Você está na página 1de 18

INTENSIVO II

Cleber Masson
Direito Penal
Aula 1

ROTEIRO DE AULA

Temas: Teoria geral da pena


Aplicação da pena

No curso Intensivo II, o professor irá encerrar alguns temas da Parte Geral do Código Penal (“Teoria Geral da Pena”) e,
posteriormente, já iniciará os estudos da Parte Especial do Código Penal.

TEORIA GERAL DA PENA

1. Sanção penal: conceito e espécies

Sanção penal é a resposta do Estado, no exercício do ius puniendi e com respeito ao devido processo legal, ao responsável
por um crime ou por uma contravenção penal.

✓ O Estado, neste caso, é o Poder Judiciário. A sanção penal é um monopólio do Estado, o qual é representado pelo
Poder Judiciário.
✓ Assim sendo, não haverá sanção penal aplicada, exemplificativamente, pelo Poder Legislativo, pelo Poder
Executivo, pelo MP etc. Esta matéria é constitucionalmente reservada ao Poder Judiciário.

1.1. As vias do Direito Penal

Questão: Quais são as espécies de sanção penal? Claus Roxin afirma que a sanção penal segue um sistema de dupla via.
• Pena (1ª via) – Pode ser privativa de liberdade, restritiva de direitos ou de multa.

1
www.g7juridico.com.br
• Medida de segurança (2ª via).

Quando se fala em um sistema de dupla via, tem-se que este representa as formas pelas quais o Estado responde a quem
violou a lei penal.

✓ Assim sendo, “vias do Direito Penal” são as formas de reação do Estado em relação a quem violou a lei penal.

Obs.: O MP de Minas Gerais, em questão dissertativa (2ª fase do concurso), questionou se existiria uma 3ª via do Direito
Penal e pediu que o candidato discorresse sobre o tema.
O professor destaca que muitos candidatos versaram sobre o direito penal do inimigo, mas este se refere à terceira
velocidade do Direito Penal.
A terminologia “terceira via do Direito Penal” é uma criação de Claus Roxin, o qual afirma que se trata da reparação do
dano causado à vítima de um crime ou contravenção penal.

✓ O professor ressalta que, nesse ponto, o Direito Penal finalmente está olhando para a vítima do processo penal.
Isso porque, segundo o professor, todos os benefícios são pensados sob a ótica do agente (exemplo: o
arrependimento posterior1 importa, em última análise, na diminuição da pena do agente).
✓ A 3ª via do Direito Penal é um “olhar para a vítima”, pois, neste caso, o Estado abre mão de seu direito de punir
porque o agente reparou o dano causado à vítima. Nessa terceira via, o Estado busca a proteção da vítima.

Questão: Existe alguma manifestação da 3ª via do Direito Penal no Brasil? Sim. No Brasil, já existem dispositivos legais
que versam sobre a 3ª via do Direito Penal. Veja o art. 74 da Lei 9099/95 (composição dos danos civis):

Lei 9.099/95, art. 74: “A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença
irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente.
Parágrafo único. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação,
o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação.”

No caso do art. 74 da Lei 9.099/95, há uma infração penal de menor potencial ofensivo, a qual se processa por ação penal
privada ou por ação penal pública condicionada à representação do ofendido. A composição dos danos civis entre o autor
do fato e a vítima acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação. Assim sendo, consequentemente, opera-se
a extinção da punibilidade.

1
CP, art. 16: “Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até
o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços.”

2
www.g7juridico.com.br
2. Pena: teorias e finalidades

Nesse ponto, é preciso verificar o que o Estado almeja quando aplica uma sanção penal em alguém (finalidades da pena).
Para analisar tais objetivos, foram criadas algumas teorias que versam sobre o tema.

2.1. Teoria absoluta e finalidade retributiva

Para a teoria absoluta, a finalidade de aplicação da sanção penal é retributiva. Tal teoria se esgota em si mesma.
✓ Neste caso, a pena não possui nenhuma finalidade prática.

A finalidade da pena, conforme essa teoria, é somente punir. Trata-se do chamado “caráter expiatório da pena”.

Conforme essa teoria, a pena não possui nenhuma finalidade prática, servindo apenas como punição – “Pune-se por
punir”.

✓ Para essa teoria, a pena é um mal justo em resposta a um mal injusto (crime).
✓ Até mesmo essa teoria, que visa ao castigo por si só, reconhece a pena enquanto um “mal”.
✓ A pena é um instrumento de vingança do Estado contra quem violou a lei penal.

Os dois grandes nomes da teoria absoluta são Kant e Hegel.

Kant e Hegel foram filósofos que se enveredaram pelo Direito Penal. Entretanto, eram adeptos a uma filosofia muito
ligada à igreja católica da época. Assim sendo, o professor afirma que, nesta teoria, a pena está muito ligada à ideia de
religião (“penitência” enquanto castigo).

✓ A palavra “penitenciária” vem de penitência. Assim, é possível perceber a vinculação das penas aos dogmas da
igreja católica.

Kant, com seus imperativos categóricos de justiça (metafísica dos costumes), traz o exemplo da ilha:

Em uma ilha distante, cada um dos indivíduos possuía funções variadas: um pescava, o outro caçava, o outro
plantava e assim sucessivamente. Entretanto, os indivíduos perceberam que um determinado membro do grupo
não realizava nenhuma atividade e, para comer, estava furtando mantimentos de outros indivíduos. Diante disso,
resolveram dar uma pena de prisão de 1 ano ao indivíduo ocioso e, para tal, construíram uma cela do outro lado
da ilha para manter o indivíduo preso. Imagine que, seis meses após o início do cumprimento da pena, a água do
mar começou a subir e a ilha começou a desaparecer. No entendimento de Kant, como o indivíduo não havia

3
www.g7juridico.com.br
cumprido toda a sanção penal imposta, ele poderia morrer, já que a pena, enquanto imperativo categórico de
justiça, deve ser integralmente cumprida, sob pena de deslegitimar a ação estatal.

A pena não busca prevenir a prática de novos delitos – “Pune-se por punir”.

2.2. Teoria relativa e finalidades preventivas

A finalidade da pena é evitar a prática de novos delitos, ou seja, o objetivo é a prevenção de novos delitos.

A prevenção se subdivide em:


• Prevenção geral: é aquela que tem os demais membros da sociedade como destinatários. O Estado pune quem
violou a lei penal para que os demais membros da sociedade não venham a delinquir.
O Estado quer mostrar para a sociedade que o crime não compensa.
• Prevenção especial: é dirigida ao condenado pela prática do crime ou da contravenção penal. Nesse caso, o Estado
pune para que o condenado não volte a delinquir.

Tanto a prevenção geral quanto a prevenção especial se subdividem em negativa e positiva.

• Prevenção geral negativa: tal teoria se baseia na chamada “Teoria da Coação Psicológica”, a qual foi idealizada
por Feuerbach. Trata-se da intimidação coletiva.
✓ A prevenção geral negativa acaba criando um direito penal do medo, pois se manifesta pela hipertrofia do Direito
Penal (aumento do Direito Penal).
✓ A prevenção geral negativa se refere ao fato de criar nos membros da sociedade um contraestimulo à prática do
crime, ou seja, é a própria intimidação coletiva.

• Prevenção geral positiva: é aquela que busca reafirmar a validade/autoridade/eficácia do Direito Penal
(reafirmação do Direito Penal).
Quando um crime é praticado, a lei penal é atacada/machucada. Segundo o professor, quando o agente é
condenado e cumpre a pena, é como se a “ferida” tivesse desaparecido. Neste caso, o Direito Penal demonstrou
prevalecer sobre a atuação ilícita do agente.
Exemplo: imagine uma cidade pacata em que as crianças brincam na rua. Se, nessa cidade, for descoberta a
existência de um assassino/estuprador, o medo irá reinar. Entretanto, se, logo após, os moradores descobrirem
que o agente foi condenado e preso, a paz retornará (restabelecimento da ordem).

• Prevenção especial negativa: é também chamada de “prevenção especial mínima”. Ela busca apenas evitar a
reincidência.

4
www.g7juridico.com.br
• Prevenção especial positiva: é também chamada de “prevenção especial máxima”. Essa prevenção busca a
ressocialização do condenado.
✓ Há uma jurista portuguesa chamada Anabela Miranda Rodrigues que afirma que a pena, antes de ser
ressocializadora, deveria ser não dessocializadora, ou seja, antes de almejar ressocializar o indivíduo, a pena
deveria tomar o cuidado de não “estragar” ainda mais o condenado.

Observações:
✓ Nos primórdios do Direito Penal (antes das codificações), a pena possuía uma finalidade exclusivamente
retributiva. Exemplo: pena de morte.
✓ Com o avanço da humanidade, a pena deixou de ser apenas retributiva e passou a assumir um viés preventivo.
Exemplo: pena de morte cumprida em praça pública (Joana D’Arc foi queimada na fogueira em praça pública)
para evitar que as demais pessoas agissem da mesma forma que o condenado.
✓ Conforme o Direito Penal vai evoluindo, a pena se torna cada vez mais preventiva e menos retributiva. Exemplo:
penas restritivas de direito.
✓ A pena começou sob o aspecto retributivo e passou a ter um caráter cada vez mais preventivo, mas ela nunca
deixará de ser castigo/retribuição. Conforme o momento histórico, a pena pode ser mais ou menos retributiva,
mas sempre terá um caráter retributivo (em maior ou menor grau), pois as vítimas e/ou os parentes da vítima
sempre querem “justiça”, ou seja, querem que o culpado seja condenado e pague pelo crime cometido.

2.3. Teoria mista e dupla (ou tríplice) finalidade

O Brasil adota a teoria mista, também chamada de teoria unificadora/unitária/intermediária/conciliatória/eclética.

Ao adotar tal teoria, a pena assume uma dupla finalidade:


• Retribuição; e
• Prevenção.

Também é possível falar em tríplice finalidade. Nesse caso, a prevenção é desmembrada em geral e especial.

Em vários dispositivos, é possível verificar a adoção dessa teoria.


Exemplo: art. 59, caput, CP.

CP, art. 59, “caput”: “O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente,
aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá,
conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime:”

5
www.g7juridico.com.br
2.4. Teoria agnóstica

Tal teoria também é chamada de negativa da pena


✓ A teoria agnóstica é proposta por Eugenio Raúl Zaffaroni.

Trata-se de teoria que não acredita nas finalidades da pena (retributiva e preventiva), pois as pessoas veem a punição dos
condenados e a situação dos estabelecimentos prisionais, mas os índices de criminalidade apenas crescem.
✓ A pena, segundo essa teoria, tem a única finalidade de neutralizar o condenado.
✓ Essa finalidade existe, sobretudo, na pena privativa de liberdade que leva à prisão, ou seja, o condenado é retirado
do convívio da sociedade.

3. Cominação das Penas

A cominação da pena é a previsão da pena em abstrato (atividade legislativa). De outro lado, a aplicação da pena é a
fixação no caso concreto (atividade judiciária).

CP, art. 53: “As penas privativas de liberdade têm seus limites estabelecidos na sanção correspondente a cada tipo legal
de crime”.

3.1. Espécies de cominação

a) Isolada: o preceito secundário do tipo penal prevê uma única pena com exclusividade.

Exemplo: homicídio simples


CP, art. 121: “Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos.”

b) Cumulativa: o tipo penal prevê, em conjunto, duas espécies de pena. Nesse caso, o juiz deve aplicar as duas penas.

Exemplo: furto.
CP, art. 155: “Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.”

c) Alternativa: o legislador prevê duas espécies de penas e dá ao juiz a opção de escolher qualquer uma delas.

Exemplo: divulgação de segredo

6
www.g7juridico.com.br
CP, art. 153: “Divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial,
de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa produzir dano a outrem:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.”

✓ O que caracteriza essa cominação alternativa é a escolha (pelo juiz) entre duas penas diversas.
✓ O magistrado apenas pode aplicar uma entre as duas penas previstas.

d) Paralela: o legislador prevê duas espécies da mesma pena e o juiz escolhe uma delas.

Exemplo: bigamia
CP, art. 235: “Contrair alguém, sendo casado, novo casamento:
Pena - reclusão, de dois a seis anos.
§ 1º - Aquele que, não sendo casado, contrai casamento com pessoa casada, conhecendo essa circunstância, é punido
com reclusão ou detenção, de um a três anos.”

✓ No exemplo dado, o juiz escolhe entre a reclusão e a detenção. Trata-se de duas espécies da mesma pena: pena
privativa de liberdade.
✓ Nesse caso, o juiz deve escolher apenas uma das penas, mas elas são da mesma natureza.

4. Classificação das penas

4.1. Quanto ao critério adotado pelo Código Penal

Previsão legal:

CP, art. 32: “As penas são:


I - privativas de liberdade;
II - restritivas de direitos;
III - de multa.”

4.2. Quanto ao critério constitucional


Neste caso, as penas são classificadas em permitidas e proibidas.

a) Permitidas: as penas permitidas estão elencadas no art. 5º, XLVI da Constituição Federal em rol exemplificativo.

✓ O legislador ordinário pode criar outras penas não previstas na CF, desde que sejam compatíveis com os valores
constitucionais.

7
www.g7juridico.com.br
CF, art. 5º, inc. XLVI: “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos.”

Observações:
✓ Pena privativa de liberdade é aquela em que o condenado é submetido à prisão. Neste caso, a pena retira do
condenado o direito de locomoção por tempo determinado.
✓ Pena restritiva da liberdade é aquela que limita o direito de locomoção do condenado sem submetê-lo à prisão.
Exemplo: “A” cometeu violência doméstica e familiar na cidade de Bauru. Neste caso, o juiz, por exemplo, pode
aplicar a pena que determina que o agente não entre mais na cidade de Bauru. Trata-se de pena que restringe a
liberdade do agente sem submetê-lo à prisão.

b) Proibidas

Previsão legal:

CF, art. 5º, inc. XLVII: “não haverá penas:


a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis.”

No Brasil, não é possível a pena de morte, exceto em caso de guerra declarada.

✓ O art. 75 do Código Penal2 limita a privação da liberdade em até 40 anos.

2
CP, art. 75: “O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 40 (quarenta)
anos. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 40 (quarenta) anos, devem
elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)

8
www.g7juridico.com.br
Obs.: O professor destaca que vai haver uma aula específica para ele trabalhar a mudança relativa à quantidade de pena
máxima privativa de liberdade, a qual foi trazida pelo Pacote Anticrime. Entretanto, ele já adianta que a mudança levou
em consideração, principalmente, o aumento da expectativa de vida do brasileiro e, portanto, o limite de 40 anos não
pode ser considerado como pena perpétua.
Exemplo: a pessoa comete crimes aos 25 anos e é condenada a 40 anos de prisão. Neste caso, é possível cumprir a pena
integralmente e ser liberto ao final dos 40 anos.

Questão: Como é possível compatibilizar a proibição de pena de trabalhos forçados com o trabalho obrigatório do preso?
Na Lei de Execução Penal, há a previsão de trabalho obrigatório do preso. A recusa injustificada ao trabalho constitui falta
grave.
✓ O trabalho obrigatório é salutar para evitar a ociosidade do preso e contribui para a própria ressocialização do
condenado.
✓ Trabalho forçado é diferente de trabalho obrigatório.
✓ Trabalho forçado é aquela pena degradante/humilhante (Exemplo: trabalhar com uma bola de ferro presa ao pé,
no sol quente, ganhando apenas água).

Pena de banimento é a expulsão de um brasileiro do território nacional.


Exemplo: um criminoso brasileiro perigoso possui parentes no Paraguai. Diante disso, o juiz decide mandá-lo embora para
o Paraguai, sendo vedada a sua volta. Essa pena é proibida.
✓ Pena de banimento é a pena de degredo.

Pena cruel é aquela que recai sobre a integridade física ou moral do condenado.
Exemplo: a pena de açoite, pena de ferro em brasa etc.

5. Teoria das janelas quebradas: “Broken Windows theory”

A teoria das janelas quebradas é referente à criminologia. Criminologia, por sua vez, é ciência auxiliar do Direito Penal.

O Direito Penal estuda as consequências do crime. A criminologia estuda as causas do crime, ou seja, as razões que levam
à prática do crime.

No ano de 1969, na Universidade de Stanford, surge essa teoria. Phillip Zimbardo, ao estudar a relação entre pobreza e
Direito Penal, resolveu abandonar dois carros idênticos em locais diversos dos EUA.

§ 2º - Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena, far-se-á nova unificação,
desprezando-se, para esse fim, o período de pena já cumprido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”

9
www.g7juridico.com.br
O primeiro carro foi abandonado em Palo Alto, Califórnia, região rica dos EUA e com a criminalidade controlada. O
segundo carro foi abandonado no bairro do Bronx, Nova Iorque, região que, na época, era muito perigosa e pobre. Os
carros foram deixados nessas regiões por alguns dias e, ao voltar para verificar como eles estavam, foi possível perceber
que o carro de Palo Alto estava intacto, mas o carro de Bronx estava completamente destruído e depredado.

Em um primeiro momento, Phillip Zimbardo deduziu que, realmente, poderia haver uma forte relação entre pobreza e
criminalidade. Entretanto, posteriormente, ele teve uma ideia: quebrou uma janela do carro que estava abandonado em
Palo Alto. Após isso, ele deixou o carro abandonado por mais alguns dias e, ao voltar para vê-lo, percebeu que o carro de
Palo Alto teve o mesmo destino do carro do Bronx, ou seja, também foi destruído.

Assim sendo, ele chegou à conclusão de que não é a pobreza o fator determinante para a prática de crimes. O que estimula
a prática de crimes é a sensação de impunidade.

✓ Esse é o primeiro contexto em que surge esta teoria.

Em 1982, James Wilson e George Kelling voltam a estudar esta matéria. Segundo eles, em locais sujos e abandonados
pelo Estado, a incidência de crimes é maior. Normalmente, os crimes ocorrem em locais abandonados.
A ideia dos estudiosos é propor que o Estado deve sempre se mostrar presente. Além disso, o Estado tem que punir todo
e qualquer crime, por mais ínfimo que ele seja.

✓ Eles constataram que pequenos crimes, se não forem punidos, acabam estimulando crimes mais graves.

No Brasil, essa teoria se destaca em dois pontos:


1º) O prazo mínimo de prescrição da pena privativa de liberdade era de 2 anos até 2010 e, atualmente, é de 3 anos. Essa
alteração legislativa ocorreu porque o legislador percebeu que deve punir os pequenos crimes e as contravenções penais.
O Estado deve punir todo e qualquer crime, por mais ínfimo que ele seja, sob pena de estímulo à prática de novos crimes.

2º) O grande exemplo da Teoria das Janelas Quebradas é a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006). Os atos de violência vão
aumentando progressivamente. Assim, punindo um crime pequeno, é possível evitar um crime maior.
✓ Tal diploma legislativo buscou retirar benefícios despenalizadores contra todo o delito praticado com violência
doméstica ou familiar contra a mulher. Isso porque, em regra, o agressor não mata a mulher no primeiro
desentendimento.

Em 1994, Rudolph Giuliani, prefeito de Nova Iorque, implantou a “política de tolerância zero”. Tratava-se de um
movimento de lei e de ordem que buscava a tolerância zero contra o crime. Assim, todo e qualquer crime era punido, de
forma a evitar crimes maiores.
✓ A política de tolerância zero não se referia ao criminoso, mas ao crime em si.

10
www.g7juridico.com.br
✓ O professor destaca que essa já era a ideia passada por Beccaria (“Dos delitos e das penas”) em 1764: não é a
criação de crimes ou o aumento de penas que inibe a criminalidade, mas a certeza de punição justa, efetiva, rápida
e proporcional.

6. Teoria dos testículos despedaçados: “breaking balls theory”

Essa teoria também é muito ligada à criminologia e tem seu nascedouro na Universidade de Chicago.

Tal teoria é construída com base na experiência policial.

✓ Imagine a seguinte situação: a polícia de determinada região desconfia que um sujeito é criminoso. Nesse caso, a
polícia começa a acompanhar o suspeito. Ao perceber que a polícia está atrás dele, o provável criminoso vai
embora da cidade.
✓ Essa teoria baseia-se exatamente nessa situação, ou seja, quando um suspeito começa a ser acompanhado de
perto pela polícia, ele migra para outro local.

7. Abolicionismo penal

O abolicionismo tem seu nascedouro em dois pequenos países europeus. Os grandes nomes dessa teoria são Louk
Hulsman (Holanda), Nils Christie e Thomas Mathiesen (Noruega).

Trazer o modelo de países como a Holanda e a Noruega, que possuem uma realidade completamente diferente da do
Brasil, e querer implantar em nosso país é um erro, pois países como a Noruega têm a criminalidade próxima ao índice
zero.

O abolicionismo penal parte das chamadas “cifras negras do Direito Penal”.

✓ As cifras negras do Direito Penal são aqueles crimes que foram efetivamente praticados, mas que não chegam a
ser efetivamente punidos pelo Estado.

Obs.: o professor destaca que, no ano 2000, a Revista Veja lançou uma matéria/pesquisa que concluiu que, de 100
homicídios praticados na cidade de São Paulo, apenas 24 tinham a autoria descoberta. 76 homicídios eram casos de
autoria desconhecida.
Dentre os 24 homicídios, 18 eram denunciados pelo Ministério Público. Entre os crimes denunciados, apenas 12 eram
pronunciados e apenas 8 eram condenados. Dentre os 8 condenados, apenas 1 cumpria a pena até o fim.

11
www.g7juridico.com.br
✓ Segundo o abolicionismo, tal estatística é um absurdo. Para essa teoria, poucos crimes chegam ao conhecimento
oficial do Estado e, entre os que chegam, poucos são efetivamente punidos. Assim, conforme a teoria
abolicionista, o Direito Penal torna-se, em algumas facetas, desnecessário, pois, mesmo com crimes e criminosos
impunes, a sociedade sobrevive.

A teoria abolicionista propõe a descriminalização da maioria das condutas. Nesses casos, a maioria dos crimes deixa de
existir.
Em relação aos crimes que continuarem existindo, o abolicionismo propõe a despenalização.
✓ Os abolicionistas afirmam que muito dinheiro é gasto com o Direito Penal. Desse modo, seria possível utilizar o
dinheiro que seria gasto com o Direito Penal em benefício da educação, esporte, lazer, cultura etc.

✓ Esse modelo, aparentemente, é impossível de ser implementado no Brasil.

Obs.: O argentino Zaffaroni, na obra “Em busca das penas perdidas”, assume o perfil abolicionista.
Luigi Ferrajoli afirma que o abolicionismo penal não passa de uma utopia. Segundo este autor, mesmo para os penalistas
extremamente garantistas, o abolicionismo penal é uma utopia.

A expressão “cifras negras” é utilizada, principalmente, para se referir aos crimes de rua (crimes praticados em locais
públicos e, geralmente, por pessoas pobres).
✓ Tais crimes de rua são praticados e, muitas vezes, não chegam ao conhecimento do Estado. Quando isso ocorre,
tem-se as chamadas “cifras negras do Direito Penal”.

No Direito Penal, também se fala nas cifras douradas. Elas se relacionam, principalmente, com a criminalidade econômica.
Exemplo: lavagem de dinheiro, corrupção ativa e corrupção passiva.
✓ Trata-se de crimes que envolvem pessoas com elevado poder econômico que abusam desse poder para a prática
de crimes.
✓ Tais crimes são cometidos em locais reservados e sob sigilo.
✓ Esses crimes raramente chegam ao conhecimento do Estado.

A expressão “cifras verdes” diz respeito aos crimes ambientais que são praticados e não entram nas estatísticas oficiais
do Estado (exemplo: desmatamento).

Cifras rosas são os crimes envolvendo homofobia e transfobia, os quais também não chegam ao conhecimento do Estado.

As cifras cinzas do Direito Penal referem-se aos crimes que são resolvidos no próprio ambiente policial. Neste caso, os
crimes não chegam ao conhecimento do Poder Judiciário.

12
www.g7juridico.com.br
Exemplo: briga de bar que gera lesão corporal leve. Imagine que o delegado solucione, informalmente, a situação entre
as partes.

8. Justiça restaurativa

A justiça restaurativa se contrapõe à justiça retributiva.

✓ Justiça retributiva é aquela que busca a imposição de uma pena a quem violou a lei penal. Tal justiça é composta
de meios formais, rígidos e inflexíveis.
Todo e qualquer crime ofende o interesse do Estado. Por esse motivo, todo crime deve ser submetido ao Poder
Judiciário. Além disso, quando o MP não é parte, ele funciona como fiscal da lei. Trata-se da tradicional concepção
de justiça penal.
✓ A justiça restaurativa busca a composição entre o agressor e o ofendido. Tal justiça almeja o reequilíbrio entre
quem praticou o crime e a vítima do delito, mediante o perdão do ofendido e mediante a reparação do dano
causado à vítima.
Tal justiça é caracterizada pelo uso de meios informais e flexíveis. O Estado não participa dessa justiça
restaurativa.
Conforme a visão dessa justiça, o problema pode ser resolvido pela própria sociedade, sem a participação do
Estado, de modo a não quebrar os vínculos existentes na sociedade.
Exemplo: “A” e “B” são vizinhos de apartamento. Certo dia, “A” percebe que “B” esqueceu a porta aberta, entra
na casa de “B” e furta as garrafas de whisky dele. Na justiça retributiva, o furto é crime de ação penal pública
incondicionada, que gerará a instauração de inquérito policial e pode ser que haja denúncia e condenação de “A”.
A partir disso, a rotina entre “A” e “B” ficaria insuportável.
De acordo com a justiça restaurativa, no exemplo dado, como “A” e “B” são vizinhos, é possível que o problema
seja resolvido sem a interferência estatal.

A justiça restaurativa afirma que nem tudo ofende o interesse estatal. Desse modo, muitas questões podem ser resolvidas
sem a participação do Estado.

✓ A justiça restaurativa é válida, sobretudo, para crimes patrimoniais sem violência à pessoa e sem grave ameaça,
além de também ser aplicada a crimes de lesão corporal leve.

13
www.g7juridico.com.br
APLICAÇÃO DA PENA

O professor destaca que esse é o tema mais importante para ser estudado por quem pleiteia o concurso de magistratura.

1. Conceito

A aplicação da pena é uma atividade exclusiva do Poder Judiciário, a qual consiste em fixar a pena na sentença ou no
acórdão, e depois de respeitado o devido processo legal, a quem teve contra si imputada a responsabilidade por um crime
ou contravenção penal.

Questão: O que se entende por teoria das margens no Direito Penal?


A atividade de aplicação da pena é um ato discricionário juridicamente vinculado. O juiz tem liberdade para aplicar a pena,
mas essa discricionariedade é limitada pelas imposições legislativas, ou seja, ele não pode ultrapassar os limites impostos
pelo Poder Legislativo, mas pode transitar entre esses limites, desde que sua decisão seja fundamentada.
✓ A Teoria das Margens no Direito Penal refere-se ao ato discricionário juridicamente vinculado e à margem que o
juiz tem para transitar entre os limites impostos pelo legislador. O juiz deve permanecer dentro das margens
impostas.

2. Pressuposto

O pressuposto para aplicação da pena é a culpabilidade do agente.

Não importa se, nesse ponto, o intérprete adota o conceito bipartido ou tripartido de crime. O pressuposto remete à ideia
de que, sem culpabilidade, não pode ser aplicada pena, ou seja, a culpabilidade é indispensável para a aplicação da pena
do mesmo modo que a periculosidade é indispensável para a aplicação de medida de segurança.

3. Sistemas ou critérios para aplicação da pena

Existem dois critérios que buscam a primazia na aplicação da pena:

• Critério trifásico: este critério diz que a pena é aplicada em três fases distintas e sucessivas. Tal critério teve Nélson
Hungria como seu grande defensor.
• Critério bifásico: Roberto Lyra é o grande nome ligado à defesa desse critério. Para Roberto Lyra, a pena deve ser
aplicada em duas fases distintas e sucessivas.

14
www.g7juridico.com.br
Alberto Silva Franco defendia uma 4ª fase na aplicação da pena privativa de liberdade. Segundo ele, a 4ª fase seria a
substituição, quando cabível, da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos.

3.1. Sistemas adotados no Brasil

Atenção:
No tocante à pena privativa de liberdade, o Código Penal adota o critério trifásico (art. 68, caput, CP).
No tocante à pena de multa, adota-se o sistema bifásico (art. 49, CP).

CP, art. 68, “caput”: “A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão
consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento”.

• 1ª fase: cálculo da pena-base;


• 2ª fase: atenuantes e agravantes;
• 3ª fase: causas de diminuição e de aumento de pena.

CP, art. 49: “A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada
em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.
§ 1º - O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal
vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário.”

• 1ª fase: cálculo do número de dias-multa, o qual varia entre 10 e 360.


• 2ª fase: cálculo do valor do dia-multa.

Observações:
1ª) As penas restritivas de direito são dotadas de duas características fundamentais: autonomia e substitutividade.
✓ No Código Penal, os preceitos secundários não preveem diretamente penas restritivas de direitos. Tais penas são
aplicadas em substituição à pena privativa de liberdade quando os requisitos legais estiverem presentes.

2ª) As penas restritivas de direito, originariamente no Código Penal, são penas privativas de liberdade. Assim sendo, o juiz
aplica a pena privativa de liberdade pelo critério trifásico. Posteriormente, se cabível, substitui tal pena por uma ou mais
penas restritivas de direitos.

3ª) A autonomia das penas restritivas de direito significa que, uma vez efetuada a substituição no sistema do Código Penal,
a pena restritiva de direitos não pode ser aplicada cumulativamente com a pena privativa de liberdade pelo mesmo crime.

15
www.g7juridico.com.br
APLICAÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

1. O critério trifásico

1.1. Introdução

A pena privativa de liberdade é aplicada em três fases:

• 1ª fase: cálculo da pena-base de acordo com as circunstâncias judiciais previstas no art. 59, caput do CP.
• 2ª fase: o juiz faz incidir as atenuantes e agravantes;
• 3ª fase: causas de diminuição e de aumento de pena (minorantes e majorantes).

Na pena-base, o juiz vai utilizar o art. 59, caput do CP (circunstâncias judiciais).


A segunda e a terceira fases também são chamadas de circunstâncias legais, pois são definidas pelo legislador.

Observação: Roberto Lyra fundia a 1ª e a 2ª fases em uma só:


Na 1ª fase, o juiz fixa a pena-base e já faz incidir as atenuantes e agravantes. Na 2ª fase, há a incidência das causas de
diminuição e de aumento de pena.

Atenção: a pena privativa de liberdade deve ser aplicada em três fases distintas e sucessivas. Isso significa que o juiz deve
passar por cada uma dessas fases separadamente.

✓ A aplicação da pena em um procedimento único, ignorando o sistema trifásico, leva à nulidade da sentença, pois
ofende o princípio constitucional da individualização da pena (art. 5º, XLVI, CF3).
✓ Esse procedimento serve para evitar a “pena padrão”, “pena automatizada”.

O procedimento único, conforme afirma o professor, ocorre quando o juiz não respeita o critério trifásico e aplica a pena
diretamente, sem discorrer sobre o raciocínio utilizado para chegar ao quantum.

3
CF, art. 5º, XLVI: “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos”

16
www.g7juridico.com.br
Depois de esgotadas as fases do critério trifásico, o juiz deve definir o regime prisional para cumprimento da pena privativa
de liberdade. Posteriormente, o juiz deve avaliar se é caso de substituição da pena privativa de liberdade por pena
restritiva de direitos (art. 44 do CP4).
Se não for possível substituir a pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, o juiz deve verificar se é cabível
o sursis.
Em seguida, o juiz verifica se seria o caso de fixação do valor mínimo para a reparação dos danos causados pelo crime.
Por fim, o juiz analisa se se trata de caso que requer a decretação de prisão preventiva.

4
CP, art. 44: “As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: (Redação
dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave
ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;(Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
II – o réu não for reincidente em crime doloso; (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as
circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
§ 1o (VETADO) (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)
§ 2o Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de
direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e
multa ou por duas restritivas de direitos. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)
§ 3o Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a
medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo
crime. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)
§ 4o A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado
da restrição imposta. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena
restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão. (Incluído pela Lei nº 9.714, de
1998)
§ 5o Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o juiz da execução penal decidirá sobre a
conversão, podendo deixar de aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior. (Incluído pela
Lei nº 9.714, de 1998)”

17
www.g7juridico.com.br
18
www.g7juridico.com.br

Você também pode gostar