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SOBERANIA E A JURISDIÇÃO SOBRE OS RECURSOS NÃO VIVOS NO MAR

MOÇAMBICANO

Osvaldo Manuel Maquia

Marinela Arlete A. Tacula

Estudantes de Direito UCM-FADIR, 3º Ano, C/D

RESUMO

Este artigo vem fazer uma análise sobre a Jurisdição e a Soberania de Recursos não vivos do
espaço geográfico concretamente Moçambique, sem descurar da Convenção das Nações Unidas
sobre o Direito do Mar e a Leis do Mar do âmbito interno. A pesquisa serve de base para este
trabalho e possibilita uma articulação entre as concepções sobre a Soberania e Jurisdição, e
emerge a necessidade da complexidade na compreensão dos recursos marinhos não vivos. No
entanto convém realçar que a própria convenção das Nações Unidas assegura determinados
direitos e deveres por parte do Estado, no que concerne a exploração dos recursos naturais do
meio marinho e alto mar situado além dos limites das jurisdições nacionais.

ABSTRACT

This article analyzes the issue of Jurisdiction and the Sovereignty of non-living resources in the
geographic space, specially Mozambique, without neglecting the United Nations Convention on
de law of the sea and the law of the sea in the internal sphere. The research serves as the basis for
this work and enables an articulation between the concepts of sovereignty and jurisdiction, and
the need for complexity in the understanding of non-living marine resources emerges. However,
it should be emphasized that the convection itself in the united Nations guarantees certain rights
and duties on the part of the State, with regard to the exploration of the natural resources of the
marine environment and the high seas located beyond the limits of national jurisdictions.

Keywords: resources, mar, Jurisdiction, Sovereignty, Convention.

1
Introdução

Os recursos do mar são todos os recursos vivos bem como os recursos não-vivos existentes nas
águas sobrejacentes ao leito do mar, no leito do mar e seu subsolo, bem como as áreas costeiras
adjacentes, cujo aproveitamento sustentável é relevante sob os pontos de vista económico, social
e ecológico.

O presente artigo de carácter avaliativo e investigativo da Cadeira de Direito do Mar e Recursos


Hídricos, leccionada no 3º ano curso de Direito, no regime diurno, intitulado “Soberania e
Jurisdição sobre os recursos não vivos no mar moçambicano”, vem fazer um estudo aprofundado
e de forma sintética sobre aspectos relevantes do tema, partindo da visão de vários autores.

No que tange aos objectivos, importa referir que este trabalho tem como objectivo geral:

 Analisar de forma aprofundada a questão de Jurisdição e Soberania dos recursos não


vivos: Caso Moçambique.

Objectivos específicos:

 Fazer uma breve conceituação dos aspectos relevantes para o tema;


 Discutir a questão da Soberania e Jurisdição, e determinar quais são os recursos
considerados não-vivos;
 Identificar as áreas de jurisdição nacional;
 Identificar se existe limitação na efectivação da actividade marinha dos recursos não-
vivos.

No que tange à sua estruturação, importa referir que para além da parte introdutória o trabalho
apresenta o Desenvolvimento onde se conciliam vários pontos de vista partindo da visão de
vários autores, a Conclusão e as Referencias Bibliográficas. De salientar que sempre que
possível iremos conciliar com a respectiva base legal.

Para a materialização e compilação deste, usou-se as fontes bibliográficas obedecendo normas e


critérios emanados nesta Instituição.

2
Conceitos Preliminares

A Soberania é o poder de mando em última instância, exclusivo e não derivado, do exercício do


poder legitimado pelo Direito com autoridade suprema e definitiva.1

Jurisdição é o foro especializado e independente que examina litígios a luz do direito e profere
decisões obrigatórias”.2

Jurisdição é o poder, mas é a face normativa do poder legitimado, derivado da autoridade


normativa e jurisdicional, aplicando o Direito ao caso concreto”.3

No entanto, a luz da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, prescreve que na
zona económica exclusiva, o Estado costeiro terá jurisdição no sentido de:

 Construir, autorizar e regulamentar a construção, operação e utilização de ilhas artificiais,


instalações e estruturas;
 Desenvolver a investigação científica marinha;
 Promover a protecção e preservação do Maio marítimo;
 Normalizar o fluxo costeiro, estabelecendo o controlo sobre o volume, a quantidade de
pesca, as quotas de captura e controle da ameaça aos estoques e cardumes que pode vir a
ameaçar a extinção ou escassez.

Com base nas ideias acima ilustradas, podemos considerar que a Jurisdição é um poder que o
Estado detém para a aplicabilidade de normas a um caso concreto, tendo em vista a solucionar
determinados conflitos sem descurar da ordem jurídica e a autoridade da lei.

Com base nos conceitos acima ilustrados, podemos levar a cabo que o Estado através do seu
poder de soberania terá a autoridade e poder de determinar sobre a zona exclusiva todas as que
são atributivas, sem que haja interferência de qualquer outro Estado, e de forma mais ampla as
questões que envolvem a exploração económica da área com fins lícitos da convenção e do
sistema jurídico do Direito do Mar e seus limites.

1
BOBBIO, N. Dicionário de política. 13. ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2008.
2
REZEK, Francisco, Direito Internacional Publico curso elementar, 13ª ed.: Coimbra Editora Saraiva, 2011.
P.259.
3
MENEZES, Wagner, Direito do Mar, Brasília 2015. P. 106.

3
Além disso, a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, presume que qualquer país
pode pedir o direito de soberania até o limite de sua plataforma continental natural.

Em relação aos recursos não vivos, podemos considerar como sendo os recursos minerais
existentes nas águas sobrejacentes ao leito do mar, no leito da maré seu subsolo, e os recursos
energéticos advindos dos ventos, marés, ondas, correntes e gradientes de temperatura. A título de
exemplo podemos. Política nacional para os recursos do Mar

Recursos Energéticos e Minerais

Recursos não vivos

Entenda-se a exploração por aproveitamento dos recursos não vivos. De forma muito simplista,
os recursos marinhos não vivos de que aqui se fala são os recursos minerais. Estes podem ser
energéticos não renováveis (petróleo, gás natural, carvão e hidratos de metano), metálicos
(nódulos polimetálicos ou nódulos de manganês, ouro, cobre, estanho, entre outros) e não
metálicos (areias e cascalho, conchas calcárias, diamantes, granitos, entre outros). Os recursos
não vivos têm como característica uma natureza finita, pois não se renovam, não podendo ser
feito um aproveitamento sustentável dos mesmos.4

Classificação dos recursos não vivos5

Os Sulfuretos polimetálicos formam-se nos campos hidrotermais que ocorrem normalmente na


Crista Média Atlântica. São potenciais recursos de cobre + zinco + chumbo + estanho+ ouro +
prata.

As Crostas de ferro e manganês ocorrem geralmente nos montes submarinos. São potenciais
recursos de cobalto + níquel + terras raras.

Os nódulos polimetálicos surgem nas zonas de planície abissal, as mais profundas do oceano.
São potenciais recursos de manganês + níquel + cobalto.

4
Disponível em: https://www.google.com/irl?sa=t&source=web&rct=j&url=http://www.geoturismobrasil.com/
Material%2520didacticolRecursos%2520do&2520mar.pdf&ved=2ahUKwi6pqylhMbvAhW-
QEEHQVaDz4OFjACegQIFjACegQOIFBAC&usg+=AOvVa3qf2WT5YwaoNIYHRPsvTi. Acesso no dia
23.03.2021.
5
Disponível em: https://www.emepc.pt/recursos-marinhos. Acessado em 18/03/2021

4
Os vulcões de lama estão associados às margens continentais. São potenciais recursos de metano
(recurso energético).

A plataforma marítima é uma excelente e abundante fonte de recursos energéticos e minerais que
são extraídos para suprir as crescentes necessidades das sociedades industrializadas e não só,
face ao esgotamento das tradicionais reservas terrestres.
Os oceanos dispõem de uma enorme fonte de recursos vivos e não vivos. Em termos de recursos
minerais, o sal presente na água dos oceanos é por si só um bem mineral e fonte sustentável de
elementos economicamente importantes, como por exemplo, Cl, Na, Mg, K, Br, Sr e B.
Entretanto, até o presente, os únicos elementos comercialmente extraídos da água do mar em
grande escala são o sódio (Na), cloro (Cl), (Mg) e bromo (Br).6

Embora a água do mar seja rica em elementos de valor económico, a maioria dos recursos
minerais encontrados nos oceanos estão relacionados a ambientes geológicos específicos, e,
portanto, à interacção entre a água do mar e outros agentes, tais como aporte sedimentar de rios,
actividade biológica e magmatismo. Desta forma, diversos mecanismos de enriquecimento, os
quais muitas vezes agem conjuntamente, levam à formação de jazidas minerais. Típicos
mecanismos de enriquecimento incluem a precipitação, a sedimentação, o metabolismo
biológico, a concentração diagenética e a actividade vulcânica. Portanto, os depósitos minerais
marinhos são encontrados em diferentes ambientes geológicos desde as margens continentais até
cordilheiras mesoceânicas.7

Direitos de soberania

O sentido mais amplo para o conceito de soberania pode ser exposto como o poder de mando em
última instância, exclusivo e não derivado, do exercício do poder legitimado pelo Direito com
autoridade suprema e definitiva.8

A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar atribui ao Estado costeiro direitos de
soberania sobre o espaço da zona económica exclusiva para os fins de: a) exploração e
aproveitamento; b) conservação; c) administração de todos os recursos naturais das águas

6
Disponível em: https://www.emepc.pt/recursos-marinhos. Acessado em 18/03/2021.
7
Sidney L. M. Mello & Jorge J. C. Palma, Geologia E Geofísica Na Exploração De Recursos Minerais Marinhos
8
MENEZES, Wagner, Direito do Mar, Brasília 2015

5
sobrejacentes ao leito, do leito e do subsolo do mar; e d) outras actividades com vistas à
exploração e aproveitamento da zona para fins económicos, como a produção de energia a partir
da água, das correntes e dos ventos.

Por ilação, entende-se que o Estado terá autoridade e poder de determinar sobre a zona
económica exclusiva todas as questões que envolvem as quatro prescrições atributivas, sem
interferência de qualquer outro Estado, e, de forma ampla, sobre qualquer questão que envolva
exploração económica da área, levando em conta obviamente os fins lícitos da Convenção e do
sistema jurídico do Direito do Mar e seus limites.9

Compreende o exercício de soberania do Estado costeiro sobre a zona económica exclusiva, o


direito de realizar visitas, inspecção, apresamento e medidas judiciais para garantir o
cumprimento das leis e regulamentos por ele adoptados em conformidade com a Convenção.

A propósito, a maior parte dos casos submetidos ao Tribunal Internacional sobre o Direito do
Mar envolve o apresamento, no caso em que as embarcações apresadas e as suas tripulações
devem ser libertadas imediatamente depois de prestada fiança idónea ou outra garantia.

As sanções por pesca, todavia, não podem incluir pena privativa de liberdade, ou corporal, o que
tem sido respeitado e garantido em vários casos já decididos.

Direitos e deveres de jurisdição

Jurisdição é poder, mas é a face normativa do poder legitimado, derivado da autoridade do


Estado de propor regras, leis e regulamentos, de agir com autoridade normativa e jurisdicional,
aplicando o Direito ao caso concreto. Esse foi o sentido dado pela Convenção ao disciplinar
aspectos ligados à soberania do Estado, por um lado, e, por outro, os direitos e deveres do Estado
no tocante a sua jurisdição. Assim, a Convenção regulamentou a esfera de responsabilidades e
atribuições em que o Estado pode e deve agir normativamente, aplicando regras e resolvendo em
última instância os conflitos eventualmente derivados dessas relações.10 O Estado costeiro poderá
disciplinar e também accionar seu sistema jurisdicional para dirimir conflitos decorrentes dessas
atribuições a ele conferidas pela Convenção.

9
MENEZES, Wagner, Direito do Mar, Brasília 2015. p.109.
10
MENEZES, Wagner, Direito do Mar, Brasília 2015. P.110.

6
Na realidade, caso não estivesse ali configurada a zona económica exclusiva, tal espaço seria
considerado alto-mar, logo a Convenção tratou de estabelecer direitos ao Estado costeiro,
resguardando um amplo espaço para exercícios em que os demais terão total liberdade para
utilizá-lo, e, em certos casos específicos, estarão submetidos à jurisdição do Estado costeiro.
Quando não houver atribuição de jurisdição ao Estado costeiro e ocorrer um conflito entre ele e
outros Estados pelo uso da zona económica exclusiva, a questão deve ser solucionada numa base
de equidade e à luz de todas as circunstâncias pertinentes, tendo em conta a importância
respectiva dos interesses em causa para as partes e para o conjunto da comunidade internacional.

A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar prescreve que, na zona económica
exclusiva, o Estado costeiro terá jurisdição no sentido de: a) construir, autorizar e regulamentar a
construção, operação e utilização de ilhas artificiais, instalações e estruturas; b) desenvolver a
investigação científica marinha; c) promover a protecção e preservação do meio marítimo; e d)
quaisquer outros direitos e deveres previstos em seu bojo.

O Estado costeiro tem jurisdição exclusiva sobre essas ilhas artificiais, instalações e estruturas,
incluindo jurisdição em matéria de leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de imigração,
sanitários e de segurança.11

A Soberania territorial dos Estados

O conceito de soberania teve origem na França (souveraineté) e seu principal teórico foi Jean
Bodin, que, citado por Bonavides afirma,
“A soberania é una e” indivisível, não se delega a soberania, a soberania é irrevogável, a
soberania é perpétua, a soberania é um poder supremo, e os principais pontos de
caracterização com que Bodin fez da soberania no século XVII um elemento essencial do
Estado”12.

A importância do território como elemento constitutivo do Estado é muito grande. Por um lado,
marca o domínio dentro do qual o Estado exerce a sua soberania. Em segundo lugar, e

11
MENEZES, Wagner, Direito do Mar, Brasília 2015. PP. 106-107
12
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10ª edição, São Paulo: Editora Malheiros. 1996, p. 126.

7
referenciando-se agora a sua extensão, é um factor de defesa militar e de defesa económica,
sobretudo quando à extensão se alia a fertilidade do solo ou a riqueza do subsolo.13
O Estado existe em perseguição de alguns fins, sem os quais não se justificaria a constituição
deste e não seria possível manter a paz interna e assegurar a paz externa. Para um Estado
soberano é primordial manter a segurança das pessoas, o desenvolvimento económico e a
inviolabilidade do território.
O exercício da soberania e do poder do Estado no mar, constitui um pilar importante para a
existência e sobrevivência de um Estado ribeirinho. Desse facto advém a necessidade de se
impor como uma das principais preocupações e obrigações dos Estados costeiros na perspectiva
de desenvolvimento equilibrado e em segurança. No fundo, a principal questão que se coloca tem
a ver com a forma como o poder do Estado deve ser aplicado em relação ao mar.
Como conciliar o Direito Internacional às vontades e necessidades nacionais.
A soberania de um Estado é complementada pela jurisdição que este faz sobre as possessões que
pelo Direito Internacional lhes são reconhecidas.
Nesta conformidade, o território dos Estados costeiros não só se cinge a terra firme como
também ao mar. Moçambique, na qualidade de Estado que faz limite com o mar, enfatiza a
importância da sua soberania e jurisdição sobre os espaços marítimos.14
Na Constituição da República de Moçambique, descreve o território nacional da República de
Moçambique como sendo uno, indivisível e inalienável, e que abrange toda a superfície terrestre,
a zona marítima e o espaço aéreo delimitado pelas fronteiras nacionais 15, que a lei nacional
define.
Fazendo fé ao espírito da Constituição vigente no Estado moçambicano é notória a importância
que os legisladores do país dão à soberania e jurisdição dos espaços marítimos.
A Soberania dos Estados e o Mar

O território é a extensão física necessária para o Estado localizar-se num determinado espaço
terrestre, marítimo e aéreo. Não existe, portanto um Estado sem território. O território estabelece

13
SOARES, Albino de Azevedo, Lição de Direito Internacional Público, 4a Edição, Coimbra Editora, Coimbra,
1988, p. 217.
14
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 14ª edição, volume I,. Rio de
Janeiro: renovar, 2002, p.71.
15
Cfr. no 2 do art.º 6 da CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei n o 1/2018 de 12 Junho:
Aprova a Constituição, in Boletim da República.

8
a delimitação da acção soberana do Estado. O princípio da impenetrabilidade afirma que um
Estado tem o monopólio de ocupação de um determinado espaço físico.
O Estado Moçambicano possui uma superfície marítima enorme cujo valor geoestratégico não
pode ser subestimado, tanto pelas autoridades nacionais como pela comunidade internacional.16
Nesse sentido, coloca-se a questão de se saber qual é a relação do Estado moçambicano com o
mar. Analisando o mapa de Moçambique, a sua localização no Canal com o mesmo nome, é logo
compreensível que o território moçambicano tem no mar a sua porta de entrada privilegiada no
contacto com o mundo e outras civilizações.
A soberania do Estado moçambicano sobre os espaços marítimos torna-se cada vez mais actual.
O mar tem hoje cada vez maior relevância para a sobrevivência dos Estados pelas suas múltiplas
valências como fonte de riqueza, reserva de recursos energéticos e actuação privilegiada no
campo das comunicações e troca de mercadorias entre os grandes pólos de produção.
A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) dá muita importância à
soberania e jurisdição do mar e ao seu adequado ordenamento e encoraja os países ribeirinhos
como Moçambique, que a façam com responsabilidade e eficácia cuidando os inúmeros recursos
que neles se encontram. Por isso mesmo, o exercício da soberania e do poder do Estado no mar
não pode deixar de se impor como uma das maiores preocupações dos Estados costeiros.
A política marítima da República de Moçambique configurada no seu artigo 5 a Lei nº 20/2019
de 8 de Novembro.17 preconiza três pontos essências que são: A manutenção da soberania e
integridades nacionais; o desenvolvimento da economia marítima nacional; e o desenvolvimento
e a melhoria das condições sociais, ambientais e outras decorrentes das actividades marítimas.
Em função do enunciado que a política marítima em vigor no Estado moçambicano faz com
relação a esta matéria urge ver em que medida é garantido o exercício da soberania e da
jurisdição sobre os espaços marítimos para que estes funcionem como potenciais condições para
o desenvolvimento sustentável da economia nacional moçambicana.18
A Soberania e Jurisdição do Estado Moçambicano nos Espaços Marítimos no âmbito da
CNUDM
O Estado moçambicano ratificou a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito Mar em 13
Março 1997. A Lei do Mar, Lei no 20/2019, de 8 de Novembro, incorpora no seu texto muitos
16
DALLAR, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado, São Paulo, Saraiva, 1998, p.74-95.
17
REPÚPLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei no 20/2019 de 8 de Novembro lei de mar in Boletim da República, I série
n 216 de 08 de Novembro.
o

18
DALLAR, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado, São Paulo, Saraiva, 1998, 1998, P. 86.

9
dos conceitos e definições constantes na Convenção de 1982 no que diz respeito a jurisdição e
soberania dos espaços marítimos.
A Lei no 20/2019 de 8 de Novembro, define os direitos de jurisdição sobre a faixa do mar ao
longo da costa moçambicana. Esta lei cria a Zona Económica Exclusiva e confere direitos
soberanos ao Estado para fins de exploração, aproveitamento, conservação e gestão de recursos
naturais vivos ou não vivos das águas subjacentes ao leito do mar e subsolo, bem como no que se
refere a outras actividades com vista à exploração e aproveitamento da zona para fins
económicos e para a produção de energia a partir da água, das correntes e dos ventos.
Para uma compreensão cabal sobre os desígnios da soberania e jurisdição do Estado
Moçambicano nos seus espaços marítimos, precisamos antes de tudo ver como é que se define
cada espaço e quais são as competências do Estado à luz da CNUDM.
Os espaços marítimos de Moçambique são medidos a partir das linhas de base, que são as linhas
a partir das quais os espaços marítimos são assentes.
Estes são definidos na CNUDM como linhas de base normal 19 ou recta20. A linha de base normal
diz respeito à linha de baixa-mar enquanto a linha de base recta aplica-se a locais onde a linha de
costa é recortada e irregular, como nas entradas das baias, locais com recifes ou franjas de ilhas,
a alínea f) do artigo 1 da Lei nº 4/96,21 incorpora na jurisdição moçambicana estas duas
disposições da CNUDM.
Os espaços marítimos do Estado moçambicano, à luz da CNUDM, para além das águas
interiores, partindo da linha de base definem-se em: Mar Territorial, Zona Contigua e Zona
Económica Exclusiva.
a) Águas Interiores
As águas interiores são aquelas que se situam no interior das linhas de base do Mar Territorial.
Podem ser lagos, estuários, lagoas, rios e albufeiras. Os Estados costeiros possuem total
liberdade para legislar e regulamentar o seu uso, bem como explorar qualquer recurso natural
existente nestas águas, os navios e embarcações estrangeiras não tem o direito de passagem.
Portanto, as águas interiores têm um estatuto equivalente àquele que o Estado costeiro exerce
soberanamente no território terrestre.21 Outrossim, os poderes que o Estado costeiro pode exercer
nas águas interiores não estão dependentes da sua conciliação com os poderes de terceiros

19
art. 5°
20

21
Art.4.da Lei 4/96, de 4 de Janeiro refere-se de forma vaga, remetendo a explicação dos artigos 5 a 13 da CNUDM.

10
Estados. Moçambique possui rios internacionais navegáveis que podem suscitar diferendos com
outros Estados, a título de exemplo, o rio Zambeze serve de possível saída para a exportação de
mercadorias do Malawi.
b) Mar Territorial
O mar territorial é a faixa marítima adjacente às costas do Estado, que vai desde a linha normal
da maré-baixa até a uma distância sobre a qual não há unanimidade de pontos de vista. 22 Nos
termos da CNUDM, (Parte II, Secção 2, arts. 2° e 3°) o Mar Territorial (MT) é definido como
sendo uma zona de soberania23 do Estado com uma largura limite de 12 milhas náuticas contadas
a partir das linhas de base. No art.º 4°, do número 4 da Lei 4/96 que temos vindo a citar são
estabelecidas as coordenadas seguintes para as linhas de fecho e de base rectas demonstradas no
anexo 1 com as respectivas Pontes, Latitudes e Longitudes.
O Estado moçambicano, adoptou para o seu ordenamento jurídico os preceitos da CNUDM em
relação ao Mar Territorial.
Como ficou claro desta disposição, o Estado moçambicano nesta matéria, goza tradicionalmente
de soberania24 sendo fora isso circunscritos os direitos reconhecidos aos terceiros Estados.
No Mar Territorial a soberania do Estado só é limitada pelo “direito de passagem inofensiva de
navios à superfície” Decorrente deste direito, o Estado costeiro, permite aos outros, o direito de
passagem inofensiva aos navios com a bandeira de outros Estados.

Moçambique, como subscritor da CNUDM, no seu mar territorial tem o poder de criar normas
concernentes à segurança da navegação e regulamentação do tráfego marítimo; protecção das
instalações e dos sistemas de auxílio à navegação e outros serviços; protecção de cabos ou ductos
submarinos; conservação dos recursos vivos do mar; pesca; prevenção do meio marinho e ao
controlo da poluição; investigação científica e aos levantamentos hidrográficos; e à matérias
aduaneira, fiscais, de imigração e de segurança.
Compete em última instância, às autoridades do Estado moçambicano no seu mar territorial
fazer: a segurança e a defesa; exercícios e manobras militares com armas de qualquer tipo;
22
SOARES, Alberto de Azevedo, lições de Direito Internacional Publico, 4ª edição, Coimbra editora, Coimbra,
1988. P.226.
23
Soberania entendida como o resultado de um conjunto de poderes internos, harmonizados, sobre os quais se
estabelecem os fundamentos e se realizam os objectivos do Estado dentro e fora de seu território, em consonância
com as regras e princípios de direito internacional.
24
Artigo 2 da Convenção de 1982, está expressamente previsto que a “soberania sobre o mar territorial é exercida
de conformidade com a presente Convenção e demais normas de direito internacional”.

11
lançamento, pouso ou recebimento a bordo de qualquer dispositivo militar; actividades de pesca;
actividades de investigação ou levantamento hidrográfico; o exercício do direito de passagem
inofensiva, reconhecido aos navios de outros Estados. No Mar Territorial, o Estado ribeirinho
exerce efectivamente a soberania e o controlo total sobre a massa líquida e o espaço aéreo
subjacente, bem como o leito e o subsolo desse mar.

c) Zona Contigua

A Zona Contigua (ZC) encontra-se definida na Secção 4 da Parte II da CNUDM, no artigo 33º,
conforme o qual a Jurisdição do Estado Costeiro, neste espaço marítimo, deve limitar-se a evitar
e reprimir as violações aos regulamentos aduaneiros nacionais, as normas fiscais, de imigração
ou sanitários. A Lei do Mar fixa o limite desta faixa marítima em 24 milhas, medidas a partir das
linhas de base.
O artigo 8º da Lei 4/96, de 4 de Janeiro 25, não só define a Zona Contigua assim como se refere às
competências que Estado de Moçambique se reserva.
Por via da conjugação das leis nacionais e internacionais sobre o mar, assiste ao Estado
moçambicano, para sua afirmação, criar legislação compatível para prevenir e debelar as
infracções às leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de emigração ou sanitários que ocorram
tanto no espaço terrestre ou marítimo do seu território nacional; fiscalizar os navios e outras
embarcações que estejam a violar a legislação marítima em vigor; reprimir com os meios legais e
de coerção a violação dos dispositivos regulamentares soberanamente aprovados pelo Estado
para o seu território; e criar regulamentos tendentes a defesa do meio ambiente marinho, sua
biodiversidade assim como medidas para prevenir e reprimir a sua violação.

Como se pode perceber consagrou-se portanto, uma zona contígua apenas em matéria aduaneira,
fiscal, sanitária e de emigração, a qual, para todos os outros efeitos, conserva o caracter de parte
do alto-mar.26
d) Zona Económica Exclusiva
O artigo 55°, da CNUDM define o regime jurídico específico da Zona Económica Exclusiva
(ZEE), ao defini-la como “zona situada para além do mar territorial e a este adjacente, sujeita a
25
Cfr. Art.º 8º. da Lei 4/96 de 4 de Janeiro
26
SOARES, Alberto de Azevedo, lições de Direito Internacional Publico, 4ª edição, Coimbra editora, Coimbra,
1988. P. 233

12
um regime jurídico específico estabelecido na segunda parte, segundo o qual os direitos e
jurisdição dos Estados costeiros e os direitos e liberdades dos demais Estados são regidos pelas
disposições pertinentes na presente Convenção”.
A largura definida para a ZEE pela Lei do Mar é de 200 milhas náuticas. O Estado
moçambicano, na qualidade de signatário da CNUDM, adoptou para o seu ordenamento jurídico
esta definição através do artigo 9°, da Lei do Mar Nacional 27 atribuindo-se a si os direitos de
jurisdição e os deveres que assistem os Estados costeiros da seguinte forma:

Na Zona Económica Exclusiva, o Estado costeiro tem:


a) Direito de soberania para fins de exploração e aproveitamento, conservação e gestão dos
recursos naturais, vivos ou não vivos das águas sobrejacentes ao leito do mar, e seu subsolo, e no
que se refere a outras actividades com vista a exploração e aproveitamento da zona para fins
económicos, como a produção de energia a partir da água, das correntes e dos ventos;28
b) Jurisdição, em conformidade com as disposições pertinentes da presente Convenção, no que
se refere a:
i. Colocação e utilização de ilhas artificiais, instalação e estruturas;
ii. Investigação científica marinha;
iii. Protecção e preservação do meio marinho.

c) Outros direitos e deveres previstos na presente Convenção.


Fica claro a partir da análise da normação que a CNUDM faz em relação a ZEE, que os poderes
do Estado moçambicano podem dividir-se em duas relevantes categorias como sejam o direito de
soberania por um lado e por outro o direito de jurisdição como está referido no artigo 56º,
competindo ao Estado moçambicano fazer valer estas prerrogativas internacionais adoptando-as
no ordenamento jurídico local.

e) A Plataforma Continental

27
Artigo 9 da Lei 4/96, de 4 de Janeiro: A zona económica exclusiva da República de Moçambique compreende
a faixa do mar além e adjacente ao mar territorial que se estende até à distância de 200 milhas marítimas
medidas a partir da linha de base a partir da qual se mede o mar territorial.
28
REPÚPLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei no 20/2019 de 8 de Novembro lei de mar in Boletim da República, I série
n 216 de 08 de Novembro.
o

13
É o prolongamento submerso de massa terrestre, constituida pelo seu leito, subsolo, talude e
elevacao continental.29
O conceito de Plataforma Continental é definido na parte IV da CNUDM, concretamente nos
artigos 76° e 77° de forma seguinte:
A plataforma continental de um Estado costeiro compreende o leito e o subsolo das áreas
submarinas que se estendem além do seu mar territorial em toda a extensão do prolongamento
natural do seu território terrestre, até ao bordo exterior da margem continental, ou até a distância
de 200 milhas marítimas das linhas de base a partir das quais se mede a largura do mar territorial,
nos casos em que o bordo exterior da margem continental não atinja essa distância.30

A Lei do Mar aprovada pelo Estado moçambicano que temos vindo a anunciar, faz um
complemento à CNUDM, e, entre outras afirmações dela se pode deduzir o seguinte:
A margem continental compreende toda a prolongação submersa da massa continental do estado
dotado de litoral e é dotada de um leito e do subsolo da plataforma, o talude e a emersão
continental. Não compreende, porém, o solo oceânico profundo com sua área oceânica, incluindo
aí o seu subsolo.
Os pontos fixos que compreendem o limite exterior da plataforma continental em leito marítimo
devem estar situados a uma distância que nunca ultrapasse as 350 milhas marítimas contadas a
partir das linhas de base, as quais se mede o comprimento do mar territorial de 100 milhas
contadas a partir da curva de 2500 metros.
A água que cobre a plataforma continental possui vida marinha em abundância e grande parte da
pesca mundial se realiza nesta zona. É nela que se encontra a quarta parte da produção mundial
de petróleo e gás procedentes das rochas que se encontram submersas.
A CNUDM, estabelece para o Estado moçambicano, entre outros privilégio, vastos direitos na
sua plataforma continental, dos quais se destaca: direitos de soberania para a exploração dos
recursos naturais, incluindo os recursos minerais e outros não vivos do leito do mar e do subsolo;
direitos exclusivos de autorização e regulamentação de perfurações; direitos de estabelecer
condições para os cabos e os ductos submarinos que penetrem no seu território marítimo; e,
direitos exclusivos de autorização e realização de investigação científica marinha.

29
FERRÃO, Marisa Caetano, A Delimitação Da Plataforma Continental Além Das 200 Milhas Marítimas, Lisboa:
AAFDL, 2009.
30
Cfr. Art.º. 76 da CNUDM

14
Para tanto, pode construir e manter ou fazer funcionar sobre a plataforma continental todas as
instalações ou dispositivos necessários, podendo estabelecer, em redor, zonas de segurança de
quinhentos metros, que todos os navios estrangeiros devem respeitar. Tais instalações e
dispositivos não têm o estatuto de ilhas, apesar de estarem submetidos à jurisdição do Estado
ribeirinho e não tem, portanto, mar territorial próprio, não influindo a sua presença na
delimitação do mar territorial do Estado Costeiro.31
Os direitos do Estado ribeirinho na plataforma continental não dependem de qualquer tipo de
proclamação nem de ocupação.
As águas suprajacentes à plataforma continental conservam o carácter de alto-mar, havendo, pois
liberdade de navegação e de sobrevoo; na superfície da plataforma continental, todos nos Estados
podem proceder à colocação de oleodutos e de cabos submarinos, devendo o Estado ribeirinho
conceder autorização às pesquisas oceanográficas, especialmente quando são levadas a cabo por
uma instituição especializada.
Quando a plataforma continental é adjacente ao território de dois ou mais Estados cujas costas
são opostas, o limite de cada plataforma será determinado por acordo ou, na falta dele, pela linha
mediana em relação à linha de base do mar territorial. Quando a plataforma continental é
adjacente ao território de dois Estados limítrofes, a sua delimitação segue os mesmos critérios.32

A Exploração dos Recursos Marinhos não vivos

O art.º 82º, da CNUDM, sob a epígrafe “Pagamentos e contribuições relativos ao aproveitamento


da Plataforma Continental além das 200 milhas marítimas”, estabelece a obrigação que impende
sobre os EC de efectuarem pagamentos ou contribuições aos demais Estados Parte pelo
aproveitamento que façam da sua Plataforma continental além das 200 M. Este artigo,
constituído por 4 números, determina, no n.º1, o dever de efectuar pagamentos ou contribuições
em espécie pelo aproveitamento dos recursos não vivos, sendo que o n.º 2 estabelece a taxa e o
momento em que os mesmos devem ser realizados. O n.º 3 prevê uma isenção a esse dever por
parte dos Estados em desenvolvimento caso sejam importadores substanciais daquele recurso

31
SOARES, Alberto de Azevedo, lições de Direito Internacional Publico, 4ª edição, Coimbra editora, Coimbra,
1988. P. 236
32
Idem, P. 236

15
extraído da sua Plataforma. Por último, o n.º 4 estipula a forma como, e a quem, deve ser
efectuada a distribuição desses pagamentos ou contribuições.33

O art.º 82º, a par com o art.º 76º, nasce do compromisso que foi estabelecido entre os
denominados “Estados com plataformas extensas” e os Estados que tencionavam limitar a
extensão da Plataforma continental apenas às 200 M. A primeira parte desse compromisso
corresponde ao art.º 76. Nele se fixa a definição da PC, bem como as fórmulas (junto com o
Anexo II da Ata Final da IIICNUDM) que podem ser utilizadas pelos Estados para estabelecer os
limites exteriores da mesma. Este art.º prevê ainda a possibilidade dos Estados estenderem a sua
Plataforma continental além das 200 M. Alguns Estados viram esta possibilidade de extensão
como uma diminuição da Área enquanto Património Comum da Humanidade. 34 Então, através da
segunda parte deste compromisso, os ECs com amplas margens comprometeram-se com os
demais Estados, em troca da possibilidade de estenderem as suas Plataformas além das 200 M, a
efectuar pagamentos ou contribuições em espécie pelo aproveitamento dos recursos não vivos
que obtivessem da extensão para lá das 200 M. Os mesmos seriam distribuídos, por intermédio
da Autoridade, pelos demais Estados Parte com base em critérios de partilha equitativa.35

Assim, o art.º 82º determina o princípio desses pagamentos e contribuições, e estabelece os


termos e as condições para os mesmos, criando para uns Estados um direito a receber e para
outros um dever/obrigação de efectuar pagamentos. Este compromisso final de mútuas cedências
foi incluído na CNUDM pelos referidos art.ºs 76º e 82º.

Os direitos de soberania que o EC exerce sobre a sua Plataforma continental existem decorrentes
da soberania que o mesmo detém sobre o seu território, como tal, são independentes do
estabelecimento dos limites exteriores da mesma ou da sua extensão. O art.º 77º prevê o direito
que assiste aos ECs de explorarem e aproveitarem os recursos naturais existentes nas suas
Plataformas. Assim sendo, aos ECs é permitido o exercício desses direitos independentemente da

33
Cf., NANDAN and ROSENNE, ob. cit., p. 932.
34
Como tal, ocorreria uma diminuição do espaço e dos recursos que poderiam ser explorados por todos os Estados.
Os Estados que queiram explorar os recursos existentes na Área terão que pagar licenças e taxas pelas actividades
que exerçam nesse espaço, bem como repartir as receitas que obtenham dessa exploração com os demais Estados,
com especial incidência nos Estados em desenvolvimento ou sem litoral. Essa repartição será feita pela Autoridade
Internacional dos Fundos Marinhos, instituição criada pela Convenção para actuar na Área em nome do interesse da
Humanidade, e também controlar e organizar as actividades nesse espaço.
35
MONCADA, António Cabral de. Curso De Direito Internacional Público. Vol. I, Coimbra: Almedina, 1996, p.
365.

16
fixação dos limites exteriores da Plataforma continental além das 200 M, não estando a
exploração e aproveitamento dos recursos não vivos dependentes dessa fixação.36

Espaço Marítimo Sob Jurisdição Internacional: A Área

A Convenção de Montego Bay criou uma denominação para aquela região que vai além dos
poderes soberanos dos Estados, ou seja, a região que não se encontra sob o manto de nenhum
ordenamento jurídico específico por se tratar de uma área que está além dos limites da zona
económica exclusiva e da plataforma continental dos Estados. Esta região que ficou denominada
como “Área” é considerada, de antemão, como património comum da humanidade, não sendo
facultado a nenhum Estado o direito de poder reivindicar ou de exercer soberania ou direitos de
soberania sobre qualquer parte da área ou seus recursos, o que quer dizer também que nenhum
Estado ou pessoa jurídica, singular ou colectiva, pode apropriar-se de qualquer parte da área ou
dos seus recursos.

Da mesma forma com que a Convenção de Montego Bay criou e deu um tratamento jurídico para
o espaço marítimo sob jurisdição estatal, dividindo-o em zonas, cada um com suas
funções e regramentos peculiares, a Convenção de 1982 também criou uma região,
disciplinando-a juridicamente, que não estava submetido a qualquer poder estatal, exactamente
por se tratar de uma região que era de interesse de todos os países e não apenas de ou de outro.
Foi então que se desenvolveu a tese lançada pelo embaixador de Malta, Arvid Pardo, em
discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas em 1967, do fundo marinho e das regiões que
vão além dos limites de jurisdições nacionais serem considerados como patrimónios comuns da
humanidade.

Em face de ter sido colocado de tal maneira, pondo-se a Área sob os auspícios da comunidade
internacional e tão somente a ela submetida, necessitar-se-ia que se criasse uma organização ou
uma entidade internacional que congregasse todos os interesses da comunidade internacional, a
fim de que pudesse ela gerir aquele tão valioso património comum da humanidade, e que pudesse
disciplinar e arregimentar os seus múltiplos usos pelos Estados, tal como a explotação de seus
recursos que a própria Convenção denominou-os, no seu art.º 133, a) e b). Foi a necessidade de
regulamentar a racionalidade e a equitatividade no uso e na explotação de recursos nas áreas

36
OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de, Direito Do Mar, Coimbra, Almedina, 2008, P. 632.

17
comuns da humanidade que levou os Estados a instituírem o regime jurídico dos fundos
marinhos.37

Geograficamente, os limites da área coincidem com os limites exteriores da plataforma


continental, que são estabelecidos conforme critério batimétrico, ou geográfico, de 200 milhas,
variável até 350, critério isobárico, que verifica a profundidade até 2.500m e critério geológico,
dado pela possibilidade de instituição de limites que abranjam a existência de rochas
sedimentares, afora os casos de acordo para delimitação de plataformas adjacentes ou vis-à-vis.

Referências bibliográficas

Legislação
37
BROWNLIE, Ian, Princípios de Direito Internacional Público, 4ª edição, Lisboa, Calouste Gulbenkian, 1997.

18
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República de Moçambique, Lei no 1/2018 de 12
Junho: Aprova a Constituição, in Boletim da República.

REPÚPLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei no 20/2019 de 8 de Novembro, Lei de Mar in Boletim


da República, I série no 216 de 08 de Novembro.

Doutrina

SOARES, Alberto de Azevedo, lições de Direito Internacional Publico, 4ª edição, Coimbra


editora, Coimbra, 1988.

BROWNLIE, Ian, Princípios de Direito Internacional Público, 4ª edição, Lisboa. Calouste


Gulbenkian, 1997.

OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de, Direito Do Mar, Coimbra, Almedina, 2008.

FERRÃO, Marisa Caetano, A Delimitação Da Plataforma Continental Além Das 200 Milhas
Marítimas, Lisboa: AAFDL, 2009.

DALLAR, Dalmo de Abreu, Elementos de Teoria Geral do Estado, São Paulo, Saraiva, 1998.

MONCADA, António Cabral de, Curso De Direito Internacional Público, Volume I, Coimbra:
Almedina, 1996.

BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10ª edição, Editora Malheiros, São Paulo, 1996.

BOBBIO, Norberto, Teoria do Ordenamento Jurídico, 10ª ed.: Editora Universidade de


Brasília, 1999.

BOBBIO, Norberto, Dicionário de política. 13ª Edição, Brasília: Editora Universidade de


Brasília, 2008.

MENEZES, Wagner, Direito do Mar, Brasília, 2015

REZEK, Francisco, Direito Internacional Publico curso elementar, 13ª ed.: Coimbra Editora
Saraiva, 2011.

MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 14ª Edição,


volume I,. Rio de Janeiro: renovar, 2002.

19
NANDAN, Satya N., and ROSENNE, Shabtai. United Nations Convention on the Law of the
Sea, 1982: A Commentary. edited by Satya N. Nandan and Shabtai Rosenne. Vol. II, The
Netherlands Martinus Nijhoff Publishers, 1993.

Disponível em:
https://www.google.com/irl?sa=t&source=web&rct=j&url=http://www.geoturismobrasil.com/
Material%2520didacticolRecursos%2520do&2520mar.pdf&ved=2ahUKwi6pqylhMbvAhW-
QEEHQVaDz4OFjACegQIFjACegQOIFBAC&usg+=AOvVa3qf2WT5YwaoNIYHRPsvTi .Ace
sso no dia 23.03.2021.

Disponível em: https://www.emepc.pt/recursos-marinhos.Acessado em 18/03/2021.

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