Você está na página 1de 17

Contribuições da arte na formação e prática

pedagógica do professor de educação infantil

Nilcemara Tanasovici Nardy 1

Nanci de Almeida Rezende 2

Resumo: O presente artigo tem por objetivo, mediante pesquisa bibliográfica,


demonstrar o tema a partir da conceituação da arte, para que se perceba a atuação da
mesma no âmbito da educação e do desenvolvimento infantil. Para a concretização
de nosso objetivo, partimos da análise da legislação relacionada ao ensino infantil
e posteriormente tomamos a história do ensino artístico nas escolas e as principais
contribuições do ensino da Arte para a formação continuada do professor de Educação
Infantil. E, por fim, abordamos a importância do professor ter um olhar diferenciado
sobre as produções artísticas das crianças e de repensar suas metodologias e objetivos a
respeito desse ensino.

Palavras-chave: Arte. Educação. Desenvolvimento. Pintura. Aprendizagem.

1
Pós-graduada em Psicopedagogia no Processo Ensino Aprendizagem pelo Centro Universitário Claretiano.
E-mail: <tanasovici@yahoo.com.br>.
2
Orientadora. Mestre em Educação pela UNICAMP – Campinas. Tutora do Curso de Especialização em
Psicopedagogia no Processo Ensino Aprendizagem e do Curso de Especialização em Educação Infantil e
Alfabetização pelo Centro Universitário Claretiano de Batatais-SP. E-mail: <nancirezende@hotmail.com>.

Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012   131


1. INTRODUÇÃO

Ao atuar na educação infantil, percebe-se que o ensino da arte e a


atuação dos educadores com os trabalhos artísticos desenvolvidos com
as crianças, em geral, é um dos grandes dilemas da pedagogia moderna.
Muitos educadores ministram aula de artes na educação infantil, mas
não sabem o objetivo, a dimensão e a importância desse trabalho para
o desenvolvimento completo da criança, pois, a falta de uma formação
acadêmica completa, suas limitações e a resistência os impedem de se
aprofundarem no assunto, fazendo com que a execução dessa disciplina
não esteja a contento de tal missão.
Muitas vezes, os conteúdos que são oferecidos aos alunos estão isentos
de sentido, fora da realidade, não se sabe onde aplicá-lo e, portanto, torna-
se algo desinteressante. Além disso, o professor procura ensinar mais a
técnica, a despeito da interpretação daquilo que o autor quis realmente
dizer, ou seja, o real sentido da obra, como afirma Almeida (1992) em seu
livro “Concepções e Práticas Artísticas na Escola”.
Segundo o autor citado, saber ensinar arte é conhecer, por meio
da experiência, concretamente vivida, quais os desafios, as facilidades,
as possibilidades técnicas encontradas durante o desenvolvimento de
criação artística, para que se possa coordenar, instigar e desafiar com maior
eficiência esse processo.
Assim, com a elaboração dessa pesquisa, buscou-se mostrar a
importância e a necessidade da arte na educação infantil com o objetivo
de levar os educadores a refletirem sobre as concepções e metodologias a
respeito da mesma, explorarem-na como papel indispensável na formação
da educação das crianças e compreenderem que a arte é decisiva para
prepará-las para as fases seguintes da educação.
Lanier (1984) defende a idéia de que as artes devam estar presentes
no currículo escolar pelos benefícios que apenas elas oferecem à educação
e não por suas contribuições nesses campos de desenvolvimento.
Na educação infantil, a criança se encontra em fase de pensamento

  132 Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012


concreto e explora a utilização dos sentidos para desenvolver e enriquecer
suas experiências. Nesta fase, as atividades artísticas contribuirão com ricas
oportunidades para seu desenvolvimento, uma vez que põem ao seu alcance
os mais diversos tipos de materiais para manipulação. O lúdico, o teatro, a
dança, a pintura, o desenho, a criatividade, o conto de fadas, fazem parte
desse momento em que elas se expressam, comunicam e transformam a
vida na relação com a arte, ou seja, “somos potencialmente criadores,
possuímos linguagens, fazemos cultura” (PIRES, 2009, p. 47).
O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil
(BRASIL, 1998) ressalta que as artes visuais devem ser concebidas
como uma linguagem que tem estrutura e características próprias, cuja
aprendizagem, no âmbito prático e reflexivo, se dá por meio da articulação
dos seguintes aspectos: fazer artístico, apreciação e reflexão. O trabalho
contextualizado com obras de arte dá conta de todas essas exigências.
Em vista disso, o presente trabalho tem por objetivo apontar a
necessidade de investimento na formação continuada do professor de
educação infantil para que este construa o conhecimento na área e possa
diversificar suas aulas e refletir sobre as contribuições que a atividade artística
oferece para sua formação e prática pedagógica, levando-o a ter um olhar
diferenciado sobre as produções artísticas das crianças e a repensar sobre
suas metodologias e objetivos a respeito desse ensino; dessa forma, mostrar a
necessidade de conhecer o verdadeiro significado da arte e como ela influencia
o trabalho pedagógico, no curso infantil, e no desenvolvimento das crianças
de 0 a 5 anos. É importante salientar que, atualmente, a educação infantil
no Brasil é parte integrante da educação básica e divide-se em creches para
crianças de 0 a 3 anos e pré escolas para crianças entre 3 e 5 anos.
Mediante pesquisa bibliográfica, pretende-se conhecer o tema a
partir da conceituação da arte, para que se perceba a atuação da mesma no
âmbito da educação, no desenvolvimento infantil e na formação e prática
pedagógica do educador.
Para uma melhor compreensão do ensino de artes na educação
infantil serão descritas sucintamente a trajetória da arte, perpassando pela
educação.

Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012   133


2. HISTORIA DO ENSINO DA ARTE NO BRASIL

Na trajetória da historia da humanidade, os homens utilizam-se do


desenho, da pintura e da escultura para se expressar e conhecer o mundo
que os cerca. Assim como o homem em sua história, também as crianças
se expressam e buscam conhecer o mundo através da arte.
O Ensino de arte no Brasil evoluiu consideravelmente de acordo com
momentos históricos e correntes pedagógicas vigentes. Em 1816, Dom
João VI trouxe para o Brasil uma importante referência para o ensino da
arte, a Missão Artística Francesa. Foi criada, então, a Academia de Belas-
Artes, que, após a proclamação da República, passou a ser chamada de
Escola Nacional de Belas-Artes, na qual era ensinado o desenho, com a
valorização da cópia fiel e a utilização de modelos europeus, por meio de
figuras e imagens reproduzidas (mimeografadas ou fotocopiadas) como
material didático.
A academia importou a estética neoclássica dos franceses e uma meto-
dologia de ensino baseada nas concepções de arte definidas por esse estilo,
que foi assumida pela elite como o que tinha de mais moderno. Esse estilo
chocou-se com o barroco, já existente no Brasil. A arte então se tornou um
“luxo” e seu alcance foi apenas aos mais privilegiados:

A partir dessa época, temos uma história do ensino da arte com ên-
fase no desenho, pautada por uma concepção de ensino autoritária,
centrada na valorização do produto e na figura do professor como
dono absoluto da verdade. Sua mesa ficava sobre uma plataforma
mais alta, para marcar bem a “diferença”. Ensinava-se a copiar mo-
delos - a classe toda apresentava o mesmo desenho e o objetivo do
professor era que seus alunos tivessem boa coordenação motora, pre-
cisão, aprendessem técnicas, adquirissem hábitos de limpeza e ordem
nos trabalhos... (MARTINS, PICOSQUE, GUERRA, 1998, p. 11).

Segundo esses autores, entre as décadas de 50 e 60, começou-se a notar


nas escolas a influência de um movimento denominado Escola Nova, já

  134 Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012


presente na Europa e EUA desde o final do século XIX, e dos ainda recentes
estudos sobre criatividade. A influência da pedagogia centrada no aluno,
nas aulas de arte, direcionou o ensino para a livre expressão e a valorização
do processo de trabalho. O papel do professor era dar oportunidades para
que o aluno se expressasse de forma espontânea, pessoal, o que vinha a ser
valorização da criatividade como máxima no ensino da arte.
Esses princípios, na prática escolar, muitas vezes refletiam uma
concepção espontaneísta, centrada na valorização extrema do processo
sem preocupação com os seus resultados.
Como todo processo artístico deveria “brotar” do aluno, o conteúdo
dessas aulas era quase exclusivamente em “deixar-fazer”, o que muito
pouco acrescentava ao aluno em termos de aprendizagem de arte.
Em 1971, com a Lei nº 5.692, foi criado o componente curricular
‘Educação Artística’. A Lei, determinando que nessa disciplina fossem
abordados conteúdos de música, teatro, dança e artes plásticas nos cursos
de 1º e 2º graus, acabou criando a figura de um professor único que deveria
dominar todas essas linguagens de forma competente.
Conforme descreve Martins (1998, p.12), o ensino da Arte se tornou
restrito e sem significado, tanto para o aluno como para o professor. Em
determinados contextos, essa prática social ainda se encontra aprisionada
na cópia de modelos ou no fazer espontâneo que não privilegia a reflexão,
a fruição e a produção:

[...] uma série de desvios vêm comprometendo o ensino da Arte. Ainda


é comum as aulas de Arte serem confundidas com lazer, terapia, des-
canso das aulas “sérias”, o momento para fazer a decoração da escola, as
festas, comemorar determinada data cívica, preencher desenhos mi-
meografados, fazer o presente do Dia dos pais, pintar coelho da páscoa
e a árvore de Natal. Memorizam-se algumas “musiquinhas” para en-
tender conteúdos de história e “desenhinhos para aprender a contar”.

A partir dos anos 80, constitui-se o movimento de organização de


professores de arte, chamado arte-educação, que permitiu a ampliação
de discussões sobre o compromisso, a valorização e o aprimoramento do

Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012   135


professor, e que se propagassem no Brasil essas mudanças de concepções
de atuação com arte, transmitidas por meio de encontros e eventos,
promovidos por universidades, associações de arte-educadores, entidades
públicas e privadas.
De acordo com Deheinzelin (1995, p. 121), “os artistas celebram o
invisível, percebendo e doando ao mundo o que sabem sobre as coisas, e
não o que vêem na realidade”.
Segundo os Parâmetros Curriculares (BRASIL, 1998), com a
promulgação da Constituição, iniciam-se as discussões sobre a nova Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96, sancionada
apenas em 20 de dezembro de 1996. Convictos da importância de
acesso escolar dos alunos de ensino básico também à área de arte houve
manifestações e protestos de inúmeros educadores contrários a uma das
versões da referida lei que retirava a obrigatoriedade da área.
Com a Lei nº 9.394/96 (BRASIL, 1996), revogam-se as disposições
anteriores e o ensino de Artes é considerado obrigatório na educação
básica: “o ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório,
nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o
desenvolvimento cultural dos alunos” (artigo 23, parágrafo 2º).
Também consta no ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente
(BRASIL, 1990), em seu art. 58: “No processo educacional respeitar-
se-ão os valores culturais, artísticos e históricos do contexto social da
criança e do adolescente, garantindo-se a estes a liberdade de criação e o
acesso às fontes de cultura”. Desse modo, a criança e o jovem têm direito
a um desenvolvimento sadio e completo, devendo o Estado, a família e
a sociedade proporcionar-lhes condições de aprimorar-se e crescer com
liberdade de criação e acesso à cultura.
Percebe-se que a Legislação Educacional, no que se refere à arte,
já contribui para a sua valorização ao incluí-la como obrigatória no
currículo escolar, nas diversas séries da Educação Básica, promovendo
assim, o desenvolvimento cultural dos alunos. Quanto à sua valorização
no cotidiano, caberá aos gestores e professores, durante a sua prática
pedagógica, proporcionarem atividades contextualizadas, que contribuam

  136 Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012


para o avanço do aproveitamento desta disciplina, no âmbito escolar.
Com a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais de
Arte, neste caso, em 1998, teve-se a oportunidade de, na qualidade de
professores, rever-se a própria prática, além de o mesmo contribuir para
a formação continuada dos docentes; fato este que passaria a influenciar,
ainda que minimamente, na produção de materiais e da seleção de recursos
tecnológicos nas aulas.
Em vista disso, este estudo aponta ainda para um maior investimento
na formação do professor, nos materiais disponíveis e nas salas ambientes.
Faz-se necessário que o professor busque os conhecimentos artísticos
necessários para sua área de atuação e isso pode ser feito por intermédio de
cursos de capacitação, chamados de formação continuada, desenvolvida
mediante atividades de estudo e pesquisa planejadas e realizadas como
parte do desenvolvimento profissional, propondo temas que abordem a
arte como uma área do conhecimento, com uma linguagem própria e suas
especificidades, contribuindo para a transformação do comportamento
dos educadores criando estratégias para a evolução de suas competências
e ampliação de seu campo de trabalho, possibilitando a reflexão, a aliança
de teoria e prática e a continuidade. Assim, a formação continuada deve
ser concebida como um processo contínuo que possibilita o profissional
a ter a clareza de como trabalhar com os diversos materiais adequados a
cada faixa etária.
No texto “Compre o kit neoliberal para educação infantil e ganhe
grátis os dez passos para se tornar um professor reflexivo”, a autora
Alessandra Arce traz relevantes ponderações sobre a atual formação de
professores com características neoliberais e pós-modernas. Trata-se de uma
formação aligeirada que não abrange aprofundamento teórico, abstrações
complexas e grandes reflexões, Dentro desse contexto, o professor não
necessita ser um intelectual com uma base teórica e prática fortemente
fundamentada em princípios filosóficos, históricos, metodológicos; [...]
(ARCE, 2001, p. 262). A educação seria encarada como a chave mágica
para o fim da pobreza, dar instrução para o individuo buscar o sucesso e se
não for capaz, fracassar, a culpa é inteiramente do individuo. Pretende-se

Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012   137


a formação do homem competitivo, flexível e que se adapta as exigências
do mercado, através da transmissão de informações, de um saber imediato
e utilitário.
É necessária uma formação docente para além da alfabetização,
do cálculo e de técnicas para o trabalho, formação para a arte, para a
promoção de experiências estéticas significativas. Talvez a formação para
arte seja repelida por ser vista como improdutiva, não gera produtos para
o mercado. A arte na escola é utilizada como uma ferramenta para auxiliar
no desenvolvimento de habilidades para a alfabetização, por exemplo, ou
para a descarga de energias. Não existe arte pela arte.
A seguir, serão abordadas algumas formas de como a arte pode
contribuir para a formação e prática dos educadores de educação infantil.

3 - CONTRIBUIÇÕES DO ENSINO DA ARTE


PARA A FORMAÇÃO CONTINUADA
DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO INFANTIL

O ensino da arte em geral é um dos grandes dilemas da pedagogia


moderna e do professor em sala de aula, pois, geralmente, a formação
acadêmica do docente e as suas limitações podem fazer com que a
execução dessa disciplina não esteja a contento de tal missão. Muitas
vezes, os conteúdos que são oferecidos aos alunos estão isentos de sentido,
fora da realidade, não se sabe onde aplicá-lo e, portanto, torna-se algo
desinteressante. Além disso, o professor procura mais ensinar a técnica
a respeito da interpretação daquilo que o autor quis realmente dizer, ou
seja, o real sentido da obra.
Neste sentido, Almeida (1992, p. 48), em seu livro ”Concepções e
Práticas Artísticas na Escola”, afirma:

A maioria dos professores acredita que desenhar, pintar, modelar, cantar,


dançar, tocar e representar é bom para o aluno, mas poucos são capazes
de apresentar argumentos convincentes para responder “Por que essas
atividades são importantes e devem ser incluídas no currículo escolar?”.

  138 Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012


O que se espera de um professor, quando está trabalhando com
linguagem visual, é que esteja profundamente envolvido com a linguagem
que ensina, que entenda a aquisição da mesma como um processo criativo
e não como adestramento técnico, atue na sala de aula, desenvolvendo
atividades significativas, as quais se relacionem com a realidade dos
alunos, esteja sempre atualizado, possua noções essenciais a respeito do
assunto (o que é arte, como é constituída, qual sua origem, suas funções,
sua historia...), ou seja, como um educador integrado.
Sendo assim, o professor de arte tem a importante tarefa de promover
o sucesso no processo transformador de levar os alunos a melhorarem sua
sensibilidade e saberes prático e teórico em arte. O papel do educador
é também o de intermediar os conhecimentos existentes e oferecer
condições para novos estudos, e isso acontece na forma como interage com
os alunos, na seleção dos materiais para serem trabalhados, na sala de aula,
e no modo como manipula esses materiais, na organização e distribuição
do tempo, espaço e na forma e critérios de avaliação.
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte
(BRASIL, 1998), o professor não pode se ver apenas como transmissor
de conhecimento, porque a mídia e a Internet são cada vez mais eficientes
nessa tarefa, porém, não funcionam como transmissores de valores. Estes
são, hoje em dia, um dos papéis exigidos do educador, que ele seja um
líder, um criador de acontecimentos, dentro e fora da sala de aula, ou seja,
um formador de opinião.
Saber ensinar arte é conhecer, por meio da experiência, concretamente
vivida, quais os desafios, as facilidades, as possibilidades técnicas
encontradas durante o desenvolvimento de criação artística, para que se
possa coordenar, instigar e desafiar com maior eficiência esse processo.
Lanier (1984, p. 54) defende a idéia de que as artes devam estar
presentes no currículo escolar pelos benefícios que apenas elas oferecem à
educação e não por suas contribuições nesses campos de desenvolvimento.
Aponta o autor:

Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012   139


Consequentemente estou sugerindo que avaliemos, o mais obje-
tivamente possível, tudo aquilo que fazemos na sala de aula, e que
reorientemos nossa conduta numa direção que trate mais especifica-
mente da aprendizagem em arte do que do desenvolvimento pessoal
de qualidades não necessariamente relacionados com a arte. Em resu-
mo, estou propondo que, de fato, devolvamos arte a arte-educação.

Fernando Pessoa (1982, p. 218) acrescenta que a função da arte


é aperfeiçoar a subjetividade da vida. Podemos concluir, então, que,
excluindo a arte do currículo, estamos, conseqüentemente, privando os
alunos do aperfeiçoamento de sua própria subjetividade.
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Arte
(BRASIL, 1998, p. 29):

É característica desse novo marco curricular a reivindicação de se


designar a área por arte (e não mais por Educação Artística) e de
incluí-la na estrutura curricular como área com conteúdos pró-
prios ligados à cultura artística, e não apenas como atividade.

A área da arte configura como o lugar da fala dos alunos, em que o


professor presente e atento vai fornecendo os desafios e os recursos para
que esta fala se articule e desenvolva-se com profundidade e coerência.
Segundo Vygotsky (2003, p. 238):

A estrutura comum da educação social está orientada para am-


pliar ao máximo os limites da experiência pessoal restrita, para or-
ganizar o contato da psique da criança com as esferas mais amplas
possíveis da experiência social já acumulada, para inserir a crian-
ça na rede da vida com a maior amplitude possível. Esses objetivos
gerais também determinam os caminhos da educação estética. A
humanidade mantém, através da arte, uma experiência tão enorme
e excepcional que, comparada com ela, toda experiência de criação
doméstica e conquistas pessoais parece pobre e miserável. Por isso,
quando se fala de educação estética dentro do sistema de formação
geral, sempre se deve levar em conta, sobretudo, essa incorporação

  140 Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012


da criança à experiência estética da humanidade. A tarefa e o obje-
tivo fundamentais são aproximar a criança da arte e, através dela, in-
corporar a psique da criança ao trabalho mundial que a humanidade
realizou no decorrer de milênios, sublimando seu psiquismo na arte.

Na educação infantil, o educador enfatiza a educação do olhar,


criando símbolos que expressem o que sentimos e pensamos, para isso é
necessário planejar, orientar e avaliar as atividades, ou seja, é fundamental
o professor ser um observador atento e sensível, ter atitude e disposição
e que esteja aberto a ter um envolvimento emocional com o projeto de
aulas, ou seja, é preciso fazer cursos de capacitação, dedicar mais horas de
treinamento, aperfeiçoar-se sempre.
Iavelberg (2003, p. 12) afirma que:

É necessário que o professor seja um “estudante” fascinado por arte,


pois só assim terá entusiasmo para ensinar e transmitir a seus alunos
a vontade de aprender. Nesse sentido, um professor mobilizado para
a aprendizagem contínua, em sua vida pessoal e profissional, saberá
ensinar essa postura a seus estudantes.

A arte faz parte da herança cultural das sociedades, porém é um grupo


muito pequeno e seletivo de pessoas que têm acesso a museus, exposições,
teatros ou qualquer meio que o aproxime deste universo cultural, por
não existir um incentivo desde cedo e com isso não desenvolverem a
capacidade de serem apreciadores e desfrutarem do que as manifestações
artísticas têm a proporcionar. Então, a escola, e somente ela, em muitos
casos, pode oferecer esse acesso. Com um trabalho significativo com obras
de artistas, novas possibilidades de leitura visual acompanharão as crianças
em suas criações e acontecerá automaticamente o incentivo a visitas em
exposições e museus, onde as crianças têm a oportunidade de refinar
o gosto, a capacidade de leitura de imagem mais criteriosa, construir
representações diversas, aguçar os olhares sobre tudo o que o mundo lhe
apresenta, e entrar em um universo de imaginação, sensibilidade, reflexão
e criatividade. “[...] é na escola que oferecemos a oportunidade para que

Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012   141


crianças e jovens possam efetivamente vivenciar e entender o processo
artístico e sua história [...]” (FERRAZ, 1999, p. 19).
O mundo das artes oportuniza aos alunos, conhecer, explorar, brincar
e desenvolver a cultura infantil no âmbito de uma visão transformadora da
educação, também, o contato com a arte de diversos períodos históricos
e de outros lugares e regiões favorece um vínculo com a realidade e assim
propicia uma cultura de tolerância, de valorização e de respeito mútuo.
A arte pode contribuir para o desenvolvimento afetivo-emocional,
para medir a compreensão da criança de seu mundo e para favorecer o elo
entre a realidade e a fantasia.
A escola deve compreender as aulas de artes visuais como um espaço
de jogo, de experimentação lúdica, em que a criança, por meio da livre
manipulação da linguagem vai construindo um discurso pessoal.
Segundo Albano ( 1999, p. 48):

As artes visuais operam, através das linhas, cores, formas e texturas,


que constituem o seu alfabeto, um dos primeiros que a criança utiliza
para se expressar. Podemos mesmo dizer que é sua primeira escrita,
porque toda criança desenha.

O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil


(BRASIL, 1998) ressalta que as artes visuais devem ser concebidas
como uma linguagem que tem estrutura e características próprias, cuja
aprendizagem, no âmbito prático e reflexivo, se dá por meio da articulação
dos seguintes aspectos: fazer artístico, apreciação e reflexão. O trabalho
contextualizado com obras de arte dá conta de todas essas exigências.
Realizando atividades artísticas, a criança desenvolve auto-estima,
sentimento de empatia, capacidade de simbolizar, analisar, avaliar, e fazer
julgamentos e um pensamento mais flexível, além de desenvolver o senso
estético e as habilidades específicas da área artística, também a capacidade
de expressar melhor suas idéias e sentimentos.
Ferreira (2001, p. 67.) diz:

  142 Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012


[...] a maior de todas as contribuições das artes na educação infantil
e básica para a formação dos alunos seja que, fazendo ou apreciando
artes, os alunos passam por uma experiência estética e aprendem que,
com ela, o mundo pode se tornar mais agradável e mais completo.

Ao analisar desenhos de crianças, pode-se observar muito a respeito


do seu modo de pensar e no que concernem as habilidades que possuem.
Na Educação Infantil, a criança se encontra em fase de pensamento
concreto e explora a utilização dos sentidos para desenvolver e enriquecer
suas experiências. Nesta fase, as atividades artísticas contribuirão com
ricas oportunidades para seu desenvolvimento, uma vez que põem ao seu
alcance os mais diversos tipos de materiais para manipulação.
Quando as habilidades das crianças são estimuladas, ajudam
no processo ensino-aprendizado, pois desenvolvem a imaginação e a
percepção; recursos indispensáveis para a compreensão de outras áreas do
conhecimento humano.
Trabalhar com arte oferece às crianças a oportunidade de desenvolver
sensibilidades que tornam possível o conhecimento estético do mundo
e a expansão do repertório de habilidades e experiências estéticas que
podem ser utilizadas para formar idéias e articular a expressão. Desde
que respaldadas em práticas adequadas de ensino, requeridas para o
desenvolvimento pleno das potencialidades dos alunos.
Na educação infantil, os aprendizes têm a chance de demonstrar seus
sentimentos e emoções, por meio da arte e do movimento artístico, entre
crianças e adultos. A autora citada demonstra que, mediante a experiência,
a criança constrói conhecimentos a respeito da própria arte, cultura
e sociedade, contando com tudo que a escola oferece materialmente e
espacialmente. O lúdico, o teatro, a dança fazem parte desse momento,
tanto quanto a pintura, o desenho, a criatividade, o conto de fadas, em
que elas se expressam, comunicam e transformam a vida na relação com a
arte, ou seja, “Somos potencialmente criadores, possuímos linguagens,
fazemos cultura” (PIRES, 2009, p. 32).

Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012   143


4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

A importância dos educadores de educação infantil compreenderem,


apresentarem e explorarem a arte, como papel indispensável na formação
da educação das crianças, é decisiva para prepará-las para as fases seguintes
da educação.
A arte exerce um papel indispensável na formação da educação das
crianças, à medida que representa as experiências individuais. A criança
passa a utilizar a arte como meio de expressar seus desejos, sonhos, medos
e descobertas. Além disso, a arte desenvolve a sensibilidade, a percepção,
a criatividade e a imaginação, estimula a interação social, desenvolve a
concentração e a atenção, tanto ao desenhar, quanto no entendimento
diante de uma obra de arte, sendo capaz de elaborar diversas concepções,
compreendendo melhor o que realmente a obra apresenta.
Para que o educador possa realizar um bom trabalho em sala
de aula, é preciso que se conscientize que a arte é necessária e é uma
grande ferramenta para o desenvolvimento tanto cognitivo, emocional e
intelectual do aluno.
Atualmente, a comunicação visual é cada vez mais importante
e a escola precisa se adaptar a essa nova realidade. Os professores,
principalmente da rede pública, precisam deixar de se lamentar por
comodismo, por falta de apoio formal da direção das instituições de
ensino, por não ter materiais disponíveis, ou insuficientes para a realização
do trabalho; não precisam ficar presos a visitas, museus ou passeios em
exposições, pois com criatividade e disposição há várias formas de se fazer
e conhecer arte, fazendo remontagens de gravuras, usando técnicas com
os recursos disponíveis, utilizando sucatas, fazendo cópias em tamanho
grande de quadros, criando suas próprias exposições, enfim, mostrando de
forma lúdica o universo da arte, juntamente com os artistas e suas obras.
Trabalhar com as obras de diferentes artistas significa muito mais
que desenvolver o olhar e a sensibilidade de cada indivíduo. Ao desafiar e
vencer as barreiras que são apresentadas para o ensino de artes, o educador
estará contribuindo para que a criança desde sua mais tenra idade possa

  144 Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012


ter oportunidades de observar, experimentar e criticar tudo que há em
seu redor, de modo que possa se apropriar da realidade histórica, social e
cultural da sua vida.
O ensino da arte deve estar em consonância com a contemporaneidade.
A sala de aula deve ser preparada adequadamente para a produção de técnicas
a serem criadas e recriadas, e o processo de criação e experimentação tome
forma de maneira viva, dinâmica e desafiadora. Para que isso aconteça,
é muito importante o educador acreditar que as crianças são criativas e
capazes de construir suas próprias aprendizagens e saberes necessários à
sua formação.
Essa maneira de propor o ensino da arte rompe com as barreiras de
exclusão, em que a prática educativa será embasada na capacidade de cada
um a experimentar e se arriscar a desenhar, pintar, moldar, escrever, pois
se trata de uma vivência e não de uma competição de quem tem talento
ou dom. Dessa forma, o ensino da arte estará intimamente ligado ao
interesse de quem aprende, pois, se reconhecerão como participantes e
construtores de seus próprios caminhos. Assim, a arte fará parte de suas
vidas e terá um sentido, deixando de ser algo incompreensível e elitista,
distante da realidade e o fazer artístico não se limitará ao simples papel
recreativo, mas sim em um instrumento pedagógico que contribui para
o desenvolvimento da criança. Em vista disso, os educadores conseguirão
alcançar seu maior objetivo: o de ensinar com satisfação e certeza de dever
cumprido.

REFERÊNCIAS

ARCE, A. Compre um kit neoliberal para a educação infantil e ganhe


grátis os dez passos para se tornar um professor reflexivo. Educação e
Sociedade, Campinas, SP, v. 22, n.74, abr. 2001.     

ALMEIDA, C.M.C. Concepções e Práticas Artísticas na Escola. In: FERREIRA,


S. (Org.). O ensino das artes: construindo caminhos. Campinas-SP: Papirus,
2001.

Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012   145


BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: São Paulo:
Imprensa
Oficial do estado, 1988.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da educação Nacional. Lei nº 9394, de 20


de dezembro de 1996.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto Secretaria de Educação


Fundamental. Estatuto da criança e do Adolescente no Brasil. Lei n.8069, de
13 de julho de 1990. Brasília: MEC/SEF, 1990.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares


Nacionais: Arte / Secretaria de Educação Fundamental: Brasília: MEC/SEF,
1998.

BRASIL. Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil. Brasília:


MEC/SEF, 1998.

DEHEINZELIN, M. A Fome Com a Vontade de Comer. 2. ed. Rio de Janeiro:


Vozes, 1995.

FERRAZ, M.H.C. de T. Metodologia do ensino da arte. São Paulo: Cortez, 1999.

FERREIRA, S.O. Ensino das Artes: Construindo Caminhos. São Paulo:


Papirus, 2001.
IAVELBERG, R. Para Gostar de Aprender Arte: sala de aula e formação de
professores. Porto Alegre: Artmed, 2009.

LANIER, V. Devolvendo arte à arte-educação. São Paulo: Max Limonad,


1984.

MARTINS, M.C.F.D., PICOSQUE, G. & GUERRA, M. Didática do ensino


da arte: a língua do mundo: profetizar, fruir e conhecer arte. São Paulo: FTD,
1998.

  146 Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012


PESSOA, F. O Livro do Desassossego – por Bernardo Soares. Lisboa: Ática, 1982.

PIRES, E. Proposta Curricular da Educação Infantil. Campinas: Prefeitura


Municipal de Campinas, 2009.

VIGOTSKY, L.S. Psicologia Pedagogia. Porto Alegre: Artmed, 2003.

Title: Contributions to the pedagogical degree and pratice of the “educação


infantil” (kinderganrten) teacher.
Authors: Nilcemara Tanasovici Nardy; Nanci de Almeida Rezende.

ABSTRACT: This paper is intended to, though literature, demonstrate the


theme from the conceptualization of art, in order to realize its acting in the field
of education and child development. To achieve our goal, we start analyzing the
legislation related to kindergarten and then take the history of art education in
schools and the main contributions of the teaching of Art for the continuing
education of the kindergarten teacher.Finally, we approach the value of the
teacher to have a different look at the artistic productions of children and allow
them to be able to rethink their methods and objectives when they are teaching
arts for kids.
Keywords: Art. Education. Development. Painting. Learning.

Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 2, n. 2, p. 131-147, jul./dez. 2012   147

Você também pode gostar