Você está na página 1de 34

Cinemática

Descrição do escoamento, Derivada Material e equação da


Continuidade
1)Descrição euleriana e lagrangeana do escoamento

Descrição lagrangeana: seja uma variável f qualquer relacionada com o


escoamento (pressão, temperatura, massa específica, uma componente
da velocidade, etc.). Na descrição lagrangeana do escoamento, seguimos
uma partícula material específica, anotando a variação de f dessa
partícula ao longo do tempo. Chamamos de derivada material (ou
substantiva) de f à variação:

Df f partícula t  t   f partícula t 
 lim (1.1)
Dt t  0 t
Essa expressão representa a derivada da grandeza f relacionada com
a partícula material no instante t.

Descrição euleriana: descrevemos a variação da grandeza f do


escoamento através de seu campo f(x,y,z,t). Não estamos mais
preocupados com partículas materiais específicas.

Para expressar a derivada material em variáveis de Euler, ou seja,


para obter uma medida da derivada material em pontos de coordenadas
x,y,z do escoamento ao longo do tempo t, podemos imaginar uma
partícula que no instante t ocupava um ponto x  (x,y,z), e em t+t passa
a ocupar o ponto ( x  x  x+
 x,y+
 y,z+
 z) devido ao fato de se mover

com uma velocidade u  ui  vj  wk :
A derivada de Eq. (1.1) pode ser escrita:
  
Df f  x  x , t  t   f  x , t 
 lim (1.2)
Dt t  0 t
Nesta última expressão, vamos somar e subtrair no numerador o

valor de f ( x , t  t ) :

    
Df  f  x , t  t   f  x , t  f  x  x , t  t   f  x , t  t 
 lim    (1.3)
Dt t  0  t t

Note que a primeira parcela representa o valor da variação temporal



de f na posição fixa x , e que a segunda parcela representa a variação
espacial de f no instante fixo t+t. Chamamos a primeira parcela de
variação local de f, e ela é representada com o símbolo de derivada
parcial em relação ao tempo para ressaltar que é calculada em uma
posição fixa:
  
Df f  f  x  x , t  t   f  x , t  t 
  lim   (1.4)
Dt t t  0  t

Observe agora o termo que restou. O seu numerador representa a


  
diferença de f entre os pontos x  x e x , em um instante fixo t+t. Dos
cálculos diferencial e vetorial, essa grandeza se relaciona com o

gradiente de f calculado em x e t+t pela expressão:

   
f  x  x , t  t   f  x , t  t   x  f (1.5)
Substituindo (1.5) em (1.4):

Df f  x 
  lim   f  (1.6)
Dt t t  0  t 

E, finalmente:

Df f 
  u  f (1.7)
Dt t

Ou seja:

Df f f f f
 u v  w (1.8)
Dt t x y z
Essa expressão continua representando a derivada material (ou
substantiva) da grandeza f da partícula no instante t, e que nesse instante

ocupa o ponto x . Mas note que agora, não precisamos mais seguir a
partícula para avaliar a derivada: ela é composta de um primeiro termo,

a derivada local, avaliado pela variação temporal de f na posição x , e
por um segundo termo, chamado de derivada convectiva ( ou derivada
advectiva), que envolve avaliar a variação espacial e o vetor da

velocidade no ponto x e instante t.
A descrição euleriana do escoamento é vantajosa em relação à
descrição lagrangeana. Em geral, estamos preocupados em calcular ou
medir a variação de grandezas em pontos fixos do escoamento. Sensores
como anemômetros, Pitots, termômetros, em geral são colocados em
posições fixas. Métodos numéricos em geral resolvem parcelas
específicas do domínio de escoamento.
Exemplo: Avalie a derivada material da temperatura T no ponto (i,j) e
instante t, se são conhecidas as temperatura no instante t nos pontos (i,j),
(i+1,j), (i-1,j), (i,j+1), (i,j-1), a velocidade no instante t no ponto (i,j) e a
temperatura no instante (t+t) em (i,j).
DT T  T T T
  u  T   u  v
Dt t t x y

Avaliando numericamente as derivadas:

DT Ti , j t  t   Ti , j t  Ti 1, j t   Ti 1, j t 
  ui , j t  
Dt t 2x
Ti , j 1 t   Ti , j 1 t 
vi , j t 
2y
2)Acelerações

Usando a Eq. (1.7) podemos escrever as acelerações:

Du u 
ax    u  u (2.1)
Dt t

Dv v 
ay    u  v (2.2)
Dt t

Dw w 
az    u  w (2.3)
Dt t
Essas relações são representadas na forma vetorial por:

 u      
a   u   u com u     u  v  w (2.4)
t x y z

Assim:

Du u u u u
ax   u v  w (2.5)
Dt t x y z
Dv v v v v
ay   u v  w (2.6)
Dt t x y z
Dw w w w w
az   u v w (2.7)
Dt t x y z
3)Visualização de Escoamentos

Escoamentos podem ser visualizados através de:

a) Trajetórias (pathlines): uma trajetória representa o caminho


percorrido por uma mesma partícula ao longo do tempo. São
dadas pelas equações:

dx dy dz
u v w
dt dt dt
b) Linhas de corrente (streamlines): são linhas que em um dado
instante tangenciam os vetores da velocidade nos pontos de
aplicação desses vetores. São dadas pelas equações:

dx dy dz
 
u v w

c) Linhas de emissão (streaklines): uma linha de emissão


representa o lugar geométrico, em um dado instante, das
partículas que passaram por um mesmo ponto em instantes
anteriores.

Trajetórias, linhas de corrente e linhas de emissão são coincidentes


em escoamentos em regime permanente.
Exemplo: Linhas de corrente.
Exemplo: A linha vermelha representa a trajetória da partícula vermelha,
que saiu do ponto A em t=0. A linha azul representa a trajetória da
partícula azul, que saiu do ponto A em t=1. A linha verde representa a
trajetória da partícula verde, que saiu do ponto A em t=2. A linha
amarela representa a trajetória da partícula amarela, que saiu do ponto A
em t=3. Em t=4 uma partícula preta está saindo do ponto A. A linha
tracejada preta representa a linha de emissão , para o instante t=4, das
partículas que em instantes anteriores t  4 passaram pelo ponto A.
4)Taxa de Deformação Volumétrica de uma partícula material

Suponha que conhecemos os valores de u, v, u x e v y no canto


O inferior esquerdo da partícula material retangular da figura. Suponha
que u não varia com y e v não varia com x, ou seja u y  v x  0 . Ao
longo de um intervalo t o escoamento vai produzir uma deformação
volumétrica devida às deformações lineares dos lados da partícula.
Lembrando que nossa análise é bidimensional, e portanto um volume
corresponde a uma área, o volume da partícula em t é dado por:

dV  dx dy (4.1)

O volume da partícula em t+t é dado por:

 u  v 
dV (t  t )   dx  dxt  dy  dyt  (4.2)
 x  y 

Isso resulta:

v u u v
dV (t  t )  dx dy  dxdyt  dxdyt  dxdy t 2 (4.3)
y x x y
Fazendo uso da Eq. (4.1) isso pode ser re-escrito:

dV (t  t )  dV (t )  u v  u v
    dV (t )  dV (t ) t (4.4)
t  x y  x y

Fazendo t  0 o último termo da Eq. (4.4) desaparece e temos:

1 DdV  u v
  (4.5)
dV Dt x y
O termo do lado direito da Eq. (4.5) corresponde, para um escoamento
bidimensional, ao divergente do vetor da velocidade. Poderíamos ter
feito toda a análise em 3D, e chegaríamos, com um pouco mais de
álgebra, ao resultado:

1 DdV  
 .u (4.6)
dV Dt

Logo, o divergente do vetor de velocidade representa a taxa de


deformação volumétrica de uma partícula de fluido.
5)Rotação e Deformação Angular de uma Partícula

Suponha que conheçamos os valores de u, v, u y e v x no canto


O inferior esquerdo da partícula material retangular da figura. Suponha
que u não varia com x e v não varia com y, ou seja u x  v y  0 . Ao
longo de um intervalo t, o escoamento vai produzir rotações dos lados
da partícula.
Para um intervalo t pequeno, podemos escrever:

v
d dx  dx t (5.1)
x

u
d dy  dy t (5.2)
y

Fazendo t  0 , obtemos as velocidades angulares dos lados da


partícula. Vamos convencionar que uma velocidade angular anti-horária
é positiva e que uma velocidade angular horária é negativa. Obtemos as
seguintes velocidade angulares:
d v
Velocidade angular do lado horizontal: 
dt x

d u
Velocidade angular do lado vertical:  
dt y

Tomando a velocidade angular da partícula como a média das


velocidades angulares dos lados, obtemos:

1  v u 
    (5.3)
2  x y 
Como simplificação, fizemos a análise mais uma vez em duas
dimensões. O termo entre parênteses da Eq. (5.3) corresponde, num
escoamento bidimensional, ao rotacional (que para um escoamento no
plano xy se restringe à rotação ao redor de z) do vetor da velocidade.
Poderíamos ter feito a análise em 3D, e chegaríamos ao resultados:

 1 
   u (5.4)
2

Logo, o rotacional do vetor de velocidade está relacionado com a


velocidade angular das partículas.
Vamos verificar a deformação volumétrica causada pelo movimento.
Em duas dimensões, o volume em t+t será dado pelo módulo do

produto vetorial a  b :
    v    u  
dV (t  t )  a  b   dx i  dx t j    dyt i  dy j  (5.5)
 x   y 

Isso resulta:

v u
dV (t  t )  dx dy  dx dy t 2 (5.6)
x y

Que pode ser reescrito, lembrando que em t o volume é dV(t)=dx dy:


dV (t  t )  dV (t ) v u
 dV (t ) t (5.7)
t x y

Fazendo t  0 , o lado direito da Eq. (5.7) desaparece e temos:

DdV 
0 (5.8)
Dt

Este último resultado demonstra que a taxa de deformação volumétrica


da partícula é apenas devida ao divergente da velocidade. As
deformações angulares não contribuem para a deformação volumétrica.
Finalmente, é possível perceber que a partícula sofre uma deformação
angular, pois o ângulo  entre os lados se transforma:
 u v 
 t  t    (t )   d  d      t (5.9)
 y x 

 t  t    (t )  u v 
    (5.10)
t  y x 

Temos, assim, fazendo t  0 , a taxa de deformação angular da


partícula:

d  u v 
    (5.11)
dt  y x 
6)Equação da Continuidade ou Conservação da Massa

Se temos uma partícula material de massa dm   dV , podemos


escrever:

D(dm) D D (dV )
0 dV   (6.1)
Dt Dt Dt

Aplicando a Eq. (4.6) relativa à taxa de deformação volumétrica da


partícula:
D 
dV     u dV  0 (6.2)
Dt

Eliminando dV:

D 
   u 0 (6.3)
Dt

Essa é a equação da continuidade numa forma menos vista na


literatura. Ela tem a propriedade de melhor definir um escoamento
incompressível. Num escoamento incompressível, uma partícula se
movimenta mantendo a sua massa específica constante. Assim, a
derivada material da massa específica é nula:
D
0 (6.4)
Dt

E resulta, para um escoamento incompressível, da aplicação de (6.4)


em (6.3):

 u 0 (6.5)

A equação da continuidade, em geral, é apresentada substituindo a


derivada material da massa específica usando a equação de Euler:
D    
   u 0   u .      u  0 (6.6)
Dt t  
 u 

E resulta:

 
    u   0 (6.7)
t
Bibliografia:

White, F.M., “Mecânica dos Fluidos”, 5º edição, Ed. McGraw Hill,


2010.

Potter, M.C.; Wiggert, D.C., “Mecânica dos Fluidos”, Ed. Thomson


Learning, 2004.

Mase, G.T.; Mase, G.E., “Continuum Mechanics for Engineers”, third


edition, CRC Press, 1999.

Você também pode gostar