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O ENSINO DE ARTE E A SUA FINALIDADE: EDUCAÇÃO INFANTIL

E ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Andrieli Tochetto1 - UNINTER


Lidiane Gomes dos Santos Felisberto2 - PUCPR

Eixo – Educação, Arte e Movimento


Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

Cada disciplina escolar presente nos currículos escolares possui uma razão específica para ser
contemplada, ou seja, as disciplinas possuem objetivos que devem ser atingidos pelo aluno em
seu processo de formação. Tendo em vista que muitas vezes a disciplina de Arte é considerada
como um momento de recreação ou de passatempo escolar, o presente artigo tem por objetivo
entender a real finalidade do ensino Arte na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental. Considerando como abordagem metodológica a pesquisa qualitativa, esta
investigação privilegiou como fontes de pesquisa os documentos oficiais que norteiam a
construção dos currículos escolares. Neste sentido, foram analisados o Referencial Curricular
da Educação Infantil (BRASIL,1998) e os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte
(BRASIL, 1997) destinados aos Anos iniciais do Ensino Fundamental, ambos elaborados pelo
Ministério da Educação (MEC). Como referenciais teóricos foram consultados autores como
Barbosa (1979; 1991), Fusari e Ferraz (2001), Pallarés (1981), que discutem a Arte no âmbito
educacional. O estudo mostra que a Arte possui objetivos claros e significativos à educação das
crianças. Os segmentos da Arte (Artes Visuais, Dança, Música e Teatro), contemplados no
ensino, possuem finalidades específicas que contribuem para a formação integral do sujeito. O
ensino de Arte permite ao aluno desenvolver aspectos como a sensibilidade, a percepção, a
expressividade, a espontaneidade, a consciência de si, do outro e das diversas culturas. As
análises dos documentos oficiais mostram que o ensino de Arte tem por objetivo desenvolver
aspectos sociais do aluno bem como auxiliá-lo na construção do conhecimento, permitindo-o a
compreender a sua realidade e a tornar-se criativo diante de seus problemas.

Palavras-chave: Disciplina de Arte. Educação. Ensino.

1
Graduanda em Licenciatura em Pedagogia pela Uninter. Licenciada em Artes pela Univel. Pós-graduada em
Metodologia do Ensino de Artes pela Uninter. E-mail: andrielitochetto@hotmail.com
2
Doutoranda em Educação no Programa de Pós Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do
Paraná (PUCPR). Professora na Rede Municipal de Curitiba. Pedagoga pela Secretaria de Educação do Estado do
Paraná. E-mail: lidianegomesdossantos@hotmail.com

ISSN 2176-1396
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Introdução

Desde a era primitiva, nossos ancestrais já utilizavam a arte como expressão do que
vivenciavam na época, registrando nas paredes das cavernas esboços e esquemas de
acontecimentos que ocorriam cotidianamente. Observamos que desde os feitos remotos até a
consolidação da arte como meio de produção e sensibilização na civilização historicamente
desenvolvida, tem-se plena asseveração da importância desse saber para a humanidade.
Neste sentido, este artigo traz reflexões que foram suscitadas durante o Estágio
Supervisionado de Docência na Educação Básica, realizado em um Colégio de Cascavel/PR,
durante o curso de Licenciatura em Pedagogia pela Uninter. Por meio de um projeto de
intervenção, notou-se que os professores que lecionavam Arte sentiam dificuldades em
lecionar, mesmo com auxílio de materiais, sendo que algumas vezes a disciplina foi ministrada
como modo simples de recreação.
É com o objetivo de entender a real finalidade do ensino Arte na Educação Infantil e
nos Anos iniciais do Ensino Fundamental que este artigo é produzido. A partir da perspectiva
qualitativa, traremos a análise de documentos oficiais que norteiam a construção dos currículos
escolares. No transcorrer das páginas, traremos as orientações contidas no Referencial
Curricular da Educação Infantil (BRASIL, 1998) e nos Parâmetros Curriculares Nacionais –
Arte (BRASIL, 1997), ambos da Secretaria de Ensino Fundamental (MEC). Ainda, estão
presentes no texto, autores que discutem a Arte no âmbito educacional como Barbosa (1979;
1991), Fusari e Ferraz (2001), Pallarés (1981), entre outros.

A Arte e a Educação

Conforme Fusari e Ferraz (2001), o representar, por meio da arte, é sinônimo de


expressão que permite orientar e ressignificar situações diárias, de maneira menos alienada,
mais crítica e sensibilizada. Assim, a arte age como formadora de mentes pensantes,
possibilitando que qualquer cidadão que tenha acesso ou pratique algum meio artístico, consiga
observar e analisar profundamente os fatos grupais e individuais, mostrando a relevância que
cada um deve configurar dentro da sociedade.
A Arte, enquanto disciplina escolar abrange os segmentos de Artes Visuais, Dança,
Música e Teatro (BRASIL, 1997). Nessas quatro áreas há inúmeras possibilidades de conteúdos
permitindo ao aluno exprimir-se, manifestar-se, comunicar-se e desenvolver-se por meio da
fruição alcançada com os estudos. A partir de estudos históricos, práticos e técnicos, a práxis
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educativa transforma-se em constante incentivador do desenvolvimento dos educandos.


Conforme Barbosa, isso permite analisar “a ideia de que a Arte na educação tem como
finalidade principal permitir que a criança expresse seus sentimentos e a ideia de que a Arte não
é ensinada, mas expressada”. (1979, p.46).
Na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, o uso do ensino de Arte
se faz de maneira imaginativa, envolvente e estimuladora, buscando instigar a criatividade e a
capacidade de criar e inventar das crianças. De acordo com os Parâmetros Curriculares
Nacionais:

O conhecimento da arte abre perspectivas para que o aluno tenha uma compreensão
do mundo na qual a dimensão poética esteja presente: a arte ensina que é possível
transformar continuamente a existência, que é preciso mudar referências a cada
momento, ser flexível. Isso quer dizer que criar e conhecer são indissociáveis e a
flexibilidade é condição fundamental para aprender. (BRASIL, 1997, p. 19)

Neste sentido, enquanto professor é preciso compreender que os processos e evoluções


são mais relevantes que o resultado final. Sendo assim, deve ser desconsideradas perspectivas
e exigências por grandes produções artísticas, e ponderar a importância de “desenvolver a
capacidade de formular hipóteses, julgar, justificar e contextualizar julgamentos diferentes
acerca de imagens e de Arte”. (BARBOSA, 1991, p.64).
O ensino de Arte traz contribuição ao âmbito social, no sentido de possibilitar à criança
compreender o ambiente em que vive, ampliar o conhecimento cultural e aprender a viver em
sociedade de maneira atuante. Conforme Fusari e Ferraz “a arte se constitui de modos
específicos de manifestação da atividade criativa dos seres humanos ao interagirem com o
mundo em que vivem, ao se conhecerem e ao conhecê-lo” (1999, p. 16).
Os PCNs indicam a contribuição no âmbito social por meio do conhecimento da arte de
outras culturas. Segundo o documento, isso permite ao aluno compreender “a relatividade dos
valores que estão enraizados nos seus modos de pensar e agir, que pode criar um campo de
sentido para a valorização do que lhe é próprio e favorecer abertura à riqueza e à diversidade
da imaginação humana” (BRASIL, 1997, p. 19). Do mesmo modo, possibilita ao aluno perceber
a sua realidade de modo mais vivo, reconhecer as formas e objetos que estão à sua volta e
exercitar a observação crítica de sua própria cultura, criando condições para uma melhor
qualidade de vida (BRASIL, 1997).
O aluno que tem uma sólida base artística dentro da escola, sendo este o lugar que
frequenta e participa grande parte de sua vida, torna-se mais sensível ao observar as mais
diversas situações e aprende a refletir de forma mais ampla, dando sentido às inúmeras
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informações que tem aproximação. É neste sentido que o ensino de Arte vem contribuir com as
demais disciplinas, pois permite ao aluno absorver e dialogar, opinar e fazer com que suas ideias
não se bastem somente em senso comum, mas pela frenética procura de dados, que constatem
e afirmem a veracidade dos fatos.
As Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Paraná consideram a Arte e seu
ensino como um amplificador de conhecimento, como se verifica no trecho a seguir:

A Arte é fonte de humanização e por meio dela o ser humano se torna consciente da
sua existência individual e social; percebe-se e se interroga, é levado a interpretar o
mundo e a si mesmo. A Arte ensina a desaprender os princípios das obviedades
atribuídas aos objetos e às coisas, é desafiadora, expõe contradições, emoções e os
sentidos de suas construções. Por isso, o ensino da Arte deve interferir e expandir os
sentidos, a visão de mundo, aguçar o espírito crítico, para que o aluno possa situar-se
como sujeito de sua realidade histórica. (PARANÁ, 2008, p. 56).

A Arte tem por objetivo promover uma educação humanizadora e transformadora,


construindo formadores de opinião, se trabalhada e atribuída corretamente a cada faixa etária
com atividades e exercícios expressivos e estimulantes. Porém, nota-se que a educação em Arte,
mesmo inserida há tempos nos currículos escolares, ainda não é trabalhada de maneira
apropriada, tanto por se ponderar que é uma ocasião para recreação, quanto pela própria
preparação dos professores.
Nesta mesma perspectiva, os Parâmetros Curriculares Nacionais salientam que o ensino
de Arte favorece o relacionamento do aluno com as outras disciplinas do currículo,
exemplificando que:

O aluno que conhece arte pode estabelecer relações mais amplas quando estuda um
determinado período histórico. Um aluno que exercita continuamente sua imaginação
estará mais habilitado a construir um texto, a desenvolver estratégias pessoais para
resolver um problema matemático. (BRASIL, 1997, p. 19)

É neste sentido que a disciplina de Arte não pode ser vista como um momento de
entretenimento ou recreação. Como as demais disciplinas do currículo, em Arte existem
objetivos a serem alcançados por meio de métodos que visam o aprendizado. Os PCNs,
reconhecendo as dificuldades enfrentadas pelos professores polivalentes, afirmam que:

Sem uma consciência clara de sua função e sem uma fundamentação consistente de
arte como área de conhecimento com conteúdos específicos, os professores não
conseguem formular um quadro de referências conceituais e metodológicas para
alicerçar sua ação pedagógica; não há material adequado para as aulas práticas, nem
material didático de qualidade para dar suporte às aulas teóricas. (BRASIL, 1997, p.
26)
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Desta maneira, o professor que leciona Arte, mesmo não tendo a formação específica,
deve buscar conhecimentos que lhe dê suportes à sua prática educativa, devido à relevância
desta disciplina na vida dos alunos.
É necessário provocar e despertar nos alunos querer algo além do que é desenvolvido
em sala de aula, tendo em vista uma nova forma de observar as mais variadas situações, até
mesmo fora do ambiente escolar. Estas observações precisam servir de estímulo e levar à
fruição livre dos pensamentos com criatividade, diante de diversas linguagens artísticas. Como
afirma as Diretrizes do Paraná:

O ensino de Arte deve basear-se num processo de reflexão sobre a finalidade da


Educação, os objetivos específicos dessa disciplina e a coerência entre tais objetivos,
os conteúdos programados (os aspectos teóricos) e a metodologia proposta. Pretende-
se que os alunos adquiram conhecimentos sobre a diversidade de pensamento e de
criação artística para expandir sua capacidade de criação e desenvolver o pensamento
crítico. (PARANÁ, 2008, p.52).

Os alunos devem ser guiados a relacionar-se com a arte, na qual esta interfira em seus
pensamentos e hábitos simples, elevando-os a algo criador. A partir do momento em que se
compreendem conceitos estéticos, ocorre uma transformação na capacidade de ver, observar,
descobrir e analisar os fatos, tornando cada momento de formação humana. Com isso, surgem
novas mentes pensantes, dispostas a adentrarem em mundos diferentes do que estão habituados,
de enfrentar desafios e posicionar-se com determinação, procurando caminhos que se
desloquem a uma conclusão coerente e abrangente.
As autoras Fusari e Ferraz afirmam que é necessário pensar em “um trabalho escolar
consistente, duradouro, no qual o aluno encontre um espaço para o seu desenvolvimento pessoal
e social por meio da vivência e posse do conhecimento artístico e estético” (2001, p. 21).
Continuam afirmando que isso “requer uma metodologia que possibilite aos estudantes a
aquisição de um saber específico, que os auxilie na descoberta de novos caminhos, bem como
na compreensão do mundo em que vivem e suas contradições” (IDEM).
Compete então, ao professor responsável pelas aulas de Arte, mediar e atrair a vontade
pela busca e pela pesquisa, despertando a curiosidade, difundindo novos elementos, indagando
e gerando dúvidas, que deixem os alunos instigados e inquietos por respostas, gerando assim
uma vasta construção de conhecimento. Essa curiosidade deve ser guiada até que se torne
objetiva, não sendo somente ingênua ou de senso comum, mas aprimorada, com o professor
mostrando caminhos e dando livre arbítrio para que o aluno exprima as suas próprias
manifestações, permitindo ao educando opinar e atuar como cidadão crítico.
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Assim sendo, o papel do professor é o de:

Valorizar o repertório pessoal de imagens, gestos, “falas”, sons, personagens, instigar


para que os aprendizes persigam ideias, respeitar o ritmo de cada um no despertar de
suas imagens internas são aspectos que não podem ser esquecidos pelo ensinante de
arte. Essas atitudes poderão abrir espaço para o imaginário. (MARTINS; PICOSQUE;
GUERRA, 1998, p. 118)

Estas discussões permitem concluir que a Arte deve ser colocada como disciplina
formadora de opinião, pela qual os conteúdos trabalhados não se resumam a meros desenhos,
trabalhos manuais, ou cantigas e representações sem sentido. Ao contrário disto, a Arte deve
propiciar que cada situação apresentada gere diálogo e discussões, permitindo ao aluno expor
o que pensa e interagir com o grupo, trocando informações, ideias e socializando, além de ser
instigado a refletir e raciocinar sobre manifestações simples e complexas. Sempre respeitando
a idade e o nível de desenvolvimento do aluno, o professor deve buscar dar significação e
conjunção de forma única e pessoal ao conteúdo exposto, permitindo que isso seja debatido e
que todos tenham direito e oportunidade de opinar e defender suas convicções, ponderando a
igualdade entre todos. Fusari e Ferraz atentam para o fato de que esse tipo de prática pedagógica
é:

Na verdade, um movimento educativo e cultural que busca a constituição de um ser


humano completo, total, dentro dos moldes do pensamento idealista e democrático.
Valorizando no ser humano os aspectos intelectuais, morais e estéticos, procura
despertar sua consciência individual, harmonizada ao grupo social ao qual pertence.
(2001, p. 19)

Todas e quaisquer manifestações artísticas levadas aos alunos devem aguçar os seus
sentidos, incentivando-os a tornarem-se seres criadores. Segundo Freinet, “a livre expressão
facilita a criatividade da criança, no desenho, na música, no teatro, extensões naturais da
atividade infantil, progressivamente responsável por seus comportamentos afetivos, intelectuais
e culturais“ (apud SAMPAIO, 1994, p. 30).
Com as discussões até aqui expostas, verifica-se nos documentos oficiais e nos
referencias teóricos que a disciplina de Arte não é um passatempo escolar, mas se constitui
como formadora de personalidade, contribuindo para o desenvolvimento perceptível e crítico
do sujeito. A seguir discutiremos de que maneira os eixos de Arte são entendidos pela
legislação educacional e em que medida estes auxilia no desenvolvimento do aluno,
demonstrando que cada segmento possui uma finalidade própria.
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O ensino de Arte e a sua finalidade a partir de seus segmentos

Assim como em qualquer outra disciplina do currículo escolar, Arte também exige
planejamento. O planejamento das aulas é um dos quesitos fundamentais para o sucesso do
professor no aprendizado dos seus alunos, pois, é através dele que se percebem os erros e acertos
de suas aulas, além de possibilitar adaptações às formas de ensinar, conforme o aproveitamento
da turma e do indivíduo. A partir dessa análise, o professor pode também se autoavaliar,
observando e levantando suposições, buscando melhorar e proporcionar aos alunos um melhor
aprendizado, além da satisfação pelo que faz. Nas palavras de Zabala, o planejamento é:

Um conhecimento e uma reflexão sobre os possíveis modelos, uma análise e uma


avaliação das normas, uma apropriação e elaboração do conteúdo, que implica a
análise dos fatores positivos e negativos, uma tomada de posição, um envolvimento
afetivo e uma revisão e avaliação da própria atuação. (1998, p. 48)

Para que os conteúdos e atividades possam ser planejados, se faz necessária a prática da
pesquisa. A pesquisa inicia no momento em que o professor estuda o currículo, sente as
necessidades dos seus alunos e busca entendimento e suporte para apresentar novos
conhecimentos. Para Paulo Freire todo professor é um pesquisador, afirmando que “faz parte
da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa” (1996, p.32), porém, é
necessário que o professor se reconheça como tal para estar em formação permanente.
Fusari também reafirma a importância do planejamento ao dizer que “nada substitui a
tarefa de preparação da aula em si” (2008, p. 47). O planejamento, segundo a autora, é uma
competência teórica do professor que busca meios de adequação pelos quais a sua turma terá
mais facilidade e interesse pelo assunto, pensando também nas formas mais compatíveis de
assimilação e apreensão dos contextos visualizados.
É fato que tudo começa pelo senso comum, pela cultura que cada um traz em sua
bagagem pessoal ou pela curiosidade ingênua. Este é o ponto de partida da aprendizagem e
deve ser encarado pelo professor como uma oportunidade para uma nova busca pelo saber,
tornando o conhecimento ou acontecimento comum em um questionamento a ser sanado.
Partindo deste ponto, a criança passa a absorver e a entender mais informações a respeito do
que procura, o que torna essa curiosidade ingênua em curiosidade intelectual, daí o aprendizado.
As aulas de Arte para a Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental devem
partir da soma da ludicidade com a instigação do interesse do aluno pelo conteúdo apresentado.
É a união destes fatores que podem gerar no aluno a vontade pela prática, fazendo com que
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formule argumentos e questionamentos. Trata-se em instigar a curiosidade dos alunos para


motivar a capacidade criadora. Segundo Freire:

A curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de


algo, como pergunta verbalizada ou não, como procura de esclarecimento, como sinal
de atenção que sugere e alerta faz parte integrante do fenômeno vital. Não haveria
criatividade sem a curiosidade que nos move e que nos põe pacientemente impacientes
diante do mundo que não fizemos, acrescentando a ele algo que fazemos. (FREIRE,
1996, p. 18).

Neste sentido, o professor deve agir como mediador, estimulando o diálogo e práticas
artísticas como expressividade e fruição dos pensamentos, a fim de que o aluno chegue a um
senso de conhecimento e aprendizado. As ideias devem ser colocadas e a partir disso, deixar o
educando exprimir o que sente e consequentemente causar uma movimentação na mente,
considerando a possibilidade de participação e as particularidades de cada indivíduo. Freire,
neste mesmo sentido, já relatava:

Quando estou diante de uma platéia de estudantes, nem sempre se trata de convencê-
los ou de mostrar que sua idéia x ou y é errada e, consequentemente, que a minha seria
a certa. Ao explicitar a minha ideia, trata-se mais de fazer com que eles percebam em
que medida as deles, que partem das suas próprias práticas, se assemelham às minhas,
quando é o caso, ou divergem das minhas. (1996, p. 71)

No planejamento das aulas de Arte, o professor precisa levar em conta os quatro


segmentos da arte, já citados anteriormente (Artes Visuais, Dança, Música e Teatro),
considerando que todos são de grande importância e que com suas peculiaridades conseguem
promover a expressão e a autonomia dos alunos. Além disso, é preciso considerar a faixa etária
e o desenvolvimento dos alunos, apresentando atividades dinâmicas adaptadas ao nível em que
cada turma se encontra. Mesmo sendo alunos pequenos, dentro de suas possibilidades
perceptivas, eles conseguem apreender os conteúdos e refletir sobre aquilo que produzem.
Acerca disso, Martins, Picosque e Guerra afirmam que a “arte é a linguagem básica dos
pequenos e deve merecer um espaço especial, que incentive a exploração, a pesquisa, o que
certamente não será obtido com desenhos mimeografados e exercícios de prontidão” (1998, p.
102).
Nas Artes Visuais, é importante salientar que os objetivos principais são aguçar a
imaginação, o conhecimento e a sensibilidade das crianças, por meio de obras de artistas
conceituados e pelos desenhos e pinturas criados na escola. Isso os incentiva a serem mais
criativos e posicionados, sabendo opinar e reconhecer os seus lugares no mundo. Segundo
Moreno:
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A construção da capacidade de criação na infância é uma forma da criança manifestar


a sua compreensão da realidade que o cerca, de exercitar sua inteligência ao criar,
alterar, organizar e reorganizar elementos plásticos, é uma construção do ser humano.
Na sua interação com o mundo, ela vivencia inúmeros contatos com experiências
estéticas que envolvem ideias, valores e sentimentos, experiências estas que envolvem
o sentir e também o pensar e o interpretar. Portanto a linguagem visual faz parte da
formação integral do indivíduo e não pode ser desconsiderada no contexto da
educação infantil. (2007, p.44)

Infelizmente, ainda nem todas as escolas desenvolvem um trabalho conveniente em


matéria de arte. O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) indica
que há “um descompasso entre os caminhos apontados pela produção teórica e prática
pedagógica existente” (BRASIL, 1998, p. 87). Não considerando a relevância que a Arte possui
no desenvolvimento humano, muitos professores a consideram apenas como um mero
passatempo. O documento revela que “atividades de desenhar, colar, pintar e modelar com
argila ou massinha são destituídas de significados” (IDEM), quando não, “outra prática corrente
considera que o trabalho deve ter uma conotação decorativa, servindo para ilustrar temas de
datas comemorativas, enfeitar as paredes com motivos para os pais, etc.” (IDEM). Neste ultimo
caso, os Referenciais apontam que “é comum que os adultos façam grande parte do trabalho,
uma vez que não consideram que a criança tem competência para elaborar um produto
adequado” (IDEM).
Já para o Ensino Fundamental, os PCNs (BRASIL, 1997) indicam que no trabalho de
Artes Visuais devem se relacionar aos conteúdos e às experiências os materiais, as técnicas e
as formas visuais de diferentes momentos históricos. Precisam ser considerados diferentes tipos
de visualidades, como as tradicionais (a pintura, a escultura, o desenho, etc.) e também as
contemporâneas advindas dos avanços tecnológicos, como a fotografia, o cinema e a televisão.
Segundo o documento, “a escola deve colaborar para que os alunos passem por um conjunto
amplo de experiências de aprender e criar, articulando percepção, imaginação, sensibilidade,
conhecimento e produção artística pessoal e grupal” (BRASIL, 1997, p. 45).
Quanto à Dança, este é o segmento que unifica o pensar, o sentir e o movimento do
corpo, fazendo com que a criança situe-se no espaço, note as suas limitações e possibilidades,
desenvolvendo o aspecto motor, a concentração e a espontaneidade. A dança permite que a
criança se torne mais desinibida e participativa individual ou coletivamente, desenvolvendo a
autonomia e o reconhecimento e respeito pela diversidade. Segundo Ávila e Silva, o ritmo,
exigido na dança, “leva a ordenação do pensamento, e suas características de organização do
tempo exigem das funções cerebrais maior agilidade e maior presteza” (2003, p.78). Assim, os
PCNs afirmam que “a ação física é necessária para que a criança harmonize de maneira
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integradora as potencialidades motoras, afetivas e cognitivas” (BRASIL. 1997, p. 49),


complementando que a escola ao possibilitar o entendimento do corpo, leva o aluno a “usá-lo
expressivamente com maior inteligência, autonomia, responsabilidade e sensibilidade”
(IDEM).
O segmento da Música permite aos alunos momentos de interação e sensibilização
emocional, ativando a criatividade e o entendimento da realidade e do próprio ser em si, além
da compreensão da atividade social na qual está inserido. Para Nogueira, a referência musical:

Acompanha os seres humanos em praticamente todos os momentos de sua trajetória


neste planeta. E, particularmente nos tempos atuais, deve ser vista como umas das
mais importantes formas de comunicação [...]. A experiência musical não pode ser
ignorada, mas sim compreendida, analisada e transformadas criticamente. (2003,
p.01)

A prática musical na escola pretende oportunizar à criança “vivências de tempo, duração


de sons, por meio do acento dos movimentos, utilizando deslocamentos naturais, canções,
percussão com instrumentos ou utilizando o próprio corpo, palavras e frases ritmadas”
(PALLARÉS, 1981, p. 10). Isso, segundo Pallarés (1981), proporciona aos alunos desenvolver
a afetividade, aguçar a capacidade de entender e reagir a mudanças e obter aprimoramentos na
percepção, na comunicação e na atenção.
A música objetiva propiciar e oportunizar o desenvolvimento dos alunos,
desconsiderando as ações mecânicas que ocorrem ao se fazer uso de cantigas infantis
conhecidas e decoradas para ocasiões peculiares da rotina escolar. Mais do que um simples
“cantarolar”, o segmento da Música deve se constituir de atividades planejadas e
contextualizadas com finalidades concretas. Os PCNs destacam que todos os alunos precisam
“participar ativamente como ouvintes, intérpretes, compositores e improvisadores, dentro e fora
da sala de aula” (BRASIL, 1997, p. 54). Afirmam ainda que a partir do segmento musical, “a
escola pode contribuir para que os alunos se tornem ouvintes sensíveis, amadores talentosos ou
músicos profissionais” (IDEM). Do mesmo modo que ao incentivar a participação de eventos
culturais que envolvem a música “pode proporcionar condições para uma apreciação rica e
ampla onde o aluno aprenda a valorizar os momentos importantes em que a música se inscreve
no tempo e na história” (IDEM).
No segmento do Teatro, para que as expressões teatrais aconteçam, é necessário que o
indivíduo libere “a sua presença de forma completa: seu corpo, sua fala, seu gesto, manifestando
a necessidade de expressão e comunicação” (BRASIL, 1997, p. 57). Com o objetivo de que o
teatro ocorra dentro da sala de aula, existe a necessidade de observar se a criança se adapta e
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sente atração pela atividade, pois, mesmo sendo um exercício de interação, pode persistir a
inibição em participar. Havendo desconforto, deve-se então, ser trabalho lentamente o
envolvimento de cada um. De início, é interessante inserir jogos teatrais e improvisos, que são
espontâneos e considerados também como brincadeiras, além da contação de histórias, que
envolve interação e não leva a nenhuma necessidade de exposição, mas somente de expressão.
Conforme a evolução, tanto de faixa etária quanto de desenvoltura e sociabilidade,
surgirão na prática teatral o cumprimento de regras e uma nova visão coletiva, ensinando
também a contribuição da ação grupal. A partir disso, amparado em imaginações, saberes e
emoções, o teatro promove aos alunos a análise e a compreensão de si próprios e de outros com
quem convive além da percepção de sentimentos e valores, sendo que cada um se exprime nos
próprios personagens que interpreta, mesmo sem a real intenção.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais, afirmam que o ensino teatral permite ao aluno:

Exercitar suas capacidades cognitivas, sensitivas, afetivas e imaginativas, organizadas


em torno da aprendizagem artística e estética. Ao mesmo tempo, seu corpo se
movimenta, suas mãos e olhos adquirem habilidades, o ouvido e a palavra se
aprimoram, enquanto desenvolve atividades nas quais relações interpessoais
perpassam o convívio social o tempo todo. (BRASIL, 1997, p. 114)

Conforme podemos verificar, o ensino de Arte, com seus segmentos, possibilita o


desenvolvimento de diferentes aptidões necessárias à vida do ser humano. É neste sentido que
reiteramos a importância de a escola servir como base artística e dispor aos alunos aulas de Arte
pautadas nas propostas curriculares dos documentos nacionais, dispondo de um ambiente
propício às práticas artísticas.
Considerando que a vida escolar é um dos fatores mais influentes para a evolução da
criticidade nos alunos e que o conhecimento adquirido na escola reflete significativamente nos
cidadãos e na sociedade, a Arte, com todas as contribuições advindas das finalidades de seus
segmentos, já discutidos anteriormente, não pode passar despercebida do contexto do ensino e
da educação.

Considerações Finais

Este artigo, que teve por objetivo entender a finalidade do ensino Arte na Educação
Infantil e nos Anos iniciais do Ensino Fundamental, apontou que existem objetivos sólidos
pelos quais a Arte é importante à educação das crianças e não se faz presente nos currículos
para ser recreação ou passatempo.
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Conforme os referenciais teóricos e os documentos oficiais analisados, a Arte se


constitui importante disciplina no currículo escolar. Seu ensino possui finalidades claras e
significativas à educação das crianças, visando desenvolver os aspectos sociais do aluno bem
como auxiliá-lo na construção do conhecimento. A Arte permite à criança compreender o
ambiente em que vive, reconhecendo os objetos e formas que estão ao seu redor; a ampliar o
conhecimento sobre outras culturas, exercitando a observação crítica de sua própria realidade;
a se relacionar, interagir e se posicionar de maneira crítica e criativa diante de seus problemas
e da sua realidade.
Referente ao ensino, o estudo indica que, como em qualquer outra disciplina, há
necessidade que o professor planeje suas aulas. Se for o caso de ser professor polivalente, sem
formação específica em Arte, precisa dedicar-se em buscar conhecimentos que lhe dêem
suportes à sua prática educativa, levando em consideração a sua relevância na formação dos
alunos.
O artigo refletiu ainda sobre os quatro segmentos da Arte que devem ser levados em
conta nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. O estudo mostrou que cada segmento tem
objetivos específicos que contribuem para a formação integral do sujeito. As Artes Visuais
desenvolvem no aluno a percepção, a imaginação, a sensibilidade, o conhecimento e a produção
artística. A Dança permite ao aluno a consciência sobre seu corpo e o espaço, desenvolve a
concentração, a expressividade, a inteligência, a autonomia e a espontaneidade. O segmento da
Música desenvolve aspectos como a interação, a criatividade, a atenção, a apreciação e a
valorização de repertórios. Já o Teatro, exercita capacidades cognitivas, sensitivas, afetivas,
aprimoram o ouvido e a palavra e promovem relações e atividades interpessoais.
Diante do exposto, conclui-se que a Arte deve ser colocada como disciplina formadora
de opinião, pela qual os conteúdos trabalhados não se resumam a meros desenhos, trabalhos
manuais, ou cantigas e representações sem sentido. Todas e quaisquer manifestações artísticas
levadas aos alunos devem aguçar os seus sentidos, incentivando-os a tornarem-se sujeitos
pensantes e criadores.

REFERÊNCIAS

ÁVILA, M. B.; SILVA, K. B. À. A música na educação infantil. In: NICOLAU, M. L. M;


DIAS, M. C. M (orgs). Oficinas de Sonho e Realidade: Formação do educador da infância.
Campinas: Papirus, 2003.
11160

BARBOSA, A. M. T. B. A Imagem no Ensino da Arte. São Paulo: Editora Perspectiva,


1991.

BARBOSA, A. M. T. B.. Teoria e Prática da Educação Artística. 3. ed. São Paulo: Cultrix,
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