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Romanceiro da Inconfidência (1953)

Romanceiro da Inconfidência é a principal


obra escrita por Cecília Meireles, retratando
de forma lírica os acontecimentos da Inspirada por uma visita a Ouro Preto,
Cecília Meireles compôs esse poema de
Inconfidência Mineira. Há a perspectiva
temática social, retratando a luta pela
popular, o lendário Tiradentes, o tema da liberdade no Brasil do século XVIII durante
escravidão e os poetas Árcades. o episódio da Inconfidência Mineira e
incorporando elementos dramáticos,
épicos e líricos.
Sobre a autora: Cecília Meireles O interesse pela cidade de Ouro Preto em
Minas Gerais, dá-se pelos esforços dos
modernistas pela recuperação do
passado nacional. Em 1951, Carlos
Drummond de Andrade (1902-1987) dedica
uma seção de seu Claro Enigma às
cidades históricas mineiras e ,em 1954,
Murilo Mendes (1901-1975) lança
Contemplação de Ouro Preto.
Já “Romanceiro” é o termo que se usa
para indicar um conjunto de romances e
um romance é o gênero literário que trata
de obras de caráter narrativo e poético.
Cecília Benevides de Carvalho Meireles
nasceu no Rio de Janeiro, em 7 de
novembro de 1901. Ficou órfã na sua Esta é considerada a obra mais
infância e foi educada pela avó materna. conhecida de Cecília Meireles por
Tornou-se professora primária em 1917 e apresentar uma linguagem mais clara e
em 1919 publicou seu primeiro livro de comunicativa e tratar de um assunto
poesias, Espectros, de familiar a muitos leitores, com esse tom de
tendência parnasiana. engajamento social devido a temática de
A partir dos livros “Viagem” (1939) e “Vaga uma revolta.
Música” (1942), Cecília alcançou a
maturidade literária, inspirando-se
principalmente no simbolismo. Ainda Temática e perspectiva
sim, seu estilo é extremamente pessoal e
único, não permitindo classificar a obra A fala que abre o livro sugere a ideia
da escritora em uma escola literária de arte como instrumento de eternização
específica. da ação humana, assumindo uma postura
Em 1953 lançou Romanceiro da de combate ao opor-se aos relatos da
Inconfidência, um dos marcos da história oficial da Inconfidência Mineira.
literatura social brasileira, no qual recria Primeiro, vê como heróis aqueles que
poeticamente a saga de Tiradentes e poderiam ser considerados criminosos;
dos demais inconfidentes nas Minas segundo, a narrativa é feita de uma
Gerais do século XVIII. Morreu no Rio de perspectiva lírica e não apenas factual.
Janeiro, em 9 de novembro de 1964. Este evento histórico é abordado de
forma subjetiva, mas ainda assim,
Sobre a obra: Romanceiro da reforça-se alguns aspectos já
conhecidos: inconfidentes como vítimas
Inconfidência de perseguições políticas e indivíduos
antecipadores da independência brasileira
e o vilão traidor da causa.
Por fim, é importante notar que os versos
vão além do tempo e do espaço
apresentados. Cecília consegue fazer com
que passado e presente
dialoguem, tratando de assuntos bem
atuais como a ambição humana, a ação
de traidores e a necessidade de
lutar contra ambos. O enredo da obra e divisões dos

Linguagem e escrita capítulos

Nessa obra de Cecília Meireles há 85 Não é possível estabelecer uma divisão


romances além de outros poemas. rigorosa dos textos de Cecília, pois muitas
Existe musicalidade nos versos vezes a narrativa avança ou regride, há
(métrica), uso de símbolos e apelos poemas transitórios feitos em momentos
sensoriais, características comuns na espontâneos e com interpolações do
poesia neo-simbolista, conferindo até um ar poeta. Contudo, é possível traçar um
de mistério e crença no imaterial. plano geral de temáticas:
Em outros poemas há o uso da redondilha  1-Ambiente e Contexto (romances I-
maior e a menor. Esse é tipo de contagem XXIII)
da métrica dos versos, fazendo-os com
cinco sílabas poéticas (menor) ou sete Em “Fala inicial”, o narrador assume a
(maior). Essa contagem era muito comum primeira pessoa para manifestar a
nos romances medievais do Trovadorismo. sensação de tornar pública a revolta. Toda
Também acaba utilizando algumas esta primeira parte funciona como
expressões do Arcadismo, movimento uma reorganização lendária e folclórica
literário vigente na época da Inconfidência da realidade histórica, com
mineira. Quanto às rimas, a autora utiliza intensa participação da atmosfera de
de vários tipos: ricas e pobres ou perfeitas narrativas populares.
e imperfeitas e em outros poemas, às O primeiro cenário retrata o desenrolar da
vezes, nem há ou são irregulares. febre do ouro, a busca enlouquecida pelo
No entanto, por ser uma autora metal, a crescente intervenção das
moderna, Cecília não se prende autoridades, lutas dos colonos contra o
totalmente a algum desses modelos, poder, o contrabando e a presença ativa
mas os mistura conforme o intuito e a dos escravos na mineração.
expressão poética desejada. Aí surge a lenda do Chico-Rei, lendário
Por fim, a dualidade também é algo muito negro que se enriqueceu e comprava a
presente, o que é típico do Barroco. Essas liberdade de outros. Também surge Chica
da Silva, a sedutora namorada de um rico
marcas refletem as ambigüidades que
minerador. Essa parte se encerra com o
caracterizam as ações do homem – herói e nascimento de Tiradentes (1746).
traidor, ódio e amor, punhal e flor, bons e  2-Articulação e fracasso (romances
maus, riqueza e miséria. XXI V-XL VH)
Esses poemas retratam o começo efetivo
Contexto histórico – obra vs realidade da articulação do movimento rebelde
contra a opressão lusitana. O segundo
cenário retrata a vida local de Vila Rica
A obra foi composta em meio à segunda
(antiga Ouro preto): há referências à
fase do Modernismo, conhecida
bucólica e pacífica poesia dos árcades e
como geração de 30, foi o período entre
o impactante surgimento do espírito de
1930 e 1945. Temos um agitado cenário
rebelião.
político nacional com Vargas e
A agitação popular se espalha, há o
internacional com a Segunda Guerra
crescimento de ideias liberais e
mundial.
Tiradentes atua de fora contusa, que tem
Como foi visto, a autora cria uma ponte
sua imagem bem poetizada. Surge o herói
entre seu contexto histórico literal e o
Tiradentes e, ao mesmo tempo, aquele que
contexto histórico da narrativa da obra,
viria a ser o traidor, Joaquim Silvério dos
que é Inconfidência Mineira.
Reis.
Essa conexão de cenários agitados
Por fim, encerra-se com a carta-denúncia
socialmente pode ser interpretada como
de Joaquim Silvério e a repressão do
uma forma de trazer reflexões para seu
governo central que leva à prisão dos
tempo com base nos acontecimento
principais envolvidos.
históricos já ocorridos.
 3-Morte de Cláudio e Tiradentes
(romances XLVIII-LXIV)
Nesta parte, há os desdobramentos da embate de antigas horas, de antigos
descoberta da tentativa de revolta para fatos, de homens antigos.
seus participantes. Destaca-se a relação
do famoso poeta Árcade Tomás Antônio
Gonzaga com Maria Joaquina, E aqui ficamos
de codinomes Dirceu e Marília. Ele é
exilado na África e ela sofre. todos contritos,
Há ainda as circunstâncias misteriosas da
morte do poeta árcade Cláudio Manuel
da Costa servem como motivo para a a ouvir na névoa
divagação e tudo se encerra com o trágico
momento em que Tiradentes dá seus
o desconforme,
passos de condenado rumando à forca.
 4-A infelicidade de Gonzaga e de
Alvarenga Peixoto (romances LXV- submerso curso
LXXX)
Esta parte retrata o contexto em que dessa torrente
Gonzaga viveu no exílio, seus poemas
escritos, as murmurações e
desconfianças e perda de sua amada do purgatório…
Marília. Há também uma oposição amarga
entre o retrato de Marília e de Juliana de
Mascarenhas, esta que conquistará seu Quais os que tombam, em crimes
coração em Moçambique. exaustos, quais os que sobem,
purificados?”
 5-Conclusão e D. Maria 1 (romances
LXXXI-LXXXV + “Fala aos
Inconfidentes Mortos”)
Este é o encerramento do Romanceiro da
Inconfidência, com alguns poemas de
lamento e drama, refletindo de forma
dolorosa todo o conjunto da
tragédia mineira. Esta parte é curta.
D. Maria I é vista vinte anos depois, já no
Brasil e sua famosa loucura é
retratada, sofrendo daquilo que ela mesma
havia feito aos poetas, soldados e doutores
da Inconfidência e seus remorsos
levaram-na à morte.

A obra termina com uma homenagem


aos rebeldes chamada “Fala aos
inconfidentes mortos”.
“Grosso cascalho da humana vida…
Negros orgulhos, ingênua audácia, e
fingimentos e covardias (e
covardias!) vão dando voltas no
imenso tempo,

— à água implacável do tempo


imenso, rodando soltos, com sua
rude miséria exposta, Parada noite,
suspensa em bruma:

não, não se avistam os fundos


leitos… Mas no horizonte do que é
memória da eternidade, referve o

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