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Meningites

Introdução
A meningite infecciosa é um processo inflamatório exudativo que afeta as meninges, sendo um
diagnóstico de natureza anatômica bem definida. As meninges afetadas são a pia-máter e
aracnoide, incluindo o espaço entre elas, por onde circula o líquido cefalorraquidiano, resultando
em exsudato no LCR e comprometimento das leptomeninges. Além do exsudato, pode ocorrer
também edema cerebral, que causa um apagamento dos giros cerebrais. Além disso, o edema
cerebral, contido pela calota craniana, leva ao desenvolvimento de hipertensão intracraniana. O
diagnóstico da meningite é inicialmente clínico, baseado em suspeita. A meningite aguda é
considerada uma emergência médica, sendo uma das principais causas de atendimento em
pronto-socorro.

Classificação, Etiologia e Epidemiologia


As meningites, no que diz respeito à evolução dos sintomas, podem ser agudas ou subagudas. As
agudas são caracterizadas por um início rápido, ocorrendo em horas a alguns dias. Já as
subagudas e crônicas são aquelas que se desenvolvem ao longo de mais de 2 semanas ou mais de
4 semanas a 1 mês. Essa distinção é importante quando consideramos a etiologia, pois os casos
mais agudos geralmente são causados por bactérias e vírus, enquanto os quadros clínicos mais
indolentes e progressivos costumam ser atribuídos ao Mycobacterium tuberculosis e fungos.
Além disso, as meningites podem ser classificadas em purulentas e não purulentas:

Purulentas
As meningites purulentas, em geral, referem-se às meningites agudas de origem bacteriana. No
Brasil, esses casos são frequentemente causados por três agentes etiológicos principais:
Streptococcus pneumoniae (pneumococo), Neisseria meningitidis (meningococo) e Haemophilus
influenzae (sendo que o impacto da vacinação teve um grande efeito na epidemiologia dessa
doença no país).
Existem outras bactérias que podem causar meningite aguda, variando de acordo com a faixa
etária. Por exemplo, o Streptococcus agalactiae é uma bactéria que tem uma tendência de

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colonizar mulheres grávidas. Estudos mostram que cerca de metade das mulheres grávidas são
colonizadas por essa bactéria no trato vaginal. Portanto, o Streptococcus agalactiae pode ser um
dos agentes etiológicos responsáveis pela meningite neonatal. Nos primeiros 28 dias de vida, o S.
agalactiae é considerado o principal agente etiológico devido a essa epidemiologia específica.
Além disso, a Escherichia coli, uma enterobactéria comumente associada a infecções do trato
urinário, também desempenha um papel na meningite. É importante considerar que mulheres
grávidas, especialmente no terceiro trimestre, tendem a ter episódios mais frequentes de
infecções do trato urinário devido a alterações anatomofuncionais. O aumento do útero exerce
compressão nos ureteres e na bexiga, resultando em uma bexiga mais cheia que não consegue ser
completamente esvaziada. Isso aumenta a suscetibilidade a infecções, juntamente com a
alteração do pH vaginal, que na gestante deixa de ser altamente ácido e torna-se praticamente
alcalino, facilitando a proliferação de bactérias. Portanto, a E. coli se torna o segundo agente
etiológico mais comum em casos de meningite neonatal relacionados a infecções do trato
urinário em grávidas.
A Listeria monocytogenes é um bacilo gram-negativo que está frequentemente associado à
exposição a alimentos crus, verduras cruas ou mal cozidas, e também ao consumo de sorvetes
não pasteurizados. Em alguns casos, especialmente na literatura americana, ela é considerada o
terceiro principal agente etiológico da meningite neonatal.
As enterobactérias Proteus e Salmonella também podem ocasionalmente causar meningite
através de quadros de bacteremia ou sepse, seguidos de disseminação para o sistema nervoso
central. Por exemplo, em pacientes idosos, as diarreias agudas causadas pela Salmonella podem
resultar nessa complicação. Assim, em algumas situações, as gastroenterites infecciosas,
especialmente em pacientes imunossuprimidos ou idosos, podem levar à bacteremia a partir do
trato gastrointestinal, podendo resultar em meningite bacteriana. No entanto, esses casos são
menos comuns.

O Pseudomonas aeruginosa é um bacilo gram-negativo que não fermenta glicose e possui uma
característica de crescer facilmente em água, formando biofilme. Como a água é amplamente
utilizada em diversos procedimentos terapêuticos e invasivos em unidades de saúde, o
Pseudomonas está associado a infecções relacionadas à assistência médica. Existem vários
exemplos dessas situações, como objetos com higienização inadequada e o uso de umidificação
na ventilação mecânica.

Procedimentos neurológicos, como em neurocirurgias e coleta de líquor


sem a técnica séptica correta e inserção de derivação ventricular são

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exemplos de possibilidades de se adquirir uma meningite em ambiente
hospitalar.

Além do Pseudomonas, nas meningites relacionadas à assistência médica, que são as infecções
hospitalares, também estão presentes como agentes estiológicos os cocos gram-positivos, como o
Staphylococcus aureus, além de outros bacilos gram-negativos, incluindo a Klebsiella
pneumoniae e outras enterobactérias.

Não Purulentas
São caracterizadas pela ausência de coleções purulentas importantes no exsudato do líquido
cefalorraquidiano (LCR) e na necropsia. Nesse contexto, temos as meningites causadas pelo
Mycobacterium tuberculosis e por fungos. O principal fungo que apresenta tropismo pelo
sistema nervoso central é o Cryptococcus neoformans, sendo o fungo mais comumente
encontrado no LCR. Existem outros fungos, como Aspergillus e Candida, porém são menos
frequentes e estão associados a pacientes imunossuprimidos. O Cryptococcus afeta tanto
pacientes imunossuprimidos, sendo o principal agente etiológico de meningite em pacientes com
HIV, quanto pacientes imunocompetentes.
Além disso, nas meningites não purulentas, temos as meningites virais, que são as mais
prevalentes em termos de epidemiologia, seguidas das bacterianas. O grande desafio das
meningites virais é a sua identificação clínica, baseada no padrão do LCR, uma vez que é difícil
determinar a etiologia específica. Seriam necessários testes virais específicos, como biologia
molecular, PCR, cultivo celular e sorologia, porém isso não é feito rotineiramente, apenas em
pesquisas. Dessa forma, a etiologia viral é inferida pela epidemiologia, sendo conhecido que os
enterovírus, em particular o echovirus e o coxsackievirus, são os principais causadores de
meningites virais. Além desses, outros vírus como o da poliomielite não são uma preocupação
devido à imunização. Também são encontradas infecções causadas por herpesvírus, tanto o
herpes simples como o vírus da varicela-zoster, Epstein-Barr e citomegalovírus, pois esses vírus
têm tropismo pelo sistema nervoso central. Por fim, outros exemplos incluem o influenza e o
vírus da imunodeficiência humana.

Aspectos gerais de agentes específicos


Meningite Herpética

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A meningite herpética é considerada a forma mais grave de meningite viral, caracterizada por
quadros agudos com expressão clínica intensa, podendo resultar em meningoencefalite com
hemorragia cerebral. Isso é incomum nas meningites virais, que geralmente têm evolução
limitada e apresentam sintomas meníngeos leves. Em geral, as meningites virais não possuem
tratamento específico, porém, no caso das meningites herpéticas, utilizamos o antiviral aciclovir.
É importante ressaltar que nem sempre as meningites herpéticas apresentam manifestações
dermatológicas, sendo a suspeita baseada no quadro clínico do paciente associado aos achados
característicos no líquor, como aumento de proteínas e células, bem como imagens evidenciando
focos de hemorragia, sem identificação de bactérias. Diante desses sinais, inicia-se
empiricamente o uso do antiviral.
Maiores detalhes relacionados com o diagnóstico, padrão do líquor e tratamento serão discutidos
posteriormente.

Neisseria meningitidis
O meningococo é o agente etiológico mais comum no Brasil, apresentando predominância
relacionada a faixas etárias específicas, que serão discutidas posteriormente. Essa bactéria tem a
capacidade de se comportar em surtos devido à sua alta virulência e excelente transmissibilidade
por meio de gotículas.

O principal mecanismo de transmissão da meningite é a dispersão de


gotículas provenientes da cavidade nasofaríngea durante espirros, coceiras
no nariz ou fala.

Existem sorogrupos que apresentam maior prevalência no país. Atualmente, o sorogrupo C


prevalece na maioria das regiões brasileiras, ao lado dos sorogrupos A e B. Além desses, o Brasil
começou a registrar a circulação dos sorogrupos W, X e Y. Na região Norte, o sorogrupo C é
responsável por 85% dos casos de meningite meningocócica. No Nordeste, essa taxa é de 83%,
enquanto no Sudeste e Centro-Oeste é de 70% e 78%, respectivamente. No Sul, o sorogrupo C
divide a prevalência com o W e o D. Vale ressaltar que o sorogrupo D já não é mais encontrado
em outras regiões além do Sul. O sorogrupo W começou a aparecer no Nordeste, e ainda não
foram registrados casos dos novos sorogrupos (W, X e Y) na região Norte.

AGENTE AGENTE TIPO


TIPO GRAM
BACTERIANO
Cryptococcus neoformans fungo

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AGENTE AGENTE TIPO
TIPO GRAM
BACTERIANO
Mycobacterium tuberculosis micobactéria
Streptococcus
pneumococo + Echovirus enterovírus
pneumoniae
Coxsackie enterovírus
Neisseria
meningococo -
meningitidis Herpes simplex herpesvírus

Haemophilus Varicella-Zoster herpesvírus


bacilo -
influenzae Esptein-Barr herpesvírus
Streptococcus
coco + Citomegalovírus herpesvírus
agalactiae

Escherichia coli enterobactéria -

Listeria
bacilo +
monocytogenes

Pseudomonas
bacilo -
aeruginosa

Klebsiella
bastonete -
pneumoniae

Fisiopatologia
Os agentes etiológicos das meningites geralmente alcançam o sistema nervoso central por via
hematogênica, sendo essa a forma mais comum de disseminação. Em seguida, temos a
disseminação por contiguidade direta e, por fim, a via neuronal retrógrada.
No caso das meningites bacterianas agudas mais comuns, como Neisseria meningitidis,
Streptococcus pneumoniae e Haemophilus influenzae, o trajeto percorrido pelas bactérias
envolve inicialmente a colonização das mucosas. Após essa etapa, ocorre a replicação nos
tecidos, seguida da invasão bacteriana hematogênica, ou seja, a multiplicação nos tecidos e a
invasão do endotélio vascular. Assim, as bactérias são transportadas pelos vasos sanguíneos até
alcançarem os vasos cerebrais.

Ao chegar nos vasos cerebrais, as bactérias encontram a barreira hematoencefálica, que é


composta por junções intercelulares que dificultam a passagem de agentes etiológicos e
fármacos. Nesse ponto, as bactérias realizam sua adesão nas células do plexo coroide, o que
permite sua multiplicação no espaço subaracnoideo. Paradoxalmente, a compartimentalização do
cérebro e a presença da barreira hematoencefálica, juntamente com a baixa atividade

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imunológica (baixos níveis de complemento, imunoglobulinas e atividade de opsonização, além
de baixa celularidade leucocitária), favorecem a replicação dos agentes etiológicos.

Assim, quando as bactérias liberam seus antígenos ou endotoxinas, ocorre uma reação
inflamatória mediada pela liberação de citocinas e mediadores inflamatórios, como interleucinas
(principalmente IL-1 e IL-6), fator de necrose tumoral (TNF) e prostaglandinas.
A atividade inflamatória desempenha um papel importante na sinalização quimiotáctica dos
leucócitos, uma vez que causa lesões no epitélio e aumento da permeabilidade vascular. No
entanto, esse processo também resulta em edema cerebral, que, juntamente com o exsudato
inflamatório, intensifica a dificuldade de reabsorção do líquido cefalorraquidiano (LCR),
especialmente quando combinado com o exsudato inflamatório presente nas células do plexo
coroide, responsáveis pela reabsorção do LCR. Consequentemente, o líquido é produzido
normalmente, mas se acumula devido à dificuldade de absorção, resultando em hipertensão
intracraniana.

A hipertensão intracraniana é o principal evento relacionado às


manifestações clínicas.

Do ponto de vista epidemiológico, 47% das notificações de meningites agudas são de origem
viral, enquanto 34% são bacterianas, sendo as mais comuns Neisseria meningitidis,
Streptococcus pneumoniae e Haemophilus influenzae. A Neisseria meningitidis é a mais
prevalente, representando 28% dos casos de meningites bacterianas, seguida pelo Streptococcus
pneumoniae, com 16%. No Brasil, devido à vacinação, o Haemophilus influenzae não possui
tanta expressão.

Quando se depara com um caso de meningite aguda, é importante


considerar se é de origem viral ou bacteriana.

Quadro Clínico
As meningites, de um modo geral, podem se manifestar por meio de três grandes grupos
sindrômicos: síndrome febril/infecciosa, síndrome de irritação meníngea e síndrome de
hipertensão intracraniana. Nem sempre as três síndromes estarão presentes; às vezes, apenas duas
são mais evidentes, ou até mesmo apenas uma.

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Em relação às meningites agudas, especialmente as bacterianas, durante a anamnese, é
importante questionar se o paciente teve alguma infecção das vias aéreas nos últimos 15 a 30
dias, uma vez que 40% das meningites agudas são precedidas por infecções respiratórias.
Geralmente, o início dos sintomas é súbito, com febre alta, intermitente, porém persistente, e
outras manifestações do quadro infeccioso, como astenia, mialgia e artralgia, caracterizando a
síndrome infecciosa/febril. A queixa principal do paciente costuma ser uma cefaleia holocraniana
que não responde à analgesia. Além disso, podem ocorrer vômitos em jato, não precedidos por
náuseas, caracterizando um vômito de ação central, o que configura a síndrome de hipertensão
intracraniana. Por fim, a síndrome de irritação meníngea é caracterizada pela rigidez de nuca,
sinal de Kernig e sinal de Brudzinski, sendo que os dois últimos são obtidos por meio de
manobras semiológicas, geralmente realizadas em crianças. Essas manobras visam provocar o
estiramento das raízes medulares da cervical à lombar, que estão envolvidas por exsudato
inflamatório, causando dor e contratura de defesa. No exame físico das crianças, também é
importante avaliar a fontanela, pois o abaulamento desta é um sinal de hipertensão intracraniana.
Além disso, em crianças, o meningococo pode causar um quadro de sepse a partir da colonização
da nasofaringe, sendo disseminado pela via hematogênica e causando focos infecciosos
sistêmicos, resultando no quadro de meningococcemia. Esse tema será discutido mais adiante.

Além disso, também podem ocorrer sinais cerebrais focais, como hemiparesias, devido ao
comprometimento dos nervos cranianos, como o terceiro (oculomotor) e o sexto (abducente).
Isso pode resultar em alterações visíveis, como estrabismo, ptose palpebral, nistagmo e
anisocoria, que podem ser avaliadas por meio da inspeção da face do paciente. Esses sinais são
comumente encontrados em casos de meningite bacteriana aguda, meningite por tuberculose e
meningite fúngica.

Além do comprometimento dos nervos cranianos, o envolvimento do oitavo par de nervos


cranianos, o nervo vestibulococlear, está relacionado a alterações no equilíbrio, como
anormalidades na marcha. Além disso, os pacientes com meningite podem apresentar outras
manifestações decorrentes do comprometimento encefálico, como crises convulsivas, que podem
ser localizadas ou generalizadas, ocorrendo em até 30% dos casos.

Complicações
Uma das complicações graves da meningite meningocócica é a meningococcemia, que se
manifesta por meio de lesões cutâneas. Essas lesões ocorrem devido ao consumo de plaquetas
pelo quadro infeccioso grave e podem se apresentar como petéquias, púrpuras e vasculites nas
extremidades. Nas crianças, essas manifestações dermatológicas são especialmente graves. O

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diagnóstico da meningococcemia é geralmente feito com base no exantema nas extremidades
superiores e inferiores. Em casos graves de meningococcemia, pode ser necessário realizar
amputações, desde a perda de dedos até a coxofemoral. O diagnóstico precoce é essencial para o
manejo adequado desses pacientes graves.
A disseminação hematogênica da meningococcemia pode levar ao aparecimento de infecções em
locais distantes, resultando em complicações adicionais, como artrite séptica e endocardite. Em
casos mais graves, pode ocorrer a síndrome de Waterhouse-Friedrichsen, uma forma aguda
fulminante de meningococcemia que pode levar ao óbito. Nem todos os casos de
meningococcemia são fulminantes, mas alguns podem evoluir para um choque séptico refratário,
no qual não há resposta às drogas vasoativas. Isso muitas vezes ocorre devido ao
comprometimento agudo das suprarrenais causado por hemorragia intensa. A destruição maciça
das suprarrenais leva a uma rápida exaustão das reservas de cortisol plasmático, tornando o
manejo do tônus vascular extremamente desafiador. Embora a administração de corticoterapia
possa reverter esse quadro em alguns casos, muitas vezes a criança já não responde ao
tratamento, onde, junto a isso, ocorre coagulação intravascular disseminada com sangramento,
levando ao óbito do paciente.

Outras complicações imediatas além da meningococcemia são a sepse por bactéria e


tromboflebites cerebrais, que podem ocasionar quadros semelhantes ao de um AVC.
Ademais, existem complicações devido ao edema cerebral acentuado, como a diminuição da
acuidade visual e amaurose, além da hipertensão intracraniana importante, que pode levar a
herniações encefálicas, quadro gravíssimo onde o paciente para devido à herniação do bulbo
através dos forames cerebrais, onde o paciente evolui em parada cardiorrespiratória.

Em adição, podem ocorrer complicações supurativas, como abscessos cerebrais e coleções


purulentas, além de coleções subdurais. Em continuidade, podem ocorrer quadros cursando com
ventriculites e hidrocefalia, devido à dificuldade de reabsorção do líquor no quadro de meningite,
ocasionando a sua retenção. As hidrocefalias podem ser revertidas através das derivações
ventrículo peritoneais.
Por fim, infecções tardiar podem acontecer semanas ou meses após o quadro, podendo cursar
com paralisia cerebral, deficiência intelectual, diminuição da acuidade auditiva e visual e
hidrocefalia, onde este último pode cursar com um quadro de hipertensão intracraniana, onde o
paciente apresenta vertigem e cefaléia.

Diagnóstico

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Em todo paciente com suspeita de meningite, é necessário realizar a punção liquórica,
geralmente feita na região lombar. Normalmente, são coletados dois frascos e são solicitados
exames de citometria (contagem de células), citologia (tipos de células), dosagem de proteína e
dosagem de glicose. Durante a punção, é possível observar visualmente se o líquido apresenta
hipertensão, sendo mais preciso utilizar um manômetro.

Além disso, é realizado um processo de triagem do LCR em pacientes com suspeita de


meningite, independentemente do agente causador ou da natureza aguda ou crônica da doença.
Nessa triagem, são realizados exames como bacterioscopia (GRAM), em que a presença de
diplococos GRAM negativos indica Neisseria meningitidis, enquanto cocos GRAM positivos
sugerem Streptococcus pneumoniae. Também é utilizado o método de Ziehl-Neelsen para
detecção de bacilos no LCR, pesquisa de antígeno bacteriano (por aglutinação de látex para H.
influenzae, S. pneumoniae e N. meningitidis), tinta nanquim (que revela a presença de
Cryptococcus neoformans, apresentando imagens de leveduras arredondadas com núcleo grande
em brotamento, semelhantes a uma gema de ovo, sendo que a presença de formas mais
numerosas indica um quadro mais grave do paciente), exame micológico direto e pesquisa de
antígeno criptocócico. Além disso, a hemocultura pode ser realizada em pacientes com suspeita
de meningite bacteriana, sendo importante ressaltar que na meningococcemia a hemocultura
revela a presença do meningococo. Essa triagem é realizada levando em consideração a falta de
conhecimento sobre a etiologia da meningite, mesmo com as informações epidemiológicas a
nosso favor, pois há casos em que os pacientes fogem do padrão clínico-epidemiológico comum.
O aspecto do líquor é um elemento importante. Exemplos de aspectos patológicos incluem líquor
turvo, purulento, xantocrômico (coloração alaranjada devido à presença de proteínas) ou
hemorrágico (sendo importante fazer a distinção de punção acidental). A pressão estará elevada
se for maior que 16 mmHg ou 20 cm de água no manômetro, ou também pode ser observada
visualmente.

A parte mais importante do diagnóstico é o padrão do líquor. No líquor normal, geralmente são
observadas 5 células por ml de LCR, sendo que 95% ou 100% dessas células são
linfomononucleares. Além disso, é esperado uma concentração de glicose entre 40 a 70 mg/ml e
de proteína em torno de 15 a 40 mg/ml. É importante lembrar do número 40, pois valores abaixo
de 40 na glicose caracterizam um consumo anormal, enquanto valores acima de 40 na proteína
indicam um aumento da concentração de proteínas no LCR.
A análise do líquor na meningite bacteriana revela uma pressão geralmente elevada, uma
contagem celular acima de 1000 células/ml de LCR, com predominância de polimorfonucleares,
diminuição da glicose (hipoglicorraquia) e aumento de proteínas (hiperproteinorraquia).

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Já na meningite viral, o padrão liquórico observado é quase normal. Na maioria dos casos, o
aspecto é límpido, a pressão está dentro dos parâmetros normais, a contagem de células é inferior
a 1000 e, predominantemente, são linfomononucleares. A glicose encontra-se em níveis normais
e as proteínas podem estar levemente aumentadas.

Na meningite fúngica, a suspeita surge quando o paciente apresenta um líquor claro associado a
uma evolução clínica crônica. A análise do líquor revela uma baixa contagem celular, consumo
de glicose e aumento de proteínas, além da presença do fungo Cryptococcus neoformans no
exame micológico direto. A sensibilidade do fungo à tinta nanquim é de cerca de 50%. No caso
do Mycobacterium tuberculosis, há um desafio, uma vez que em mais de 95% dos casos o
BAAR (bacilo álcool-ácido resistente) é negativo.

As indicações para realização de TC de crânio com contraste são a presença de complicações, ou


seja, a presença de sinais neurológicos focais, suspeita de empiema ou abscesso, piora do quadro
apesar da antibioticoterapia, manutenção ou recorrência da febre, disfunção neurológica
persistente, confuso e desorientado, crises convulsivas, entre outros.

Bactérias Vírus Fungos Micobactéria

Pressão Alta Normal Normal Normal

Límpido ou
Aspecto Turvo Límpido Límpido ligeramente turvo
(opalescente)
Branca-leitosa ou
Incolor ou Incolor ou
Cor ligeiramente Incolor
opalescente xantocrômica
xantocrômica

Glicose Diminuída Normal Diminuída Diminuída

Levemente Levemente
Proteínas Aumentadas Diminuída
aumentadas aumentadas
Levemente
Citometria Muito aumentada Diminuída Diminuída
aumentada
Polimorfonucleares Presentes Ausentes - -

Linfomononucleares Ausentes Presentes - -

GRAM + indica S.
Bacterioscopia pneumoniae;
- - -
(GRAM) GRAM - indica N.
meningitidis

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Bactérias Vírus Fungos Micobactéria

Látex Reagente - - -

Presença de
Cryptococcus
neoformans,
Nanquim/micológico imagens de
direto/pesquisa de leveduras
- - -
antígeno arredondadas com
criptocócico núcleo grande em
brotamento,
semelhantes a uma
gema de ovo

Tratamento
Meningite bacteriana
No tratamento da meningite bacteriana, é necessário utilizar uma antibioticoterapia capaz de
ultrapassar a barreira hematoencefálica, administrada em doses elevadas (pois mesmo
antimicrobianos que conseguem ultrapassar a barreira tendem a perder sua concentração) e que
seja via endovenosa, além de possuir ação bactericida.
Para o tratamento das meningites neonatais, causadas principalmente por Streptococcus
agalactiae, Listeria e E. coli, é indicado o uso de cefalosporina de terceira geração. No entanto,
deve-se evitar o uso de ceftriaxona devido ao risco de kernicterus, sendo recomendado o uso de
cefotaxima em combinação com ampicilina, já que o S. agalactiae responde à cefotaxima,
enquanto a Listeria responde apenas à ampicilina.

Para pacientes com mais de 3 meses, a infecção predominante é causada pelo meningococo,
sendo recomendado o uso de ampicilina ou penicilina G cristalina em altas doses. Também é
possível utilizar ceftriaxona, uma vez que nessa faixa etária não há mais associação com
kernicterus e o medicamento apresenta boa eficácia contra Neisseria meningitidis. Vale ressaltar
que, fora do Brasil, já existe resistência da bactéria à ampicilina e à penicilina G cristalina.
Em pacientes acima de 1 ano, adolescentes e adultos, o tratamento de escolha é a ceftriaxona. É
importante mencionar que o princípio da antibioticoterapia é selecionar o medicamento com
menor espectro possível, porém essa escolha deve ser baseada em cultura. Portanto,
empiricamente, pode-se utilizar a ceftriaxona. Após a obtenção do resultado da cultura e

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identificação do pneumococo, de acordo com a sensibilidade, é possível suspender o uso de
ceftriaxona e iniciar o tratamento com ampicilina ou penicilina G cristalina. Essa abordagem é
particularmente relevante para pacientes menores de 18 anos, visto que após essa faixa etária o
agente etiológico predominante é o pneumococo, seguido pelo meningococo.
No caso de pacientes que apresentam meningites de repetição, em falha terapêutica com a
ceftriaxona, pode-se realizar a associação à vancomicina.
Em pacientes com idade acima de 50 anos, gestantes ou imunodeprimidos, o pneumococo
continua sendo o principal agente etiológico, porém também podem ser encontrados bacilos
Gram negativos, como Escherichia coli e Klebsiella pneumoniae. Além disso, em idosos e
imunossuprimidos, há um aumento na ocorrência de infecções causadas por Listeria
monocytogenes. Nesses casos, é necessário utilizar ampicilina, uma vez que esse agente
etiológico não responde às cefalosporinas de terceira geração.

Por fim, no que diz respeito à meningites decorrentes de serviços assistenciais, utilizam-se
antibióticos de muito amplo espectro, como o meropeném (ação em GRAM negativos
multirresistentes) associado à vancomicina (ação em GRAM positivos). Outras opções
terapêuticas são a ceftazidima, cefalosporina de 3ª geração anti-pseudomonas e cefalosporinas de
4ª geração, neste caso, o cefolin, também associado à vancomicina.
O tempo de tratamento de uma meningite meningocócica é de 7 dias. Infecções por
Streptococcus pneumoniae e agalactiae são tratadas por 2 semanas. Já por Listeria e outros
GRAM negativos são tratados por 3 semanas.

Em infecções por procedimentos hospitalares de colocação de DVP e


DVE, para obtenção do êxito no tratamento, deve-se retirar o dispositivo.

Nos primeiros 2 a 4 dias de início da antibioticoterapia pode-se utilizar corticoesteróides, como a


dexametasona, complementando a terapia ao diminuir a resposta inflamatória, diminuindo as
complicações. Utilizam-se doses baixas de 6/6 a 8/8 horas, sendo 0,15 mg/kg/dia. Possui eficácia
especialmente em meningites por S. pneumoniae e H. influenza.

Meningite fúngica
O tratamento é feito com um antifúngico, principalmente a anfotericina B desoxicolato associado
com a 5-fluorocitosina, visto que essa facilita a entrada da anfotecicina B no Cryptococcus,
apresentando um efeito sinérgico. Faz-se 0,6 a 0,8 mg/kg/dia de anfotericina B VO durante 2

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semanas. Após 2 semanas de tratamento se dá seguimento com fluconazol na dose de 400 mg/dia
também VO.
Alternativamente, pode-se realizar anfotecicina B lipídica (Ambisome) de 3 a 6 mg/kg/dia de 6 a
10 semanas. Esse medicamento possui menos efeitos colaterais e por ser só uma droga apresenta
maior adesão. A desvantagem é o preço. Em pacientes com HIV esse é o tratamento de primeira
escolha.

Meningite por tuberculose


O tratamento é muito semelhante ao da tuberculose pulmonar, porém, a segunda fase será mais
longa. A primeira fase tem 2 meses, sob administração de rifampicina, isoniazida, pirazinamida e
etambutol, enquanto a segunda terá 7 meses, sob administração de rifampicina e isoniazida.
Quando o paciente vive com HIV o tempo é de 12 meses.

Existem casos em que é necessário realizar uma nova punção lombar no


paciente. Na meningite cryptocócica, por exemplo, às vezes é feita uma
repunção para avaliar a resposta terapêutica. Já na meningite aguda, na
maioria das vezes, não é realizada uma repunção, a menos que haja
suspeita de complicações, o que é bastante raro.

FAIXA
AGENTES TRATAMENTO
ETÁRIA/SITUAÇÃO
Streptococcus agalactiae, Listeria
Neonatos monocytogenes, Escherichia coli, Neisseria Cefotaxima + Ampicilina
meningitidis

Ampicilina ou Penicilina G
Acima de 3 meses Neisseria meningitidis
Cristalina ou Ceftriaxona

Neisseria meningitidis>Streptococcus Ceftriaxona ou Ampicilina ou


1-18
pneumoniae Penicilina G Cristalina
Streptococcus pneumoniae>Neisseria
Acima de 18 Ceftriaxona
meningitidis

Streptococcus pneumoniae>Neisseria
Falha terapêutica Vancomicina
meningitidis

Meningites 13
FAIXA
AGENTES TRATAMENTO
ETÁRIA/SITUAÇÃO
Acima de 50, Streptococcus pneumoniae, Escherichia
gestantes e coli, Klebsiella pneumoniae, Listeria Ceftriaxona + Ampicilina
imunodeprimidos monocytogenes

Meropenem + Vancomicina ou
Infecções hospitalares Pseudomonas aeruginosa Ceftazidima ou Cefolin +
Vancomicina

Anfotericina B Desoxicolato + 5-
Meningite fúngica Cryptococcus neoformans Fluorocitosina ou Anfotericina B
Lipossomal

Meningite por
Mycobacterium tuberculosis RHZE 2 meses + RH 7 meses
tuberculose
Herpes simplex, Varicella-Zoster, Esptein-
Meningite herpética Aciclovir
Barr, Citomegalovírus

Pevenção e profilaxia
A prevenção da meningite é principalmente realizada por meio da vacinação, que abrange os
principais agentes causadores da doença no calendário vacinal. No entanto, também é possível
adotar medidas de profilaxia. A profilaxia consiste em tomar um medicamento dentro das
primeiras 72 horas de exposição, a fim de eliminar possíveis colonizações. Portanto, enquanto a
vacinação impede a colonização, a quimioprofilaxia é utilizada quando já existe uma colonização
estabelecida. Para a profilaxia, é recomendado o uso de rifampicina na dose de 600 mg por 2
dias. Além disso, é importante orientar os familiares e fornecer a profilaxia para aqueles que
tiveram contato com o paciente. Em crianças, utiliza-se uma suspensão de rifampicina na dose de
10 mg/kg durante 2 dias. Vale ressaltar que a meningite é uma doença de notificação obrigatória
e sua transmissão ocorre por meio de gotículas respiratórias. Portanto, é necessário o uso de
máscara cirúrgica e a manutenção do paciente em um quarto de isolamento por 24 horas a partir
do início do tratamento com antibióticos. Após esse período, o paciente pode ser transferido para
um quarto de enfermaria. É importante destacar que a descolonização total do nasofaríngeo
ocorre após 24 horas de medicação.

Meningites 14

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