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Filosofia e seus filósofos, de um jeito simples

Prefácio
Ao longo da minha vida de professor de Filosofia tenho encontrado muitos “amantes da
Filosofia”. Parece pleonasmo: amante do amor à sabedoria! Melhor, são pessoas que se
simpatizam com a Filosofia, que têm um desejo, ainda que vago, de seguir o caminho da
sabedoria. Muito linda essa vontade, mas quero adiantar, é uma aposta perdida: a gente
nunca vai alcança-la! Então, por que se dar ao trabalho? Acredito que percorrer um caminho
que nunca chega ao fim, só vale a pena se for um caminho muito legal!

Tenho tentado, sem grande sucesso, confesso, mostrar aos alunos e a quem quer que me
pergunte, como é incrível o caminho da Filosofia. De um modo geral, os alunos se interessam
quando cai na prova e as demais pessoas conseguem se encantar por um tempo, digamos, em
torno de 15 minutos! Esse é, na minha opinião, o principal problema: a Filosofia só começa a
ficar interessante depois de um certo caminho percorrido. Quando, por exemplo, obriguei os
alunos a lerem Ética a Nicômaco de Aristóteles, a maioria odiou o livro e, por tabela, a mim.
Então me convenceram a cobrar o resumo apenas dos primeiros capítulos. Os poucos alunos
que realmente leram o livro todo consideraram um dos livros mais importantes da vida deles!

Na Filosofia é assim, o pouco é chato, o muito é encantador. O objetivo aqui é tentar encontrar
um meio-termo e, por favor, não confunda com a “justa medida” de Aristóteles! Há infinitos
livros de “filosofia para iniciantes”, estou ciente. Esse meio-termo passa por uma tentativa de
reproduzir o que acredito ser a parte mais interessante das aulas e das conversas sobre
Filosofia. Por isso é um texto coloquial, só quero ter uma conversa. Acredito que servirá para
as pessoas que já estão encantadas com o saber filosófico, mas que ainda estão na fase inicial.
Deverá servir para os alunos do Ensino Médio que se preparam para o vestibular.

No final, há um conjunto de textos com perguntas fechadas, com dois objetivos. O primeiro de
possibilitar ao leitor um contato, ainda que pequeno, com o texto original de alguns filósofos.
O segundo, diz respeito à própria essência da Filosofia, que é a construção de conceitos:
entenda como uma brincadeira para se verificar quais conceitos estão presentes naquele
trecho. Serve também como um treino para o ENEM.

Acredito que o conteúdo aqui apresentado seja bem sério. Mas não há preocupação com a
estrutura acadêmica ou com as normas da ABNT. Inclusive digo aos alunos: “não reproduzam
na redação o modo coloquial de o professor explicar na aula”. Espero que, com essa falta de
formalidade acadêmica, o texto a seguir seja um pouco menos indigesto. Faça bom proveito!

Introdução
Pra que serve a Filosofia? Pra nada! “Uma ciência tal, sem a qual, o mundo permanece tal e
qual”; muita gente adora essa definição italiana, embora tenha ouvido alunos a dizer: “não
entendi”. Aqui a resposta apenas se coaduna com a pergunta: quem espera da Filosofia uma
solução imediata já supõe sua inutilidade. Em primeiro lugar, Filosofia é uma busca gratuita de
“sabedoria”, de “conhecimento”, da “verdade”, chame como quiser! Em segundo lugar, a
Filosofia está na raiz de praticamente todo o conhecimento que a humanidade produziu;
então, serve pra tudo!

O que torna a Filosofia maravilhosa – ou chata, pode escolher – é que essa busca é
fundamental, vai à raiz dos problemas. Como assim? Nosso cotidiano utilitarista quer resolver
problemas imediatos. Não consigo imaginar problema mais fundamental que quando
relacionado à vida. “O que faço para sobreviver?” é, sem dúvida, uma pergunta fundamental,
mas, “o que significa sobreviver?” é uma pergunta que antecede e, sem a qual, aquela não faz
sentido. Acredito que todo amante da vida seja um amante do sentido da vida e, por
conseguinte, “amante da sabedoria”: philos sophia.

O que é Filosofia?
O que é, pois, Filosofia? Um caminho amoroso e constante de conhecimento, em busca dos
fundamentos; é “radical”, porque vai à raiz dos problemas; é uma investigação de rigor,
racional, argumentativa, explicativa; nasce da dúvida, da pergunta, e principalmente do
encanto. O filósofo nunca é indiferente, faz perguntas sobre tudo; reconhece seus limites,
busca mais que um simples conhecimento (como informação), busca a totalidade desse
conhecimento (sabedoria). Todos os temas fazem parte da investigação filosófica: ciência, arte
(estética), religião, mito, ética, política, cultura, linguagem.

A Filosofia, como investigação do Ser na sua totalidade, procura o sentido do mesmo Ser, o
sentido da realidade que nos cerca. É, portanto, diferente da Ciência, considerada
“conhecimento verdadeiro” (episteme) e especializado (foca sempre num único objeto),
frequentemente reconhecida pelo senso comum como “inquestionável”. Mas, assim como os
filósofos, os cientistas reconhecem os limites de sua investigação: ciência não tem acesso à
verdade, persegue a verdade – é “verossimilhança” – mas nunca chega nela. Se ciência
alcançasse alguma verdade estaria parada, completa; mas, ao contrário, está em constante
evolução e, por isso mesmo, nunca atinge o ponto final.

Verdade é um conceito que está fora da demarcação humana. Não há acesso a uma verdade.
Isso não significa que não exista. O problema não está na verdade, mas na condição humana.
Essa é uma afirmação cética? Melhor esclarecer. Ceticismo é uma das correntes filosóficas que,
por entender que seres humanos não alcançam a verdade, supõe que não exista. Se não há
verdade, tudo é convenção: a vida em comum – na polis (cidade) – é um exercício de
estabelecer limites e relações humanas, é, portanto, “política” e, consequentemente, ética. O
dogmatismo, ao contrário, é uma corrente, segundo a qual, o ser humano pode alcançar
verdades inquestionáveis, do tipo “dois e dois são quatro”. Ambas reconhecem tanto os
limites humanos quanto a necessidade de se buscar perenemente.

Segundo o filósofo neokantiano Ernst Cassirer (1784 – 1945) o conhecimento humano se dá


por diversas “formas” de acesso à realidade - formas simbólicas – que são basicamente mito,
ciência, arte, linguagem, ética, e a Filosofia faz a mediação intérprete de todas essas formas
culturais. Até aqui tudo bem; mas, por que o mito? Tanto a Filosofia quanto a Ciência seriam
justamente o oposto do mito: as primeiras são racionais, argumentativas, enquanto o mito,
como o próprio Cassirer admite, é “incoerente, caprichoso, irracional” (Mito do Estado, p. 36).
Parece confuso? Vai piorar!

Mito e Filosofia
A Filosofia nasce no seio do mito. Muitos autores falam do “milagre grego” porque tanto
histórica quanto geograficamente não faz sentido tamanha grandeza de conhecimento, tanta
genialidade quanto a que surgiu na Grécia a partir do século VI a.C. Acredito que a principal
“genialidade” da Filosofia surgiu antes dela, na mitologia grega. Ali os principais conceitos
abstratos foram formulados, tipo “espaço”, “tempo”, inclusive “número”, “alma”, e alguns
conceitos que não sei traduzir, como logos (palavra, razão, sentido), physis (natureza das
coisas), arché (princípio, origem, causa) etc. Histórias trágicas nos fazem pensar sobre o
destino, a fatalidade, a vida. O mito é brilhante, mas ainda assim não é lógico!

Mythos significa narrar, contar, grandes feitos. O modo de pensar do mito é narrativo, não
reflexivo. Os significados míticos não se determinam pela racionalidade. Muitos problemas
filosóficos surgirão a partir do mito. A Mitologia grega possui um caráter educativo e humano
de Hesíodo e de Homero que busca encontrar um significado para a existência humana. Suas
narrativas exploram temas dramáticos, tais como o destino imposto pelos deuses, culpa,
morte, sacrifício. Na história do Édipo, por exemplo, aparece um drama de o personagem, ao
tentar fugir do próprio destino, comete justamente o crime que tenta evitar (Sófocles, Édipo
Rei). Tais contos são mágicos, mas refletem a existência humana, trazem uma “verdade” que
não se determina pela racionalidade, porque a vida é onde há significação. Demorou muito
para que os filósofos percebessem que, para fazer sentido não precisa ser necessariamente
lógico. Ao meu ver, foi Schelling (1775- 1854), do idealismo alemão, o primeiro a investigar as
estruturas do mito, como a origem de todo o pensamento; para ele, não fomos nós que
inventamos o mito, ao contrário, a mitologia os tornou humanos: “é a mitologia se
autoexplicando” (Schelling, Filosofia da Mitologia, XII).

O mito tem a função de “fixar modelos exemplares de conduta humana” (Mircea Eliade, Mito e
Realidade, p. 8), o que não significa que sejam exemplos a serem seguidos: nos miramos
nesses exemplos e refletimos sobre a conduta que devemos observar, aprender com erros e os
acertos. O mito é uma leitura da realidade, “uma realidade viva” (p.23), é expressão de uma
verdade, já que a vida humana não pode ser entendida só pela lógica, nem computada por
algoritmos.

Quando a Filosofia grega surge, a partir do século VI a.C., acontece uma negação da
irracionalidade mítica. Os primeiros filósofos buscam uma explicação racional do mundo das
coisas, da vida etc., mas essas perguntas tinham sido feitas originalmente pelo mito. Portanto,
há uma negação do mito, no que diz respeito à sua irracionalidade, mas há uma afirmação do
mito, no que concerne aos temas, conceitos e problemas. Em suma, a Filosofia grega nasce por
causa do mito, mas busca superá-lo – e negá-lo – por meio de explicações racionais. Tal como
nas relações de amor e ódio, temos aqui uma relação de negação e de afirmação. Vai se
acostumando: a filosofia não nega as contradições humanas, enfrenta e as aprofunda!

Os primeiros filósofos gregos se perguntaram pelas causas primeiras (arché) por meio de
explicações naturais (e não mais sobrenaturais). Se o “arché” era entendido no mito como
“princípio”, agora adquire um sentido de “causa original”. Todo pensamento agora precisa ser
argumentado, explicado, fundamentado. O logos não é mais “palavra de poder mágico”, mas
palavra racional, que se recusa-se a aceitar as “explicações” sobrenaturais do mito. Temos
agora um discurso ordenado. O cronos não é mais um titã devorador, mas o tempo que nos
consome, condição de memorização ou de esquecimento; espaço não é mais delimitação
sagrada, mas cosmo (mundo ordenado) e lugar de exercício da vida pública (polis). O fato é
que os filósofos literalmente assaltaram os conceitos míticos e deram um sentido racional às
palavras que, até então, eram consideradas como parte do sobrenatural. E pensar que os
principais conceitos científicos foram frutos de um roubo!

Seguem alguns dos principais conceitos adotados pelos filósofos gregos: Alétheia (verdade),
doxa (opinião), cosmo (mundo ordenado), arché (princípio, causa originária), physis (natureza
das coisas, realidade no seu fundamento), ontos (ente, ser), polis (cidade, espaço de cidadania,
do exercício da democracia), cronos (tempo marcado, medido), kairos (tempo da oportunidade
da ação humana).

Filósofos “Pré-socráticos” – Período Cosmológico


Os primeiros filósofos costumam ser chamados de “pré-socráticos” e fazem parte do “Período
Cosmológico”, por tentarem explicar racionalmente as características do universo. O que há de
comum entre eles é que se perguntam pelas causas naturais, ou causas originárias (arché) e
pela “natureza das coisas” (physis), em vista de uma explicação unitária do mundo. Os três
primeiros foram os sábios (séculos VII e VI a.C.) da cidade de Mileto, atual Turquia. Tales teria
sido o primeiro a tentar entender os fenômenos como naturais (nesse sentido seria o primeiro
“cientista”). Fez contribuições na engenharia, matemática, astronomia e política. Para ele o
arché é a água, possivelmente por entender a umidade como fonte originária da vida. Ainda
que pareça absurda a proposição “tudo é água”, ele diz algo sobre a origem das coisas e o faz
sem fabulação, mas o que o torna realmente filósofo está no fato de iniciar o pensamento
“tudo é um” (Nietzsche, A filosofia trágica dos gregos, III). Para Anaximandro o princípio é o A-
peiron, literalmente “não privado de limites”, o infinito e, portanto, o indeterminado, porque
está além da compreensão humana. Para Anaxímenes é o Ar, como princípio da
indeterminação, mais sutil que a água e, ao mesmo tempo infinito e ilimitado, pelo menos na
compreensão da época.

Pitágoras de Samos (séculos VI e V a.C.) teria sido cientista, no sentido moderno da palavra,
devido ao fato de ser o primeiro a delinear a escala musical, relacionando as proporções
matemáticas com os sons produzidos pelos instrumentos; por exemplo, quando se pressiona
num violão três quartos do tamanho da corda, produz um som (em relação ao som da corda
solta) que os músicos chamam hoje “uma terça”, pressionando na metade da corda produz
“uma oitava”. Em outras palavras, Pitágoras descobriu que a relação agradável (harmônica)
entre os sons obedece a uma proporção matemática, isso foi genial! Como os egípcios,
Pitágoras era uma mescla de matemático com religioso e seguia uma religião denominada
“Orfismo” como um caminho de purificação (vida contemplativa = bios theorétikós). Para ele o
arché é o “número” (arithmós), no sentido de relações. Encantado com as proporções do
universo, Pitágoras afirmava “tudo é número”. Nem precisa dizer sobre a importância do
“Teorema de Pitágoras” para a geometria e a matemática!

Uma pergunta comum desse período é “o que muda” e “o que permanece”? Essas constituem
o que chamamos hoje de “Problema Ontológico” (ontos = ser, juntamente com logos dá um
sentido de “investigação da realidade”). Uma outra pergunta deriva dessas duas: “como
podemos conhecer tais fenômenos”? Heráclito, de Éfeso (355 – 475 a.C.), dá uma resposta
radical: Tudo muda, literalmente “tudo flui”. Quando lhe perguntaram: “há algo que não
mude?”, ele respondeu, “sim, a mudança”!

“Não se pode descer duas vezes no mesmo rio e não se pode tocar duas vezes uma
substância mortal no mesmo estado, pois, por causa da impetuosidade e da
velocidade da mudança, ela se dispersa e se reúne, vem e vai. (...) Nós descemos e não
descemos pelo mesmo rio, nós mesmos somos e não somos”

Quando se volta ao um mesmo rio, ele não é mais o mesmo (aquelas águas se foram), e nós
também mudamos. Ora, a mudança implica no contrário (era uma coisa, mudou, agora é
outra); mas há, para ele, uma “harmonia nos contrários” e a unidade dos opostos é Deus.
Quando lhe perguntaram “como você sabe que tudo muda?”, ao invés de responder o óbvio
(“olhe o mundo ao seu redor”), ele foi ainda mais brilhante: “busquei em mim mesmo”. Isso
significa que o princípio da mudança está no pensamento, no logos, então o mesmo princípio
está no dia (dois)-logos. Pensamento é, portanto, diálogo, e diálogo só faz sentido se houver
“dois lógos”, isto é, diferença. Sendo assim, o pensamento não somente capta os contrários,
como é oposição, é diálogo. Acredito que, para Heráclito, um dicionário de antônimos seja
mais esclarecedor que o de sinônimo! O arché, então, é o “fogo”, por razões óbvias.

Parmênides, da cidade de Eléia (atual sul da Itália) teria vivido entre 510 e 470 a.C. Poeta
revolucionário, foi o primeiro a pensar o “princípio de identidade” da lógica. Opôs-se
totalmente a Heráclito ao negar a mudança. Corajoso esse senhor! Parmênides lembra que o
“o ser é” (existe), e não pode simplesmente deixar de ser. Ora, o que não é (não existe) não
pode simplesmente surgir do nada, isto é, não pode “vir a ser”. Portanto, para ele, o princípio
da mudança é a própria negação da existência, e mais, é a negação da racionalidade! Nessa
hora os alunos costumam dizer: “Para! Explica de novo”! Para ele a questão é simples:
mudança é contradição. O pensamento não admite contradição. Portanto, o pensamento não
admite mudança. Como se explica, então, a mudança que acontece no dia-a-dia? Se o mundo
entra em contradição com o pensamento, então o mundo não é real! Parmênides inicia uma
diferença que depois será explicitada por Platão, entre “mundo ideal” e “mundo sensível”. O
mundo sensível (aquele que chamamos “mundo real”) passa pelos nossos sentidos e,
portanto, nos enganam. Se não podemos confiar num mundo do engano, só nos resta a
certeza do mundo ideal, do que nos diz a razão. Se a razão entra em contradição com o que
vemos no mundo, Parmênides fica com a razão. Pagou um alto preço esse pensador,
certamente muita gente não gostou dessa ideia! O arché é, portanto o próprio Ser. Nasce
definitivamente Ontologia, e essa palavra “Ser” (o que é, a realidade etc.) vai dar o que falar!

Pra piorar as coisas, seu discípulo, Zenão de Eleia, refuta “matematicamente” o movimento.
Esses caras são loucos? Talvez. Mas ninguém me muda opinião que esse louco estabeleceu as
bases do que será chamado hoje “integrais e derivadas”, assunto tão caro para o pessoal de
exatas. Ele criou possivelmente os primeiros “paradoxos”, contradição, literalmente “opiniões
contrárias”. A explicação mais simples é o chamado “da dicotomia”, segundo o qual,
teoricamente se pode dividir um segmento de reta na sua metade, na metade da metade, e
assim sucessivamente, e se poderia ser subdividido infinitamente, é porque qualquer
segmento de reta tem infinitos pontos. Ora, como seria possível percorrer o infinito para ir a
qualquer distância? Portanto, não existe o movimento (ou não existe a subdivisão, nem o
infinito). Isso é realmente muito louco! Mais conhecido é o paradoxo do “Aquiles e a
tartaruga”. Se Aquiles saiu atrás da tartaruga, ao chegar no ponto em que ela estava, a mesma
tartaruga teria andado um pouco; ao chegar no novo ponto, ela andou mais um pouco e assim
ele nunca alcançaria a tartaruga, ficaria perseguindo-a em direção a um ponto zero-infinito.
Aqui tenho certeza absoluta que o leitor dirá “não entendi nada”. Dificil! Sugiro que pergunte
ao seu professor de matemática, de física ou a um amigo do ramo.

Até aqui os pensadores são todos considerados “monistas” (mono = um), porque entendem
que tudo tem uma única causa originária. Há um outro grupo dos chamados “pluralistas”, que
entendem não haver um só arché. Vamos a eles.

O primeiro pluralista foi Empédocles de Agrigento, Sicília (484 – 424 a.C.). Para ele, a origem
não depende do “nascer” ou “perecer”, mas do compor-se e desagregar-se dos quatro
elementos originários, “raízes de todas as coisas”: ar, água, terra, fogo. São governadas por
amor (que agrega e leva à unidade) ou pelo ódio (que desagrega e gera o Caos). Para
Anaxágoras de Clazômenas, Jônia (500 – 428 a.C.) esse agregar e desagregar acontece por
unidades básicas, sementes (spérmata), que ele chama homeomerias (partes qualitativamente
semelhantes) que são os “originários qualitativos”. Assim, por exemplo, o que há no pão há
também no cabelo, na carne, se não fosse assim, como o pão se transformaria na carne e no
cabelo? Então, “tudo está em tudo” (em cada coisa há parte de toda coisa). Isso aí dá o que
pensar! Mas essa composição só é possível se ordenada por uma inteligência ilimitada (Nous),
conforme o fragmento:

"Todas as outras coisas têm parte de cada coisa, mas a inteligência é ilimitada,
independente e não misturada a coisa alguma, mas encontra-se apenas em si
mesma. Com efeito, se ela não estivesse em si, mas misturada com alguma outra
coisa, participaria de todas as coisas, caso estivesse misturada com alguma. De fato,
em tudo se encontra parte de cada coisa, como já disse, e as coisas misturadas
seriam um obstáculo para ela, de modo que não teria poder sobre alguma coisa
como tem encontrando-se apenas em si mesma. Com efeito, ela é a mais sutil e a
mais pura de todas as coisas e possui pleno conhecimento de tudo e tem força
imensa. E todas as coisas que têm vida, as maiores e as menores, são todas
dominadas pela inteligência".

Pessoalmente acredito que o conceito de Anaxágoras se aproxima muito mais do conceito


atual de átomo (já que prótons, nêutrons e elétrons são qualitativamente iguais, mas se
diferem na quantidade) do que o conceito de átomo que veremos a seguir. Em todo caso, seria
feio chamar elementos químicos de “homeomerias”. Átomo é um bom nome e seu conceito é
brilhante!
Leucipo e Demócrito foram a última tentativa de responder ao problema deixado pelos
eleatas Parmênides e Zenão. Leucipo (século V a.C.), nascido em Mileto e estabelecido em
Abdera, possivelmente foi o primeiro a formular o conceito de átomo, que foi elevado ao mais
alto nível pelo seu discípulo Demócrito de Abdera (460 – 370 a.C.). Para ele, uma pedra não
poderia ser quebrada indefinidamente, pois seria contraditório um “final” infinito encerrado
num nada. Logo teria que chegar a um último fragmento inquebrável (átomo = não divisível
em partes). Para que haja movimento desses átomos é necessário o vazio, dentro da qual a
matéria possa se deslocar. Átomos são diferentes entre si, não podem ser percebidos pelos
sentidos, mas somente pela inteligência. Para ele, o cosmo (Universo) é formado por um
turbilhão infinito de átomos. Demócrito terá grande influência sobre Protágoras e Epicuro, que
veremos a seguir.

Período Antropológico – Sofistas e Sócrates


Por que será que a Filosofia nasceu e se desenvolveu longe de Atenas, o centro da cultura
grega? Possivelmente porque a genialidade dos primeiros filósofos necessitava de liberdade de
pensamento, o que certamente não aconteceria próximo ao centro de poder da Grécia. Com a
crise da aristocracia, e o “século de Péricles” houve não somente um grande investimento na
cultura grega, mas, principalmente, a democracia! Agora todos podem expressar suas ideias, é
o poder do “demos” (povo, massa). Houve por isso grande fluxo da população para as grandes
cidades, especialmente Atenas, o que aumenta o pluralismo de ideias e, assim, a vida do
cidadão, a “virtude política” (polis = cidade) é relativizada pela variedade de costumes e de
culturas. Surge assim uma nova pergunta-problema: seria possível a existência de valores
eternos e universais? É o ambiente propício para o surgimento dos sábios (sophos) com mente
aberta e inovadora.
Sofistas são esses sábios, que não ligam mais para as questões da natureza, concentram agora
seus interesses para a vida na polis, para o próprio homem, uma radical inovação do “cosmo”
para o “antropos” (ser humano). Possuem a arte de educar, de preparar para a vida política.
Eles instauram um clima cultural tão inovador que pode ser comparado com o moderno termo
"iluminista". Como agnósticos são críticos da religião (sendo Deus desconhecido é inútil
discutir sua existência). Inauguram um “certo ceticismo” segundo Copleston, ou um
“relativismo”, ou seja, a busca pelo “relativo mais útil” segundo Reale e Antisseri. O fato é que
eles põem em dúvida o conceito de verdade e de bem absolutos. Destroem a imagem
tradicional do homem ideal, sendo a virtude “política” o objeto do próprio ensino; são, por
isso, mestres de virtude, no sentido utilitarista. São expressão da crise da aristocracia e da
ascensão política das novas classes. Protágoras, o mais importante dos sofistas, é o relativista
ocidental: “o homem é a medida de todas as coisas”, e o primeiro agnóstico “dos deuses não
podemos dizer que eles existem nem que eles não existem”. Virtude é o que é útil e não
danoso: “tornar mais forte o argumento mais fraco”. Górgias expressava seu ceticismo com
maestria: “o ser não existe e o nada existe” e, se existisse, “não seria compreensível” e, se
fosse pensável, “não seria comunicável”. Inaugura o niilismo (nada como fundamento de
tudo). Oratória tem fundamento estético, é uma arte! Pródico descobriu a sinonímia: técnica
dos sinônimos com diferentes nuanças e sutilizas para tornar mais convincente os debates
públicos. É tão utilitarista quanto Protágoras. De Crítias conhecemos a frase ironizada por
Platão, mas que pode servir, inclusive, de crítica: “justiça nada mais é que a vontade do mais
forte sobre o mais fraco”. Hípias e Antifonte são os sofistas naturalistas que formulam teorias
políticas em base às leis da natureza: “cosmopolitismo” e “igualitarismo”.
É muito comum que se use a expressão “sofisma” no sentido de enganação, de “falácia” que é
a tentativa de induzir alguém ao erro. Essa é a impressão que se tira a partir de vários diálogos
de Platão. Hoje a maioria dos autores não pensa mais assim. Os principais filósofos gregos
herdaram da sua mitologia uma tendência para a alethéia (verdade). Mas os sofistas fazem
parte de um outro “time” de filósofos, digamos assim, que herdou o conceito oposto: lethé
(engano, encobrimento) que se vinculava ao princípio do convencimento e da sedução. Na
prática democrática esses filósofos adotam um conceito chave: doxa (opinião). Na prática
democrática é essencial que as opiniões sejam partilhadas e, é claro, sejam mais ouvidas se
melhor expressas. Na democracia, toda “verdade absoluta” (isso é um pleonasmo!) deve ser
descartada porque só seria aceita se imposta. Esses pensadores nos ensinaram a força e o
poder da palavra sobre o outro. Hoje diversos profissionais, não somente políticos, mas
advogados, vendedores, palestrantes, professores etc. terão melhores resultados quanto mais
souberem se expressar, ouvirem e serem ouvidos. Os sofistas merecem nosso respeito!
Se conseguimos desenvolver uma grande simpatia pelos sofistas, vamos conhecer seu maior
crítico: Sócrates (470/469 – 399 a.C.). Ele é um homem ético por excelência, que busca uma
justificação filosófica, um fundamento da vida moral. Para ele a essência do homem é sua
alma, sua consciência intelectual e moral (capacidade de entender e de querer). Sempre
repetia a frase do oráculo de Delfos “conhece-te a ti mesmo”, como direção da virtude
intelectual e moral. Virtude ética é busca de conhecimento. Ninguém peca voluntariamente,
mas só quando confunde bem com mal. Liberdade interior é autodomínio. Alma racional só é
livre quando supera paixões e instintos. Felicidade é o prêmio da virtude, morrer não é mal.
Deus é causa de todo o bem.
Pode parecer contraditório, mas o ponto de partida de Sócrates é o reconhecimento da
própria ignorância, “tudo o que sei é que nada sei”. Imagino que, assim como o primeiro passo
alcoólatra é se reconhecer viciado, da mesma forma, buscar conhecimento (que é o mesmo
que buscar a virtude) só será possível se nos reconhecermos ignorantes. Na Apologia de
Sócrates, obra de Platão, ele se explica que, por saber que era ignorante, passou a dialogar
com pessoas supostamente mais inteligentes que ele e, por isso, desenvolveu o método do
diálogo, inspirado em Heráclito. Só que ele percebeu que as pessoas eram ainda mais
ignorantes que ele, e que sua maior sabedoria era de reconhecer-se ignorante, coisa que a
maioria das pessoas não eram capazes de entender. Quase dois mil e quinhentos anos depois
e não mudamos nada!
Quando Sócrates se deparava com supostos sábios ele fazia tantas perguntas que fatalmente,
em algum momento, caiam em contradição. Por isso, a primeira parte do seu método era a
ironia e a refutação, dedicada especialmente aos que se acham donos do saber. Mas o maior
dom de Sócrates está na segunda parte de seu método, a maiêutica, literalmente arte de fazer
parto, isso mesmo (como um obstetra!), só que ele fazia “parto de ideias”. Para ele isso era um
“dom divino”, trata-se de um talento único de saber fazer as perguntas certas e fazer com que
seu interlocutor fosse por si só desenvolvendo conhecimento. Assim, ao expor e definir
precisamente os conceitos envolvidos num diálogo e ordená-los de maneira lógica, as ideias
são naturalmente paridas! Depois só faltava avaliar os resultados para verificar se as ideias
“paridas” eram boas ou não. Enfim, conhecer o bem exige querer, querer de verdade. Quando
perguntaram a Sócrates se ele podia conversar com alguns políticos corruptos, para ver se eles
melhorassem um pouco na índole, Sócrates respondeu: “não adiantaria, eles não estão
grávidos de conhecimento”.

Platão: teoria das formas


Possivelmente a maior questão filosófica de todos os tempos foi introduzida por Platão
(428/427 – 347 a.C.). Seus escritos reproduzem o método dialógico (de Sócrates). Dos vários
escritos de Platão, um que se destaca é a República, uma obra de filosofia, de política, de ética,
teoria do conhecimento... tem muita coisa ali! No que seria o capítulo (“Livro”) VII há um
diálogo entre dois personagens, Sócrates e Glauco, na célebre Alegoria da Caverna, considero
uma “experiência mental”, no sentido de Einstein. Vou contar do meu jeito.
Imagine que pessoas viviam desde o nascimento, acorrentadas numa caverna, só olhando
para as sombras produzidas por coisas entre um fogo e a parede do fundo. Se essas
pessoas nunca viram nada além disso, não acreditariam que “sombras” são a única e a
“verdadeira” realidade? Será que o mundo que vemos, ouvimos e no qual acreditamos
seja apenas sombra da realidade? Será que as pessoas acorrentadas, que nunca se viram,
não pensem que sejam elas próprias sombras? Por favor, não precisa responder às
perguntas retóricas!
Imagine que um deles se solte, e descobre que há pessoas e coisas na caverna que são
reais e não as meras projeções da luz do fogo. Imagine que essas pessoas passem diante
do fogo produzindo imagens diversas para iludir os prisioneiros. Quem faria uma coisa
dessas? Conheço um monte de gente com poder para tal: meios de comunicação, redes
sociais, cineastas, propagandas políticas etc. Sem querer acusar ninguém, no mundo da
caverna é fácil de se enganar! Tá! Imagine que essa pessoa que se soltou conte aos outros
acorrentados que há outra verdadeira realidade, os prisioneiros acreditariam? Deixa que
eu respondo, claro que não!
Imagine que esse recém liberto resolva sair da caverna. Certamente sentiria medo do
desconhecido, sentiria muita dor na vista por nunca ter visto a luz do sol. Os que nunca
saíram, as pessoas dentro da caverna, achariam que ele é corajoso, consciente, ou que é
um louco? Sejamos sinceros; o fato é que tratamos como loucos aquelas pessoas que
enxergam mais do que a gente!
Voltando ao ex-prisioneiro que sai da caverna, no início ia preferir o dia ou a noite? No
início, seria mais fácil olhar para as coisas ou para as sombras das coisas? Pra se descobrir
grandes coisas é preciso ir devagar. Há que se passar por um processo (pedagógico) que
exige grande esforço, determinação e perseverança. Mas, supondo que, aos poucos, da
noite para o dia, das sombras para as coisas, consiga ver o mundo total, na sua
maravilhosa riqueza de cores e de formas. Nesse caso, ia querer ficar nesse mundo lindo
ou voltar para aquela caverna horrível? Suponha que ele volte para a caverna. Para que,
se nem os amigos acorrentados acreditaram? Não temos resposta. Tudo o que sabemos é
que professores e educadores tentam teimosamente mostrar um mundo diferente, sobre
qual quase ninguém quer ouvir. Quando essa pessoa voltar para a caverna, com a vista
desacostumada com a escuridão, andaria tranquilo pelo escuro ou desajustado,
tropeçando em tudo? E as pessoas que nunca saíram da caverna? Só teriam a confirmação
do que “já sabiam”: saiu louco e voltou pirado. Ninguém pensaria que seria uma coisa
boa.
E se essa pessoa, sabendo que não seria acreditada, tentasse à força levar seus amigos
para fora da caverna, possivelmente reagiriam até com violência, matando-o, se preciso,
para se defender de um “louco homicida”. Minha opinião sobre o que Platão pensava da
morte de Sócrates é que os que o condenaram à morte o fizeram em legítima defesa!
Acredito que muitos mártires foram condenados à morte por gente que “só estavam se
defendendo”.
O mito para Platão tem valor de conhecimento, no sentido pedagógico, como complemento ao
logos, tanto que ele mesmo criou vários mitos. Mas a alegoria da Caverna não é um mito, é um
itinerário para se entender sua “Teoria das Formas”. Platão retoma o problema do ser
imutável de Parmênides e descobre a realidade superior, “mundo das formas” ou “mundo
inteligível”, em contraposição à aparência de realidade ilusória do “mundo sensível”, lugar do
senso comum, da opinião (doxa). Para ele, no topo do mundo inteligível das formas está a
ideia de Bem, Sumo Bem e, no nível mais baixo desse mundo, está a matemática e a geometria
(aquelas sombras das coisas, fora da caverna). O filósofo deve ter a coragem, o autocontrole, a
austeridade, a virtude (areté = ascese) de romper as algemas da caverna para transcender o
mundo da verdadeira realidade.
Para Platão, o mundo que conhecemos no tempo e no espaço é uma cópia do mundo
inteligível, elaborada pelo deus artesão (Demiurgo) que se baseou na contemplação
(theoréticos) do mundo ideal. Então, o mundo em que vivemos é cópia do mundo ideal. Para
ele, conhecimento é recordação de verdades conhecidas desde sempre pela alma (almas são
imortais, contemplaram as ideias antes de descer para um corpo). O caminho do
conhecimento é a dialética, que vai desde a opinião (doxa) até o conhecimento verdadeiro
(episteme) em busca da verdade (alétheia). Se o mundo sensível é cópia, então arte é cópia de
uma cópia, imitação de uma imitação. E a poesia precisa ser criticada, porque é cópia de
emoções, de paixões (patos, da qual veio o termo patologia). Assim a verdadeira beleza não
deve ser procurada na estética (aestésis = percepções), mas na erótica (“amor platônico”): Eros
é um mediador que nos eleva do Belo ao Bem. Sua antropologia é dualista: corpo e alma.
Corpo é prisão, túmulo da alma imortal (mito de Er e o mito do carro alado). O filósofo não
teme a morte, até a deseja!
Na obra A República Platão apresenta um modelo político do Estado ideal, dentro do qual os
cidadãos acompanham os estados da alma: temperança (trabalhador artesão-comerciantes),
coragem (guardas-soldados) e sabedoria (rei-filósofo ou governantes sábios capazes de
alcançar uma sociedade justa). Para organizar esse Estado propõe uma educação própria, artes
cênicas e musicais, ética e vida simples. Os sófos-governantes devem ter uma educação longa,
pelo exercício da dialética, até alcançar o sumo Bem. Devem ser priorizadas as leis e a justa
medida contra os excessos.

Aristóteles: Ciência, Metafísica, Ética, Estética, Política.


Aristóteles (384/383 – 322 a.C.), foi discípulo da Academia, admirado por Platão desde jovem.
Com a morte de Platão, Aristóteles abandonou a Academia e fundou uma escola em Assos.
Mais tarde foi convidado por Felipe da Macedônia para educar seu filho Alexandre, então com
treze anos. É uma pena que pouco se sabe sobre o encontro de dois dos maiores personagens
de todos os tempos: o filósofo e o estadista! Voltando a Atenas, fundou sua mais importante
escola, alugando um espaço ao lado do templo de Apolo Lício: ficou conhecido como o Liceu, o
lugar dos peripatos, os caminhantes, ele ensinava caminhando pelo jardim.
“Aristóteles foi o mais genuíno discípulo de Platão” (Diógenes de Laércio), não porque repetiu
o mestre, mas porque o superou! Ele abandona o aspecto místico-religioso de Platão, mas
demonstra um escasso interesse pela matemática e dá mais atenção às ciências naturais e
empíricas. Abandona o modo dialógico de Platão e apresenta o método sistemático. É
complicado falar de Aristóteles em termos simples porque sua investigação envolve tudo.
Como assim, tudo? Isso mesmo, tudo o que foi possível se investigar, na sua época, ele não
deixou passar. É muita coisa. Mas, interessante é que seu pensamento não é um amontoado, é
um sistema, isto é, todos os temas estão conectados.
Ele tinha um problema. Embora soubesse de Platão que o mundo sensível é ilusório, sabia que
não podia confiar só nas ideias. O mundo é fonte de conhecimento. Basta observar os seres
vivos, não dá para entender sua estrutura biológica (bios = vida), sem observá-los. Precisava de
um sistema que vinculasse o mundo ideal ao mundo sensível. Entre muitas investigações, ele
estrutura o que hoje chamamos de Lógica (ele usava o termo análysis, “analítica”), a
propedêutica de todas as ciências, a base formal do pensamento. A lógica verifica a coerência
formal, independente do conteúdo. Seu objetivo era estabelecer um método para relacionar o
universal dos conceitos teóricos ao particular da experiência. Nessa relação universal-
particular, teórico-empírico, há dois caminhos diferentes, mas complementares: a dedução
(syllogismós) extrai conclusões necessárias a partir de premissas universais, e a indução parte
de proposições singulares para delas extrair leis gerais. Caso esse enunciado tenha deixado
dúvidas, sem problemas, ia precisar mesmo de um outro livro para explicar, um de Lógica.
Aristóteles é o pai da lógica!

Dois conceitos chaves podem ajudar na compreensão do filósofo e estão presentes em todo o
seu pensamento. Substância (ousia), é uma “essência necessária” (Metafísica 1017b e 1029b),
“aquilo que o Ser é”, que no fundo é o próprio objeto do conhecimento científico. Fazer
ciência nada mais é que uma tentativa de conhecer a realidade, não de modo superficial, mas
na sua essência. Telos, fim, finalidade, término como perfeição é o outro conceito: para ele,
todo o movimento é uma passagem da imperfeição para a perfeição. Isso explica o paradoxo
entre, de um lado, o mundo perfeito e estático de Parmênides e, de outro, o mundo dinâmico
e mutável de Heráclito. Movimento é, pois busca de perfeição; não existiria se vivêssemos num
mundo perfeito. E a lógica, citada há pouco, é um método científico para relacionar o
particular do mundo sensível em movimento à perfeição universal e estática dos conceitos
teóricos.
Aristóteles classifica as ciências como: 1. Teoréticas (saber pelo saber); 2. Práticas, que são a
ética e a política (saber “prático” como perfeição moral) e 3. Poiéticas (poiese = produção).
Para ele, a Metafísica1 é a “Filosofia Primeira”, a ciência de todas as causas e da relação de
todas as ciências: a) causas supremas, b) o “ser enquanto ser”, e c) a substância. O Ser é uno (a
realidade é única), mas tem muitos significados: a) dizem respeito ao ser em si, são as
categorias (substância ou essência, qualidade ou predicado, quantidade ou número, relação,
ação, paixão, onde ou espaço, quando ou tempo, ter, jazer); b) potência e ato (Metafísica
1047-8), a semente é potência da árvore e árvore é a atualização final); c) ser acidental (em
oposição ao essencial); d) ser como verdadeiro (não-ser como falso). Substância é “o que é”,
união de matéria e forma, ato e potência (exemplo da estátua). Por fim, cabe aqui uma

1
O termo deriva do grego tá metá tá física, cujo sentido é “além da física”. Sua origem é um tanto
ridícula: classificando os livros de Aristóteles, o bibliotecário de Alexandria colocou provisoriamente os
livros de “filosofia primeira” na estante depois dos de física, por isso “depois da física”. Parece que o
nome agradou aos propósitos da Filosofia!
referência à famosa teoria das quatro causas. Fica fácil com o exemplo que ele mesmo dá: a
estátua. São elas: formal (a própria forma da estátua), material (o mármore ou o bronze),
eficiente (escultor) e final (o telos, a finalidade estética, memorial, simbólica pela qual uma
estátua é esculpida). Conhecimento científico é, portanto, conhecimento causal. Aristóteles dá
continuidade ao arché, como “causas originais” dos pré-socráticos e corrobora no conceito de
causa e efeito da ciência moderna.
A realidade mais perfeita é o ser vivo e o ser humano é o ser vivo mais inteligente. Deus é
inteligência e vida, causa da perfeição, motor imóvel (causa do movimento), causa das causas.
Tudo tem uma finalidade (telos) e Deus é a finalidade última. Para ele, a física estuda a
natureza do movimento, a passagem de uma forma de ser para outra forma de ser, de
potência para ato: geração / corrupção, alteração ou mudança, aumento / diminuição ou
translação. Aristóteles estudava o que hoje chamamos de “força gravidade”, só que, para ele,
era o deslocamento dos corpos para seus telos, lugares absolutos.
Talvez, o problema do infinito, que para ele não existe em ato (Metafísica 1066b), é o que
tenha desanimado Aristóteles nas suas investigações matemáticas. Preferiu negar a existência
do infinito em ato (atualidade), por ser contraditório; existiria apenas em potência, na mente.
Assim também números e figuras geométricas são “potências da mente”, não seres. Seres
animados tem por causa o princípio da vida: alma, (enteléquia = ato da perfeição de um
corpo). Assim, corpo é matéria da alma (forma). Vegetais só têm alma vegetativa, há também
a alma sensitiva (animal tem os dois) e a mais complexa é a alma inteligível (ser humano possui
as três).
Ética e Política são, para ele, “ciências práticas”. Todas as ações tendem a um fim (telos) que é
a felicidade (eudaimonia), que não é riqueza, nem fama, nem saúde, mas um “estado da alma”
que é a realização da sua natureza racional. Para isso a alma submete a sensibilidade às
virtudes éticas, “justa medida”, meio termo entre o excesso e a falta; assim, por exemplo,
coragem é justa medida entre covardia e temeridade (imprudência). Os conteúdos de ética
estão presentes na mais importante obra de Aristóteles, Ética a Nicômaco. Nicômaco era o
nome do filho dele e, por acaso do pai dele. Gosto de pensar que certo (ético) é tudo aquilo
que quero para o meu filho e que gostaria de contar para meu pai!
Homem (antropos) é “animal racional” e “animal político” por natureza, mas, na polis, é
somente aquele que goza de plenos direitos políticos: assim, colonos e escravos não são, para
ele, homens propriamente ditos, mas instrumentos inanimados! Modelos políticos são
monarquia (X tirania), a aristocracia (X oligarquia) e politia ou democracia sob leis (X
demagogia). Seus desvios acontecem quando movidos por interesses privados. Penso que o
maior limite de Aristóteles está no fato de entender como normal, a escravidão e as
desigualdade entre seres humanos; devia aceitar, portanto, a existência mais de uma natureza
(physis) humana.
Por fim, a arte, para ele, tem valor catártico (purificatório), é imitação sim, mas imitação
criativa, que tem a função de libertar o ser humano das paixões, porque promove o prazer
estético.

Período helenístico-romano
Nesse período permanecem a Academia de Platão e o Liceu de Aristóteles, mas, for falta de
originalidade, caíram no esquecimento. Com a morte de Aristóteles, a Grécia perde o último
dos seus maiores gênios, de uma sucessão impressionante de gênios. Possivelmente, a falta de
novos talentos, ao menos do nível a que se chegou até aqui, ou a crítica a eles (como é o caso
de Diógenes) levou os sucessivos pensadores a se concentrarem no modelo de sábio, como
vida serena, imperturbável (ataraxia). Essa é a nova “regra de ouro”: a imperturbabilidade
individual. Toda vez que o assunto era sobre ética, a política vinha junto. Ética e política são
inseparáveis. Mas a novidade desse período consiste na passagem de uma ética da polis para
uma ética individual. Ideal da polis muda para o ideal “cosmopolita” (o mundo todo é uma
polis); o homem-cidadão muda para o homem-indivíduo. Com as novas exigências surgem a
filosofia epicurista e a estóica; o ceticismo é resgatado dos sofistas e o cinismo, fundado por
Antístenes, depois da morte de Sócrates, e refundado por Diógenes, que era contemporâneo
de Platão.

Cinismo, ou anticulturalismo. Trata-se de uma corrente que nasce bem antes, mas antecipa o
problema da ética individual e continua pelo helenismo. Diógenes de Sínope (412 a 323 a.C.).
era aquele cara bizarro, que vivia num barril, sem muita higiene, pobre por opção. Há muitas
anedotas sobre ele. Dizem que um dia roubaram seu barril a única coisa que tinha. Quanta
maldade! Sacanagem, como diriam os jovens. Mas ele achou graça e retrucou: “o cara deve
estar precisando mais do que eu”. Dizem também que o próprio Alexandre, mais tarde
chamado de “o grande” (aquele conquistador que foi educado por Aristóteles), impressionado
com as ideias de Diógenes, aproximou-se e exclamou: “peça-me o que quiser” (típico de gente
poderosa!), mas Diógenes só pediu para ele sair da frente, estava tomando sol: “então, por
favor, não me tire o meu sol”. Pode uma coisa dessa?! Não lhe interessava nenhuma riqueza,
felicidade só é alcançada por uma vida simples, fora dos padrões; para ele é inútil também a
pesquisa intelectual. Seu ideal de vida é a autarquia (governo de si mesmo), bastar-se a si
mesmo, ser independente de todos, até das regras. Foi grande crítico das instituições e da
sociedade corrupta. Liberdade, para ele, só é possível pelo domínio dos prazeres: quanto mais
se eliminam as necessidades, mais livre se é. O livre direito da palavra e da ação tinha sempre,
em Diógenes, um caráter provocador, ele era mesmo um antissocial.

Hedonismo. Para Epicuro de Samos (341 a 270 a.C.), filosofia é lógica, física e ética. De
Sócrates aprendeu a ética e a arte de viver. Ao retomar a teoria atomista de Leucipo e de
Demócrito, ele estreita a relação entre felicidade e prazer. Dor e prazer nascem das sensações
e servem de fundamento para a ética afim de julgar o bem e o mal: opiniões verdadeiras são
confirmadas pelas sensações, as falsas não. Verdadeiro bem é o prazer, como ausência de dor.
A vida imperturbável, a ataraxia é alcançada pela moderação dos prazeres naturais
necessários e pelo abandono dos prazeres não necessários, como excessos, honra, riqueza,
poder. Não acreditava na imortalidade, morte é ida para o nada, mas liberta a alma dos males,
é um bem, portanto. Dor, se suportável é boa; se insuportável, leva à morte, que também é
um bem! Vida pública (política) só traz perturbação. A amizade deve ser a única ligação entre
as pessoas. São quatro os remédios para os males do mundo: 1. não temer deuses, nem o
além; 2. não temer a morte; 3. saber que prazer justo (moderado) está à disposição de todos;
4. não temer a dor, ela é breve ou suportável, nos dois casos é boa!

Estoicismo. A Estoá (pórtico), uma escola fundada por Zenão de Cício (333/332 a.C. – 262 a.C.)
entende que a razão (logos), ao contrário de Epicuro, é a que aprova ou reprova as sensações.
Se aprovada, torna-se intelecção ou conceito e, uma vez ordenada pelo silogismo (Lógica),
torna-se universal. Toda a Estoá (estoicismo) aceitava a divisão da Filosofia em Lógica, Física e
Ética. A verdade é material, “é um corpo”. E o corpo produz em nós noções inatas. Há,
portanto, conceitos que são universais e incorpóreos, num sentido negativo, como “realidade
empobrecida” (um ser só ligado ao pensamento). Ser é corpo e logos é semente (spermata) de
todas as coisas. Deus é logos presente no mundo todo (panteísmo = tudo é Deus). Todo ser
vivo deve viver segundo sua natureza: a natureza do homem é racional, logo, virtude é bem,
vício é mal. O Cosmo é um grande organismo vivo, tudo é vida (hilozoísmo). Condições físicas
são indiferentes, mas as que prejudicam o corpo são males, saúde é preferível. É o logos que
produz ações boas, o fim (telos) é “viver de modo coerente”. O princípio da conservação do
corpo se estende à família e à humanidade, no sentido de comunidade. O homem é, portanto,
animal comunitário, não mais animal político. Nascem daqui ideais igualitários, inclusive entre
homens e mulheres, e aversão à escravidão. Zenão, escreve sua República em aberta oposição
a Platão, e rompe também com Aristóteles. No entanto, só pelo novo ideal de respeito e de
igualdade entre seres humanos, valeu a pena! Não admite nenhum sentimento de simpatia,
porque patos, para o estoicismo, é paixão, vício. Permanece o ideal da ataraxia, agora como
impassibilidade (apatia), no sentido de moderar as paixões e cancelar os erros.

Pirro de Élida (365/360 – 275/270 a.C.): é o fundador do Ceticismo. Ele nada escreveu e não
fundou propriamente uma escola, mas juntou um grupo de discípulos ou admiradores que
buscavam um novo modelo de vida. Para ele, as coisas são indiferentes, indiscriminadas, não
há essência, só aparência (phainômena), e sentidos não distinguem verdade de falsidade.
Assim deve-se permanecer sem omitir opinião: afasia (calar) e suspensão do juízo (epokhé),
quando faltam palavras (afasia), esse é caminho da ataraxia e da vida feliz. Depois o
acadêmico Carnéades (por volta de 219 – 129 a.C.) introduz o conceito de “provável”, já que,
faltando a verdade, há que se tomar alguma posição diante dos fatos. Para amenizar a
radicalização do ceticismo, Filon de Larissa introduz o conceito de probabilidade, pelo qual as
coisas sejam “compreensíveis”. O cético não pode dizer “a verdade não existe”, só pode dizer
“não sei se a verdade existe; sou eu, em todo caso, que não a conhece”.

Astronomia, mecânica, matemática, medicina. Nesse período acontece um notável


desenvolvimento das ciências particulares. Euclides (330 – 277 a.C.), nos seus Elementos,
apresentou as bases de toda a geometria a partir da metodologia de Aristóteles: postulados e
axiomas da geometria nada mais são que derivações do princípio da não-contradição.
Eratóstenes (276- 194 a.C.) foi um matemático que calculou o diâmetro da terra, considerado
o fundador da Geografia. Arquimedes (287 – 212) foi brilhante em diversas áreas da mecânica,
como hidrostática, estática (alavanca) e da matemática (que lhe permitiu inventar obras de
engenharia, como balísticas, “rosca sem fim” e a famosa lei do empuxo (com a qual provou
que a coroa do rei Geron não era de ouro puro). Na astronomia, embora geocêntrica, se sabia
que o modelo de uma única esfera no céu não explicava o movimento de todos os astros.
Aliás, “planeta” vem da palavra planomai (errante) e, por diversos motivos, se imaginava várias
esferas no céu! No século III surge um astrônomo que, por assim dizer, chegou na frente de
Copérnico e supôs que o Sol estaria no centro dos astros. Contudo, a mentalidade da época
ainda não estava preparada para uma ciência tão avançada! Mas havia muitas complicações.
Ainda nesse período, os médicos Erófilo de Calcedônia e Erasístrato de Júlida descobriram
funções diversas do coração, artérias, brônquios etc., e fizeram possivelmente a primeira
dissecação de cadáveres, o que gerou grande alvoroço!

O Estoicismo encontrou solo fértil em Roma, a partir do primeiro século da nossa era. Sêneca
(4 a.C. – 65 d.C) foi um estadista rico e conselheiro do imperador, mas não teve uma vida fácil:
de exilado a condenado a morte, deixa uma ideia de como teria sido viver em Roma sob o
domínio do imperador Nero. Se é verdade que Seneca teria trocado cartas com Paulo
apóstolo, não duvido: é fácil notar, tanto elementos cristãos nos textos de Sêneca, quanto
metáforas estóicas nas cartas de Paulo. Sêneca une o naturalismo estoico grego ao dualismo
religioso (corpo e alma) de Platão. Na ética introduz o conceito de “consciência” como força
moral originária, conhecimento do bem e do mal, da qual o ser humano não pode esconder-se.
E descobre um novo conceito filosófico: a “vontade” (voluntas) como distinto do
conhecimento, no sentido que damos hoje de “querer o bem”, como “força de vontade”.
Diferente dos filósofos gregos, para ele o homem é originalmente pecador: se alguém não
pecasse, não seria homem. Epiteto (50 – 138), embora grego, viveu a maior parte como
escravo em Roma de um cruel secretário de Nero. Apesar dos maus tratos e da sua dura
condição, escreveu sobre a vida feliz, sobre o desapego das coisas e dos títulos, sobre a
liberdade pessoal, qualidades morais etc. Sua filosofia se fundamenta em dois principais
conceitos. Diáiresis (duas coisas), segundo o qual há as coisas que dependem de nós (opiniões,
pensamentos, desejos etc.; e coisas que não dependem de nós, como corpo, família, condição
social etc. Está claro que o bem e o mal, nossa felicidade ou infelicidade, alegria ou tristeza,
estão ligadas exclusivamente às coisas que dependem de nós. Da aceitação dessas duas coisas
vem a decisão de toda uma vida, a “escolha moral”, Proháiresis (pré-escolha), como em
Sócrates, conhecimento é virtude, ignorância pecado. Deus é inteligência, ciência, bem, é
fundamentalmente providência: cuida de tudo e de cada um de nós em particular. Nessa linha
racional, servir ao logos é fazer o bem, é, portanto, servir a Deus. Liberdade é submeter-se à
vontade de Deus. Marco Aurélio (121 – 180) foi imperador romano e filósofo. Sua principal
obra, “Meditações”, de filosofia e espiritualidade estóicas, escreveu para si mesmo, para
suportar seu cargo. Parece mais um livro de autojulgamento. Na linha de Epiteto, submete
suas impressões a um exame rigoroso para não cair em julgamentos injustificados. Discute,
como os demais, o valor pequeno das coisas, dos bens das riquezas. Ao conceito de corpo e de
alma platônico, Marco Aurélio acrescenta o de intelecto (nous), que é superior à alma e
moralmente está acima de tudo; nada pode atingir o intelecto, a não ser o julgamento que ele
próprio formula das coisas. Bem ou mal dependem do julgamento do intelecto, não são as
coisas que fazem bem ou mal ao homem, mas seu julgamento.

Interessante é que das personalidades acima, um rico e depois exilado, um escravo e depois
liberto e um imperador filósofo, há um denominador comum entre os três: felicidade, riqueza,
alegria, ética, estão no interior, coisas são apenas coisas.

Com o Neoplatonismo, o problema religioso entra definitivamente na reflexão filosófica grega.


Plotino (205 - 270) traz diversos temas contidos em Platão, mas sua formulação é nova e
original. Sua filosofia do Uno-Bem pode ser coroada com as últimas palavras que disse ao
médico Eustóquio, na hora de sua morte: “procure unir o divino que há em você com o divino
que há no universo”. Para ele, o Bem é a absoluta transcendência, o Uno, Deus. Ao dualismo
(ideal – sensível) de Platão, Plotino acrescenta um terceiro mundo, o do Absoluto, realidade
suprema e permanente, substância do mundo inteligível (hipóstase). Três são as Hipóstases de
Deus: Uno (aquilo que é, Bem, absoluto, gera todas as coisas), “luz da luz”; Inteligência
(Espírito, causa racional de tudo); Alma (atividade criadora, alma suprema, dá vida aos seres).
Mundo é criação. Homem é liberdade para o Bem, retorno a Deus é metanoia (conversão).
Não dá pra afirmar que o neoplatonismo sofreu influência do cristianismo, mas Amônio
Sacas, fundador da Escola Neoplatônica, veio de família cristã; ainda que tenha se dedicado à
religião pagã, há claramente aspectos em comum entre os problemas que derivaram do
projeto judaico-cristão e o Neoplatonismo. Não será por acaso que, a partir do século IV, o
primeiro e maior expoente do diálogo filosofia e cristianismo será o neoplatônico Aurélio
Agostinho.

O Projeto Judaico-Cristão e a Patrística


Ao mesmo tempo em que se desenvolveu o pensamento estóico, nasce o cristianismo, filho de
uma longa tradição judaica. É inegável a recíproca influência entre filosofia grega e projeto de
salvação. Mas foi o cristianismo que, bebendo das fontes racionais gregas, produziu um
notável sistema de teologia, de filosofia e de espiritualidade originalmente unitário! Por sua
vez, diversas questões de origem religiosa trouxeram contribuições para a Filosofia e, por sua
vez, foram fundamentadas nos moldes gregos. Não sei quem influenciou mais quem! Assim
como os filósofos gregos contribuíram progressivamente para um monoteísmo, a tradição
judaica fez o mesmo caminho, por problemas diferentes. Os “dez mandamentos” (Ex 20; Dt 5)
são um texto implicitamente politeísta, “Não terás outros deuses diante de mim” e, mais, “não
te prostrarás diante desses deuses e não os servirás”, porque Ele é “maior dos deuses” (Ex 18,
11; Sl 95, 3), aquele que ‘julga os outros deuses” (Sl 82,1). Mas, no fim, triunfa o monoteísmo,
“o primeiro e o último, fora de mim não há Deus” (Is 44, 6), porque os deuses, os ídolos, “nada
são” (Is 44, 9). Ambos, filosofia e judaísmo, fixam o conceito monoteísta da Unidade de Deus.
Para os gregos, a substância do cosmos é eterna (Metafísica 1073) e, se Deus é “causa das
causas”, como poderia o eterno criar o eterno? Criação do nada, pela Palavra, parece a
solução: Deus é definitivamente causa do universo; Deus é o Logos (Jo 1, 1); Deus é bom, é o
princípio da ética, a causa de tudo! Os primeiros cristãos buscaram fundamentar
racionalmente a fé no transcendente, “dar as razões da fé” (Pd 3, 15). A nova missão é a de
resolver a tensão entre fé e filosofia, entre a loucura e a sabedoria (1Cor 18 e 26).

Merece uma menção aquele que certamente foi a maior personalidade de toda a história:
Jesus Cristo. Nascido entre 4 e 6 a.C., isso mesmo, ele nasceu antes do ano que celebramos seu
aniversário (Jesus Cristo nasceu antes de Cristo!), foi um judeu simples, passou a vida num raio
de 100 km, exceto pela infância, quando esteve no Egito. Não é considerado um filósofo,
principalmente porque nunca quis sê-lo, não se considerou “profeta nem filho de profeta”,
mas um enviado a proclamar um Projeto de Vida. Suas duras críticas à sociedade e a religião
lhe custaram a vida. Criador de metáforas e de parábolas, suas mensagens (ou a ele atribuídas)
deram margem a intermináveis análises ético-filosóficas. Milênios se passaram, mas seu
discurso é sempre novo, e renovado a cada leitura atenta! Praticamente não há cultura que
não se sinta positivamente influenciada por suas propostas e por suas críticas. Inverteu
projetos institucionais: “o sábado foi feito para o ser humano, e não o contrário” (Mc 2, 27),
inverteu ideais sociais “felizes os pobres” (Lc 6, 20), “os últimos serão os primeiros” (Mt, 20,
16), “se alguém quiser ser o primeiro, seja o último” (Mc 9, 35). Seu critério de ética é a vida:
bom é o que a promove, mau é o que a destrói: “que todos tenham vida e a tenham em
plenitude” (Jo 10, 10), mas, paradoxalmente, o amor, que é o centro das suas pregações,
significa “dar a vida” pelos seus (Jo 15, 13). Condenado à morte por aclamação, transformou-
se num símbolo de vida, de esperança e de amor.

Assim, a mensagem bíblica, embora não tenha sido inspirada na razão, mas sim na fé, causou
possivelmente o maior impacto histórico no que diz respeito à visão de mundo e à natureza
humana; e chamou a atenção da Filosofia! O projeto ético dos gregos ganha agora novo
sentido, o da transcendência: Deus, que já estava no centro daquela filosofia, não é apenas o
Ser (“aquele que é”), nem somente o logos spermata (palavra seminal), mas Amor, um passo
além da ética, um amor de compromisso (“próximo”), o amor dos comensais (ágape).

A ordem moral e filosófica dos gregos é subvertida, da proposta racional e lógica, para a luz da
fé. Toda formulação grega é a-histórica, seus conceitos são intemporais e universais; mas, com
a ideia de criação e de “fim dos tempos”, a concepção de história cíclica dos gregos e agora
expressa na forma atual de história linear. “De onde venho?” e “para onde vou?” se tornam
perguntas filosóficas. O homem, que os gregos tanto exaltavam, é a “medida”, não mais das
coisas, mas de Deus! Nasce o humanismo cristão!
Cristo anunciou o “Evangelion” (boa mensagem) à viva voz, nada escreveu. Depois de sua
morte foram fixados vários escritos que, depois, se multiplicaram. A complexidade da
mensagem suscitou novos e grandes problemas: quais textos são autênticas (cânon)
reproduções da proposta de Jesus?; como conciliar o Deus lei e justiça do Antigo Testamento
com o Deus amor do Novo?; e, finalmente, o problema teológico do Deus Uno e Trino. Além
disso, os cristãos sofriam contínuas acusações de diversos adversários judeus, filósofos e
principalmente os gnósticos (gnose = ação de conhecer) que eram pensadores sincretistas, que
misturavam diversas filosofias com diversas religiões e deformavam a mensagem evangélica.
Era urgente que se construísse a identidade dos cristãos. Foi um trabalho complexo, iniciado
pelos “Padres Apostólicos” (ligados aos apóstolos), ainda no século I, limitando-se às questões
morais e religiosas.

A Patrística é um movimento dos “Padres da Igreja”, entre os séculos II e III que inicialmente
faziam uma defesa sistemática do cristianismo (Padres Apologistas) e gradualmente se
dedicaram a uma formulação original de uma filosofia cristã. Esses caras estão inaugurando
um movimento bem interessante: o diálogo entre o pensamento filosófico grego e o projeto
religioso cristão. A transcendência (aquele “Bem” de Plotino) faz parte de uma das maiores
aspirações do ser humano, que não deixou nem os ateus de fora! Por outro lado, uma
religiosidade, uma “mística”, sem bom senso (razão), pode se converter numa magia barata,
propensa à manipulação. Fundamentar um projeto religioso dentro dos moldes de uma
racionalidade de primeira linha me parece um casamento perfeito! A proposta geral é a
unidade entre Fé e Razão. O mártir São Justino de Roma (Flavius Iustinus, 100 – 165), maior
destaque entre os apologistas, afirmou que o cristianismo é a verdadeira filosofia: “Viver
segundo a razão é ser cristão”. São Clemente de Alexandria (150 – 215) foi o que mais insistiu
na similaridade entre a fé cristã e a ciência (ou a Filosofia), dizendo haver uma perfeita
harmonia entre fé e razão, inclusive Filosofia foi pedagoga e antecedeu o pensamento cristão.
O Filósofo neoplatônico Orígenes de Alexandria (185 – 253) busca fundamentar
filosoficamente as verdades reveladas (monoteísmo, imaterialidade e transcendência de Deus,
criação etc.). Fica claro aqui a Patrística é um movimento filosófico que busca unir e
harmonizar a fé cristão com a filosofia grega.

Santo Agostinho: verdade interior como iluminação


Agostinho de Hipona (354 – 430) é o mais importante dos Padres da Igreja: Antes da conversão
estudou o neoplatonismo e foi adepto do Maniqueísmo, doutrina derivada da religião persa,
segundo a qual a existência se baseia num eterno conflito cósmico entre o reino da luz (Bem) e
o das sombras (Mal), e o ser humano deve vencer o mal pela ascese (autocontrole, esforço e
disciplina). Agostinho era já um Filósofo quando ouviu a pregação de Ambrósio, no início só
pelo interesse profissional. Pós conversão funda uma Filosofia Cristã. Confronto com o
Pelagianismo (que nega o pecado e a graça divina). Produz uma Filosofia da totalidade da vida:
consciência e interioridade, fé e busca de Deus eterno e transcendente. Fé e Razão são
complementares (“creio para entender”). Nova metafísica: Deus (infinita busca da fé) e alma
(consciência). Verdade habita no interior.

Alta Idade Média: dissolução do Império Romano, manutenção e catalogação dos


conhecimentos. Continuidade do diálogo fé e razão. “Compreender para crer”. Razão
interpreta e compreende a revelação. Ser se revela ao homem. Deus existe como ser
perfeitíssimo: até ateu tem ideia de Deus.
Problema dos Universais: Porfírio, no século III, perguntou-se se gêneros e espécies
(Universais) são realidades existentes (corpóreas, que subsistem por si mesmas). A pergunta é
muito boa, ainda que, parece, Aristóteles, não aceitava universal como “substância”
(Metafísica 1038b) e, portanto, não corpórea! Em todo o caso, os Realistas defendem que
“Universais existem” e que são tanto mais reais quanto mais universais; nesse sentido, Deus
seria o “universal dos universais”. Os Nominalistas defendem que universais são apenas
nomes, não havendo ligação substancial entre palavras (conceitos) e as coisas. Assim a solução
nominalista é cética.

Pensamento Árabe: explicação racional do mundo. Luz na Idade Média: estudam Física,
Astronomia, Matemática, Anatomia humana, Medicina, Lógica e Filosofia. Redescobrem
Aristóteles. Autonomia da Filosofia em relação à Teologia. Avicena (980 – 1037) distinção
aristotélica entre ente (seres concretos) e essência (substância aristotélica universal, “o que
é”). Averróis (1126 – 1198) Estuda Aristóteles à luz do Islã (novo diálogo fé e razão): unicidade
e imortalidade do intelecto como saber universal. Intelecto divino se funde ao humano e o
torna imortal. “Nada é supérfluo na natureza”.

Tomás de Aquino assimila a cosmovisão cristã à Filosofia de Aristóteles. Conciliação da


Filosofia com a fé cristã. Deus (criador) é diferente do cosmo (criatura). Propõe as “cinco vias
da existência de Deus”. Teoria do direito: lei eterna (ordem natural do universo), lei natural
(conservação e destruição), lei humana (direito positivo) e lei divina (revelada). Sobre o
problema dos universais, sua solução é moderada: a realidade está nas coisas, mas os
universais existem na mente do homem, na forma das coisas e em Deus.

Guilherme de Ockham: solução nominalista ao problema dos universais, separa lógica de


realidade para elaborar uma lógica rigorosa e mais clara. Nega a possibilidade racional de se
conhecer Deus ou de se provar sua existência. Bases da simplificação científica (“Navalha de
Ockham”) “não se deve multiplicar os entes desnecessariamente”, ou seja, soluções mais
simples são mais verdadeiras.

Humanismo e Renascimento: “duas faces de um mesmo fenômeno”. Movimento artístico,


literário, filosófico, cultural, científico (heliocentrismo, ciências experimentais), político-
econômico que se caracteriza pelos seguintes aspectos: volta aos clássicos, novo sentido do
homem e de seus problemas, oposição à Escolástica (com raras exceções), tendência
helenístico-oriental, com influências mágico-teúrgicas (volta do “paganismo” e às religiões
órficas dos gregos); arte humanista (maior exposição do corpo), tendência ao racionalismo
(inclusive nas discussões sobre Deus), críticas (implícitas) à Igreja.

Maquiavél (1469-1527): um dos primeiros humanistas, análise específica da realidade da vida


do poder. Nesse sentido, é um filósofo cuja ontologia (como investigação do ser) é a realidade
política. São aspectos importantes do seu pensamento: “Fins justificam os meios”; a prioridade
do “ser temido”, se não puder “ser amado”; a “memória curta do povo” (o que orienta a fazer
coisas ruins de uma só vez e as boas bem espaçadamente); o saber dosar entre a lei (raposa) e
o leão (força), sendo que este último deve ser evitado sempre que possível; enfim, orientações
aparentemente ruins, mas que se explicam pelo fato de que os homens não são bons (“Se os
homens fossem bons, o que eu digo seria mau”).

Erasmo de Hotterdam (1466-1536) e Thomas More (1478-1535): autores respectivos de


“Elogio à Loucura” e “Utopia”. Ambos são críticos da vida social e a favor da tolerância
religiosa. Ambos criticam a Igreja, no sentido de que pretendem uma renovação interna, mas,
ao contrário dos reformadores, como Lutero, permanecem fiéis à Igreja de Roma.
Michel de Montaigne (1533-1592). Humanista como Sócrates na busca do autoconhecimento,
e diferente dele no ceticismo (“cético só pode ser fideísta”, ou seja, ceticismo filosófico não se
opõe à fé). Descobre na miséria humana sua grandeza: “proponho vida humilde”. Produz
análises humanistas em prol do respeito à diversidade cultural, contra o “eurocentrismo” e o
regime de cristandade como única forma de verdade.

Giordano Bruno (1548-1600): Cosmologia copernicana, visão de universo infinito e, portanto,


Deus Infinito: tudo é um. Antecipa Spinoza, Schelling e o Romantismo.

Revolução Científica: Período que vai de 1543, ano da publicação do De revolutionibus de


Nicolau Copérnico, até 1687, ano da publicação de Plhilosophiae naturailis principia
mathematica de Isaac Newton. Grandioso movimento de ideias que começa com Copérnico,
adiquire características quantitativas com Galileu, encontra fundamentações filosófico-
metodológicas em Bacon e Descartes e atinge sua maturidade na mecânica newtoniana.
Renasce as discussões entre ciência e sociedade, entre saber científico e fé religiosa. Copérnico
retoma a astronomia no lugar da astrologia dos magos. A ciência sai do “mundo do papel” para
entrar numa discussão acerca do “mundo da natureza”. Sua característica é o método; em
Descartes é racional, quantificado (proposições simples, “claras e distintas”); em Bacon é
hipotético-dedutivo (hipóteses controláveis dos fatos). Rejeita-se aqui todas as proposições
essencialistas aristotélico-tomistas. A nova ciência, a partir de Galileu, indaga não sobre a
substância, mas sobre a função. Deus imprime no mundo uma ordem matemática e
geométrica. Novo douto é o cientista experimental que, nascido do artesão (técnico e artista)
domina as operações instrumentais, como fonte de conhecimento. Renasce a Academia, agora
como sociedade científica.

Galileu Galilei (1564-1642) físico, matemático, astrônomo, filósofo. Mudança do qualitativo


para o quantitativo. Oposição à ciência da Escolástica. A experimentação obriga a natureza a se
revelar. Ênfase na tese heliocêntrica de Copérnico (1473-1543). A matemática se aplica às
ciências físico-naturais.

Francis Bacon (1561- 1626). Novum Organum: regras do método e renovação de Aristóteles: 1.
Limpar a mente das falsas noções (ídolo da tribo, da caverna, do foro ou mercado, do teatro) e
2. Regras do método indutivo: fenômenos observáveis, hipótese, análise, experiência
(indução), lei, síntese e aplicação ou concretização.

Descartes (1596-1650). Críticas: filosofia escolástica, lógica expositiva e pouco reflexiva,


matemática descritiva e abstrata e falta de rigor. Razão é “bom senso”. Regras do método: 1.
Não aceitar nada se não evidente (duvidar de tudo), 2. Análise, dividir problemas até a
simplicidade evidente, 3. Síntese e ordenamento do mais simples ao mais complexo e 4.
Revisão e enumeração minuciosa, completa e rigorosa. Dúvida Metódica (não cética!!!)
“Penso, logo existo”. Distinção res cogitans (ser pensante, alma) X res extensa (mundo medido,
dominado), são duas substâncias diferentes. Prova metafísica da existência de Deus a partir do
conceito de perfeição.

Hobbes (1588-1679). Lógica nominalista: tendência ao empirismo. Por experiência, homens


são egoístas, “homem lobo do próprio homem”, daí a necessidade de leis convencionais para
alcançar a paz: estado absolutista (Leviatã); nasce o pacto social. Contratualista.

Locke (1632-1704). Empirista, aperfeiçoa Bacon e nega inatismo de Descartes. Da experiência


se formam ideias simples e depois complexas. Na política (tema mais frequente no vestibular):
liberdade natural do homem; liberdade é poder; seu projeto (econômico) liberal baseia-se nos
direitos “naturais” e na propriedade privada. Estado se limita aos direitos e não interfere na
religião. Ética utilitarista. Contratualista.

Espiñoza (1632-1677). Família de espanhóis judeus, foi excomungado por todos! Interesse na
ética humanista e na paz interior (contrário de Descartes que se limita ao conhecimento).
Absoluta racionalidade e infinitude de Deus: panteísmo! Há um paralelo entre corpo e alma,
porque tudo é um, todos estamos em (somos) Deus.

David Hume (1711-1776). Todas as ideias provêm das impressões sensíveis. Com o usa das
palavras (nominalismo) se cria o “hábito” (palavra chave em Hume), um tipo de instinto
implantado no ser humano pelas diversas experiências. Como não há conexão lógica entre
causa e efeito (já que toda experiência é possível, não necessária), então a utilização científica
de causa-efeito, é também um hábito: daí seu ceticismo em relação à ciência!

Adam Smith (1723 – 1790). Sistematiza o liberalismo do ponto de vista da economia. Na obra
“Ensaio sobre a riqueza das nações” critica o Mercantilismo (metalismo) e desenvolve o
conceito de riqueza ligado ao resultado do trabalho da nação como um todo. Apresenta o
conceito do jogo da livre oferta e da procura do mercado (teoria da “mão invisível”). O
empenho do auto interesse de cada um (e não necessariamente a benevolência das pessoas) é
o que sustenta a economia. Contudo, a base do seu pensamento é o caráter democrático,
criticava a corrupção e propunha a igualdade de direitos em relação à classe trabalhadora.

Voltaire (1694-1778): Tolerância religiosa e sobre ideias diferentes. Crítica à Igreja. Deus
engenheiro, religião de justiça e de bem, iluminista.

Rousseau (1712-1788): Crítica à desigualdade social. Homem originariamente íntegro, bom,


(teoria do “bom selvagem”). É corrompido pela “ordem” social. Homem nasce livre, mas em
todo lugar “encontra-se em cadeias”. Finalidade da educação e do projeto social: restituir a
liberdade. Amante do bem comum: propõe uma socialização radical, contra interesses
privados, garantido por um Estado forte, ainda que seja um monarca, mas sempre garantido
por leis que visam a “vontade geral” (bem comum). Propõe ainda uma religião natural baseada
no projeto cristão. Contratualista.

Kant (1727-1804). Problema teórico: transcendental (modo pelo qual se conhece objetos).
Crítica ao idealismo por centrar-se só nas ideias e ao empirismo por centrar-se só na
experiência. Conhecemos só os fenômenos, nunca o “em si”. Revolução copernicana: estudar
o conhecimento para então conhecer os objetos. É no conhecimento que se dá a síntese entre
empírico e as ideias. Deus não pode ser provado pela razão. Ética autônoma. Dever universal,
absoluto, acima de qualquer interesse pessoal ou cultural. Dever moral é imperativo da
liberdade: devo porque sou racional, mas também sou sensível. Esclarecimento é expressão da
maioridade, é exercício da autonomia.

Romantismo (século XIX).

Hegel (1170 – 1831). Pensar e ser coincidem. O Ser é Espírito, é dinâmico (não mais o ser
estático de Parmênides). Espírito Infinito é a realidade. Realidade é sujeito, atividade,
movimento. Espírito Absoluto é a Razão. A vida do Espírito é a dinâmica da realidade, e essa
realidade é dialética: Tese, Antítese, Síntese. Na dialética há a supressão (suprassunção) e ao
mesmo tempo manutenção do que foi suprimido. As contradições são momentos necessários
da unidade orgânica, são momentos dinâmicos da realidade, as contradições fazem parte do
Espírito em constante processo de se autoproduzir. Absoluto é totalidade: “A Filosofia se
ocupa da verdade e a verdade é a totalidade”. Realidade é processo teleológico.

Karl Marx (1818 – 1883). O mundo “espiritual” (religioso, filosófico, ético etc.) é apenas reflexo
do mundo real (“mundo material”, “modo produtivo”, “vida material” de um povo).
Materialismo de Marx: é o mundo real, material, produtivo que produz as ideias, não o
contrário! Materialismo histórico: “Não é a consciência dos homens que determina o seu ser,
mas, ao contrário, o seu ser social que determina a consciência”. O trabalho é alienado, foi
convertido em pura subsistência. Divisão de trabalho destrói a criatividade humana.
Materialismo dialético: contradições da vida material a partir das condições econômicas da
vida de produção. Quanto mais riqueza da produção, mais pobreza do operário. Ideologia:
ideias de uma classe dominante. O estudo da economia (livro O Capital) é uma aplicação do
método dialético à economia política. A História da sociedade é uma história de luta de
classes. Mais-valia: o operário vende sua força de trabalho e recebe o “justo” (mínimo) para a
sobrevivência; o valor restante da força de trabalho é reinvestido para acumulação de capital.

Schopenhauer (1788 – 1860). Maior crítico de Hegel: o acusa de charlatão e “sicário da


verdade”. O mundo, o objeto criado pelo sujeito, enfim, o que chamamos de real, é apenas
representação. “não conhece um sol..., mas apenas um olho que vê um sol...”. Afinado com o
pensamento hindu, afirma o mundo como imagem ilusória. Homem é um ser corporal: vive,
respira, sente, ama, move-se e alimenta-se; representação é negação, fenômeno, aparência.
Ser “em si”, o noúmeno, a essência é a Vontade! É o corpo que conhece a vontade, insaciável
e, portanto, dor e tédio! Vontade é a única realidade humana! Felicidade é ilusão! Só o homem
faz sua espécie sofrer sem motivo. História é acaso cego, progresso é ilusão. Libertação da
vontade: Abandonar felicidade do mundo, por uma “felicidade interior”! Como? Caminhos: 1.
Arte, música, como elevação espiritual; 2. Ascese enquanto esforço, “força de vontade” e 3.
Justiça, amor, compaixão (ágape).

Soren A. Kierkegaard (1813 – 1855): Também crítico de Hegel, questiona as ambiguidades da


vida, do eu, da consciência. Aborda as incertezas da fé e as dificuldades de se viver uma fé
autêntica. Para ele a existência humana passa por três etapas: 1. Estético (busca dos prazeres
ilusórios, do qual vem a tristeza; 2. Ético (uma tentativa desesperada de superar a tristeza do
hedonismo); 3. Religioso (o ser humano entra em relacionamento com o Absoluto). A fé, o
momento religioso é a superação dos estágios anteriores, porém, o indivíduo enfrenta o
paradoxo da fé, que é inexplicável, como Abraão, herói trágico. Assim fé é loucura divina. Ao
amar a Deus o indivíduo encontra-se consigo mesmo. O estágio religioso é a libertação do ser
humano. Tudo o que acontece na vida humana é uma revelação: todo fato é um revelar-se de
Deus ao homem. O que impede é o pecado (ato de negar-se a si mesmo), e o pecado gera
angústia da culpa. Mas essa angústia pode ser superada pelo bom uso da liberdade (com a
liberdade se pode construir ou destruir). Enfim, a existência humana é uma tensão (um
paradoxo) do sujeito que busca o Absoluto, numa tensão da qual não se pode escapar.
Kierkegaard salienta o aspecto dramático da existência, tema que será amplamente discutido
na filosofia do século XX.

S. Freud (1856 – 1939). Criou a Psicanálise como um método terapêutico para tratar as
neuroses. A totalidade dos fenômenos psíquicos é muito maior que a consciência:
inconsciência é a base da vida psíquica. Id é totalmente inconsciente: energia psíquica, libido,
irracional, impulsivo, busca o prazer, alheio à realidade e à moral. Superego, parte
inconsciente, parte consciente, é a interiorização da autoridade, normas e valores morais,
aspira à perfeição. Ego, parcialmente inconsciente, representa a realidade do mundo externo,
controla os instintos, e busca satisfazer tanto os impulsos do id quanto as exigências morais do
superego. Todos os fenômenos psíquicos têm, de alguma forma, sua origem na sexualidade,
originados desde a primeira infância e que são normalmente reprimidos socialmente. Os
sonhos expressam simbolicamente sentimentos, anseios, medos, desejos, tanto do
inconsciente, quanto do consciente.

F.W. Nietzsche (1844 – 1900). Crítico impetuoso do passado e dessacralizador dos valores
tradicionais, propõe um homem que está por vir, um “super-homem”. De Schopenhauer, vê a
vida irracional, cruel e cega; pela arte se pode enfrentar a destruição, a dor, e dizer sim à vida!
Para Nietzsche, a tragédia grega foi a explosão e a exaltação vigorosa da vida. O segredo das
tragédias gregas está no espírito de Dionísio (força instintiva, paixão, música) e no espírito de
Apolo (razão, aspiração, senso de medida, equilíbrio, arte figurativa). Os instintos dionisíacos e
apolíneos são complementares, caminham juntos em aberta discórdia. A decadência grega
começa com Eurípedes (moralismo apolíneo), depois com Sócrates e Platão (presunção de
dominar a vida com a razão, destroem o fascínio dionisíaco). Em nome do “amor à vida”
anuncia a “morte de Deus”, pela qual morre o homem velho em prol do nascimento do super-
homem, que ama a vida e volta à sanidade da “terra”. Amaldiçoa o cristianismo, mas é
fascinado pela figura de Cristo: “o homem mais nobre”! Sendo o cristianismo um atentado
contra a vida, propõe a “transmutação de todos os valores”. Com a morte de Deus, resta o
nada (nihilismo), não há sentido, cai as mentiras milenares. O homem sozinho resta-lhe aceitar
a si próprio e a repetir-se. É a doutrina do eterno retorno: o mundo que se aceita a si mesmo e
se repete. Ao aceitar-se segue-se a doutrina do amor fati: aceitar esse mundo e amá-lo, aceitar
o eterno retorno, aceitar a vida, em todos os aspectos, até nos cruéis. Tal amor anuncia o
super-homem: homem novo, homem da terra, fiel ao mundo, que ama a terra, cujos novos
valores são a saúde, a vontade forte (vontade de potência), o amor e a embriaguez dionisíaca!

Escola de Frankfurt – Theodor Adorno (1895 – 1973) e Max Horkheimer (1903 – 1969).
Influenciados pelo hegelianismo, marxismo e freudismo, críticos do Iluminismo e do próprio
Hegel, Adorno e Horkheimer são os principais expoentes da Escola de Frankfourt, que renasce
no pós-Hitler, como um Instituto para pesquisa social. Sua crítica vai em direção às
contradições fundamentais da sociedade capitalista. Combatem o que eles denominam “razão
Instrumental”, como uma racionalização voltada para manipular e subjugar, ou seja, todo um
“sistema” montado que visa cegamente atingir os fins desejados. Elaboram o conhecido
conceito de “Indústria Cultural”, um aparato poderoso de poder constituído pelos meios
massivos de comunicação (mass-media) que “impede a formação de indivíduos autônomos,
capazes de julgar e de decidir conscientemente”, impõe valores e modelos de comportamento,
por meio de uma linguagem elaborada, e cria necessidades consumistas. Nesse modelo o ser
humano é um “puro nada”, um ser “absolutamente substituível” e descartável tal qual a
mercadoria que consome! Assim a cultura se converte em bem de consumo. Contra tal
indústria (fruto da “corrida para o mundo da organização”) se propõe o exercício da liberdade
conservada, estendida e ampliada.
Albert Camus (1913 – 1960). Considera o nihilismo a perda do sentido da existência. O ser
humano está destinado à morte e ao imprevisível. A existência humana é um absurdo, Sísifo é
o herói do absurdo. Diante disso tudo só cabe a “revolta metafísica do homem”, que “se ergue
contra a própria condição e contra toda a criação”.

Martin Heidegger (1889 – 1976). Busca pelo sentido do ser: o homem (dasein) é o ente que se
propõe pergunta pelo ser. Existência é possibilidade de atuar. O Dasein é projeto,
possibilidade, é transcendência, superação; é ele que dá sentido às coisas (utensílios que
“estão à mão”), ao mundo; é, portanto, “cuidado”, é “pastor do ser”. O homem é “ser para a
morte” que a consciência autêntica reconhece como angústia. Medo é fuga, banalização,
existência inautêntica. Distingue o plano ôntico (factualidade) do ontológico (sentido do ser,
transcendência). Tempo autêntico é o tempo da existência humana (angústia), oposto ao
tempo inautêntico (sucesso, riqueza, progresso, ciência). Linguagem é a casa do ser, mas só a
poesia alcança dizer o Ser (“poetas dizem mais que os filósofos’).

Jean Paul Sartre (1905 – 1980). Propõe a volta às próprias coisas, à “intencionalidade”. Existir
é assumir, é responsabilidade individual. Liberdade é incondicional: “condenados a ser livre”.
Consciência individual é abertura para o mundo, que é absurdo; daí o conceito de náusea..
Ateísmo: suprime Deus e eternidade. Ser “em-si” é representação; Ser “para-si” é consciência
de ser, “nada de ser”. Liberdade, portanto, não é um ser, é um “nada de ser” (é escolha
absurda, não há destino, não há missão), é absoluta (não há desculpas para a má fé). Mas o
homem se projeta ser Deus, é, portanto “paixão inútil”. O outro é “aquele que me vê”
(vergonha, pudor) é a queda original: “o inferno são os outros”. Amar é negar a liberdade do
outro; amor e ódio são, portanto, relações fundamentais. O homem é demiurgo do seu futuro,
não é essência, é pura existência: “A existência precede a essência”.

Influência do Marxismo.

Simone de Beauvoir (1908 – 1986). Parte do conceito existencialista sartreano (“a existência
precede a essência”) e analisa a condição da mulher (“ninguém nasce mulher, faz-se”)

Hannah Arendt (1906 – 1975). Em A Condição Humana distingue três formas de atividade
humana: labor (sobrevivência), trabalho (artificialidade, estar no mundo) e ação (vida pública,
pluralidade). O poder (diferente de força = violência, subjugação, destruição) é potência,
qualidade natural, fruto da ação humana. Em As Origens do Totalitarismo analisa o
antissemitismo (ódio contra um “outro”, discriminação torna-se genocídio), o imperialismo
(conquista territorial) e o totalitarismo (ditadura) como diferentes modos de “crimes contra a
humanidade”. Em Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a Banalidade do Mal discute a
burocratização (ninguém “vê” a parte toda do processo) como condição para a aceitação da
violência. Para o nazismo, outros países não eram inimigos, potencialmente países dominados!

Michel de Foucault (1926 – 1984). Seus estudos mais importantes referem-se aos mecanismos
históricos de controle social. Abandona os conceitos tradicionais de esquerda e direita e das
relações assimétricas do Estado contra o povo, para estudar o poder estendido a todas as
instâncias da sociedade, um poder difuso, que vai desde as escolhas individuais e de pequenos
grupos até os mais altos níveis de governo. Na obra “Vigiar e Punir” faz uma análise das
mudanças de controle social e das alterações no jogo de poder, desde o século XVII até o
século XX, quando surgem as “sociedades disciplinares” (principalmente escolas e instituições
operárias), mais vigiadas e controladas: torna as pessoas mais úteis à sociedade. É mais
rentável e eficaz “vigiar” do que “punir”. Toda a arquitetura é projetada por mecanismo
disciplinares (hoje substituído pela vigilância digital). O indivíduo passa de um espaço fechado
a outro: família, escola, fábrica, universidade e, eventualmente, prisão ou hospital, todos
controlados pelo mesmo padrão de visibilidade. Assim toda instituição se resume numa tática
de dois polos: sujeitar e reprimir (polo negativo) e produzir e mobilizar forças (polo positivo).
Daí o conceito do “Panóptico” originalmente destinado às prisões (celas individuais expostas à
observação e controle do “ver sem ser visto”) e posteriormente estendida a toda a sociedade,
para vigiar, controlar e reprimir (“corrigir”) todo possível dano à “ordem”. Trata-se de uma
distopia social: medo por ameaça. Também são estimulados nos indivíduos o conceito de
corpo bonito que são, na verdade, corpos úteis, “corpos dóceis,” disciplinados e passíveis de
sujeição, de controle; enfraquecendo, assim, toda possibilidade de resistências individuais.

SURREALISMO

(ler o capítulo correspondente no livro, conforme orientado em aula)

FILOSOFIA DA CIÊNCIA (“CRÍTICA À CIÊNCIA”)

Karl Popper (1902 – 1994): procura delimitar o que é ciência e o que não é. Para ele
afirmações sempre verdadeiras não são científicas porque não podem ser questionadas. toda
afirmação científica precisa ser falsificável. Quanto mais precisa, quanto mais abrangente,
mais científica, porque mais falsificável. Enfim, quanto mais falsificável, melhor. Popper
apresenta demonstrações lógicas para demonstrar que a indução (o método empírico) não se
sustenta logicamente. Uma experiência pode falsificar uma teoria, mas nunca provar que seja
verdadeira, porque sempre haverá a possibilidade de uma nova experiência dar errado! E se
descobrimos, por acaso, que uma teoria seja mesmo falsa, “podemos ter aprendido muito
sobre a verdade, e teremos chegado mais perto dela”. Quanto mais falsificável uma teoria,
mais científica ela é! Karl Popper é autor do “paradoxo da tolerância”

Thomas Kuhn (1922 – 1996). Embora físico, defende uma abordagem histórica: na história da
ciência, o falsificacionismo de Popper não se sustenta. O que ocorre no processo da ciência é
que a atividade científica obedece a um paradigma, um pressuposto filosófico ou um conjunto
de princípios e de teorias que são seguidas. Assim, por exemplo, a ciência seguiu o paradigma
aristotélico, depois o paradigma newtoniano, depois o da relatividade etc. Quando a ciência
segue um determinado paradigma, Kuhn chama Ciência Normal. Quando surgem problemas
na ciência, anomalias, sucede uma crise, e o paradigma não se sustenta mais; decorre, então, a
necessidade de um novo paradigma. Este é para Kuhn o processo da ciência: ciência normal –
anomalias – crise – revolução científica – novo paradigma –e nova ciência normal. Quando
um paradigma substitui um antigo, chamamos Revolução Científica. Enfim, o que a ciência faz
é construir modelos (paradigmas) e controlar os erros (e não falsificar teorias).

Gabriel Marcel
Merleau-Ponty

Bertrand Russerl (1872 – 1970) . Ciência como referência das investigações filosóficas. Lógica.
Aplicação política internacional “Tribuna Russell”

Jürgen Habermas (1929 – 91 anos): razão comunicativa


QUESTÕES PARA EXERCÍCIO DE LEITURA

1- Sobre Parmênides

“O mesmo é o pensar e aquilo por causa do qual existe o pensamento porque sem o ser no
qual é expresso, não encontrarás o pensar. Com efeito, nada mais existe ou existirá fora do
ser, pois a Sorte o vinculou a ser um inteiro e imóvel.

Por isso sendo nomes todas as coisas que os mortais estabeleceram, convictos de que fossem
verdadeiras nascer e perecer, ser e não-ser, trocar de lugar e mudar luminosa cor.”

Parmênides, Poema sobre a natureza, fr. 8

Encontramos no fragmento acima dois aspectos básicos:

a) Conceito de verdade e pluralismo


b) Princípio da identidade e ontologia
c) Negação da existência e mutabilidade
d) Afirmação da mortalidade e movimento
e) Relação existencial entre ser e não-ser

2- Maiêutica de Sócrates
— Agora — disse Sócrates — recorda-te de nosso ponto de partida e fala,
sem empregar, para responder, as próprias palavras de minha pergunta, mas
tomando-me por modelo. Explico-me: ao lado da resposta de que eu em primeiro
lugar falava, a resposta certa a que me referia, vejo, à luz do que agora dissemos,
uma outra certeza. Podes perguntar-me: que. é que entrando num corpo o faz
quente? Não te darei aquela resposta certa, mas simples, que é o calor, mas
responder-te-ei com uma mais hábil, dizendo que é o fogo. Perguntas: que é que,
entrando num corpo, o torna doente? Não direi que é a doença, mas a febre. Da
mesma forma, não irei declarar que um número se torna ímpar devido à
imparidade, mas sim devido à unidade, e assim por diante. Examina, entretanto, se
compreendeste bem o que quero dizer!
— Compreendi suficientemente — respondeu Cebes.
— Então responde-me, se puderes: qual é a coisa que, entrando num corpo,
o torna vivo?
— A alma.
— Mas é sempre assim?
— Como não?
— Portanto a alma, empolgando uma coisa, sempre traz vida para essa coisa?
— Sempre traz vida!
— Existe um contrário da vida, ou não?
— Existe.
— Qual é?
— A morte.
— Não é verdade que a alma jamais aceitará o contrário do que ela sempre
traz consigo?
— Decididamente!
— Ora pois; como chamávamos há pouco ao que não aceita a ideia do par?
— ímpar.
— E ao que não aceita o justo e ao que não admite o harmônico?
— Inarmônico — respondeu Cebes -— e injusto.
— Bem; e ao que não admite a morte como chamaremos?
— Imortal.
— A alma não admite a morte, pois não é?
— É.
— Logo, a alma é imortal?
— É imortal!
(Platão. Diálogos – Fedon. 1991 – Os pensadores).
O diálogo acima, tal como descrito por Platão tem como método:
a) Erístico, como exercício de convencimento
b) Religioso, como defesa da imortalidade da alma
c) Semântico, como extração de significado
d) Hermenêutico, como busca do sentido
e) Dialético, como parto de ideias

3- Alegoria da Caverna
SÓCRATES — Agora imagina a maneira como segue o estado da nossa natureza relativamente
à instrução e à ignorância. Imagina homens numa morada subterrânea, em forma de caverna,
com uma entrada aberta à luz; esses homens estão aí desde a infância, de pernas e pescoço
acorrentadas, de modo que não podem mexer-se nem ver senão o que está diante deles,
poisas correntes os impedem de voltar a cabeça; a luz chega-lhes de uma fogueira acesa numa
colina que se ergue por detrás deles; entre o fogo e os prisioneiros passa uma estrada
ascendente. Imagina que ao longo dessa estrada está construída um pequeno muro,
semelhante às divisórias que os apresentadores de títeres armam diante de si e por cima das
quais exibem as suas maravilhas.
Glauco — Estou vendo.
Sócrates — Imagina agora, ao longo desse pequeno muro, homens que transportam objetos
de toda espécie, que o transpõem: estatuetas de homens e animais, de pedra, madeira e toda
espécie de matéria; naturalmente, entre esses transportadores, uns falam e outros seguem em
silêncio.
Glauco — Um quadro estranho e estranhas prisioneiros.
Sócrates — Assemelham-se a nós. E, para começar, achas que, numa tal condição, eles tenham
alguma vez visto, de si mesmos e dos seus companheiros, mais da que as sombras projetadas
pelo fogo na parede da caverna que lhes fica defronte?
Glauco — Como, se são obrigados a ficar de cabeça imóvel durante toda a vida?
Sócrates — E com as coisas que desfilam? Não se passa o mesmo?
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Portanto, se pudessem se comunicar uns com os outros, não achas que tomariam
por objetos reais as sombras que veriam?
Glauco — E bem possível.
Sócrates — E se a parede do fundo da prisão provocasse eco, sempre que um dos
transportadores falasse, não julgariam ouvir a sombra que passasse diante deles?
Glauco — Sim, por Zeus!
Sócrates — Dessa forma, tais homens não atribuirão realidade senão às sombras dos objetos
fabricados.
Glauco — Assim terá de ser.
Sócrates — Considera agora o que lhes acontecerá, naturalmente, se forem libertados das suas
cadeias e curadas da sua ignorância. Que se liberte um desses prisioneiros, que seja ele
obrigado a endireitar-se imediatamente, a voltar o pescoço, a caminhar, a erguer os olhos para
a luz: ao fazer todos estes movimentas sofrerá, e o deslumbramento impedi-lo-á de distinguir
os abjetos de que antes via as sombras. Que achas que responderá se alguém lhe vier dizer
que não viu até então senão fantasmas, mas que agora, mais perto da realidade e voltado
para objetos mais reais, vê com mais justeza? Se, enfim, mostrando-lhe cada uma das coisas
que passam, o obrigar, à força de perguntas, a dizer o que é? Não achas que ficará embaraçada
e que as sombras que via outrora lhe parecerão mais verdadeiras do que os objetos que lhe
mostram agora?
Glauco — Muito mais verdadeiras.
Sócrates — E se a forçarem a fixar a luz, os seus olhos não ficarão magoados? Não desviará ele
a vista para voltar às coisas que pode fitar e não acreditará que estas são realmente mais
distintas do que as que se lhe mostram?
Glauco — Com toda a certeza.
Sócrates — E se o arrancarem à força da sua caverna, o obrigarem a subir a encosta rude e
escarpada e não o largarem antes de o terem arrastado até a luz do Sol, não sofrerá vivamente
e não se queixará de tais violências? E, quando tiver chegado à luz, poderá, com os olhas
ofuscados pelo seu brilho, distinguir uma só das coisas que ora denominamos verdadeiras?
Glauco — Não o conseguirá, pelo menos de início.
Sócrates — Terá, creio eu, necessidade de se habituar a ver os objetos da região superior.
Começará por distinguir mais facilmente as sombras; em seguida, as imagens dos homens e
dos outros objetos que se refletem nas águas; por último, os próprios objetos. Depois disso,
poderá, enfrentando a claridade dos astros e da Lua, contemplar mais facilmente, durante a
noite, os corpos celestes e o próprio céu da que, durante o dia, o Sol e a sua luz.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Por fim, suponho eu, será o Sol, e não as suas imagens refletidas nas águas ou em
qualquer outra coisa, mas o próprio Sol, no seu verdadeiro lugar, que poderá ver e contemplar
tal como e.
Glauco — Necessariamente.
Sócrates — Depois disso, poderá concluir, a respeito do Sol, que é ele que faz as estações e os
anos, que governa tudo no mundo visível e que, de certa maneira, é a causa de tudo o que ele
via com os seus companheiros, na caverna.
Glauco — E evidente que chegará a essa conclusão. Sócrates — Ora, lembrando-se da sua
primeira morada, da sabedoria que aí se professa e daqueles que aí foram seus companheiros
de cativeiro, não achas que se alegrará com a mudança e lamentará os que lá ficaram?
Glauco — Sim, com certeza, Sócrates.
Sócrates — E se então distribuíssem honras e louvares, se tivessem recompensas para aquele
que se apercebesse, com o olhar mais vivo, da passagem das sombras, que melhor se
recordasse das que costumavam chegar em primeiro ou em última lugar, ou virem juntas, e
que por isso era o mais hábil em adivinhar a sua aparição, e que provocasse a inveja daqueles
que, entre os prisioneiros, são venerados e poderosos? Ou então, como o herói de Homero,
não preferirá mil vezes ser um simples criado de charrua, a serviço de um pobre lavrador, e
sofrer tudo no mundo, a voltar às antigas ilusões e viver como vivia?
Glauco — Sou da tua opinião. Preferirá sofrer tudo a ter de viver dessa maneira.
Sócrates — Imagina ainda que esse homem volta à caverna e vai sentar-se no seu antigo lugar:
não ficará com os olhos cegos pelas trevas ao se afastar bruscamente da luz do Sol?
Glauco — Por certo que sim.
Sócrates — E se tiver de entrar de nova em competição com os prisioneiros que não se
libertaram de suas correntes, para julgar essas sombras, estando ainda sua vista confusa e
antes que os seus olhos se tenham recomposto, pois habituar-se à escuridão exigirá um tempo
bastante longo, não fará que os outros se riam à sua custa e digam que, tendo ido lá acima,
voltou com a vista estragada, pelo que não vale a pena tentar subir até lá? E se a alguém
tentar libertar e conduzir para o alto, esse alguém não o mataria, se pudesse fazê-lo?
Glauco — Sem nenhuma dúvida.
Sócrates — Agora, meu caro Glauco, é preciso aplicar, ponto por ponto, esta imagem ao que
dissemos...
Platão. A República (livro VII). Tradução de Enrico Corvisieri. São Paulo: Nova Cultural, 1997.
I. Para Platão, o interior da caverna reflete qual conceito?
a) Imaginação
b) Contemplação
c) Senso comum
d) Comunicação
e) Realidade

II. Ainda sobre o texto acima, o esforço de sair da caverna diz respeito a quais aspectos éticos?
a) Decisão, força
b) Convicção, certeza
c) Verdade, experiência
d) Ascese, virtude
e) Diálogo, convencimento

III. Por fim a metáfora “fora da caverna” possui um elemento que constitui qual ideia principal
de Platão?
a) Sol: sumo bem
b) Sombras: verdades matemáticas
c) Objetos: verdadeira realidade
d) Dia: condição de conhecimento
e) Noite: corpos celestes

4- A ideia e a reminiscência
A alma que não evoluiu e nunca contemplou a verdade não pode tomar a forma humana. A
causa disso é a seguinte: a inteligência do homem deve se exercer de acordo com aquilo que
se chama Ideia; isto é, elevar-se da multiplicidade das sensações à unidade racional. Ora, esta
faculdade nada mais é que a reminiscência das Verdades Eternas que ela contemplou quando
acompanhou a alma divina nas suas evoluções. Por isso, convém que somente a alma do
filósofo tenha asas: nele a memória, pela sua aptidão, permanece sempre fixada nessas
Verdades, o que o torna semelhante a um deus. É apenas pelo bom uso dessas recordações
que o homem se torna verdadeiramente perfeito, podendo receber em alto grau as
consagrações dos mistérios. Um homem desses se desliga dos interesses humanos e dirige seu
espírito para os objetos divinos; a multidão o considera louco, sem perceber que nele habita a
divindade.
Platão, Fedro, 249c
O trecho acima apresenta dois aspectos, 1. uma concepção da alma e 2. Um problema
filosófico de Platão. São estes:

a) Sopro espiritual. Teologia especulativa.


b) Faculdade cognitiva. Teoria do conhecimento.
c) Existência real. Teoria cosmológica.
d) Fonte de percepção. Empirismo atomista.
e) Ser lógico. Antropologia utilitarista.

5- Ponto de partida da Metafísica de Aristóteles


Todos os homens por natureza tendem ao saber. Sinal disso é o amor pelas sensações: até
mesmo à parte de sua utilidade, elas são estimadas em si mesmas e, mais que as outras, a
sensação através dos olhos. De fato, não apenas para agir, mas também quando nada
pretendemos fazer, preferimos o ver a todas as outras (por assim dizer). A causa disso é que,
entre as sensações, esta é a que mais nos faz conhecer e mostra muitas diferenças.
Aristóteles, Metafísica. Livro I (Alfa), Capítulo 1 [980a 21].
Assinale o enunciado que se encontra em acordo com o texto acima.

a) Sensações são a causa do amor.


b) Os olhos são a causa das sensações.
c) O mundo é fonte de conhecimento.
d) As diferenças se encontram nas ideias.
e) A utilidade das sensações está nos olhos.

6- A justa medida
Ora, a virtude diz respeito às paixões e ações em que o excesso é uma forma de erro, assim
como a carência, ao passo que o meio-termo é uma forma de acerto digna de louvor; e acertar
e ser louvada são características da virtude. Em conclusão, a virtude é uma espécie de
mediania, já que, como vimos, ela põe a sua mira no meio-termo.
Por outro lado, é possível errar de muitos modos (pois o mal pertence à classe do ilimitado e o
bem à do limitado, como supuseram os pitagóricos), mas só há um modo de acertar. Por isso,
o primeiro é fácil e o segundo difícil — fácil errar a mira, difícil atingir o alvo. Pelas mesmas
razões, o excesso e a falta são característicos do vício, e a mediania da virtude:
Pois os homens são bons de um modo só, e maus de muitos modos.
Aristóteles, Ética a Nicômaco. 1106b 30-35.
Segundo o texto acima, a medianeira de Aristóteles implica em que:
a) excesso ou falta são constituintes da natureza humana.
b) ações e paixões, sendo humanas, identificam-se na virtude.
c) tanto a carência quanto o excesso fazem parte do meio-termo.
d) há mais opções no excesso ou na falta que no meio-termo.
e) há mais possibilidades de escolha no acerto que no erro.

7- Poesia e criação
O poeta é imitador, como o pintor ou qualquer outro imaginário; por isso, sua imitação incidirá
num destes três objetos: coisas quais eram ou quais são, quais os outros dizem que são ou
quais parecem, ou quais deveriam ser. 1460b (...)
... na poesia é de preferir o impossível que persuade ao possível que não persuade. Talvez seja
impossível existirem quais Zêuxis os pintou; esses porém correspondem ao melhor, e o
paradigma deve ser superado. E depois, a opinião comum também justifica o irracional, além
de que às vezes irracional parece o que o não é, pois verossimilmente acontecem coisas que
inverossímeis parecem. 1461b
Aristóteles, Poética. XXV 1460b – 1461b
A partir dos dois fragmentos extraídos da Poética de Aristóteles, o conceito de imitação
implica em:
a) persuadir ao impossível pela cópia das emoções.
b) expressar o universal por meio das aparências.
c) Justificar o irracional por parecer ser o que não é.
d) não ser verossímil por falta de um paradigma.
e) superar a aparência ao propor a racionalidade.

8- O prazer ético
Embora o prazer seja nosso bem primeiro e inato, nem por isso escolhemos qualquer prazer:
há ocasiões em que evitamos muitos prazeres, quando deles nos advêm efeitos o mais das
vezes desagradáveis; ao passo que consideramos muitos sofrimentos preferíveis aos prazeres,
se um prazer maior advier depois de suportarmos essas dores por muito tempo. Portanto,
todo prazer constitui um bem por sua própria natureza; não obstante isso, nem todos são
escolhidos; do mesmo modo, toda dor é um mal, mas nem todas devem ser sempre evitadas.
Convém, portanto, avaliar todos os prazeres e sofrimentos de acordo com o critério dos
benefícios e dos danos. Há ocasiões em que utilizamos um bem como se fosse um mal e, ao
contrário, um mal como se fosse um bem.
Epicuro. Carta sobre a Felicidade. São Paulo: Unesp, 1997. Pag. 37.
Segundo o texto acima, qual expressão se coaduna com o acolhimento do prazer na teoria
hedonista de Epicuro?
a) Temperança.
b) Sofrimento.
c) Benefício.
d) Nihilismo
e) Vocação

9- Virtude e vida feliz


O homem se concilia antes de tudo às coisas conformes a sua natureza e, posto o princípio de
acolher aquilo que é conforme à natureza e rejeitar aquilo que lhe é contrário, surge o
primeiro dever de conservar-se na constituição natural e ater-se a tudo aquilo que favorece a
ela, rejeitando aquilo que lhe é adverso. Uma vez encontrado este procedimento de escolha e
de rejeição, imediatamente depois vem o hábito obrigatório de escolher a cada momento
atendo-se, constantemente e até ao último, à natureza: e aqui começamos a encontrar e
sentir a ideia daquilo que poderá ser chamado de sumo bem.
Zenão. Fr.25, por Cícero, Sobre os fins, III, 20. In Reale, Antisseri. História da Filosofia. Vol. 1.
Do fragmento acima é possível concluir que:
a) o homem vive conforme a natureza das coisas.
b) o princípio de escolha baseia-se no que é adverso.
c) ações boas são as que estão de acordo com a razão.
d) sumo bem é a natureza conciliando os opostos,
e) escolha é o processo de rejeitar o dever natural.

10- Estoicismo romano.


A partir dos enunciados abaixo:
“As coisas que nos assustam são em maior número do que as que efetivamente fazem mal, e
afligimo-nos mais pelas aparências do que pelos fatos reais.” (Sêneca)
"O que perturba e alarma o homem não são as coisas, são suas opiniões e fantasias a respeito
das coisas". (Epiteto)
Indique qual alternativa melhor expressa a característica do estoicismo romano.
a) Caráter prático da vida ética
b) Interesse pela physis da polis
c) Laço estreito entre o Estado e a Sociedade
d) Abandono do interesse religioso
e) Sentido da teologia especulativa grega.

11- Neoplatonismo de Plotino


A alma, purificada torna-se forma, razão. Torna-se totalmente incorpórea, intelectual e
pertence inteiramente ao Divino onde está a fonte da beleza e de onde nos vêm todas as
coisas do mesmo gênero. A alma, portanto, reconduzida à inteligência, é muito mais bela que
as coisas sensíveis. Mas a inteligência e aquilo que dela deriva e para a alma uma beleza
própria, não alheia, pois a alma antão está verdadeiramente só. Por isso se diz justamente que
o bem e a beleza da alma consistem em se assemelhar a Deus, uma vez que dele derivam o
belo e a natureza essencial dos seres.
Plotino, Enéadas, I, 6, 6 (Sobre o Belo).
De acordo com o trecho acima, qual é o conceito de alma?
a) Imagem e semelhança de Deus
b) O bem ético da natureza
c) Essência dos seres corpóreos
d) Última realidade inteligível
e) Beleza das coisas sensíveis

12- Paulo e a questão do “Evangelho”

Leia atentamente a carta de Paulo a Filêmon.


1 Paulo, prisioneiro de Jesus Cristo, e seu irmão Timóteo, a Filêmon, nosso muito amado
colaborador (...) 5 ao receber notícia da tua caridade e da fé que tens no Senhor Jesus e para
com todos os santos, 6 para que esta tua fé, que compartilhas conosco, seja atuante e faça
conhecer todo o bem que se realiza entre nós por causa de Cristo. 7 Tua caridade me trouxe
grande alegria e conforto, porque os corações dos santos encontraram alívio por teu
intermédio, irmão.
8 Por esse motivo, se bem que eu tenha plena autoridade em Cristo para prescrever-te o que é
da tua obrigação, 9 prefiro fazer apenas um apelo à tua caridade. Eu, Paulo, idoso como estou,
e agora preso por Jesus Cristo, 10 venho suplicar-te em favor deste filho meu, que gerei na
prisão, Onésimo. 11 Ele poderá ter sido de pouca serventia para ti, mas agora será muito útil
tanto a ti como a mim. 12 Torno a enviá-lo para junto de ti, e é como se fora o meu próprio
coração. 13 Quisera conservá-lo comigo, para que em teu nome ele continuasse a assistir-me
nesta minha prisão pelo Evangelho. 14 Mas, sem o teu consentimento, nada quis resolver, para
que tenhas ocasião de praticar o bem (em meu favor), não por imposição, mas sim de livre
vontade.
15Se ele se apartou de ti por algum tempo, foi sem dúvida para que o pudesses reaver para
sempre. 16 Agora, não já como escravo, mas bem mais do que escravo, como irmão caríssimo,
meu e sobretudo teu, tanto por interesses temporais como no Senhor. 17 Portanto, se me tens
por amigo, recebe-o como a mim. 18 Se ele te causou qualquer prejuízo ou está devendo
alguma coisa, lança isto em minha conta. 19 Eu, Paulo, escrevo de próprio punho: Eu pagarei.
Para não te dizer que tu mesmo te deves inteiramente a mim!
A pergunta que está inclusa no texto acima é?
a) Onésimo será recebido por Filêmon?
b) O evangelho é capaz de abolir a escravidão?
c) Filêmon devolverá Onésimo para viver com Paulo?
d) Paulo e Onésimo estão presos por causa do Evangelho?
e) Filêmon reconhecerá a dívida que tem para com Paulo?

13 – Patrística

Vou te dizer o que é claro para mim. De fato, a filosofia é o maior e o mais precioso bem diante
de Deus, para o qual somente ela nos conduz e nos associa. Na verdade, santos são aqueles
que consagram à filosofia a própria inteligência. No entanto, o que seja a filosofia e o motivo
pelo qual ela foi enviada aos homens muitos o ignoram, pois do contrário não existiriam
platônicos, nem estóicos, nem teóricos, nem pitagóricos, sendo ela uma única ciência. Quero
explicar porque ela passou a ter muitas cabeças. A questão é que aos primeiros que a ela se
dedicaram e se tornaram famosos em sua profissão, seguiram outros que não fizeram mais
nenhuma investigação sobre a verdade. Ao contrário, levados pela admiração da constância,
do domínio de si e da raridade das doutrinas de seus mestres, só aceitaram como verdade o
que cada um tinha deles aprendido. Então, transmitindo a seus sucessores doutrinas
semelhantes às primitivas, cada escola tomou o nome daquele que foi o pai da doutrina.
Justino, I e II Apologias, 1995, página 57.

Segundo o texto acima, a Filosofia, assim como sua busca pela verdade deve ser pautada por
qual virtude?
a) Aceitação da vontade de Deus
b) Alcance da santidade
c) Honestidade intelectual
d) Dedicação ao aprendizado
e) Transmissão das doutrinas

14 – Santo Agostinho

“Não saias de ti, mas volta para dentro de ti mesmo, a Verdade habita no coração do homem.
E se não encontras senão a tua natureza sujeita a mudanças, vai além de ti mesmo. Em te
ultrapassando, porém, não te esqueças que transcendes tua alma que raciocina. Portanto,
dirige-te à fonte da própria luz da razão. Aonde pode chegar, com efeito, todo bom pensador
senão até à Verdade? Se a Verdade não é atingida pelo próprio raciocínio, ela é justamente, a
finalidade da busca dos que raciocinam. Eis a harmonia que nada mais poderia ultrapassar.
Harmoniza-te com ela.” (Santo Agostinho, A Verdadeira Religião. Páginas 106-107)

Ao se discutir temas daí derivados, como a ética, por exemplo, a conclusão é que, segundo o
excerto, sua fonte deriva da:

a) revelação dada por Deus


b) verdade filosófica em si
c) oração de interiorização
d) metodologia transcendental
e) autonomia do pensamento

Gabarito das questões:


1- b
2- e
3-I. c
3-II. d
3-III. a
4- b
5- c
6- d
7- b
8- a
9- c
10- a
11- d
12- b
13- c
14- e
BIBLIOGRAFIA
Abbagnano, N. Dicionario de Filosoía. Traducción de Alfredo N. Galletti. Bogotá: Fondo de
Cultura Económica, 1997.
Aristóteles. Metafísica. Tradução de Lucas Angioni. Campinas: UNICAMP/IFCH, 2002.
___ Metafísica, Ética a Nicômaco e Poética. Traduções respectivas de Vincenzo Coceo, Leonel
Vallandro e Eudoro de Souza. São Paulo: Abril Cultural, 1984.
Cassirer, E. O Mito do Estado. Tradução de Álvaro Cabral. São Paulo: Codex, 2003.
___ Um Ensaio sobre o Homem. Tradução de Vicente Feliz de Queiroz. São Paulo, Mestre Jou,
1977.
Copleston, F. Historia de la Filosofia. 9 volumes. VVTT. Barcelona: Ariel, 1993- 1996.
Eliade, M. Mito e Realidade. Tradução de Pola Civelli. São Paulo: Perspectiva, 1972.
Epicuro. Carta sobre a Felicidade. São Paulo: Unesp, 1997.
Justino, Martir, Santo Justino de Roma. I e II Apologias: Diálogo com Trifão. Tradução de Ivo
Storniolo, Euclides M. Balancin. 2ª edição. São Paulo: Paulus, 1995.
Nietzsche, F.W. A Filosofia na Era Trágica dos Gregos. Tradução de Gabriel Valladão Silva.
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Reale, G. Antisseri, D. História da Filosofia. 7 volumes. Tradução de Ivo Storniolo. São Paulo:
Paulus, 2003 - 2006.
Platão. Diálogos – o Banquete, Fedon, Sopfista, Político. Tradução de José Cavalcante de Souza.
São Paulo: Nova Cultural, 1991 (Os pensadores).
___. A República. Tradução de Enrico Corvisieri. São Paulo: Nova Cultural, 1997.
Plotino. Enéadas. Tradução de José Carlos Baracat Jr. Tese de Doutorado. Campinas: Unicamp,
2006.
Santo Agostinho. A Verdadeira Religião. São Paulo: Ed Paulinas, 1986.
___. Agostinho, Santo. Confissões; De magistro. 2. ed. São Paulo : Abril Cultural, 1980. (Coleção
Os pensadores).

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