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IRID

Teoria das Relações Internacionais I


Bruno Magalhães
brunoepbm@gmail.com
Recapitulação

Primeiro Grande Debate


Contexto Geral

Mesmo antes da 1a Guerra Mundial, guerras estavam


se tornando cada vez mais frequentes e cada vez mais
destrutivas.
Pergunta

“É possível acabar com


as guerras?"
Três escolas:

Teoria Marxista sobre Imperialismo


Sim, é possível acabar com guerras, mas só quando
passarmos do capitalismo para o socialismo.
Institucionalismo Clássico
Sim, é possível acabar com guerras retirando os incentivos
negativos para que guerras aconteçam e aumentando os
incentivos positivos, econômicos e institucionais, para
cooperação.

Realismo Clássico
Não, não é possível nos livrarmos completamente da guerra.
Em vez de buscarmos o fim das guerras, devemos buscar
estabilidade via equilíbrio de poder.
Em vez de ficarmos pensando sobre como a política
internacional deveria ser, deveríamos nos dedicar a entender
como ela é na prática.

Aula de Hoje
Segundo Grande Debate
Abordagem Científica x
Abordagem Tradicional
Pergunta:

“Devemos estudar a
política internacional
usando os métodos da
política internacional
usando os métodos da
ciências humanas,
como a análise
histórica e a análise
conceitual, ou
devemos estudar a
política internacional
usando os métodos
das ciências exatas,
como a modelagem, a
estatística e a análise
sistêmica?”
Parênteses
1) Realmente existiu um segundo
debate?
Entre acadêmicos, período que teria
sido marcado pelo Segundo Debate não
teve essa realidade binária.
Havia tema de interesse comum:
Qual a forma adequada de estudar as relações
internacionais?
Mas havia temas de interesse exclusivo das abordagens
científicas
Quais são as configurações possíveis do sistema
internacional?
Qual a configuração atual do sistema internacional?
Quais variáveis sociais estão correlacionadas com a
incidência de guerras?
Assim como havia temas de interesse maior para as
abordagens tradicionais
Em mais detalhes:

2) Relação com o Primeiro Debate


Defesa de cientificidade já estava presente no 1o debate -
em especial na crítica feita por realistas clássicos ao
voluntarismo dos institucionalistas.
No segundo debate, a chamada por cientificidade vai se virar
contra o realismo clássico.
Por exemplo,
Hans J. Morgenthau
Morgenthau defendeu que o "poder" é um fenômeno
complexo e, essencialmente, de natureza mental.
Assegurou que um equilíbrio de poder nunca é um
resultado automático apenas da força militar.
Um equilíbrio de poder é mais do que um simples
equilíbrio de forças.
Para que o equilíbrio de poder internacional funcione
corretamente, tem de ser sustentado por um
consenso percetivo subjacente - ou "compacto
silencioso" (Morgenthau 19.78, p. 226).
Essa abertura para o psicológico nos argumentos de
Morgenthau foi considerado pouco científica por uma
nova geração de analistas.
Enquanto Morgenthau via o equilíbrio de poder como um
produto complexo das percepções dos homens de
Estado e da cooperação diplomática, eles viam o
equilíbrio de poder como um simples equilíbrio de forças.
Definiam o poder em termos materiais e concretos,
como quantidade de tanques, aviões etc.

Contexto:
Contexto político (mais relevante para
entender a abordagem tradicional)
II Guerra Mundial foi seguida pela
criação da ONU e novo esforço de
normatização das relações
normatização das relações
internacionais.

II Guerra Mundial foi seguida pela Guerra


Fria.
II Guerra Mundial foi seguida pelo
processo de descolonização que criou
novos Estados como atores da política
internacional.
Contexto intelectual (mais relevante para
entender a abordagem científica)
Ascensão de abordagens científicas nas
Ciências, incluíndo as sociais, incluíndo
as RI.
Popperianismo
Popperianismo se espalha como a compreensão
dominante sobre filosofia da ciência.
Falseabilidade
Só conta como científica tese que é passível de
falsificação.
Não representacionalismo das teorias

Teorias não servem para representar.


Teorias são simplificações do real
voltadas a gerar previsibilidade.
Exemplo: Modelagem
A construção de modelos se espalha como uma
técnica metodológica recorrente, primeiro na
economia, e, com o tempo, nas Ciências Sociais
como um todo, incluíndo as RI.
Como as agentes racionais se comportam quando
estão interagindo?
O que é um modelo?
Técnica de pesquisa desenvolvida na economia.
Um modelo é uma descrição simplificada da
realidade, concebida para produzir hipóteses
sobre o comportamento de atores que possam
ser testadas.
Os modelos econômicos podem ser bastante
simples:
Exemplo 1: "quanto mais baratas são as
maçãs, mais maças são compradas”.
Existem duas grandes classes de modelos
econômicos - teóricos e empíricos.
Tópico:
Comportamento de consumo do agente
Modelo teórico:
Existe uma relação positiva entre
despesas e rendimentos.
Os modelos teóricos fornecem
respostas qualitativas a questões sobre
a economia
Modelo empírico:
O modelo empírico tenta atribuir um valor
numérico ao montante médio da despesa
que aumenta quando o rendimento
aumenta.
Os modelos empíricos têm por objetivo
verificar as previsões qualitativas dos
modelos teóricos e converter essas
previsões em resultados numéricos
precisos.
O que são correlações?
Relação entre duas variáveis
Teoria dos Jogos como exemplo de abordagem
voltada à modelagem do comportamento humano
Exemplo
Consideremos um soldado na frente de batalha,
esperando com os seus camaradas para repelir
um ataque inimigo.
Pode ocorrer-lhe que, se a defesa for bem
sucedida, então não é muito provável que a sua
contribuição pessoal seja essencial.
Mas se ele ficar, corre o risco de ser morto ou
ferido - aparentemente sem razão.
Por outro lado, se o inimigo vai ganhar a
batalha, então as suas hipóteses de morte ou
ferimento são ainda maiores, e agora
claramente sem razão de ser, uma vez que a
linha será de qualquer modo dominada.
Com base neste raciocínio, parece que o
soldado vai se dar melhor se fugir,
independentemente de quem vai ganhar a
batalha.
Platão, Laches e Symposium
Muito antes de a teoria dos jogos ter surgido para
mostrar aos analistas como pensar
sistematicamente neste tipo de problema, este já
tinha ocorrido a alguns líderes militares reais e
influenciado as suas estratégias.
Por exemplo, o conquistador espanhol Cortez,
ao desembarcar no México, tinha boas razões
para recear a sua capacidade de repelir o ataque
ao desembarcar no México, tinha boas razões
para recear a sua capacidade de repelir o ataque
dos astecas, muito mais numerosos.
Cortez eliminou o risco de as suas tropas
pensarem em bater em retirada queimando os
navios em que tinham desembarcado.
Tendo a retirada sido fisicamente
impossibilitada, os soldados espanhóis não
tinham outra alternativa senão ficar e lutar - e,
além disso, lutar com toda a determinação
que pudessem reunir.

Behaviorismo
Behaviorismo se espalha como uma das abordagens
metodológicas dominantes, primeiro na psicologia, e, com
o tempo, nas Ciências Sociais como um todo, incluíndo
as RI.
Imagem
O termo Behaviorismo foi formalmente estabelecido com
a publicação em 1913 do artigo clássico de John B.
Watson, "Psychology as the Behaviorist Views It".

"Dêem-me uma dúzia de crianças saudáveis, bem


formadas, e o meu próprio mundo específico para as
criar, e eu garanto que pegarei em qualquer uma delas
ao acaso e treiná-la-ei para se tornar qualquer tipo de
especialista que eu possa selecionar - médico,
advogado, artista, chefe de comércio e, sim, até
mendigo e ladrão, independentemente dos seus
talentos, inclinações, tendências, capacidades,
vocações e raça dos seus antepassados. "4
Qualquer pessoa, independentemente dos seus
antecedentes, pode ser treinada para agir de uma
determinada forma, desde que seja devidamente
condicionada.
De cerca de 1920 até meados da década de 1950, o
behaviorismo tornou-se a escola de pensamento
dominante na psicologia.
Os investigadores estavam interessados em criar
teorias que pudessem ser claramente descritas e
empiricamente medidas, mas também utilizadas para
dar contribuições que pudessem ter influência no
tecido da vida humana quotidiana.
O Behaviorismo tornou-se uma abordagem dominante
nas ciências sociais durante as décadas de 1950 e 1960.
Exemplos:
Behaviorismo na ciência política
Talvez as contribuições comportamentais mais
importantes para a ciência política tenham sido os
estudos eleitorais.

Angus Campbell e colegas, The American Voter


(1960),
Utilizaram os resultados de análises estatísticas
eleitorais para desenvolver o conceito de
identificação partidária - a ligação psicológica a
longo prazo de um eleitor a um partido político.
Afirmaram que era possível classificar o que
condicionava o comportamento de voto:
O comportamento de voto é condicionado, em
primeiro lugar, pela forma como o eleitor foi
socializado, principalmente pelos seus pais,
para adotar uma determinada identificação
partidária.
A religião, a classe social, a região e a etnia,
argumentaram, condicionam o comportamento
de voto, por esta ordem, mas são todos
secundários ao condicionamento parental.
Behaviorismo na sociologia
Seymour Martin Lipset, Political Man

Lipset utilizou estatísticas econômicas sobre


sociedades para identificar os fatores que se
correlacionavam com a adoção pelos países de
sistemas políticos autoritários ou democráticos.
Lipset encontrou uma forte relação entre o nível
de afluência e o tipo de sistema político,
Os países pobres raramente criam estruturas
democráticas.
Lipset desenvolveu a teoria da modernização:
o desenvolvimento econômico está
correlacionado com o desenvolvimento de
instituições democráticas.

Análise Sistêmica
Mudança de diretriz do Departamento
de Estado
Exemplo do embate entre abordagem tradicional e abordagem científica na prática.

George F Kennan
Diretor da equipe de planejamento de políticas do
Departamento de Estado dos EUA
Desempenhou um papel importante no desenvolvimento
de programas e instituições definitivos da Guerra Fria,
especialmente o Plano Marshall.
Seu "Longo Telegrama" de Moscou durante 1946 e o
artigo subsequente de 1947, As Fontes da Conduta
Soviética, argumentaram que o regime soviético era
inerentemente expansionista e que sua influência deveria
ser "contida" em áreas de importância estratégica vital
para os Estados Unidos.
Esses textos justificaram a nova política anti-soviética do
governo Truman.
Seus conceitos se tornaram a política dos Estados Unidos
Kennan era histórica e filosoficamente inclinado
Ele lera o relato de Gibbon sobre o declínio e queda do
Império Romano para melhorar sua compreensão do
comportamento soviético e americano
Paul Nitze
Substituiu Kennan como diretor da equipe de
planejamento de políticas do Departamento de Estado
dos EUA
Havia sido analista das pesquisas de bombardeiros
estratégicos dos EUA
Análise fotográfica dos bombardeamentos de guerra
Medição dos danos causados
Avaliação numérica dos efeitos
Formula estratégia baseada em projeções econômicas
NSC-68
Recomendou um reforço militar maciço destinado a
criar um equilíbrio de forças favorável entre os EUA e
a URSS
Defendeu aumento de impostos impulsionado por
gastos com defesa

Abordagens científicas para as RI


Pergunta(s) motivadoras:

Qual a forma adequada de estudar as


relações internacionais?
Quais são as configurações possíveis do sistema
internacional?
Qual a configuração atual do sistema internacional?
Quais variáveis sociais estão correlacionadas com a
incidência de guerras?
Expoentes:
J. David Singer
Foto

Argumentos principais:
Quais variáveis sociais estão correlacionadas com a
incidência de guerras?
The Correlates of War Project (1963)
Objetivo
Acúmulo sistemático de dados quantitativos sobre a
incidência e a extensão da guerra inter-estatal e
extra-sistêmica no período pós-napoleônico
O projeto na prática
Mede a variação temporal da guerra
Mede a variação espacial da guerra
Acompanha as variáveis que podem estar
relacionadas com estas variações
Exemplos de variáveis:
Capacidade nacional
Indicadores
- despesas militares
- pessoal militar
- consumo de energia,
- pessoal militar
- consumo de energia,
- produção de ferro
- produção de aço
- população urbana
- população total
Alianças
Indicadores
patos de defesa mútua,
tratados de não agressão
tratados bilaterais de defesa
representação diplomática
Sub-indicadores:
- encarregado de negócios
- ministro
- embaixador

Geografia
Indicadores
- fronteiras terrestres desde o Congresso de
Viena
- fronteiras marítimas desde o Congresso de
Viena
- alterações pacíficas de território de 1816-2018
- alterações violentas do território de 1816-2018
Participação em organizações intergovernamentais
Indicadores
participação em organizações selecionadas de
1815 a 2014
Exemplos de OI, além do sistema das Nações
Unidas:
African Interstate Tourist Office
Arab International Tourist Office/Arab Tourist
Organization
Commonwealth Shipping Committee
East African Agriculture and Forestry Research
Organization
European Conference of Insurance
Supervisory Services
General Fisheries Council of the
Mediterranean
Imperial War Museum
Inter-American Statistical Committee
International Association of Railway
Congresses
International Boundary Commission (US-
Mexico)
International Boundary Commission (US-
Canada-UK)
Int’l Commission for the Decennial Revision of
the Nomenclature of the Causes of Death
International Computation Center
International Institute of Administrative
Sciences
International Joint Commission (US-Canada)
International Pacific Halibut Commission
International Pacific Salmon Fisheries
Commission
International Meteorological Organization
Comércio
Fluxos comerciais nacionais e bilaterais totais
entre estados de 1870-2014
Morton A. Kaplan

Argumentos principais:
Qual a forma mais adequada de estudar as relações
internacionais?
A forma mais adequada de estudar as ri é via a criação
de modelos sobre o sistema internacional e via busca
por correlações com base no acúmulo de dados
quantificados.
Um modelo é uma descrição simplificada da
realidade, concebida para produzir hipóteses sobre o
comportamento de atores que possam ser testadas.
Porque esta forma de estudar as RI é superior,
segundo behavioristas?
A forma tradicionalista de estudar as ri gera teorias
que não são falsificáveis
A literatura tradicional em relações internacionais é
uma grande massa de detalhes da qual se derivam
generalizações absurdamente amplas e muitas
vezes não falsificáveis.
Por exemplo, afirma-se que a teoria tradicional do
"equilíbrio de poder" se aplica independentemente
do número e do tipo de Estados, das variações de
motivação, dos tipos de sistemas de armamento
etc.
As generalizações são aplicadas
indiscriminadamente em enormes extensões de
tempo e espaço.
São enunciados de forma suficientemente vaga
para que quase nenhum acontecimento possa ser
incoerente com eles.
Se não forem seguidos os procedimentos
científicos, na medida em que o assunto o permita,
as intuições não podem ser falsificadas e a ciência
científicos, na medida em que o assunto o permita,
as intuições não podem ser falsificadas e a ciência
não pode crescer.
Sem modelos teóricos não podemos sequer formular
questões.
Quem estuda as ri nunca vai atingir a mesma
certeza que um físico pode esperar sobre as suas
teorias. Ainda assim, criar teorias via método
científico é a melhor forma de estudar as ri.
O grau de confiança que depositamos nos nossos
estudos nunca se aproximará do que o físico tem
no estudo da mecânica (embora outras áreas da
física possam apresentar problemas tão graves
como os da política);
mas sem modelos teóricos não podemos sequer
fazer as discriminações que se nos abrem e
explorar estas questões.
Modelos teóricos permitem simplificar estudo de
tópicos complexos e gerar previsibilidade.
Note que isso não é o mesmo que dizer que
modelos são retratos fidedignos do mundo lá fora.
Quem estuda as ri não deve achar que modelos
teóricos são retratos da realidade. Modelos
teóricos são ferramentas heurísticas.
Um construtor de modelos sabe que eles só são
aplicáveis sob parâmetros específicos.
A pessoa que trabalha com modelos geralmente
passa pela difícil tarefa de justificar sua
associação entre os parâmetros do modelo e o
mundo real.
Ninguém que tenha passado por isso é
suscetível de confundir modelo com realidade.
Quantificar (em particular, identificar correlação entre
variáveis sociais e funcionamento do sistema
internacional) é a forma mais confiável de estudar as
ri.
Várias ações humanas dependem de motivações
inconscientes que são frequentemente
inconsistentes com as motivações conscientes.
As motivações inconscientes são mais
frequentemente confirmadas pela observação e
análise cuidadosas dos padrões de comportamento
das pessoas e das tentativas de explicar esses
comportamentos.
Os instrumentos normais de observação científica
cuidadosa e controlada são inestimáveis.
Aqueles que aspiram a uma "ciência" da política
insistem na precisão, no rigor, na quantificação e na
teoria geral.
Se o número, o tipo e o comportamento das nações
diferem ao longo do tempo, e se as suas
capacidades militares, os seus bens econômicos e
a sua informação também variam ao longo do
tempo, então é provável que haja alguma correlação
entre esses elementos.
Quais são as configurações possíveis do sistema
internacional?
Existem seis formas diferentes de organizar o sistema
internacional
O sistema de equilíbrio de poderes.
Os atores nacionais agirão em oposição a qualquer
ator ou coligação de atores que se considere estar a
ascender a uma posição dominante no sistema
internacional.
O sistema bipolar frouxo.

O sistema bipolar surge quando duas nações


formam dois blocos diferentes com outros atores
nacionais que cooperam entre si.
O sistema bipolar frouxo significa que as duas
superpotências estão rodeadas de nações não
alinhadas
A existência de nações não alinhadas restringe
os poderes das duas superpotências.
O sistema bipolar rígido.

Os Estados não alinhados desaparecem da cena


internacional
Restam apenas dois blocos de superpotências
O sistema internacional hierárquico.
O mundo inteiro é absorvido por um ator universal
Só existe uma nação.
O sistema universal.

A função judicial, econômica e política é


desempenhada pelo ator universal (ex: Nações
Unidas).
O ator universal é suficientemente poderoso para
impedir os atores nacionais de recorrerem à força.
Neste sistema, as nações utilizam meios pacíficos
para atingir os seus objectivos
O sistema de veto unitário.
Todos os atores nacionais dispõem de armas
capazes de destruir qualquer outro ator, embora não
possam impedir a sua própria destruição.
Qual a configuração atual do sistema internacional?
Na época em que Kaplan estava escrevendo:
Guerra Fria
Sistema bipolar frouxo.

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