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“Defeitos Cristalinos”

Prof. Frederico A.P. Fernandes


codoico@gmail.com
frederico.fernandes@ufabc.edu.br

CECS - Centro de Engenharia, Modelagem e Ciências Sociais Aplicadas


Objetivos

- Tipos de defeitos em sólidos;


- Puntiformes, lineares, bidimensionais e volumétricos;
- Importância;
- Observação dos defeitos;
- Defeitos vs. Propriedades;
- Formação de soluções sólidas;
- Importância das soluções sólidas...
Por que estudar os defeitos?

Sólidos com perfeita ordem em escala atômica não


existem;
Todos materiais contém uma quantidade de defeitos;
O tipo e o número de defeitos dependem do material, do
meio ambiente, e do processamento;
Os defeitos influenciam muito as propriedades dos
materiais; Estrutura

Processamento

Propriedades

Desempenho
Os Defeitos
Classificação dos defeitos
- DEFEITOS ELETRÔNICOS: associados a elétrons e buracos;

- DEFEITOS PONTUAIS ou PUNTIFORMES (associados com uma ou


duas posições atômicas): lacunas e átomos intersticiais;

- DEFEITOS DE LINHA (defeitos unidimensionais): discordâncias;

- DEFEITOS BIDIMENSIONAIS (fronteiras entre duas regiões com


diferentes estruturas cristalinas ou diferentes orientações
cristalográficas): contornos de grão, interfaces, contornos de
macla, defeitos de empilhamento;

- DEFEITOS VOLUMÉTRICOS (defeitos tridimensionais): poros, trincas


e inclusões...

“Defeito cristalino: imperfeição do reticulado cristalino”


Defeitos Puntiformes
Chamados também de defeitos pontuais;
Lacunas: (vacância ou vazio) ausência de um átomo em um
ponto do reticulado cristalino;
- Podem ser formadas durante a solidificação do cristal, durante a
deformação plástica ou como resultado de vibrações atômicas.
São defeitos intrínsecos;
Defeitos Puntiformes
Lacunas: (vacância ou vazio) ausência de um átomo em um
ponto do reticulado cristalino;

- Número de lacunas em equilíbrio:

 Ql 
N l = N exp − 
 kT 
onde:
- N ≡ número total de posições atômicas
- NL ≡ número de lacunas
- QL ≡ energia de ativação para formação de lacunas
- k ≡ constante de Boltzmann H=U (energia interna)
- T ≡ temperatura absoluta
k=1.38×10−23 J/K (Nl) - número de lacunas
k= 8.62×10−5 eV/K

Obs.:
- Nl aumenta exponencialmente com a T;
- Metais: T imediatamente abaixo da Tf,
1 sítio em cada 10.000 sítios da rede estará vazio.
Defeitos Puntiformes
Auto-intersticial: um átomo da rede que ocupa uma posição
que não é uma posição típica da rede (ocupa um interstício).
- Os defeitos auto-intersticiais causam uma grande distorção do
reticulado cristalino a sua volta, pois o átomo geralmente é maior
que o espaço do interstício;
- A formação de um defeito intersticial implica na criação de uma
lacuna, por isso este defeito é menos provável que uma lacuna.
São defeitos intrínsecos;

- Também é um defeito de equilíbrio,


assim existe uma concentração de
equilíbrio que aumenta com a
temperatura;
- Exemplo: a energia de formação de
lacunas para o Cu é de 1,2eV e a
energia de formação de auto-
intersticiais é de 4,0eV.
Defeitos Puntiformes
Lacunas e intersticiais em cerâmicas:
- Deve ser obedecido o princípio de neutralidade de cargas;
- A lacuna deve ser compensada pela falta de um íon de carga
oposta ou pela inserção de um íon adicional de carga igual em outra
localidade;
- Probabilidade mais baixa em ânions (maior raio atômico).

São defeitos intrínsecos;

Compostos estequiométricos:
a razão nºcátions/nºânions não é
alterada, pois não há presença de
outros defeitos.
Defeitos Puntiformes
Lacunas e intersticiais em cerâmicas:

Compostos não-estequiométricos:
a razão nºcátions/nºânions é alterada.
Ocorre em materiais onde existem dois estados de
valência.
Sítio de Fe2+ vazio para compensar a presença de
2 íons de Fe3+ (necessidade de se manter a
neutralidade elétrica do sólido iônico cristalino).

C.I. FeO = 51%


Defeitos Puntiformes
Defeitos de Schottky e Frenkel:

- DEFEITO FRENKEL: cátion intersticial + lacuna catiônica

- DEFEITO SCHOTTKY: lacuna aniônica + lacuna catiônica


Defeitos Puntiformes

Exercício: Se a eletroneutralidade deve ser preservada,


quais defeitos puntiformes são possíveis no NaCl quando um
íon Ca2+ substitui um íon Na+?
Defeitos Puntiformes

Impurezas: intersticial e substitucional;

Material puro é impossível de se produzir;

Técnicas de refino permitem obter 99,9999% de pureza, ou seja,


1022–1023 átomos de impurezas/m3 existem.

São defeitos extrínsecos;


Defeitos Puntiformes
Impurezas nas cerâmicas:
- Podem formar soluções sólidas
- Impureza substituirá o íon de maior semelhança

São defeitos extrínsecos;


Soluções sólidas

Adição intencional de impurezas:

cristal matriz = solvente átomos de impureza = soluto

Solução Sólida
- Os átomos de impureza ocupam posições aleatórias no
cristal, similarmente a um soluto em um líquido;
- As impurezas adicionadas são chamadas de elementos de
liga;
- Tem a finalidade de:
. Aumentar a resistência mecânica;
. Aumentar a resistência a corrosão...
Soluções sólidas

- Normalmente são intencionalmente produzidas;


- Presença de mais de um tipo de átomo (soluto + solvente);
- Estrutura cristalina é preservada;
- Nenhuma estrutura nova é formada;
- Normalmente são homogêneas;
- São formadas mais facilmente quando átomos de soluto e
solvente apresentam tamanhos próximos e estrutura
eletrônicas comparáveis;
- Podem se de 2 tipos: substitucional ou intersticial
Soluções sólidas

Substitucional:
Ex: latão (Cu e Zn), bronze (Cu e Sn), monel (Cu e Ni);
- átomos do solvente substituídos por átomos do soluto no
reticulado;
- a estrutura do solvente não muda, mas se deforma;
Soluções sólidas

Intersticial:
Ex: carbono em ferro;
- os átomos do soluto “espremem-se” nos vazios
(interstícios) da rede cristalina do solvente;
- ocorre quando a diferença de tamanho entre soluto e
solvente é grande;
- a máxima solubilidade é menor que 10 % (normalmente)
Soluções sólidas
Intersticial
Célula CCC

.Razão entre o raio do interstício (r) e o raio do átomo da rede (R):


r/R = 0,15 r/R = 0,286
Soluções sólidas
Intersticial
Célula CFC

.Razão entre o raio do interstício (r) e o raio do átomo da rede (R):


r/R = 0,4142 r/R = 0,223
Soluções sólidas

- Regras de Solubilidade para soluções substitucionais:


(Regras de Hume – Rothery):

1 - Diferença entre raios atômicos <±15%

2 - Mesma estrutura cristalina para os metais

3 - Eletronegatividades semelhantes

4 - Valência maior = maior solubilidade


Soluções Sólidas
Exemplo:
A formação da solução sólida entre Si-Ge é favorável?
Regra 1
rSi = 0,117 nm e rGe = 0,122 nm Favorável √

Regra 2
Ambos apresentam a estrutura diamante cúbica Favorável √

Regra 3
ESi = 1.90 e EGe= 2.01. Assim, DE%= 5.8% Favorável √

- Si (+4) e Ge (+4) formam uma solução sólida


em um grande intervalo de composições!!!

Cu + Zn= latão Ligas de Cu + Ni


Cu = Estrutura CFC Cu = Estrutura CFC
Zn = Estutura HC Ni = Estutura CFC
Solubilidade de Zn em Cu: 40% Solubilidade de Ni em Cu: 100%
RCu = 0,128 nm RCu = 0,128 nm
RZn =0,139 nm RNi =0,125 nm
Defeitos Lineares

Chamados de discordâncias ou deslocações;

Tipos:
- Discordância em aresta ou cunha;
- Discordância em hélice ou espiral;
- Discordância mista
Defeitos Lineares
Discordância em aresta:

Discordância
em aresta
Defeitos Lineares
Discordância em aresta:
Interação entre discordâncias:

Repulsão

Atração e
aniquilamento

Regiões de tração e compressão


ao redor da discordância
Defeitos Lineares
Discordância em espiral:
- Tensões de cisalhamento estão associadas
aos átomos adjacentes à linha da
discordância em espiral.

Vista superior do cristal:


Defeitos Lineares
Discordância mista:

Vista superior do cristal:


Defeitos Lineares
O Vetor de Burgers:

Discordância em aresta:
- Vetor de Burgers perpendicular à
linha de discordância;
- Símbolo:

Discordância em espiral:
- Vetor de Burgers paralelo à linha
de discordância;
- Símbolo:
Deformação Plástica

(a) (b)
Formação de um degrau na superfície de um metal pela
movimentação de (a) uma discordância em cunha e (b) uma
discordância em hélice.

Analogia entre a movimentação de uma


lagarta e de uma discordância.
Deformação Plástica
Cristal perfeito vs. Cristal com defeito:
Deformação Plástica

- O deslizamento é mais
provável em planos e direções
compactas porque nestes
casos a distância que a rede
precisa se deslocar é mínima.

- Dependendo da simetria da
estrutura, outros sistemas de
deslizamento podem estar
presentes.

- Deformação em metais e
cerâmicas?
- Deformação plástica em
estruturas CCC e CFC?
Observação de discordâncias

Diretamente TEM ou HRTEM

Indiretamente SEM e MO (após ataque químico seletivo)

TEM: microscopia eletrônica de transmissão


HRTEM: microscopia eletrônica de transmissão de alta resolução
SEM: microscopia eletrônica de varredura
MO: microscopia óptica
Observação de discordâncias

HRTEM
Microscopia eletrônica de transmissão
(MET) de um arranjo de discordâncias ao
longo de um plano de deslizamento em
uma folha de aço inoxidável (18Cr-8Ni).
Defeitos Lineares

Considerações finais:
- A quantidade e o movimento das discordâncias podem ser
controlados pelo grau de deformação (conformação mecânica) e/ou
por tratamentos térmicos;
- Com o aumento da temperatura há um aumento na velocidade de
deslocamento;
- Impurezas tendem a difundir-se e concentrar-se em torno das
discordâncias formando uma atmosfera de impurezas;
- O cisalhamento se dá mais facilmente nos planos de maior
densidade atômica, por isso a densidade das mesmas depende da
orientação cristalográfica;
- As discordâncias geram lacunas;
- As discordâncias influem nos processos de difusão;
Defeitos bidimensionais
Chamados também de defeitos interfaciais;

- Superfície externa:
.superfície entre o cristal e o meio que o circunda.
- Contornos de grão:
.contornos entre dois cristais sólidos da mesma fase.
- Contornos de fase (interface):
.contorno entre duas fases distintas.
- Contornos de macla:
. tipo especial de contorno de grão que separa duas regiões
com uma simetria tipo ”espelho”.
- Falhas de empilhamento:
.interrupção na sequência de empilhamento
Defeitos bidimensionais
- Superfície externa:

Átomos na superfície possuem maior energia livre que os átomos


sob a superfícies;
Esta energia está associada com as ligações rompidas ou
insatisfeitas;
Os materiais sempre tendem a minimizar a área superficial, para
que diminua a energia de superfície
Defeitos bidimensionais
- Contornos de grão:
- Materiais policristalinos são compostos por pequenos cristais,
chamados de grãos;
- Os contornos de grão são as fronteiras que separam os cristais de
diferentes orientações em um material policristalino;
- Região defeituosa;

Aço ferrítico (Fe-Cr)


Defeitos bidimensionais
- Contornos de grão:

- Forma provável dos grãos em um material policristalino;


- Ortotetracaidecaedro (24 vértices, 36 arestas e 14 faces) (a);
- Arranjo tridimensional (sem vazios) destes poliedros (b);
Defeitos bidimensionais
- Contornos de grão:
- Ligações mais irregulares
- Maior energia superficial
- Maior reatividade química
- Influencia as propriedades (n° grãos por pol2 – 1)
mecânicas 2

σy=σ0+Kd -½
(Hall-Petch)

Tensão limite
para deformação plástica
Defeitos bidimensionais
- Contornos de fases:

. São as fronteiras entre duas fases diferentes.


. Podem ser coerentes (menor energia), semicoerentes e
incoerentes (maior energia).
Defeitos volumétricos
Chamados também de defeitos de massa;
Introduzidos durante o processamento do material
e/ou fabricação do componente;

Tipos:

- Inclusões: impurezas estranhas;


- Precipitados (segunda fase): formam-se devido à
presença de impurezas ou elementos de liga (ocorre
quando o limite de solubilidade é ultrapassado);
- Porosidade: origina-se devido a presença ou
formação de gases;
- Trincas: origem no processamento...
Defeitos volumétricos
- Inclusões:

Inclusões de óxido de cobre (Cu2O) em cobre de


alta pureza (99,26%) laminado a frio e recozido a
800ºC.
Defeitos volumétricos
- Porosidade:

Compactado de pó de ferro após


sinterização a 1150°C, por 120 min
em atmosfera de hidrogênio.
Defeitos volumétricos
- Precipitados de segunda fase:

Arranjo dos átomos ao


redor das interfaces:
a) coerente,
b) semicoerente,
c) incoerente.
(segundo E. Hornbogen)

Waspalloy
(Super liga de Ni)
Defeitos volumétricos
- Precipitados de segunda fase:

Aço perlítico

Solubilidade do C
no Fe-α em T
ambiente:
0,009%p.

Fe-γ
Ferrita: Fe-α
Cementita: Fe3C
Resumindo
Exercício: Identificar os possíveis defeitos

a) átomo de impureza intersticial, b) discordância em aresta,


c) auto-intersticial, d) lacuna, e) precipitado, f) conjunto de
lacunas, g) conjunto de intersticiais, h) átomo de impureza
substitucional.
Defeitos e resistência mecânica
Ligas de alta resistência mecânica

Incluem em seu projeto diversos tipos de


caracteristicas que são conferidas por “defeitos”:

- Formação de solução sólida;


- Alto percentual de deformação (alta densidade
de discordâncias);
- Grãos reduzidos;
- Presença de segunda fase finamente dispersa;

“Mecanismos de aumento de resistência”


Defeitos
Resumo:
1. Defeitos Puntiformes
Lacunas e intersticiais
Defeitos de Frenkel e Schottky
Átomos de impureza (substitucional e intersticial)
2. Defeitos Lineares
Discordância em aresta
Discordância em espiral
Discordância mista
3. Defeitos Bidimensionais (planar)
Contornos de grão
Contornos de macla
Contornos de fase
Falhas de empilhamento
4. Defeitos Volumétricos (volume)
Porosidade
Inclusões
Precipitados
Trincas
Sugestão de Leitura

- Capítulo 4 (4.1 a 4.8) – Livro: W.D. Callister, Ciência e


Engenharia de Materiais

- Capítulo 12 (12.5) – Livro: W.D. Callister, Ciência e


Engenharia de Materiais

- Capítulo 7, 9 e 10 – Livro: A.F. Padilha, Materiais de


engenharia.

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