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Wheeties/CC
O império e a colônia
ENQUANTO DEVASTAVA o Caribe, Sandy era apenas uma “tor-
menta tropical”, quase ignorada pela mídia de Bruzundanga. Ele já
provocara dezenas de mortes na América Central e no Caribe, mas
não merecera sequer 15 segundos de atenção nos telejornais da co-
lônia. Quando desembarcou em praias estadunidenses, porém, o fu-
racão tornou-se uma celebridade, com muito mais destaque na tv do
que os shows (?) de Lady Gaga ou a derrota de Serra em São Paulo.
Era de dar dó o ar compungido que Mr. Bonner exibia ao tratar da
“tragédia em Nova Iorque”. Com a pronúncia impecável dos órfãos
de Tio Sam, ele nos informava passo a passo sobre os estragos que
Sêindi provocara na ilha de Manhattan, o coração do capital finan-
ceiro internacional. De fato, se fôssemos nos guiar pelo noticiário da
Rede Globo e de certas emissoras de rádio, seria possível crer que vi-
vemos nos EUA – e não nestes esfuziantes e tórridos trópicos ao sul
do Rio Bravo.
Até jornalistas da grande imprensa tupiniquim se incomodaram
com a papagaiada. A histeria faz crer que não seja piada o lugar-co-
mum das redações, segundo o qual um ianque assustado vale cerca de
40 caribenhos mortos ou 50 corpos africanos... O povo de Cuba, aliás,
conhece muito bem essa máxima: rota preferida dos ciclones e fura-
Obama dará continuidade cões, a terra de José Martí os enfrenta com invejável galhardia e mui-
ta organização social, a ponto de perder menos vidas que a Big Apple
(11 x 21).
Não estranho o “paradoxo” entre as duas ilhas. Na terra do primo
A REELEIÇÃO de Barack Obama
foi recebida com simpatia pelos seus
A utilização Times, têm sido mortos. Durante a
campanha, Obama evitou o envolvi-
pobre, o cidadão respeita as instruções do seu governo e, disciplina-
do, prioriza a segurança coletiva, evitando acidentes fatais; para o pri-
aliados europeus. Sobre ele chovem
elogios.
dos aviões sem mento dos EUA em novas guerras de
agressão. Mas, reeleito, a sua estra-
mo rico, a “pátria da liberdade”, vale a lei de Murici (“cada um trata de
si”). Não por acaso, em Nova Iorque uma pessoa morreu dentro de seu
Mas a sua campanha eleitoral não
transcorreu na atmosfera triunfa-
piloto, os drones, tégia belicista de dominação mun-
dial vai ser retomada. O ataque à Sí-
carro, atingido pela queda de uma árvore em pleno vendaval.
lista da anterior. O presidente não substituiu ria será o próximo objetivo. A deci-
cumpriu as promessas sintetizadas
no slogan “sim, nós podemos!”, que progressivamente
são será americana, muito embora
Washington incumba dessa tarefa a
E aí eu pergunto: de quantos Sandys
em 2008 entusiasmou milhões de
compatriotas que acreditaram numa os
Turquia e provavelmente a França e
a Grã-Bretanha.
precisaríamos para varrer esse lixo?
“mudança”. Resolvida “a questão síria”, os
O país continua mergulhado numa bombardeamentos EUA, em parceria com Israel, inten-
crise profunda. A dívida pública in- sificarão a campanha mundial que Isso tudo às vésperas da (re)eleição do bom-mulato Obama, acom-
terna aumentou para um nível astro- da força aérea visa a destruição do seu grande “ini- panhada com fervor pela mídia local. Faz sentido: se já há revistas por
nômico. A dívida externa é a maior migo” na região, o único grande Es- aqui com títulos e chamadas em inglês (vi uma que não tinha guia de
do mundo. O déficit da balança co- tradicional tado islâmico que não se submete à lazer, e sim living guide, além de welcome, at home e who’s who),
mercial é colossal. Os EUA são ho- sua estratégia imperial: o Irã. como querer que nossos repórteres não sonhem ser um novo Paulo
je um estado parasita que consome A atual política para a América La- Francis, arrulhando profecias como correspondente nos EUA?
muito mais do que produz e man- tina, que através de golpes de Esta- Só não dirão, obviamente, quão bizarra é a “festa da democracia”
tém a hegemonia mundial em conse- do atípicos – Honduras e Paraguai – ianque, à qual só comparecem 40% dos seus eleitores. Aliás, o que fa-
quência do seu enorme poderio mi- exterior que tenha configurado pa- afastou presidentes incômodos, te- lar da farsa, com seus debates inócuos, seu moralismo puritano de
litar. A política financeira de Obama, ra a humanidade uma ameaça com- rá continuidade. Washington sofreu araque e tanta alienação social cristalizada? De quantos Sandys preci-
concebida para favorecer as grandes parável à desenvolvida por Barack uma derrota importante com a ree- saríamos para varrer esse lixo?
transnacionais e a banca, contribuiu Obama. leição de Hugo Chávez, mas a guerra
para agravar o desemprego e mante- No Iraque, vandalizado pela ocu- não-declarada contra a revolução ve- E vai rolar a festa...
ve na miséria dezenas de milhões de pação militar, permanecem milha- nezuelana vai prosseguir. As eleições acabaram há mais tempo na Colônia – e os abutres já es-
famílias. res de oficiais e dezenas de milhares A prioridade na estratégia belicista tão de volta à cena pública. Aqui no Rio, com a farra da Copa e das
Romney com o seu programa as- de mercenários e a violência é um da nova administração será, contu- Olimpíadas, andam ainda mais assanhados. Sem perder tempo, o al-
sustou os negros, os latinos e um flagelo endêmico. No Afeganistão, a do, a China. Obama foi transparen- caide (re)eleito anuncia que vai demolir o velódromo do Pan para
amplo setor da pequena burgue- guerra está perdida. A maior parte te quando anunciou que dois terços construir um novo e que pretende retalhar uma Área de Proteção Am-
sia branca. No início o seu discurso do país encontra-se sob controle das do poder aeronaval dos EUA vão ser biental para fazer um campo de golfe olímpico (!). De quebra, ainda
era tão reacionário que o modificou, forças que combatem a ocupação concentrados na Ásia Oriental. É por decretou a morte da Escola Arthur Friedenreich, instalada no Maraca-
deslocando-se da direita cavernícola dos EUA e da Otan, e o governo fan- ora imprevisível o estilo que assumi- nã, que dará lugar a uma quadra de aquecimento (!) para os jogadores
para o centro. toche de Karzai é odiado pelo povo. rá a política anti-chinesa (e anti-rus- do Mundial 2014. Como diriam os cariocas, é mole ou quer mais?
Nos debates televisivos que en- A utilização dos aviões sem pilo- sa) de Barack Obama. Mas pode-se Este cronista pressente que os caprichos da tchurma da bandana
cerraram o grande circo milionário to, os drones, substituiu progressi- antecipar que o seu segundo manda- lhe custarão caro. A Audiência Pública do último dia 8/11 provou isso:
da campanha eleitoral ele e Obama vamente os bombardeamentos da to será para a humanidade tão nega- cerca de 500 pessoas, entre alunos e pais da escola municipal, jovens
coincidiram praticamente nas ques- força aérea tradicional. O presiden- tivo ou mais do que o primeiro. da Frente Nacional de Torcedores e chefes indígenas, foram até lá bo-
tões fundamentais. te Obama elogiou repetidamente du- Cabe perguntar: como foi possível tar água (e outras cositas) no chope dos playboys e dizer que, de Ca-
A mídia apresentou a política in- rante a campanha o recurso a essa atribuir a tal homem o Prêmio No- bral a Cabral, desde 1500 a coisa vai de mal a pior. Sem ter o que argu-
ternacional do presidente como o nova modalidade criminosa de guer- bel da Paz? mentar, o secretário da Casa Civil, Régis Fichtner, jurou que o governo
grande êxito do seu mandato; Rom- ra. É ele pessoalmente quem selecio- Fez uma chuva de novas promes- está fazendo “o melhor para o Rio”. Em resposta, o pau comeu na casa
ney não a criticou. Essa coincidência na os “inimigos” a abater em listas sas, mas elas serão engavetadas tal de Noca, sinal de que outras batalhas virão. E aí eu pergunto: de quan-
dos candidatos é por si só revelado- elaboradas pela CIA, submetidas à como as do primeiro mandato. tos Sandys precisaríamos para varrer esse lixo?
ra do nível de alienação do eleitora- sua aprovação. Mas nesses bombar-
do da grande república. deamentos “cirúrgicos” a aldeias do Miguel Urbano Rodrigues é jornalista Luiz Ricardo Leitão é escritor e professor associado da UERJ. Doutor em Estu-
É difícil encontrar precedente na Paquistão milhares de camponeses, e escritor português. Escreve uma vez dos Literários pela Universidade de La Habana, é autor de Noel Rosa – Poeta
história dos EUA para uma política como reconhece o próprio New York por mês para o Brasil de Fato. da Vila, Cronista do Brasil e de Lima Barreto – o rebelde imprescindível.
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de 15 a 21 de novembro de 2012 3
Educação urgente!
iconoclasistas.com.ar
Delicadeza perdida
capital. Essa mudança é tão expressiva, que até grandes gru-
pos estrangeiros passaram a investir pesado em nosso ensi-
no superior privado. Depois do agribusiness, agora temos o
unibusiness.
Existe um projeto aprovado pela Câmara dos Deputados,
“DEPENDENDO DAS CIRCUNSTÂNCIAS, o brasilei- Mas será que perdemos a delicadeza de vez para o nos- e ainda em tramitação no Senado Federal, que assegura 10%
ro pode dar numa raça generosa ou um povo até triste e so lado mais sombrio, ou nos escapa a capacidade de re- do PIB para alocação obrigatória em educação. Esse seria o
amargurado”. A frase é de Chico Buarque de Hollanda, presentar e compreender a agressividade que predomina primeiro passo para a grande transformação tão necessária
em depoimento ao documentário Chico – ou o país da de- nas relações sociais? A forma como a violência é retratada no nosso sistema de ensino. A questão não é apenas de me-
licadeza perdida (1990), de Walter Salles. No filme, Chico nos vários meios de comunicação de massa apontaria pa- lhorar os aspectos quantitativos de mais escolas, mais vagas
comenta a teoria do homem cordial de seu pai, o sociólogo ra a segunda alternativa. e mais professores. É fundamental melhorar também os ele-
Sérgio Buarque de Hollanda, enfatizando que “a ideia do Dois exemplos recentes só para abrir a discussão. Coin- mentos de qualidade da educação em nosso país. Isso por-
homem cordial é a do homem que reage conforme o seu cidentemente, na mesma semana na qual anunciou-se que as avaliações dos resultados continuam muito fracas,
coração, para o bem e para o mal, capaz de grandes efu- um aumento de 67% no número de estupros nos últimos seja pelos elevados índices de analfabetismo funcional, se-
sões amorosas e capaz de inimizades violentas (...)” três meses em São Paulo, a novela Salve Jorge da Rede ja pelas comparações internacionais de desempenho em tes-
O mote escolhido por Walter Salles não poderia ser Globo exibiu uma cena definida como um “estupro light”. tes básicos envolvendo capacidades em leitura, matemática
mais atual. De certo modo a obra de Chico Buarque trafe- Será que a cena de algum modo ilumina a questão da vio- e ciências.
ga nesse fio da navalha da alma humana e, ao revelar as- lência contra a mulher por algum dos seus ângulos? Ou se A urgência de uma verdadeira revolução na educação é in-
pectos contraditórios do nosso comportamento através vale do impacto emocional e da potência agressiva do ges- questionável. Cabe uma mudança radical de mentalidade, de
de um lirismo inspirado no samba e na bossa-nova, nos to para girar a roda da violência enquanto produto? focarmos no Brasil das próximas gerações e não apenas da
ajuda a pensar no que estamos fazendo com o nosso ima- Último exemplo. Diante da média de 26,2 assassina- miopia do “depois de amanhã”. E isso implica projetos inova-
ginário hoje. tos para cada grupo de cem mil habitantes, o Ministério dores e modernizantes de orientação pedagógica, com a ne-
Um país cuja colonização envolveu um genocídio indí- da Justiça e o Conselho Nacional de Justiça, dentre ou- cessária valorização das condições salariais e de trabalho dos
gena e a escravidão de mão de obra africana, e posterior- tras entidades, criaram a campanha “Conte até 10. Paz”. professores. Não basta crescer a economia e distribuir a ren-
mente permitiu uma das maiores desigualdades sociais Quem foram os escolhidos para serem os protagonistas da, caso o projeto de desenvolvimento nacional não coloque
do planeta, não poderia almejar um arquétipo pacífico. dos vídeos da campanha? Lutadores de UFC: Júnior Ci- a educação de qualidade como prioridade-zero do país.
Entretanto, pela própria influência das culturas africana gano, Anderson Silva e Leandro Guilheiro. Para combater
e indígena, articulamos uma afetividade própria, abrin- a violência usa-se assim de violência pura, ainda que esti- Paulo Kliass é doutor em economia pela Universidade de Paris
do-nos para múltiplas formas de “efusões amorosas”, co- lizada. Metáfora maior para o que está acontecendo com 10 (Nanterre) e integrante da carreira de Especialistas em Políti-
mo diz Chico Buarque. a imagem da violência no Brasil não há. cas Públicas e Gestão Governamental, do governo federal.
fatos em foco
da Redação
Royalties para a Educação dad aproveitou para tratar de alguns pontos Isso garantirá regras de trabalho mais cla-
Em nota, a CUT defende o cumprimento fundamentais de sua futura administração, ras, valorizando a carreira e garantindo um
da meta 20 do Plano Nacional da Educa- como a questão de habitação e da mobilida- piso salarial.
ção (PNE), que prevê a destinação de 10% de urbana. Fernando Haddad informou que
do PIB para a Educação. De acordo com a pretende construir 55 mil unidades habita- Atendimento a estudantes de SP
Central, construiu-se um amplo consenso cionais em São Paulo (SP), e pediu apoio do Oferecer tratamento oftalmológico in-
no qual seria indispensável a destinação de ministério para área de mobilidade urbana, tegral, ampliar a capacidade instalada de
100% dos recursos oriundos dos royalties um dos maiores problemas dos paulistanos. atendimento no país, com formação de
do petróleo para este fim. Havia concor- cadastro nacional de estabelecimentos pri-
dância da presidenta Dilma, bem como do Profissão de comerciário vados e públicos especializados na área de
ministro da Educação Aloizio Mercadante. O Projeto de Lei nº 3.592/2012, que oftalmologia, além de reajustar valores de
Porém, a Câmara dos deputados aprovou o regulamenta a profissão de comerciário, procedimentos na tabela do Sistema Único
texto-base do Senado Federal do Projeto de deve ser avaliado nos próximos dias pela de Saúde (SUS). Estas são as principais
Lei nº 2565/2011, que muda a distribuição Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) novidades do novo projeto Olhar Brasil,
dos royalties do petróleo. da Câmara dos Deputados. O relator do desenvolvido pelo Ministério da Saúde em
projeto, deputado Zezéu Ribeiro (PT-BA), parceria com o Ministério da Educação.
Moradias em SP deu parecer favorável à sua aprovação. A Com nova redefinição, o projeto estima
O ministro das Cidades, Aguinaldo Ribei- matéria, que teve origem no Senado, já foi atender até 2014, 190.345crianças, jovens
ro, reuniu-se dia 12 com o prefeito eleito de aprovada pelas Comissões de Desenvolvi- e adultos matriculados na rede pública e
São Paulo, Fernando Haddad, para estabe- mento Econômico, Indústria e Comércio e inseridos nos programas Saúde na Escola
lecer parceria do maior município brasileiro de Trabalho. São 12 milhões de trabalha- (PSE) e Brasil Alfabetizado (PBA) no esta-
com o ministério. Na oportunidade, Had- dores que aguardam essa regulamentação. do de São Paulo.
4 de 15 a 21 de novembro de 2012 brasil
ECONOMIA
Aquisições estrangeiras
batem recorde em 2012
CÓDIGO PENAL
Temas relacionados à
saúde estão entre os mais
polêmicos no o projeto de
lei que propõe a reforma
do Código Penal
Viviane Tavares
do Rio de Janeiro (RJ)
Aborto
O aborto, considerado um dos grandes
avanços deste projeto, também é alvo de
críticas. Na nova redação, no artigo 128,
mulheres que não tenham condições psi-
cológicas de arcar com a maternidade
constatadas por médico ou psicólogo e
que optem por interromper a gestação,
podem realizar o aborto. De acordo com
a doutora em antropologia e professora
da Universidade de Brasília (UnB) Débo-
ra Diniz, os assuntos relacionados à saú-
de são considerados mais polêmicos por-
que não são tratados com a laicidade que
deveria ter o Estado. Prova disso é o nú-
mero de emendas às temáticas relacio-
nadas à saúde, que chegam a quase 1/3
do total. “O tema tem uma pauta religio-
sa em um espaço democrático. Não esta-
mos defendendo um Estado ateu, mas
que reconheça a pluralidade de crenças
e necessidades diversas. As mulheres re-
ligiosas vão estar protegidas, caso não Protesto no STF contra o aborto: assuntos relacionados à saúde não são tratados com laicidade
6 de 15 a 21 de novembro de 2012 brasil
ONU
direitos a imigrantes
Pelo menos 300 mil
latinos-americanos
Guilherme Zocchio
de São Paulo (SP) vivem hoje na cidade
de São Paulo, segundo
A RELATORA da ONU para Formas de
Escravidão Contemporânea, a advogada levantamento do Cami
armênia Gulnara Shahinian, defendeu
em sua passagem pelo país que o gover-
no brasileiro ratifique a Convenção so- Enquanto não assina a Convenção da
bre a Proteção dos Direitos dos Traba- Em São Paulo, juízes atendem bolivianos e paraguaios sobre questões referentes ao trabalho ONU, ainda hoje, um dos principais ins-
lhadores Migrantes e Membros de Sua trumentos jurídicos que orienta sobre a
Família. Trata-se do acordo da Organi- O Brasil é o único país membro temente, no Paraná, 71 paraguaios foram presença de imigrantes no país é a Lei nº
zação das Nações Unidas (ONU) que ga- encontrados sujeitos à escravidão con- 6.815/1980, do período militar, também
rante direitos de trabalhadores migran- do Mercosul que não é signatário temporânea. conhecida como Estatuto do Estrangei-
tes e suas famílias. Durante audiência do acordo, em vigor desde 2003 Para Leonardo Sakamoto, coordena- ro, e em muitos pontos contraditória a
pública, dia 9 de novembro, na Assem- dor da Repórter Brasil, é preciso enten- alguns princípios da própria Constitui-
bléia Legislativa do Estado de São Pau- der que a situação do trabalho escravo ção Federal de 1988. O coordenador do
lo (Alesp), ela elogiou a experiência bra- de imigrantes não diz respeito somen- Cami defendeu a importância de o Brasil
sileira no combate ao trabalho escravo, isolados”, pontuou. Muitos dos estran- te ao indivíduo que sai de sua terra pa- adotar políticas favoráveis a migrantes.
mas defendeu que o país precisa assinar geiros, por entrarem no país em situa- ra procurar melhores condições de vida, A relatora da ONU defendeu que o
o tratado para assegurar dignidade aos ção precária, terminam em condições de mas deve ser encarada como um proble- combate ao trabalho escravo deve envol-
trabalhadores estrangeiros. trabalho subumanas. “Por causa da vio- ma de toda a sociedade. “A culpa da de- ver também “a conscientização dos tra-
O Brasil é o único país membro do lência que lhe é imposta, seja a guerra, a gradação e do cerceamento da liberdade balhadores e a reinserção, para trazer os
Mercosul que não é signatário do acor- desigualdade ou a pobreza, o imigrante é só do outro ou é nossa também?”, ques- trabalhadores de volta à situação de nor-
do, em vigor desde 2003. Gulnara e re- se vê obrigado a deixar seu país”, salien- tionou durante a audiência da comissão malidade”. Em maio deste ano, ela tam-
presentantes da sociedade civil aponta- tou na reunião o Padre Roque Patussi, de direitos humanos da Alesp. “Precisa- bém defendeu a aprovação da Propos-
ram a necessidade de ampliar a prote- coordenador do Centro de Apoio ao Mi- mos defender a cidadania que é retirada, ta de Emenda Constucional 57A, a “PEC
ção às vítimas do trabalho escravo, prin- grante (Cami). principalmente dos migrantes que estão do Trabalho Escravo”, a qual classificou
cipalmente àquelas que vêm de outros Pelo menos 300 mil latinos-america- aqui em São Paulo”, reforçou no mesmo como “mais poderoso instrumento legal
países. “É preciso de mais ajuda ao imi- nos vivem hoje na cidade de São Paulo, sentido Luiz Alexandre de Faria, chefe de para o combate à escravidão da história
grante, porque eles ainda estão muito segundo levantamento do Cami. Recen- fiscalização da Superintendência Regio- do Brasil”. (www.reporterbrasil.org.br)
brasil de 15 a 21 de novembro de 2012 7
Valter Campanato/ABr
espaço sindical
da Redação
Brasileiros gastam mais com os planos de saúde que pioraram a qualidade do atendimento Contra o Judiciário e a Mídia
O presidente da Central Única dos
SAÚDE Enquanto do mercado de planos privados só nos a saúde pública é para os pobres e que Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas,
distancia da efetivação do SUS”. o plano privado de saúde ajuda porque afirmou que fará peregrinação pelos
operadoras de plano de Para Ligia Bahia, esse crescimento desonera o SUS. O fato de os planos se- estados para enfrentar o que chama
dos planos de saúde ainda interfere na rem financiados com recursos públicos de tentativa de calar os movimentos
saúde lucram, serviços universalização do SUS. “Como as in- é pouco divulgado e as negociações de sociais. Segundo o dirigente, o objetivo
públicos de saúde são terfaces entre o setor privado e o siste- contingenciamento de salários em troca é fortalecer as estaduais da CUT para
ma público são muito extensas no Bra- de alguns benefícios, que ocorrem nas enfrentar os ataques de setores conser-
enfraquecidos sil, a existência de um mercado de pla- mesas de negociação, nem sempre fi- vadores que atuam em duas frentes: o
nos de saúde em expansão represen- cam explicitadas”, considera. Poder Judiciário e a velha mídia.
ta um obstáculo concreto à universali-
zação do direito à saúde. Os planos de Mercado da saúde MP e o mundo do trabalho
Viviane Tavares saúde são os principais vetores de desi- O enfraquecimento do SUS em de- Freitas afirmou que o Supremo
do Rio de Janeiro (RJ) gualdade do sistema de saúde brasilei- trimento do crescimento dos planos de Tribunal Federal tornou-se uma ca-
ro”, analisa. saúde também pode ser observado em sa de julgamento político, papel que
MARIA PRECISAVA de uma consulta outros aspectos. Um exemplo é a aquisi- não deveria lhe caber, enquanto o
médica com um especialista. Embora ção, anunciada no início de outubro, de Ministério Público (MP) passou a
não fosse um caso de emergência, ela es- “A maioria das pessoas que 90% da empresa brasileira Amil pela es- intervir diretamente nas funções dos
perou quase dois meses para conseguir tadunidense United Health. Dependen- sindicatos. “Não adianta irmos para o
uma consulta e o único lugar que tinha adquire ou se vincula via do da interpretação, o assunto é consi- enfrentamento ao patrão porque se o
tal especialidade era a 50 km de sua re- empresa empregadora a derado inconstitucional, uma vez que MP não concordar com a nossa luta, a
sidência. A situação fictícia parece ser o está previsto na Constituição Federal o entidade sindical terá que estabelecer
retrato do serviço público de saúde mos- um plano de saúde precário veto a “participação direta ou indireta um Termo de Ajustamento de Conduta
trado pela grande mídia, mas é, na reali- de empresas ou capitais estrangeiros na (TAC). O Ministério Público não tem
dade, o encontrado por usuários da saú- sabe que não pode esperar assistência à saúde no país, salvo nos ca- experiência e nem vivência no mundo
de suplementar. sos previstos em lei”. No entanto, a Lei do trabalho para interferir dessa for-
Atualmente, de acordo com a Pesquisa um atendimento igual ao nº 9.656/98, conhecida como Lei Geral ma”, criticou.
de Orçamentos Familiares 2008-2009 - do patrão ou dos cidadãos dos Planos de Saúde, autoriza a partici-
Perfil das Despesas do Brasil do Institu- pação de capital estrangeiro. A questão, Mercedes recusa nas demissões
to Brasileiro de Geografia e Estatística brasileiros ricos” no mínimo, merece um sinal de alerta. Após semanas de negociações e pres-
(IBGE) divulgada em setembro, os bra- Isabel Bressan, diretora do Centro são dos trabalhadores, o Sindicato dos
sileiros gastam 7,2% de sua renda men- Brasileiro de Estudos em Saúde, em ar- Metalúrgicos do ABC conseguiu evitar
sal com saúde, entre planos de saúde e tigo publicado na página da instituição, as demissões de 484 trabalhadores na
remédios. Mas, como explicar um au- Baseado em dados da OMS, o Conse- analisa a compra e aponta o enfraqueci- Mercedes-Benz de São Bernardo do
mento nos gastos com saúde por parte lho Federal de Medicina (CFM) mostra mento do SUS em detrimento do cres- Campo (SP). Os contratos (por prazo
do cidadão, superando os investimentos que o governo brasileiro tem uma par- cimento dos planos de saúde. “Certa- determinado) venceriam dia 18 de no-
do poder público, e a qualidade dos ser- ticipação menor do que as suas necessi- mente, o investidor americano acredi- vembro e os trabalhadores já haviam
viços de saúde cada vez mais precária? dades e possibilidades no financiamen- ta que caminharemos para ser como até recebido telegrama da empresa,
Para Ligia Bahia, doutora em Saúde to da saúde pública. Do grupo de países nos EUA, onde o governo paga por pla- na semana passada, que comunicava
Pública e professora da Universidade com modelos públicos de atendimento nos mequetrefes para pobres e idosos, a dispensa. Foram orientados pelo
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), es- de acesso universal, o Brasil é o que tem garantindo para as empresas de saúde sindicato a rasgar o comunicado. Ras-
se fenômeno pode ser atribuído ao au- a menor participação do Estado (União, uma renda imensa gerada pelo subsí- garam. Pelo acordo negociado entre
mento das mensalidades e não exata- Estados e Municípios). Esse percentu- dio público. Não por coincidência, há o sindicato e a montadora e aprovado
mente ao fato de mais brasileiros se vin- al fica em 44%, quase a metade do que é um projeto de lei (PL 489/2011) nes- por unanimidade em assembleia re-
cularem aos planos privados. Apesar do investido pelo Reino Unido (84%), Su- se sentido, de uma deputada federal do alizada dia 13, os 484 trabalhadores
aumento, ela ressalta que a qualidade do écia (81%), e muito inferior a países co- Ceará (Ronalba Ciarlini do DEM/RN), terão seus contratos prorrogados até
serviço prestado não acompanhou a mu- mo a França (78%), Alemanha (77%), que propõe o pagamento de um adicio- 31 de março de 2013. Como contrapar-
dança e que essa pode ser a única alter- Espanha (74%), Canadá (71%), Austrá- nal em dinheiro para quem recebe Bol- tida, vão abrir mão da segunda parcela
nativa para muitos brasileiros. “A maio- lia (68%) e Argentina (66%). sa Família, para aquisição de plano de da PLR (Participação nos Lucros e
ria das pessoas que adquire ou se vincu- saúde. Há também uma sugestão de re- Resultados). Após aprovado, o acordo
la via empresa empregadora a um pla- O que a nova ‘classe média’ está presentantes das seguradoras de saúde foi comemorado pelos mais de 1.000
no de saúde precário sabe que não po- consumindo? de que o governo complemente o paga- trabalhadores que participaram da
de esperar um atendimento igual ao do De acordo com Lígia Bahia, as co- mento de planos para idosos como for- assembleia.
patrão ou dos cidadãos brasileiros ri- berturas dos novos planos para os seg- ma de compensar os preços exorbitan-
cos. A expectativa de aderir a um plano mentos de renda C e D são ainda menos tes que cobram das pessoas com mais Jornalistas em estado de greve
privado é a de escapar de dois grandes abrangentes do que as tradicionais dos de 60 anos. Tudo com o dinheiro que Em assembleia, jornalistas do Grupo
problemas do Sistema Único de Saúde planos básicos brasileiros, que já são certamente faltará ao SUS e aumentará Comunidade, do Distrito Federal man-
(SUS): a demora e a total despersonali- bem restritas. “O desenho dos planos o lucro das empresas”, analisa. têm o estado de greve, com possibili-
zação da assistência”, explica Ligia. Re- corresponde à acepção de diferenciação dade de parar a qualquer momento. A
centemente, a Agência Nacional de Saú- da qualidade da mercadoria de acordo direção da empresa prometeu pagar o
de Suplementar (ANS) divulgou que foi com o preço. O problema é que na saú- “A existência de um mercado de planos mês de setembro para todos os funcio-
de R$ 1,27 bilhão o lucro líquido, no pri- de tal distinção colide com todas as con- nários até o dia 7/11, porém, o Sindi-
meiro trimestre de 2012, de cerca de mil cepções sobre a igualdade biológica da de saúde em expansão representa um cato de Jornalistas do Distrito Federal
operadoras de saúde ativas no país. humanidade”, explica. obteve a informação, durante a assem-
A professora lembra ainda que a es-
obstáculo concreto à universalização do bleia, que alguns jornalistas ainda estão
Despesa pública x despesa privada tratificação social não pode ser trans- direito à saúde. Os planos de saúde são sem receber. Ronaldo Junqueira, presi-
De acordo com a Pesquisa de Orça- posta para a saúde. “Se fosse assim não dente do Grupo, informou ao sindicato
mentos Familiares 2008-2009, a des- seria necessário ter política de saúde. os principais vetores de desigualdade que não há previsão de data para este
pesa de consumo das famílias brasilei- A estratificação origina discriminações pagamento.
ras com bens e serviços de saúde che- e privilégios que estão na origem de fi- do sistema de saúde brasileiro”
gou a R$ 157,1 bilhões – 4,8% do Pro- las que não andam e atendimento ime- Ford e demições na Europa
duto Interno Bruto (PIB) em 2009. En- diato de autoridades públicas e priva- A Ford pode se desfazer de mais fá-
quanto isso, a despesa da administra- das e, portanto a demora injusta e evi- bricas e demitir mais trabalhadores na
ção pública com esses bens e serviços foi tável no tratamento de pacientes gra- De acordo com o artigo, esta tran- Europa se a crise da dívida na Zona do
de R$ 123,6 bilhões (3,8% do PIB). Por- ves”, analisa. sição bilionária é uma nova ameaça à Euro continuar agravando o excesso
tanto, como também informa o relatório Vale lembrar também que o próprio conquista efetiva do SUS. “Conforme de capacidade da indústria automobi-
Estatísticas de Saúde Mundiais 2011, da poder público ajuda a financiar a saú- destacou um considerado consultor lística. A situação nos mercados euro-
Organização Mundial de Saúde (OMS), de suplementar ao oferecer esse tipo empresarial, a compra da Amil por peus permanece “muito volátil”, disse
a iniciativa privada fica com a fatia de de benefício como parte da remunera- essa empresa americana deverá for- o presidente-executivo da companhia
56% diante de 44% dos gastos públicos ção aos servidores. Ligia Bahia entende çar a adoção de um novo modelo de norte-americana, Alan Mulally, em
com saúde. “É uma contradição estrutu- que falta consciência sanitária aos ser- saúde no Brasil - o modelo america- uma conferência ontem (7) em Berlim,
ral. O Brasil tem um sistema universal vidores públicos, inclusive àqueles que no”, enfatizou. (Escola Politécnica de duas semanas depois de a empresa ter
lastreado por um financiamento de sis- atuam em instituições de saúde. Mui- Saúde Joaquim Venâncio/Fiocruz – anunciado um corte de 6.200 empre-
tema segmentado. Ou seja, a expansão tos servidores públicos consideram que www.epsjv.fiocruz.br) gos na região.
8 de 15 a 21 de novembro de 2012 brasil
R$ 2,00
s do país
No dia 7, um Grito pelas rua
Diante da crise, movimen
tos sociais propõem
a organização do povo
e a criação de mecanism
os de democracia direta
Anderson Barbosa
são
de renda, seus abatimentos da
do Social na Reunião Ministerial
pífios. Outras são as regras
No pri- OEA, em Caracas, que estabele-
fisco para as empresas.
das ce metas aos países membros,
meiro semestre, os lucros
a uma como a redução da desigualdade
empresas aumentaram
do que social e dos índices de pobreza.
taxa quatro vezes maior Pág. 9
os impostos e as contribuições
Primeira escola
que recolheram.
Pág. 7
latino-americana
LULA PRECISA MUDAR, alertava o arquiteto e militante co- modo digno”. E afirmava que não tinha perdido a esperança. “Se
A política
colonizada de agroecologia
Camponeses de toda a Amé-
pelo mercado trocar
munista Oscar Niemeyer, na época com 97 anos. Em entrevista eu fosse jovem, em vez de fazer arquitetura, gostaria de estar na
rica Latina vão poder
téc- conhecimentos sobre sementes
“A política econômica é rede vai
mostra e técnicas agrícolas. A
nica, e não política. Isso Lati-
ser organizada pela Escola
um fortalecimento do Estado”, ,
no-Americana de Agroecologia
disse o ministro da Fazenda, em Paris em
inaugurada dia 27 de agosto,
exclusiva ao Brasil de Fato, publicada na edição número 131, rua protestando contra este mundo de merda em que vivemos”.
entre- de incêndio em albergue,
Antônio Palocci, durante prestam homenagem às vítimas institui-
Na França, filhos de imigrantes Lapa (PR). Pioneira, a
vista coletiva em que respondia
eceita, ção é resultado de parceria
entre
às acusações de corrupção.
Para o economista Paulo
No-
Constituição do Tuberculose tem Super-R os governos da Venezuela
e do
Luiz Inácio Lula da Silva é ruim. Agora, com a crise que o asso- na. Desde a edição de número 500, estamos reproduzindo al-
Marcio Baraldi
la, ele tem que cumprir as promessas que fez, como distribuição guns momentos importantes até aqui registrados em nossas pá-
metem 32% do orçamento ao tem-
a reno, resiste bravamente
liar. Uma CPI pode investigar Os moradores da Ilha dos
Ca- Todo
Pág. 6 po em Conservatória (RJ).
privatização do setor. chorros (MA) estão resistindo
à
fim de semana, seresteiros
e
contra implantação de um pólo siderúr- seresteiras caminham lentamen-
EQUADOR – Na luta
e pe- gico gigantesco na Ilha de São te pelas ruas, cantando
canções
transnacionais do petróleo
de renda. É sua última oportunidade de acabar seu mandato de ginas nestes quase dez anos.
naturais Luís. Parceria entre Companhia de amor. No dia 27 de
agosto,
la defesa dos recursos governo do os
obtêm Vale do Rio Doce, milhares de visitantes lotaram
do país, comunidades Luís e para
Pág. 10 Estado, prefeitura de São hotéis e pousadas do lugar
vitória parcial. transnacionais, o projeto
preten- Seres-
prestigiar o Encontro de
em zona músicos
de transformar a região teiros, a união entre os
cerca de
industrial, desalojando de fora e os locais.
danos das creches no Fundo Pág. 16
15 mil pessoas e causando sociais reivindicam a inclusão
Em Brasília, organizações em discussão no Congresso
ambientais. Educação Básica (Fundeb),
Pág. 13 de Desenvolvimento da
8 De 1º a 7 de setembro de 2005
NACIONAL
ENTREVISTA
S
entado, em seu escritório Nascido em 1907, Oscar
em Copacabana, no Rio de pelo comunismo? Niemeyer Soares Filho é
Janeiro, Oscar Niemeyer Niemeyer – Não, ao contrário. arquiteto e militante comu-
balança a cabeça. “Cansamos de A situação se faz tão difícil e nista. Formou-se em 1934
esperar as reformas que Lula pro- degradada que um dia só a na Escola de Belas Artes, no
metia”, diz, comentando a crise do revolução resolverá os nossos Rio de Janeiro. Onze anos
governo e do Partido dos Trabalha- problemas. Quando houve a depois, ingressou no Partido
dores (PT). Em entrevista exclusi- eleição do Lula, declarei que Comunista Brasileiro. Man-
va ao Brasil de Fato, o arquiteto meus candidatos seriam ou João teve a militância durante
revela que nunca teve ilusões em Pedro Stedile, do Movimento dos toda a vida. Entre seus prin-
relação ao presidente Luiz Inácio Trabalhadores Rurais Sem Terra cipais projetos estão o dese-
Lula da Silva, que, segundo ele, (MST), ou Leonel Brizola, ex- nho da sede da Organização
chegou ao poder “cheio de ânimo”, governador do Rio de Janeiro. das Nações Unidas (ONU),
mas sem um projeto para mudar Esses homens são de luta. Lula é o Parque do Ibirapuera em
radicalmente o Brasil. um ex-operário, cheio de ânimo, São Paulo (SP) e, principal-
Esboça um sorriso. Mantém-se mas nunca foi comunista. Seu mente, a construção de Bra-
otimista, pois “Lênin já dizia que projeto era melhorar o capitalis- sília, onde foi responsável
sem sonhar as coisas não acon- mo, o que é um objetivo impossí- pelos projetos do Palácio da
tecem”. Segundo ele, Lula ainda vel, a meu ver. Minha posição é Alvorada, do Congresso Na-
pode “virar a mesa” e implementar que precisamos de um presidente cional e da Catedral
ações efetivas contra a pobreza. que tenha a força de virar a me-
Para tanto, sugere, deve tomar sa e realizar mudanças radicais,
exemplo nos presidentes cubano e como Castro e Chávez. Lula. No geral, rejeitam a hipóte-
venezuelano, Fidel Castro e Hugo se. O que o senhor acha disso?
Chávez. BF – Qual o impacto da crise na Niemeyer – É péssimo. Os que são
Segundo Niemeyer, mais do esquerda? contra o Lula são muito piores.
que nunca é preciso voltar-se à Niemeyer – Cansamos de espe-
luta por mudanças radicais. Diante rar as reformas que Lula prome- BF – Se o presidente realmente
da possibilidade de transformar tia. Para nós ele deveria se ligar estivesse ameaçado de ser der-
o mundo, outras atividades – até à esquerda do PT e cumprir as rubado, o senhor acha que as
mesmo a arquitetura – perdem im- promessas que fez ao povo. Se- pessoas sairiam às ruas para
portância. Diz isso e caminha para ria a sua última oportunidade. defendê-lo?
a sala. Nas paredes, frases que es- Niemeyer – Depende dele. De-
creveu. “Revolução”, “Terra para pende dele.
todos”, “Por um mundo melhor”. (Lula) prometeu
Ao lado, nas mesmas paredes, ras- BF – O que isso quer dizer?
cunhos e desenhos de suas obras.
muita coisa e, para Niemeyer – Que ele tem que
acabar seu governo agir, apelar para as bases. Ele
Brasil de Fato – Apesar da queda como um homem prometeu muita coisa e, para
do muro de Berlim, da dissolução digno, de pé, acabar seu governo como um
da União Soviética e, agora, da homem digno, de pé, precisa
precisa cumprir as
crise do PT, o senhor continua a cumprir as promessas.
ser comunista. De onde encontra promessas que sem sonhar as coisas não problemas que ocorriam naque-
motivação? acontecem. la época. Lembro que, logo nos BF – O que aprendemos com a
Oscar Niemeyer – Deste mundo inícios de Brasília, fui chamado tomada do poder por Lula e com
de pobres que nos cerca e até ho- BF – Lula tem força e, princi- BF – O senhor concilia arquite- à polícia política. Avisei ao pre- a crise que o assola?
je espera por uma vida melhor. palmente, vontade para uma tura e comunismo, que parecem sidente, que, homem de centro Niemeyer – Um aprendizado
mudança radical? distantes... que era, me advertiu: “Você não muito duro... É que infelizmente
BF – O comunismo é a solução? Niemeyer – Tinha. Mas para Niemeyer – A vida é mais impor- pode ir. Tiram o seu retrato, e falta conhecimento político ao
Niemeyer – O comunismo resol- mantê-la ele teria que se ligar tante do que a arquitetura. A ar- eu não poderei mais recebê-lo nosso povo para decidir coisas
ve o problema da vida. Faz com ao povo, apoiar com maior vi- quitetura não muda nada, mas a no Palácio.” Mas o meu amigo dessa natureza. Sempre recla-
que a vida seja mais justa. E isso gor a reforma agrária, o MST, o vida pode mudar a arquitetura. logo se recuperou, telefonando mamos não serem levados à
é fundamental. Mas o ser huma- movimento mais importante que para o general Amaury Kruel: juventude os problemas da vida
no, este continua desprotegido, existe em nosso país. Deveria BF – O que é uma arquitetura “O Niemeyer não pode ir. É meu e do ser humano, cuja compre-
entregue à sorte que o destino ser menos gentil com os donos mais igualitária? elemento-chave em Brasília.” ensão deve fazer parte de sua
lhe impõe. do dinheiro, inclusive com o Niemeyer – Aquela que a todos formação. Cada um sai da
presidente dos Estados Unidos, atende sem discriminação. Vou BF – O senhor foi à política escola apenas interessado nos
BF – Como se constrói, no ideá- George W. Bush, um cretino que esclarecer a vocês meu ponto de política? problemas de sua profissão.
rio popular, uma visão positiva não devia existir. vista. Quando o governo decide Niemeyer – Mais duas vezes.
do comunismo – termo que pa- fazer uma escola perto das fave- Numa delas, só para ser “escra- BF – O que quer a direita?
rece estar bastante desgastado BF – O que deu errado no PT? las, a idéia é sempre fazer algo chado”, como se diz, isto é, ir de Niemeyer – Manter este clima
desde a derrocada da União Niemeyer – Um partido de es- mais pobre. Isto é errado. Recen- mesa em mesa, apresentando-se de poder, de injustiça social e de
Soviética? querda que se enfraquece esque- temente, projetei uma biblioteca aos policiais de plantão. Na outra subserviência ao império norte-
Niemeyer – A Revolução Russa cendo as suas origens... Até o e um teatro em Caxias. Fiz como vez, quando voltei ao Brasil, lem- americano.
de 1917 fez MST, um movimento que Stedile se fosse para Copacabana, o bro que fui levado para uma sala
Mujique – Nome
dado aos campo-
de um país de lidera tão bem, não teve do go- projeto mais audacioso possível. acolchoada, onde um policial me BF – Dizem geralmente que
neses russos que mujiques a se- verno atual o apoio que deveria Não pode ha- fazia as perguntas que um criou- quem controla o mundo é o
viviam em regime gunda potên- ter. Sobre tudo isso escrevi num Centros Integra- ver discrimi- linho batia à máquina. Recordo Bush.
feudal. O governo dos de Educação
cia mundial. artigo comentando como é difícil Pública (Cieps)
nação. Quan- a última pergunta: “O que vocês Niemeyer – O Bush, no fundo, é
revolucionário, ins-
taurado em 1917, Foi fantástico. mudar este mundo coberto de – Idealizados por do Brizola fez comunistas pretendem?” “Mudar um idiota que tem as armas na
após a Revolução de Setenta anos miséria e discriminação. Brizola, em 1983, e os Centros Inte- a sociedade”, respondi. E o poli- mão e delas se serve para levar
projetados por Nie-
Outubro, implemen- de glória e a grados de Edu- cial disse ao rapaz: “Escreve aí: o terror às áreas mais desprote-
tou diversas políticas meyer, são escolas
para melhorar as
vitória defi- BF – Nesse artigo, o senhor dis- de período integral. cação Pública mudar a sociedade”. E o criouli- gidas. Representa o capitalismo,
condições dos traba- nitiva contra se que era preciso ser otimista. Atendem em média (Cieps), vimos nho riu, dizendo para mim: “Vai que, decadente, tudo faz para
lhadores, especial- o nazismo. Continua com essa opinião? 1.000 crianças por que os meni- ser difícil”. subsistir.
dia, oferecendo,
mente os rurais. Não podemos Niemeyer – Sim. Lênin já dizia além de aulas, ati-
nos entravam
vidades culturais, nos prédios BF – Na arquitetura, o senhor
com orgulho, está trabalhando em algum pro-
Agência Brasil
esportivas e lazer.
Se eu fosse jovem,
Há 500 unidades em imaginando, jeto que traduza sua visão atual
funcionamento, ge-
na sua inocên- em vez de fazer do Brasil e do mundo?
ralmente instaladas
em áreas pobres do cia, que os tem- arquitetura, Niemeyer – Se eu fosse jovem,
Estado. pos iam mu- gostaria de estar em vez de fazer arquitetura, gos-
dar e eles po- na rua protestando taria de estar na rua protestando
deriam começar a usufruir o que contra este mundo de merda em
antes só às crianças mais ricas
contra este mundo que vivemos. Mas, se isso não é
era permitido. de merda em que possível, limito-me a reclamar o
vivemos mundo mais justo que desejamos,
BF – A arquitetura está muito com os homens iguais, de mãos
vinculada ao urbano. É possível dadas, vivendo dignamente esta
pensá-la para os camponeses? BF – Muitas vezes, o senhor foi vida curta e sem perspectivas
Niemeyer – A arquitetura obede- criticado porque Brasília é muito que o destino lhes impõe.
ce sempre a um programa e, no vazia. No entanto, sempre que
caso, seria diferente, voltada pa- desenhou a cidade, enchia-a de BF – A arquitetura não tem fun-
ra a vida dos homens do campo. gente. A cidade saiu como o se- ção social?
nhor queria? Niemeyer – Deveria ter. Mas,
BF – Se pudesse voltar no tempo, Niemeyer – Ao contrário, hoje quando ela é bonita e diferente,
o senhor participaria, de novo, Brasília tem gente demais. Até o proporciona pelo menos aos po-
da construção de Brasília? tráfego começa a ficar difícil. bres e ricos um momento de sur-
Niemeyer – Não sei. Brasília foi presa e admiração. Mas quanto
uma aventura, parecia o fim do BF – Setores da direita e esquer- lero-lero! Na verdade, o que nós
Na Brasília de Niemeyer, manifestação pela reforma política mundo. E não eram poucos os da discutem o impeachment do queremos é a revolução.
brasil de 15 a 21 de novembro de 2012 9
CULTURA
Nego Fugido,
Negro Livre Fotos: Cristiano Navarro
CULTURA POPULAR mentação do torso e dos braços na dan-
ça e a presença de termos em iorubá nos
Há mais de 120 anos, cânticos), além das práticas da cultura
banto Congo-Angola, como o samba de
comunidade do roda. “O nego fugido é uma soma de di-
Recôncavo Baiano ferentes manifestações afro-brasileiras e
encontramos registros desta brincadeira
apresenta saga em busca em nossa comunidade de antes de 1888;
portanto, antes da própria abolição” des-
da liberdade taca Monílson Santos, que interpreta o
Capitão-do-Mato e é mestrando do curso
de pós-graduação em Artes Cênica pela
Universidade Estadual Paulista (Unesp).
Cristiano Navarro,
da Reportagem
“O nego fugido é uma
DAS SENZALAS nos engenhos de ca-
na-de-açúcar, os escravos cantam, dan- soma de diferentes
çam, organizam-se e fogem em busca manifestações afro-
da liberdade. A mando do Rei , o Capi-
tão-do-Mato organiza os Caçadores de brasileiras e encontramos
Escravos que saem no encalço dos fugi-
dos. Depois de encontrados, baleados e registros desta brincadeira
reescravizados, os escravos (interpreta- em nossa comunidade de
dos por crianças e adolescentes), grave-
mente feridos, são obrigados a implorar antes de 1888”
por dinheiro para comprarem suas car-
tas de alforria. Ao lado do Rei e protegi-
da pelos militares, a Madrinha (repre-
sentando a paz e uma referência à Prin- O mar
cesa Isabel) ora assiste a tudo passiva, Nas décadas de 1970 e 1980, o nego
outra procura pacificar o conflito. fugido” passou por um período de qua-
Na última apresentação do Nego Fu- se desaparecimento, mas a partir de
gido, o epílogo mostra a revolta dos es- meados da década de 1980 passou a ser
cravos que tomam as armas dos milita- reencenado anualmente. “O nego fugi-
res e capturam o Rei e seus soldados, do é como a maré que tem seus altos e
exigindo a liberdade. “Queremos a car- baixos e depende da lua”, afirma o pes-
ta de alforria. Queremos a carta de alfor- cador Valdeci que há 28 anos participa
ria. Queremos a carta de alforria”, gri- do folguedo.
tam. Sob a mira dos revoltosos, o Rei ce- Nos últimos anos a maré parece es-
de as pressões dos escravos e pede para tar cheia para o grupo. Neste mês, o Ne-
que o Capitão-do-Mato anuncie a abo- go Fugido viajou cerca de 1900 Km para
lição. Por fim, os papéis se invertem e se apresentar em São Paulo (SP). Na ca-
os escravos perguntam ao público se al- pital paulista, apresentaram-se para pú-
guém quer comprar o Rei. blicos distintos como o das ruas do bair-
Atabaques ditam o ritmo da encena- ro de classe média-alta de Perdizes e do
ção. A letra das músicas contam o de- extremo leste da cidade, no bairro Ci-
senrolar das ações desta peça teatral dade Tiradentes – periferia onde o to-
apresentada tradicionalmente aos do- que de recolher vigora pelo crime. “A ca-
mingos do mês de julho pelas ruas no da apresentação é sempre uma grande
município de Acupe, distrito de Santo surpresa porque se trata de uma inter-
Amaro da Purificação (BA). venção que interage com o público que
Além de lembrar as lutas no período a interpreta do seu ponto de vista livre.
da escravidão na região do Recôncavo Em Acupe essa narrativa traz à tona a
Baiano, o enredo serve para ressignificar luta contra a escravidão. O que foi esse
a história e dar protagonismo à conquis- processo? Ele já se deu? Ele ainda está
ta da abolição aos negros. Com os ros- acontecendo?” destaca Monílson.
tos pintados com uma mistura de óleo e As expressões artísticas de Acupe
carvão e a boca com tinta vermelha re- acontecem sem contar com quase ne-
presentando o sangue expressam a dor nhum apoio de recursos públicos. Re-
e o sofrimento do povo negro. Os atores centemente a Associação Cultural Ne-
são pessoas da comunidade (pescadores, go Fugido comprou um terreno onde
marisqueiros, donas de casa, estudan- tenta a construção de sua sede. “O ne-
tes) e o impacto visual é assustador. go fugido’ cumpre um papel de mais de
Ao final de cada apresentação, os par- 100 anos de fortalecimento da identida-
ticipantes e o público celebram cantan- de local e a educação informal, dos mais
do e dançando em um samba de roda. velhos para as crianças, sem contar com
Em seguida, os moradores do distri- nenhuma estrutura. Agora queremos,
to preparam uma grande feijoada para por nós mesmos, montar a nossa sede
a comunidade com o dinheiro arreca- e investir em nossa cultura” afirma Mo-
dado durante a brincadeira (quando a nílson. Para ajudar na construção da se-
população contribui com a compra das de é possível fazer doações por meio do
cartas de alforria os escravos). site www.idea.me
“A verdadeira cara
do nosso sistema” Divulgação
“pressar
encontra a violência no estado, sendo es- nuncia às torturas para a peça”, conta. Durante a temporada do projeto nas ci- Achei muito bacana a peça. Ex-
te também um reflexo do que acontece em Após uma longa e aprofundada pesqui- dades, são realizadas três etapas: a apre-
todo o país. sa e compilação de relatos sobre a reali- sentação do espetáculo, um bate papo que como as pessoas podem
O trecho com que a reportagem se inicia dade da violência no Brasil, foi elabora- traga a temática dos Direitos Humanos, e contribuir para acabar com a
é de um texto de 1971, do dramaturgo Au-
gusto Boal. Ali, o autor faz uma analogia
da não apenas uma peça, mas um proje-
to. “Nosso objetivo é que o cidadão civil
uma oficina de Teatro do Oprimido. Pa-
ra tal, antes da chegada do grupo é neces-
opressão é muito importante .
”
Welbert Rezende, 21 anos,
da Idade Média, através da Inquisição Es- participe desse movimento, de ter memó- sário o contato com entidades que traba- cursa o 7° ano em supletivo.
panhola, com os porões da Ditadura Mili- ria, memória histórica. O projeto traba- lhem a temática na região. Em Belo Hori-
tar. Ele retrata a violência imposta pelos
frades, à luz do Padre Tomaz de Torque-
lha com a memória da ditadura para falar
da memória de hoje em dia, e vice e ver-
zonte, o Movimento Nacional dos Direitos
Humanos foi o responsável pela recepção “vãoSaindo do teatro, as pessoas
pra casa mais sensibilizadas,
mada, e a imposta pelos militares tortura- sa. Quando colhemos histórias da violên- e articulação da vinda do projeto, que es- mais mobilizadas. Elas se sentem
dores da ditadura. Entre os casos, o que cia de hoje, fica claro que isso está direta- teve na cidade entre os dias 5 e 8 deste
há em comum é a obscuridade, a violência mente ligado a como a polícia funciona, e mês. A Fundação Municipal de Cultura parte de problema, e isso é muito
às escuras, em “porões da sociedade”.
Esta analogia é feita novamente, nos
como a policia funciona está ligado com o
aprendizado sobre como lidar com o cida-
fez um convite aos seus funcionários para
a participação nas atividades, além de ar-
importante .
” Flávia Santana, 50 anos,
dias atuais. A peça Torquemada – 17 ba- dão. A cultura de exploração é muito anti- ticulação com escolas da periferia da cida- trabalha com Direitos Humanos.
las, do grupo de Teatro do Oprimido da ga neste país, e relacionar isso com a dita- de e funcionários do município de Betim.
“taTeatro usado como ferramen-
política incrível, porque é muito
concreto, muito pratico. É ali, aos
seus olhos, que o conflito surge e a
Ao longo da peça, são do texto. “Coletamos histórias de violên- peça. Já em casa após o ocorrido, seus Após a oficina
reproduzidos discursos
cia com mais de vinte jovens, e também
trouxemos as vividas pelos integrantes do
pais reproduzem também algumas destas
falas. Assim, o espetáculo relaciona clara- “ Estava com colegas de traba-
lho, vendo eles em corpos diferen-
grupo. Assim, fizemos um compilado e se mente a memória da ditadura aos tempos tes, em uma relação diferente. Saio
opressores que estão criou uma dramaturgia coletiva, a partir atuais. Ao fim, Bruno não escapa da reali- muito grato, foi uma tarde muito
diariamente presentes na da experiência de usar o teatro do oprimi- dade. Dezessete balas perfuram seu cor-
realidade do país
do dentro do teatro”, explica.
O público tem a possibilidade de acom-
po. Sua mãe e amigos seguem a peça bus-
cando justiça. A empreitada traz outros
”
bonita .
Eduardo Ramos,
Centro Cultural Pampulha.
panhar diferentes momentos da vida de personagens opressores da nossa socie-
Bruno, um jovem negro morador da pe- dade, desta vez sendo a mãe de Bruno o
de Belo Horizonte (MG)
riferia. Bruno vive cenas de opressão a to-
do o momento. Ele é alvo de preconcei-
alvo de opressão.
O integrante do grupo de Teatro do
“trabalhar
Vi a necessidade que temos de
isso nos equipamentos
to do empregador, que o despreza e ofen- Oprimido da Garoa, Rodrigo Caldeira, culturais, principalmente os de pe-
A peça é dinâmica e envolvente. O tre- de; alvo de seus pais, que não compreen- conta que, ao longo da peça, são repro- riferia. Muitas vezes as pessoas fi-
”
cho de início desta reportagem abre tam- dem sua forma de expressão com o rap, e duzidos discursos opressores que estão
cam perdidas ou se acomodam .
bém o espetáculo, esclarecendo desde o as dificuldades enfrentadas por ele na so- diariamente presentes na realidade do
Vicente Paula de Souza,
princípio qual é o objetivo do grupo. A ciedade; de seguranças particulares, que país. “A peça reconhece o jovem pobre, Fundação Municipal de Cultura.
apresentação traz, logo de saída, fortes o ameaçam apenas por andar de skate negro, e da periferia como alvo da atu-
“vamos
cenas de tortura retiradas do original de em frente à propriedade; e da polícia. alidade. E Torquemada é o grande per- O desafio que fica pra nós é como
Boal, e vividas pelo mesmo, e segue com Uma batida que Bruno e seu amigo sonagem opressor ali. Ele aparece como
uma história da realidade atual de opres- Mosca sofrem da polícia é ponto chave da o político, como a mídia, como o empre- pegar carona na ferramen-
são aos jovens. peça. Neste momento, o texto traz trechos gador que não recebe jovens de periferia. ta do teatro, na perspectiva do tea-
Kelly, do grupo de Teatro do Oprimido dos diálogos antes proferidos nas sessões Tem vários Torquemadas na nossa socie- tro do oprimido, para trabalhar o
da Garoa, conta um pouco da construção de torturas vividas por Boal, no inicio da dade”, declara Rodrigo. (MG) tema Direitos Humanos .
”
Gilvásio Silva, Movimento
Nacional de Direitos Humanos.
“destas
alta que ainda havia policias presentes no Em destaque, Rodrigo traz duas pos- Quanto mais a gente se aproxima
ativos da história publico”, diz Kelly Di Bertolli. sibilidades apresentadas pelo público
Já durante a realização das oficinas na em suas viagens. Uma deles foi sugeri- vivências, mais a gente per-
cidade, os jovens e policiais participan- da em um dos momentos de maior difi- cebe o medo que a gente tem, as di-
de Belo Horizonte (MG)
tes viveram momentos importantes. “Ti-
nham ali jovens que identificaram um po-
culdade de se fazer alguma coisa, segun-
do o ator, que foi no momento do assassi- ”
ficuldades .
Célia Marques, psicóloga.
licial presente como seu opressor e vio- nato. “Quando a cena foi acontecer, umas
Em um segundo momento do espetácu- lentador em um episódio vivido anterior- vinte pessoas começaram a tacar pedras
lo, o público é convidado a fazer parte do
enredo. Os expectadores cumprem ago-
mente. Mas nem todos são assim, alguns
policiais se sentiram à vontade para colo-
(bolinhas de papel) na polícia”. Uma ou-
tra possibilidade, que Rodrigo declara ter
“formas
É muito importante pensar em
de ação, agir, é mais efeti-
ra o papel de participantes ativos da his- car também suas experiências enquanto considerado viável na época, foi a reação vo. Conseguir dar um passo, mes-
tória, capazes de mudar seu rumo. “Este é oprimidos”. Kelly conta que se há algum da mulheres da comunidade. “Elas afir- mo em palco, traz o protagonismo.
uma momento muito bacana da peça. Em conflito com o supervisor, o policial mui- maram que, quando conhecem o rapaz e Quero trabalhar isso com quem
nossas viagens, temos vivido diversas ex- tas vezes é colocado em uma unidade de estão certas de sua inocência, se juntam
periências diferentes”, conta o ator Rodri- risco, sozinho e sem armas. para ‘fazer um auê’ e botar a polícia pra atende essas pessoas que são opri-
go Caldeira. O integrante Rodrigo conta que, em ati- correr. O tratamento da PM com a mulher midas cotidianamente, pela policia,
Em uma visita à cidade de Rio Claro, no vidade no bairro Sapopemba, região de é diferente, por isso pareceu dar certo”. pela guarda municipal, serviço de
estado de São Paulo, policias militares fo- periferia com alto índice de violência na O Grupo de Teatro do Oprimido da Ga- saúde, educação, trabalhar isso em
”
ram convocados pela Secretaria Municipal cidade de São Paulo, as opções dos jovens roa disponibiliza imagens de muitas das
varias instâncias .
de Segurança a participar das atividades. são poucas. “É bater na policia, ou correr. alternativas surgidas em suas viagens,
Gabriela Vieira, Coordenadoria de Promoção
O grupo conta que muitos foram assistir Não existia um arsenal de alternativas além de espaço para debate. O endereço da Igualdade Racial. (MG)
à peça fardados, outros a paisana. “Após além destas duas para eles. Denunciar, do site é torquemada.art.br. (MG)
12 de 15 a 21 de novembro de 2012 cultura
Apesar de você
CONTO Esses seres, que
Reprodução
se reconhecem, se unem
e lutam. E serão eles, os
seres que lutam, que
tornarão para a terra sua
semente e dela verão
brotar o seu perdão
Marina Tavares
www.malvados.com. br dahmer
PALAVRAS CRUZADAS
Horizontais: 1.Bloco econômico criado para se contrapor à proposta da Alca – Há um mês, os índices de (?) 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18
em São Paulo não param de crescer. 2.Flexão feminina de “seu” - “Ovo”, em alemão. 3.Nome do furacão que
passou recentemente pelo Haiti, Cuba e Nova York – A sigla em inglês para “Localizador-Padrão de Recursos”, 1
vulgarmente chamado de “endereço do site” - Disco de Caetano Veloso gravado durante o exílio, cujo nome
remete à relação sexual. 4.Partidário – É infiel. 5.Distrito federal (sigla) - Pílula, tema de um filme, que teria 2
a capacidade de tornar a memória mais potente. 6.Historiador trotskista nascido na Argentina atualmente
professor da USP e do Mackenzie – Acre (sigla) – Interpreta o que está escrito. 7.Ordem dos Advogados do 3
Brasil - Palavra utilizada no árabe para designar Deus - “Ligado”, em inglês. 8.Rio Grande do Norte (sigla)
– Correios (sigla) – Amazonas (sigla). 9.Irmã do pai, da mãe ou mulher do tio – Droga feita a partir da mistura
de pasta de cocaína com bicarbonato de sódio, uma forma impura de cocaína e não um sub-produto, seu 4
nome deriva do verbo em inglês que significa “quebrar”, devido aos pequenos estalidos produzidos pelos
cristais (as pedras) ao serem queimados, como se se quebrassem – Uma das três principais preposições em 5
inglês – Foi responsável na semana passada por uma ação desastrosa numa aldeia Munduruku que termi-
nou com a morte de um indígena, que recebeu quatro tiros no peito e um na cabeça. 10.Do latim, “Anno
6
Domini”, Ano do Senhor, o mesmo que d.C. - Unidade de Saúde das Universidades (sigla) – Edifício. 11.Estado
em que ocorreu o massacre de Eldorado dos Carajás, em 1996 – Companhia (sigla) - Trabalhador urbano que
recolhe resíduos sólidos recicláveis, como papelão, alumínio e vidro (plural). 7
Verticais: 1.“‘?’ moral”, exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrange-
8
doras – Parceria Público-Privada. 2.Único satélite natural da Terra, situando-se a uma distância de cerca de
384.405 km do nosso planeta, o equivalente a 38 viagens entre a América do Sul e a Europa ou a 9,5 voltas
ao redor do mundo seguindo a linha do Equador. 3.“Banda”, em inglês – Narrar. 4.Tocantis (sigla) – Ato de 9
ir. 5.Doença articular, geralmente acompanhada de inchação. 6.Palavra sânscrita que significa divisão ou
disciplina assim como historicamente refere-se a um povo não-ariano. 7.Jornalista e ativista uruguaio de- 10
dicado ao trabalho com movimentos sociais na América Latina. 8.Ordem prescrita das cerimônias que se
praticam numa religião – Que está por cozer. 9.Como é chamado aquele que apenas “carrega” a droga para
11
entregá-la a outra pessoa – Briga, disputa entre pessoas ou grupos. 10.Período de tempo que vai desde a
meia-noite até à meia-noite seguinte – Um equivalente ao CPF. 11.“Peso (?)”, o mesmo que peso líquido, em
espanhol. 12.“Ar”, em inglês – Pessoa chata, na linguagem informal – Partido dos Trabalhadores. 13.Antigo
Testamento – Maneira informal de falar “camarada”. 14.Norma Regulamentadora (sigla) – Nome um urso
de pelúcia que dá nome a um filme recente que o tem como personagem principal. 15.Desalento – Diário sânimo – DO. 16.Ai – Ir. 17.Alô – Põe. 18.Enem – ENFF.
Oficial (sigla). 16.Interjeição de dor, desagrado, surpresa ou, por vezes, alegria - Passar ou ser levado de um – Crua. 9.Mula – Luta. 10.Dia – CIC. 11.Neto. 12.Air – Mala – PT. 13.AT – Camará. 14.NR – Ted. 15.De-
lugar para outro, afastando-se. 17.Expressão usada para atender ao telefone – Coloca. 18.Por meio do seu Verticais: 1.Assédio – PPP. 2.Lua. 3.Band – Contar. 4.TO – Ida. 5.Gota. 6.Anga. 7.Raúl Zibechi. 8.Rito
Twitter, a revista Veja incentivou os candidatos deste exame a fotografarem a prova, com a promessa de que 11.Pará – Cia – Catadores.
as melhores fotos viriam a ser publicadas – Nome da “universidade da classe trabalhadora” do MST, localiza- 6.Coggiola – AC – Lê. 7.OAB – Alá – On. 8.RN – ECT – AM. 9.Tia – Crack – At – PF. 10.AD – HU – Prédio.
Horizontais: 1.Alba – Criminalidade. 2.Sua – Ei. 3.Sandy – URL – Transa. 4.Aliado – Trai. 5.DF – NZT.
da em Guararema (sigla).
américa latina de 15 a 21 de novembro de 2012 13
As mãos “invisíveis”
sobre a agricultura peruana Reprodução
PERU Convênio do convênio. Por fim, a Petroperú entra-
ria como parceira subsidiária para a pro-
firmado entre órgãos dução dos biocombustíveis.
Na trama entre os diversos órgãos, a
governamentais Devida seria uma instituição de fachada,
para produção de pois teria a influência estadunidense di-
tando as regras aos demais parceiros.
biocombustíveis no país Em visita aos Estados Unidos em maio
passado para cumprir uma agenda de
andino oculta anseio reunião com funcionários do alto esca-
lão da Casa Branca, a presidente da Devi-
estadunidense da, Carmen Masías revelou. “O governo
de Humala conta com ajuda norte ame-
ricana para assistência técnica destinada
às forças armadas peruanas, desenvolvi-
Marcio Zonta mento de cultivos alternativos à folha de
correspondente em Lima (Peru) coca e reabilitação de áreas dominadas
pelo narcotráfico”. Expondo a verdadei-
UM CONVÊNIO de cooperação inte- ra posição da Devida no convênio. “Es-
rinstitucional para promover pesquisas se projeto parte da intenção estaduni-
e produção de biocombustíveis na Ama- dense que vai se beneficiar da produção
zônia peruana foi assinado recentemen- de biocombustíveis no Peru e seus obje-
te no país. Entre os envolvidos no projeto tivos estão expressos na Devida”, alerta
estão a estatal Petroperú, o Instituto Na- Juan Villas, sociólogo peruano.
cional de Inovação Agrária (Inia), Conse- Os Estados Unidos destinou ao Peru no
lho Inter-Regional Amazônico (Ciam), o ano de 2011 cerca de 55 milhões de dóla-
Instituto Pró Investimento e a Comissão res para serem distribuídos entre as ins-
Nacional para o Desenvolvimento e Vida tituições de combate às drogas no país.
sem Drogas (Devida). Masías, ao assinar o projeto, no início
A iniciativa acena à possibilidade de de novembro, afirmou que a plantação
substituir grandes extensões de planta- de plantas oleaginosas traz mais bene-
ção de folha de coca e outros cultivos que fícios mercadológicos em relação à fo-
geram alimentos, por espécies de plantas lha de coca. “A vantagem é que existe
oleaginosas, próprias para produção de uma demanda de mercado para os bio-
biocombustíveis. combustíveis”.
Especialistas no assunto alertam que
a junção desses órgãos governamentais
oculta a intervenção dos Estados Unidos “Esse projeto parte da
no projeto, além de interesses empresa-
riais que ameaçam a soberania alimen- intenção estadunidense que
tar no Peru.
vai se beneficiar da produção
de biocombustíveis no
“Não tem sentido que se
Peru e seus objetivos estão
produza em regiões com
déficit de alimentos plantas expressos na Devida”
que serão transformadas em
combustível de carros” Para Soberón existe a tentativa de per-
Destruição da plantação de coca seria pretexto para entregar as terras para o agronegócio suadir o camponês cocaleiro e a socieda-
de peruana com um novo discurso para
to para entregar as terras dos cocaleiros A Devida teria um papel chave nesse além da criminalização da planta, “afir-
O discurso adotado pelos membros da aos anseios empresariais e estaduniden- processo, ficando responsável por desti- mando que não existe desenvolvimento
cooperação também expõe uma nova tá- ses na região”. Lourdes Benavides, auto- nar as terras com cultivos de planta de econômico com a folha de coca, por isso
tica contra os camponeses cocaleiros. As ra do estudo As Sementes da Fome que coca que julgar ilegal, à plantação de ole- teria que extinguir seu cultivo”.
argumentações contra o plantio da folha traz objeções à plantação de matéria pri- aginosas. Colocando os projetos de interesses
de coca já não são mais associadas so- ma para produção de biocombustíveis, O Inia será responsável por analisar estrangeiros, como os de biocombustí-
mente à produção de cocaína, mas como adverte: “Não tem sentido que se pro- e validar os estudos tecnológicos para veis, para alternativas ao plantio de co-
produto inviável economicamente para a duza em regiões com déficit de alimen- o cultivo dos insumos e o Ciam se en- ca. “Lançam uma série de programas go-
agricultura peruana. tos, plantas que serão transformadas em carregará de distribuir entre cinco e vernamentais e privados que dizem que o
Para o pesquisador peruano em polí- combustível de carros”. dez mil hectares, por projeto, das ter- camponês tem que se converter em em-
tica internacional e segurança nacional, ras apontadas pela Devida aos investi- presário, agroexportador, utilizando su-
Ricardo Soberón, que deixou o cargo de Mãos invisíveis dores privados. as terras de outra maneira”, complemen-
coordenador da Devida no início do ano A forma como se armou a tarefa de ca- Por sua vez, o Pró Investimentos tem a ta Soberón.
por discordar das políticas do presidente da órgão governamental envolvido no responsabilidade de garantir o aporte fi- No Peru, grandes grupos privados já
Ollanta Humala no combate às drogas no convênio insinua uma estratégia dos Es- nanceiro empresarial à assistência técni- utilizam 40 mil hectares de terras para
país, “a destruição da plantação da folha tados Unidos e uma mirada meramente ca e fomentar a parceria entre o público e plantação de palma azeiteira destinada à
de coca sob qualquer alegação é pretex- empresarial ao projeto. o privado nos futuros negócios em torno produção de biocombustíveis.
Eduardo Tamayo G.
de Quito (Equador)
OPINIÃO
O melhor, agora, é torcer
para que Obama possa
melhorar as relações com
o nosso país e a América
Latina
Frei Betto
ENTREVISTA
Filósofo espanhol analisa
a eleição de Obama e
estabelece comparativo
com o presidente
venezuelano
Silvia Mazzini
de Doha (Qatar)