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Introdução às Relações Internacionais e Defesa

Orientações para a 1ª Prova (P1)

1) Níveis de Análise das Relações Internacionais:

- Quando se faz uma análise do cenário internacional, o pesquisador pode sustentar a sua tese em
cima de três níveis de análise: o 1º nível é o da natureza humana; o 2º é o do Estado; e o 3º é o do
Sistema Internacional.

- 1º Nível de Análise: Natureza Humana


- Quando se prioriza o 1º nível de análise, o pesquisador se concentra na natureza humana para
explicar um fenômeno social.
- O 1º nível de análise tenta revelar como os eventos históricos não podem ser isolados das
decisões humanas, particularmente das decisões das pessoas investidas de poder em um momento
crucial na história daquela sociedade.

- Kenneth Waltz, um importante teórico das Relações Internacionais, fez sua tese de doutorado
sobre os três níveis de análise. A tese é intitulada “O homem, o Estado e a guerra” (a guerra como
reveladora da real natureza do sistema internacional).
-Lá, Waltz nos diz que, para o teóricos da natureza humana: “As guerras resultam do egoísmo, de
impulsos agressivos mal canalizados e da estupidez [humana].” (WALTZ, 2004, p. 23)

- O problema de uma análise baseada exclusivamente na natureza humana é que ela não leva em
consideração diversas pressões estruturais, como rivalidades históricas, tensões geopolíticas,
conjuntura econômica, algum incidente diplomático, que modi cam o contexto no qual os
estadistas farão suas escolhas estratégicas.
- Sem falar que a história não é feita exclusivamente por indivíduos, mas por grupos sociais
pressionando o sistema o tempo todo.

2º Nível de Análise: Estado


- Quando se prioriza o 2º nível, o pesquisador se concentra tanto na razão de ser dos Estados
quanto na organização interna dos Estados.

- O Cardeal Richilieu, assessor do Rei Luís XIV, o Rei Sol, disse que a raison d’être do Estado (a
razão de ser do Estado) é sobreviver no Sistema Internacional anárquico.
- Para isso os Estados deveriam obedecer a duas razões: a externa e a interna.
- A razão externa do Estado é a Defesa, é garantir a soberania política, a integridade dos recursos e
a liberdade da população.
- A razão interna do Estado é a Justiça.

- Sobre a organização interna dos Estados, cabe destacar a Tese da Paz Democrática.
- Essa tese, difundida pelo ex-presidente americano Woodrow Wilson, defende que democracias
não entrariam em guerra contra outras democracias.
- O raciocínio é o seguinte:
- Se é o povo quem vai pra guerra, sendo recrutados como soldado ou sendo convocados para
atuar nas funções públicas e na indústria de defesa, e se esse povo vive em um regime democrático,
então, o povo não elegeria um presidente com discurso belicoso, que ameaçasse outros países,
porque, no nal das contas, quem pagaria com tributo de sangue a escolha de ir à guerra seria o
próprio povo, uma vez que a elite não vai para a guerra, a elite ca protegida em suas torres de
mar m, esperando o resultado do con ito para assinar novos contratos vantajosos.
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- Essa ideia é até interessante, mas a opinião pública não obedece a essa racionalidade, a opinião
pública é movida por êxtases patrióticos, suscetíveis a convocações de emoções profundas que
permitem a mobilização das massas.

- Os defensores da tese da paz democrática respondem às críticas dizendo que o processo de


democratização ainda é muito recente na história humana e que a maioria das democracias ainda
são jovens e não amadureceram suas instituições.
- A resposta dos defensores da tese da paz democrática faz algum sentido.

- O polêmico lósofo esloveno Slavoj Zizek disse que, apesar de todas as críticas ao m da história
de Francis Fukuyama, a ideia de apostar nas democracias liberais como uma importante inspiração
política faz sentido no atual cenário histórico da humanidade.
- Talvez a humanidade consiga no longo prazo, com democracias maduras, pensar em inovações
incrementais para pensar novas e melhores formas de governo, mas, hoje, a aposta na democracia
liberal faz bastante sentido.

- 3º Nível de Análise: Estrutura Internacional


- A principal característica do sistema internacional é que ele é anárquico.
- O que signi ca dizer que o sistema internacional é anárquico?

- O sistema internacional é anárquico, porque os Estados são soberanos; se o Estados não fossem
soberanos, se os Estados não tivessem autoridade máxima sobre suas questões internas e sobre
suas relações exteriores, então caria claro que haveria uma outra autoridade política superior aos
Estados, uma autoridade que lhes daria ordens sobre suas questões internas e sobre suas relações
exteriores.

- O raciocínio ao contrário também é válido.


- Os Estados só são soberanos porque não existe um governo supranacional, acima das nações,
porque o sistema internacional é anárquico.

- Anarquia não é sinônimo de caos. Anarquia é uma forma de governo que nega uma autoridade
acima das demais, privilegiando redes horizontalizadas de decisão coletiva.

- Quando se fala de anarquia internacional, portanto, estamos falando que, no sistema internacional,
não há um ente político acima dos Estados, não há um governo supranacional acima das nações,
capaz de resolver as disputas e impor coercitivamente uma norma, porque, no sistema
internacional, os Estados são soberanos para resolverem suas questões internas sem interferência
de nenhum ator externo e os Estados são independentes para aderir voluntariamente ou não a
uma norma internacional negociada horizontalmente entre os demais Estados.

- Nessa concepção, Burundi é tão independente e soberano quanto os Estados Unidos; Haiti é tão
independente e soberano quanto a França; Palau é tão independente e soberano quanto a
Argentina.

- É claro que essa a rmação parece um pouco ingênua se formos encarar a assimetria de poder e
de riqueza existente entre os Estados citados no exemplo.
- Stephen Krasner tem um importante livro em que ele trabalha a ideia de soberania como se
fosse uma hipocrisia organizada.
- A crítica feita por Krasner precisa ser diluída, porque a sociedade internacional tem avançado
bastante na construção de normas e de instituições internacionais, que conseguem constranger os
Estados a atuarem de um modo mais interessante para o mundo, embora constranja de modo
seletivo cada Estado.
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- Para Stephen Krasner, uma dose de hipocrisia é necessária para a sociedade internacional
continuar avançando no fortalecimento das instituições multilaterais e na expansão do direito
internacional

- Kenneth Waltz, na sua tese “O homem, o Estado e a guerra”, diz o seguinte:


“A ausência de uma autoridade acima dos Estados, para prevenir e conciliar os con itos que
surgem necessariamente de vontades particulares signi ca que a guerra é inevitável”. (WALTZ,
2004, p. 235)

- O livro mais conhecido de Kenneth Waltz é “Teoria da Política Internacional”, em que ele se
apresenta como um realista estrutural, privilegiando o 3º nível de análise,
- Para Waltz, as teorias que privilegiam suas explicações com base na natureza humana e nos
regimes dos Estados seriam teorias reducionistas, enquanto que as teorias que privilegiam a
estrutura internacional seriam teorias sistêmicas.
- Waltz privilegiava o sistema internacional porque o sistema internacional não seria a mera soma
das diferentes ações estatais.
- Para Waltz, o todo do sistema internacional seria maior que a soma das partes dos Estados.
- É verdade que os Estados constituem o Sistema Internacional, mas, uma vez, funcionando essa
estrutura internacional, ela ganha autonomia, ela é capaz de pressionar as ações dos Estados.
- As dinâmicas internacionais ao mesmo tempo em que são constituídas pelos Estados também
constituem os Estados.
- É no espaço internacional que os Estados socializam.
- Segundo Waltz, somente uma ontologia que privilegiasse o estudo da estrutura internacional
poderia ser chamada de uma teoria de Relações Internacionais.
- Apesar dos avanços de várias agendas, essa visão estruturalista de Waltz continua mainstream no
debate teórico das Relações Internacionais.
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2) Modelos de Natureza Humana

- Thomas Hobbes (1588-1679), em “Leviatã ou Matéria, Palavra e Poder de um Governo


Eclesiástico e Civil”, de 1651, faz a famosa a rmação de que “o homem é o lobo do próprio
homem” e que o estado de natureza é o estado de “guerra de todos contra todos” (bellum omnia
omnes).

- A premissa que Hobbes se fundamentou para dizer que “o homem é o lobo do próprio homem”
baseia-se na crença de que ninguém vai aceitar se subordinar a outra pessoa por livre e
espontânea vontade, só porque um outro qualquer quer a pessoa se submeta.
- Ninguém estaria disposto a deixar de ser livre para atender aos caprichos de uma outra pessoa.
- No entanto, como, nesse estado de natureza, de “guerra de todos contra todos”, há muita
violência e medo de que se possa ser a próxima vítima, então as pessoas decidiriam organizar
coletivamente um conjunto de normas capazes de implantar regras e de punir quem tivesse uma
conduta desviante.

- Perceba que não se trata de simplesmente se submeter ao capricho de uma pessoa qualquer, mas
de obedecer uma autoridade constituída, cujos poderes foram prede nidos e limitados por algum
código de conduta, escrito ou não.
- Esse ato de vontade coletiva celebraria tacitamente um contrato social, no qual os indivíduos
abririam mão de sua liberdade em nome da segurança.
- Esse contrato daria amplos poderes para um monstro mitológico, o Leviatã, uma entidade de
cção jurídica que teria autoridade máxima para legislar, julgar e executar atos públicos,
procurando atingir o bem coletivo maior em detrimento do atendimento dos caprichos dos
interesses individuais.

- Assim, as pessoas abririam mão coletivamente da sua liberdade em benefício da segurança de um


estado civil.
- Estado civil não como oposição ao militar, mas como oposição ao estado de natureza. Civil de
civilizado.
- Civilização, portanto, implica em limitar sua liberdade individual em benefício de um bem coletivo
maior: a segurança coletiva e a estabilidade social.
- Em contrapartida, as pessoas investidas de autoridade gozariam de poderes em função de suas
atribuições públicas e não como privilégio de mando pessoal.

- Essa perspectiva de natureza humana, de que ninguém está disposto a se submeter ao capricho
de ninguém, mas que entendem coletivamente a necessidade de se criar regras de conduta que
limitem a liberdade individual em prol da segurança coletiva, subordinando a conduta das pessoas
investidas de autoridade ao escrutínio legal, traz importantes re exões sobre a natureza política da
nossa sociedade e sobre a ideia de civilização como castração, ao menos parcial, das liberdades
individuais.

- Jean-Jacques Rosseau (1712-1778), em “Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da


Desigualdade entre os Homens”, de 1754, defende o “mito do bom selvagem” em que sustenta que
o homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe.

- A ideia de uma natureza humana genuinamente boa tem origem numa leitura idílica da vida dos
indígenas brasileiros.

- Uma visão super cial dos cronistas europeus sobre os povos indígenas, após um breve contato,
sustentava o mito de que eram povos “sem fé, sem lei, sem rei”, como descrito pelo cronista Pero
de Magalhães Gândavo.
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- Errado nos três aspectos. Os povos indígenas simplesmente não tinham a mesma religião, nem o
mesmo código jurídico, nem a mesma forma de governo dos europeus.
- No entanto, os povos nativos das Américas tinham governos, regras e deuses, bem como
conviviam com disputas tanto con itos internos dentro das tribos quanto guerras entre as tribos
indígenas.
- Não era o paraíso terreno, mas também não era a barbárie total. Todos os povos apresentam
doses igualmente relevantes de civilidade e de barbárie.

- Contudo, essa ideia de “sem fé, sem lei, sem rei” respaldou uma ideia de sociedade paradisíaca
que não corromperia o homem.
- Esses relatos corriam a Europa, aguçavam a curiosidade das cortes e inspiraram tanto a ideia de
“Utopia”, de Thomas More, quanto o “mito do bom selvagem”, de Jean-Jacques Rosseau.

- O “mito do bom selvagem” é ingênua e equivocada, mas essa visão de que a sociedade corrompe
o homem é importante demais porque mostra como a vida em sociedade é uma vida de disputa de
poder.
- Mesmo com um Leviatã, tentando controlar e ordenar as disputas dentro da sociedade, ainda
assim, haveria uma pulsão destrutiva nos homens que faria com que a vida em sociedade estivesse
sempre num frágil equilíbrio prestes a ser rompido.
- Essa ideia de equilíbrio frágil em uma sociedade com diversos focos de con ito por
micropoderes é muito importante.
- Rosseau cou convencido de que o homem é bom por natureza, sendo a vida em sociedade a
causa da sua degradação moral.
- No nal, apesar do ponto de partida idealizado sobre a natureza humana, a inevitabilidade da
corrupção humana na vida em sociedade, consolida a ideia de que o ser humano isoladamente
poderia até ser bom, mas, quando está em sociedade, seria corrompido pelo desejo de poder, ainda
que apenas fosse micropoderes.

- Aristóteles (384 aec - 322 aec), tanto em “Ética a Nicômaco” quanto em “Política”, concebe a
ideia de zoon politikon, a concepção do ser humano como animal político.

- Aristóteles entende que a percepção de que o ser humano é um animal social deriva da noção de
que a vida em sociedade promove maior bem-estar social e maior segurança coletiva.
- Se os humanos são animais sociais, eles seriam também animais políticos, porque toda relação
social seria uma relação de poder, quer se perceba isso ou não, quer se goste disso ou não.
- Mesmo que você lute para seja uma relação mais horizontalizada e mesmo que a balança do
poder passe a pender para o seu lado, ainda assim, seria uma relação de poder.
- Uma relação de poder não signi ca necessariamente uma relação assimétrica.
- Aliás, as grandes lutas sociais históricas são lutas por redução da assimetria de poder, às vezes,
por inversão da polaridade na condição assimétrica, e, por isso, que se pode a rmar que toda
relação social é uma relação de poder.

- Quem observou isso primeiro foi Aristóteles, ao formular a conhecida tese de que o ser humano
seria um animal político, um zoon politikon.
- Isso signi ca que, ao viver em grupos sociais, os humanos estabelecem um constante jogo de
poder, portanto uma disputa política.
- Assim, mais do que um animal social, o ser humano é um animal político.

- Mas, é importante frisar que, na loso a aristotélica, a política não seria apenas o campo da
de nição das regras de governo sobre a sociedade, mas também seria o campo de re exão ética
sobre qual seria a melhor forma de se bem-viver coletivamente.
- Portanto, se homem é um animal político, ele seria também um animal ético.
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- E essa chave de análise vai ser importante para o restante da re exão da aula, porque podemos
ter várias leituras sobre a condição humana, mas, em última instância, nossas deliberações têm
menos a ver com predisposições naturais do que com uma posicionamento ético incisivo.
- O ser humano é um animal social, um animal político, mas sobretudo um animal ético.

- É bom lembrar que não existia antropologia em 300 aC., na época de Aristóteles, nem nos 1600’
de Hobbes, nem nos 1700’ de Rosseau e de Adam Smith.
- Eles não sabiam nada de antropologia, paleontologia, primatologia ou biogeogra a.
- Eles conheciam, no máximo, poucos registros de civilizações mais antigas.
- Portanto, suas observações vinham muito mais de uma certa intuição antropológica do que de
qualquer evidência material.

- Adam Smith (1723-1790) escreveu, em 1776, “Uma Investigação Sobre a Natureza e a Causa
da Riqueza das Nações”, ou simplesmente “A Riqueza das Nações”.
- Adam Smith era um lósofo escocês, de profunda formação religiosa.
- Ele estava realmente preocupado em saber como as sociedades conseguiam se organizar para
que todos pudessem ter o mínimo para sobreviver e interessado em saber como algumas pessoas
poderiam tomar a iniciativa de empreender novas frentes de produção e de comércio que seriam
o motor da economia, produzindo o nível de riqueza geral daquela nação.

- Primeiro Smith constatou uma tendência natural a trocas, o que estimularia as pessoas a
empreenderem novas frentes de produção e de comércio, porque seus retornos materiais seriam
vantajosos.
- Smith concebeu uma noção de natureza humana em que prevalece a ideia de uma pessoa
individualista e absolutamente racional.
- Com essa ideia na cabeça, Smith defendeu que, se os indivíduos seguissem seus interesses
egoístas, querendo maximizar seus interesses, a sociedade como um todo se bene ciaria desse
comportamento egoísta e racional.
- Caberia ao Estado não interferir na relação entre indivíduos livres, autônomos, egoístas e
racionais para que a milagrosa mão invisível do mercado levasse à sociedade para um ponto de
equilíbrio e de aumento do bem-estar coletivo.

- Essa concepção de natureza humana de Smith foi chamada posteriormente de homo economicus.
- Essa visão de natureza humana como um homo economicus não explica a generosidade humana, a
participação frequente em atividades de caridade, o desempenho dedicado em funções públicas e o
não interesse por atividades que visam ao lucro a qualquer custo.
- Ou seja, essa concepção de natureza humana tem um problema fundamental: o ser humano é
muito menos racional e consciente do que se imagina.
- Inclusive, um campo de pesquisa que se desenvolve com enorme rapidez é o da Economia
Comportamental, justamente para perceber como as decisões econômicas das pessoas são, muitas
vezes, orientadas por emoções, apego e expectativas irracionais do que pela razão.

- Sigmund Freud (1856-1939) – em “Além do princípio do prazer” (1920), “Psicologia das


Massas e a Análise do Eu” (1921) e “O Mal-estar na Civilização (1930)”, entre outras obras –
mostra que a psique humana é mais inconsciente e pulsional do que consciente, racional e lógica.
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3) De nições de Política:

- Política é o campo de disputa pelo poder para prevalecer a visão de mundo de um grupo de
interesse especí co.

- Em inglês, politics é o jogo político entre os atores em disputa pelo poder;


policy é a política pública resultante desse jogo político; e
polity é o conjunto de instituições e de regras do jogo político criado pela estrutura do Estado
para mediar a disputa política.

- Política Internacional é a disputa pelo poder entre diferentes atores, especialmente os


Estados, no sistema internacional anárquico.

- Política Externa é a política pública que orienta a ação dos estadistas na negociação
diplomática para consecução dos interesses nacionais na arena política internacional.
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4) De nições de Poder:

- Poder é a capacidade em exercício, de determinar ou de in uenciar, por coerção ou por


aceitação, as decisões e os comportamentos de indivíduos e grupos, com a intenção de atingir os
objetivos de um grupo de interesse especí co.

- O poder duro (hard power) é a capacidade de mudar o comportamento de um agente


contra suas preferências iniciais, por meio da ameaça de punição (sticks) ou da possibilidade de
recompensa (carrots).
- O hard power atua tanto no campo militar quanto no campo econômico.

- O poder brando (soft power) é a habilidade de persuadir outros atores políticos a


voluntariamente se comportarem de acordo com os valores preconizados pela potência
dominante, atuando dentro das regras institucionais estabelecidas por essa superpotência, para
operacionalizar uma ordem política que lhe favoreça.
-Essa habilidade de cooptar adeptos para a uma pauta especí ca de valores, pode ser exercida
também por potências menores, que tentam usar o soft power para in uenciar a opinião pública a
ser favorável à sua agenda mais periférica, contrabalançando, inclusive, as regras criadas pela
superpotência.

- O poder inteligente (smart power) é a combinação astuta e dissimulada de redes de


diplomacia, de instituições multilaterais de governança, de instrumentos de defesa, de incentivos
econômicos, de mecanismos de desenvolvimento e de outros recursos de soft e hard power
simultaneamente, para contemplar o projeto de poder de um ator político.

- John Mearsheimer a rma que os EUA estão progressivamente abandonando a estratégia de


ênfase no soft power das instituições liberais da sua “hegemonia benigna” e concentrando-se, como
historicamente sempre o zeram, em apoiar aliados via hard power com ameaças ou com
incentivos.
- Joseph Nye Jr, em “O Paradoxo do Poder Americano”, destaca que, apesar da assimetria do poder
militar americano em relação aos demais Estados ser grande, os EUA deveriam priorizar o uso do
poder inteligente, combinando coerção com aceitação, porque o uso indiscriminado de poder
bélico, paradoxalmente, tem o potencial de diminuir o poder americano, porque cria um
sentimento global anti-hegemônico.
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5) As Agendas Políticas e a Longa Duração do Poder:

- A agenda de alta política (high politics) trata dos assuntos relativos à segurança
internacional, à defesa nacional, à geopolítica e aos interesses estratégicos, que visam à
sobrevivência do Estado no sistema internacional anárquico.
- É importante destacar que temas de economia política internacional – como moeda, dívida e
embargo econômico – também são essenciais para o exercício do poder no jogo político
internacional, sendo parte da agenda de alta política

- A agenda de baixa política (low politics) trata de temas como a agenda


desenvolvimentista, o estado de bem-estar econômico e social e os múltiplos regimes de
governança global, como os de direitos humanos, de justiça social, de meio ambiente, de saúde
global, de ciência e cultura, de comércio internacional…

- A sociabilidade humana se complexi ca à medida que novas camadas de informação passam a


mediar as relações sociais.
- Após a Revolução Cognitiva, há 70 mil anos, o desenvolvimento de so sticadas narrativas
ccionais permitiram aos agrupamentos humanos acreditarem em um destino coletivo maior e
assim cooperarem com estranhos.
- Desde o desenvolvimento da linguagem e do pensamento abstrato, o ser humano desenvolveu a
arte da narrativa ccional para perpetuar sua cultura, para estabelecer sua moral e para criar seus
mitos fundacionais.
- A criação de narrativas ccionais de coesão social como a Nação é fundamental para
compreender a complexa sociabilidade humana contemporânea, em que há Estados-nações
com mais de um bilhão de habitantes cooperando para uma vida pública comum, apesar das
disfuncionalidades presentes em qualquer forma de sociabilidade.

- A Revolução Agrícola, há 10 mil anos, permitiu a sedentarização do poder, que, por sua vez,
permitiu aumentar o contingente populacional dos grupos sociais. Com isso, foi necessário pensar
em novas e melhores formas de se organizar as relações de poder em grupos cada vez maiores e
mais complexos.
- Com a polis, a política vai gradativamente se institucionalizando, criando códigos de convivência
(escritos ou não), com o aparecimento gradual de líderes políticos e de gestores públicos.
- E para garantir a obediência do código da polis: a polícia.
- Não há polis, sem polícia.
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6) Requisitos para que um Estado tenha sua personalidade jurídica garantida
pelo direito internacional:
- População permanente, podendo haver estrangeiros na base populacional.
- Território de nido, ainda que haja algumas disputas de limites não resolvidas.
- Governo autônomo, não sofrendo intervenção estrangeira em seus assuntos internos.
- Capacidade de estabelecer relações com outros Estados.
- Personalidade jurídica internacional que permite o Estado assumir compromissos e assinar
tratados, que garantem direitos e obrigam deveres perante o direito internacional.
- A existência política de um Estado não depende do reconhecimento pelos demais Estados.
- O reconhecimento de um Estado apenas signi ca que aquele que o reconhece aceita a
personalidade do outro com todos os direitos e deveres determinados pelo direito internacional.
- O reconhecimento incondicional e irrevog vel.
- Mesmo antes de ser reconhecido, o Estado tem o direito de defender sua integridade e
independ ncia e tem o direito de prover a sua conserva o e prosperidade.

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7) Nação e o Nacionalismo:
- Nação é uma comunidade de indivíduos vinculados social e economicamente, que compartilham
um certo território, que reconhecem a existência de um passado comum, ainda que grupos sociais
dentro dessas nações possam ter interpretações diferentes de seu passado e aspirações distintas
para seu futuro em comum, sem, todavia, ter nenhum grupo signi cativo que chegue a desejar e a
lutar pela secessão. (adaptação GUIMARÃES, 2008, p. 245)
- A maioria das nações originam-se de um processo longo e violento de uni cação e
homogeneização de grupos étnicos distintos com culturas, costumes, línguas e tradições diferentes
por um grupo dominante com maiores recursos políticos, militares e econômicos. (HALL, 2005, pp.
59-60)
- A nação não é apenas uma entidade política, mas algo que produz sentidos, um sistema de
representação cultural, um discurso que organiza a identidade política coletiva e individual, ao criar
uma comunidade imaginada, uma narrativa que confere sentido às existências individuais,
conectando essas vidas com um destino nacional que lhes preexiste e que continuará existindo
após as suas mortes. (HALL, 2005, pp. 49-52)
- O desenvolvimento de so sticadas narrativas ccionais – como a ideia de pertencimento nacional
– permitiu aos agrupamentos humanos acreditarem em um destino coletivo maior e assim
cooperarem com estranhos, fato incomum na sociabilidade animal.
- São as ordens informacionais abstratas trazidas pela criação dos mitos, das religi es e das
ideologias que permitiram a organização de grupos sociais cada vez maiores e mais complexos.
- A espécie humana está sempre enxergando o mundo por uma metanarrativa construída
socialmente. Quando se desconstrói uma, faz-se isso com base em outra metanarrativa que
oferece uma outra cosmovisão. Ou seja, nunca se está fora desses moldes mentais.
- A “invenção das nações” é um fenômeno social complexo, cujo apelo de pertencimento coletivo
seduz a todos, ressoando com o “cérebro tribal” dos humanos, produzindo sentimentos genuínos
nas pessoas.
- Se, por um lado, pode ser louvável a ideia de nação ser capaz de mobilizar as pessoas para
atuarem em benefício da coletividade em nome de uma causa maior; por outro lado, é necessário
tomar cuidado com a exploração do ideal nacional.
- “Nacionalismo é o sentimento de considerar a nação a que se pertence, por uma razão ou por
outra, melhor do que as demais nações”. (GUIMARÃES, 2008, pp. 245-246)
- O discurso de nação homogênea, no qual se defende a eliminação das diferenças entre os grupos
sociais que a compõe; e o discurso de excepcionalismo nacional, em que se acredita que haja um
povo eleito e superior aos demais, são discursos fundamentais para se estimular manifestações
extremadas de xenofobia, de racismo e de arrogância imperial. (GUIMARÃES, 2008, pp. 245-246)
- Cuidado com o discurso de nação homogênea, pois ele pode silenciar con itos sociais internos.
- Cuidado com o discurso de de excepcionalismo nacional, pois ele pode legitimar projetos
agressivos na arena internacional.
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8) Tipos de relações internacionais:

- O termo “internacional” enfatiza a ideia de que cada Estado poderia ser representado pela
sua identidade nacional.
- Acontece que a formação dos Estados Modernos foi um processo de consolidação do poder de
um grupo social especí co sobre os demais povos circunscritos ao território do nascente Estado.
- A ênfase no uso do termo “internacional” é, na maior parte das vezes, equivocada
etimologicamente, porque os Estados são, em sua maioria, multiétnicos e mesmo multinacionais.
- O mais preciso etimologicamente, na maior parte dos casos, seria usar o termo “interestatal”.
- Contudo, a expressão consagrada é “internacional”, resumindo a representação do Estado à sua
identidade nacional, como uma ideia-síntese de amálgama social da base populacional do Estado.

- O termo “supranacional” pressupõe um ente político acima dos Estados com capacidade de
impor coercitivamente suas normas.
- No sistema internacional anárquico, não há um ente supranacional acima dos Estados.

- O termo “intergovernamental” destaca as relações entre os representantes dos governos


dos Estados, como em uma Organização Internacional.
- Organizações Internacionais são comumente chamadas de Organizações Intergovernamentais.
- As Organizações Internacionais são criadas pela decisão dos Estados, que decidem abrir mão
relativamente de sua soberania, para criarem intergovernamentalmente Regimes de Governança
Mundial.
- Os Regimes de Governança Mundial fazem a gestão de temas de interesse global, em fóruns
permanentes de negociação diplomática.
- Esses Regimes criam regras apropriadas e autônomas para o pleno funcionamento da gestão do
tema em questão.
- Depois de formados, esses regimes passam a constranger os próprios Estados que lhes
conferiram originalmente a sua autonomia, mas isso não signi ca de maneira nenhuma que haja um
governo mundial.

- O termo “transnacional” se refere a uxos que passam ao largo do controle estatal,


podendo ser lícitas ou ilícitas.
- As viagens turísticas ou mesmo os processos migratórios, normalmente, não são esquemas de
trânsito populacional acordado previamente entre os Estados, mas decisões individuais de impacto
internacional, que não zeram parte de um acordo bilateral prévio.
- O narcotrá co é considerado um crime transnacional, porque envolve diversos atores em
diferentes Estados, sem a participação formal dos governos dos Estados em que a rota da droga
passou. Por exemplo, Bolívia e Peru plantam a coca, que é transformada em pasta-base na
Colômbia, sendo encaminhada para o Paraguai, para, de lá, alcançar os portos brasileiros de Santos
e de Paranaguá, para atingirem o mercado americano e europeu, com entrepostos na África. Nem
Bolívia, nem Peru, nem Colômbia, nem Paraguai, nem Brasil, nem Guiné-Bissau, nem Portugal, nem
Espanha, nem França, nem Estados Unidos participaram o cialmente desse uxo transnacional de
drogas.
- O termo “transfronteiriço” também signi ca que os uxos continuam passando ao largo do
controle estatal, mas destaca o fato de os países envolvidos serem Estados fronteiriços,
compartilhando fronteiras secas e molhadas.
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9) Guerra Clássica e o Con ito Armado

- Con ito Armado é o recurso utilizado por grupos organizados que empregam a violência
armada para impor sua vontade, normalmente no âmbito local.
- Esses grupos organizados não têm as estruturas e as instituições de um Estado, embora contem,
eventualmente, com o apoio ou mesmo com a presença de representantes corruptos e criminosos
do Estado, até mesmo do alto escalão dos três poderes.
- Ao se chamar qualquer con ito armado de guerra, está se legitimando a busca de solução desses
con itos pela violência máxima, autorizando, inclusive, o recurso às Forças Armadas.
- É preciso muita cautela para não se militarizar a sociedade, em nome da segurança pública, da
garantia da lei e da ordem ou de algum outro con ito que não se caracteriza guerra.

- Guerra é o con ito sistemático entre dois ou mais Estados, no seu grau máximo de violência,
com o objetivo de impor a vontade de um Estado sobre o outro, fazendo prevalecer os interesses
nacionais do Estado que se sagrar vencedor.
- Em função da magnitude do con ito, o esforço de guerra pode implicar a mobilização de todos
os recursos materiais e populacionais disponíveis no território nacional.

Subordinação Política da Guerra


- A guerra é declarada pelas autoridades políticas, mas é conduzida, operacionalmente, pelas
autoridades militares.
- Dessa forma, a guerra está subordinada aos objetivos políticos.

Armadilha dos Interesses Nacionais


- A de nição política dos interesses nacionais envolve diversos atores estratégicos, mas, na prática,
acaba prevalecendo os interesses econômicos do capital produtivo e do capital nanceiro nacional.
- A armadilha dos interesses nacionais consiste na constatação de o que se chama de “interesses
nacionais” são interesses privados dos grupos econômicos mais ricos, capazes, inclusive, de pautar
as discussões políticas.
- Guerra é um fenômeno político para fazer prevalecer o interesse nacional, mas que molda a
ordem política internacional.
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10) Paz

Sobre a Paz
- Paz deriva do latim Pax, o que remete à ideia de ordem construída pela potência vencedora,
como a Pax Romana, a Pax Britannica e a Pax Americana.
- Desde o Tratado de Kadesh, primeiro registro escrito de um acordo de paz em 1259 aec, o que
se denomina paz na política internacional é a imposição de uma ordem estável construída pelo
vencedor de uma guerra.
- Portanto, para se alcançar uma ordem estável, para se chegar à paz, é necessário a imposição de
força.

Paci cação
- Pax, também grafada como Pacis, exige o exercício assimétrico do poder para paci car.
- Não é paci car no sentido místico-psicológico, mas no sentido de subjugar os demais atores aos
interesses das grandes potências dominantes, construindo uma ordem estável.

Dissuasão
- Às vezes, não se precisa de uma vitória militar explícita para se estabelecer uma ordem, basta à
potência dominante ostentar instrumentos de dissuasão.
- Portanto, a dominância pode vir como resultado de uma guerra ou como resultado da dissuasão
provocada pela assimetria de poder da potência dominante.

Paz entre as Grandes Potências


- Paz é a ordem estável construída pela potência dominante ou pelo pequeno grupo de potências
dominantes.
- Se a ordem tiver mais de uma potência dominante, a arquitetura construída deve tentar
contemplar simultaneamente os interesses das grandes potências envolvidas.
- Quando se fala da Paz no Sistema Internacional, está-se falando da Paz entre as Grandes
Potências; não importa se os países da periferia tenham con itos con agrados.

A Tragédia da Política das Grandes Potências


- Para se alcançar o status de Grande Potência é necessário lançar mão sistematicamente do
recurso à guerra, para garantir os lucros exorbitantes do capital privado do seu país, de nido
como “interesse nacional”, o que não deixa de ser verdade do ponto de vista da grande potência
belicosa expansiva.
- É a “lei de ferro”, como John Mearsheimer explicou: é “a tragédia da política das grandes
potências”. Se algum país quiser entrar no jogo do poder das grandes potências, no big game, esse
país terá que virar a chave do modo de organização política do seu Estado para o modo de
preparação contínua para a guerra.

Tratado de Paz
- Aos derrotados, normalmente, se impõem um Tratado de Paz que implica
- perdas territoriais em favor das pretensões dos vencedores;
- o dever de mobilizar mão-de-obra e recrutas para as empreitadas dos vencedores;
- a garantia de acesso a recursos estratégicos pelos vencedores;
- a cessão de parte da produção para os vencedores;
- o pagamento de dívidas, multas e tributos na moeda do vencedor;
- a punição às lideranças políticas e militares dos países derrotados;
- e, algumas vezes, a desmilitarização e a desindustrialização dos países derrotados.
- Os instrumentos de dominação dos vencedores variam de tratado a tratado.
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- Todo período que se chama de paz silencia muitos con itos internos e muitas injustiças sociais.
- Toda paz é interessada.
- Toda ordem é injusta.
- Logo, nenhuma paz será perpétua.
- E, por isso, nunca haverá uma guerra para acabar com todas as guerras.
- Toda guerra é para impôr uma nova ordem injusta em favor da potência que se sagrar vencedora.

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