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SURGE A IDÉIA DE JUSTIÇA

Ir.’. Charles Evaldo Boller

Pode-se especular que a intuição de justiça e direito surgiu nas cavernas de


nossos ancestrais pré-históricos, quando da descoberta do fogo, o que lhes
aumentou o tempo em que ficavam acordados. Ao iluminarem as cavernas
obtiveram mais tempo de convivência ativa. Com isto afloraram vantagens
estratégicas. Tiveram mais tempo para planejar e trocar experiências, bem como de
contar estórias e transmitir informações vitais para a sobrevivência. Dessa dinâmica
social a espécie tornou-se poderosa, transformou o homem num ser social por
excelência. Da convivência forçada nas horas de escuridão fora das cavernas surgiu
a condição ideal para tornar o homem superior aos outros animais que compartilham
a biosfera. Descobriu-se nesta época que o amor fraterno, a energia emocional que
une fraternalmente os seres vivos, é o único meio das ações humanas interagirem
de forma positiva com seus semelhantes, permitindo obter assistência colaboradora
de uns para com os outros. E isto grandes pensadores vem repetindo através das
eras. Infelizmente, poucos entendem por que devem adaptar-se na adoção deste
proceder benéfico e persistem a sugar a energia vital do meio ambiente e de seus
semelhantes até a exaustão.

É devido a inteligente dedução efetuada pelo morador das cavernas que o


benefício do amor transmitiu-se pelas gerações e cada um já nasce com uma
intuição natural de direito e Justiça, denominado propriamente de direito natural.
Esta noção, este inatismo, precede todo e qualquer código compilado de leis. Desde
que livre e independente, o homem possui direitos inalienáveis: respeito;
desenvolvimento da personalidade; igualdade; trabalho; evolução; liberdade;
associação; legitima defesa; e outros. É da consciência humana que floresce o
direito natural. A Justiça está alicerçada nos deveres e direitos naturais do homem e
o auxiliam em seu relacionamento social, fazendo-o manter seu equilíbrio em
relação aos outros, impedindo-o de ser uma besta, humanizando-o.

O problema é que sempre que um recurso se restringe, aumenta a


concorrência que leva uns a desconfiarem dos outros. Principalmente na escassez
de comida, segurança e sexo. A convivência forçou os vetustos homens a conviver
em espaços estreitos, já que a noite não lhes era possível sair de sua toca devido à
escuridão reinante, o que instigou disputas por melhor espaço, a fêmea melhor
dotada ou o melhor pedaço de comida. Mas o verdadeiro fundador da sociedade civil
certamente foi aquele ancestral que, cercando um pedaço de terra, àquela área
associou o pensamente de posse: "isso é meu"! Acabou a paz do homem nativo,
que vivia em equilíbrio com a natureza, que desfrutava do direito natural, que
descansava sua cabeça em qualquer lugar, ao abrigo de qualquer arbusto, sem
problemas de impacto ambiental, sem necessidade de correr, salvo para defender-
se de algum predador. Um dia era como o outro e o tempo transcorria sem maiores
situações de estresse. A tendência de reservar um espaço de chão para fixar
morada é explorada ao extremo em nossa sociedade moderna; são edificados
"caixotes", uns sobre os outros, amontoados. Isto gera problemas de relacionamento
entre pessoas, violência, porque sempre existe aquele que, por uma razão ou outra,
não paga as taxas de condomínio, ou então perturba a paz de seus vizinhos com
ruídos ou provocações. E num país como o Brasil - que é só terra - existe uma
espécie de invasor de terras que se denomina um "sem terra". No transito de
automóveis é possível perceber a violência como resultado da concorrência: é só
aumentar o número de veículos que transitam numa mesma via para imediatamente
surgirem situações onde um "apressadinho" ou um mais ansioso colocar em risco a
vida de outros motoristas, a sua própria, de pedestres ou causa dano ao patrimônio
público. Mas a grande campeã de disseminação de violência de hoje é a falta de
oportunidades e a desigual distribuição das riquezas. Quando não há disputa ou
concorrência, a vida em grupo é suave, tranqüila, e nesta forma natural de
convivência quase não há necessidade de a sociedade punir pela coerção social.
Quando a distribuição dos recursos e oportunidades é igualitária não ocorrem
eventos "sociopáticos" significativos, salvo nos casos de insanidade.

A sociedade não deve punir para vingar, sua obrigação é a de ensinar o


homem a melhorar cada vez mais. O que se deduz da vida em sociedade real de
hoje, é que ela não ama seus componentes, embrutecida e insensibilizada pela
ganância e o poder, tornou-se subserviente à economia e espreme a todos até
sobrar apenas bagaço.

O conhecimento de como surge e se aplica justiça com equidade é uma


noção muito importante que o maçom desenvolve para melhorar a si mesmo e a
coletividade. Da correta interpretação do que é justiça, diferenciando-a de vingança,
ele extrai as diretrizes básicas de seu relacionamento com irmãos e visinhos. Cada
maçom é conduzido a desenvolver seu conhecimento para utilizar intuitivamente do
direito natural, sem a necessidade de lei escrita. Em se tratando de um ser fraterno,
o pedreiro especulador sonda todas as possibilidades de buscar o equilíbrio da
justiça, desaparecendo a necessidade de um juiz que lhe dite o que é direito. Ele
usa do direito natural que reside em seu intelecto, voltado para o amor. É a lei do
amor que define o direito natural. Esta suprema lei conduz a tomar para si apenas o
que é de seu direito e estrita necessidade, sem invadir o direito do outro. Não há
necessidade de justiça aplicada por um terceiro porque não chega nem a surgir
evento que lhe dê razão de existir. Esta noção é muito simples se vista com o
coração. Existe um ditado que diz: se todos varrerem a frente de suas casas a
cidade fica limpa num instante. De forma parecida é com o direito natural; se cada
um apenas utilizar o que precisa para sua subsistência há recursos para todos na
cidade.

Entretanto, a sociedade não vive assim. Infelizmente o homem insiste teimosa


e estultamente em avançar sobre o que é de direito do outro. É um animal que tem
uma inclinação instintiva em demarcar território, dominar seus iguais em busca do
poder e possuir muito mais coisas do que realmente precisa. Daí a necessidade da
instituição das leis para acalmar a fera. Na aplicação da Justiça, as leis tornam-se
tanto ou mais cruéis que a ações que lhe deram causa. Isto porque normalmente é o
mais rico que dispõe mais de aplicação e desfruta de suas benesses; o ladrão de
galinhas vai preso enquanto o ladrão de "colarinho branco" anda solto. Uma Justiça
que tarda não é justiça. Uma justiça corrupta é pior que a selvageria de uma terra
sem leis. E como o jogo de interesses cresce em graus de complexidade
proporcional ao número de cidadãos que formam uma sociedade, as leis vão se
complicando e embaralhando cada vez mais até ficar impossível aplicar a justiça
com equidade e a comunidade explode atos de vinganças e guerras.

É nisto que a Maçonaria trabalha usando de simbologia simples como o


mosaico, a corda de oitenta e um nós, a trolha, o esquadro, o nível, o compasso, e
outros; tudo para transmitir o direito natural e levar seus adeptos a intuírem que sem
igualdade de direitos a sociedade humana desaparece. A Maçonaria ensina a todos
a serem prudentes, haja vista que sob certos aspectos a prudência é sinônimo de
sabedoria. O exercício começa dentro dos templos, onde cada irmão é induzido a
tratar o outro com respeito e igualdade. Onde o direito natural falha, o problema
judicativo é tratado em câmara do meio, não sem antes se haverem esgotado todos
os recursos de conciliação e dado todo o tempo possível para firmar acordo pelas
diretivas do amor fraterno. De lá a experiência é levada para fora dos templos; ao
escritório, em casa e todos os lugares por onde uma pessoa assim formada passa. A
intenção é transformar cada maçom num multiplicador do amor fraterno, uma idéia
simples de entender, mas difícil de aplicar. Existem pensadores que ensinam a amar
até ao inimigo, o maior estágio que um maçom pode alcançar ao se submeter aos
ensinamentos da ordem. A idéia de Justiça ocorre neste último estágio da escalada
do amor fraterno. O sol brilha sobre bons e maus, da mesma forma que a justiça. Os
vetustos homens das cavernas deduziram pela necessidade de sobrevivência de se
ter a disposição mental de considerar os outros como iguais é a única saída para
viver em paz e aumenta as chances de sobrevivência do grupo. De forma
semelhante os maçons de hoje, pelo amor fraterno fazem surgir a idéia de justiça
perfeita e equilibrada, treinam suas capacidades de desenvolver esta única forma de
resolver todos os problemas da humanidade pelo amor e à glória do Grande
Arquiteto do Universo.

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