaros, e se eles atacassem e


saqueassem a sua vila ou cidade, você teria sorte se fosse morto pela espada.
Caso tenha estômago fraco, melhor não ler essas citações. Vamos ver alguns
relatos de suas práticas com os povos que eles invadiam:

“eles pegaram hrafnkel e seus homens e amarraram suas


mãos atrás das costas. Então eles invadiram o armazém e
tiraram algumas cordas de uma estaca; em seguida, sacaram
suas facas e furaram os calcanhares dos homens atrás dos
tendões e puxaram as cordas pelos buracos. Eles jogaram as
cordas sobre a viga e amarraram as oito juntos.” (Hrafnkel saga

Freysgoða)

Ou outro relato da saga de Orkneyinga: “Lá eles encontraram Halfdan de


perna longa, e Einnar fez então esculpir uma águia em suas costas com uma
espada, e cortou todas as costelas da espinha dorsal, e extraiu os pulmões de
lá, e o deu a Odin pela vitória que ele havia conquistado.”.

(representação artística de como era a “Águia de Sangue”, punição usada


pelos vikings, onde a pele das costas era aberta)

E por fim vamos a um relato das Sagas de Njal:


“Mensageiros correram para dizer aos perseguidores que
o rei Brian havia caído. Ulf Hraeða e Kerthjálfað voltaram
imediatamente. Eles cercaram Broðir e seus homens, e
sufocaram suas armas com galhos. Broðir agora foi feito
prisioneiro. Ulf Hraeða abriu sua barriga e o guiou ao redor de
um carvalho, e dessa maneira arrancou seus intestinos; Broðir
não morreu até que todos foram arrancados dele.” (Njal saga)

No entanto, quais as causas para esses ataques brutais. Bom, quando


Carlos Magno começou a expansão territorial do Império Carolíngio para o
leste, ele matou vários pagãos e fez a conversão forçada de outros. E na
Saxônia ocorre o massacre de Verden em 782, onde 4500 saxões foram
mortos. Outro relato fala que eles foram batizados forçadamente no rio.
Widuking era cunhado do rei dinamarquês, e após esse massacre o número de
ataques da Dinamarca e da Noruega parece ter aumentado.

No entanto, esse não é o único motivo. Há também questões climáticas,


já que o clima da Escandinávia só foi esfriando de 200 até 600, caindo 2,5° C.
A partir de 600 começa a esquentar de novo e vai atingir o pico em 1100,
subindo novamente os 2,5°C perdidos. A Era Viking é conhecida do período de
800 até 1200, mas é de 800 até 1000 que os vikings dão trabalho para a
Europa cristã com seus ataques e saques.

Com essa melhora do clima a partir de 600, em 700 começa a ter a


expansão da agricultura em terras escandinávias e a colonização interna da
região. Na área Báltica você tem um crescimento da população e o
crescimento de novos assentamentos. No entanto, em 800 parece que houve
uma crise populacional, já que não era possível alimentar tanta gente. Soma-se
a isso, o fato da agricultura nos países nórdicos ser mais precária do que no
resto da Europa, porque a Noruega é praticamente só montanhas, a Suécia é
só florestas de coníferas, e a Dinamarca só tem pântanos.

Em 840, colonos nórdicos fundaram Dublin, apreendem o assentamento


eclesiástico e constroem seu próprio assentamento.

Em 844, uma esquadra viking com mais de 150 barcos navegou pelo
Atlântico até Lisboa, então controlada pelo Emirado de Córdoba. Registros da
época contam que as velas marrons cobriram o estuário do Tejo como
pássaros negros. Após 13 dias de saques, três batalhas contra os mouros, não
conseguiram conquistar a cidade, e a frota seguiu em direção à Espanha. Em 2
de outubro, a expedição subiu o rio Guadalquivir até Sevilha. Tomada com
pouca resistência, grande parte da população fugiu para Carmona, e os
homens que ficaram foram mortos; as mulheres e crianças foram escravizadas.
Eles ficaram cinco semanas em Sevilha e saqueavam vilarejos a cavalo. O
emir de Córdoba organizou um exército, e com o elementos surpresa e
catapultas conseguiu recuperar a cidade. Prisioneiros foram enforcados nas
palmeiras e, para comprovar a vitória, 200 cabeças decapitadas foram
enviadas ao emir de Tânger (Marrocos), incluindo a do líder da expedição.

Esquadras vikings atacaram a costa e os rios franceses, muitas vezes


financiadas por Horik, um rei dinamarquês. Na Páscoa de 845, uma dessas
expedições chegou até Paris, com 120 barcos navegando pelo rio Sena. Para
proteger a Basílica de Saint-Denis do saque, o rei Carlos, o Calvo, dividiu seu
exército em dois, colocando metade em cada lado do rio. Liderados por alguém
que os francos chamavam de Reginheri, que pode (ou não) ser o mítico Ragnar
Lothbroc, os vikings atacaram apenas uma das margens do Sena. Do outro
lado, o resto das tropas assistiu à vitória escandinava e ao enforcamento de
mais de cem prisioneiros. Muitos dos soldados desertaram, forçando o rei
franco a pagar 3 toneladas de ouro e prata aos vikings para evitar um
massacre maior.

A presença viking na França foi tamanha que Paris foi saqueada três
vezes na década de 860, além de sitiada em 885. Melhor preparada do que
nos anos anteriores, a cidade se negou a pagar tributos resistindo ao cerco por
oito meses e impedindo que os navios seguissem o curso do Sena. No fim,
para descontentamento dos parisienses que mantiveram a cidade, o rei Carlos,
o Gordo, permitiu a passagem deles, desde que atacassem a Borgonha, que
tinha se rebelado contra os francos.

Mas os vikings também trabalhavam como mercenários contratados por


nobres francos que se opunham ao poder central. Em 843, um Conde Lambert,
acreditando ter direito sobre a cidade de Nantes, enviou guerreiros nórdicos
para tomar o local no Dia de São João. O resultado, entretanto, não foi o
esperado. A cidade estava cheia de devotos, e os vikings não refrearam sua
habitual ferocidade, executando parte da população e roubando tudo que era
de valor. A catedral foi invadida, fiéis e clero massacrados, inclusive o bispo
que celebrava a missa. Suas últimas palavras foram Sursum Corda, “corações
ao alto”. Por seu martírio, a Igreja o santificou Gohardus de Nantes.

(Cerco de Paris em 845)

No século 10, outra tática de defesa se mostrou mais efetiva. O rei


Carlos III (Carlos o Simples) entregou em 911  no Tratado de Saint-Clair-sur-
Epte, grande parte do norte da França a Rolo, líder viking exilado da terra natal,
em troca de vassalagem e da proteção contra ataques de outros grupos. Rolo
se tornou duque da Normandia, foi batizado, e seus descendentes adotariam a
fé cristã, a língua e os costumes franceses. Seus domínios seriam conhecidos
como Normandia, em referência aos senhores nórdicos. Quando os vikings
voltariam para a França para saquear Paris novamente, Rolo agora lutaria ao
lado dos francos e ganhou dos vikings. Em 927, Rolão passou o feudo da
Normandia para seu filho Guilherme Espada-Longa. O seu
tataraneto Guilherme da Normandia tornou-se rei de Inglaterra ao conquistá-la
em 1066, fazendo de Rolão o ascendente indireto de todos os monarcas
Ingleses da dinastia plantageneta.
(Estátua de Rolão em Calvados.)

A Inglaterra era o principal alvo dos vikings e foi o país que mais sofreu
com os ataques, tendo boa parte de seu território ocupada e regida diretamente
pelos nórdicos. Em 838, os vikings se uniram aos celtas da Cornualha contra
os saxões liderados pelo rei Egbert, e ao Sul, frotas escandinavas se
revezavam em saques nos dois lados do Canal da Mancha. Londres não era
capital de nenhum reino, mas era um porto importante e movimentado. Os
vikings saqueiam a cidade em 842 e passam a navegar no Tâmisa em 851,
com uma forta estimada de 350 barcos. O novo ataque a Londres foi um
grande massacre, e os vikings ainda pilharam Cantebury, antes de, pela
primeira vez, montar um acampamento de inverno na Inglaterra. Quatro anos
depois, os nórdicos repetiram a experiência, no que é considerado o prelúdio
para a invasão do Grande Exército Pagão.

Os vikings também passaram pelo Mediterrâneo. Em 859, 62 langskips


partiram da França para o Mediterrâneo, e segundo as sagas nórdicas, foram
lideradas por Hastein e um dos filhos de Ragnar Lodbrok, Björn Flanco de
Ferro. Após cruzar o estreito de Gibraltar, os vikings atacaram a cidade
espanhola de Algeciras, onde queimaram uma grande mesquita. Depois
tomaram Nador, no Marrocos, onde escravizaram a população litorânea.
Passaram pelas Ilhas Baleares e Valência, e depois se concentraram no sul da
França, inclusive fixando-se por algum tempo próximo a Arles.

Da Côte d’Azur, chegaram ao norte da Itália, atacando Pisa e outras


cidades costeiras. Segundo as lendas, ao chegar em Luna, Hastein pensou ter
alcançado Roma. Ao perceber o erro, mandou matar todos o os homens da
cidade. É possível que dali a frota tenha se dirigido ao sul da Itália, chegando à
fronteira oeste do Império Bizantino, na Sicília.

Na viagem de volta muitas embarcações foram perdidas para os mouros


e tantas outras para o mau tempo no golfo de Biscaia. Para diminuir o prejuízo,
sequestraram o rei de Navarra, em Pamplona, recebendo 70 mil moedas de
ouro como resgate. Quando finalmente retornaram à França, três anos depois,
a esquadra de Hastein e Björn contava com apenas 20 navios.
Vale lembrar que foram os vikings que fundaram a Rússia de Kiev, o
primeiro estado russo. A Rússia foi fundada pelos vikings varegues, que eram
comerciantes, que a partir dos rios que desembocam no Mar Negro e Mar
Cáspio, saqueavam e subjulgavam as tribos eslavas, e fundaram a Rússia de
Kiev em 882 por Oleg. Mas a grande ambição deles era Constantinopla, a
cidade mais importante da primeira parte da Idade Média, a maior cidade e a
mais rica e fortificada, com cerca de 500.000 habitantes.

Em 8 de julho de 860, uma frota de 200 langskips viajou pelo Mar Negro
até o Estreito de Bósforo, encontrando a cidade despreparada. O imperador
Miguel e a elite militar estavam fora de Constantinopla lutando contra os
árabes. Monastérios e vilarejos foram pilhados e destruídos, e suas populações
dizimadas. No entanto, quem estava dentro da cidade saiu ileso. Após um mês
de cerco, os russos de kiev saíram frustados, não conseguindo invadir as
grandes e poderosas muralhas de Constantinopla.

Com isso os bizantinos estipularam que os russos só podiam entrar em


Constantinopla desarmados, em pequenos grupos, não podiam passar a noite
na cidade, e seriam escoltados o tempo todo. Em 941, mais uma vez os
bizantinos estavam em guerra com os árabes, e os russos aproveitaram mais
uma vez para atacar, desta vez com cerca de 350 barcos. Então os bizantinos
preparam uma armadilha e usaram embarcações velhas e em pouca
quantidade para defender o Bósforo. Quando foram cercados pelos vikings,
lançaram Fogo Grego, uma substância cuja fórmula hoje está perdida,
altamente inflamável e que não apagava ao entrar em contato com a água –
pelo contrário, flutuava. Os vikings se lançaram no mar e poucos sobreviveram.
No entanto, os bizantinos ficaram impressionados com os nórdicos e formaram
a Guarda Varegue, que era formada exclusivamente por vikings a serviço do
imperador. Os russos acabaram se miscigenando com os eslavos e depois
adotaram o Cristianismo Ortodoxo de Constantinopla em 1054.

Agora vamos voltar nossa atenção para a Inglaterra que é o que


interessa mais e onde o estrago foi mais feio. Em 865 chega na Inglaterra o
Grande Exército Pagão, e desembarcaram na Anglia Oriental, onde o rei lhes
deu cavalos para a sua campanha em troca da paz. Eles passaram o inverno
de 865-66 em Thetford, antes de marchar para o norte para tomar York, em
novembro de 866. York era uma cidade muito importante da Inglaterra, pois, foi
revivida como um porto comercial pelos anglo-saxões. Com a tomada de York,
os vikings liderados pelos filhos de Ragnar Lothbroc, com destaque para Ivar, o
Desossado (800s-873), tomaram todo o reino da Nortúmbria em 868.

Em 868, o exército pagão marchou para a Mercia e passou o inverno


em Nottingham, onde foi cercado por uma força conjunta dos reinos de Mercia
e Wessex. Com nenhum progresso sendo feito, os mércios fizeram um acordo
com o exército viking, que se moveu de volta para Iorque durante o inverno de
869-70. Em 870, o Grande Exército Pagão voltou-se para a Anglia Oriental,
conquistando-a e matando seu rei. O exército moveu-se para para os
acampamentos em Thetford. Em 871, os viquingues se moveram para Wessex,
onde Alfredo, o Grande estava disposto a pagar-lhes para sair. O exército, em
seguida, marchou para Londres para passar o inverno de 872 antes de voltar
para a Nortúmbria em 873. Eles retornam para a Mércia, conquistand-a em 874
e passando o inverno em Rapton no rio Trent.

Agora apenas o reino de Wessex ainda estava de pé, só que um pouco


maior do que o original, porque absorveu parte do reino da Mércia e os reinos
pequenos de Kent, Essex e Sussex. Em 875, o exército pagão manda outra
ofensiva contra Wessex, mas Alfredo o Grande derrotou os vikings na batalha
de Ethandun em maio de 878. Então Alfredo faz um pacto com Guthrum, o
pacto de Danelaw, onde Alfredo mantinha Wessex e os vikings mantinham o
que conquistaram. Este pacto durou até 890.

Alfredo estabeleceu uma cadeia de fortalezas em todo o sul da


Inglaterra, reorganizou o exército, "de modo que sempre metade dos homens
estavam em casa e metade em serviço, com exceção dos homens que
deveriam guarnecer os burhs" , e em 896 ordenou a construção de um novo
tipo de arte que poderia se opor às conquistas viquingues nas águas costeiras
rasas. Quando os viquingues retornaram do Continente em 892, descobriram
que não podiam mais percorrer o país à vontade, pois onde quer que fossem,
eles se opuseram a um exército local. Depois de quatro anos, os escandinavos,
portanto, se separaram, alguns se estabeleceram na Nortúmbria e Ânglia
Oriental, o restante tentou sua sorte novamente no continente.
(Inglaterra em 878)
(Incursões do Grande Exército Pagão de 865 a 879)

Além das vitórias militares de Alfredo, ele também contribuiu para a


divulgação da escrita na Inglaterra, e tinha um enorme amor pela
aprendizagem. Ele criou um código de leis praticamente libertário onde ele cita
a Bíblia dizendo que é preciso proteger a propriedade privada. Simon Keynes
sugere que o trabalho de Alfredo lançou as bases para o que realmente torna a
Inglaterra única em toda a Europa medieval de cerca de 800 até 1066. Um livro
que foi particularmente valioso para ele foi Cura Pastoralis de Gregório Magno,
que é o guia de como um sacerdote deve cuidar das pessoas. Alfredo tomou
este livro como seu próprio guia sobre como ser um bom rei para o seu povo;
portanto, um bom rei para Alfredo aumentaria a alfabetização. Isto estabeleceu
um crescimento em cartas, direito, teologia e aprendizagem. Alfredo
estabeleceu as bases para as grandes realizações do século X e fez muito
para tornar o idioma vernáculo mais importante que o latim na cultura anglo-
saxã.

(Alfredo o Grande (849-899))

Ao longo do século X, os reis saxões ocidentais ampliaram seu poder


primeiro sobre Mércia, depois para o sul do Danelaw e, finalmente, sobre
a Nortúmbria, impondo assim uma aparência de unidade política aos povos,
que, no entanto, permaneceriam conscientes de seus respectivos costumes e
seus passados separados.

Quem governou de 899 a 924 foi Eduardo, o Velho,  que, com sua
irmã, Etelfleda, Senhora dos mércios, revelam charters, encorajaram as
pessoas a comprar propriedades dos dinamarqueses, para reafirmar algum
grau de influência inglesa em território que havia caído sob controle
dinamarquês. David Dumville sugere que Eduardo talvez tenha estendido essa
política recompensando seus apoiadores com com concessões de terras nos
territórios recentemente conquistados pelos dinamarqueses e que quaisquer
cartas emitidas em relação a tais subsídios não tenham sobrevivido. Seja com
for, em 918 Wessex e Mércia reconquistam parte do sul da Inglaterra,
conquistando a Ânglia Oriental e partes de Danelaw, no entanto Wessex e
Mércia vão se fundir e Wessex vai ser o único estado inglês. Em 910, as forças
combinadas de Wessex e Mércia venceram os vikings da Nortúmbira na
Batalha de Tettenhall, o que é a batalha onde se vê a derrota do último grande
exército dinamarquês para devastar a Inglaterra.

Eduardo, o Velho foi sucedido por seu filho Etelstano que Simon Keynes
chama a "figura imponente na paisagem do século X". Sua vitória sobre uma
coalizão de seus inimigos – Constantino, Rei dos Escoceses, Owen I de
Strathclyde, Rei dos Cúmbrios, e Olavo de Dublim - na Batalha de Brunanburh
em 937, comemorada por um poema famoso na Crônica Anglo-Saxã abriu o
caminho para que ele fosse saudado como o primeiro rei de toda a Inglaterra.
Ele era intransigente em sua insistência no respeito pela lei, mas esta
legislação também revela as dificuldades persistentes que o rei e seus
conselheiros enfrentaram em trazer pessoas problemáticas sob alguma forma
de controle. Sua afirmação de ser "rei dos ingleses" não foi amplamente
reconhecida. A situação era complexa: os governantes hiberno-nórdicos de
Dublin ainda cobiçavam seus interesses no reino dinamarquês de York; os
termos tinham que ser feitos com os escoceses, que tinham a capacidade não
apenas de interferir nos assuntos da Nortúmbria, mas também de bloquear
uma linha de comunicação entre Dublin e York; e os habitantes do norte da
Nortúmbria consideraram uma lei para si mesmos. Foi somente após vinte
anos de desenvolvimentos cruciais na sequência da morte de Etelstano em 939
que um reino unificado da Inglaterra começou a assumir a sua forma familiar.
No entanto, o principal problema político para Edmund e Edredo, que
sucederam a Etelstano, continuou a ser a dificuldade de subjugar o norte. Em
927, eles terminaram de expulsar os dinamarqueses das ilhas Britânicas e a
Inglaterra estava praticamente formada, exceto pela Nortúmbria, País de Gales
e Strathclyde. A Inglaterra foi unificada depois dos conflitos de Edredo em 953.

Em 959, Edgar diz ter "conseguido o reino tanto na Saxônia Ocidental


quanto em Mércia e em Nortúmbria, e é chamado de "O Pacificador". No início
dos anos 970, depois de uma década de "paz" de Edgar, pode ter parecido que
o reino da Inglaterra foi realmente feito completo. Entre 970 e 973, um conselho
foi realizado, sob a égide de Edgar, onde um conjunto de regras foi planejado
que seria aplicável em toda a Inglaterra. Isso colocou todos os monges e freiras
na Inglaterra sob um conjunto de alfândegas detalhadas pela primeira vez. Em
973, Edgar recebeu uma especial segunda "coroação imperial" em Bath, e
desse ponto a Inglaterra foi governada por Edgar sob a forte influência de
Dunstan, Etelvoldo e Osvaldo, o Bispo de Worcester.

O reinado de Etelredo o Despreparado testemunhou a retomada das


invasões vikings na Inglaterra, colocando o país e sua liderança sob tensões
tão severas quanto duradouras. As invasões começaram em uma escala
relativamente pequena nos anos 980, mas se tornaram muito mais sérias na
década de 990 e levaram à calamidade em 1009-12, quando grande parte do
país foi devastada pelo exército de Þorkell inn hávi (Thorkell, o Alto). Assim
permaneceu para que Sveinn Haraldsson tjúguskegg (Sueno Barba Bifurcada),
rei da Dinamarca, conquistasse o reino da Inglaterra em 1013-14, e (após a
restauração de Etelredo) para seu filho Canuto alcançar o mesmo em 1015-16.
Em abril de 1016, Etelredo morreu de doença, deixando seu filho e
sucessor Edmundo Braço de Ferro para defender o país. As lutas finais foram
complicadas pela dissensão interna, e especialmente pelos atos traidores do
ealdormano Edrico de Mércia, que mudaram oportunamente para o partido de
Canuto. Após a derrota dos ingleses na batalha de Assandun em outubro de
1016, Edmund e Canuto concordaram em dividir o reino para que Edmund
dirija a Saxônia Ocidental e Canuto da Mércia, mas Edmund morreu logo após
sua derrota em novembro de 1016, possibilitando a Canuto aproveitar o poder
sobre toda a Inglaterra. Em 1016 a Inglaterra passou a ser parte do Império do
Mar do Norte, junto com Dinamarca a partir de 1018, e Noruega a partir de
1028, e esse império durou até 1035.

A próxima invasão que a Inglaterra sofreria é da Dinamarca, mas vai


durar apenas de 1040 a 1041. A Dinastia real nativa foi restaurada com a
adesão de Eduardo, o Confessor, em 1042. E depois vai ser a do Reino da
Noruega em 1066, em que vai ocorre uma vitória decisiva inglesa na Batalha
de Stamford Bridge em 25 de setembro, onde a Inglaterra perdeu 5000 homens
de seus 15.000 e a Noruega perdeu 6000 de seus 9000.

(Batalha de Stamford Bridge)

Ao mesmo tempo em 1066 está começando a conquista normanda da


Inglaterra. Lembra que Rolo se instalou na Normandia quando conseguiu a
concessão dessas terras em 911? Bom, ele continuou a sua dinastia dali por
bastante tempo, até chegar em Guilherme o Conquistador, ou Guilherme II da
Normandia. A reivindicação de Guilherme ao trono inglês vinha de sua relação
familiar com o rei anglo-saxão Eduardo, o Confessor que reinou até 1066, mas
ele não tinha filhos. Eduardo morreu em janeiro de 1066 e foi sucedido pelo
cunhado Haroldo Godwinson. O rei norueguês Haroldo III invadiu o norte da
Inglaterra em setembro de 1066, saindo vitorioso na Batalha de Fulford, porém
o rei inglês derrotou e matou o norueguês na Batalha de Stamford Bridge em
25 de setembro. Poucos dias depois, Guilherme desembarcou na Inglaterra.
Haroldo II foi para o sul a fim de enfrentá-lo, deixando uma boa parte de seu
exército no norte. Os exércitos de Haroldo e Guilherme se encontraram no dia
14 de outubro na Batalha de Hastings; as forças de Guilherme derrotaram as
de Haroldo, que morreu na batalha.

Apesar de seus principais rivais terem sido mortos, Guilherme mesmo


assim enfrentou rebeliões nos anos seguintes e apenas assegurou
completamente o trono em 1072. As terras dos resistentes ingleses foram
confiscadas; alguns membros da elite foram para o exílio. Mudanças graduais
afetaram as classes agrárias e a vida nos vilarejos: a principal mudança parece
ter sido a abolição formal da escravidão, que pode ou não estar ligada à
invasão. Houve poucas mudanças na estrutura do governo, já que os novos
administradores normandos assumiram muitas formas de governo dos anglo-
saxões. Guilherme II também acabou com um sistema de segurança privada
que existia na Inglaterra anglo-saxã desde o século VIII, que eram os borh,
algo como caçadores de ladrões.

E este é o fim do período viking, com a Inglaterra sendo conquistada


pelos normandos. Os normandos introduziram o feudalismo francês e
mantiveram o poder através de barões, que construíram castelos na Inglaterra.
O período viu mudanças no comércio e na legislação, incluindo a assinatura da
Carta Magna, uma carta jurídica utilizada para limitar o poder soberano por lei e
proteger os privilégios dos homens livres. O monasticismo católico floresceu,
as universidades de Oxford e Cambridge foram fundadas com o patrocínio real.
Dentre as figuras deste período se destaca Ricardo Coração de Leão (1157-
1199) que lutou na Terceira Cruzada (1189-1192), e seu irmão, o João Sem
Terra. Ele tem esse nome porque era o filho mais novo entao não herdaria
nenhuma terra, e também porque ele perdeu muita guerra pros franceses. E
com isso em 1215 sai a Carta Magna, que tentou limitar o poder do rei. O erro
foi que era por escrito e nao por tradição. Começa a abrir a cova do direito
conseutudinário e do direito natural.
Os vikings vão aos poucos se convertendo ao Cristianismo, com os
reinos escandinávios se convertendo por volta do ano 1000. Relatos apontam a
visita de missionários cristãos na Dinamarca, ainda no século IX, como o
monge beneditino Ansgário de Hamburgo (801-865), que também visitou a
Suécia. Em 995, o fundador de Trondheim, Olav Tryggvasson constrói a
primeira Igreja Católica na Noruega. Ele havia passado um tempo na ilha da
Sicília, onde um vidente teria previsto uma batalha na qual Tryggvasson
sofreria grandes feridas e depois se converteria. Um pouco depois do encontro
com o vidente, ele sobreviveu a um ataque vicioso e se converteu
devidamente. Ele volta para a Noruega e toma o trono e começa a lenta
conversão da Noruega. No ano 1000, o Cristianismo chega na Islândia e na
Groelândia, e Olav converte os chefes, punindo aqueles que não se
recusassem. Em 1015, o assentamento nórdico na América é abandonado,
provavelmente por causa dos suprimentos limitados, e da longa jornada
necessária para comercializar com a Escandinávia.
( O martírio de São Olavo na Batalha de Stiklestad (1030), Peter Nicolai Arbo,
1860)

Por fim, algumas imagens da Europa sofrendo a segunda onda de


invasões, feitas pelos vikings, sarracenos e magiares.
Referências

https://historiasderoma.com/2019/08/24/o-saque-de-roma/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Federados_(Roma_Antiga)#:~:text=foederati)
%20nos%20prim%C3%B3rdios%20da%20Hist%C3%B3ria,caso%20isso
%20lhe%20fosse%20solicitado.

https://en.wikipedia.org/wiki/Socii

https://stringfixer.com/pt/Lindisfarne_Gospels

https://www.medieval.eu/early-medieval-london-c-770-950/

https://www.timetoast.com/timelines/roman-saxon-and-viking

https://www.visualcapitalist.com/chart-deaths-roman-emperors-vs-coinage-
debasement/

https://super.abril.com.br/especiais/os-saques-dos-vikings-pela-europa/

https://seguindopassoshistoria.blogspot.com/2018/02/sao-olavo-o-primeiro-
santo-viking.html

https://apologistasdafecatolica.wordpress.com/2020/06/01/a-conversao-dos-
vikings/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Leges_Barbarorum

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