Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
NARRAR A CIDADE 09
01 02 03 04
A CONSTRUÇÃO DA PAISAGEM 15 UMA REPÚBLICA NO DELTA DO RIO RENO 33 ONDE CAPIBARIBE E SOBRE A ILHA DE MANHATTAN 83
Paisagem: palavra e ideia BEBERIBE SE ENCONTRAM 53
15 Uma nação ascendente 34 Um território mercantil 83
O Nordeste ocupado 53
A História através de imagens 26 O cotidiano como tema 38 Uma nova Amsterdam 93
A Cidade Maurícia 62
Narrativa, paisagem e cidade 31 Cidade entre canais 41 As casas e o forte 100
Palácios, fortes e pontes 71
Príncipios para o ordenamento urbano 45
PRESENÇAS E AUSÊNCIAS 107
A colonização como empreendimento 48
AGRADECIMENTOS 111
BIBLIOGRAFIA 115
RESUMO
Esse ensaio explora uma das possíveis e narrativas a serem construídas sobre a produção
de assentamentos ultramarinos pela República das Províncias Unidas, atual Países Baixos.
Em especial, temos a intenção de contribuir para a historiografia da Arquitetura e Urbanismo
brasileira ao nos debruçarmos sobre um momento singular da História urbana brasileira:
a construção de Mauritsstad, atual Recife, pela Companhia das Índias Ocidentais (WIC) no
século XVII. O estudo foi produzido de maneira comparada a um outro assentamento urbano
holandês nas Américas: Nieuw-Amsterdam, atual Nova York. A discussão é pautada a partir
do conceito de paisagem e são analisadas representações pictóricas paisagísticas a fim de
debater o ambiente construído pelos batavos, pois assim nos apoiamos na interpretação de
artistas contemporâneos a tais núcleos urbanos.
ABSTRACT
This essay explores one of the possible narratives to be constructed about the production of
overseas settlements by the Republic of the United Provinces, currently the Netherlands. In
particular, we intend to contribute to the historiography of Brazilian Architecture and Urba-
nism by looking at a unique moment in Brazilian urban History: the construction of Mauritss-
tad, now Recife, by the West India Company (WIC) in the 17th century. The study was produ-
ced as a comparison to another Dutch urban settlement in the Americas: Nieuw-Amsterdam,
now New York. The discussion is based on the concept of landscape and landscape pictorial
representations are analyzed in order to debate the environment built by the Batavians, in
this way we rely on the interpretation of artists contemporary to such urban centers.
A imensidão do mar parece chegar a um limite. Uma fina linha de terra se aproxima e presen-
ciamos a chegada do chão. Ha algo que nos impressiona, em um determinado momento, o
mar se abre em dois cursos distintos, reduzidos, como se procurasse uma forma de percorrer
o solo que surge a nossa frente. E quando a água se encontra em novos fluxos, o que resta
é uma ilha. Mas a ilha se diferencia do continente e de todos os territórios próximos, e essa
diferença não vem apenas de estar na foz de dois rios. A ilha está sob uma cidade, sob um
conjunto de casas e prédios que formam um todo horizontal, em harmonia com os baluartes
das muralhas, com os fortes grandiosos e com as torres das igrejas. Observamos o contraste
da cidade com a natureza inabitada do entorno próximo, distinta em elementos e em or-
dem daquilo que a terra apresentava em origem. E vemos também o vigoroso diálogo que se
consolida entre o espaço e a movimentação das variadas embarcações que se aproximam e
se afastam dos portos, com mercadores, oficiais, civis e escravizados em inter-relações cujo
resultado é a ação mercantil.
Na cidade sobre a ilha, os personagens são diversos em cultura, em condição social e até
mesmo na linguagem, mas todos fazem parte de uma única cena. A cidade e seus agentes
são como um ponto de encontro entre o interior e o exterior, entre a exploração e o comércio,
9
entre a invasão territorial e a consolidação de um império. Ela rompe com a natureza ao pas- Ao ler a cidade nova como expressão de seu tempo, da realidade que embasou as
so que cria dinâmicas próprias, e então termina por assemelhar-se a ela. Assim, há a gênese tomadas de decisões e os caminhos trilhados, podemos ter uma melhor compreen-
da urbe, entendida por nós enquanto paisagem. Paisagem observada, construída e vivida, são sobre o momento em que se originou, bem como relacioná-la com outros fenô-
menos, contemporâneos ou não.
assim como um dia foram Mauritsstad e Nieuw-Amsterdam, dois assentamentos que se inse-
rem na descrição acima apresentada. Cidades que não mais existem, mas que permanecem Aqui damos início a uma investigação sobre um momento histórico muito específico da His-
presentes como prólogo das atuais Recife e Nova York, temas desse estudo e protagonistas tória brasileira: o período de dominação holandesa no Nordeste durante o século XVII. Nes-
de diversas narrativas ainda a serem escritas. se momento, a gestão batava trouxe diversas particularidades à administração territorial,
incluindo uma série de investimentos no meio urbano e na construção de edificações. Foi
Na analogia que abre o raciocínio de Paul Ricoeur01 em “Architecture et Narrativité”, o autor
nesse período que foi construída Mauritsstad, uma cidade nova, capital da Nova Holanda e
descreve a construção e a narrativa como dois raciocínios configurantes para, respectiva-
origem da cidade do Recife, experiência inédita na rede urbana brasileira.
mente, o espaço e o tempo. É fato que, ao observarmos uma cidade ou uma arquitetura,
nos deparamos com uma disposição espacial que atua diretamente no estabelecimento de O olhar sobre esse período é de interesse fundamental à historiografia, pois a limitação tem-
uma vivência singular àquele local específico. Essa organização tem origem em uma expres- poral e espacial trouxe um caráter de pontualidade à experiência urbanística e arquitetônica.
são cultural e histórica vinculada a um tempo, de maneira que na própria criação do espaço Nem antes, nem depois, houve a construção de uma cidade brasileira seguindo princípios
são encontrados vestígios do tempo que o compôs. No entanto, as vivências que nele se urbanísticos holandeses em um diálogo tão direto com a produção luso-brasileira já estabe-
desenvolvem o assumem como condicionante, seja a partir de estímulos ou limitações. Há, lecida nacionalmente. Portanto, torna-se surpreendente o baixo número de estudos sendo
portanto, uma relação dialética e não linear entre o tempo e o espaço, entre a construção e a realizados nas escolas de Arquitetura e Urbanismo do Brasil que tenham Mauritsstad como
narrativa, que nos leva à investigação histórica sobre o espaço como um potencial caminho foco.
para debater a natureza humana.
Para a construção da narrativa histórica que aqui apresentamos, assumimos o desafio pro-
Um caminho importante vem sendo trilhado pelos arquitetos e urbanistas que escolhem o posto por Jacques, Pereira e Cerasoli04 ao propor um estudo comparativo em que dispomos
ensino e a reflexão histórica como ofício, pois diferentemente de outros campos do estudo fatores distintos lado a lado. Essa sobreposição busca o encontro de relações entre diferen-
historiográfico, os que estudam a História da Arquitetura assumem as edificações e as cida- tes experiências e o desenvolvimento de uma nova narrativa que as inclua, evidenciando os
des como objetos a serem investigados e analisados em suas condições formais e espaciais. possíveis contrastes, contradições ou aproximações existentes. O estudo parte também da
Os conceitos e relações que fazem parte dessa formação profissional favorecem a formação sugestão do professor pernambucano José Luiz Mota Menezes05 que, após listar uma série de
de um olhar diferenciado sobre os espaços estudados. É nesse sentido que Ricardo Trevi- importantes cidades holandesas no ultramar, nos diz que “um estudo comparado de tais ci-
san02 nos informa, ao estudar as cidades novas03, que: dades deveria ser realizado e talvez trouxesse maiores informações sobre o plano da Cidade
Maurícia”.
01 RICOEUR, Paul. Architecture et Narrativité. 1998. Nieuw-Amsterdam, atual Nova York, foi escolhida como a segunda cidade para essa pesqui-
02 TREVISAN, Ricardo. Narrar por Cidades Novas. 2020, p. 297. sa. Essa decisão foi tomada particularmente pela presença abrangente de documentação e
03 Cidade Nova, segundo o conceito de Ricardo Trevisan apresentado no livro “Cidades Novas”
(2020), é um assentamento urbano que reúne em sua gênese seis atributos inerentes: surgem a partir
do desejo de um empreendedor público ou privado, para atender a uma necessidade, são dispostas 04 JACQUES, Paola Berenstein; PEREIRA, Margareth da Silva; CERASOLI, Josianne Francia. Ne-
sobre um sítio previamente escolhido, contam com um projeto urbanístico, foram pensadas por um bulosas do Pensamento Urbanístico Tomo III: Modos de Narrar. 2020.
10 profissional e são vinculadas a um tempo, possuindo uma data relativamente precisa de sua gênese. 05 MENEZES, José Luiz Mota. O século XVII e o Brasil holandês. 1983, p. 342. 11
bibliografia nos meios digitais sobre a sua fundação e seus anos de existência. Mas, para além Visando à abrangência da narrativa, foram elencadas diversas obras de arte para cada caso
das questões de viabilidade e de acesso a referências, existem algumas aproximações entre estudado, seguindo a premissa do Atlas de Aby Warburg08, pois investigamos as imagens de
os dois núcleos urbanos que tornam ainda mais interessante esta sobreposição de estudos maneira sobreposta e refletimos dinamicamente sobre os objetos de estudo. Dessa manei-
de caso, como a influência direta da Guerra Anglo-Holandesa, a atuação de Peter Stuyvesant, ra, podemos passar o nosso olhar de uma imagem a outra, investigando possíveis relações
a emigração de um grupo de judeus de Mauritsstad para Nieuw-Amsterdam após o fim do entre os objetos apresentados e procurando ausências ou presenças que as relacionem, re-
Brasil Holandês e, claro, a Companhia das Índias Ocidentais (WIC) como empreendedora de sultando na construção uma narrativa particular à nossa experiência de pesquisa, que con-
ambos os assentamentos. sidera, além das diversidades temporais e espaciais dos próprios objetos, a própria presença
de debruçar-se sobre as obras e analisá-las de maneira cambiante.
É importante, também, ressaltarmos a nossa escolha por nos referirmos às cidades por seus
nomes originais em holandês, decisão tomada pois Mauritsstad e Nieuw-Amsterdam não O trabalho foi então estruturado em quatro capítulos. Temos início com uma discussão sobre
mais existem e o que hoje encontramos em Recife ou Nova York pouco se assemelha ao que o termo paisagem e o seu significado para a civilização ocidental. Partimos então para um
encontraríamos no período de administração da WIC. A configuração espacial que aqui de- estudo sobre a Holanda, discutindo o contexto histórico, a produção de arte e os princípios
batemos foi há muito apagada, restando apenas o traçado das ruas como vestígios de sua de organização territorial pelos holandeses. Em seguida, são apresentados os dois estudos
implantação. de caso, nos quais abordamos de maneira geral o período de dominação holandesa, fazemos
uma análise dos elementos urbanos apresentados em mapas da época e finalizamos com
E é justamente por essa condição de não existência que recorremos à visão daqueles que
uma discussão que assume as representações pictóricas como tema.
a conheceram para fundamentar a nossa discussão. Além das análises documentais e dos
relatos literários, o uso de imagens como testemunhos históricos pode fornecer fundamen-
tos para debates sobre os aspectos visuais, sociais e espaciais de assentamentos urbanos. É
nesse sentido que elencamos uma série de representações pictóricas a serem interpretadas
e estudadas, buscando estabelecer relações entre as experiências urbanas da Cidade Maurí-
cia e de Nova Amsterdam que podem ser apreendidas a partir do olhar de quem realmente
as conheceu.
A ideia de paisagem pode ser compreendida como um conceito histórico que pertence ao
sentido comum01. Ou seja, temos o conhecimento do significado do conceito mesmo sem
sabermos defini-lo de maneira precisa, pois conhecemos a ideia mesmo antes de conhecer o
objeto. E apesar de termos confiança em olhar um quadro de Monet e falarmos “estou diante
de uma paisagem”, ou até mesmo em observar a interação entre a topografia, a ocupação
humana, o mar e o céu da cidade do Rio de Janeiro e interpretar esta composição visual se-
gundo essa definição, descrevê-la universalmente é extremamente difícil. Ao perguntarmos
às pessoas o que é uma paisagem, nos deparamos frequentemente com respostas que refe-
renciam exemplos, mas ao mesmo tempo abrem espaço para interpretações mais amplas.
“É como um quadro”. “É como um cartão postal”. Assim, podemos ver que a tentativa de
definir a ideia parece limitá-la, apesar de sabermos empiricamente interpretar o que é e o
que não é paisagem.
Num estudo que toma como ponto de partida a paisagem, torna-se necessário procurar
02 De acordo com Benjamin Lorch (2002), o surgimento do termo em alemão tem origens próxi- Foi este encontro com a fruição estética através das paisagens que levou diversos artistas a
mas ao termo holandês (landscap) e nórdico (landskap). O termo alemão foi escolhido como referência representá-las, de tal maneira que a própria evolução no conceito de paisagem está comple-
nesta discussão, mas sabe-se que a etimologia nas outras duas línguas se assemelha. tamente associada à sua representação no mundo das artes. Lúcia Veras10 elenca dois mo-
03 PAYSAGE. Centre national de ressources textuelles et lexicales (CNRTL). mentos iniciais na construção desse conceito na civilização europeia: o relato de Francesco
04 Torna-se interessante entender que o termo pays em francês é usado em diversos sentidos Petrarca da subida ao Mont Ventoux na Provence, em 1336, e o afresco de Ambrogio Loren-
relativos à cultura e reconhecimento cultural. Por exemplo: o substantivo dépaysement, flexionado no zetti (figura 1), denominado “Os efeitos do bom governo no campo” (1338-1339). Nessas pro-
adjetivo dépaysée, denota a sensação ao se encontrar num lugar completamente distante da cultura
natal, como um holandês nas Américas do século XVII.
05 LANDSCHAFT. Digitalen Worterbuch der deutschen Sprache (DWDS). 08 CAUQUELIN, 2007. p. 16.
06 CAUQUELIN, Anne. A invenção da paisagem. 2007. p. 29. 09 KANT, Immanuel. Crítica da faculdade de julgar. 2019.
16 07 CAUQUELIN, 2007, p. 35 10 VERAS, Lúcia. Paisagem-postal. 2014. p. 82. 17
duções a relação da natureza enquanto objeto a ser observado, apreendido pelos sentidos e
interpretado pela razão e pelo juízo estético se faz presente, com a data de execução coinci-
dindo espacialmente e temporalmente com o início do Renascimento (Itália do Século XIV).
Podemos, portanto, entender a atuação dos artistas para além da interpretação e represen-
tação de uma paisagem, mas também como compositores do modo como ela virá a ser apre-
sentada, pois há uma participação direta e fundamental na escolha dos valores e no arranjo
que os elementos tomam em cena, de maneira a evocar sensações e sentimentos nos futuros
observadores.
Figura 2: “Villa dans la campagne romaine”, 1646-1647, Claude Lorrain. Fonte: Wikimedia Commons.
Pelo sertão nos pareceu, vista do mar, muito grande, porque, a estender olhos, não
podíamos ver senão terra com arvoredos, que nos parecia muito longa.
Nela, até agora, não pudemos saber que haja ouro, nem prata, nem coisa alguma
de metal ou ferro; nem lho vimos. Porém a terra em si é de muito bons ares, assim
frios e temperados como os de Entre Douro e Minho, porque neste tempo de agora
Figura 1: “Allegoria degli Effetti del Buon Governi in Campagna”, 1338-1339, Ambrogio Lorenzetti. os achávamos como os de lá.
Fonte: Wikimedia Commons.
11 CAUQUELIN, 2007. p. 83. Grifo nosso. 13 CAMINHA, Pero Vaz de. Carta a El-Rey D. Manoel I de Portugal sobre o achamento do Brasil.
18 12 GOMBRICH, Ernst. A história da arte. 2015. p. 396 2015. p. 14. 19
Águas são muitas; infindas. E em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, de longos eixos, a exemplo do espelho d’água citado por Benevolo, e o posicionamento de
dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem. monumentos ao longo do parque. Dessa maneira, a própria forma do jardim atua diretamen-
te na construção de uma narrativa metafórica sobre o poder monárquico como análogo ao
Podemos encontrar nessa estrutura textual uma sequência de comparações, descrições e
controle da natureza.
analogias que visam a transmissão dos aspectos visuais da terra através das palavras. Esse
é um dos pontos levantados por Cauquelin14 ao nos dizer que “as figuras do discurso vêm
completar, perfazer a construção da paisagem”. Dessa maneira temos a pintura da paisa-
gem como a transformação em imagem daquilo que foi percebido e a literatura da paisagem
como a construção poética da percepção visual.
Um outro produto artístico que reflete o conceito de paisagem é a produção de jardins, ofício
conhecido como paisagismo, num jogo léxico que relaciona diretamente o objeto-paisagem
e a atitude diante do mundo de construir e compor o espaço. De acordo com Veras15, “os
jardins, diferentemente da pintura, são a própria expressão do país em paisagem, ou seja,
o território é a tela sobre a qual o homem vai recortar a natureza e transformá-la em paisa-
gem”. Dessa maneira, tem-se na criação de jardins um processo que associa as potencialida-
des visuais à ocupação do ambiente e, muitas vezes, a construções narrativas, metafóricas e
simbólicas. É nesse sentido que se projetou, por exemplo, o Jardim de Versalhes (figura 3).
Segundo Benevolo16:
Le Nôtre ordena o jardim [de Versalhes] numa planície pantanosa, circundada por
baixas colinas. Ao fundo, manda escavar um canal em forma de cruz; o braço maior,
Figura 3: Le parterre d’eau, Jardin de Versailles. Projeto de André Le Nôtre, 1624. Fonte: Versailles.
com um quilômetro e meio de comprimento, fica no eixo do castelo e pode ser visto
de flanco a partir do terraço central. Essa fita de água, na qual se espelha o sol ao se
pôr, guia o olho até o ponto de fuga nas colinas ao fundo.
14 CAUQUELIN, 2007. p. 160. Figura 4: Trecho da Planta do Jardim de Versalhes, 1746, Jean Delagrive. Fonte: Wikimedia Commons
15 VERAS, 2014, p. 95.
20 16 BENÉVOLO, Leonardo. História da cidade. 2015. p. 514. 21
Nas três formas de arte supracitadas, a pintura, a literatura e o paisagismo, podemos com- No texto “Drawing and Making in the Landscape Medium”20, Corner apresenta a produção da
preender a construção das paisagens como a ordenação de elementos numa determina- paisagem urbana a partir de três fenômenos vinculados à experiência da paisagem, que seriam
da visão de maneira a transmitir uma mensagem, seja a fruição estética, como no caso de a espacialidade (a paisagem enquanto ambiente que nos envolve e nos recebe), a temporali-
Claude Lorrain, seja uma ambientação e descrição do espaço natural, como com Pero Vaz dade (pois a paisagem não pode ser apreendida em um único instante no tempo e depende,
de Caminha, ou seja na construção de uma espacialidade simbólica e monumental, como portanto, de uma vivência que assume o próprio tempo como condição) e a materialidade (que
no Jardim de Versalhes. Esses exemplos corroboram a afirmação de James Corner de que seria, de fato, o que constitui os elementos, tanto a nível superficial quanto substancial)21.
“Paisagem não é apenas um fenômeno físico, mas também um esquema cultural, um filtro
É também nesse sentido que Michel Collot nos informa que:
conceitual pelo qual entendemos nossas relações com a natureza”17. Assim, pensa-se a pai-
sagem não apenas como um elemento estético desvinculado da vida quotidiana, mas como A paisagem aparece como uma manifestação exemplar da multidimensionalidade
um agente produzido por uma sociedade e condicionante de diversas relações posteriores. dos fenômenos humanos e sociais, da interdependência do tempo e do espaço, e da
Encontramos na paisagem, portanto, um campo a ser investigado para entender as relações interação entre a natureza e a cultura, entre a economia e o simbólico, entre o in-
divíduo e a sociedade. Ela fornece um modelo para pensar a complexidade de uma
sociais, culturais, morfológicas e estéticas presentes nos espaços.
realidade que nos convida a articular as contribuições de diferentes ciências sociais.22
Tal investigação nos leva à urbe. Seriam as cidades potenciais paisagens? Essa é uma ques-
Esses diferentes fenômenos ampliam a nossa capacidade interpretativa das cidades enquanto
tão amplamente debatida justamente pela compreensão secular de paisagem associada ao
paisagem, e nos auxiliam a entender, por exemplo, porque a experiência de viver e observar a
mundo natural, não tomado por sistemas infraestruturais, tecnologia e arquitetura18, assim
paisagem em Recife no século XXI, com seus edifícios verticais e suas amplas favelas, se dife-
como as representações de Lorrain, Caminha e Le Nôtre nos evocaram. Sobre isso, Corner19
rencia tanto do Recife do século XIX, com seus sobrados e mocambos reunidos no centro da
nos diz que
cidade. Apesar de ser a mesma cidade, são paisagens diferentes em espacialidade, em tempo
[a cidade] pode não parecer uma paisagem, mas como base inicial, as geometrias e em matéria.
e unidades que formam a cidade funcionam de maneira muito semelhante a uma
paisagem, canalizando fluxos e energia, conectando e dispersando, expandindo e A interpretação fenomenológica da paisagem segundo as descrições de Corner e Collot se liga
contraindo com graus variáveis de firmeza e abertura através do tempo. diretamente à presença do termo visão na definição de Cauquelin. Dessa maneira, torna-se
necessário entender as diferentes formas de presença das pessoas na construção da paisagem,
É dessa maneira que nos propomos a pensar a paisagem urbana, ou seja, a pensar a cidade
ou seja, dos agentes que veem a paisagem e experienciam os fenômenos.
como detentora de uma série de valores ordenados em possíveis visões.
17 CORNER, James. The landscape imagination. 2014. p. 101. Tradução nossa: “Landscape is 20 CORNER, 2014, p. 161-196.
not only a physical phenomenon, but is also a cultural schema, a conceptual filter through which our 21 CORNER, 2014. p. 165. Tradução nossa: “landscape spaciality”, “landscape temporality” e
relationships to wilderness and nature can be understood.” “landscape materiality”.
18 CORNER, James. Terra Fluxus. In: WALDHEIM, Charles (org.). The Landscape Urbanism Rea- 22 COLLOT, Michel. La pensée-paysage: philosophie, arts littérature. 2014. p. 11. Tradução nos-
der. 2016. p. 25. sa: “Le paysage apparaît ainsi comme une manifestation exemplaire de la multidimensionnalité des
19 CORNER, 2014, p. 10. Grifos do autor. Tradução nossa: “it might not look like a landscape, but phénomènes humains et sociaux, de l’interdépendance du temps et de l’espace, et de l’interaction de
as a primarly horizontal foundation, the geometries and entities that shape the city function much like la nature et de la culture, de l’économique et du symbolique, de l’individu et de la société. Il fournit um
a landscape, channeling flows and energy, connecting and dispersing, and expanding and contracting modèle pour penser la complexité d’une réalité qui invite à articuler les apports des différentes sciences
22 with varying degrees of fixity and open-endedness over time.” humaines et sociales.” 23
Elencamos, então, três possíveis intenções ao interagir com a paisagem urbana: as intenções
contemplativas, daqueles que a observam e reproduzem o observado de maneira poética ou
pictórica; as intenções compositivas, dos que atuam diretamente sobre a construção da cidade,
como os planejadores urbanos, figuras políticas e profissionais projetistas (arquitetos, urbanis-
tas, agrimensores, engenheiros...); e as intenções práticas, daqueles que vivem a cidade duran-
te o momento de sua existência e que no dia-a-dia são tanto compositores e contempladores,
como também valores incluídos na construção visual do meio urbano.
Tendo em vista a discussão abordada, entendemos a construção da paisagem como uma di-
nâmica social diretamente vinculada à experiência do espaço e às relações culturais que ele
reúne. Essa ideia surge tanto na produção de peças artísticas como na própria ocupação e de-
senvolvimento de cidades. Estas, apesar de dissonantes de uma ideia bucólica e idealizada de
paisagem natural, emergem como paisagens urbanas detentoras de diversos valores interrela-
cionados a serem apreendidos.
Portanto, uma compreensão histórica das paisagens urbanas através das representações
é uma iniciativa interdisciplinar que reúne diversos atributos das sociedades em uma única
narrativa. A partir delas, é possível observar desde princípios urbanísticos ou arquitetônicos
e traços da produção artística, até relações que não foram inicialmente entendidas enquanto
protagonistas da paisagem, mas que são reflexos de um modo de ver o mundo daquele que a
interpretou e apresenta tal realidade. Figura 5: Paisagem com Ruínas de Olinda, 1664, Frans Post. Fonte: Wikimedia Commons.
Este trabalho investiga as cidades de Mauritsstad e Nieuw-Amsterdam através de pinturas e A sociedade holandesa no século XVII já atendia aos quatro critérios selecionados por Ber-
gravuras produzidas por artistas holandeses do século XVII. Para possibilitar a interpretação de que. O primeiro critério era atendido pela presença de uma palavra para descrever a ideia de
uma sociedade segundo a ótica da paisagem, é preciso investigar se em tal contexto já havia paisagem (landskip). Também são encontradas descrições de paisagens em textos literários,
um entendimento desse conceito. Nesse sentido, apoiamo-nos na teoria de Augustin Berque23 como em trechos do texto de Gaspar Barléu (historiador holandês; 1584-1648)25 sobre o terri-
apresentada por Veras para reconhecer uma “civilização paisagística”, ou seja, uma sociedade tório ocupado pelos holandeses no Brasil. Já sobre as representações pictóricas, podem ser
que vê as composições espaciais de acordo com a ideia de paisagem. citadas as obras de Frans Post (pintor holandês, 1612-1680) sobre a paisagem pernambuca-
Para Berque, civilizações paisagísticas seriam as que atendem aos quatro critérios seguintes:
1-) a presença de representações linguísticas, 2-) a presença de representações literárias, orais 25 BARLÉU, Gaspar. História dos feitos recentemente praticados... 1940. p. 23. “Conquanto su-
jeita a nevoeiros, é a terra recreada com os bafejos placidíssimos dos ventos mareiros, que dissipam
ou escritas, 3-) a presença de representações pictóricas com tema em paisagens, e 4-) a presen-
os vapores e névoas matutinas, fazendo brilhar um sol límpido e esplendoroso. Durante o inverno,
ça de representações jardinísticas com intenção de embelezamento.24
sopram os ventos do sul e do sueste e durante o verão cursam o nornordeste e o lesnordeste. É a região
numas partes vestida de matas, noutras plana e tapizada de pastagens e noutras ergue-se em colinas.
23 BERQUE, Augustin. Cinq propositions pour une théorie du paysage. 1994, apud VERAS, 2014. Chuvas freqüentes regam-lhe a gleba feraz e sempre verdejante. Por isso é mais para admirar que, sen-
24 24 VERAS, 2014, p. 79-80. do-lhe tão fecundos os campos e tão salubre o clima, tenha a sua gente caráter cruel e fero [...]” 25
na (figura 5), que já recebiam em seu título o nome “paisagem”. E os jardins também estavam cuperar informações sobre as cidades em períodos passados e relacioná-las segundo a ótica
presentes, a exemplo de áreas claramente concebidas com intenções de embelezamento no de quem não as vivenciou. É preciso entender a paisagem a partir do olhar de quem estava lá
mapa de Nieuw-Amsterdam (figura 6). durante a sua existência, pois esta é a única visão que de fato tomou o espaço enquanto ma-
téria como uma referência a ser interpretada e representada. Em especial quando tratamos
de cidades que não mais existem, como Mauritsstad e Nieuw-Amsterdam.
Nesse sentido, a paisagem pode ser interpretada segundo a visão de quem as compôs, como
nos projetos do arquiteto Pieter Post para Mauritsstad. Ao investigar a paisagem em momen-
tos de projeto, pode ser estudada a ordem urbana proposta para os espaços a partir de ma-
pas e planos. É com essa proposta que Ron van Oers (2000) publica “Dutch Town Planning
Overseas During VOC and WIC Rule (1600-1800)”. No entanto, aqui nos propomos a investi-
gar duas cidades concebidas e ocupadas de maneiras distintas. Enquanto Mauritsstad foi
resultado de uma ocupação ordenada por meio de um projeto urbanístico e infraestrutural,
Nieuw-Amsterdam surgiu de maneira espontânea e o projeto existente para a região não foi
executado. Nesse sentido, partimos da análise das cidades de acordo com as representações
contemplativas, ou seja, daqueles que as observaram e as relataram durante a sua existên-
cia.
Figura 6: Trecho do Castello Plan de Nieuw-Amsterdam com representação de jardim. 1660, Jacques Entre as possibilidades de análise da paisagem em objetos artísticos, poderiam ser escolhi-
Cortelyou. Fonte: Wikimedia Commons das as representações poéticas ou pictóricas. A literatura da época fornece material para um
estudo da paisagem, como os relatos de Gaspar Barléu27 sobre os feitos de Maurício de Nas-
Dessa maneira, entendemos a presença da ideia de paisagem na civilização setecentista ho- sau no Brasil ou as narrativas de Joannes de Laet sobre as “Índias Ocidentais”28. Mas, devido
landesa e, portanto, validamos a interpretação do meio urbano de Mauritsstad e Nieuw-Ams- às dificuldades de acesso a textos originais e traduções, optamos pela análise de pinturas
terdam segundo a ótica da paisagem. Assim, esperamos relacionar o meio físico e as repre- e gravuras, o que nos leva ao estudo da iconografia associada à construção de narrativas
sentações da paisagem urbana numa narrativa que contemple a história social e cultural de históricas.
ambos os casos estudados.
A análise de imagens traz diversas potencialidades e desafios aos historiadores. Elas, de fato,
A HISTÓRIA ATRAVÉS DE IMAGENS não podem ser tratadas como documentos oficiais ou narrativas precisas. A existência de
Ao retomarmos a ideia de Cauquelin de paisagem como “um conjunto de valores ordena- imagens implica na presença de alguém que as capturou, seja nas fotografias, nas pinturas,
dos em uma visão”26 entendemos que investigar espaços segundo esse conceito vai além nas gravuras ou nos desenhos. Nesse sentido, deve-se assumir como realidade a presen-
de um reconhecimento de elementos dispostos no ambiente. Torna-se necessário entender ça intermediária do contemplador, aquele que seleciona as presenças e as ausências, que
também como eles estão relacionados, e a existência de uma diálogo entre eles implica na decide quais partes da realidade vão aparecer e quais permanecerão ocultas aos que obser-
presença de alguém que observa e entende tais ligações. No entanto, não seria possível re-
27 BARLÉU, 1940.
28 No texto publicado em 1630 de título “Beschrijvinghe van West-Indien” (“Descrição das Índias
26 26 CAUQUELIN, 2007, p. 16. Ocidentais”, tradução nossa). 27
varão a sua obra. Erwin Panofsky32, apresentado no livro “Meaning in the Visual Arts”, e as revisões conceituais
propostas por Burke33 em “Testemunha Ocular: o uso de imagens como evidência histórica”.
Assim, deve-se entender as imagens também em sua subjetividade. Mas, ao mesmo tempo
em que esse componente subjetivo traz dificuldades para assumir as referências iconográ- Em seu livro, Panofsky apresenta um roteiro para a interpretação de representações icono-
ficas como descrição de eventos, ele é em si uma possibilidade à compreensão histórica, gráficas em três etapas sequenciais.34 A primeira etapa é a Pré-Iconográfica, em que são in-
pois, como nos informa Peter Burke29, “o processo de abstração é, ele próprio, evidência de vestigados os elementos da cena. Essa é uma etapa onde predomina o reconhecimento e a
fenômenos que muitos historiadores desejam estudar, tais como mentalidades, ideologias, descrição dos objetos. Em seguida, parte-se para a segunda etapa, a Iconográfica, onde se
identidades”. Como a compreensão de paisagem assume a presença de um observador, a descobre o tema e se inicia uma interpretação da cena apresentada. Nessa etapa, já se recor-
subjetividade na produção das imagens se relaciona diretamente à visão do agente de inten- re a uma construção cultural e social para entender as dinâmicas do que é apresentado. Por
ções contemplativas. É justamente nesse sentido que Burke30 também pontua que “imagens fim, vem a etapa Iconológica, onde se investiga e se discute significados mais profundos das
podem auxiliar a posterioridade a se sintonizar com a sensibilidade coletiva de um período obras de arte e se tenta entender as razões para o modo como ela foi produzida e como os
passado”. E, como encontramos nas paisagens justamente uma compreensão sensível de elementos foram representados.
um ambiente vivido em coletividade, as imagens tornam-se objetos adequados a esta inves-
Numa aplicação resumida e rápida do método, podemos fazer uma análise da pintura holan-
tigação.
desa “Lição de anatomia do Dr. Tulp”35 (1632) de Rembrandt (figura 7). Em nível Pré-Icono-
Enquanto isso, é sobre a produção de representações pictóricas que Cauquelin31 nos informa gráfico, podemos descrever a tela como 8 homens reunidos em volta de um cadáver. Maiores
que: descrições poderiam ser produzidas sobre vestimentas, instrumentos e outros elementos
da composição. Em nível Iconográfico, passamos a incluir a compreensão de que se trata de
Organizar e constituir a coerência do ponto de vista seria mostrar que se vê aquilo
uma aula, que existe um homem, vestido de maneira diferente, que é reconhecido a partir do
que se vê: ou seja, o estado das coisas tal como a razão cognoscente as apreende.
Trata-se, portanto, de interpor, entre a impressão dos sentidos e o conhecimento próprio nome do quadro como Dr. Nicolaes Tulp. Estes homens estão estudando especifica-
das leis da realidade necessária, um protocolo de acordo: um ‘quadro’ ou uma ‘for- mente elementos da anatomia do corpo humano no braço do cadáver, que está aberto, com
ma’ que os una fortemente, de tal maneira que uma não possa dispensar a outra e tecidos musculares, conjuntivos e ósseos expostos.
vice-versa.
Num nível Iconológico, podemos iniciar as suposições sobre a sociedade e o contexto que
Dessa maneira, vemos mais um argumento que corrobora para o nosso entendimento do levaram à existência e à forma dessa pintura. Vemos que Rembrandt pintou um dos homens
trabalho pictórico como uma tentativa de unir a percepção de mundo às estruturas da rea- olhando na direção de quem observa a tela, como se soubesse que está sendo pintado.
lidade. É justamente nessa relação que reside o entendimento de paisagem e que encon- Nesse sentido, teríamos que um dos personagens entende sua própria condição de objeto
tramos um amplo campo de investigação, revelador de ângulos diversos da relação entre o pictórico, expandindo as intenções narrativas do autor para uma reflexão sobre a racionali-
homem e o ambiente.
32 PANOFSKY, Erwin. Meaning in the Visual Arts. 1955.
Para a interpretação de imagens, tomaremos como referência o Método Iconográfico de
33 BURKE, 2017.
34 CASIMIRO, Luís Alberto. O método iconográfico... 2016.
35 Foi escolhida uma representação de uma cena, e não de uma paisagem, para esta introdu-
29 BURKE, Peter. Testemunha Ocular: o uso de imagens como evidência histórica. 2017. p. 25.
ção rápida ao método iconográfico. Essa decisão foi tomada tendo em vista a rapidez na aplicação do
30 BURKE, 2017. p. 38. método, e a escolha se deu por uma obra com interpretações já consolidadas, auxiliando na brevidade
28 31 CAUQUELIN, 2007, p. 83. Grifos nossos. na construção narrativa. Ainda assim, trata-se de uma obra Holandesa produzida no século XVII. 29
dade humana. Também vemos que existem expressões diferentes entre os três alunos mais para entender que a expansão ultramarina envolve o sentimento de conquista e imposição
próximos ao cadáver. Eles podem representar diferentes posturas dos homens seiscentistas cultural. É, portanto, o entendimento da Etapa Iconológica como um aprofundamento da
ao encarar o desenvolvimento científico do Século XVII, como o medo, a curiosidade e a ex- Etapa Iconográfica a partir de uma associação com a literatura histórica pré-existente.
pectativa.
Assim, pretendemos investigar e interpretar diferentes paisagens pintadas de Mauritsstad e
No entanto, Burke levanta críticas ao método justamente pelo olhar intuitivo, excessiva-
36
Nieuw-Amsterdam, para entender a relação entre o que foi apresentado em cena e os con-
mente literário e que privilegia o conteúdo sobre a forma. Ele sugere, em seu texto, uma textos social, cultural e econômico externos à pintura.
associação entre o Método Iconográfico com o estudo da História Social e é essa a proposta
NARRATIVA, PAISAGEM E CIDADE
que iremos seguir com este estudo.
Nos estudos de caso propostos nesse trabalho, iniciaremos com uma investigação sobre as
condicionantes que levaram à construção de Mauritsstad e Nieuw-Amsterdam. Serão com-
preendidas de modo suscinto as relações estabelecidas com a Companhia das Índias Oci-
dentais (WIC), com os colonizadores holandeses, com os povos nativos, com povos escravi-
zados e com colonizadores de outras nações europeias. Também será estudada a atuação de
figuras ilustres, como Maurício de Nassau em Mauritsstad e Peter Stuveysant em Nieuw-Ams-
terdam. Assim teremos como objetivo o reconhecimento de uma narrativa histórica abran-
gente a partir de trabalhos já consolidados na área.
Em seguida, o meio urbano será descrito a partir de mapas produzidos na época. Dessa ma-
neira, serão investigados os elementos do meio urbano, a relação com o ambiente natural,
a posição geográfica da cidade, a presença de arquiteturas e a sua distribuição no espaço,
como é estruturado o tecido urbano, onde estão localizados os fortes ou muralhas e como
foram distribuídos os canais. Para essa etapa, será essencial o redesenho dos mapas escolhi-
dos e a busca por traduções do conteúdo apresentado.
A terceira etapa no método será a análise das representações pictóricas. Será necessário
compreender o contexto em que foram produzidas, para avaliar qual a função destas ima-
Figura 7: Lição de Anatomia do Dr. Tulp. 1632, Rembrandt. Fonte: Wikimedia Commons. gens no momento de sua produção. Também serão investigados os autores e a relação que
Dessa maneira, as possíveis interpretações sobre as obras pictóricas irão assumir como eles estabeleceram com as cidades das Américas e com a Holanda.
base estudos já existentes, de onde extraímos os fundamentos para a nossa compreensão. Como Etapa Pré-Iconográfica, teremos o reconhecimento nas imagens dos elementos apre-
É dessa maneira que sabemos que não estamos nos inserindo numa narrativa fantasiosa sentados nos mapas, tanto arquitetônicos e infraestruturais quanto naturais, bem como de
quando vemos as embarcações holandesas na paisagem brasileira ou norte-americana nas possíveis pessoas apresentadas em cena (agentes de intenções práticas). Em seguida, as eta-
paisagens do Século XVII como símbolo de dominação, pois a ampla literatura já nos dá base pas Iconográfica e Iconológica serão trabalhadas em conjunto, nas quais iremos descrever as
cenas e a relação entre os objetos representados e as narrativas históricas já existentes sobre
30 36 BURKE, 2017.
Mauritsstad e Nieuw-Amsterdam. 31
02 UMA REPÚBLICA NO
DELTA DO RIO RENO
De início, precisamos entender quem são estes colonizadores. Atualmente, diversos ter-
mos podem ser usados como gentílico dos Países Baixos. O termo “holandês” se refere aos
habitantes do Condado da Holanda, onde fica Amsterdam, uma região muito importante
mas que não abrange toda a nação. Já “flamengos” diz respeito aos nativos do Condado de
Flandres, território não existente atualmente e parte da formação original dos Países Bai-
xos, hoje usado para designar todos os falantes do neerlandês e também os habitantes da
região belga de Flandres. Outro termo usado é “batavo”, criado durante o Império Romano
para representar os habitantes do delta do Rio Reno no Mito de Batávia, narrativa retomada
33
como afirmação cultural em tempos de construção identitária01. Hoje em dia, tem-se como mental que durou de 1588 a 1795, quando foi proclamada a República Batava.
mais correto o termo “neerlandês”, que designa todos os habitantes dos Países Baixos. No
entanto, por razões culturais e históricas, assumiremos os termos Holanda e Holandês pela
presença já estabelecida na literatura histórica brasileira02 e nos relatos contemporâneos03
sobre o período.
Nesse sentido, para a construção desse capítulo foram estruturados cinco subtópicos. Ini-
cialmente, discutiremos a Era de Ouro Holandesa a partir das particularidades que levaram
ao desenvolvimento cultural e econômico do país. Passaremos então para uma apresenta-
ção da arte holandesa setecentista, na qual tomaremos como foco as pinturas de paisagem
e as representações pictóricas de cidades holandesas. Em seguida, estudaremos o meio ur-
bano holandês, tomando Amsterdam como exemplo, prosseguindo com a análise dos prin-
cípios teóricos do plano de cidade ideal de Simon Stevin, influência direta na produção de
assentamentos urbanos pelos holandeses em terras do ultramar. Por fim, apresentaremos os
empreendimentos colonizatórios da Holanda, a atuação das companhias colonizatória e as
artes visuais como meio de divulgação das conquistas holandesas.
Em 1555, as terras que hoje compõem os Países Baixos foram concedidas pela dinastia de
Habsburgo a Filipe II, rei da Espanha. Assim foi iniciada uma série de tensões que culmina-
ram na Guerra dos 80 Anos04, conflito estabelecido entre as províncias dos Países Baixos e o
Estado Espanhol. Um dos momentos-chave desse conflito, foi a assinatura da União de Utre-
cht, em 1579, um acordo entre as sete províncias do norte que clamavam independência05.
Como resultado, houve o estabelecimento da República Holandesa, um sistema governa-
Nas artes, de acordo com Ernst Gombrich12, os holandeses mantiveram uma certa distância
das tendências barrocas da Europa Católica, nas quais predominava a aspiração a uma bele-
za supraterrestre13 e um consequente distanciamento da realidade perfeita em sua simplici-
dade, como descrita pelos renascentistas.
O estado de espírito barroco era diretamente vinculado aos ideais da Contrarreforma. Esse
movimento buscava a valorização da realidade transcendental (metafísica) como reação
aos questionamentos que os avanços científicos e culturais do século XV levantaram, muitas
vezes distantes do interesse do clero. Como a Holanda era um país protestante, o barroco
católico não foi predominante, de maneira que a produção artística do período se vincula
muito mais aos ideais de estabilidade, harmonia e busca pela perfeição vistos no cinquecen-
to italiano, com as composições de paisagem remetendo a um estilo tectônico, com formas
fechadas em composições contidas em si mesmas e vinculadas a uma série de regras, como
a valorização de linhas horizontais e verticais e o equilíbrio entre as laterais das telas14.
Mas mesmo que este controle visual esteja sempre vinculado à produção de representações
pictóricas, é nele que reconhecemos a visão do artista e o seu interesse em passar para a pos-
teridade aquilo que foi apreendido. E nesse sentido se reconhece a paisagem, justamente pela
interação entre o objeto e a visão de quem o observa.
Assim como fez Marsely Kehoe19 em “Dutch Batavia: Exposing the hierarchy of the dutch colonial
city”, iremos retomar os princípios vinculados à produção de cidades holandesas através de
dois exemplos paradigmáticos: a cidade de Amsterdam e o plano de cidade ideal de Simon Ste-
vin. Em seu texto, Kehoe teve como foco a ordem na forma urbana que reforçava a ideia de hie-
rarquia entre camadas sociais distintas. Aqui, iremos procurar discutir de maneira abrangente
Figura 10: “Uma curva no Herengracht”, 1685, Gerrit Adriaensz Berckheyde. Rijksmuseum, Amster- quais são os elementos encontrados nos planos das cidades, para então entender a paisagem
dam. Fonte: Wikimedia Commons. urbana holandesa no século XVII.
De acordo com Burke17 ao retomar o pensamento de Svetlana Alpers, a cultura holandesa en- O crescimento espontâneo de Amsterdam levou a uma série de expansões urbanas que modi-
corajava a “arte de descrever”, o que agrega um certo valor documental às obras de paisagens ficaram fortemente a paisagem da cidade, mas que mantiveram a relação íntima entre o terri-
do período. É nesse sentido que ele cita a obra “Uma curva no Herengracht” (figura 10) de 1685, tório e os corpos d’água. No mapa de Amsterdam de 1662 (figura 11) é possível reconhecer esse
produzida por Gerrit Adriaensz Berckheyde. Nessa tela, encontramos uma representação de processo de crescimento da cidade através de uma expansão radial, por meio de anéis que
uma cena urbana com claros traços estilísticos que visam a uma valorização estética da cidade. assumiam como centro o núcleo inicial da cidade. De acordo com Spiro Kostoff20
Nela, nos deparamos com diversas interações em paralelo, sem haver um personagem prota-
18 BURKE, 2017, p. 130.
16 GOMBRICH, 2015. 19 KEHOE, Marsely L. Dutch Batavia: exposing the hierarchy of the dutch colonial city. 2015.
40 17 BURKE, 2017, p. 129. 20 KOSTOFF, 1991. p. 136 41
O plano de expansão urbana de 1607 simplesmente assumiu os canais no núcleo inicial, com uma forma mais orgânica, quanto nas áreas de expansão, onde assu-
que formavam os limites da cidade e traçou três canais circundantes no miram um caráter de rigidez geométrica.
território não ocupado. O primeiro dos três – O Heerengracht – foi cons-
truído onde estava a antiga muralha de 1593, e os outros dois foram cons- Devido aos conflitos que se desenvolviam na Europa, a fortificação e o militarismo se fa-
truídos em paralelo. ziam presentes para o desenvolvimento urbano dessas regiões, e isso pode ser observado
na presença da muralha externa, cuja função se expandia para além de dispositivo bélico e
despontava como elemento de limite ao crescimento da cidade, também sendo uma parte
essencial à forma urbana assumida por Amsterdam.
Já o ambiente construído era fortemente caracterizado pelas casas às margens dos canais
(Canal Houses). Devido à falta de espaço e à alta demanda por moradia, os terrenos para a
construção eram estreitos (com 9m como largura padrão de lote) e o pagamento de impos-
tos assumia a largura dos imóveis como parâmetro. Assim, as residências se desenvolviam
de maneira vertical, ocupando normalmente de dois a quatro pavimentos.
De acordo com Jacquelien Canoo21, as fachadas das casas são compostas de três seções
com distinções visuais a partir da forma ou do uso de materiais. A parte inferior, chamada
de plinth, é onde reside o contato direto com a rua e com o canal. Na parte intermediária, fa-
çade-plane, há destaque para as janelas, que acentuam a verticalidade das edificações pela
proporção alongada. Já a parte superior, gable top, que esconde o telhado, atua diretamente
na plasticidade da forma assumida pelas edificações por ser construída em desenhos parti-
culares a cada edificação. Entre as diversas possibilidades, destaca-se o frontão escalonado,
que se tornou muito frequente na arquitetura residencial das colônias holandesas. Desta-
ca-se, também a presença de um gancho para içar móveis, posicionado ao centro do gable
top e necessário às casas estreitas que não facilitavam o manuseio do mobiliário nos interio-
res. Entre os prédios públicos, merece atenção especial a Prefeitura de Amsterdam, também
sede do banco, que foi “uma das primeiras aplicações do estilo renascentista italiano a uma
estrutura civil monumental”22 e tornou-se referência para a construção de prefeituras duran-
te séculos.
Figura 11: Mapa de Amsterdam, 1662, Daniel Stalpaert. Fonte: Biblioteca da Universidade de Amster-
A paisagem urbana de Amsterdam pode ser evidenciada através de algumas pinturas do sé-
dam, Amsterdam.
culo XVII (figuras 10, 12 e 13). Nelas vemos a proximidade da cidade aos corpos d’água, que
Nota-se, também, que a cidade estava se desenvolvendo através de um grid, ou seja, de uma
malha de quadras que assumia a expansão radial como diretriz de crescimento. As vias prin-
21 CANOO, Jacquelien. Aan ‘De Gracht’: Exception in the Amsterdam Canal Ring. 2016.
cipais para circulação foram posicionadas em direção ao centro e vias locais perpendiculares
22 CHING, Francis D. K.; JARZOMBEK, Mark; PRAKASH, Vikramaditya. História Global da Arquite-
a estas. Os canais eram parte integrante do sistema de circulação da cidade e surgiram tanto
42 tura. 2016, p.547 43
são elementos protagonistas das pinturas de paisagem do período. A presença dos canais Nessa pintura, ressaltamos a presença da ponte, instrumento infraestrutural e arquitetônico
fazia parte não apenas do cotidiano dos moradores, como também surgia como elemento necessário às dinâmicas urbanas e que impacta a paisagem justamente por surgir em meio
estético e simbólico de Amsterdam, sendo retomados em seu aspecto visual pelos pintores aos percursos feitos pelos canais, possibilitando as travessias dos pedestres e conectando
do período. espacialidades distintas.
Figura 12: Vista do Porto de Amsterdam: o Lago IJssel nas proximidades da ponte nova, entre 1641 e
1692, Jocobus Storck. Fonte: Wikimedia Commons.
O porto era um elemento bastante representado, como visto na figura 12. A presença de vá-
Figura 13: Vista do Rio Amstel em Amsterdam, entre 1747 e 1785, Gerrit Toorenburgh. Mauritshuis,
rios barcos indica a movimentação intensa e a forte atividade comercial. Nessa cena, conse-
The Hague. Fonte: Wikimedia Commons.
guimos ver com bastante clareza a arquitetura tradicional holandesa, com as casas estreitas
e os frontões diversos. Também percebemos a presença das embarcações indicando o pro- PRINCÍPIOS PARA O ORDENAMENTO DAS CIDADES
tagonismo da tecnologia náutica no desenvolvimento do país. O caráter urbano da cidade se
Simon Stevin (1548-1620) foi um matemático e engenheiro militar da região de Bruges reco-
faz presente a partir da presença da aglomeração de pessoas, indicando a simultaneidade
nhecido por trazer avanços à técnica e à teoria da produção de fortificações e assentamentos
e as diversas dinâmicas interpessoais que se desenrolam no meio urbano, assim como visto
militares. Ele tinha uma relação muito próxima com o Príncipe Maurício de Nassau, conheci-
na figura 10.
do na Holanda pela ação militar durante a Guerra dos 80 Anos23. Entre as produções teóricas
Já na figura 13, há uma composição que apresenta um conjunto de edificações em volta
dos canais. Podemos perceber que a regularidade no tamanho dos lotes e na altura das ca- 23 Não confundir o Príncipe Maurício de Nassau com seu sobrinho, o Conde João Maurício de
sas traz uma uniformidade ao desenho urbano que agrega à construção identitária do local. Nassau, conhecido pelos brasileiros por ser o principal administrador e financiador do Brasil Holandês
44 e pela atuação direta na construção de Mauritsstad (a Cidade Maurícia), que inclusive recebe dele o 45
de Stevin, destacam-se diversos tratados como o De Sterctenbouwing (A Arte das Fortifica-
ções), um manual para a construção de fortes, o Wisconstighe Ghedachtenisssen (Pensamen-
tos em Matemática), com um dos capítulos debatendo a ordem urbana, e o Castramentatio,
sobre a organização de acampamentos do Exército24.
Nos textos “Vande Oirdening der Steden” e “Vande Oirdening der deelen eens huys met ‘t
gheene daer ancleeft” (“Sobre o ordenamento das cidades” e “Sobre o ordenamento das
partes de uma casa e todos os aspectos relacionados”25), escritos como partes de um tratado
não publicado em arquitetura e planejamento urbano, Stevin se baseia nos princípios do
Renascimento Italiano para traçar uma teoria sobre as cidades holandesas e a arquitetura re-
sidencial. Nesses trabalhos, escritos em torno de 1590, foi apresentado o esquema de cidade
ideal (figura 14) tido por Ron van Oers26 como uma das principais referências na fundação de
assentamentos ultramarinos holandeses e que pode ser lido como uma reunião dos princí-
pios valorizados por essa civilização na organização do meio urbano.
Assim como nos sugere Phillipe Panerai27, podemos dar início à compreensão da forma de
uma cidade pela investigação de dois tipos de elementos: “aqueles que organizam a expan-
são (linhas e polos) e aqueles que a contém (barreiras e limites)”. No caso da cidade ideal
de Stevin e de diversas outras cidades das Idades Medieval e Moderna, encontramos como
limites a fortificação, que nesse caso é uma muralha retangular repleta de baluartes e con-
tornada por um canal de defesa.
Como eixo estruturador pode ser citada a rede de canais, construída a partir de um canal
central e dois paralelos, elemento divisor da trama urbana em quatro área semelhantes. É
interessante observar que, assim como no caso de Amsterdam, a cidade ideal de Stevin toma
como referência a relação com as águas tanto para o estabelecimento de limites quanto para
organizar a expansão urbana. Essa relação é corroborada com a argumentação do próprio Si-
nome.
24 WEEBERS, Robert; AHMAD, Yahaya; MA, Zuraini. Simon Stevin’s ideas on settlements. 2011.
25 Tradução nossa a partir da tradução para o inglês apresentada por OERS, 2000, p. 79. “On the
Structuring of Cities” e ”On the Structuring of the parts of a house and everything that goes with it”
26 OERS, Ron van. Dutch Town Planning Overseas during VOC and WIC Rule (1600-1800). 2000.
46 27 PANERAI, Philippe. Análise Urbana. 2006, p. 60.
Figura 14 (página anterior): mon Stevin28 ao dizer que na escolha de um local para implantar um novo assentamento “em A corrida entre esses dois países gerou conflitos diplomáticos. O Tratado de Tordesilhas
O plano de cidade ideal de Si- geral, procura-se por solo fértil, localizado no estuário de um longo rio navegável vindo de (1494) foi um dos documentos assinados que visavam a solucionar esse dilema, e nele havia
mon Stevin. Fonte: Produzido terras distantes, pois esses locais recebem acesso duplo: um para o mar, outro para a terra” a divisão dos territórios do novo mundo em um meridiano estabelecido a 370 léguas a oeste
por Jéssica Duarte e Leonardo
de Cabo Verde. Dessa maneira, as terras a leste do meridiano seriam de domínio português e
Nóbrega com base em KEHOE, A trama urbana é conformada através de um grid regular formando quadras quadradas, um
a oeste ficariam sob regimento espanhol.
2015. Tradução produzida a esquema que permite a flexibilidade e sugere formas de expansão do traçado urbano. Num
partir da tradução para o inglês sentido paralelo ao canal principal, há a distribuição dos principais espaços arquitetônicos De acordo com Murillo Marx31
de OERS; 2000, p. 80-85. e praças, construindo um eixo de importância simbólica e funcional para o meio urbano. É
O oceano Atlântico, conquistado e dominado pelos portugueses e espa-
nele que encontramos a prefeitura, a universidade e a casa real, por exemplo.
nhóis nos séculos XV e XVI, estará, nos séculos XVII e XVIII, sendo navegado
De acordo com Oers29, um dos princípios vinculados à cultura holandesa que se reflete no com mais assiduidade pelos holandeses e ingleses e, em parte, pelos fran-
ceses, colocando, assim, um término no monopólio dos portugueses na
desenho da cidade é a presença de diversas igrejas, possivelmente permitindo o uso por
rota do Cabo. Ingleses, holandeses e franceses, não só passaram a fazer
religiões distintas. Também pode ser citada a importância atribuída aos locais de comér-
concorrência aos portugueses e espanhóis, como também a obstruir a sua
cio, como o Grande Mercado e o espaço reservado para Câmbio, ambos localizados no eixo
navegação, tendo como meta conseguir os grandes lucros obtidos pelos
transversal e aos pontos para compra e venda de mercadorias distribuídos pela cidade. Nes- ibéricos.
se sentido, observamos que a relação intensa com o comércio também veio a se refletir nos
princípios urbanísticos e na forma das cidades projetadas pelos holandeses. A Holanda seiscentista, portanto, teve uma atuação significativa nesse processo, com a ação
colonizatória se vinculando às tradições mercantis emergentes e à economia favorável, em
A COLONIZAÇÃO COMO EMPREENDIMENTO tempos de estabelecimento do sistema capitalista.
No século XV, a Europa buscava se reestruturar economicamente mas o ouro estava esgota- Desde a década de 1590, companhias foram criadas para o comércio de especiarias asiáticas
do e o preço das mercadorias estava crescendo. A cobrança de impostos em postos comer- em diversas cidades das Sete Províncias. Em 1602, o estado unificou essas associações a
ciais intermediários, como Constantinopla e Alexandria, inviabilizava a oferta de especiarias Vereenigde Oost Indische Compagnie (VOC, Companhia Unida das Índias Orientais), estabe-
e produtos vindos da Ásia por rotas terrestres. Com a Espanha ainda não unificada e comba- lecendo a atuação do estado nesse ramo e garantindo a eficiência no comércio por evitar
tendo os árabes em Granada, a Inglaterra e a França envolvidas na Guerra dos 100 anos e a a concorrência intranacional32. O êxito da VOC levou ao estabelecimento da West-Indische
Holanda e o Sacro Império fragmentados, o ambiente tornou-se favorável para os avanços Compagnie (WIC, Companhia das Índias Ocidentais) para o comércio dos produtos prove-
portugueses. Dessa maneira, Portugal deu início aos estudos em tecnologia náutica e aos nientes do Atlântico.
primeiros avanços na expansão marítima europeia30, sendo rapidamente seguida pela Espa-
nha unificada. As companhias tiveram a atuação dividida por um meridiano, semelhante ao proposto no
Tratado de Tordesilhas, e a partir delas foram fundados diversos assentamentos coloniais
por todo o mundo. Essas cidades funcionavam como pontos focais para a troca de merca-
28 STEVIN, Simon. apud. OERS; 2000, p. 81. Tradução nossa: “in general one looks for fertile soil,
located at the estuary of a large navigable river coming from faraway lands, because such places receive
double passage, one out to sea, the other inland” 31 MARX, Murillo. In: HUTTER, Lucy Maffei. Navegação nos séculos XVII e XVIII: Rumo Brasil. 2005,
p. 13-14.
29 OERS, 2000. 32 BICK, Alexander. Governing the free sea: the Dutch West India COmpany and commercial poli-
48 30 VICENTINO, Cláudio. História Geral. 2007. tics 1618-1645. 2012. 49
dorias, marcando a presença holandesa no território e estruturando uma rede de compra e todo o mundo, ou de Frans Post, reconhecido principalmente pelas pinturas de paisagens bra-
venda que normalmente conectava a produção e o extrativismo no interior do território com sileiras do Século XVII.
a ação portuária.
Essa produção se vincula diretamente aos ideais descritivos da arte holandesa do período e
Ron van Oers33 informa que os empreendimentos coloniais das companhias eram diversos, oferece um grande material para retomar os aspectos históricos, artísticos e culturais das terras
podendo ser fortes, entrepostos comerciais fortificados ou assentamentos urbanos. Não ha- invadidas e ocupadas pela República das Sete Províncias, sendo justamente essa a intenção
via distinções claras entre esses tipos, então Oers tenta classificar como assentamentos os dessa pesquisa.
que atendem aos quatro aspectos seguintes:
33 OERS; 2000.
34 Oers descreve esse atributo como “the architectural design of public space”, indicando a in-
tencionalidade estética e funcional dos holandeses seiscentistas ao projetar, organizar e embelezar as
ruas e praças das cidades que fundavam.
50 35 BARLÉU; 1940. 51
03 ONDE CAPIBARIBE E
BEBERIBE SE ENCONTRAM
O NORDESTE OCUPADO
Entre 1580 e 1640, Portugal esteve sob domínio espanhol, formando a União Ibérica. Até
então, portugueses e holandeses mantinham relações comerciais e diplomáticas harmôni-
cas, inclusive com diversas refinarias das Províncias Unidas recebendo exclusivamente o
açúcar brasileiro e garantindo uma parte significativa do lucro aos holandeses01. No entanto,
os conflitos já estabelecidos entre Holanda e Espanha impossibilitaram a continuidade des-
sa parceria quando os territórios portugueses ficaram sob controle dos espanhóis. Devido
às restrições mercantis impostas pelo império de Filipe IV, os holandeses impulsionaram a
ação colonizatória através da invasão de diversos territórios ultramarinos, possibilitada pe-
los avanços na tecnologia náutica e pelo crescimento econômico nacional.
De acordo com Evaldo Cabral de Mello02, os fatores que levaram à escolha do Nordeste brasi-
leiro como foco da WIC foram a condição de possessão lusitana, tornando a América portu-
guesa um elo frágil do Império Espanhol, os lucros proporcionados pelo açúcar e pelo pau-
A única intervenção holandesa sobre o território baiano que permanece nas narrativas his-
tóricas sobre o período é um dique. De acordo com diversas narrativas, esse seria o Dique
do Tororó, contudo, diversos historiadores, como Cid Teixeira, contestam a origem batava
dessa obra, argumentando a impossibilidade da construção de uma estrutura desse porte
em 11 meses. Eles então sugerem a existência de outro dique construído pelos invasores das
Províncias Unidas, menor e não mais existente07.
O ataque seguinte à costa brasileira foi sob o comando de Hendrick Conelisz Loncq, atingin-
do Pernambuco em 1630 e dando início aos ataques em fevereiro. A resposta dos portugue-
ses foi o abandono de Olinda e do povoado do Recife, com a resistência nos fortes recifenses
durando apenas uma quinzena. Até 1632, o objetivo principal dos holandeses era a conquis-
ta do litoral, seguindo a crença de que isso os garantiria o controle sobre todo o Nordeste.
A defesa dos luso-brasileiros visava o bloqueio do acesso dos holandeses à várzea do Capi-
baribe, distrito açucareiro próspero. Foi nesse contexto que, em 1631, Olinda foi incendiada
pelos holandeses.08
Após 1632, a luta continuou a se desenvolver por mais cinco anos numa guerra lenta “de
emboscadas”, uma maneira de lutar com instrumentos disponíveis no território brasileiro,
semelhante às disputas indígenas09. Sem o apoio pleno da União Ibérica, que dedicava seus
maiores esforços a outras batalhas de maior interesse ao Império Espanhol, a resistência
pernambucana não foi bem sucedida e aos poucos os holandeses foram conquistando os
territórios do Nordeste. A expansão começou com a ilha de Itamaracá em 1633, onde cons-
truíram o Forte Orange, seguida por Rio Grande do Norte e Paraíba em 1634 e, por fim, pelo
56 09 PUNTONI, 1992. 57
Mauricio de Nassau-Siegen12, Governador Geral do Brasil Holandês entre 1630 e 1644. Dessa
maneira, temos que
Para garantir o domínio sobre a região10, a WIC adotou uma estratégia que visava a consoli- 13 Stadhouder foi um cargo político na República das Províncias Unidas com funções executi-
vas e militares. O pai de João Maurício de Nassau era primo de Frederico Henrique de Orange-Nassau,
dação do domínio sobre o território pernambucano a partir da substituição do conselho de
príncipe de Orange, Stadhouder das províncias de Holanda, Zelândia e Utrecht entre 1625 e 1647. Entre
governo, até então administração atuante, por uma liderança única. O primeiro candidato
1647 e 1650, o cargo foi ocupado pelo filho de Frederico Henrique, Guilherme II de Orange-Nassau (TI-
pensado pela Companhia foi o oficial polonês Crestofle Arciszewski11, já ativo na Nova Ho-
JDLIJN; s.d.).
landa, mas após indicações pessoais do príncipe de Orange, o escolhido foi o Conde João
14 AB’SABER, Aziz N. et al. História geral da civilização brasileira t.1 v.1. 2007, p. 206.
15 SILVA, Leonardo Dantas. João Maurício: um príncipe renascentista em terras do Novo Mundo.
10 PUNTONI, 1992. 2012.
58 11 MELLO, 2010. 16 PUNTONI, 1992. 59
integravam à economia açucareira, e por atrair a comunidade judaica à Nova Holanda17. Os mente que, além dos portugueses que já habitavam a região e dos holandeses e judeus re-
judeus sefarditas eram importantes agentes na interação entre portugueses e holandeses cém-chegados, conviviam também a população negra escravizada e as comunidades indíge-
por terem conhecimento das duas línguas e essa habilidade, associada à atividade econô- nas. Apesar dos holandeses da metrópole olharem de maneira questionadora a escravidão,
mica já estabelecida pelo grupo no território holandês e à cultura das atividades comerciais o comércio já estabelecido pelos portugueses e espanhóis levou a uma aceitação desse sis-
intrínseca aos grupos judaicos, levaram a uma participação ativa nas atividades mercantis, tema no mundo colonial e também a uma participação ativa nessa economia, inclusive com
em especial como “financiadores da indústria do açúcar, corretores [...] e exportadores açu- a participação direta de Maurício de Nassau22. Apesar da presença de uma narrativa já esta-
careiros”18, permitindo acúmulo de capital à comunidade judaica e gerando uma certa hosti- belecida na cultura popular pernambucana dos holandeses como “bons colonizadores”23, é
lidade em outros grupos populacionais.19 bom ter em mente que eles
No campo cultural, Maurício de Nassau trouxe para o Brasil um grupo de intelectuais liga- estavam interessados em enriquecer — e enriquecer o mais depressa pos-
dos às artes e à ciência, entre eles podem ser citados o poeta Franciscus Plante, os médicos sível — para olhar os escravos com humanidade. Para os escravos era qua-
se um castigo trabalhar para os flamengos. Trabalhavam todos os dias da
Willem Piso e Willem van Milaenen, o astrônomo Georg Marcgrave, os pintores Frans Post e
semana e nem aos domingos tinham licença para folgar ou para invocar
Albert Eckhout20.
seus orixás. Apesar da proibição do trabalho aos domingos, esta não era
A chegada desse grupo ao território brasileiro trouxe uma nova perspectiva à produção artís- respeitada, sobretudo no interior, pelos holandeses.24
tica e científica que se desenvolvia no país e mostra o olhar que Nassau tinha para a cidade
Já na relação com os indígenas, a postura foi diferente para diferentes grupos étnicos, mas
que estava construindo, que incluía a compreensão da colônia também como uma possibi-
de maneira geral, a escravização de indígenas era proibida com um curto momento de ex-
lidade de expansão cultural e demográfica das Províncias Unidas, atitude que se diferencia,
ceção, pois os holandeses buscaram estabelecer uma boa relação com os grupos nativos. É
de certa forma, da exploração prévia portuguesa, na qual a cultura não era prioridade, e tam-
interessante observar que houve momentos de instrução religiosa calvinista para os indí-
bém da atuação da WIC em outros territórios ultramarinos21. No entanto, não devemos en-
genas25, o que nos apresenta certos limites ao ideal de liberdade religiosa pregado na Nova
tender a atitude civilizatória de Nassau como representante de todo o período e nem subtrair
Holanda. Essa liberdade nos parece, então, restrita a grupos europeus e a religiões reconhe-
as intenções exploratórias de sua conduta, visto que o rendimento econômico permanecia
cidas na República das Províncias Unidas, já que aos indígenas a catequese foi estimulada e
como principal propósito da WIC.
aos africanos não sobrava nem tempo para exercer as próprias crenças.
No que se refere à composição étnica e demográfica do Brasil Holandês, é preciso ter em
Em 1640, Portugal resgatou a autonomia administrativa e D. João IV, conde de Bragança, foi
coroado rei. Na articulação diplomática, a monarquia lusitana estabeleceu um acordo com
17 Nesse contexto que foi construída a Sinagoga Kahal Zur Israel, a primeira sinagoga das Amé-
as Províncias Unidas para o combate à Espanha numa trégua que durou de 1641 a 1651. Essa
ricas e hoje o Arquivo Histórico Judaico de Pernambuco.
pacificação levou a uma redução do investimento financeiro e militar das WIC no territó-
18 LEVY, Daniela Tonello. Judeus e Marranos no Brasil Holandês – Pioneiros na Colonização de
rio brasileiro, trazendo conflitos entre a Companhia e Nassau, criticado pelas altas despesas
Nova York (Século XVII). 2008, p. 43.
19 Esses conflitos levaram à expulsão dos judeus do território brasileiro após a reconquista por-
tuguesa. 23 deles conseguiram chegar à Nieuw-Amsterdam, onde estabeleceram atividades comer- 22 MONTEIRO, Carolina; ODEGARD, Erik. Slavery at the Court of the ‘Humanist Prince’. 2020.
ciais. Essa narrativa é apresentada em maiores detalhes na dissertação de Daniela Levy (2008) e liga 23 MENDES, Anderson. O mito do ‘bom colonizador holandês’: o imaginário sobre a colonização
diretamente as duas cidades estudadas nesse ensaio. holandesa em Pernambuco. 2021.
20 SILVA, 2012. 24 MELLO, José Antônio Gonsalves de. Tempo dos Flamengos. 2001, p. 197.
60 21 Ver capítulo 4. 25 MELLO, 2001. 61
pessoais. Isso culminou no fim do período nassoviano e no retorno do conde ao território de Mello30: “este mapa de Golijath é, sem dúvida, o melhor mapa do Recife sob o domínio ho-
holandês26. landês. Melhor, tanto pela representação cartográfica, quanto pela riqueza de informações
de interesse para o historiador”.
Apesar da paz estabelecida entre Portugal e Holanda, os holandeses continuaram a expandir
o domínio territorial no Brasil, estabelecendo uma atmosfera de conflito militar com diversos
líderes lusitanos. Esse fator, associado à revolta de empreendedores luso-brasileiros da eco-
nomia açucareira que questionavam as cobranças excessivas de empréstimos financiados
por holandeses, levou à Guerra da Liberdade Divina27, conflito com diversas batalhas distri-
buídas por todo o território e que deu início à redução da área de influência batava.
Em 1648 e 1649 aconteceram as duas batalhas dos Guararapes, que resultaram em diversas
baixas para ambos os lados. A segunda delas trouxa a derrota incontestável aos holandeses,
levando o Brasil Holandês a uma “existência de moribundo”28 pelos quatro anos seguintes.
Em 1654, o território é plenamente reconquistado pelos portugueses e apenas em 1661 as
Províncias Unidas reconhecem a soberania lusitana sobre o território após o Tratado de Haia,
pondo fim à Nova Holanda.
A CIDADE MAURÍCIA
O Povoado do Recife se ligava à Olinda por meio de um istmo, enunciado nas narrativas do
século 17 como “elemento natural de conexão entre as cidades”36. Nesse istmo estava locali-
zado um pequeno assentamento, no fim da faixa de terra, com um porto para os mercadores
portugueses. Essa região foi ocupada pelos holandeses, que posteriormente se expandiram
para a ilha de Antônio Vaz com o projeto de Mauritsstad. É importante dizer que nesse estudo
consideramos ambos os espaços como parte de um mesmo núcleo urbano. Apesar da sepa-
ração evidente causada pelo corpo d’água, as travessias por barcos e a Ponte do Recife37 já
possibilitavam o trânsito entre os dois espaços com facilidade, permitindo uma compreen-
são conjunta do território.
O projeto para Mauritsstad tem autoria atribuída a Pieter Post38, arquiteto e pintor, irmão
Figura 19: Mapa de Mauritsstad e do Recife, Johannes Vingboons34, c. 1665. Fonte: Wikimedia Com- 35 MENEZES, José Luiz Mota. Ruas sobre as águas. 2016.
mons.
36 LIRA, Flaviana. O olhar sobre o lugar: o Istmo de Olinda e Recife na visão dos memorialistas.
2014, p. 6.
32 MELLO, 1976. 37 A Ponte do Recife se localizava onde hoje está a atual Ponte Maurício de Nassau. A mudança
33 MENEZES, 1978. no nome aconteceu em 1865, segundo dados disponíveis na Biblioteca do IBGE.
34 No mapa de Vingboons, os dois rios estão intitulados como Rio de Capibaribe. É importante 38 Essa atribuição é vista em diversos textos, a exemplo de OERS 2000, mas tem sido questiona-
64 ressaltar esse equívoco, já que o corpo d’água a norte é o Rio Beberibe. da por diversos autores, entre eles MENEZES, 1978. 65
Figura 20: Mapa de Mauritss-
tad e do Recife, 2022. Fonte:
Produzido por Jéssica Duarte
e Leonardo Nóbrega com base
no desenho de Johannes Vin-
gboons disponível no Wikime-
dia Commons.
de Frans Post. Ele tinha grande prestígio junto à casa de Nassau-Siegen, inclusive sendo o contrastar essa distribuição de quadras da Ilha de Antônio Vaz com as do povoado do Recife,
coautor, junto a Jacob van Campen, da Mauritshuis em Haia, a casa de Maurício de Nassau que apesar de mais adensado, possuía quadras construídas de maneira orgânica e dispostas
nas Províncias Unidas. em formas irregulares.
A partir do mapa (figura 20), podemos encontrar diversas características do meio urbano Os dois espaços se ligavam por meio da Ponte do Recife, que foi a primeira ponte de grande
de Mauritsstad que são essenciais à compreensão da sua forma. De início, entendemos que porte no território brasileiro e é considerada um dos mais importantes feitos de Maurício de
tanto no Recife quanto na Ilha de Antônio Vaz, o meio urbano tomava como limites as forti- Nassau. Havia também o projeto para uma segunda ponte ligando a ilha de Antônio Vaz à
ficações (muralhas ou fortes) e as águas. É importante ressaltar que, ao mesmo tempo em várzea42, que inicialmente seria construída como uma continuação da primeira, mas que foi
que a presença abundante de corpos d’água era essencial ao transporte de mercadorias, ela executada em outra localização, à lateral do Palácio da Boa Vista, uma posição mais favorá-
também facilitava a chegada de ataques externos, combatidos pelos militares vinculados à vel à implantação por diminuir a extensão da estrutura.
WIC, assistidos pela própria forma urbana repleta de fortalezas.
Como principal marco visual de Mauritsstad, destacamos o Palácio de Friburgo, cuja impo-
Funcionando de maneira associada às muralhas, estavam os fortes, dos quais destacamos nência e monumentalidade são ressaltadas a partir do grande jardim que o circunda. A pró-
o Forte Frederik Henrik (das Cinco Pontas), o Forte do Brum, o Forte Ernesto e o Forte Waer- pria construção do jardim já nos apresenta uma característica da civilização holandesa no
denburck, reforçando o caráter militarizado do meio urbano e formando um “sistema de- que concerne o pensamento da paisagem, pois moldava o espaço natural às intenções de
fensivo articulado”39. É interessante observarmos que a área urbana apresentada no mapa é embelezamento. O local escolhido para a implantação do palácio e do jardim foi a extremi-
limitada tanto pelas muralhas quanto pelos fortes, que funcionam como estruturas pontuais dade norte da ilha de Antônio Vaz de maneira um pouco isolada do meio urbano e “reunindo
de união entre as muralhas leste e oeste dos limites da cidade. E assim como sugeria Stevin, características de chácaras”43. Isso permitia uma visão privilegiada do palácio aos observa-
Maurícia possuía canais inseridos no próprio meio urbano e nos pontos de encontro entre a dores posicionados no povoado do Recife e também aos que caminhavam no istmo. A altura
cidade e o mangue. Eles serviam tanto para a proteção das próprias muralhas, ao contorná- das torres favorecia a sua percepção em diversos pontos da cidade, reforçando o caráter
-las, quanto para o escoamento das águas pluviais, para o transporte de mercadorias e para simbólico e monumental da arquitetura e da presença de Maurício de Nassau no Recife seis-
o fluxo de pessoas. centista.
Também é perceptível a aplicação de um desenho racional a esses canais, cuja forma des- O Palácio da Boa Vista era menos monumental que o de Friburgo e foi construído numa plan-
ponta como eixo regulador da distribuição de quadras na porção sul da Ilha de Antônio Vaz. ta quadrada com quatro torres nos vértices e um volume central mais alto. Ele se localizava
O grid foi disposto de maneira bastante semelhante ao plano de Stevin, seguindo uma malha junto à saída de Mauritsstad em direção à Várzea e tinha como objetivo “impressionar os
ortogonal e criando espaços livres a serem ocupados por mercados40. É importante ressaltar visitantes e alertar possíveis invasores”44
que a primeira área construída é localizada próxima ao Forte Ernesto, enquanto que a região
Quando analisamos a arquitetura de Mauritsstad, percebemos uma mistura de caracterís-
ao sul, na direção do Forte Frederik Henrik e separada da inicial por um canal paralelo à
ticas típicas das produções portuguesa e holandesa. Apesar de encontrarmos frontões es-
Ponte do Recife, é a “Nova Mauritsstad”41, resultado da expansão do núcleo. É interessante
calonados aos moldes do gable top holandês e do guincho para o transporte de móveis ao
Os frontões escalonados de feição batava não apresentam a verticalidade Esse debate nos apresenta a construção de uma arquitetura muito particular ao contexto re-
das construções na Holanda, e o fato de os prédios estarem geminados cifense, com um inédito hibridismo luso-holandês que tem limitações espaciais e temporais,
mostra que os postulados germânicos vigentes nos Países Baixos no que
reduzindo essa produção à condição de pontualidade na história da arquitetura.
se refere à obrigatoriedade do afastamento lateral dos prédios entre si
não foram integralmente respeitados. PALÁCIOS, FORTES E PONTES
Essa diferença se dá, claro, pela diferença de adensamento populacional entre Mauritsstad Além de resultado de um impulso artístico e criativo, as pinturas de paisagem nos territórios
e as cidades holandesas, e também pela presença portuguesa, já que grande parte dos habi- ultramarinos despontavam como uma maneira de divulgar aos europeus as conquistas dos
tantes da região permaneciam com costumes lusos e a administração da WIC era favorável à impérios mercantis em fase de consolidação. A comitiva de Maurício de Nassau trouxe ao
diversidade cultural. No entanto, o argumento de Weimer se baseia nas construções na ilha Brasil cientistas e artistas com produções diversas, entre eles, se destaca o pintor Frans Post.
de Antônio Vaz em tempos de ocupação inicial, consideravelmente menos adensada que o De acordo com Bia e Pedro Corrêa do Lago48, ele “não só é o primeiro pintor da paisagem
povoado do Recife. Quanto ao povoado, Ron van Oers comenta que “a demanda por espaço brasileira, mas também o primeiro paisagista das Américas. Ele ocupa, para a arte brasileira,
no istmo levou ao surgimento de fachadas altas e casas próximas similares às holandesas, uma posição de importância primordial como primeiro artista estrangeiro a descobrir nossa
derivando de condições similares e adaptadas às necessidades locais”46. Também sobre a paisagem”.
arquitetura dessas casas, José Luiz Mota Menezes comenta que47
Entre suas pinturas, percebe-se um interesse pela paisagem natural da Mata Atlântica e tam-
Juntas, moradias com características flamengas e portuguesas. As mora- bém um fascínio pelas ruínas de Olinda, destruída após o incêndio. A partir do conjunto de
dias portuguesas, com telhados em quatro águas, balcões e esquadrias telas, em grande parte agrupadas no Instituto Ricardo Brennand em Recife e apresentadas
em madeira, sem uso do vidro, são semelhantes àquelas observadas em
no catalogue raisonné publicado em 200649, podemos ter uma compreensão abrangente da
outras partes do Brasil, Salvador, por exemplo, e onde, na composição os
arquitetura do nordeste brasileiro tanto no que se refere aos engenhos de cana de açúcar
cheios dominam os vazios. As aberturas, ao quadrado, são demarcadas
por uma moldura, de madeira ou pedra. A composição é simétrica e bas-
quanto às igrejas construídas pelos portugueses.
tante singular se comparada às de origem flamenga. As casas flamengas,
em cobertura de duas águas, trazem à frente a empena em degraus, usual
nos Países Baixos.
21b 21d
72 73
Em número menor, mas ainda em grande importância, está uma série de ilustrações de Mau- meio urbano. Entre esses outros marcos visuais, podem ser citados o Forte Ernesto (marcado
ritsstad que nos indica indícios da paisagem construída nesse assentamento urbano. Toma- pela letra B), a cúria (letra C) e a Igreja Francesa (letra D).
remos como ponto de partida três ilustrações de Post que compõem o livro de Gaspar Bar-
A Ponte do Recife aparece ainda em fase de construção, o que pode representar, de certa
léu50, cujos títulos são Mauritiopolis (figura 21), Fribvrgvm (figura 22) e Boa Vista (figura 23).
maneira, o processo de consolidação da cidade e a continuidade dos avanços da administra-
Em Mauritiopolis, vemos uma panorâmica ampla do conjunto urbano de Mauritsstad. É ção de Nassau no período que estava sendo retratado. É interessante olhar em conjunto essa
um dos documentos fundamentais para entender a relação entre a Ilha de Antônio Vaz e ponte, que estava sendo erguida em pedra, com a ponte apresentada na figura 23, ao lado
o Povoado do Recife. Na figura 21d podemos perceber que o povoado do Recife era mais do Palácio da Boa Vista, em madeira e muito menos imponente.
verticalizado e os telhados das casas eram muito inclinados, se assemelhando ao modo de
Na extremidade direita da ilustração (figura 21d), observamos a movimentação do Porto do
produzir holandês. Podemos ver, então, que apesar de Antônio Vaz compreender uma área
Recife, se assemelhando às representações de Amsterdam. Nela observamos a chegada e
muito maior e reunir diversos edifícios importantíssimos, como a Igreja Francesa, o Palácio
partida de diversas embarcações e uma sobreposição visual que sugere a simultaneidade
da Boa Vista, o Palácio de Friburgo e as três praças-mercado apresentadas no mapa (figura
das atividades mercantis.
20), o povoado a leste permanecia como centro focal da urbanidade, sendo uma área já con-
solidada e densificada.
É interessante, também, comparar a variação dos tipos edilícios no sentido sul, para a es-
querda da imagem, que nos mostra a Nova Mauritsstad como uma região de expansão ainda
em fase de implantação. Nesse sentido, podemos supor que nem todas as quadras estavam
ocupadas, pois a figura 21a nos apresenta a muralha dessa área ainda não plenamente cons-
truída.
Como marcos visuais que se destacam no meio urbano, citamos principalmente o Palácio de
Friburgo, ao centro da composição (figura 21b), realçado tanto pela verticalidade como pela
ausência de edificações no entorno próximo. Segundo a conceituação de Frederico de Ho-
landa51, podemos entender a construção visual do Palácio de Friburgo como uma produção
que se aproxima do Paradigma da Formalidade, ou seja, era uma espacialidade construída
com o intuito de atingir um determinado aspecto visual, nesse caso com intenções de refor-
çar o caráter simbólico a partir da monumentalidade. Ao passo que o Palácio é construído
segundo esse paradigma, o restante da cidade parece se desenvolver de maneira muito mais
próxima ao Paradigma da Urbanidade, com um conjunto urbano densificado e diverso, pois
ainda que houvesse construções monumentais, como as igrejas, elas estavam inseridas den-
tro do conjunto, favorecendo uma variedade tipológica e de usos conveniente à ocupação do
50 BARLÉU, 1940.
74 51 HOLANDA, Frederico. O Espaço de Exceção. 2002. Figura 22: Palácio de Friburgo, Frans Post, 1647. Fonte: Brasiliana Iconográfica. 75
Já na ilustração produzida sobre o Palácio de Friburgo (figura 22), podemos compreender
22a
perfeitamente as intenções paisagísticas na implantação dessa arquitetura em meio aos
amplos jardins em diálogo com os corpos d’água. Na aproximação, torna-se claro o efeito
visual atingido com a sequência de palmeiras, funcionando na construção de um ritmo de
elementos verticais em meio ao horizonte e harmonizando com as duas torres do Palácio.
É interessante reforçar que essa era a vista para quem observava do povoado, tornando o
monumento presente no dia a dia dos observadores, apesar de distante geograficamente e
situado num terreno com características semirrurais.
As extremidades dessa ilustração estão ocupadas pelo Forte Ernesto e pelo Forte Waer-
denburch, construções horizontais e discretas, principalmente quando postas ao lado do Pa-
lácio de Friburgo. Também inseridas na composição estão uma sequência de embarcações
de menor porte, indicando que a área entre o Povoado do Recife e a ilha de Antônio Vaz não
22b
era ocupada por grandes navios.
22c
76 Figura 23: Palácio da Boa Vista, Frans Post, 1647. Fonte: Brasiliana Iconográfica. 77
A figura 23 apresenta o Palácio da Boa Vista, na saída de Mauritsstad em direção à várzea
23a
do Capibaribe. É interessante observarmos que, assim como na ilustração do Palácio de Fri-
burgo, nos deparamos com uma cena mais bucólica e com uma movimentação muito mais
limitada do que a do porto do Recife. E ressaltamos que mesmo num ponto de vista oposto,
permanecemos com o Palácio de Friburgo e a Igreja Francesa como marcos visuais.
Essa ilustração também nos dá indícios da forma de ocupação da ilha de Antônio Vaz pois
percebemos um processo de adensamento na primeira Mauritsstad, com edificações mais
altas e mais próximas, enquanto que a área ao sul, desenhada à direita da ilustração, ainda
se mostrava em processo inicial de ocupação. Como o governo de Maurício de Nassau durou
apenas sete anos e após a sua saída houve o início um período de conflitos entre os holande-
ses e os lusos-brasileiros que acarretou na própria destruição da cidade, podemos supor que
esse estágio não foi muito ultrapassado e que esta, assim como as ilustrações anteriormente
discutidas, refletem o apogeu desse assentamento urbano.
Além dessas ilustrações produzidas por Frans Post para o livro de Barléus, uma outra docu-
mentação iconográfica importante produzida por ele é a pintura a óleo intitulada “Vista da
Cidade Maurícia e do Recife” (figura 24). Nela encontramos a ocupação ainda em estágio ini-
cial, quando não havia Palácio de Friburgo nem Ponte do Recife. O povoado, à esquerda na
23b imagem, surge com um maior adensamento e já aparenta estar consolidado, enquanto que
a primeira Mauritsstad, nas proximidades do Forte Ernesto, ainda está em meio à natureza
num perímetro muito limitado, num caráter de ocupação inicial e exploratória.
Como comentado no capítulo 2, Ron van Oers52 inclui a intenção de embelezamento das ruas
78 52 OERS, 2000. 79
como uma característica dos assentamentos urbanos coloniais da Holanda, tal intencionali-
dade pode ser percebida com as palmeiras ainda jovens delimitando o eixo da passagem que
provavelmente viria a se tornar uma rua, mas que ainda não o era pois não havia a delimita-
ção de edificações em ambos os lados.
Figura 25: Residência de Sua Excelência, Zacharias Wagner, entre 1637 e 1668. Fonte: Revista Fapesp.
Figura 24: Vista da Cidade Maurícia e do Recife, Frans Post, 1657. Fonte: Revista Continente.
Essas construções surgem ainda num momento muito inicial e não apresentam uma ampla
relação com o entorno, de maneira que torna-se difícil através da imagem entender o local
de sua implantação e a sua relação com outras edificações da cidade. Estudos mais apro-
Figura 26: Vista do porto do Recife a partir de Olinda no início do século XVII, Gillis Peeters, entre 1637
fundados sobre a localização dessa primeira residência e sobre a evolução urbana da área
e 1653. Fonte: REIS FILHO, 2000.
podem situá-la melhor na narrativa histórica do Povoado do Recife.
80 81
04 SOBRE A ILHA DE
Na figura 26, encontramos uma vista da cidade do Recife com o observador posicionado em
Olinda. É interessante encontrar as ruínas mais próximas e a cidade vista por completo, pro-
vavelmente num momento próximo ao da figura 24. Nessa época, ainda não havia o Palácio
de Friburgo nem a Ponte do Recife, mas já encontramos a primeira Mauritsstad na Ilha de MANHATTAN
Antônio Vaz, o Forte Frederik Henrik, o Forte Ernesto e um certo adensamento no povoado
do Recife.
Também percebemos o Istmo como um meio de conexão direta entre Recife e Olinda, sendo
muito vinculado à vivência dos que habitavam as cidades da província de Pernambuco no
século XVII, como nos informa Flaviana Lira53. Também podemos ver, agora numa vista única,
o contraste entre a quantidade de embarcações no porto do Recife e no encontro dos rios.
A observação em conjunto das vistas da Cidade Maurícia e do Porto do Recife nos permite
uma compreensão abrangente da construção visual dessas cidades. Podemos perceber, a
partir da visão dos pintores, muitos dos princípios vinculados ao planejamento urbano ho-
landês no Século XVII quando associados à realidade pernambucana. É curioso não encon-
trarmos vistas que representem os canais que cortavam a Nova Mauritsstad nem a muralha
concluída. Nesse sentido, cabe uma investigação posterior com vista ao ponto a que chegou
a execução do projeto, que pode incluir também uma análise documental e de relatos lite- UM TERRITÓRIO MERCANTIL
rários.
A História de Nieuw-Amsterdam teve início na investigação de novas rotas às Índias por per-
cursos saídos da Europa e seguindo no sentido oeste. A área foi encontrada pelo explorador
inglês Henry Hudson em 1609, que comandava uma expedição em nome da VOC, já que
a WIC ainda não havia sido fundada. A navegação atingiu a costa leste do atual território
norte-americano e, após encontrar a ilha de Manhattan, seguiu pelo Rio Hudson, cujo nome
remete ao explorador. O desejado caminho para o oriente não foi encontrado, mas a região
foi reivindicada pelos holandeses e virou, inicialmente, um ponto para o comércio de peles.
Além do interesse comercial e exploratório, a região também se tornou relevante por ser uma
base militar das Províncias Unidas no Novo Mundo, estratégica para possíveis combates no
Atlântico Norte.
Anteriormente à chegada dos holandeses, o território era ocupado por grupos de índigenas,
dos quais se destacam os Weckquaesgecks a sul da ilha de Manhattan e os Reckgawawacks a
norte, ambos da tribo Mohican01. Encontros entre os nativo-americanos e europeus invaso-
Após a chegada de Henry Hudson, o próximo evento a marcar a presença holandesa nas pro-
ximidades da ilha de Manhattan foi o desembarque de 30 famílias de imigrantes flamengos
que saíram da Holanda em 1623 no navio Nieu Nederlandt para dar início à ocupação desse
território. Entre eles estava o engenheiro Cryn Fredericksz, importante personagem desse
momento histórico e portador das instruções da recém-fundada WIC para o início do proces-
so de colonização02.
02 KOOLHAAS, 1994.
03 JORDAN, Louis. A brief outline of the History of New Netherland. 1997.
04 PALTSITS, Victor Hugo. Founding of New Amsterdam in 1626. 1924.
05 JORDAN, 1997. Tradução nossa: “New Netherland was a company-owned and -operated busi-
ness, run on a for profit basis by the directors of the West India Company. The intent of the firm was to
make a profit for the investors who had purchased shares in the company. WIC paid skilled individuals,
as doctors and craftsmen, to move to New Netherland and also sent over and paid soldiers for military
protection of the settlements”.
06 A colônia holandesa no Brasil foi nomeada como Nieuw-Holland e a colônia na América do
Figura 27: Assentamentos europeus e tribos indígenas na América do Norte em 1650. Fonte:
Norte recebeu o nome de Nieuw Nederland. A opção nesse trabalho para traduzi-las em termos distin-
produzido por Jéssica Duarte e Leonardo Nóbrega com base em The History of America.
84 tos foi de chamar respectivamente de Nova Holanda e Novos Países Baixos. 85
e uma operação comercial, gerida com vista à produção de lucro Não eram um canteiro para transplantar a cultura batava ao
pelos diretores da WIC. O intento da firma era lucrar para os in- novo mundo. Não eram uma oficina ou uma plantação para a
vestidores que haviam comprado participação na companhia. A produção de mercadorias. Eram, pura e simplesmente, um lu-
WIC pagava indivíduos, como médicos e artesãos, para se mudar gar onde produtos europeus manufaturados e baratos (facas,
para os Novos Países Baixos e também enviava soldados assala- machados, cobertores, panelas de ferro, pregos) poderiam ser
riados para a proteção militar dos assentamentos. trocados por itens do local de origem (peles vestidas e curadas09)
que iriam obter um bom preço ao retornar.
Dessa maneira, percebermos a atuação da WIC é essencial para o entendimento da própria
cidade, já que ela era, em si, um empreendimento econômico. Nesse momento da história, Apesar dos Novos Países Baixos serem uma colônia em um estágio de desenvolvimento di-
as leis eram produzidas por funcionários da companhia e ela controlava todo o comércio in- ferente do Brasil à mesma época, essa estratégia de ocupação permitiu o controle de uma
ternacional dos produtos cultivados e encontrados na colônia, retendo uma grande parte do ampla área da América do Norte às Províncias Unidas durante grande parte do século XVII
lucro. Nessa máquina burocrática, destacava-se a presença do Diretor Geral como principal (figura 28).
figura no controle da operação colonizatória e mercantil.
Um personagem importante nesse momento histórico foi Peter Stuyvesant, escolhido em
Como os custos operacionais da expansão territorial eram expressivos, uma estratégia ado- 1647 como o quinto (e último) Diretor Geral da colônia e administrador de Nova Amsterdam.
tada pela WIC foi o estabelecimento em 1628 do plano de Patrocínio07 (Patroonship plan), um A decisão partiu da busca da WIC por uma personalidade forte, assim como havia aconteci-
recurso administrativo que moldou a expansão colonial nos anos iniciais de ocupação ho- do no Brasil, para gerir o empreendimento e melhorar a cidade de Nieuw-Amsterdam, cujas
landesa. A ideia era atrair mais colonos para o território sem elevar os custos da companhia, condições de habitabilidade eram precárias10.
assim os patronos receberiam um grande território e os direitos de exploração, em retorno,
Ele veio da Senhoria de Físia, no norte das Províncias Unidas, sendo parte de uma família
eles iriam levar os imigrantes e colonizar o território às próprias custas. No entanto, não hou-
calvinista e muito religiosa. Em 1630, ele atuou como agente comercial em Fernando de No-
ve adeptos ao programa segundo esses parâmetros, pois a pesca e o comércio de pele, prin-
ronha, na costa brasileira, e havia participado de operações contra os portugueses. Em 1635,
cipais produtos comercializados à época, eram monopólios da companhia.
foi transferido para Pernambuco, onde permaneceu até 1638, quando passou a atuar em
Essa situação veio a ser modificada em 1629 com a flexibilização do programa e a autoriza- Curaçao, uma ilha holandesa no Caribe. Lá, ainda com cerca de 30 anos, se tornou o gover-
ção para o comércio dessas mercadorias com a Virgínia e a Nova Inglaterra mediante o paga- nador dos territórios de Curaçao, Aruba e Bonaire11. Portanto, Stuyvesant, apesar de jovem,
mento de taxas. Esse sistema atraiu o interesse de mais indivíduos e possibilitou a expansão já era um dos oficiais da WIC mais bem sucedidos no Novo Mundo. Entre suas conquistas
territorial da colônia com a construção de novos assentamentos, dos quais destacamos, nas para Nieuw-Amsterdam, podem ser citadas, principalmente, a expansão dos investimentos
proximidades do Forte Orange, a colônia de Rensselaerswyck sob a administração do patro- na cidade, o incentivo à construção civil e a busca por um ambiente urbano com um caráter
no Kiliaen van Rensselear. Era, então, o início do estabelecimento de uma rede mercantil e
produtora de matriz holandesa em interação com colônias de outros países europeus dis-
postos sobre a América do Norte. a workshop or plantation for the production of commodities. It was, purely and simply, a place where
cheap European manufactured goods (knives, axes, blankets, iron pots, nails) would be exchanged for
those items of local origin (dressed and cured pelts) that would fetch a good price back home.”
É nesse sentido que Burrows e Wallace08 nos informam que os Novos Países Baixos
09 Vestir e curar (dress and cure) eram processos feitos pelos nativo-americanos para conservar
e preparar as peles.
07 JORDAN, 1997.
10 KRIZNER, L. J.; SITA, Lisa. Peter Stuyvesant. 2001.
08 BURROWS, Edwin G.; WALLACE, Mike. Gotham: A History of New York City to 1898. 2000, p.
86 24-26. Tradução nossa: “It wasn’t a seedbed for transplanting Dutch culture in the New World. It wasn’t 11 BURROWS, WALLACE, 2000. 87
mais holandês (inclusive a partir da legislação12). Essa administração é, portanto, tida como eles não tinham uma população grande o suficiente para ocupar todos os territórios que
auge do domínio holandês no território dos atuais Estados Unidos. estavam colonizando no ultramar. Dessa forma, diversos imigrantes eram de outras etnias. É
nesse sentido que Geert Janssen14 nos informa que:
Já Louis Jordan15 nos informa que cerca de metade da população não era holandesa. Havia
um número significante de alemães, suecos e finlandeses que chegaram após 1639, grupos
expressivos de ingleses reunindo cerca de 2000 colonos ao longo de todo o território dos No-
vos Países Baixos (provenientes dos espaços de ocupação inglesa e ocupando, em especial,
Long Island ou as proximidades do Rio Connecticut), além de grupos de africanos escraviza-
dos e a comunidade judaica que emigrou do Brasil após o declínio da Nova Holanda.
Pouco restou do passado holandês na então recém-criada Nova York, assim como aconteceu
no Recife, pois ela
De acordo com Gerard Koeppel25, a extremidade sul da ilha apresentava uma morfologia O núcleo urbano de Nieuw-Amsterdam assumia como limites as águas e a muralha ao norte.
familiar à cultura holandesa, pois era um território pantanoso, em contraste com a massa Podemos interpretar a via Heeren Straat como o principal eixo estruturador da forma urbana
rochosa ao norte. Nesse sentido, cabe ressaltar a diferença de escala entre a Ilha de Antô- tanto pela sua grande dimensão (ressaltada pelos ingleses ao renomeá-la como Broadway,
nio Vaz e Manhattan, pois enquanto Antônio Vaz possuía cerca de 0,5km², Manhattan possui via larga) quanto pela continuidade ao restante da ilha, já que era também um eixo viário
50km², apesar do perímetro ocupado em Nieuw-Amsterdam de apenas 0,24km² 26, assim tor- para o fluxo regional.
na-se evidente que a ocupação territorial no século XVII não iria se estender por toda a ilha,
O Forte Amsterdam é um ponto chave na distribuição espacial da cidade, cuja presença des-
e a decisão sobre a porção a ser ocupada foi uma atitude consciente e essencial à formação
ponta como marco visual e ponto focal, pois as principais vias o tinham como extremidade
do meio urbano.
e havia uma ampla área livre que o circundava. No entanto, não há uma organização formal
No entanto, apesar de surgir de uma escolha consciente e com intenções mercantis, Nieuw- do espaço para recebê-lo que permita a compreensão dessa área urbana como uma área de
-Amsterdam não foi uma cidade nova, segundo os atributos propostos por Ricardo Trevi- intencionalidades simbólicas no momento de planejamento. A inserção do forte em meio
san27. Apesar disso, a compreensão da presença ou ausência de tais características podem ao vazio urbano nos parece muito mais uma consequência da ocupação espontânea e das
nos ajudar a entender a construção e a consolidação do assentamento. dinâmicas que regiam a cidade do que um recurso para a organização espacial da paisagem.
Dessa maneira, temos que a cidade teve um empreendedor, a WIC, e surgiu destinada a uma O traçado urbano se dispõe de maneira irregular com a construção de diversas quadras em
função colonizatória e comercial. Ela também decorre da escolha de um sítio apropriado, grandes dimensões, especialmente quando comparadas ao Povoado do Recife ou a Ams-
como descrito anteriormente, e possui um tempo relativamente preciso de sua fundação, terdam. Com exceção às quadras próximas ao forte, região que podemos interpretar como
com a chegada das famílias imigrantes em 1626. No entanto, não foi executado um projeto o centro funcional da cidade, o restante da ocupação aconteceu por meio de amplos lotes
sob a responsabilidade de um profissional, e isso a torna uma cidade de geração espontâ- com casas próximas às ruas, mas sem contiguidade nas construções. Assim foram formadas
nea, semelhante ao núcleo original de Amsterdam ou ao Povoado do Recife. grandes propriedades e foi estabelecida uma organização espacial mista, com características
urbanas e rurais.
De acordo com Jeroen van den Hurck28, houve um plano entregue pela WIC para o oficial
Willem Verhulst que não foi executado. O autor nos informa que havia instruções a nível de É percebido um canal que adentra o interior de Nieuw-Amsterdam. Apesar de em determi-
planejamento prevendo a distribuição de lotes, a inserção de equipamentos públicos de nado ponto ele dar origem a um outro canal menor e perpendicular, ainda não encontramos
grande porte e a construção das fortificações, com ideias que se aproximavam muito mais às uma rede de canais formada como estava sendo proposta em Mauritsstad ou como havia se
influências de cidades coloniais ibéricas do que aos postulados de Simon Stevin. No entanto, estabelecido em Amsterdam. Também não eram vistos canais acompanhando a muralha de
limite da cidade. No entanto, a própria presença dessa infraestrutura em tempos iniciais já
25 KOEPPEL, Gerard T. Water for Gotham. 2000.
nos mostra que a tradição holandesa estava, ao menos em parte, sendo aplicada na constru-
ção da cidade. Ressaltamos, também, a presença de algumas pequenas pontes para possi-
26 Dados extraídos com sobreposições de polígonos para o cálculo de área no Google Earth
assumindo as semelhanças entre os traçados original e atual como referência.
bilitar as travessias aos canais.
27 TREVISAN, 2020. A extremidade sul da ilha favorecia a atividade portuária, necessária ao funcionamento da
28 HURK, Jeroen van den. Plan Versus Execution: The “Ideal City” of New Amsterdam. Seven- colônia. Esta se concentrava nas proximidades dos diques, na face sudeste do núcleo ur-
94 teenth Century Netherlandic Town Planning in North America. 2015. 95
Figura 30: Mapa de Nieuw-
-Amsterdam, 2022. Fonte:
Produzido por Jéssica Duarte
e Leonardo Nóbrega com base
no Mapa de Castello disponível
no Wikimedia Commons.
bano, próxima à entrada dos canais. É interessante observarmos que tanto o centro da ci- to, existem diversas gravuras que ilustravam os relatos sobre as cidades e algumas pinturas
dade de Nieuw-Amsterdam quanto o Povoado do Recife eram regiões portuárias, foram os que merecem ser analisadas na compreensão dessa cidade.
espaços iniciais da ocupação holandesa e estavam consideravelmente mais adensados que
Começaremos pela mais conhecida, a paisagem produzida por Johannes Vingboons que
outras áreas das cidades.
representa Nieuw-Amsterdam vista da foz do Rio Hudson. Nessa ilustração encontramos a
A arquitetura que se desenvolvia em Nieuw-Amsterdam era predominante residencial ou co- cidade ainda sem o canal cortando o meio urbano, indicando que retrata o momento inicial
mercial de pequeno porte. De acordo com dados apresentados pelo New Amsterdam History da ocupação urbana na região. Vemos diversas sequências de casas muito semelhantes e
Center, as casas eram, em grande maioria, residências de até dois pavimentos com telhado soltas no lote em pontos distintos da cidade. É interessante perceber que tais agrupamentos
bastante inclinado e lareiras. Em alguns casos, eram construídos frontões escalonados ou eram formados, mas havia espaços entre tais núcleos, de maneira consonante à espacialida-
com curvaturas semelhantes aos gable tops holandeses. A maioria das construções possuía de dispersa descrita no Mapa de Castello.
recuos laterais e grandes quintais posteriores e eram normalmente construídas em tijolos
Na figura 31a, o Forte Amsterdam surge como o mais importante marco visual, com uma das
ou madeira. No geral, a cidade possuía uma feição batava a partir das características mor-
construções interiores ao forte numa altura muito mais expressiva que as casas da região.
fológicas da arquitetura residencial, mas não se assemelhava diretamente a Amsterdam, já
Também observamos, ao fundo, o moinho, representado também nas figuras 32, 33, 34 e 36.
muito adensada e permeada de canais. Ela poderia, na verdade, ser muito mais facilmente
Por sua altura e formato, o moinho era visto de diversos pontos da cidade e provavelmente
comparada a cidades interioranas dos Países Baixos.
era entendido como ponto de referência.
Também como marco visual e histórico da presença holandesa, estavam os moinhos de ven-
Também é visível, na figura 31a, o porto de Nieuw-Amsterdam ainda em fase de consoli-
to a oeste do Forte Amsterdam. Eles são representativos de uma tradição econômica que
permaneceu no território novaiorquino após o fim de Nieuw-Amsterdam. O autor John A. Bo-
gaert29 informa que a WIC tinha monopólio do comércio de pães na colônia por grande parte
do período de dominação holandesa e esse negócio assumiu grandes proporções, incluindo
interações com o mercado externo.
E, por fim, ressaltamos a presença dos jardins, dispostos principalmente nas proximidades
da casa de Peter Stuyvesant e nos Jardins da WIC. Encontramos, portanto, mais uma evi-
dência da preocupação dos holandeses com o paisagismo nos assentamentos ultramarinos,
nos levando, mais uma vez, à ideia de estética do espaço público como um dos princípios da
fundação de assentamentos coloniais pelos batavos.
AS CASAS E O FORTE
31b
Figura 32: “Vista do Forte Amsterdam na extremidade da ilha de Manhattan”, c. 1651. Fonte: John
100 Carter Brown Library. 101
Na figura 33 vemos uma aquarela atribuída a Laurens Block que data de 1650. Nela encon- Um elemento visual que é apresentado nessa ilustração é a presença do relevo mais aci-
tramos, assim como na ilustração de Vingboons (figura 31), uma construção interna ao Forte dentado ao fundo da imagem. Ele pode representar tanto a porção norte de Manhattan
Amsterdam como principal marco visual da cidade. Vemos também o conjunto horizontal de como Long Island, mas nos permite perceber o contraste a conformidade plana do relevo de
construções se estendendo ao longo da ilha. A posição do observador nessa cena do lado Nieuw-Amsterdam.
oposto ao forte, e isso mostra que outras áreas, além da representada no Mapa de Castello,
poderiam estar funcionando como porto.
Na figura 34 vemos uma cena com nativo-americanos em primeiro plano e a cidade repre-
sentada ao fundo. Ela é de um período um pouco posterior à Nova Amsterdam, mas prova-
velmente teve como base rascunhos já existentes da cidade com uma vista do meio urbano
que ainda se assemelhava ao existente. Nela já é percebido o canal que corta a cidade e pode
ser visto um conjunto de casas holandesas distribuídas em uma uniformidade horizontal.
São percebidos também alguns diques na região portuária mais importante. É visível, ao
Figura 33: “Nova Amsterdam”, atribuída a Laurens Block, 1650. Fonte: New York Historical Society. fundo, um moinho que provavelmente não é o moinho representado no Mapa de Castello.
Ele pode ser tanto ilustrativo, para mostrar o território como uma potência no comércio de
102 103
pães, quanto representar um outro moinho mais ao norte na ilha de Manhattan.
Essa representação se assemelha bastante à da figura 35, e provavelmente ambas tem ori-
gem na Vista de Nieuw Amsterdam de 1673, ainda não encontrada durante essa pesquisa.
Nessa outra representação, podemos ver com mais clareza o meio urbano e também o Forte
Amsterdam. Nela, não vemos o jardim associado à casa de Peter Stuyvesant (figura 35a), de
maneira que podemos supor que a sobreposição do jardim com novas construções já havia
sido empreendida pelos ingleses após a tomada do território.
104 Figura 35: “Nieu Amsterdam”, c. 1702. Fonte: John Carter Brown Library. 105
PRESENÇAS E
AUSÊNCIAS
A Companhia das Índias Ocidentais (WIC) surge como o principal elo entre as duas cidades,
estabelecendo estratégias de administração e ocupação que são diretamente relacionáveis,
pois é justamente por assumir a colônia brasileira como foco, que o território da América
do Norte foi tratado com menos empenho. O investimento feito pela companhia na Cidade
Maurícia permitiu a construção de uma cidade vinculada a ideais teóricos como os propostos
por Simon Stevin. A presença desse critério de planejamento é percebida, até mesmo, na
distribuição de quadras e na implantação das arquiteturas. Enquanto isso, a ocupação es-
pontânea na América do Norte levou à consolidação de um núcleo com forma orgânica, mais
próxima à dinâmica espacial das centralidades iniciais de cidades europeias.
É percebido nos dois casos, um esforço por parte da WIC em construir um ambiente atrativo
para o comércio, criando um caráter cosmopolita nas duas cidades. No entanto, em Nieuw-
-Amsterdam estava sendo construída uma cidade em meio a territórios ocupados inicial-
mente por indígenas e a rede produtiva estava em fase inicial de estudos de viabilidade e
107
implantação. Dessa maneira, as Províncias Unidas puderam montar um assentamento com visão que observa o conjunto02, encontramos diversas relações estabelecidas entre os ele-
feições holandesas claras, em especial na arquitetura. Em paralelo, no território brasileiro, mentos dispostos no espaço com o tempo e a subjetividade dos artistas. É nesse sentido, por
houve um diálogo entre as produções lusa e batava, de maneira a criar construções híbridas, exemplo, que entendemos as torres do Palácio de Friburgo ou os moinhos de Nova Amster-
singulares na História da Arquitetura. Em Mauritsstad, o destaque fica para a organização dam como marcos visuais. Dessa maneira, puderam ser delineadas algumas interações entre
espacial em grid, cuja distinção ao modo de fazer português é evidenciada pela proximidade objetos, personagens, a natureza circundante e o momento histórico.
ao Porto do Recife.
Abre-se espaço, portanto, para futuras reflexões sobre essas paisagens pintadas e para novas
Ressaltamos, também, a presença das águas como determinante à escolha dos holandeses investigações das relações entre os elementos que as compõem. Caso tenhamos um apro-
para a implantação de assentamentos coloniais e para a construção de uma rede mercan- fundamento ainda maior na contextualização histórica dos períodos retratados, será possí-
til que envolvia o interior do país. Nesse sentido, destacamos os Rios Hudson e Capibaribe vel entender de forma minunciosa as presenças e ausências nas paisagens, levando a uma
como principais meios de transporte fluviais nas colônias estudadas. compreensão mais coerente e profunda do caráter visual de Mauritsstad e Nieuw-Amster-
dam.
É curioso encontrar alguns personagens ou fatos históricos que surgem em ambas as nar-
rativas, como Peter Stuyvesant, as Guerras Anglo-Holandesas ou o grupo de 23 judeus emi- Também como resultado dessa pesquisa, observamos uma aproximação muito interessante
grados do Brasil. Isso nos dá indício de possíveis conexões entre a história dos dois assenta- de Mauritsstad ao Plano de Simon Stevin e à expansão da cidade de Amsterdam. A Cidade
mentos que podem ser investigadas em mais detalhes. Tais narrativas devem incluir outros Maurícia foi uma cidade nova segundo os atributos propostos por Trevisan03, e a partir desse
territórios holandeses pelo mundo, inclusive os ocupados pela VOC. Nesse sentido, ressalta- ensaio, já se torna possível a montagem de uma urbegrafia que a situe segundo tais caracte-
mos mais uma vez a sugestão de José Luiz Mota Menezes, impulso inicial para essa pesquisa, rísticas, além de estabelecer relações diretas com a produção holandesa do período.
de que estudos comparados podem trazer novos olhares para a Cidade Maurícia01.
Por fim, ressalta-se também a possibilidade de, em percursos futuros de estudo, ter apenas
No que se refere à paisagem criada pelos artistas (agentes compositivos), podemos observar Mauritsstad como foco. Ao relacionar documentações históricas, representações pictóricas
que a representação pictórica desponta como uma maneira de ver o que existe e relatar, para e descrições literárias, pode-se chegar a considerações ainda mais esclarecedoras sobre a
a posteridade ou para os contemporâneos da metrópole, o que havia nos assentamentos paisagem desse núcleo urbano, e eventualmente atingir um método que possa ser aplicado
ultramarinos do Século XVII. de maneira mais pragmática às outras cidades coloniais holandesas.
Esperamos, a partir dessa pesquisa, seguir com estudos que relacionem os assentamentos
urbanos coloniais e o conceito de paisagem, já presente na sociedade batava do Século XVII
e fundamental a uma compreensão da urbe segundo suas características visuais. Dessa ma-
neira, nos aproximamos à interpretação do meio urbano como fenômeno vivido, interpreta-
do e representado, para além das descrições, também extremamente válidas, mas já postas
em debate, da forma urbana enquanto projeto e planejamento.
Ao professor Ricardo Trevisan por todo o auxílio durante o processo de pesquisa e escrita
desse trabalho. É de um valor inestimável encontrar um orientador que acredite nas ideias
dos alunos e os incentive de forma tão participativa. Ser seu orientando é uma das maiores
alegrias do meu curso;
Ao professor Andrey Schlee, que em suas aulas me apresentou a alguns dos temas que mais
tenho curiosidade em investigar, entre eles a Cidade Maurícia, e cujas sugestões foram es-
senciais ao andamento da pesquisa;
A Sara Madrigal, por trazer da Europa um dos livros mais importantes para a minhas referên-
cias bibliográficas;
A Jessica Duarte, pelas ilustrações que tornam esse trabalho muito mais bonito e completo;
A Ana Lúcia Nóbrega e a todos os meus amigos que me escutaram falar desse ensaio tantas
e tantas vezes, por me ajudarem com conselhos e opiniões e me confortarem nos momentos
de ansiedade;
Aos meus representantes em Pernambuco: minha irmã Mariana Nóbrega e meu pai José
Queiroz de Paiva, sempre dispostos a investigar o Recife in loco quando eu não posso;
E à minha mãe, Maristella Paiva, revisora dos meus textos e apoio irrestrito em todos os de-
safios que me proponho a enfrentar. 111
LISTA DE FIGURAS
Figura 7: The Anatomy Lesson of Dr. Nicolaes Tulp (1632), Rembrandt. Mauritshuis, The Hague. Disponível em
<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:The_Anatomy_Lesson.jpg>. Acesso em 04 jul. 2022.
Figura 8: As Províncias Unidas. Redesenho do autor com base em imagem disponível em: <https://en.wikipedia.
org/wiki/Dutch_Republic#/media/File:Republiek_der_Zeven_Verenigde_Nederlanden.svg>. Acesso em 02 ago.
2022.
Figura 9: Utsikt fran Dordrecht, 1655, Jan van Goyen. Nationalmuseum, Estocolmo. Disponível em: https://com-
mons.wikimedia.org/wiki/File:Jan_van_Goyen_-_View_from_Dordrecht.jpg. Acesso em 08 ago. 2022.
Figura 10: Gezicht op de Gouden Bocht in de Herengracht vanuit het oosten, 1685, Gerrit Adriaensz Berckheyde.
Rihksmuseum, Amsterdam. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Gezicht_op_de_Gouden_
Bocht_in_de_Herengracht_vanuit_het_oosten_Rijksmuseum_SK-A-682.jpeg. Acesso em 08 ago. 2022.
Figura 11: Kaart van Amsterdam in 1662, met panorama van Amsterdam. 1662, Daniel Stalpaert. Biblioteca da
Universidade de Amsterdam, Amsterdam. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Amster-
dam1662.jpg>. Acesso em 09 ago. 2022.
Figura 12: View of Amsterdam Port: The Ij Near the New Bridge, entre 1641 e 1692, Jacobus Storck. Disponível em:
<https://www.gazette-drouot.com/article/storck-an-amsterdam-painter-of-the-dutch-golden-age/23789>. Acesso
em 09 ago. 2022.
Figura 13: Gezicht op de Amstel te Amsterdam, entre 1747 e 1785, Gerrit Toorenburgh. Mauritshuis, The Hague.
Figura 1: Allegoria degli Effetti del Buon Governi in Campagna (1338-1339), Ambrogio Lorenzetti. Afresco na pa- Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:View_of_the_River_Amstel_in_Amsterdam_by_Ger-
rede direita da Sala dei Nove, Palazzo Pubblico, Siena. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/Fi- rit_Toorenburgh_Mauritshuis_178.jpg>. Acesso em 09 ago. 2022.
le:Ambrogio_Lorenzetti_-_The_Effects_of_Good_Government_in_the_Countryside_%28detail%29_-_WGA13495.
Figura 14: Simon Stevin, Ideal Plan for a City, 1650. Fonte: KEHOE, 2015.
jpg>. Acesso em 19 jun. 2022.
Figura 15: O Império Holandês. Redesenho do autor com base em imagem disponível em: <https://commons.
Figura 2: Villa dans la campagne romaine (1646-1647), Claude Lorrain. Szépmuvészeti Múzeum, Budapeste. Dispo-
wikimedia.org/wiki/File:DutchEmpire15.png>. Acesso em 13 ago. 2022.
nível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Claude_Lorrain_-_Villa_in_the_Roman_Campagna_-_Goo-
gle_Art_Project.jpg >. Acesso em 19 jun. 2022. Figura 16: Marin d’Olinda de Pernambuco e T’Recif de Pernambvco. Autor desconhecido, c. 1630. Disponível em:
< https://www.researchgate.net/figure/Figura-8-Marin-dOlinda-de-Pernambuco-TRecif-de-Pernambvco-de-au-
tor_fig5_306351369>. Acesso em 15 ago. 2022.
Figura 3: Parterre d’eau, Jardin de Versailles. Projeto de André Le Nôtre. Disponível em: <https://www.chateauver-
sailles.fr/decouvrir/domaine/jardins/parterres#le-parterre-deau>. Acesso em 19 jun. 2022. Figura 17: Perímetro do território brasileiro sob domínio das Províncias Unidas no Século XVII. Produzido por
Jéssica Duarte e Leonardo Nóbrega com base em ilustrações disponíveis em: < https://commons.wikimedia.org/
Figura 4: Extrait du “Plan de Versailles, du petit parc, et de ses dependances où sont marqués les emplacemens wiki/File:Dutch_Brazil_1630-1654_map.svg> e <https://www.panmythica.com/2008/04/mapas-histricos-do-brasil.
html>. Acesso em 20 ago. 2022.
de chaque maison de cette ville, les plans du Château, et des hôtels, et les distribuitions de jardins et bosquets”
(1746), Jean Delagrive. Bibliothèque nationale de France, Paris. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/ Figura 18: Perfecte Caerte der gelegentheyt van Olinda de Pharnambuco, Maurits-Stadt ende t’Reciffo, Cornélis
Goliath, 1648. Disponível em: <https://bndigital.bn.gov.br/dossies/biblioteca-virtual-da-cartografia-historica-do-
wiki/File:Versailles_Plan_Jean_Delagrive.jpg>. Acesso em 19 jun. 2022. -seculo-xvi-ao-xviii/artigos/perfecte-caerte-der-gelegentheyt-van-olinda-de-pharnambuco-maurits-stadt-ende-
-treciffo/>. Acesso em 20 ago. 2022.
Figura 5: Paisagem com Ruínas de Olinda (1664), Frans Post. Instituto Ricardo Brennand, Recife. Disponível em <
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Frans_Post_-_Paisagem_com_Ru%C3%ADnas_de_Olinda,_1664.jpg>. Figura 19: Caerte van de haven van Pharnambocque met de stadt Mouritius en het dorp Reciffe met bijleggende
forten en alle gelegentheden van dien, Johannes Vingboons, c. 1665. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/
Acesso em 04 jul. 2022. wiki/Ficheiro:Recife-Map1665.jpg>. Acesso em 20 ago. 2022.
Figura 6: Castello Plan (1660), Jacques Cortelyou. New York Public Library, New York. Disponível em <https://com- Figura 20: Mapa da Cidade Maurícia, do Povoado do Recife e de parte da Várzea do Capibaribe. 2022. Produzido
por Jéssica Duarte e Leonardo Nóbrega com base na ilustração de Johannes Vingboons disponível em: <https://
mons.wikimedia.org/wiki/File:CastelloPlanOriginal.jpg>. Acesso em 04 jul. 2022.
112 pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Recife-Map1665.jpg>. Acesso em 20 ago. 2022. 113
BIBLIOGRAFIA
Figura 21: Mauritiopolis, Frans Post, c. 1645. Disponível em: < https://www.abebooks.com/art-prints/Gesamtansi-
cht-Mauritiopolis-F-Post-1645-RECIFE/22915580936/bd#&gid=1&pid=1>. Acesso em 27 ago. 2022.
Figura 22: Palácio de Friburgo, Frans Post, 1647. Disponível em < https://www.brasilianaiconografica.art.br/arti-
gos/20259/o-legado-dos-artistas-de-mauricio-de-nassau>. Acesso em 27 ago. 2022.
Figura 23: Palácio da Boa Vista, Frans Post, 1647. Disponível em: < https://www.brasilianaiconografica.art.br/arti-
gos/20259/o-legado-dos-artistas-de-mauricio-de-nassau>. Acesso em 27 ago. 2022.
Figura 24: Vista da Cidade Maurícia e do Recife, Frans Post, 1657. Disponível em: <https://revistacontinente.com.
br/image/view/news/image/1103>. Acesso em 27 ago. 2022.
Figura 25: Residência de Sua Excelência, Zacharias Wagner, entre 1637 e 1668. Disponível em: <https://revistapes-
quisa.fapesp.br/a-luneta-no-telhado/>. Acesso em 27 ago. 2022.
Figura 26: Vista do porto do Recife a partir de Olinda no início do século XVII, Gillis Peeters, entre 1637 e 1653.
Fonte: REIS FILHO, 2000.
Figura 27: Assentamentos europeus e tribos indígenas na América do Norte em 1650. Produzido por Jéssica
Duarte e Leonardo Nóbrega com base em <http://theamerica-history.blogspot.com/2009/11/america-history-
-of-1650-1669.html>. Acesso em 28 ago. 2022.
Figura 28: Imagem da expansão dos Novos Países Baixos sobre o território da América do Norte. Fonte: produzido
por Jéssica Duarte e Leonardo Nóbrega com base em <https://www.nps.gov/mava/learn/historyculture/new-ne-
therland.htm>. Acesso em 29 ago. 2022.
Figura 30: Mapa de Nieuw-Amsterdam. Fonte: produzido por Jéssica Duarte e Leonardo Nóbrega com base em
<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:CastelloPlanOriginal.jpg>. Acesso em 30 ago. 2022. AB’SABER, Aziz N. et al. História geral da civilização brasileira t.1 v.1. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2007.
Figura 31: Gezicht op Nieuw Amsterdam, Johannes Vingboons, 1664. Fonte: < https://commons.wikimedia.org/
wiki/File:GezichtOpNieuwAmsterdam.jpg>. Acesso em 30 ago. 2022.
AMSTERDAM 200 jaar ouder dan aangenomen. Nu. 2008. Disponível em < https://www.nu.nl/wetens-
Figura 32: t’Fort nieuw Amsterdam op Manhatans, c. 1651. Fonte: <https://jcb.lunaimaging.com/luna/servlet/de- chap/1801750/amsterdam-200-jaar-ouder-dan-aangenomen.html?redirect=1>. Acesso em 09 ago.
tail/JCB~1~1~492~115901103:t--Fort-nieuw-Amsterdam-op-de-Manha>. Acesso em 30 ago. 2022.
2022.
Figura 33: Novum Amsterodamum, atribuída a Laurens Block, 1650. Disponível em: < https://emuseum.nyhistory.
org/objects/21581/novum-amsterodamum-new-amsterdam-new-netherlands>. Acesso em 30 ago. 2022.
BARLÉU, Gaspar. História dos feitos recentemente praticados durante oito anos no Brasil e nou-
Figura 34: N Amsterdam, ou N Iork in Ameriq, c. 1700. Disponível em: < https://emuseum.nyhistory.org/objec- tras partes sob o govêrno do ilustríssimo João Maurício, Conde de Nassau etc., ora governador de
ts/64124/n-amsterdam-ou-n-iork-in-ameriq?ctx=b37e513ec2a0499dbf6669027c9fd4280a593e35&idx=31>. Acesso
em 30 ago. 2022. Wesel, tenente-geral de cavalaria das provincias-unidas sob o Principe de Orange. Rio de Janeiro:
Ministério da Educação, 1940. Disponível em: <https://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/227290>.
Figura 35: Nieu Amsterdam, een stedeken in Noord Amerikaes NIeu Hollant op het eilant Mankattan, Petrus Schenk,
c. 1702. Disponível em < https://jcb.lunaimaging.com/luna/servlet/detail/JCB~1~1~975~1200003:Nieu-Amster- Acesso em 04 jul. 2022.
dam%2C-een-stedeken-in-Noo?qvq=q:nieuw-amsterdam&mi=16&trs=17#>. Acesso em 30 ago. 2022.
BICK, Alexander. Governing the free sea: The Dutch West India Company and commercial politics,
1618-1645. 2012. Tese (PhD em History), Princeton University. 2012 Disponível em < https://www.
proquest.com/docview/1238001630/abstract/8A1A30DFF1864696PQ/1?accountid=26646>. Acesso em
13 ago. 2022.
FREIST, Dagmar. The “Dutch Century”. EGO – European History Online. 2012. Disponível em: <http:// KOSSMAN, E. H.; MELLING, A. F. Texts concerning the Revolt of the Netherlands. London: Cambridge
ieg-ego.eu/en/threads/models-and-stereotypes/the-dutch-century/dagmar-freist-the-dutch-cen- University Press. 1974.
tury#InsertNoteID_2_marker3>. Acesso em 02 ago. 2022.
KOSTOFF, Spiro. The City Shaped. London: Thames and Hudson, 1991.
FREYRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala. São Paulo: Global. 2006.
KRIZNER, L. J.; SITA, Lisa. Peter Stuyvesant: New Amsterdam and the origins of New York. New York:
The Ronsen Publishing Group. 2001.
116 117
LANDSCHAFT. Digitalen Worterbuch der deutschen Sprache (DWDS). Disponível em <https://www. PALTSITS, Victor Hugo. The Founding of New Amsterdam in 1626. Worcester: American Antiquarian
dwds.de/wb/etymwb/landschaft>. Acesso em 19 jun. 2022. Society. 1924.
LAGO, Bia Corrêa do; LAGO, Pedro Corrêa do. A obra de Frans Post. In: VIEIRA, Hugo Coelho; GALVÃO, PANOFSKY, Erwin. Meaning in the Visual Arts: Papers in and on Art History. New York: Doubleday.
Nara Neves Pires; SILVA, Leonardo Dantas. Brasil Holandês: História, Memória e Patrimônio Compar- 1955.
tilhado. São Paulo: Alameda, 2012.
LAGO, Pedro Corrêa do; LAGO, Bia Corrêa do. Frans Post (1612-1680): Obra Completa. Rio de Janeiro: PANOFSKY, Ewin. Idea: a evolução do conceito de belo. São Paulo: Martins Fontes. 2013.
Capivara Editora, 2006.
PAYSAGE. Centre national de ressources textuelles et lexicales (CNRTL). Disponível em <https://
LEVY, Daniela Tonello. Judeus e Marranos no Brasil Holandês – Pioneiros na Colonização de Nova
York (século XVII). 2008. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciên- www.cnrtl.fr/etymologie/paysage>. Acesso em 19 jun. 2022.
cias Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. PLUNZ, Richard. A History of Housing in New York City. New York: Columbia University Press, 1990.
LIRA, Flaviana. O olhar sobre o lugar: o Istmo de Olinda e Recife na visão dos memorialistas. PUNTONI, Pedro. Guerras do Brasil (1504-1654). São Paulo: Editora Brasiliense, 1992.
PosFAUUSP, v. 26, n. 49. 2019. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/posfau/article/
view/162180#:~:text=O%20Istmo%20de%20Recife%20e,XX%2C%20tornou%2Dse%20esquecimen-
to.>. Acesso em 27 ago. 2022. RECIFE recorda domínio holandês com ‘Boi Voador’ e encerra comemorações dos 482 anos da cidade.
G1. 2019. Disponível em < https://g1.globo.com/pe/pernambuco/noticia/2019/03/17/recife-recorda-
LORCH, Benjamin. Landscape. Chicago School of Media Theory, 2002. Disponível em: <https://csmt. -dominio-holandes-com-boi-voador-e-encerra-comemoracoes-dos-482-anos.ghtml>. Acesso em 24
uchicago.edu/glossary2004/landscape.htm>. Acesso em 19 de junho de 2022. jul. 2022.
MELLO, Evaldo Cabral de. O Brasil holandês (1630-1654). São Paulo: Penguin Classics, 2010. REIS FILHO, Nestor Goulart. Contribuição ao Estudo da Evolução Urbana do Brasil (1500/1720).
São Paulo: Editôra da Universidade de São Paulo. 1968.
MELLO, José Antônio Gonsalves de. Tempo dos Flamengos: Influência da ocupação holandesa na
vida e na cultura do norte do Brasil. Rio de Janeiro: Topbooks, 2001. REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da Arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2014.
MELLO, José Antônio Gonsalves de. A cartografia holandesa do Recife: estudo dos principais mapas REIS FILHO, Nestor Goulart. Imagens de vilas e cidades do Brasil Colonial. São Paulo: EDUSP, 2000.
da cidade do período 1631-1648. Recife: IPHAN/MEC, 1976.
MENDES, Anderson F. R. O mito do ‘bom colonizador holandês’: o imaginário sobre a colonização RICOEUR, Paul. Architecture et Narrativité. Urbanisme, v. 303, p 44-51, nov/dez 1998.
holandesa em Pernambuco. 2021. Relatório técnico (Mestrado Profissional em História) – Universida- RINK, Oliver A. Holland on the Hudson: An Economic and Social History of Duch New York. New York:
de Católica de Pernambuco. Programa de Pós-graduação em História. 2021. Cornell University Press, 1986.
MENEZES, José Luís Mota. O século XVII e o Brasil holandês. In: ZANINI, Walter (org.). História geral da SCHLEE, Andrey. A Arquitetura do Brasil Batavo. Não publicado.
arte no Brasil. São Paulo: Instituto Walther Moreira Salles, 1983. p. 312-346. SILVA, Leonardo Dantas. João Maurício: um príncipe renascentista em terras do Novo Mundo. In:
MENEZES, José Luiz Mota. Ruas sobre as águas: as pontes do Recife. Recife: Cepe, 2016. VIEIRA, Hugo Coelho; GALVÃO, Nara Neves Pires; SILVA, Leonardo Dantas. Brasil Holandês: História,
Memória e Patrimônio Compartilhado. São Paulo: Alameda, 2012.
MENEZES, José Luiz Mota. Séculos de história de uma praça. Instagram. 2021. Disponível em: <ht-
tps://www.instagram.com/p/CPsmBcWLAhR/>. Acesso em 29 ago. 2022. SOUZA, Alice. Herança holandesa: o Recife de Maurício de Nassau. Diario de Pernambuco. 2017. Dis-
MONTEIRO, Carolina; ODEGARD, Erik. Slavery at the Court of the ‘Humanist Prince’: Reexamining ponível em: <https://www.diariodepernambuco.com.br/noticia/vidaurbana/2017/06/heranca-holan-
Johan Maurits van Nassau-Siegen and his Role in Slavery, Slave Trade and Slave-smuggling in Dutch desa-o-recife-de-mauricio-de-nassau.html>. Acesso em 24 jul. 2022.
Brazil. Journal of Early American History, n. 3, p. 3-32. 2020.
SOMBART, Werner. Os judeus e a vida econômica. São Paulo: Editora Unesp. 2015.
OERS, Ron van. Dutch Town Planning Overseas during VOC and WIC Rule (1600-1800). Zutphen:
Walburg Pers. 2000. TAVARES, Vitor. Especialistas analisam legado deixado pelos holandeses em Pernambuco. G1. Dispo-
nível em: < https://g1.globo.com/pernambuco/noticia/2015/05/especialistas-analisam-legado-deixa-
PANERAI, Philippe. Análise urbana. Brasília: Editora UnB. 2006. do-pelos-holandeses-em-pernambuco.html>. Acesso em 24 jul. 2022.
118 119
TREVISAN, Ricardo. Narrar por Cidades Novas. In: JACQUES, Paola Berenstein; PEREIRA, Margareth da
Silva; CERASOLI, Josianne Francia (org.). Nebulosas do Pensamento Urbanístico Tomo III: Modos de
Narrar. Salvador: EDUFBA, 2020. p. 288-311
VEYNE, Paul. Como se escreve a história. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. p. 106.
VICENTINO, Cláudio; DORIGO, Gianpaolo. História do Brasil. São Paulo: Scipione. 2000.
WALDHEIM, Charles. Landscape as Urbanism: a general theory. New Jersey: Princeton University
Press, 2016.
WEEBERS, Robert; AHMAD, Yahaya; MA, Zuaini. Simon Stevin’s ideas on Settlements. In: 2nd Interna-
tional Conference on Behavioral, Cognitive and Psychological Sciences, 2011, Singapura.
WEIMER, Günter. Arquitetura Popular Brasileira. São Paulo: Martins Fontes, 2012.
WOLFFLIN, Heinrich. Conceitos fundamentais em história da arte: o problema da evolução dos esti-
los na arte mais recente. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
120