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"Enquanto a Gramática considera o


sistema na sua funcionalidade objetiva,
isto é, a língua nos seus valores lexicais
e sintáticos, a Retórica considera o
momento subjetivo do acto lingüístico,
que é um momento de liberdade no
âmbito daquele sistema."
(PAGLIANO, Antonino. A vida do sinal: ensaios sobre
a língua e o utros símbolos. Trad. e pref. de Aníbal
Pinto de Castro. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 1967, p . 303.)
Dado• de Catalogaçlo na Publlcaçêo (CIP) Internacional
(Càmara Braallelra do Livro, SP, Braall)

Cherubim, Sebastião.
Dicionário 9e figuras de linguagem / Sebastião
Cherubim. -- Sao Paulo : Pioneira, 1989. -- (Manuais
de estudo)

1. Figuras de retórica - Dicionários I. Titulo


I 1. sé ri e.

89-1976
COD-808.003
lndices para catálogo sistemático:
1. Dicionários : Figuras de li~guagem 808.00ª
2. Figuras de linguagens : Retorica : Dicionarios
808.003
3. Figuras de palavras : Ret6r1cá : Di c io~ártos
808.003
4. Figuras de pensamento : Retórica : Dicionários
808.003
Apresentação

Ao organizar este Dicionário de Figuras de Linguagem, surgiu de início


um problema a ser resolvido: que figuras relacionar e dentro de que critérios
classificá-las. A opção foi a de aceitar a classificação tradicional cujos crité-
rios vêm da Retórica antiga.
Primeiro, há uma classificação entre figuras de palavras e figuras de
pensamento que é aceita sem questionamentos. As primeiras são as melo-
péias oufanopéias; as segundas, logopéias. Quanto ao quadro de uma classi-
ficação específica, as figuras de palavras dividem-se em figuras de dicção
ou prosódia, figuras de morfologia, figuras de harmonia ou combinação.
O quadro abaixo reproduz sinteticamente as principais figuras de palavras

sinalefa
sinérese
diérese
Figuras de dicção hiato
sinafia
anacrusa
hiperbibasmo

prótese
adição epêntese
paragoge
rípio
Figuras de morfologia
aférese
diminuição síncope
haplologia
apócope
2 SEBASTIÃO CHERUBIM

aliteração
assonância
eco
onomatopéia
Figuras de harmonia paralelismo
parequema
paronomásia
ritornelo
simetria
sinestesia
Esta classificação não é sempre rígida, porque figuras como parale-
lismo, às vezes, são classificadas como figuras de construção uma vez que
é tida como figura de repetição.
As figuras de construção classificam-se em:

anadiplose
antanáclase
conversão
epanadiplose
epanástrofe
epfmone
epizeuxe
mesodiplose
palilogia
ploce
Figuras de repetição polissíndeto
anáfora
epanáfora
antimetábole
diácope
epanalepse
epânodo
epfstrofe
mesarqu1a
mesoteleuto
pleonasmo
poliptoto
s fmploce
aposiopese
Figuras de omissio elipse
asslndeto
zeugma
DICIONÁRlO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 3

hipérbato
Figuras de transposição anástrofe
parêntese
sfnquese

a naco luto
ená lage
Figuras de discordância hendíades
hipálage
silepse

As figuras de cohstrução chamam-se também figuras de sintaxe, nome


que seria mais apropriado. Quanto ao hipérbuto, seria difícil aceitar a idéia
de que não pudesse recobrir os conceitos de anástrofe, por exemplo. As
subdivisões apresentadas, às vezes, são sutis.
As figuras de pensamento apresentam também uma classificação que
nem sempre tem o consenso de todos. Parece difícil aceitar, por exemplo,
que o trocadilho seja uma figura de pensamento , pois ela se define , segundo
Hênio Tavares em sua Teoria literária , como um "arranjo hábil de palavras
semelhantes no som e cuja seqüência propicia a equívocos de sentidos dú-
bios, principalmente visando fazer humor e graça" . De qualquer maneira,
uma vez que o jogo de palavras "propicia a equívocos de sentidos" , conser-
vamos o trocadilho como é apresentado tradicionalmente. As principais
figuras de pensamentos são as seguintes:

acumulação gradação
alusão hipérbole
ampliação ironia
antanagoge litotes
antítese optação
aplicação palinódia
apóstrofe paradoxo
Figuras de pensamento com inação parrésia
comparação per(frase
deprecação preterição
descrição prosopopéia
dialogismo prolepse
dubitação subjeção
epanortose suspensão
epifonema tautologia
exclamação trocadilho
4 SEBASTIÃO CHERUBJM

Po~ último. os tropas, figuras nas quais as palavras apresentam mudança


de senttdo . Dentre os tropos. a metáfora é de natureza tão genérica que
é tida como "'princípio ompresenle da linguagem" como afirma Richards,
citado por Hênio Tavares, opus cit., p. 379. Isto, porém, não impede a
aceitação de uma classificação dos tropos em trapos de similaridade e tropas
de contigüidade:

imagem
metáfora
Tropos de similaridade símbolo
catacrese
alegoria

metonímia
Tropos de contigüidade sinédoque
antonomásia

Esta classificação tem história e está calcada na Poética de Aristóteles


e em De Oratore de Cícero. Hoje, existem outras tentativas como a do
Clube dos chamados retóricos de Liêge, Dubois e outros com sua Retórica
Geral. Porém , a visão desses autores e sua tentativa de colocar a Retórica
tradicional em novos termos não atendem aos objetivos deste Diciõnário
de Figuras de Linguagem.
As figuras de linguagem fazem parte da Retórica. Saber se ela é uma
arte ou uma ciência é cenamente uma discussão inútil, porque o mundo,
como sempre, está dividido entre sofistas e peripatéticos. Os primeiros são
os lingüistas que a defendem tentando mantê-la sempre presente, como
faz o grupo de Liêge que tentam resgatá-la em novos termos. Os segundos
são todos aqueles qne afirmam que muitas pessoas sem nunca terem estu-
dado Retórica, sem nada saberem de seus intrincados preceitos, sabem,
contudo, falar e escrever com eloqüência. Para estes ela é inútil. A opinião
do primeiro grupo é perfeitamente aceitável; a do segundo, no mínimo
discutível.
Conforme Pagliano (1952), a Retórica logrou um culto mais que mile-
nário no Ocidente e, se foi arvorada em objeto de estudo particular por
pensadores à frente dos quais está Aristóteles, isto significa necessariamente
que ela tem ligações muito fortes com a natureza humana. Dizendo melhor:
que suas raízes extremas atingem aquele estrato mais profundo da Huma -
nidade no qual até as mais diversas determinações históncas se conciliam.
Dois mundos diferentes fizeram crescer a Retórica: o indiano e o grego.
DIClONÁRJO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 5

Na Índia, o culto à palavra tem procedência da Retórica e da poesia.


A língua da Religião é uma experiência lingüística particular que é projetada
no plano das origens. Diante do texto arcaico, o sacerdote é obrigado a
uma exegese e a uma interpretação. É obrigado a estabelecer a inter-relação
entre a denotação e a conotação. A palavra é senhora do sentido e, sendo
assim, a palavra, nesse universo, é magia e encanto; é carne e é vida. É
supremacia. É tudo isso porque o significado, perseguindo a palavra, faz
com que o sentido seja considerado secundário em relação aos aspectos
fônicos. Neste particular, a palavra é vergasta, é espada, é ferrete incandes-
cente que penetra o ser, ferindo-o. Por isso, pode-se dizer que a Retórica
nasce quando o homem, estudando as formas poéticas dos textos sagrados,
quer estabelecer a relação entre a palavra e a significação. Melhor dizendo:
entre a língua e o mundo. Na Índia, para uns, os hinos sagrados não tinham
um sentido, conforme relata Pagliano (1952); para outros, o que existia
era o princípio pelo qual havia uma grande possibilidade de expressão que
ultrapassava o limite do sentido denotativo, que era inerente às palavras,
pelo uso metafórico. E foi daí que surgiu a teoria da classificação das figuras,
enquanto técnica de expressão figurada e de ornamento literário. Na India,
a análise da expressão lingüística atingiu uma perfeição de técnica paralela
à conseguida pela Gramática que realizara a análise das formas.
Na Grécia, a Retórica tem um fim prático por estar inserida num con-
texto de relações sociais diferentes das da Índia. Para os gregos, a palavra
é ação. Nessa sociedade, o homem deve ser adestrado tanto nas artes ma-
nuais quanto nas da língua: tanto nas artes da guerra quanto nas do dizer
com propriedade porque com isto é que se conseguia a fama.
As disputas nas assembléias e reuniões fazem da palavra uma necessi-
dade vital. Nessa sociedade, o homem não é espectador passivo, mas influen-
te participador nas contendas e decisões. E, nessas disputas, o valor do
sentido da forma lingüística é mais agudo e, desse modo, a forma lingüística
está posta a serviço do êxito e da fama.
O espírito científico que norteia todas as atividades dos gregos, os quais
consideravam o próprio agir do homem como objeto de estudo científico,
sabe considerar o discurso como uma realidade objetiva. Enquanto a Gra-
mática punha em relevo a técnica interna do sistema lingüístico, forçando
as formas a entrar nos quadros dos paradigmas, a Retórica catalogou as várias
possibilidades de pôr em movimento aquela funcionalidade para obter urna
expressão tão eficaz quanto possível; "enquanto a Gramática considera o siste-
ma na sua funcionalidade objetiva, isto é, a língua nos seus valores lexicais
e sintáticos, a Retórica considera o momento subjetivo do acto lingüístico,
que é o momento de liberdade no âmbit~'daquele sis.terna'' (Paglia.no,..19?2).
E importante lembrar também que se pode considerar o ato hnguíst1co,
SEBASTIÃO CHERUBIM

que ~ a .liberdade d? falant~. ape~a~ em relaç~o à ~ficáci~ expressiva que


constitui a sua finahdade" (idem, 1btdem). Assim so atraves do critério da
eficácia .é que foi possível fazer a classificação e a catalogação das figuras,
sob a onentação de diversos expoentes, em metáforas, metonímias, sinédo-
ques. catacreses, litotes, etc.
Hoje. nas escolas. não há Retórica nos curricula . Nem nos das Facul -
dades de Letras, nem nos dos Cursos de Jornalismo. O que é de se lamentar,
sendo necessário deixar relatado aqui, embora que de passagem , que quem
tentou destruir a Retórica foi a Burguesia com sua educação calcada no
Idealismo: a Burguesia tudo fez para pôr abaixo o Racionalismo, em qual-
quer das suas modalidades. E a Retórica como disciplina propedêutica para
bem falar e bem escrever teve , então, sua decadência a partir do Roman-
tismo, evoluindo para o ressentimento contra a forma manifesta. Esse res-
sentimento nunca deixou de preocupar os teóricos da linguagem porque
a forma constitui uma necessidade obrigatória para todas as atividades hu-
manas que se objetivam. E a figura é essencialmente forma.
Pode-se dizer que, se a retórica ainda se encontra em crise, é porque
ninguém está novamente capaz de dizer o que ela realmente significa.
Não se duvida de que o reconhecimento de esquemas (formas) nos
quais seja possível classificar a variedade de aspectos da fala-escritura (tal
como foi proposto por Aristóteles) reúne as características de um verdadeiro
e estruturado sistema de conhecimento científico: porque o ato humano,
na sua historicidade, traduz-se em formas, a fala-escritura aparece objetivada
não só na estrutura do sistema lingüístico, mas também em esquemas que
podem ser considerados como mediadores entre a sua funcionalidade e a liber-
dade do falante escritor. São categorias fora do sistema em sua pertinência
que fazem que se consiga uma expressão original, eficaz e persuasiva. Resu-
mindo com palavras de Pagliano quando diz que "além disso, precisamente
pela liberdade que o ato lingüístico implica em relação ao sistema, o compor-
tamento de cada um e a maneira diversa com que as formas são escolhidas
para exprimir um conteúdo próprio podem transfonnar-se no objeto de investi-
gação que ajuda indubitavelmente a completar a compreensão , e a que não
faltam atrativos para quem puser nela interesse e estudo" (idem, ibidem).
Atualmente, existe um grande interesse pelo estudo das figuras de lin-
guagem, especialmente em relação ao estilo dos falantes-escritores, com-
preendendo por estilo a maneira de cada um, na qual existem traços idiossin-
cráticos que se repetem no contexto das próprias figuras, os quais engendram
os traços pertinentes da língua idiolética.
Parece assim que se pode chegar a uma conclusão: como substitutivo
da Retórica propõe-se a Estilfstica Lingüfstica que deverá ser conceituada
como o conhecimento sistemático do estilo de um falante ou escritor.
DlCIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 7

Mas isto implica a necessidade de um referencial à categoria de classifi-


cação. Este referencial deve ser estritamente lingüístico: as figuras de lingua-
gem são parte importante deste referencial.
Portanto, as figuras de linguagem, vistas pelo ângulo da Estilística,
fazem pane de um compartimento da Estilística que é a Estilística semântica.
Neste dicionário, as figuras que são expostas não devem ser as únicas.
Insistimos naquelas para as quais pudemos encontrar o maior número de
~xemplos , uma vez que sem eles este Dicionário de Figuras de Linguagem
teria pouca valia.
Assim, esperamos que este trabalho contribua, de um modo ou de
outro, com aqueles que fazem uso da língua, quer falada quer escrita tanto
como meio de subsistência (professores, advogados, jornalistas, publicitá-
rios, políticos, pregadores), quanto como meio de expressão estética (os
artistas).

Sebastião Cherubim
ACUMULAÇÃO (Do lat. accumuiacione). Figura que consiste na junção
deidéias similares, apresentando como recurso mais evidente a enumeração.
Eis um expressivo exemplo de Camões em sua obra lírica: "Formosa manhã
clara e deleitosa,/ Que. como fresca rosa na verdura,/ Te mostras bela e
pura, marchetando/ As nuvens, espelhando teus cabelos/ Nos verdes montes
belos; tu só fazes./ Quando a sombra desfez triste e escura./ Formosa a
espessura e a clara fonte ,/ Formoso o alto monte e o rochedo ... " E este
famoso exemplo de Carlos Drummond de Andrade: "E agora, José?/ Sua
doce palavra,/ seu instante de febre ,/ sua gula jejum,/ sua biblioteca,/ seu
temo de vidro,/ sua inocência,/ seu ódio-e agora?" Outro exemplo expres-
sivo é este de Castro Alves: ''O martírio, o deserto, o cardo, o espinho,/
A pedra, a serpe do sertão maninho,/ A fome, o frio, a dor,/ Os insetos,
os rios, as Iianas,/ Chuvas, miasmas, setas e savanas,/ Horror e mais hor-
ror. .. " (Cf. Hênio Tavares em sua Teoria Literária).

AFÉRESE (Do gr. aphaireses, pelo lat. aphaerese). Figura de morfologia


(metaplasmo) que consiste na supressão de fone ma ou grupo de fonemas
no início de um vocábulo. Exs: gume por acume; tonto por attonitu; bispo
por episcopu. Caso especial de aférese é a deglucinação que consiste na
supressão de um a ou o iniciais por confusão com o artigo. Exs.: relógio
por orologio; bodega por abodega. Exemplos literários: "Stamos em pleno
mar. .. Doudo no espaço". (Castro Alves). "Vejo-as inda passar. pálidas
e belas". (Raimundo Correia).

AGLOMERAÇÃO. Veja amplificação.


SEBASTIÃO CHERUBIM
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li arfa pelo lat. allegoria). Figura que consiste na
ALEGORI~ d(Do gr. id~1a abstrata por uma figura dotada de atributos
representaçao e uma ~
q ue sugerem aquela abstraçao. . d
· eleto armado de foice é a alegona a morte; uma mu-
Asstm, um esqu , · d · · T
lher com balança e com os olhos vendados e a alegona a J~bst1ça. e~~se
· ue se descrevem ou se enumeram os atn utos, om1tm-
a alegona sempre q B d · "C d " ,
do-se 0 nome adequado. O poema de Manue 1 an eira,
1on(s~a a., e
'pi'co· "Quando a indesejada das gentes chegar nao sei se
um exemp lo t i · · d' ·/ Al "
dura ou caroável) ,/ Talvez eu tenha medo, ~alvez sorna, ou .•ga. - o,
Iniludível!/ o meu dia foi bom, pode a noite desc~r./ (A nmte com seus
sortilégios)./ Encontrará lavra~? o_campo, a casa hmpa,/ A m,es.a posta,/
Com cada coisa em seu lugar. Nao aparece no poema uma un1ca vez a
palavra "morte". Por meio de uma série continuada de metáforas, o poeta
declara estar preparado para recebê-la.

ALITERAÇÃO (De a·2 + lat . liuera, 'letra'. + -ção). Figura de harmonia


(efeitos provocados pelas combinações sônicas) que consiste na incidência
reiterada de fonemas consonantais idênticos. Ou: repetição de fonemas no
início, no meio e no fim de vocábulos próximos, ou mesmo distantes, desde
de que simetricamente dispostos em uma ou mais frases, em um ou mais
versos. Ex.: "Auriverde pendão de minha terra,/ Que a brisa do Brasil
beija e balança. (Castro Alves). "As ondas roxas do rio rolando a espuma/
batem nas pedras da praia o tapa claro. " (Augusto Meyer, "Minuano").
"A fortuna das forças africanas" (L. IV, 20). "O mar todo com fogo e
ferro ferve." (L. X, 29), "Que um fraco Rei faz fraca a forte gente!" (L.
III, 138). O seguinte ex.emplo de Martins Fontes é, estilísticamente, de
um efeito extraordinário: "Começa o baile. Tatalam tfbias./ No honisso-
nante .faral sarau,/ Chocalham crânios, roçam-se rótulas,/ Há roídos secos
de pedra e pau." A a/iteração e a onomatopéia são figuras de estilística
fónica ou fonética que possuem grande força expressiva tanto na língua
poética quanto na prosaica. Veja paragramatismo, onomatopéia, tautograma.

ALITERAMENTO. Veja, aliteração.

ALUSAO. (~o lat. allusi~ne~. Apreciação indireta de uma pessoa ou de


um ato, por meio de referencia a um fato ou personagem conhecido: "Está
sob a espada de Dâmocles." "O exército vencedor sofreu tantas baixas
que não pôde continuar a lutar: seu general alcançara uma vitória de Pirro."
~,Cf. Aur~lio). Con!orme ~ê~io Tavares, Machado de Assis em sua poesia
No alto , _faz alusao ª?gemo do mal e da desilusão, encarnada na criação
shakespeanana de Cahman: "O poeta chegara ao alto da montanha,/ E
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 11

quando ia descer a vertente do oeste ,/ Viu uma cousa estra~a,/ Um~ figura
má .// Então, volvendo o olhar ao sutil , ao celeste,/ Ao gracioso Anel, q,ue
de baixo o acompanha,/ Num tom medroso e agreste/ Pergunta o que sera.//
Como se perde no ar um som festivo e doceJ Ou bem se fosse/ Um pensa-
mento vão,// Ariel se desfez sem lhe dar mais resposta/ Para descer a encosta/
O outro estendeu-lhe a mão." Como se vê, nem o nome foi mencionado;
apenas se percebe a alusão por contraste com Ariel.
AMBIGÜIDADE (Do lat. ambiguitare). Circunstância de uma comuni-
cação lingüística se prestar a mais de uma interpretação; a Retórica grega
a focalizou na construção da frase sob o nome de anfibologia. Em sentido
lato, a ambigüidade é uma conseqüência, em qualquer língua, da: 1. polisse-
mia, 2. homonímia e 3. deficiência dos padrões sintáticos. A homonímia
e a polissemia desaparecem no contexto lingüístico, em princípio; mas em
certos contextos não desaparecem inteiramente e cria-se a ambigüidade,
que decorre da deficiência dos padrões sintáticos: colocação, concordância
e regência. A boa manipulação da língua no discurso individual elimina
a ambigüidade criando contextos em que a homonímia ou a polissemia se
anulam pela concatenação com outros termos, e jogando com a colocação,
a concordância e a regência de maneira a suprir a deficiência existente.
Assim, em Exigi de Pedro o livro , a colocação corrige a ambigüidade da
regência com de que pode indicar complemento verbal (como é o caso)
ou adjunto adnominal (o livro de Pedro). Na língua literária , em que a
colocação normal é comumente desrespeitada, para se conseguir efeito esti-
lístico, na figura de sintaxe chamada hipérbato (ex.: A grita se levanta ao
céu da gente, em vez de: A grita da gente levanta-se ao céu), cria-se , não
raro, a ambigüidad~, que em certas escolas literárias é propiciada sob o
nome de sínquese. E o defeito de construção da frase que a torna duvidosa
ou equívoca, permitindo mais de uma interpretação. No exemplo seguinte
- Ele saudou o amigo em sua casa - como se interpreta? - em casa
do amigo? em casa de quem saudou? ou em casa do interlocutor tratado
por você?. Os casos mais comuns de ambigüidade ocorrem com o possessivo
seu e o pronome relativo que, em vista de sua aplicação múltipla, e com
as inversões (A grita se levanta ao céu da genre). (Heitor Aquiles chama
ao desafio.) Grande parte das ambigüidades se deve à convergência sintática:
estruturas frasaís profundas diferentes, mediante transformações. assumem
estruturas superficiais idênticas. Assim: Vendem os escravos, Os escravos
vendem, Os escravos têm uma venda, convergem para uma mesma estrutura
superficial: A venda dos escravos. Esta é pois uma estrutura ambígua já
que representa qualquer daquelas estruturas básicas (ou profundas). A am-
bigüidade é um problema importante porque conflita com a clareza que
é requisito fundamental da comunicação.
12 SEBASTIÃO CHERUBIM

AMPLIAÇÃO (Do lat. ampliattione). É o processo lingüfstico por meio


do qual se prolonga um membro d~ frase sobre ~ qual se. deseja ~nsistir.
Pode ser coordenado por e: Ex.: movimento operáno e movimento sindical.
Os dois membros significam a mesma coisa. A ampliação é um recurso
de grande eficácia estilística na oratória. Veja sinonímia.
AMPLIFICAÇÃO (Do lat. amplificatione). Conforme Hênio Tavares,
consiste em explanar as particularidades do assunto, desenvolvendo-o por-
menorizadamente. Entre os vários processos, podemos lembrar: o desenvol-
vimento da definição, o emprego de exemplos, o uso de comparações, con-
trastes, etc. Ex.: "A vida é o dia de hoje, I A vida é um ai que mal soa,
/A vida é a sombra que foge, / A vida é nuvem que voa, /A vida é sonho
tão leve, /Que se desfaz com a neve I E como o fumo se esvai; I A vida
não dura um momento / Mais leve que o pensamento / A vida leva-a o
vento / A vida é folha que cai!" (João de Deus, in "A vida").
ANACEFALEOSE (Do gr. anakephalaiôsis). Recapitulação dos pontos
principais de um discurso, de uma exposição escrita ou oral.
ANACOLUTO (Do gr. anakolouthus, pelo lat. anacoluthon). Figura de
sintaxe que consiste na mudança abrupta de uma construção: Define-se
também como frase quebrada. Ex.: "Quem o feio ama, bonito lhe parece ... "
(prov.). "O forte, o cobarde I seus feitos inveja." Tradução: O covarde
inveja os feitos do forte. (Gonçalves Dias, Obras poéticas, II, p. 43). "Eu
não importa a desonra do mundo." (Camilo Castelo Branco). "Essas criadas
de hoje não se pode confiar nelas." (Machado de Assis). "Esses colonos
que se viram desalojados do Congo , não digo propriamente nada contra
eles, mas não servem para nós." (Raquel de Queirós). "A rua onde moras,
nela é que desejo morar." (Domingos Paschoal Cegalla, em sua Novíssima
gramática da língua portuguesa, cit., p. 404).
ANACRUSA (Do gr. anákrousis, 'ação de repetir'). Figura de poética que
consiste em sílaba ou sílabas que antecedem o tempo forte no primeiro pé no
início do verso grego e do latino, vindo no princípio do verso. Eis um exemplo
apresentado em português. "Meu Deus li Eras bela / Donzela, / Valsando,"
(Casimiro de Abreu, "A valsa"). Outro exemplo: "Alva, / Nua / A lua I Cai;
I E triste, / Eivada, / A o nada / Vai". (Fagundes Varela, "Predestinação").
ANADIPLOSE (Do gr. anadíplosis, pelo lat. anadiplose) . Figura de rep~ti­
ção de palavras do fim de um período ou oração, ou de um verso, ~o p~n­
cípio do período, oração ou verso seguinte. Exs.: "Contou muitas h1stón.as.
Histórias de lembranças." (Álvaro Moreira, in Havia uma oliveira no 1ar-
dim, p. 104). "O dia surge todo de bruma,/ todo de bruma,/ todo de neve."
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 13

(Alphonsus de Guimarães, Obras completas , p. ~17) . '~E a fo~te rápida


e fria / Com um sussurro zombador / Por sobre a areia coma,/ Coma levando
a flor;,. (Vicente de Carvalho. ''Poe~as e canções", p. 263). Veja epanadiplose.

ANÁFORA (D o gr. anaphorá, pelo Jat. anaphora) . Repetição de uma ou


mais palavras no princípio de duas ou mais frases , ou de dois ou mais ver~os .
Ex~ : ·'Ela não sente. ela não ouve, avança, avança!" (Fialho de Almeida,
" O pa ís das uvas", p. 94). "Depois o areal extenso .. ./ Depois o oceano
de pó .. ./ Depois no horizonte imenso/ Desertos .. . desertos só ... '' (Castro
Alves, Obra completa, p. 282). "Quase tu mataste ,/ Quase tu mataste,/
Quase te mataram!" (Manuel Bandeira, "Estrela da vida inteira" , p. 224).
Veja epanáfora.

ANAPTIXE (D o gr. anáptyx, 'desdobramento'). Veja suarabácti.

ANÁSTROFE (Do gr. anastrophé, inversão). Hipérbato atenuado em


que a inversão se dá entre as palavras relacionadas entre si. Exs.: "Que
importa do nauta o berço." (Castro Alves). "Da pátria formosa distante
e saudoso." (Casimiro de Abreu). "Que transparece à luz do dia clara."
(João Ribeiro). "Baliza natural ao norte avulta,/ O das águas gigante cauda-
loso." (Castro Alves).

ANFIBOLOGIA (Do gr. amphibolos, 'ambíguo' +-Log(o)- +-ia). Ambigüi-


dade ou duplicidade de sentido numa construção sintática. Veja ambigüidade.

ANTINOMIA (Do gr. antinomia, pelo lat. antinomia) . Veja paradoxo.

ANOMINAÇAO (Do lat. annominatione). Alteração intencional de uma


palavra para desvirtuar-lhe o sentido.
'
ANTANACLASE (D o gr. antanáklasis, 'repercussão', pelo lat. antanaclase).
Figura que consiste em usar palavra igual ou semelhante no som, mas dife-
rente e oposta no sentido. Exs.: HEm vão aos deuses vãos. surdos e imotos."
(L. X, 15). "Em pós de um sonho vão, em vão se cansa." (Raimundo
Correia, "Os ciganos"). "O tempo não me dá tempo/ de bem o tempo
fruir. . ./ E nesta falta de tempo/ nem vejo o tempo fugir!. .. (Luís Otávio).

ANT ANAGOGE (De ant(i) + gr. anagogé, 'ação de puxar para cima'). Figura
pela qual se voltam contra o acusador os argumentos que lhe serviram à
acusação. Exemplo belíssimo este de Rui Barbosa: "Mas, senhores, o que
se me antolha, na verdade, estupendo, e não se poderá deixar sem adver-
14 SEBASTIÃO CHERUBIM

tência, é que dentre a mesma gente. cujas exigências me requerem uma


conciliação com o socialismo, para granjear o voto operário, surja, entonada
e retumbante, na consagração da candidatura oposta à minha. o desengano
mais radical às esperanças das classes trabalhadoras numa legislação, que
nos dê quanto às relações do trabalho com o capital, alguma cousa das
notáveis conquistas a tal respeito já sancionadas entre os mais bem organi-
zados países do mundo . Vede como entre esse gentio da nossa politicalha
se pratica a lisura, como esses discípulos de Comte vivem 'às claras', como
nessa escola de austeridade se cultiva esta virtude. Com os sufrágios do
operariado não podia eu sonhar, porque ainda não lhe dera arras de correli-
gionário nas idéias de renovação da sociedade; porque não jurara bandeira
no socialismo; porque não comia praça de soldado nas suas legiões. Todos
esses sufrágios, porém, se devem concentrar no candidato da Convenção dos
Sete, justamente porque essa candidatura nasce ao grito da intransigência dos
seus autores contra as pretensões do operariado à interferência da lei nas rela-
ções dele com o capital." (Rui Barbosa, in Campanha presidencial, p. 126).
Muitas vezes, a antanagoge é fruto da presença de espírito do orador
que, aproveitando-se das circunstâncias aparentemente adversas a envol-
verem o ambiente, transfonna numa magnífica e eloqüente vitória o que
lhe parecia inevitável e humilhante fracasso. O seguinte episódio histórico
narrado por Josué Montello é bem característico: "Em outros lances da
mesma campanha (refere-se o autor à campanha da abolição), ainda por
hostilidade dos republicanos, esboçaram-se vaias contra Patrocínio, termi-
nando em sérias arruaças a aglomeração popular".
Numa dessas ocasiões, falava o tribuno quando, de súbito, a palavra
lhe fugiu:
- O Brasil ...
Voltou a iniciar a frase:
- O Brasil ...
Seu semblante fatigado e mais a voz lenta e arrastada deram a impressão
perfeita de que, ao mestre da eloqüência, faltava repentinamente a expres-
são apropriada.
E volvia ele, no mesmo tom penoso, a buscar o fio do discurso, insis-
tindo no mesmo começo de frase, quando irromperam as risadas de seus
adversários, em vários pontos da assistência.
E Patrocínio, espicaçado por essa hostilidade, agora de olhos rebri-
lhantes aJteando vivamente a voz:
- Somos um povo que ri quando devia chorar!!" (Pequeno anedotário
da Academia Brasileira, p. 135).

ANTECIPAÇÃO. Veja prolepse.


DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 15
ANTICLÍMAX (De anti- +clímax). Figura de retórica que consiste no
emprego da gradação descendente. Ex.: É modesto, apagado, um joão-nin-
guém. (Cf. Aurélio) .

ANTÍFRASE (Do gr. antíphrasis, pelo lat. antiphrase) . Emprego de pala-


vra ou frase em sentido oposto ao verdadeiro, como no famoso caso do
Cabo das Tormentas, cujo nome, para fugir-se ao mau agouro, foi trocado
em Cabo da Boa Esperança. (Cf. Aurélio) . Veja ironia.

ANTIMET ÁBOLE (Do gr. antimetabolé, pelo Iat. antimetabole). Figura


que consiste em repetir, numa frase , palavras da anterior, mas em ordem
inversa e com acepções diferentes; é figura conhecida pelos nomes de anti-
metalepse, antimetátese. Ex.: "Glutão, não come para viver; vive para co-
mer". Outro exemplo apresentado por Massaud Moisés: "risos que se umeàe-
ciam de lágrimas e lágrimas que se esmaltavam de risos." (Antônio Patrício,
A rota do bergantim e outras alegorias, 1947, p. 13). Veja antítese e oxímoro.

ANTIMET ALEPSE (Do gr. antimetálepsis). Veja antimetábole.

ANTIMETÁTESE (Do gr. antimetáthesis). Veja antimetábole.

ANTÍTESE (Do gr. amíthesis, pelo lat. antithese). Figura de pensamento


pela qual se salienta a oposição entre duas idéias ou palavras. Exemplo
de Olavo Bilac: "Última flor do Lácio, inculta e Bela, / És, a um tempo,
esplendor e sepultura." De Jorge Amado: "A areia alva, está agora preta,
de pés que a pisam. " De Érico Veríssimo: "Como era possível beleza e
horror, vida e morte harmonizarem-se assim no mesmo quadro?". O novo
dicionário da língua portuguesa registra os seguintes exemplos de antítese:
"Era o porvir - em frente do passado, / A liberdade -face à escravidão."
(Cf. Aurélio).

ANTONOMÁSIA (Do gr. antonomasía, pelo lat. antonomasia). Substitui-


ção de um nome por outro , entre comum e próprio , ou substituição de
um nome por uma perífrase: o cisne de Mântua por Virgílio; a águia de
Haia por Rui Barbosa; o poeta negro por Cruz e Sousa. Exemplos apresen-
tados por Hênio Tavares em sua Teoria da Literatura: "Cessem do sábio
Grego e do Troiano" (L.I, 3). "E o Rabi simples, que a igualdade prega,
1Rasga e enlameia a túnica inconsúptil." (Raimundo Correia). "O Genovês
salta os mares ... " (Castro Alves). "Num desses dias em que o Lorde errante,
I Resvalando em coxins de seda mole ... " (Castro Alves). Lorde errante
=Byron.
16 SEBASTIÃO CHERUBIM

ANTORISMO (Do gr. antorismós) . Substituição de uma palavra por ou-


tra que se considera mais enérgica ou mais precisa.

APLICAÇÃO ( Do lat. applicarione). Conforme Hênio Tavares, consiste


em adotar um pensamento de um autor a uma circunstância para a qual
não foi feito , mas que se enseja por lembrar uma outra semelhança. Exs.:
" Disse o Cristo que o homem não vive só de pão. Sim , porque vive do
pão e do ideal. O ideal é o martírio, órgão da vida eterna." (Rui Barbosa).
"Que Stendhal confessasse haver escrito um de seus livros para cem leitores,
cousa é que admira e consterna. O que não admira, nem provavelmente
consternará, é se este outro livro não tiver os cem leitores de Stendhal,
nem cinqüenta, nem vinte , quando muito dez. Dez? Talvez cinco." (Ma-
chado de Assis, in Memórias póstumas de Brás Cubas).

APÓCOPE (Do gr. apokopé . pelo lat . apocope). Metaplasmo que consiste
na supressão de um fonema no fim da palavra. Ex.: mar por mare; ama
por amat~ mal por male; bel por belo; são por santo; mui por muito. O
verbo é apocopar.

APÓDOSE (Do lat. apodose). É a segunda parte de um período grama-


tical, em relação à primeira chamada prótase, de cujo sentido é complemento.
(Cf. Aurélio). Segundo Dubois et alii, 1978, apódose é "oração principal que,
colocada depois duma subordinada condicional, indica a conseqüência ou con-
clusão desta. Assim, na frase - Se Pedro se esquecer novamente da hora
do encontro, ficarei zangado - , a principal ficarei zangado é a apódose e
- se Pedro se esquecer novamente da hora do encontro - é a prótase.

APÓFASE (Do gr. apophasis). Figura de Retórica que consiste na refuta-


ção daquilo que se acaba de dizer.

~POFONIA Figura de metaplasmo que con-


(De ap(?)-+-fon (o) + -ia).
siste na mudança de timbre de uma vogal por influência de um prefixo.
Ex.: in + aptu = inepto; in + barba = imberbe; sub + jactu = sujeito.

AP~SIOPESE . (Do gr. aposiópesis •. p__eto .lat. aposiopese).


Interrupção in-
tenaonal no meio de uma frase; rehcenc1a. (Cf. Aurélio). Exs.: "Era esta
a sala ... (Ah! se me lembro e quanto!) / Em que da luz noturna à claridade
I Minhas irmãs e minha mãe ... o pranto I jorrou-me em ondas." (Resistir,
quem há de?). (Luís Guimarães Jr.). "Mas, morra enfim, nas mãos das
brutas gentes, I Que pois fui eu ... E nisto, de mimosa I O rosto banha
em lágrimas ardentes, I Como co'o orvalho fica a fresca ~osa." (L. II, 41).
DIClONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 17

No exemplo acima em que temos a fala de Vênus a Júpiter a favor dos


navegantes portugueses, o argumento feminino atinge seu intento como-
vendo o chefe do Olimpo. '

APÓSTROFE (Do gr. apostrophé) . Figura de pensamento que consiste


em dirigir-se o orador ou o escritor, em geral fazendo uma interrupção,
a uma pessoa ou coisa real ou fictícia. Exs.: "Deus! ó Deus! onde estás
que não respondes?" (Castro Alves). "Deus te leve a salvo, brioso e altivo
barco, por entre as vagas revoltas ... " (José de Alencar, cf. Domingos Pas-
choal Cegalla, em sua Novíssima gramática da lrngua portuguesa, p. 407).
Segundo Aurélio Buarque de Holanda Ferreira em seu Dicionário da língua
portuguesa, o exemplo citado de Castro Alves é ''prova (e outras poderiam
ser dadas) de que a apóstrofe nem sempre é uma interrupção, como em nossos
dicionários se lê". Interrupção ou invocação, a apóstrofe é uma figura de grande
força expressiva que garante a eficácia na consecução da adesão do leitor.

APOTEGMA (Do gr. apóphthegma , 'sentença'). Praticamente sinônimo


de aforismo, máxima e outros termos equivalentes, o apotegma consiste
num pensamento expresso de modo lapidar, conciso e claro, encerrando
um saber baseado na experiência de figuras ilustres antigas, e digno de
lembrança e imitação.

ARCAÍSMO (Do gr. archaismós). O arcaísmo é o emprego de um termo


pertencente a um estado de língua antiga e não mais usado na língua contem-
porânea. O arcaísmo faz parte do conjunto dos desvios entre a língua padrão
e a comunicação literária. O termo francês cuider, português cuidar, era
um arcaísmo no momento em que La Fontaine o usou em suas Fábulas.
No exemplo de Fagundes Varela in "Cântico do Calvário" a palavra asinha
significa "depressa" - "Escada de Jacó serão teus raios I Por onde asinha
subirá minh'alma." No exemplo seguinte, apresentado por Maria Helena
de Novais Paiva em sua Contribuição para uma estilística da ironia, 1961,
p. 338, nota-se que, além de polícia significar "civilização,, , " urbanidade" ,
os termos alcatifa e galã exalam odor de coisa velha: "- Não n:ie ensine
as leis da cortesia, abade - replicou algum tanto afrontado o fidalgo da
Agra. Eu não me fiz em alcatifa de sala; mas aprendi a polícia e trato
humano nas lições de galãs afamados como D. Francisco Manuel de Melo.
(Camilo Castelo Branco. A queda dum anjo, 1948, p. 74).

ARGUMENTO ( Do lat. llfgumnw,(um)) . Conforme Massaud Moisés,


ao nível da Retórica, o argumento consiste no emprego de provas, justifica-
tivas, arrazoados, a fim de apoiar uma opinião ou tese, e/ou rechaçar uma
18 SEBASTIÃO CHERUBlM

obra. Em linguagem filosófica, a palavra equivale a todo "racioc~nio desti-


nado a provar ou refutar uma dada proposição". No campo da linguagem
o argumento designa o sumário do conteúdo, ação ou e~redo de um poema,
conto, novela, romance ou peça de teatro. N~sta acepça~, o term~ com~ç?u
a ser utilizado no século XVI, por vezes de mistura com assunto , mate na,
tema ou idéia.

ASSIBILAÇÃO (De a + sibil + -ção). Figura de meta~l~smo que con-


siste na transformação de um ou mais fonemas em u~a s1b1lante. Gera.1-
mente dá-se com: t(e ,i) + vogal = Ç ou Z. Ex.: ~apttia = cabeça; l~ntiu
= lenço; belitia = beleza; ratione = razão. d(e,1) = Ç. Ex.: au~io .
ouço; ardeo = arço; c(e,i,) +vogal = Ç ou Z: Ex.: lançea =lança; minacrn
= ameaça; Gallicia = Galiza. ·

ASSIMILAÇÃO (Do lat. as_similatione) . Figura de metaplasmo que con-


siste na transformação de um fonema em igual ou semelhante a outro exis-
tente na mesma palavra. A assimilação pode ser: 1. total: quando o fonema
assimilado se iguala ao assimilador. Ex.: persona - pessoa; mirabilia -
maravilha; per + lo-pelo; 2. parcial: quando o fonema assimilado apenas
se assemelha ao fonema assimilador. Ex.: auru- ouro; laite -leite; assibiar
-assobiar; 3. progressiva: quando o fonema assimilado está antes do assimi-
lador. Ex.: amam-lo - amam-no; nastro - nosso; molairo - moleiro.
4. regressiva: quando o fonema assimilador vem depois do assimilado. Ex.:
persicu - pêssego; ipsa - essa.

ASSÍNDETO (Do gr. asyndeton, 'disjunção', pelo lat. asyndeton). Ausência


de conjunção coordenativa entre as frases ou entre partes da frase. O exem-
plo clássico~ o de César em seu De bello gallico: "Vim, vi, venci." Outro
exemplo: "E homem, rico, simpático, inteligente. " A função estilística do
assíndeto é a de separar as idéias para destacá-las expressiva e impressi-
vamente.

ASSONÂNCIA (Do lat. assonamia). Seqüência de palavras ou sílabas


semelhantes, .ma~ ~ão idênticas. Co~formidade ou aproximação fonética
entre as vogais tomcas de palavras diferentes. A assonância é uma figura
de harmonia. Exs:: "Numa nuança mansa que não cansa." (Emiliano Perne-
~a)., O texto segumte é d~ ~ugust~ dos Anjos: "Trazendo no deserto das
id~1as / O desespero endem1co do mferno, / Com a cara hirta tatuada de
fohg~n~." (ln "Monólogo de uma sombra"). A assonância redebe 0 nome
de hi.atumo quando há acumulação de vogais e homofonia quando há inci-
dência de acentuação tónica na mesma vogal.
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 19
ASTEÍSMO. Veja ironia.

ATICISMO. (D~ gr. attikism?s, pelo lat. attictsmu) . É o termo que designa
0 estilo preciso, s1~ples, polido, elegante, composto de frases isentas de
omatos desnecessános ou excesso de palavras, em que a lucidez do pensa-
mento se reveste de ~~a forma cristalina e sucinta. A palavra a~icismo
prende-se ao falar de Atica , tornado o modelo de linguagem política e literá-
ria quando se processou a expansão da Grécia. Com a decadência do povo
helênico, no século II a.~., passou-se nostalgicamente a encarar os escritores
de Atenas (capital da Atica) dos séculos V e IV a.C. como mestres de
sobriedade lingüística, digna de preservação e culto. Em parte por reação
contra o estilo empolado que entrou em moda no contato do grego com
os idiomas orientais, o aticismo, transferindo-se para Roma alcançou o ápice
no século II da era cristã. De certo modo, os movimentos puristas das línguas
modernas têm origem nos exemplos oferecidos pelo aticismo, de sorte que
o estilo castiço e breve constitui sinônimo de estilo ático. Em vernáculo,
Manuel Bernardes e Machado de Assis podem ser considerados como pa-
drão em matéria de elegância, concisão e pureza. Veja casticismo.

Figura que consiste em exage-


AUXESE (Do gr. áuxesis, pelo lat. auxese).
rar, exprimindo-se um conceito que não corresponde à realidade. Ex.:
"Quando o comandante invadiu o pequeno distrito parecia maior que Napo-
leão." Veja hipérbole.

BARBARISMO (Do gr. barbarismós, pelo la~ . barbar!st~u) . ~egundo Na-


poleão Mendes de Almeida em sua Gramática metod1ca da lmgua portu-
gue~a, barbarismo é o emprego de palavras .estr~n..has na forn__ia ou na idéia,
ou mteiramente desnecessárias ou contránas a mdole da hngua (note-se
20 SEBASTIÃO CHERUBIM

bem: quando necessário, deixa de constituir barbarismo). O barbarismo


pode estar já no vocábulo, já na frase , daí a divisão em barbarismos vocabu-
lares ou léxicos e barbarismos fraseológicos. Assim, quem emprega a palavra
habitué (de origem francesa), em vez de freguês ou freqüentador,. pratica
um barbarismo Léxico, por estar empregando uma palavra estrangeira, des-
necessariamente. Quem diz boa manhã em vez de madrugada pratica um
barbarismo fraseológico, porque já não são os vocábulos em si, que são
estrangeirismos, mas o fraseado , a locução (também aqui de origem france-
sa). Tais estrangeirismos se discriminam pela língua de que procedem: gali-
cismo (de Gália, antigo nome da França), anglicanismo (do inglês), castelha-
nismo (de Castela-espanhol), etc.

1e1
CACOFONIA (Do gr. kakophonia) . Segundo Celso Pedro Luft, qual-
quer sonoridade desagradável na fala. Deve-se à ligação dos fonemas, à
sibilação, à distribuição dos acentos, etc. A cacofonia (termo abrangente)
compreende: 1. cacófaton , 2. colisão, 3. aliteração, 4. hiato externo ou
intervocabular e 5. eco. Exs.: 1. Pretensões acerca dela. 2. Vê se achas
as chaves. 3. Poucos podem passar por pontes-pênseis. 4. Vai a aia à aula.
5. A publicação da nomeação causou sensação na população.

CALEMBUR (Do francês). Veja trocadilho.

CASTICISMO (Do lat. casta). Praticamente sinónimo de purismo, o


casticismo consiste no estilo ou modalidade da linguagem que e caracteriza
pela rejeição de neologismos, estrangeirismos e de todas as palavras ou
frase que, não se apoiando na tradição literária, possam atentar contra
a sua integridade. Veja atici.~mo .
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LTNGUAGEM 21
CATACRESE (Do gr. katáchresis). Aplicação de termo figurado por fal-
ta. d~ outro termo próprio. A catacrese é uma figura de linguagem que
nao ·~~~re~sa à Estilística Expressiva porque é mais uma forma de suprimir
a def1c1enc1a do vocabulário da língua. Ela é uma metáfora intelectualizada.
~eu in~ere~se é mais da Semântica Diacrônica, da Etimologia ou da Gramá-
tica H1stónca e até mesmo da Psicolingüística e da Psicologia. Exs.: embar-
car num automóvel, montar num trem, chumbar um dente a ouro, uma
novena de três dias, marcar uma sabatina para segunda-feira, martelar com
os dedos, uma ferradura de prata, etc.

CATÁFASE (De cata- +-fase). Afirmação; período ou proposição afir-


mativa. Veja apófase.

CATÁSTASE (Do gr. katásrasis). A terceira parte da tragédia grega que


se segue à prótase e a epítase, e na qual os acontecimentos ou peripécias
se adensam, se precipitam e se esclarecem; desenredo, desenlace.
CATÁSTROFE (Do gr. katastrophé) . Na tragédia grega, conclusão de
ação trágica segundo Aristóteles consiste em "uma ação perniciosa e doloro-
sa, como são as mortes em cena, as dores veementes, os ferimentos e os
mais casos semelhantes." (Cf. Poética, tr. de Eudoro de Souza, s.d., 1452,
apud Moisés, Massaud, Dicionário de termos literários, citado) .

CIRCUNLÓQUIO (Do lat. circunloquiu). Veja perifrase.

CLICHÊ (Do fr. cliché). Em Estilística, chama-se clichê toda e qualquer


expressão rebuscada que constitui um desvio de estilo em relação à norma
e que se acha vulgarizado pelo emprego freqüente que já lhe foi feito. Exs. :
aurora dos dedos de rosa; o astro rei; o precioso líquido. Distingue-se o
clichê de diversos outros fenómenos lingüísticos: antes de ser um clichê,
a expressão dedos de rosa é, em Homero, um epíteto ligado à aurora por
considerações prosódicas e estilística particulares. O sintagma esteriotipado
. (gente grande, tomar o trem) não é mais assimilado ao clichê, visto que
não constitui desvio estilístico. Chavão, lugar-comum.

CLÍMAX (Do gr. klímax, pelo lat. climax) . Apresentação duma seqüência
de idéias em andamento crescente ou decrescente. Ex.: "Tão dura, tão
áspera, tão injuriosa palavra é um Não." (Pe. António Vieira, Sermões ,
II, p. 88). "Entrava a girar em torno de mim, à espreita de um juízo, de
uma palavra, de um gesto, que lhe aprovasse a recente produção." (Ma·
chado de Assis, Memórias postumas de Brás Cubas, p. 138).
22 SEBASTIÃO CHERUBfM

COLISAO (Do lat. colfisione).É a desagradável repetição de consonân-


cias iguais ou semelhantes Exs.: ºA enfadada vida dos deuses." "Para
papai pôr o pó." "Só se salva o santo.,, ··o sol se sepulta."

COMINAÇÃO (Do lat. cum + mirwri) . Também chamada imprecação .


diatribe ou objurgatória. É uma ameaça ou maldição ditadas pela revolta ,
desalento ou desespero. Exemplos apresentados por Hémo Tavares: "Dor-
me cidade maldita / Teu sono de escravidão !. .." (Castro Alves) . ~·con te­
ve-se o bárbaro - Mísero Cão! I Humilha-te, abaixa-te, é tempo, senão
I Com férreos açoutes arranco-te a vida!H (Fagundes Varela). "Nem mais
um passo, cobardes! / Nem mais um passo , ladrões!" (Castro Alves) . "Tu
choraste em presença da morte? / Em presença de estranhos choraste? /
Não descende o cobarde do forte ;/ Pois choraste , meu filho não és! / Possas
tu, descendente maldito I De uma tribo de nobres guerreiros, I Implorando
cruéis forasteiros ,/ Seres presa de vis Aimorés." (Gonçalves Dias).

COMPARAÇÃO (Do lat. comparatione). É o confronto de dois ou mais


objetos em que depreendemos algum ponto de contato. É o síqiile. Sem
dúvida um dos recursos básicos da linguagem humana. Exs.: "E à tarde,
quando o sol - condor sangrento / No ocidente se aninha sonolento I Como
a abelha na flor ... " (Castro Alves). "Seus cabelos eram mais negros do que
a asa da graúna." (José de Alencar) . "Morena... esbelta ... airosa me lembrava
I Sempre da corça arisca dos silvados. I Quando lhe via os olhos negros, negros,
/ Como as plumas noturnas da graúna." (Castro Alves). Veja símile.

CONCATENAÇAO (Do lat. concacenacione). Figura de retórica pela


qual os membros de um período estão ligados de maneira que cada um
comece pela última palavra do anterior. Ex.: "De maneira que, num mo-
mento passa a virtude de peixinho, da boca do anzol, do anzol à linha,
da linha à cana e da cana ao braço do pescador." (Pe. Antônio Vieira,
Sermão de Santo Antônio, III). Veja cUmax.

CONCESSAO (Do lat. concessione). Veja digressão.

CONCISÃO (Do lat. concisione). É a qualidade do estilo sugestivo, em que


a palavra corresponde a mais de uma idéia. Chamam-lhe estilo lacônico, por
analogia com o estilo dos habitantes da Lacônia, uma região da Grécia antiga.

CONOTAÇÃO (Do lat. cum + conatiom•) . Sentido translato , ou subja-


cente, às vezes de teor subjetivo, que uma palavra ou expressão pode apre-
sentar paralelamente à acepção em que é empregada. (Cf. Aurélio) .
DICIONARIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 23
CONS?NANTIZAÇÃO. Figura de metaplasmo que consiste na trans-
formaçao d~ um~ v.ogal em consoante. Dão-se casos de consonantização
co~, as sem1voga1s 1 e ~, que passam, respectivamente, a j e v. Exs.: iam
- 1a; Iesus - Jesus; u1ta - vida; uaca - vaca.

CO~E_RS~~ É o mesmo que o quiasmo, ou seja,


_(Do lat. con vertione).
a repetiçao s1metnca, cruzando as palavras à maneira de X. Exs.: "Cheguei.
Chegaste. Vinhas fatigada e triste I E triste e fatigado eu vinha. / Tinhas
a alma de sonhos povoada, I E a alma de sonhos povoada eu tinha." (Olavo
Bilac). "Ela corava e tremia, I Tremia e corava eu. " (Juvenal Galeno).
"Cada noite sonhando um lindo sonho / Chorando um sonho morto em
cada dia. " (Vicente de Carvalho). "Uma ilusão gemia em cada canto, I
Chorava em cada canto uma saudade!" (Luís Guimarães Jr.). Veja quiasmo.
CRASE (Do gr. kràsís, 'mistura'). Metaplasmo que consiste na fusão de
duas ou mais vogais iguais em uma só, em termos de Gramática Histórica
ou Diacrônica. Exs. : pé por pee; cor por coor; nu por nuu. Quando a crase
se dá pela junção da vogal final de uma palavra com a vogal inicial de
outra na formação das expressões compostas, recebe o nome de sinalefa.
Exs.: ~utra + hora = outrora; de + intro = dentro. Em termos de Gramá-
tica Normativa, crase é a fusão do artigo definido a e a preposição a como
em "Vou a a feira" cujo a é marcado com o grafema ( ' ) . Não se deve
chamar crase ao ace~to grave que se coloca para marcar o traço língüístico
que é de natureza morfo-sintática.

lnl
-
DENOTAÇAO (Do lat. denotatione) .
p
· dadeddoJtermo
, .ropne
queacorres-
D bois deno-
ponde à extensão do conc~ito. (Cf. ~u~eho). Segun ~ã~ dou con~eito que
tação de uma unidade léxica é const1tmda pela exten
24 SEBASTIÃO CHERUBIM

expressa o seu significado. Por exemplo, sendo o signo cadeira uma associa-
çã~ d? conceito "móvel de _quatro pés, com assent~ e enco~to" e da imagem
acust1ca kadeyra, denotaçao será: a, b, c, ... , n sao cadeuas. Nessa quali-
dade, a denotação pode ser oposta à designação. Enquanto pela denotação
o conceito remete à classe dos objetos, na designação o conceito remete
a um objeto isolado (ou a um grupo de objetos) que faz parte do conjunto.
A classe das cadeiras existentes, que existiriam ou poderão existir, constitui
a denotação do signo cadeira, ao passo que "esta cadeira" ou "as três cadei-
ras" constituem a designação do signo cadeira no discurso.

DEPRECAÇÃO (Do lat. deprecatione) . Consiste numa súplica, num pe-


dido comovente e ardente ou num convite. Ex.: "Roga a Deus, que teus
anos encurtou, / Que tão cedo daqui me leve a ver-te I Quão cedo dos
meus olhos te levou." (Camões). "Amigo! O campo é o ninho do poeta ...
/Vem comigo cismar risonho e grave ... " (Castro Alves).

DESCRIÇÃO (Do lat. descriptione). A descrição tem por fim reproduzir,


por meio de palavras, a representação imaginária, intelectual, sentimental
ou real dos seres e das coisas, numa seqüência de aspectos. Pode ser: 1.
Descrição propriamente dita. 2. Descrição impropriamente dita. A primeira
comporta dois aspectos: A. conforme o objeto: histórica quando reconstitui
coisas, fatos, ou cenas de um passado. Por exemplo, A Primeira Missa
no Brasil; cronológica quando se refere ao momento em que ocorre um
fato. Por exemplo, a descrição de um crepúsculo; topográfica quando descre-
ve um lugar. Descrição do rio Paquequer, por exemplo; prosopográfica
quando descreve o exterior dos seres ou personagens , como: perfil, atitudes,
gestos, fisionomia, vestuário, aspectos físicos .. . B. conforme o modo: cientí-
fica ou técnica é a descrição minuciosa e exata segundo o método que rege
a ciência. Pode se fazer uma descrição precisa, tomando-se um objeto que
nada tem de científico; um quadro, por exemplo; oratória é a descrição baseada
nos recursos da eloqüência; poética é a descrição literária que tem como finali-
dade causar prazer estético mediante a expressão do Belo. A descrição impro-
priamente dita abrange,: etopéia quando descreve o caráter moral de um indiví-
duo ou de um grupo. E para o espírito o que a prosopografia é para o corpo.
Uma refere-se ao interior, outra ao exterior. Eis um exemplo de Camões:

"Como? Da gente ilustre portuguesa


Há-de haver quem refuse o pátrio Marte?
Como?! Desta província, que princesa
Foi das gentes na guerra em toda parte,
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 25
Há-de sair quem negue ter defesa
Quem negue a fé, o amor, o esforço e arte
De Português, e por nenhum respeito
O próprio Reino queira ver sujeito?" (L. IV, 15)
''Eu só, com meus vassalos e com esta
(E dizend~ isto, arranca meia espada),
Defenderei da força dura e infesta
A terra nunca de outrem , sujugada,
Em virtude do Rei, da pátria mesta,
Da lealdade já por vós negada,
Vencerei não só estes adversários,
Mas quantos a meu rei forem contrários." (L. IV, 19)
O text_o de Camões anterior~ente aprese9tado representa a fala que
o Autor poe na ?oca do C~ndest~vel , Nuno ~~vares Perei~a e que é um
exemplo de etope1a; retrato e um tipo de descnçao que combina a prosopo-
grafia c9m a etopéia, descrevendo, portanto, um indivíduo no físico e no
moral. E o perfil. Eis um exemplo de Coelho Neto: "Cesário Pires, o 'filóso-
fo', era a alma jovial da casa. Assíduo, tinha o seu lugar à mesa e, como
vivia a pregar o celibato, Jorge, para tentá-lo, colocava-o sempre junto
de Mademoiselle, a quem ele chamava: 'o breve contra a luxúria' .
Homem de grandes estudos, preocupava-se com a história e com a
filosofia, fontes de todo saber e, a propósito de tudo, com largos e arremes-
sados gestos, fazia preleções defendendo caracteres, refutando teoristas e
mostrando a nihilidade de tudo: beleza, fortuna, força, tudo poeira. Só
o espírito subsiste, através dos tempos, como a alma imortal das gerações.
Quarenta anos, alto e forte , densa barba grisalha. Adorava a mulher
como um lindo encanto para os olhos.
Era um puro. "(Coelho Neto , in Inverno em flor , pp. 119-120);
caráter quando descreve tipos gerais, em oposição à etop~ia e ao retrato ,
que descrevem indivíduos. Esses tipos podem ser: a. morazs. Por exemplo:
o avarento, o misantropo; b. sociais. Por exe~pl~, o operári?, o padre,
o médico, etc.; e. nacionais. Por exemplo, o 1ngles, o 1apones, o turco,
etc. O exemplo seguinte de Castro Alves é bom:
''O Inglês - marinheiro frio,
Que ao nascer no mar se achou,"
..... .. .. ...... .... ' ......... .... . ...... .
'

HOs marinheiros helenos


Que a vaga iônia criou ,
Belos Piratas morenos
Do mar que Ulisses cortou."
26 SEBASTIÃO CHERUBlM

paralelo ou comparação é a descrição em que se confrontam indivíduos,


grupos ou coisas. Exs. :

.. Bernardes não tomava tese que da consciência lhe não brotasse ,


e a desenvolvê-la aplicava todas as suas faculdades inte.l ectuais, que
eram muitas, e todas as faculdades morais que eram ~ais, tresdobra-
mento. Vieira zomba freqüentes vezes da nossa credulidade, podemos
desconfiar da convicção de Vieira, ainda quando nos fala certo; Bernar-
des é um amigo cândido e liso que, ainda quando nos ilude, não nos
mente.
Por tudo isso se admira Vieira; a Bernardes admira-se e ama-se."
(A. Feliciano de Castilho) .

Este outro exemplo também é muito expressivo:

"Na vida são os mecenas que douram com os mundanos clarões,


que lhes sobejam, os louros altivos dos virgílios. Na morte os virgflios
que iluminam e perpetuam com reflexos de sua glória os vultos secun-
dários dos mecenas." (Latino Coelho).

Quando uma descrição é viva, animada e tão expressiva como se


nós a estivéssemos vendo com os próprios olhos, reconhecemos nela a
figura específica da hipotipose ou enargia, figura que, como logo se de-
preenct:, é aquela que comunica calor e ênfase à descrição. Exemplos
expressivos:

"Para o céu cristalino alevantando


Com lágrimas os olhos piedosos,
(Os olhos, porque as mãos lhe estava atando
Um dos duros ministros rigorosos),
E depois nos meninos atentando ,
Que tão queridos tinha e tão mimosos,
Cuja orfandade como mãe temia,
Para o avô cruel assim dizia:,, (L. III, 125)

No texto acima, Camões descreve a trágica e comovente situação da


inerme Inês, prestes a ser imolada pelos algozes. E nosso Castro Alves
na pintura sombria do infame navio negreiro: '
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE UNGUAGEM 27

"Era um sonho dantesco ... o tombadilho


Que das luzernas avermelha o brilho
Em sangue a se banhar. '
Tinir dos ferros ... estalar de açoite ...
Legiões de homens negros como a noite
Horrendos a dançar .. ." '

Eis uma descrição vigorosa, humorística e satírica, que pode ilustrar


também uma prosopografia:

"T~o C?_sme vivia com minha mãe, desde que ela enviuvou. Já
era entao vrnvo, como prima Justina; era a casa dos três viúvos. A
fortuna troca muita vez as mãos à natureza. Formado para as serenas
funções do capitalismo, tio Cosme não enriquecia no foro: ia comendo.
Tinha .º escri~ório na antiga Rua das Violas, perto do júri, que era
no extmto Aljube. Trabalhava no crime .
..... ... .. .. ........... .. . .. ...... .. .... .. .... ............ ........ .... .. .... ................
Era gordo e pesado, tinha a respiração curta e os olhos dormi-
nhocos. Uma das minhas recordações mais antigas era vê-lo montar
todas as manhãs a besta que minha mãe lhe deu e que o levava ao
escritório. O preto que a tinha ido buscar à cocheira, segurava o freio,
enquanto ele erguia o pé e pousava no estribo; a isto seguia-se um
minuto de descanso ou reflexão. Depois, dá um impulso, o primeiro,
o corpo ameaçava subir, mas não subia; segundo impulso, igual efeito.
Enfim, após alguns instantes largos, tio Cosme enfeixava todas as forças
físicas e morais, dava o último surto da terra, e desta vez caía em
cima do selim. Raramente a besta deixava de mostrar por um gesto
que acabava de receber o mundo. Tio Cosme acomodava as carnes ,
e a besta partia a trote." (Machado de Assis, in Dom Casmurro, pp.
363-365).
DESNASALIZAÇÃO (De des- + nasal + iz + ação) . Figura de meta-
plasmo que consiste na passagem de um som nasal a um oral. E.: luna
- lúa - lua; bona-bõa - boa; ponere - põer - pôr. Veja nasalização.

DIÁCOPE (Do gr. diakopé). Figura de construção também denominada


separação que consiste em empregar uma ou mais palavras repetidas, inter-
poladas por outras. O exemplo clássico é o seguinto verso de_Luís de Ca-
mões: "Tu, só tu, puro amor com força crua,/ Que os coraçoes humanos
tanto obriga... " (L. III, 119). "Sois lindas, sois, não v?s ~ue~o. porém ... "
(Emiliano Perneta, apud Hênio Tavares em sua Teona l1terarza, p. 334).
28 SEBASTIÃO CHERUBIM

"Louco, sim, louco, porque quis grandeza/ Qual. a sorte a n~o dá .~' (Fer-
nando Pessoa, idem, ibidem, p. 344). "Não mais, musa, nao mais, que
a Lira tenho ... (L. X, 145).

DIÁFORA (Do gr. diaphorá). Veja antanáclase.

DIALOGISMO (Do gr. dialogismós) . Consiste na conversa ou no diálo-


go fictício com interlocutores imaginários. Pode ser também o diálogo que
o orador, escritor ou poeta intercala em sua composição, tanto reais quanto
imaginários.

"O mancebo perfeito e o velho humilde e rude


viram-se. E disse ao velho o mancebo perfeito:
- Glória a mim! sorvo o céu num hausto do meu peito
E o velho: - Engana o céu ... Tudo na terra ilude ...
-Rebentam roseiras do chão em que me deito!
-A alma da noite embala a minha senectude ...
- Quando acordo, há um clarão de graça e de saúde.
- Pudesse ser perpétua a calma do meu leito!
- Quero vibrar, vencer a Natureza,
Viver a vida! A vida é um capricho do vento ...
- Vivo e posso! - O poder é uma ilusão da sorte ...
- Herói e deus, serei a beleza! - A beleza
É a paz! - Serei a força! - A força é o esquecimento ...
Serei a perfeição! A perfeição é a morte!" (Olavo Bilac, in Diálogo).

DIATIPOSE. Veja descrição .


,
DIERESE (Do gr. diaíresis, pelo lat. diaerese). Figura de metaplasmo que
consiste na divisão do ditongo em duas sílabas. Ex.: "Deus fala, quando
a turba está quieta." (Castro Alves) Obs. : na palavra quieta deve ocorrer
a diérese. Conforme Hênio Tavares, pela alternância entre sinérese e diérese
observa-se a intenção de se manter o mesmo metro, que caracteriza uma
composição isométrica. Exemplo: .

"Saudade! gosto amargo de infelizes, (sinérese)


Delicioso pungir de acerbo espinho,
Que me estás repesando o íntimo peito
Com dor que os seios dalma dilacera
- Mas dor que tem prazeres - Saudade (diérese)
Misterioso númen que aviventas
DICIONARIO DE FlGURAS DE LINGUAGEM 29
Corações que estalaram, e gotejam
Não já sentes de vida, mas delgado
Soro de estanques lágrimas - Saudade! (sinérese)
Mavioso nome que tão meigo soas
Nos lusitanos lábios, não sabido
Das orgulhosas bocas dos Sicam bros
Destas alheias terras - Oh Saudade!" (diérese) (Almeida Garrett,
in Camões).

Todos os versos acima transcritos são decassílabos; naqueles em que


aparece a palavra saudade, ora ela é trissílaba, ora tetrassílaba, conforme
está assinalado.

DIGRESSÃO (Do lat. digretione) . Figura de linguagem que consiste em


o orador afastar-se de seu tema, através da inserção de matéria estranha
àquela tratada no momento, podendo conter a intercalação de um trecho
descritivo, narrativo, poético, elogioso, etc. Assume a forma de concessão,
ou seja, "confessar o fato de que o adversário tem razão num ou noutro ponto".
(Heinrich Lausberg, Elementos de retórica literária, trad. port., 1966, p. 254).

DISSIMILAÇÃO (De dissimilar + -ção) . Figura de metaplasmo que


consiste na diferenciação de um fonema por já existir outro igual na palavra.
Ex.: Jiliu-lírio; memorare-lembrar; rotundu -redondo. A dissimilação,
às vezes, pode levar ã supressão de fonemas, e, então, recebe o nome de
dissimilação eliminadora. Ex: aratru-arado; cribu-cribo; rostru-rosto.

DITONGAÇÃO (De ditongo + -ção). Figura de m~taplasmo que con-


siste na passagem de uma vogal em ditongo. Exs.: sto - estou; do - dou ;
arena-area -areia. O metaplasmo de ditongação tem várias causas dentre
as quais se destacam as seguintes: 1. síncope da consoante intervocálica:
vanitate - vaidade; vadi - vai; 2. vocalização: nacte - noite; regnu -
reino; 3. hipértese: rábia - raiva; capio - caibo; 4. alargamento (consiste
na epêntese de uma se mi vogal para desfazer o hiato). Ex.: arena - areia;
credo - creo - creio; 5. eclusão (fechamento de timbre das vogais e e
o que passam respectivamente a i e u). Ex.: maio - mao - mau; velo
- veo - véu; amatis - amades - amaes - amais. O ditongo final ão
do português moderno representa as formas do português arcaico am, ã,
om, õ, correspondentes às terminações latinas anu, ane, one, udine, ant,
um. Ex.: veranu - verão; pane - pão; oratione - oração; paganu -
pagão; cane - cão; ratione - razão; multitudine - multidão; solitudine
- solidão~ dant --Oão.
30 SEBASTIÃO CHERUBIM

DUBITAÇÃO (Do lat. dubitatione). Segundo J:lênio Tava~es,. é a ince~-


ntos ou emoçoes contrad1tónos, expn-
teza do aut or em lut a Com Pensame . ·· 1 ·
· d h · -
mm o es1taçao ou rece10 · em forma exclamativa cond1c10na
. ' ,, . ou mterro-
f A d bitação também chamada "perplexidade denuncia uma certa
ga 1va. u . "N- · por onde comece e
vacilação de quem fala ou escreve. Exs.. ao ~e• ' ,,
explicaria melhor a minha dor com lágrimas e gemidos que co~ palavras.
(Pe. Antônio Vieira) "Quem bate assim, levement~, I Com tao estranha
leveza / Que mal se ouve mal se sente? ... I Não e chuva, nem é gente,
/ Não é vento com certeza:" (Augusto Gil, in "A balada da neve"·)

ECO (Do gr. echó, pelo lat. echo) . Figura de harmonia que consiste na
sucessão de palavras com final semelhante. Recomenda-se que o eco seja
evitado na língua lógica ou técnico-científica. O exemplo clássico de eco
na língua literária é o de Eugênio de Castro: "Na messe, que enlourece,
estremece a quermesse ... "
ELIPSE (Do gr. élleipsis, 'omissão' , pelo lat . ellipse). Figura de sintaxe que
consiste na omissão de um termo ou oração que facilmente se pode suben-
tender. É uma economia de palavras que toma o estilo conciso e elegante.
Na língua portuguesa, são comuns as elipses dos pronomes-sujeito: Ando
e corro.; dos verbos e de partículas de conexão (preposições e conjunções).
Exemplos apresentados por Domingos Paschoal Cegalla em sua Novíssima
gramática da Ungua portuguesa, p. 403: "João estava com pressa. Preferiu
não entrar"; "As mãos eram pequenas e os dedos delicados''; "As quares-
mas abriam a flor logo depois do carnaval, os ipês em junho.'' (Raquel
de Queirós); "Nossa professora estava satisfeita, como, aliás, todas as suas
colegas"; "Parece que, quando menor, Sereia era bonita" "Caçam todos
os animais que podem"; uPor que foi que a criatura se imolou?" "Um
ato de protesto contra o governo?" Veja zeugma.
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 31
ELISÃO (D~ lat. elisione). Figura de meta plasmo que consiste na supres-
são da vogal final de uma palavra quando a seguinte inicia por vogal. Ex. :
dalgum por de algum. A elisão é uma figura muito comum na língua
poética.

ENÁLAGE (Do gr. enallagé) . Figura que consiste na troca de classe gra-
matical, gênero , número , caso, pessoa, tempo, modo ou voz de uma palavra
por outra classe, gênero, número, etc. Exemplos citados por Hênio Tavares
em sua Teoria literária: "Começou a servir outros sete anos I Dizendo:
Mas servira, se não fora 1 Para tão longo amor tão curta a vida." (Camões,
soneto 179) - servira está por serviria, assim como fora está para fosse.
"Mais os amo quando volte, I Pois do que por fora vi." (Gonçalves Dias,
in "Minha Terra")- amo está por amarei assim como volte está por, voltar.
"Eu perdera chorando essas coroas I Se eu morresse amanhã!" (Alvares
de Azevedo) - perdera está por perderia. "O)l! quão sólida não fora a
estabilidade / das margaridas, se ligassem a sua existência I à execução séria
deste princípio sobre todos civilizados!" (Rui Barbosa, in O Marquês de
Pombal, p. 54) -fora está por seria.

ENARGIA (Do gr. enargéia, pelo lat. enargia) . Termo usado pela retórica,
o qual designa a representação ou descrição muito ao vivo em um discurso.
Veja descrição ou hipotipose.

ÊNFASE (Do gr. émphasis , pelo lat. emphase) . Conforme o Dicionário


de termos literários de Massaud Moisés, é a figura de linguagem que consiste
no emprego exagerado da voz ou dos gestos na enunciação de vocábulos
e frases que demandam especial realce. Quando diz respeito à expressão
avizinha-se da hipérbole, como, por exemplo, em morrer de amores; lançava
chispas pelos olhos; etc. Na língua escrita, utiliza a inversão dos membros,
pormenorização das idéias, ordem crescente-decrescente dos termos da fra-
se, sinais de pontuação, etc. A ênfase pode, graças à sua própria natureza,
converter-se em fala vazia, empolada, pemóstica. Não obstante, constitui
recurso universalmente aceito.

ENUMERAÇÃO (Do lat. enumeratione). Veja amplificação.

EPANADIPLOSE (Do gr. epanadiplosis, pelo lat. epanadiplose). Figura


de sintaxe que consiste na repetição de uma palavra no começo e no fim
14
de um verso ou de uma frase . Exs.: Rosa a desabrochar, botão de rosa."
(Alberto de Oliveira, Poesias, p. 155). "Vozes veladas , veludosas vozes,
I Volúpia dos violões, vozes veladas." (Cruz e Sousa).
32 SEBASTIÃO CHERUBIM

EPANÁFORA (Do gr. epanaphorá, pelo lat. epanafora). É o mesmo que


anáfora: repetição de palavras no começo dos versos ou de frases seguidas
Aurélio apresenta o exemplo seguinte: ''Sonharei em Mariana, I Sonharei
no trem de ferr~, I Sonharei no acaba-mundo." (Alphonsus de Guimarães).

EPANALEPSE (Do gr. epanáltpsis, pelo lat. epanalepse). Figura de sinta-


xe que consiste na repetição da mesma palavra ou expressão no começo
e no fim de um mesmo verso ou frase. Ex.: "St!r como a tarde que voltou
voltou I além de meus enganos, muito além ... I Eu vou por um país, po;
onde eu vou ... " (Paulo Mendes Campos). Veja epanástrofe.

EPANÁSTROFE (Do gr. epanastrophé, pelo lat. epanástrofe). Figura de


sintaxe que consiste na repetição de um verso ou frase com as palavras
em mudança de ordem, conforme a define Hênio Tavares (Opus cit., p.
345). Os exemplos são apresentados pelo mesmo autor: "Soam suaves, sono-
lentos, I Sonolentos e suaves." (Eugénio de Castro). ''E zumbia, e voava,
e voava, e zumbia." (Machado de Assis). "Minha viola bonita, I Bonita
minha viola." (Mário de Andrade). Veja quiasma.
"'
EPANODO (Do gr. epánodos, pelo lat. epanodo). Figura de sintaxe que
consiste em desagregar e repetir em separado qualquer expressão ou idéia
anteriormente expressa, desenvolvendo-lhe o sentido. Hênio Tavares, em
sua Teoria literária, apresenta os seguintes exemplos: "Admirável foi Davi
na harpa e na funda; com a harpa afugentava os demônios, com a funda
derrubava gigantes." (Pe . Antônio Vieira). "A prudência é a filha do tempo
e da razão; da razão pelo discurso, do tempo pela experiência." (Pe. Antônio
Vieira). "Olha cá dous infantes, Pedro e Henrique,/ Progênie generosa de
Joane;/ Aquele faz que fama ilustre fique/ Dele em Germânia, com que
a morte engane;/ Este, que ela nos mares o publique/ Por seu descobridor,
e desengane/ De Ceuta a Maura túmida vaidade,/ Primeiro entrando as
portas da cidade." (L. VIII, 37). Eis um exemplo de quadra popular também
apresentado por Hênio Tavares: "Chamaste-me a tua vida;/ e eu tua alma
quero ser;/ a vida acaba com a morte,/ a alma não pode morrer."

EPANORTOSE (Do gr. epanórthosis, pelo lat. epanorthose). Correção


que o orador finge dar a uma palavra ou frase pronunciada. Exemplos apre-
sentados por Hênio Tavares em sua Teoria literária: "Voltando-se depois o
Senhor - não digo bem - não se voltando o Senhor. . .'' (Pe. Antônio
Vieira). "Notai que não diz: multiplicarei os meus dias, senão enfaticamente:
os dias meus." (Pe. António Vieira). "Jazia Santo Inácio - não digo bem
- jazia D. Inácio ... " (Pe. Antônio Vieira).
DICIONÁRIO DE FrG URAS DE LlNGUAGEM 33
,...

EPENT~SE (Do ~r. ~penthesis, pelo lat . epencltese). Figura de metaplasmo


que consiste n~ acresc1mo de um fonema no meio da palavra. Exs.: estrela
de stella; humilde de humile; ombro de umero. Há uma modalidade de
epêntese que se chama suarabácti, metaplasmo em que se intercala uma
vogal para desfazer um grupo de consoantes: planu -prão- porão; blatta
- brata - barata.

EPEXEGESE (Do gr. ephexegesis). Segundo Dubois et alii "é um grupo


de palavras ~u ,uma proposição (relativa, em particular), e~ aposi9ão a
uma palavra . E o caso do aposto em "São Paulo, o centro mdustnal do
Brasil, já apresenta problemas de superpopulação." (Cf. Dicionário de lin-
güística, cit.).

EPIFONEMA (Do gr. epiphónema, pelo lat. epiphonema). Exclamação


sentenciosa com que se fecha um discurso ou uma narrativa. Seguem exem-
plos apresentados por Hênio Tavares: "Não me lembro se tinha flores
perto dela/ Mas nascia um perfume simples de seu corpo./ Que amor
o meu!" (Augusto F. Schmidt, in "Elegia do canto da noite"). "E à
gaiola volta comovida,/ Comovida por vê-la chorar tanto,/ Que tanto
pode uma mulher que chora." (Raimundo Correia, in " Um soneto de
Lope da Vega).

EPÍFORA (Do gr. epiphorá, pelo lat. epiphora). Figura de linguagem,


que consiste na repetição de uma ou mais palavras no fim de dois ou
mais versos ou segmentos de prosa. Quando num poema , constitui a
chama rima idêntica. Ex.: "Talvez isto realmente se desse ... / Verdadei-
ramente se desse ... / Sim, calmamente se desse ... " (Fernando Pessoa ,
Poesia de Álvaro de Campos, 1951, p. 293). Significa também transfe-
rência e extensão de sentido através da comparação. Veja diáfora e metá-
fora.

EPÍMONE (Do gr. ephímone) . Figura de sintaxe que consiste na repeti-


ção enfática da mesma palavra. O texto seguinte de Olavo Bilac em "O
11
caçador de esmeraldas" é um dos mais belos exemplos do género: Verdes,
os astros no alto abrem-se em verdes chamas;/ Verdes na verde mata emba-
lam-se as ramas·/ E flores verdes no ar brandamente se movem;/ Chispam
verdes fuzis risc~ndo o céu sombrio;/ Em esmeraldas flui a água verde do
rio,/ E do céu, todo verde, as esmeraldas chovem ... " Eis outro exemplo
do Pe. Antônio Vieira: "Divertem-nos a atenção os pensamentos, suspen-
dem-nos a atenção os cuidados, prendem-nos a atenção os afetos.'' (Idem,
loc. cit. ).
34 SEBASTIÃO CHERUBIM

EPÍSTROFE (Do gr. epistrophé, pelo lat. epístrophe) . Figura de sintaxe


que consiste na repetição da mesma palavra no fim do verso ou frase. O
exemplo seguinte é de Olavo Bilac: "E a ira muda? e o asco mudo? e
o desespero mudo?" Note-se a expressividade causada pela epístrofe no
seguinte exemplo de Martins Fontes: "Era uma noite negra, horrendamente
negra,/ Horrendamente negra,/ como o corvo de Poe, horrendamente negra. "

EPÍTESE (Do gr. epithesis. pelo lat. epithese). O mesmo que paragoge cu-
jo nome é mais usado em Poética e Gramática Histórica. Veja paragoge,
onde se pode encontrar farta exemplificação.

EPÍTETO (D o gr. ephí1heton, i.é., ónoma eplrheton, 'nome acrescentado', pelo


Figura que consiste no uso de um adjetivo que revela intrinse-
lat . epithetu).
camente um substantivo. O mesmo que o pleonasmo, mas na ordem do
pensamento e não no da língua, não consistindo pois uma figura de sintaxe.
Os exemplos são os apresentados por Hênio Tavares em sua Teoria literária,
p. 348: "Quando uma lousa cai sobre um cadáver mudo". (Guerra Junquei-
ro). "Com a frígida neve e seco monte .. ." (Camões). Veja oxímoro.

EPÍTROPE (Do gr. epicropé). Figura de retórica pela qual se aceita algo
que poderia ser contestado, a fim de dar mais força àquilo que se quer
provar. (Cf. Aurélio).

EPIZEUXE (Do gr. epízeuxis, pelo la t . epizeuxe). Figura pela qual se repe-
te seguidamente a mesma palavra, para ampliar, para exprimir uma paixão,
uma compaixão, para exortar. Exs.: " ... e eu vos darei tudo, tudo, tudo,
tudo, tudo, tudo ... " (Machado de Assis, Histórias sem data, p. 6). "Nise,
Nise? onde estás, onde?" (Cláudio Manuel da Costa, Obras poéticas, p.
109, citado por Hênio Tavares em sua Teoria literária) .

EQUÍVOCO. Veja antanáclase .


,
ETOPEIA (Do gr. erhopoiía, pelo lat. aethopeia). Veja descrição.

EUFEMISMO (Do gr. euphemismós). Segundo Massaud Moisés, espé-


cie de perífrase mediante a qual, por motivos religiosos, éticos, supersti-
ciosos ou emocionais, atenua-se o sentido rude ou desagradável de uma
palavra ou expressão, através da substituição por outra de sentido agradável
ou menos chocante. Assim, por exemplo, a infinidade de eufemismos popu-
lares para dissimular o nome do Diabo: Arrenegado , Canhoto, Coisa-ruim,
Diacho, Mofino, etc. ou o modo indireto de Camões referir-se à sentença
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINO UAGEM 35

de morte contra Inês de Castro: "Tirar Inês ao mundo determina." (L.


III, 123). Veja ironia.

EUFONIA (Do gr. euphonía, pelo Iat. euphonia). Segundo Massaud Moi-
sés, antônimo de cacofonia, a eufonia consiste na combinação harmónica
de sons. "Além da neve coroa uma serra com um radiante nimbo de santi-
dade, e escorre, por entre os flancos despedaçados, em finas franjas que
refulgem." (Eça de Queiroz, Contos, 1946, p. 154). Veja aliteração eco
,. .
onomatopeia e rllmo.
' '

EXCLAMAÇÃO (Do lat. exclamatione) . É a expressão de um sentimen-


to surpreso e comovido. "Oh! grandes e gravíssimos perigos! / Oh! caminho
da vida nunca certo!" (L. I, 105). "Oh! que saudades que tenho / Da aurora
da minha vida, I Da minha infância querida / Que os anos não trazem mais!"
(Casimiro de Abreu). "Como eu me lembro dos meus dias puros!" (Casi-
miro de Abreu). "Ó glória de mandar! Ó vã cobiça I Desta vaidade, a
quem chamamos Fama! '' (L. IV, 95).

EXCURSO (Do lat. excursu) . Veja digressão .

EXERGASIA. O mesmo que sinonímia.

EXECRAÇÃO (Do lat. exsecratione). Veja imprecação.

EXPOLIÇÃO (Do Jat. expolitione) . Figura de pensamento utilizada co-


mo recurso de ampliação ( v.). Na Retórica Latina recebia o nome de com·
moratio, comoração, e expolitio. Estrutura-se por meio: 1. da repetição
de um pensamento: "Deixaria a lavoura? Desistiria da sementeira? Ficar-
se-ia ocioso no campo, só porque tinha lá ido?" (Pe. Antônio Vieira, "Ser-
mão do Santíssimo Nome de Maria"); 2. da acumulação de pormenores,
também chamada evidência (do latim evidentia): "Já lá o soberbo Hipótades
soltava/ Do cárcere fechado os furiosos I Ventos, que com palavras ani-
mava / Contra os barões audaces e animosos. / Súbito o céu sereno se
obumbrava, / Que os ventos, mais que nunca, impetuosos~ / Com~çam
novas forças a ir tomando, / Torres, montes e c~sas dernbando. .(L.
VI, 37); 3. de argumentos, também denominad_a entimema, 0~ 14. do ad1~a­
mento de membros sintáticos, também denominado epífrase. (Cf. He1n-
rich Lausberg, Elementos de retórica literá~i~, tra~. port. 1966,. pp. ~14
e. ss., citado por Massaud Moisés em seu D1c1onário de termos ltterários,
Clt.).
SEBASTIÃO CHERUBlM
36

FANOPÉIA. Veja logopéia.


FIGURA (Do lat. figura). Conforma Dubois et alii, em Retórica, as figu-
ras são os aspectos que as diferentes expressões do pensamento pode.m
revestir no discurso. Distinguem-se 1. as figuras de pensamento, q_ue consis-
tem em certos giros de pensamento independentes de ~~a expr:~sa~; f~z~~­
se por "imaginação" como por exemplo a prosopopeia, por rac1~c1mo ,
como por exemplo a deliberação ou a concessão ou por desenvolvimento,
por exemplo a descrição; 2. as figuras de significação ou tropos, referentes
à mudança de sentido das palavras das quais as mais importantes são a
metonímia, a metáfora e a sinédoque; 3. as figuras de expressão, referentes
à mudança de sentido que afeta grupos de palavras e frases; fazem-se p9r
"ficção" (alegoria), por "reflexão" quando as idéias enunciadas se refletem
mas que não o são como é o caso da litotes; por "oposição,' (ironia); 4.
as figuras de dicção, que consistem na modificação material da forma das
palavras, corno são exemplos do português fugace, pra, sendo as principais
deste tipo: prótese, epêntese, apócope, metátese, crase; 5. as figuras de
construção referentes à ordem das palavras e que se fazem por "revolução"
(modificação da ordem), por "exuberância,' (aposição), por "subentendi-
mento" (elipse); 6. as figuras de elocução, referentes à escolha das palavras
que convêm à expressão do pensamento e que se fazem por "extensão"
(epí~7to), po~ "~e?,uçã?'' (repetição e si~onímia), por "ligação" (assíndeto),
por conso,nanc1a ~ahteraçao); 7. as figuras de estilo propriamente ditas,
refere~tes ~,expressa? das relaçõ~; ent~e várias !déias: são a "ênfase" (enu-
meraçao ), ~ os to~e1os ,~~ ~rase: ,,(apostrofe, mterrogação), "confronto"
(comparaçao, antitese), 1m1taçao (harmonia imitativa).

GNÔMICA (Do gr · gnôme ' ·sen


- tença • · pelo lat. gnome) Consiste num
pensamento expresso de forma concisa, lapidar' breve·. Refere-se, tanto
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM
37
quanto os seus deriva... dos, l e gnômica , à poesia · Desse modo consi-·
· gnômico
deram-se versos .gnom1cos N- aque es que encerram um afons·mo
b , sen
t
ença,
provérbio ou ~qu1va1ente~ . . ao o stante, certa prosa ensaísta ou moralística
Pode ser sentt~a ,P.0 r gnomica. ~orno exe~plo ~e prosa gnômica, cita-se
a de Bacon, n~ m1c10 ?e su~ carreua. A poesia gnom1ca remonta aos antigos
gregos, que nao rar? t~senam em ~uas com~osições épicas, trágicas, elegía-
cas, etc. ve!sos af~nsttcos que podiam perfe1ta~ente destacar-se do conjun-
to. A parttr do .se:. "! a.C., graças a Teogoms de Megara, Focílides de
Mileto, Sólon, ~1mon1des de Amorgos e .outros, os poemas gnômicos adqui-
riram autonomia ..Entre os greg.os, recebiam também o apelativo de hipothe-
cai e entre os latmos exhortatwnes ou sententiae (Cf. Massaud Moisés em
se~ Dicionário de termos literários).

GRADAÇÃO (Do lar. gradaiione). Gradação é uma figura de retórica que


consiste em apresentar uma série de idéias ou sentimentos numa ordem tal
que 0 que segue exprima sempre um pouco mais - gradação ascendente
_ou um pouco menos - gradação descendente - do que o que precede .
Eis um exemplo de La Fontaine: "Um sopro, uma sombra, um nada, tudo
lhe dava febre .'' ("A lebre e as rãs''). E este outro de Boileau-gradação ascen-
dente: "Ande, corra, voe aonde a honra o chama." ("A estante de coro").

HAPLOLOGIA (De hap(o)- + -log(o)- +-ia). Metaplasmo qáubelconsEist~


t similares de um voe u o. x..
na contração ou redução dos e lemen os ·dólatra or idolólatra
1
semínima por semimínima, bondoso por bondadoso, . . • P '
. , . . 'd · f
t rag1comed1a por tragicocome ia , o rmi'ci·da por fiormic1cida.

BAPLOLOGIA SINTÁTICA. Redução de duas pal~vras homônimas


. "Antes quena morrer do que
ou parõnimas, e vizinhas, a uma só . E xs. ·
38 SEBASTIÃO CHERUBIM

(que) me acusassem de ladrão. " (Cf. Domingos ~onteiro, Contos do dia


e da noite, p. 137). "Aquele homem exalta~a de s1 o (que) quer que fosse
de sobrenatural e divino." (Guerra Junqueiro) .
HENDÍADES (Do Iat. hendiadys) . Figura ~~ retórica qu:. consiste ei_n
exprimir por dois substantivos ligados pela aditiva e um~ 1deaa que .s~ d~z
usualmente com um substantivo e um adjetivo. Ex.: Caminhava no stlenczo
e na noite por Caminhava no silêncio da noite. (Var. hendladis ou hendíade).

HIATISMO. Veja assonância.

HIATO (Do lat. hiacu). É a afluência seguida de vogais (vozes) acentua-


das. Exs.: Vá à aula." "Lá há almas".
HIPÁLAGE (Do gr. hypallagé, pelo lat. hypallage). Figura pela qual se
atribui a certas palavras de uma frase o que convém logicamente a outras
da mesma frase, claras ou subentendidas. Exs.: "No silêncio orvalhado da
manhã." (Miguel Torga , Diário, X, p. 169). " ... em cada olho um grito
castanho de ódio." (Dalton Trevisan, Desastres de amor, p. 30). " ... o raspar
espavorido do fósforo. " (Eça de Queiroz, A correspondência de Fradique
Mendes, p. 9).

HIPÉRBASE (Dehiper, 'acima',+ basis, 'marcha'). Éonomequeseapli-


ca à metáfora. Veja metáfora.
HIPÉRBATO (Do gr. hyperbatón, 'que ultrapassa'). Consiste em qual-
quer alteração na ordem direta . É, pois, a figura genérica no caso da transpo-
sição, sendo específica quando acusar inversão de orações no período , como
em "que os tribunais não podem rever atos políticos, não contestei, não
contesto." (Rui Barbosa). "As armas e os barões assinalados/ .. ./ Cantando
espalharei por toda parte." (L. I, 1-2). Veja anástrofe, parêntese e sínquese.

HIPERBIBASMO (Do gr. hyperbibasmos, ' transposição do acento tônico').


Figura de metaplasmo que consiste no deslocamento do acento tônico de
uma palavra. Dá-se por dois modos: sístole e diástole. Sístole: recuo do
acento tónico da palavra. Ex.: pantano - pântano; campana - campa;
idolu - ídolo. Diástole: avanço do acento tônico da palavra. Ex.: límite
- limite; ténebra - tenébra - treva.

HIPÉRBOLE (Do gr. hyperbolé, pelo lat . hyperbolt) . Figura de pensa-


mento que engrandece ou diminui exageradamente a verdade das coisas.
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 39
Exemplos mais comuns: "Chorou rios de lágrimas." ''Estava morto de se-
de." "Os cavalos não corriam, voavam." (Cf. Domingos Paschoal Cegalla,
Opus cit., p. 407). Exemplos apresentados por Aurélio: "Chorei bilhões
de vezes com a canseira} De inexorabilíssimos trabalhos!" (Augusto dos
Anjos, Eu, p. 21). Outros exemplos: "No almoço e no jantar, tio Aníbal
se levantava da cama pra comer. Comia montanhas." (Raquel de Queirós).
"Calisto Eloi romperia no parlamento os vesúvios da sua eloqüentíssima
imaginação." (Camilo Castelo Branco). Veja auxese.

HIPERBOLISMO (De hipérbole + ismo). Qualidade que consiste no


exagerado emprego da hipérbole. Cita-se como caso patológico de hiperbo-
lismo a personagem José Dias do romance Dom Casmurro de Machado
de Assis. O verbo correspondente é hiperbolizar. Veja hipérbole.

HIPÉRTESE (Do gr. hypérth esis) . Figura de metaplasmo que consiste


na transposição de um fonema ou som de uma sílaba para outra. Ex.: Caibo
por capio; primairu por primariu que deu primeiro; fresta por fenestra.

HIPOSIOPESE (Do gr. hyposipesis). Veja preterição.

HIPOTIPOSE (Do gr. hypotyposis, 'imagem', pelo lat. hypocypose) . Des-


crição viva e animada de um objeto ou de uma ação, que apresenta à vista
o que pretende significar. Veja descrição e enargia.

HOMEOTELEUTO (Do gr. homoiotéleuron) . Termo pertencente à re-


tórica, o homeoteleuto consiste na correspondência fonética da terminação
ou desinência (similiter desinens ; simile determinatione) das últimas pala-
vras das partes da oração ou dos versos. Registrado pela primeira vez por
Aristóteles (Retórica, III , 9, 9.) durante muito tempo foi considerado a
matriz da rima. Ex.: "Quem no mundo cantará assim, qualquer que seja
o vivente? De bico não se sabe qual, e sem bico não há nenhum. Uirapuru
junto dele se cala, do canário belga nem se fala; rouxinol, ou pintarroxo.
que aos pássaros ensinam a cantar, se ouvirem Clarim cantando, tratam
logo de calar. E quando Clarim gorjeia, como estava cantando para o menino
Jesus, assim, nem canta a sereia, nem mesmo gente assim sabe cantar,
quando canta o canário Clarim." (Luís Jardim, Proezas do menino Jesus,
p. 23).

HOMOFONIA (Do gr. homophonía) . É a identidade fônica entre duas


ou mais unidades significativas, ou entre dois ou mais signos gráficos. Veja
assondncia.
40 SEBASTIÃO CHERUBIM

HOMOGRAFIA (De homo- + -graf(oJ- + -ia) . Homografia é o fenô-


meno lingüístico pelo qual duas formas da mesma escrita (e freqüentemente
da mesma pronúncia) têm significados diferentes. Por exemplo, manga 'fru-
ta' e manga 'parte do vestuário' são homógrafos, têm etimologias diferentes,
sentidos diferentes, mas a mesma representação gráfica e a mesma pronún-
cia. Da mesma forma, nos casos de polissemia quando uma mesma forma
vem a tomar dois ou mais sentidos nitidamente diferenciados, pode-se igual-
mente falar de homografia. Dois homógrafos podem ter pronúncias diferen-
tes: assim jogo (subst.) e jogo (verbo).

HOMONÍMIA (Do gr. homonynía, pelo lat. homonmia) . Homonímia é


a identidade fônica (homofonia) ou a identidade gráfica (homografia) de
dois morfemas que não têm o mesmo sentido, de um modo geral. Veja
homofonia e homografia.

HOMOPTOTO (Do gr. homóptoton) . Figura de sintaxe pela qual se em-


pregam sucessivamente os verbos nos mesmos tempos, ou de nomes nos
mesmos casos ou nas mesmas funções sintáticas.

HOMOTELEUTO. O mesmo que homeoteleuto.

ID~LOPÉIA (Do gr. idolop~ía): Segundo Massaud Moisés, figura de re-


tónca segundo a qual se atnbu1 um pensamento ou um discurso a uma
pessoa morta.

IMPRECAÇÃ~ _ (Do lat. imprecatione) . Figura de retórica que consiste


em lançar maldiçoes sobre pessoas ou coisas. Quando 0 desejo maligno
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE UNCiUAGEM 41
se volta contra a própna pessoa, recebe o nome de execração. Entretanto.
os dois termos são tomados por vezes como smônimos. A fala do Velho
de Restelo. nOs Lusíadas (IV, 94 e ss.), que pode ser considerada uma
longa imprecação contra os navegantes que ~e arnscavam para descobrir
o caminho para as Índias. fornece um exemplo típico:

"Oh! Maldito o primeiro que. no mundo,


Nas ondas vela pôs em seco lenho!
Digno da eterna pena do Profundo,
Se é justa a lei que sigo e tenho !
Nunca juízo algum, alto e profundo,
Nem cítara sonora ou vivo engenho,
Te dê por isso fama nem memória,
Mas contigo se acabe nome e glória!"

INCREMENTO (Do lat. incrementu) . Veja amplificação.

INOPINADO. Veja suspensão.

IRONIA (Do gr. eiróneia, 'interrogação', pelo lat. ironia). Figura de pensa-
mento pela qual se diz o contrário do que se pensa, com intenção sarcástica.
Aurélio define a ironia como "modo de exprimir-se que consiste em dizer
o contrário daquilo que se está pensando ou sentindo, ou por pudor em
relação a si próprio ou com intenção depreciativa e sarcástica em relação
a outrem". A ironia depende muito do contexto extralingüístico; daí a difi-
culdade em exemplificá-la. Domingos Paschoal Cegalla em sua Novíssima
gramática da língua portuguesa faz a frase e explica assim: "Fizeste um
excelente serviço!'' (para dizer um serviço péssimo). Eis um exemplo que
já tem em si contexto: "Vejam os altos feitos desses senhores: dilapidar
os bens do país e fomentar a corrupção.'' (p. 407). Dentre as modalidades
de ironia, Hênio Tavares, lembra: 1. antifrase: exprime idéias funestas ou
antitéticas por palavras de sentido contrário. Ex.: "Moça linda bem tratada,
I três séculos de família, I burra como uma porta: / um amor." (Mário
de Andrade, in Lira Paulistana) . 2. parêmia: consiste em repetir, numa
inflexão zombeteira, sentença que encerra um pensamento já esteriotipado
e surrado. Exs.: Ensinar o padre-nosso ao vigário ... ". "Cresça e apareça ... "
É uma feição irônica do eptfoncma. 3. o sarcasmo: trata-se da iroma pesada
e injuriosa. "Eu lembrei-me devo~. funâmbulos da cruz Que andais pelo
universo, há mil e tantos anos / Exibindo. explorando o corpo de Jesus."
(Guerra Junqueiro, in Parasitas, cit. por 1Iênio Tavares e~ sua Te~ria ~iterá­
ria). 4. eufemismo ou asteísmo: é a ironia delicada, sut1l~ a suav1zaçao ou
SEBASTIÃO CHERUBlM
42
e expressões rudes, chocantes ou repugnantes. Alguém já
abran dame nto d d' E - ·
disse ser 0 eufemismo a arma..verbal_ do )1p1oma~a . á~prdesso_es como: ,V~cê
fa 1tau a, verdade (por: você e mentiroso . Func1on
. ~r
1
no a 1rnpeza
,
publica
(por lixeiro) são nitidamente eufêmicas. Veja anll1rase. aste1smo.

ISÓCOLO (Do gr. isokôlon, pelo lat. isocolon). Veja simetria.

LICENÇA. Veja parrésin.

LITOTES (Do lat. litotes). Figura de pensamento que consiste num mo-
do de afirmação por meio de negação do contrário. "Ele não é nada tolo."
(por: é muito esperto). Exemplo apresentado por Hênio Tavares: "Fará
que os seus, da vida pouco escassos." (L. X, 16): pouco escassos equivale
aqui a pródigo. Em relação à vida, significa "aqueles que não se poupam",
"que não temem a morte".

LOGOMAQUIA (Do gr. logomachía, ' luta de palavras') . Segundo a defi-


nição apresentada por Massaud Moisés, designa as estéreis pugnas em tomo
de palavras, ou a sua utilização arbitrária e inócua. De onde o sentido cor-
rente de 'palavreado inútil'. Genericamente, a logomaquia acusa empre~o,
por parte de dois ou mais interlocutores das mesmas palavras com sentido
diverso. '

LOGOPÉIA (Do gr . Jogopoeía, criação de palavras').


1
Designa, segu~do
~a~aud, de modo geral, a arte de combinar palavras a fim de sug~nr ª
idé1a d~ beleza pela forma e pelo conteúdo. De modo particular, o vocab~.10
anda Vinculado a Ezra Pound, graças à distinção que propõe entre logopeia,
DICIO ÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 43
Jan.optia e mefop~ia. Segundo Pound, a fanopéia consiste em "projetar o
ob1eto (fixo ou em movimento) na imaginação visual". A melopéía, em
"produzir correlação emocional por intermédio do som e do ritmo da fala".
A logopéia, em "produzir ambos os efeitos estimulando as associações (inte-
lectuais ou emocionais) que permaneceram na consciência do receptor em
relação às palavras ou grupos efetivamente empregados".
LOGORRÉIA (De log(o)- + -r éia). Segundo Massaud, designa o empre-
go abusivo e incontinente das palavras, sem respeito aos nexos lógicos e
à ocasião. Sinônimo: verborragia.

MESARQUIA. Figura de sintaxe que consiste no emprego de palavra


no início de um verso ou frase e repetida no meio do mesmo verso ou
frase, ou ainda no meio de outro verso ou frase. Exemplos: "Envolvei vosso
amor com a natureza, I Mas envolvei-o numa tal mistura.·· (Emiliano Perne-
ta). "Grito e se grito é para que ... (Augusto dos Anjos).

MESÓCLISE. Veja tmese.


MESODIPLOSE . Figura de sintaxe que consiste na repetição de pala-
vras no meio de versos seguidos, ou no interior do mesmo verso ou frase .
Eis um exemplo de Emiliano Perneta apresentado por Hênio Tavares em
sua Teoria literária, p. 347: ··Eu que não sou da Terra e que à Terra estou
preso." Outro exemplo de Cassiano Ricardo também apre entado por Hê-
nio Tavares: "Foi o abismo que criou a asa ao pá aro; agora foi a minha
asa que criou o abismo."
MESOTELEUTO. Figura de intaxe que con i te na r~pctição de pala-
vras no meio e no fim do verso ou da frase. O texto seguinte de Augusto
SEBASTIÃO CHERUBIM

dos Anjos é um belíssimo exemplo de expressividade incomum: "Grito e


se grito é para que meu grito I Seja a revelação deste infinito I Que eu
trago encarcerado na minha alma." O mesmo que mesoleuto.

METÁBASE. Veja suspensão.

METÁBOLE (Do gr. metabole, 'mudança'. 'troca'). Figura que consiste


na repetição de uma idéia em termos diferentes.

METAFONIA (De met(a)- + -fon(o)- + -ia) . Figura de metaplasmo que


consiste na mudança de uma vogal tônica por influência de outra, geralmente
i ou u. Ex.: debita-dívida; tepidu - tíbio ; tosso - tusso; cobro -cubro.
Casos há em que se observa a metafonia apenas para diferenciar a flexão
da palavra. Por exemplo: avô, avó, avós. Segundo Mattoso Câmara Jr.,
este tipo de metafonia é um submorfema do português. (Cf. Estrutura da
língua portuguesa). Veja umlaut.
METÁFORA (Do gr. mewphorá , pelo lat. metaphora). Metáfora é a figura
de linguagem em que se dá a substituição da significação natural de uma
palavra por outra em virtude de uma relação de semelhança subentendida.
Por exemplo: A primavera da vida; A luz da inteligência; Meu filho é meu
braço direito, Minha filha é o sol tla minha vida. Desde os gregos (com
Aristóteles) se reconhece a importância da metáfora. Entre os escritores
ela goza de prestígio incomum, a ponto de se dizer que somente ela eterniza
o estilo. Hoje, considera-se que a metáfora não é somente um artifício
de estilo, mas também está intimamente ligada à fala humana, por vários
motivos, dentre os quais se destacam quatro principais: 1. é um fator primor-
dial de motivação; 2. é uma fuga para as emoções intensas; 3. é um artifício
expressivo; 4. é uma fonte de polissemia e sinonímia. O esquema psicológico
da metáfora é simples: há sempre dois tennos presentes: a coisa que se
diz e aquilo com que se quer comparar; o primeiro é o teor; o segundo,
o veículo; os semas comuns (traços mínimos de significação) são o funda-
mento. Quando os latinos tomaram musculu (diminutivo de mus, 'rato').
para indicar músculo, tomaram ''musculo" como teor; "ratinho'' como veí-
culo e a "semelhança" como "fundamento•'. A semelhança é então uma
significação fundamental. A metáfora não diz que museu/o parece um rati-
nho e assim se pode dizer que é uma comparação sem os nexos~ tal compa-
ração afirma uma identidade intuitiva e concreta. A semelhança entre teor
e V~cu!o é de du.as espécies: objetiva e emotiva. Em pé-de-cabra a metá~ora
.·--jetiva; em dla.s amargos aqueles, a metáfora é subjetiva, isto é, emotlv~,
llRILC seu efeito é semelhante ao sabor amargo. As metáforas são mais
DICIONARIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 45
expressivas estilisticamente quando o afastamento entre teor e veículo é
m~ior. Há quatro grupos principais de metáforas: l. metáforas antropo-
morficas: boca de forno, coração da floresta, o nervo da questão; 2. metá-
foras zoomórfi~as ou, anima!s: pé-de-cabra, barba-de-bode, pé-de-galinha
(ruga). Neste tipo ha tambem grandes grupos de metáforas animais que
transferem para o homem características dos animais onde muita vez adqui-
rem significações humorísticas dos animais. O homem pode ser comparado
a uma grande variedade de animais; 3. metáforas do concreto ao abstrato:
uma das qualidades da metáfora é traduzir experiências abstratas em termos
concretos: "Valéria é o sol da minha vida." "Marcos é meu braço direito."
4. metáforas sinestésicas: é a metáfora em que se dá a transposição de um
sentido para o outro: cores berrantes, voz quente, cheiro doce, perfume
estridente. A metáfora , conforme querem os teóricos atuais, pressupõe sem-
pre uma comparação in absentia e in praesentia. No primeiro caso, a metá-
fora se mostra completa: A =BC; no segundo, C ou AB = C. (Cf. Morier).
Eis exemplos apresentados por Hênio Tavares em sua Teoria literária: "Mas
vejo aquela cujo olhar são pirilampos." (Antônio Nobre). "Iracema, a vir-
gem dos lábios de mel. .. " (José de Alencar). "Tomai as rédeas vós do
Reino Vosso" (L. I, 15). "Supondo o espírito humano uma vasta concha,
o meu fim, Sr. Soares, é ver se posso extrair a pérola, que é a razão ... "
(Machado de Assis). "Levantou-se com o passo vagaroso de costume, ~ão
aquele vagar arrastado dos preguiçosos, mas um vagarcalculadoe deduz1d?,
um silogismo completo, a premissa antes da conseqüência, a co~se9üênc1a
antes da conclusão. Um dever amaríssimo!" (Machado de Assis, m Dom
Casmurro). "E o Universo - Bíblia imensa / Que Deus no espaço es~re­
veu?" (Castro Alves, in "Adeus, meu cant~"). " ... e ~eixou ver os peitos
virgens - dois botões puríssimos de i_nagnóh~ o.nde ~avia po~sado um casal
de abelhas rubras ... " (Coelho Neto, m Rapsodtas). O mar e um lago sere-
no, / O céu - um manto azulado, I O mundo - u~ so.n~o dourado, I
A vida_ um hino d'amor. " (Casimiro de Abreu). Ve1a htperbase.

METAGRAMA (De mec(a) + -gramma). O mesmo que metaplasmo.

METALEPSE (Do gr. metáiepsis, pelo lat. p·igur.a em que


~etalepse)." ,, se
toma o antecedente pelo conseqüente, e vice-versa: Ele~ v1vera?,1 p~r
"Eles estão mortos". ~'Surgiram as flores" por "Surgm a pnmavera . Veja
metonímia.
METAPLASMO (Do gr . pelo lat. metap /asmu.)
metaplasmos, Designação
· t suprimem permutam ou trans-
comurn a todas as figuras que acrescen am~ metagra,,;a. Para a Gramática
põem fonemas nas palavras. O mesmo qu
46 SEBASTIÃO CHERUBIM

Histórica, é a alteração que sofrem as palavras na evolução do latim para


o português. Essas alterações são apenas fonéticas. As palavras conservam,
de modo geral , a sua significação. Os poetas usam metaplasmos para conse-
guir efeitos expressivos ou para auxiliá-los na feitura dos versos. Os meta-
plasmos realizam-se de quatro modos: aumento, supressão, transposição,
transformação .

METÁTESE (Do gr. Metaplasmo que


me1áthesis, pelo lat. metathese).
consiste na transposição de um fonema na mesma sílaba. Ex.: por por pro;
sempre por semper; entre por inter. Veja hipértese.

METONÍMIA (Do gr. metonymla, pelo lat. metonymia). A metonímia,


é simples variante da sinédoque (v.); são denominações essas de distinção
tão sutil que autores há que dão como exemplo de metonímia aquilo mesmo
que outros subordinam à sinédoque, e tratadistas há que mal mencionam
essas denominações de tropas semânticos. Se na sinédoque se emprega o
nome de uma coisa em lugar do nome de outra nela compreendida; na
metonímia, a palavra é empregada em lugar de outra que sugere, ou seja,
em vez de uma palavra emprega-se outra com a qual tenha qualquer relação
por dependência de idéia: damasco: tecido de seda com flores ou espécie
de abrunho, ambos provenientes de Damasco (o nome de um lugar acaba
por designar os seus produtos industriais ou naturais). Louro, por glória;
cãs por velhice; Fulano é um bom garfo; perna, que era só a de porco,
é hoje de todos os mamíferos e até de aves e insetos; rostro, que primitiva-
mente indicava 'bico da ave', passou a designar o remate da proa e, poste-
riormente, sob a forma rosto, a face humana; insultar perdeu o sentido
material de 'saltar sobre'; desprezar significava, em latim clássico, 'olhar
de cima para baixo'.

MIOTERISMO. Veja ironia.

MONOTONGAÇÃO. Figura que consiste na simplificação de um diton-


go em uma vogal. Ex.: fructu -fruito -fruto; lucta-luita - luta; auricula
-orelha.
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 47

NASALIZAÇÃO Figura d t l .
transformação de ~m fo e mi e ap asmo que consiste na passagem ou
. nema ora a nasal Ex . nec _ . .h. .
Veja desnasalização. · ·· nem, mt t - mim.

lol
<?~SCURIDADE (Do lat. obscurilace). É a falta de clareza pela dispo-
saçao enleada da frase: " ... que em terreno não cabe o altivo peito tão
~queno" ( =. e'!1 terren~ ~ão pequ~no ). O preciosismo, o neologismo, as
ehp~es e os h1perbatos v1c1osos, as inversões afetadas, a ambigüidade, os
parentes:s e~tensos, o emprego exagerado dos homônimos, a acumulação
das ?raçoes mterferentes, a perissologia, as circunlocuções, os períodos de-
masiado longos e a má pontuação são circunstâncias que, pela maior parte,
trazem obscuridade ao discurso.
OCULTAÇÃO. Veja preterição.
OMISSÃO. Veja preterição.
~ ,
ONOMATOPEIA (Do gr. onomatopoiía, pelo lat. onomatopeia). E a figu-
ra que consiste no emprego da palavra cuja pronúncia imita o som natural
da coisa significada. Ex.: murmúrio, sussurro, cicio, mugir, pum, reco-reco,
tique-taque. Estas são as palavras onomatopaicas, naturalmente motivadas.
A onomatopéia pode ser construída também na base da aliteração. Exs.:
"Bramindo o negro mar de longe brada." (L. V, 38). "Tíbias flautins finíssi-
mos gritavam;/ Crótalos claros de metal cantavam." (Olavo Bilac). O se-
guinte texto é de Manuel Bandeira: "Sino de Belém, pelos que inda vêm!
I Sino de Belém bate bem-bem-bem. I Sino da Paixão, pelos que lá vão!
1 Sino da Paixão bate bão-bão-bão. // Sino de Belém , como soa bem! I
Sino de Belém bate bem-bem-bem. I Sino da Paixão ... Por meu pai? ...
Não! Não! / Sino da Paixão bate bão-bão-bão ... Eis um outro texto de
48 SEBASTIÃO CHERUBIM

Jorge de Lima apresentado por Hênio Tavares: "Vamos ver quem é que
sabe I soltar fogos de s. João?/ Foguetes, bombas, chuvinhas, / chios, chuvei-
ros, chiando, I chiando, / chovendo / chuvas de fogo!"

OPTAÇÃO. Segundo Hênio Tavares, espécie de figura pela qual se ex-


pressa um desejo, não chegando a confundir-se com a deprecação, por não
haver nenhuma pessoa ou entidade a quem se dirija o autor. Exs.: '0h, 1

eu quero viver, beber perfumes ! Na flor silvestre, que embalsama os ares."


(Castro Alves). "Nunca morrer assim! Nunca morrer num dia I Assim!
de um sol assim!" (Olavo Bilac). "Quero um beijo sem fim,/ Que dure
a vida inteira e aplaque o meu desejo!" (Olavo Bilac). "Assim eu quereria
o meu último poema / Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e
menos intencionais. / Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas /
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume / A pureza da chama
em que se consomem os diamantes mais límpidos I A paixão das suicidas
que se matam sem explicação." (Manuel Bandeira, in "Último poema").
OXÍMORO (Do gr. oxymóron). Figura de palavras que consiste em reu-
nir palavras aparentemente contraditórias como "silêncio eloqüente", ..co-
varde valentia", "inocen te culpa". O oxímoro é uma figura de grande eficá-
cia estilística porque instaura na linguagem uma espécie de estranhamento.
Seu efeito expressivo é sempre surpreendente pela sua alta taxa de imprevisi-
bilidade. Ele é uma espécie de aporia em que se emprega o raciocínio por
absurdo ou por paradoxo. Veja epíteto.

PALATIZAÇÃO (De palatizar + -ação). Figura de metaplasmo que


consiste na transformação de um ou mais fonemas em uma palatal. Geral-
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 49
mente
·
se dá com:
h
n· (e,i)
·
+vogal
·
= NH: vinea -vinha· nh .
, aranea - ara a,
sen.1or - sen. or; JU.nlu - junho; 1 (e~i) + vogal = LH: palea _palha;
foli~ -. folha, d (e,i) + vogal = J: v1deo - vejo; hodie - hoje· invidia
- mveJa. Os grupos pi, cl, fl = CH: pluvia - chuva; implere -'encher
clave - chave; masculu - macho; flama - chama; inflaire - inchar. o~
grupos cl, pi , gl = L~: ocuio - olho; apicula - apecla - abelha; scopulu
-. scoplo - . escolho , _te~la - telha. Os grupos se, ss (i,e) = X: pisce -
peixe; passione - paixao; miscere - mexer· cerevisia - cerveja· basiu
- beijo; ecclesia - igreja. , '

PA~ILOGIA (D~ gr. paliliogía.' ' repetição de uma idéia ou palavra'). Figura
de"s1~taxe que consiste ~a repetição de uma frase ou de um verso. Segundo
Hen10 Tavares, Opus crt., p. 347, a palilogia é uma "figura iterativa ou de
tautologia ~o~um ~ certos poemas de forma fixa como o rondó, a glosa, o
rondel, o tnole, a v1lanela, o pantum, o canto real, etc.; é muito encontrada
nos romances ou xácaras antigos. Exemplos também apresentados por Hê-
nio Tavares: "Quantos Césares fui! / Na alma e com alguma verdade; I Na
imaginação e com alguma justiça;/ Na inteligência, e com alguma razão -
I Meu Deus! Meu Deus! / Quantos Césares fui! / Quantos Césares fui! / Quan-
tos Césares fui!" (Fernando Pessoa). " ... Caminho pela cidade / sofrendo com
mal-de-amor/ sofrendo com mal-de-amor, I sofrendo com mal-de-amor I sofren-
do com mal-de-amor." (A frase parece que não pára mais.) (Mário de Andrade).

PALINÓDIA (Do gr. palinodía, pelo Iat. palinodia). É a retratação de algo


dito pelo autor em uma composição ou passagem. Ex: em Vidas seca~,
Graciliano Ramos escreve: "Fabiano, você é um Homem ... " Para depois
retificar: "Você é um bicho, Fabiano." Carlos Drummond de Andrade canta
em seu "Poema de sete faces" - "Mundo mundo vasto mundo I mais vasto
é meu coração ... "; e desfazendo a hipérb~le n~ seu "Mu~?º g~ande'': ~~o,
meu coração não é maior que o mundo. E muito menor. Ve1a preteriçao.

PARÁBOLA (Do gr. parabolé). Conforme Massaud Mois~s, narrativa


curta, não raro identificada com o apólogo e a fábula, em r~z.ao da mor~l,
explícita ou implícita, que encerra, e da sua estrutura dramatica. To~avia,
distingue-se das outras duas formas literárias pelo fato de ser ~rotagon~a~a
por seres humanos. Vizinha da alegoria, a parábola comunica uma hç.ao
ética por vias indiretas ou simbólicas: numa prosa ~lt.a~ente metafónca
e hermética veicula-se um saber apenas acessível aos m1ciados. C?nquant?
' . ' b la semelha exclusiva da Bi-
se possam arrolar exemplos profanos, a l'~ra 0 , . lh p d'da
0
biia, onde se encontra em abundância: O Filho Prod1go, A ve ª er 1 '
O Semeador, O Bom Samaritano.
so SEBASTIÃO CHERUBIM

PARADIÁSTOLE (Do gr. paradias10/ê, pelo lal. paradiascole) Figura de


linguagem mediante a qual se distinguem os vários sentidos ou "noções
vizinhas" de uma palavra, conforme definição de Quintihano, em seu lnsti-
tutio oratoriae, liv. IX, 3, 66 (citado por Massaud Moisés em seu Dicionário
de termos literários). O exemplo apresentado é o seguinte: "Desconfiar por
temor, é covardia , mas desconfiar por cautela, é prudência.'' (Pe. An tônio
Vieira).

PARADOXO (Do gr. parádoxon, pelo lat. paradoxon) . É a figura que con-
siste em exprimir a opinião contrária ao senso comum, tendo por aparência
o erro, mas podendo conter a verdade ou parte dela, e ser , portanto ,
apenas uma forma de originalidade, e não raro engenhoso sofisma. Houve
escritores que se notabilizaram por suas tiradas paradoxais. Oscar Wilde,
B. Shaw, Chesterton estão nesse rol. Eça de Queiroz manejou-o com
perícia entre os portugueses, como também esse admirável Fernando
Pessoa. Exs.: " Ninguém é menos que quem tem reino:· (Antônio Ferrei-
ra). "Grandes homens! Apóstolos heróicos!. .. / Eles diziam mais do que
os estóicos: / Dor, - tu és um prazer! / Grelha, - és um leito ~ Brasa.
-és uma gema! I Cravo, - és um cetro! Chama, - és o viver!" (Castro
Alves).

PARAGOGE (Do gr. paragogé. pelo lat. paragoge). Figurá de metaplas-


mo que consiste no acréscimo de fonema ou sílaba no fim de uma palavra.
Ex.: antes por ante; quites por quite. Veja epítese.

PARAGRAMATISMO (Do gr. paragrammatismós). Chama-se paragra-


matismo a perturbação de fala que consiste na desorganização sintática das
frases (paragramatismo expressivo) ou na substituição de formas corretas
esperadas por formas gramaticais incorretas ou neoformas (paragramatismo
impressivo). Veja a/iteração.

PARALELISMO. É a figura de harmonia que consiste na repe,tição


de idéias ou de palavras que se correspondem quanto ao sentido. E um
processo estilístico muito antigo a ponto de ser a base da poesia hebraica
e mesmo da portuguesa medieval. Quando a repetição paralela se faz de
um ou mais versos inteiros, sem modificação alguma. o paralelismo é consi-
derado ritornelo. Ex.: "Minha mãe era bonita, / Era toda a minha dita ,
I Era todo o meu amor. / Seu cabelo era tão louro, / Que nem uma fita
de ouro / Tinha tamanho esplendor. I ( ... ) i Minha mãe era mui bela, /
Eu me lembro tanto dela, I De tudo quanto era seu." (Junqueira Freire.
1
'Ôrfã na costura'').
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 51
PARALIPSE (Do gr. paráleipsis). Veja preterição.

PARÊMIA . Veja ironia.

PARÊNTESE (Do gr. parénthesis. pelo lat. paremhese). Consiste na inter-


posição ao sentido geral de uma ou mais orações ou expressões intercalares,
separadas por vírgulas ou sinais parentéticos... Ó tu , que tens de humano
o gesto e o peito, I (Se de humano é matar uma donzela, I Fraca e sem
força, só por ter sujeito I O coração, a quem soube vencê-la) / A estas
criancinhas tem respeito." (L. III, 127). "Mas que vejo? No azul lá do
oceano I (Quais as gaivotas piadoras brilham) I Pontos de prata branque-
jando avultam ..." (Dutra e Melo). "Ó Netuno (lhe disse) , não te espantes."
(L. IV, 15) "Ora, se deu que chegou I (isso já faz muito tempo) I no bangüê
dum meu avô I uma negra bonitinha / chamada negra Fulô." (Jorge de
Lima).

PAREQUEMA (Do gr. paréchema) . Do ponto de vista da Lingüística,


o parequema é um deteito de linguagem que consiste em começar uma
palavra com sílaba igual ou muito parecida com a última sílaba da palavra
antecedente. Exs.: uma mão, cama macia, capa parda, sempre presente.
Mas do ponto de vista da Estilística, o parequema é uma figura de harmonia
que consiste na repetição da sílaba final de um vocábulo no início do vocá-
bulo seguinte. O exemplo de Casimiro de Abreu que é apresentado a seguir
é significativo: "Se tenho de morrer na flor dos anos, I Meu Deus! não
seja já." E o de Cruz e Sousa: "Nesse lábio mordente e convulsivo / Ri,
ri, risadas de expressão violenta."

PAREQUESE. Veja paronomásia.

PÁRISON. Veja simetria.

PARONOMÁSIA (Do gr. paronomasia, pelo lat. paronomasia). Figura de


harmonia que consiste no emprego de palavras semelhantes no som, mas
diferentes no sentido. Aurélio apresenta o exemplo seguinte: "Todas nove
nos braços o tomaram., / criando-o co seu leite no seu leito." (Camões, in
Rimas, p. 275). "Há um pinheiro estático e extático." (Rubem Braga, Ai
de ti Copacabana!, p. 16). A paronomásia, na prosa, ~ usada nas tiradas
jGCOll&ou irônicas, confundindo-se com o trocadilho. Ex.: "A arte de verse-
j nde pouco: baladas não são boladas." (Agripino Grieco). Exemplos
;~•twMaomúia do francês e do italiano: "qui se ressemble, s'assemble1
ditore" Poéle-se definir paronmúsia como a fiaura
52 SEBASTIÃO CHERUBIM

m~nia qu~ C?nsiste. em reaproximar palavras parônimas, seja por uma simi-
landade fomca, seja por um parentesco etimológico ou formal.

~ARRÉSI~ O termo grego significa


( Do gr. P,arrhesía. pelo lat. parrhesia).
fr~queza, h.berdade •. E uma figura pela qual alguém parece dizer livremente
co1s~s ~fens1 vas, qu~ndo na realidade constituem advertências ou exortações.
Exs.· Vença em s1 mesmo Vossa Alteza; dome o seu espírito, amanse a
grandez~ de seu coração." (D. Jerônirno). "Ouvis isto, Nuno Álvares Perei-
ra? Ouvis, senhor condestável do reino , senhor conde de Ourém? ... Quanto
mais títulos, e honras e senhorios e mercês e grandezas tendes, para vos eu
chamar ~or el~s todos e vos dizer ... para te envergonhar com eles todos, Nu-
no, e te dizer: Estudo isso, Nuno, D. Nuno: olha agora oAlfageme, o homem
do povo, e vê o que lhe fizeste!" (Almeida Garrett, in OAlfagemede Santarém.)

PERÍFRASE (Do gr periphrasis, pelo lat. periphrase). Segundo Massaud


Moisés, também chamada circunlóquio, a perífrase consiste em substituir
uma palavra por uma série de outras, de modo que estas se refiram àquela
indiretamente Exprime, num rodeio frásico , aquilo que o decoro manda
calar por obsceno ou de mau gosto, e pode conter alusões, antonomásias
ou paradoxos. No geral constitui traço de estilo, utilizado para evitar a
monotonia das expressões feitas e criar novas relações metafóricas. Conforme
exemplo em Hênio Tavares, Teoria literária, p. 374, para dizer o ano de 1497,
Camões escreveu: "Curso do sol catorze vezes cento, / Com mais noventa
e sete, em que corria, / Quando no mar a armada se estendia." (L. V, 2).

PERISSOLOGIA (Do gr. perissología, pelo lar. perissologia). Veja perífrase.

PERSONIFICAÇÃO (Do lat. personna). Figura de pensamento pela


qual se faz os seres inanimados ou irracionais agirem e sentirem como huma-
nos. É um precioso recurso de estilo na língua literária, especialmente n~
língua poética, porque empresta vida e ação a seres inanimados. A persom-
ficaçáo é uma figura de linguagem que nasce de ~ma q~alidade ~que.º homem
possui: não pode ver a natureza como uma realidade rnerte; ve-se mt~gra~o
nela e, por isso , dá-lhe vida constantemente. Exs.: "Lá fora, º? 1ard~m
que o luar acaricia, um repuxo apunh~,Ia a ~l~a da.solidão." (?legáno Ma~a­
no). "Os sinos chamam para o amor. (Mano Qumtana). Ve1a prosopopeia.

PLEONASMO (Do gr. pleonasmós. 'supe rabundância'. pelo lat pleon~s~w).


Figura de sintaxe pela qual se empregam palavras redundantes leg1uma-
mente. A função estilística do pleonasmo é reforçar a express~o para conse-
guir impressionar o interlocutor eficazmente, conseguindo vigor e clareza
DICIONARIO DE FIGt.:RAS DE LINGUAGEM
S3
na comunicação, quer oral. quer escrita. Exemplos comuns da língua oral:
"Vi com estes olhos que a terra há de comer... Camões em seu Os Lusíadas
V, 18:.."V! claramente visto o !ume vi~o / Oue a marítima gente tem por
santo. Ha u~ tipo de c?nstruç~o pleonástica muito comum na língua popu-
lar e na hterana, que vtge hod1ernamente como autêntico arcaísmo: "En-
tram no coche. carruagem sua especial dela ... (Antônio Carlos Vilaça, O
anel, p. 99). Para designar o pleonasmo usam-se palavras sinônimas como:
circunlóquio, circunlocução. É comum construir-se pleonasmo expressivo
com termos cognatos e com objeto direto repetido pelo pronome oblíquo.
Este último tem a função lingüística de evitar a ambigüidade, verdadeiro
resquício do sistema casual que vige na língua para auxiliar o sistema posicio-
nal na configuração estrutural das relações funcionais:'' "Sorriu para Holanda
um sorri~o ainda marcado de pavor.'' (V. Moog). ''João vive vida de um
lorde.'' E preciso relatar que o pleonasmo, como figura de linguagem, ·visa
a um efeito expressivo e deve obedecer ao bom gosto. São considerados
como viciosos pleonasmos do tipo: descer pra baixo, entrar pra dentro,
subir pra cima, a monocultura exclusiva de uma planta, que são até comuns
da língua familiar e popular.

PLOCE. Figura de sintaxe que consiste na correspondência da palavra


do meio da frase com a do início ou a do fim de outra. Ex.: "Não se engana
quem deseja ser honrado; mas engana-se quem busca honra em gente sem hon-
ra.'' (Paiva de Andrade, cit. por Hênio Tavares, em sua Teoria Literária, p. 348)

PLURISSIGNIFICAÇÃO. Veja ambigüidade.

POLIPTOTO (Do gr. polyptoton , pelo lat. polyptotu) . Fi~:a de sintaxe pela
qual se emprega, em um período outras:, uma pala_vra sob vanas formas gr~a-
t ica1s.
. · "Ex . .· "Trabalhar , trabalhei , porem antes nao houvesse trabalhado.

POLISSEMIA (Do gr. polisemía). Não é figura de linguagem, trata-se


da propriedade de significação lingüística de abarcar toda uma gama ;de
· ·r·1caçoes,
s1gm - que se definem e precisam dentro. de· um - contexto.
· , Convem
l ;b·l
não confundi-la com a homonímia, embora a d1stmçao se1a as vez~s a .• .
(Cf Ull 1952 180). Todas as formas da língua apresentam pohssem1~,
que. se r~~~~lanto ,à significação gramatical ou interna (~orno nas prepos1-
ções, nas con1unçoes, nas exoe~, e e. .
. _ fl - t ) como à sigmf1caçao externa concen-
alavras mas há casos extremos
trada nos semantemas e caractenzadora das P . : . .. ,. . . f
. . l te chamam a atenção na descnçao lmgu1shca, e . prep.
que prmc1pa men . a falar a Pedro ou andar em - an~ar
a em - Ir a Londrma, andar ópé,I andar doente. As conespondênaas
a largos passos, andar de autom ve '
54 SEBASTIÃO CHERUBIM

de formas, de uma língua a outra, nunca se mantêm em todo o campo


polissémico que cada forma na sua língua abrange, o que complica a técnica
de feitura do dicionário bilíngüe e a tradução de língua a língua. A metáfora
e a metonímia ainda tornam mai~ complexa a polissemia de cada forma
lingüística. Veja ambigüidade.

POLISSÍNDETO (Do gr. polysyndewn) . Figura de sintaxe que consiste


na repetlção intencional do conectivo coordenativo , geralmente com a con-
junção aditiva e, maior número de vezes do que exige a ordem gramatical.
Exs.: "Trejeita, e canta, e ri nervosamente ." (Pe. António Tomás). "Porque
é a beleza vaga e tênue, / falaz e vã e incauta e inquieta?" (Coelho Neto).
''Vão chegando as burguesinhas pobres, / e as criadas das burguesinhas
ricas. / e as mulheres do povo I e as lavadeiras da redondeza." (Mário
Barreto). O polissíndeto é uma figura própria para sugerir movimentos con-
tínuos ou séries de ações que se sucedem rapidamente. Quando existe na
língua de um autor reiteradamente o uso do polissíndeto , diz-se que ele
possui um estiio bíblico porque tal tipo de figura é freqüente no texto sagra-
do. Outros exemplos: "E voava e zumbia e zumbia e voava." (Machado
de Assis). "Contra a destruição se aferra à vida e luta / E treme, e cresce,
e brilha, e afia o ouvido, e escuta / A voz que na soidão só ele escuta,
só." (Olavo Bilac). "Não gentil, mas cruel , mas traiçoeiro I Vibrou-se o
golpe." (Alberto de Oliveira, Poesias, l~ série, p. 302). Antônimo: assíndeto.

PRAEPARATIO. Veja suspensão.

PRECIOSISMO. É o uso de palavras, expressões e construções ou anti-


gas ou inusitadas, esquisitas, rebuscadas, de forma que o pensamento se
torne difícil de ser compreendido. Exs.: Substantivos e adjetivos: hostes,
heréu (herdeiro), incréu, comunal, ucha (arca), infançon (moço fidalgo) ,
fazenda (por negócio ou sentimento), manceba, primente (primeiramente),
vizindade, livridõe (por liberdade), similidõe (por similitude), segre (sécu-
lo), malo (mau). Destes aqui citados, alguns são ainda usados com certa
discrição. Entre os arcaísmos, convém notar os particípios em udo: recebu-
do, estabeleçudo, da 2~ conjugação. De tais particípios há três vestí_gios
ainda usados: teúdo, manteúdo, conteúdo (tido, mantido e contido). E de
se notar os arcaísmos resultantes da incerteza de sufixos na derivação: so-
frença e sofrimento, livridõe e liberdade. Possuímos ainda nascença e nasci-
mento, que não se arcaízaram. O arcaísmo avença (concórdia) deixou vestí-
gio em desavença. Heréu ocorre na expressão terra d'heréu. Ucha sobrevive
em ucharia. Maio sobrevive na expre~são: "Pedro das malas artes''. Verbos:
jeitar (lançar), endurentar (endurecer, sofrer), conquerer (conquistar), em-
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 55
prir (encher), chantar (plantar, fincar), catar (olhar), trebelhar (brincar),
e~c. E de notar també~ gue aJg~~s verbos deixaram vestígios: jeitar sobre-
vive nos compostos: re1e1tar , sujeitar; catar observa-se em cata-cego, cata-
vento; coitar (magoar) vê-se em coitado; chantar temos em "cruz chantada
em terra", ''chantando esteios". "O demônio se chantou naquele miserável
corpo". (Cf. Napoleão Mendes de Almeida em sua gramática citada).

PRETERIÇÃO (Do lat. prae1eritione). Figura que consiste em tratar-se


de um assunto ao mesmo tempo que se afirma que ele será evitado; para-
lipse. Ex.: Não, não me referirei aos seus horrendos crimes. Outros exem-
plos em Massaud Moisés: " Deixo os risos de Diógenes, que metido na
sua cuba, zombava dos Alexandres e suas riquezas. Deixo a sobriedade
dos Sênecas, dos Epictetos, e só me admira ... " (Pe. Antônio Vieira). E exem-
plos são também apresentados por Hênio Tavares: "Deixo deuses, atrás a
fama antiga,/ Que co'a gente de Rômulo alcançaram." (L. I, 26). "Não falo
dos juros que os fidalgos têm vendido, nas jóias empenhadas, nas lágrimas
das mulheres, na pobreza da gente, na miséria da gente pobre, na miséria
dos que pouco podem." (D. Jerônimo Osório, in Carta II a D. Sebastião).

PROLEPSE (Do gr. prolépsis, 'antecipação', pelo lat. prolepse). Figura pe-
la qual se refutam ou se destroem antecipadamente as objeções do adver-
sário. Exemplos apresentados por Hênio Tavares: "Vejo que me perguntas
por que Deus não dá o mesmo dom aos pregadores." (Pe. Antônio Vieira).
"Dir-me-eis que não há C'Jm que premiar a tantos. Por essa escusa esperava.
Primeiramente, eles dizem que há para quem não quereis. Eu não digo
isso ... " (Pe. Antônio Vieira). "Ora (direis) ouvir estrelas! Certo / Perdeste
o senso!" -Eu vos direi, no entanto, / Que para ouvi-las muita vez desperto
1E abro as janelas, pálido de espanto ... " (Olavo Bilac).

PROSOPOGRAFIA (De prosop(o) 1 -graj(o) + -ia). Veja descrição.

PROSOPOPÉIA (Do gr. prosopopoiia, ·~rsonificação', .r eto. lat pros~p~­


poeía). Figura que consis!e no emprestar vida ~o~ seres i~a~1mados, ~ctt­
cios, ausentes ou mortos. E a figura, por excelenc1a, de f1cçao, dos mttos,
das histórias (estórias) maravilhosas e narrações infant~s. Há po~~as - como
"Vozes d'África" de Castro Alves, em que o poeta simula a Afnca a gemer
sua desgraçada so'rte, numa explosão de ª,~gústia e ~e revolta~ - que ,e _con-
substanciam essencialmente na prosopopeia. Exs. : Os altos promontonos o
choraram." (L. III, 84). ''Uma ilusão gemia em cada canto, / Chorava em
cada canto uma saudade!'' (Luís Guimarães Jr.). "Andr:~da. arranca esse pen-
dão dos ares! / Colombo! fecha a porta dos teus mares! (Castro Alves).
56 SEBASTIÃO CHERUBIM

PRÓTASE É a primeira parte de um


(Do gr. prótasis, pelo lat. procase).
período gramatical. Segundo Aurélio, no antigo teatro grego, a primeira
parte da ação dramática, na qual o argumento é anunciado e inicia o seu
desenvolvimento. Eis um exemplo onde há distribuição equilibrada nas duas
partes (também na prótase): ''A idéia ou a realidade rasa de que tudo aquilo
se resumia em um rato. um simples e diminuto rato li não podia, segundo
a minha própria natureza imaginativa, acomodar-se no tumulto das minhas
cogitações." (Luis Jardim, in Confissões de meu tio Gonzaga, p. 5). Nos
períodos a prótase é a parte ascendente; a parte descendente é a apódose
(v.). Segundo Marcel Cressot, in O estilo e suas técnicas, deve existir um
equilíbrio entre prótase e apódose. Prótase e apódose referem-se a um bina-
rismo, não importa o problema da extensão; assim os períodos mais simpJes
contêm as duas partes.

PRÓTESE (Do gr. próthesis. pelo lat. prothese). Figura de metaplasmo


que consiste no acréscimo de um fonema no início do vocábulo: estar de
stare: espírito de spiritu; escudo de scutu. Há uma maneira especial de pró-
tese que é a aglutinação que consiste na incorporação do artigo no início
do vocábulo: alagoa de lacuna; ameaça de minácia; a prótese é muito
comum na língua popular, dizendo-se: arruído por ruído; apodar por
podar.

1Q1
QUIASMO (Do gr. chiasmós, ·ação de dispor cm cruz'). Figura de lingua-
gem pela qual se repetem palavras invertendo-se-lhes a ordem. Exs.: ·•Jgno-
tas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo." (Jos~ de Alencar. Jracema.
p. 15). ~'Tinhas a alma de sonhos povoada ! E a alma de sonhos povoada
eu tinha.'' (Olavo Bilac, Poesias, p. 112). Veja conversão.
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 57

REDUPLICAÇÃO. Veja episeuxe.

REPERCUSSÃO. Veja antanáclase.

REPLICA TIO. Veja a/iteração.

RÍPIO. Palavra enxertada no verso a fim de completar-lhe a medida.


Exs.: "Ouvi: que não vereis com vãs façanhas." (L.I, 11). "Criaturas de
Deus se peregrinam / Invisíveis na terra , consolando / As almas que pade-
cem, certamente." (Alvares de Azevedo, in (!Anima mea").

RITORNELO . (Do it. rirornello). É um paralelismo especial; as repeti-


ções se fazem integralmente não só sob o aspecto ideativo, mas também
no. expressional ou vocabular. Ex.: "Hoje a verdade é esta: / não tenho
verdades / ao longo do dia, / nem penso em dar festas J que há pouco
fazia. / Nas horas que passam / Ao longo do dia / nem minha tristeza,
I me lembra em poesia. I Sobre o azul calado I do céu em degredo I segredo
de moça, / hoje a verdade é esta: J não tenho verdades, / não tenho poemas,
/ não tenho poesia, / tenho penas, vivo/ - ao longo do dia - / com um
desejo exato / de você, Maria." (Moacir Félix, in "Redondilhas de um dese-
jo", apud Geir Campos, op. cit.).

s
SARCASMO. Veja ironia.
58 SEBASTIÃO CHERUBIM

SILEPSE (Do gr. syllepsis. 'ação de compreender', pelo lat. syllepse). Figura
de sintaxe pela qual a concordância das palavras se faz de acordo com o
sentido e não segundo as regras da gramática. Pode ser: 1. de gênero: ''Vossa
Majestade informado acerca de tudo." "Sobre a triste Ouro Preto o ouro
dos astros chove." (Olavo Bilac). ' Quando a gente é novo, gosta de fazer
1

bonito.,. (Guimarães Rosa). "Se acha Ana Maria comprido, trata-me de


Naná." (Ciro dos Anjos). 2. de número: "O casal de patos nada disse,
pois a voz das ipecas é só um sopro. Mas espanadaram, rufiaram e voaram
embora." (Guimarães Rosa). "Está cheio de gente aqui. Tire esse povaréu
da minha casa. Que é que eles querem?" (Dalton Trevisan). 3. de pessoa:
"Aliás todos os sertanejos somos assim." (Raquel de Queiróz). "Os que
adoramos esse ideal , nele vamos buscar a chama incorruptível." (Rui Barbo-
sa). "Os amigos nos revezamos à sua cabeceira. (Raquel de Queiróz). "Mas
haverá para qualquer de nós, os que lutamos, alguma alternativa?'' (Fer-
nando Namora). " Os que a procuravam são inúmeros, pois todos sofremos
alguma coisa; esta água insípida tem uma vastíssima órbita de ação. " (Cecília
Meireles). "Ficamos por aqui, insatisfeitos, os amigos." (Carlos Drummond
de Andrade) . Exemplos retirados da Novíssima gramática da língua portu-
guesa, pp. 404-405).

SIMBOLO (Do gr. symbolon, pelo lat. symbolu) . É a imagem que vale
por um sinal, ou conforme Hugh Walpole, "uma palavra usada referencial-
mente". (Cf. Hênio Tavares, em sua Teoria literária) . Uma imagem pode
invocar-se como metáfora uma vez, mas se se repete persistentemente, con-
verte-se em símbolo. Para tornar-se símbolo a imagem ou metáfora deve
apresentar: repetição persistente e valorização universal. Tomando uma
frase em construções gradativas, notaríamos: a. João é forte; O leão é forte
- frases enunciativas em sentido próprio. b. João é forte como um leão
- figura e comparação ou símile, ainda no sentido próprio. e. João é um
leão - imagem ou metáfora já em sentido translato. d. O leão é imagem
da força - conclusão das frases anteriores. e. O leão é o símbolo da força
- conclusão da frase anterior. Assim o símbolo é de duas naturezas: 1.
símbolo metafórico. Ex.: o cordeiro. 2. símbolo metonímico. Ex.: a cruz.
Numa frase como: - Você é uma águia, há simultaneidade de imagem
ou metáfora e símbolo. Em - Ele é um Homero - há concomitância
de imagem ou metáfora, símbolo e sinédoque. Para a criação dos símbolos,
concorrem inúmeras fontes, dentre as quais destacamos: 1. mitologia: nomes
de deuses, heróis, animais, lugares, etc. Exs. : Vênus (em referência à beleza
e ao amor); Hércules (à força); Mercúrio (ao dinheiro); Narciso (à vaidade);
Tântalo (à insatisfação); Castália, Hipocrene. Parnaso, Pégaso (à inspira-
ção); Baco (ao vinho); Letes (ao esquecimento); Esculápio (medicina). No-
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 59

t:-se :~ta quadri~ha epigra~ática, em que os símbolos se usam como alu-


so~s: A huma,n~dade cammha I Sem descansar um segundo: / - Vai de
f
Ven.us,ª. Mercuno Desde o começo do mundo/." (Djalma Andrade).
2. histona: vul~os .c~le~res, acontecimentos notáveis, lugares que foram pal-
co de evento s1gmf1cattvo, peculiaridades de nações e povos, etc. Ex.: Ale-
xandre, César, .Napoleão (conquistadores); Calígula, Nero, Átila, Vândalo,
~uno (pervers1da.de); Faraó (suntuosidade); Sibarita (dissídia e voluptuo-
sidade); Cresa (n9ueza); Demóstenes, Cícero (oradores); Lúculo (gula);
Colombo (_descobndor, desbravador); Waterloo (desastre, derrota, insuces-
so), etc. Eis um exemplo de Castro Alves: "O livro - esse audaz guerreiro
1 Que conquista o mundo inteiro/ Sem nunca ter Waterloo... " 3. filosofia:
grandes pensadores e seus sistemas. Ex.: Sofistas, Sócrates, Platão, Epicu-
ristas, Estóicos. 4. religião: pessoas e fatos a ela ligados: Ex.: Moisés, Monte
Tabor, Calvário, Gólgota, fariseu, samaritano, Canaã, Matusalém, Babel,
Golias, Jeremias, Jó e outros. 5. criações literárias: tipos provenientes da
inspiração dos grandes artistas, que atingiram proporções universais. Ex.:
Homero (força, valentia): Ulisses (astúcia); Nestor (prudência); Penélope
(fidelidade conjugal). Shakespeare: Timon (misantropia); Otelo (ciúme);
Hamlet (loucura); Shylock (avareza); Cordélia (amor filial); Caliban (mal-
dade). Moliere: Alceste (misantropia); Harpagão (avareza); Tartufo (hipo-
crisia). Rabelais: Pantagruel (gula); Panúrgio (cinismo) e muitos outros con-
forme consta na lista apresentada por Hênio Tavares em sua Teoria literária.
6. Cores, plantas, animais, objetos, etc. branco (pureza); verde (esperança);
azul (bonança); negro (desgraça, tristeza); vermelho (sangue, luta, socialis-
mo); amarelo (desespero. dinheiro); cão (fidelidade); raposa (malícia, astú-
cia); abutre (crueldade). (Cf. Hênio Tavares, Teoria literária, pp. 382-384).

SIMETRIA Quando
(Do gr. symmetria, 'justa proporção, pelo lat. symmelria).
se observam o equilíbrio e a correspondência dos sons, funções e extensão
das palavras e proposições tem-se a simetria. As espécie.s simétrica.s mais
importantes são: 1. párison: também chamada toante, pois nada mais é do
que um tipo especial de assonância: a homofonia (v). que é a correspon-
dência das vogais a partir da tônica. 2. homeoleteuto ou homoteleuto; é
a mesma coisa que rima: desinências iguais no final de versos ou frases
e tem particular emprego no provérbios: Ex.: Varão, manda ele e ela nã~!
/ Varela manda ele e manda ela; I Varunca, manda ela, e ele nunca.
Como n~ verso a rima ocorre naturalmente, o homotclcuto deve ~r obse~­
vado com atenção na prosa, q~ando dele certo~ au~o~es procuram ~,efe1·
tos estilísticos. Para ilustrar, eis de Pe. Antômo Vieira um e1emplo. Oue
faz o lavrador na terra, cortando-a com o arado, cavando, regando, mondan-
do, semeando? Busca pão. Que faz o soldado na campanha, canepdo
SEBASTIÃO CHERUBIM

fettõ, vigiando, pelejando, derramando o sangue? Busca pão. Que faz


111\'tgante no mar, içando, amainando, lutando com as ondas. e com
O& ~ntos? Busca pão... J. homeoptoto ou homoptoto: emprego de vários
verbos ~os mesmos tempos, ou de várias palavras na mesma função: HSe
você gritasse, f se você gemesse, I se você tocasse, / a valsa vienense, /
se você dormisse, / se você cansasse, I se você morresse .. . / Mas, você não
morre, / vocé é duro, José!" (Carlos Drummond de Andrade). "Bramando
duro, corre e os olhos cerra, I Derriba, fere, mata e põe por terra." (L.1,
88). "Amar como um homem amando I viver como um homem vivendo:
I ousar como um homem ousando / saber como um homem sabendo / querer
como um homem querendo / lutar como um homem lutando, / morrer como
um homem morrendo." (Geir Campos, in "Os Mandamentos"). 4. isócolo:
quando se verificam membros ou frases de extensão igual ou quase igual.
No verso medido o isócolo é uma característica: "Rufiando as asas, I sacu-
dindo as penas." (Raimundo Correia. in "As Pombas"). Muitos escritores
empregam-no na prosa a fim de tomá-la harmoniosa. Exs.: "Salta o coração,
1 bate o peito, I mudam-se as cores, / chamejam os olhos, I desfazem-se
os dentes, / escuma a boca, / morde-se a língua, I arde a cólera, / ferve
o sangue, fumejam os espíritos, I os pés, as mãos, os braços, I tudo é ira,
I tudo fogo, I tudo vento.'' (Pe. Antônio Vieira, in "Sermão de Santo Antô-
nio"). Para o estudo do período gramatical em prosa há outras figuras como
a pr6tase e a apódose em suas múltiplas relações ; e as divisões bimembres,
trimembres, quadrimembres e outras que podem ensejar os períodos.

SÍMILE (Do lat. simile). Figura de pensamento até certo pontosinônimo


de comparação, o súnile dela se distingue na medida em que se caracteriza
pelo confronto de dois seres ou coisas de natureza diferente , a fim de ressal-
tar um deles. Constitui, por isso, uma espécie de ampliação. Regra geral,
vem expresso o elemento de coordenação dos membros comparativos (co-
mo, tal como, assim como). Ex.: Este terrível doesto foi certeiro, feriu
o coração de Maurício como uma seta envene~ada." (Bernardo Guimarães,
Maurkio, 2~ ed. 1941, p. 323). Veja comparação.
sfMPLOCE (Do gr. symplok~. 'entrelaçamento', pelo lat. symploct) . Fi-
pra de sintaxe que consiste na simultane.idade da anáfora. e ~~ epístrofe;
itDclo aquela a repetição de uma ou mais palavras no pnncip10 de duas
·.aa-.ats.frases ou de dois ou mais versos; e, esta, a repetição do mesmo
~-,;~•! E .: ºComo~ escuro nascer! I Como é úmido nascer!"
f t.....:

a.it.114'i\&C:nmick in 'Destino da Tenebrosaº, apresentado por Hênio


) Ou exemplo do Pe. Antõn10 Vieira; ºToma
1M11> C11J • ! im toma. Toma o Ministro da Fazenda?
1
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 61
Sim, toma. Toma o Ministro da República? Sim. toma. Toma o Ministro
da Milícia? Sim. toma.'' (Pe. Antônio Vieira. ~'Sermão da visitação ' Veja
1
).

anáfora e epfstrofe.

SINAFIA (Do gr. synápheia, pelo lat synaphia). Caso extremo de enjam-
bement, corrente quando dois versos se interprenetram de maneira que a
última palavra de um se completa no outro Exs .: "É como a água terna-
/ mente matutina." (Cassiano Ricardo, Poesias completas, p. 436). "Vê
com ardor / Teu belo cor - I po escultural!" (Antônio Feijó, Poesias comple·
tas, p. 81 ).

SINALEFA (Do gr. synaloiphé, pe lo lat. synalepha). Figura pela qual se


reúnem duas ou mais sílabas em urna só por elisão, crase, ou sinérese.
Veja exemplificação de crase.

SÍNCOPE (Do gr. synkope, pelo Jat. syncope, 'ação de cortar').Figura de


meta plasmo que consiste na supressão de um fonema no meio do vocábulo.
Exs.: leal por legale; lenda por legenda. Veja hap/ologia.

SINÉDOQUE (Do gr. synedoché, 'comparação de várias coisas simultaneamen-


te'. pelo lat. synedoche). A sinédoque é um tropo imperfeito porque não
oferece uma real e perfeita translação de sentido, mas tão-somente uma
simples extensão do sentido vocabular, baseada em relação de contigüidade,
de vizinhança ou de coexistência para alargar ou restringir a significação
normal das palavras. São vários os casos em que ocorre: 1. tomando-se
a parte pelo todo: Há no campo quinhentas cabeças (em lugar de reses) .
Completou ela quinze janeiros (em lugar de anos). Transpuseram a barra
treze velas (em vez de navios). 2. tomando-se o todo pela parte: o mundo
é egoísta (em vez de os homens). 3. tomando o singular pelo plural: O
brasileiro é cordial. A mulher tem sempre rara intuição (em vez de, respecti-
vamente, os brasileiros e as mulheres). 4. tomando-se o plural pelo singular;
A obra dos Ruis e dos Nabucos. 5. tomando-se o indivíduo pela espécie:
Ele foi para todos um Mecenas, como o irmão foi um Hércules. 6. tomando-se
a espécie pelo indivíduo (em uma fala sobre Camões): "Como disse o poe-
ta .... ". Ou falando sobre São Paulo: "No entender do Apóstolo ... " 7. tomando
a espécie pelo gênero: "Está sem um centavo ... (em lugar de dinheiro).
Ganharás o pão com o suor dp teu rosto ... (em vez de alimento). 8. toman·
do-se o género pela espécie: E triste o destino dos mortais (pelos homens).
9. tomando-se o abstrato pelo concreto: A inexperiente juventude (em lugar
de os jovens). O egoísmo do amor (em lugar de dos apaixonados). 10. toman-
do-se a matéria pela obra: cruzaram o aço {por espadas). Tangem os bronzes
62
SEBASTlÃO CHERUBIM

~~~dve~g;~inos). (Cf. Gay?l Fernandes. Teoría literária. 2 vols. La Habana,


· ··.. . ·PP· 116-117. catado por Rocha Lima). Exemplos apresentados
~r Hemo Tavares em sua Teoria literária: ' Vem, pois poeta amargo da
1

escrença. / Meu lara vagabu~do, / e co 'a taça na mão e o fel nos lábios
1
Zo!llb~remos d~ ~undo!" (Alvares de Azevedo, in "O conde Lopo"):
e~phcaçao necessana: ~~ra . sinédoque, símbolo, metáfora~ Lara é a cria-
çao de Byron e personifica o mdivíduo orgulhoso e egoísta.

SINÉRESE (Do gr'. synaíresis, 'contração' , pelo lat. synerese) Figura de


~etaplasmo que consiste na fusão de duas sílabas numa só, mas sem altera-
çao de l~tras ?u fo nemas, como, por ex., em reu-nir, pie-dade, em vez
de re-u-mr e p1-e-da-de. Veja diérese.

~INES~ESIA (~~ sin- +gr. aísthesis, 'sensação, + -ia) . É a evocação de


1mpressoes s~nsonaas através da palavra. Ex.: "Tarde de olhos azuis e seios
mor~nos. I O t~rde li9da, ó tarde doce que se admira, / Como uma torre
de perolas e safira. I O tarde como quem tocasse um violino. / Tarde como
Endimion , quando ele era menino. / Tarde em que a terra está mole de
tanto beijo / Porém querendo mais, nervosa de desejo ... " (Emiliano Perne-
ta, in "Baucis e Filemon").

SINONÍMIA (Do gr. syn, 'conjunt o', e onyma, 'nomes' + -ia). Proprie-
dade de dois ou mais termos poderem ser empregados um pelo outro sem
prejuízo do que se pretende comunicar. A sinonímia aparece em todos
os planos das formas lingüísticas, embora a denominação, que nos vem
dos gregos, tenha apenas pressuposto um conjunto. Temos, pois, sinonímia
em: 1. formas mínimas, quer semantemas básicos, quer afixos; 2. palavras;
3. vocábulos gramaticais; 4. locuções; 5. frases. Exs.: 1. voe- = fon- (seman-
temas sinônimos, como mostram fônico = vocal); a = in = des (prefixos
sinónimos, como mostram anormal = inepto = desgosto, onde os prefixos
de forma diversa exprimem todos a idéia de 'falta de ... '); 2. levantar =
erguer; 3. pois = porque; 4. tenho de sair = preciso sair; 5. Espero que
ele cumpra o prometido = confio em que ele não falte com a sua palavra.
Em regra, a Gramática restringe a sinonímia ao plano da palavra, incluindo
aí a sinonímia das formas mínimas, que só aparecem integradas nas palavras~
e refere-se aos casos previstos nos itens 3, 4, 5. como equivalência, paral~­
lismo, correspondência. Há, porém, quem distinga entre os sinônimos lexi-
cais, pondo de um lado o caso 2, in~luindo o 1. e do outro lado, .ºs c~s~s
3, 4, e 5 (Cf. Poelelungi. 1960). UE quase um truísmo .que a smo~1~~a
total é ocorrência extremamente rara, um luxo a que a lmguagem d1.f1ctl-
mente se dá." (Ullmann. 1957, p. 108). Os sinônimos distinguem-se, a ngor,
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 63
entre si por uma das seguintes circunstâncias: 1. Significação - a) mais
ampla ou mais restrita; b) mais simples ou mais complexa. Exs.: a) ave
e pássaro; b) sofrer e padecer. 2. Efeito estético do termo - a) delicado
ou grosseiro; b) n?bre ou vulgar; e) poético ou usual; d) usual ou cientifico;
etc. Exs. : a) nanna_ e ven~a; .b) enfadonho e cacete; e) pulcro e belo~ e)
queda e ptose. A cucunstancta 1 refere-se ao âmbito da denotação, e a
circunst~~cia ~ ~o . âmbito~ da conotaçã? de~ fundo estilístico. Eis por que
entre vanos smommos ha um que se tmpoe conforme a frase , para ela
se tornar realmente eficiente e expressiva. E no âmbito da denotação é
ainda preciso levar em conta a polissemia (v.) imanente em toda palavra,
de que resulta que a sinonímia depende essencialmente do contexto em
que se acha a palavra. Assim, o sinônimo de a) Levantar os braços é erguer;
b) levantar nos braços é suspender; e) levantar uma estátua é erguer ou erigir;
d) levantar a lebre é descobrir; e) levantar uma candidatura é lançar; O levan-
tar um terreno é medir. Verifica-se o valor sinonímico e as diferenças denota-
tivas ou conotativas entre duas ou mais palavras por dois processos: 1. substi-
tuição de uma pela outra ou de outras em determinado contexto; 2. determi-
nação do antônimo comum de cada uma delas. Assim em 1. o cão está
livre , a substituição por solto mostrará certa diferença de denotação; 2.
a mesma diferença aparecerá opondo-se livre a preso e solto a amarrado.
A sinonímia é um fato essencialmente sincrônico, pois diz respeito à signifi-
cação dos termos num estado lingüístico dado. A diacronia entra no estudo
da sinonímia para explicar as causas que a determinaram em caso concreto
e que podem ser, em última análise, duas: 1. empréstimo a uma língua
estrangeira; ex: fônico , ptose; empréstimos ao grego, ao lado de vocal, que-
da; 2. evolução semântica: ex: sofre, dá idéia de 'suportar' à de 'suportar
uma dor', o que associa o termo com padecer. A diacronia nos mostra
também a eliminação de sinônimos, quando há uma coincidência perfeita
na denotação e na conotação ou quando a falta de interesse pela área semân-
tica a que ele se refere faz que se ponham de lado os matizes denotativos
e um só termo é considerado suficiente para representar toda a área. As
línguas que servem a uma cultura muito refinada caracterizam-s~ pela rique-
za sinonímica por dois motivos: 1. a preocupação de não repetir os termos
num texto dado; 2. o esforço para criar cambiantes de significação e valor
estético e estabelecê-los firmemente, por meio de termos distintos; daí re-
sulta o empréstimo a línguas estrangeiras e uma tendência muito f~rte_ para
evoluções semânticas sutis dentro de certos contextos com a amphaçao de
sinonímia. Veja exergasia.

SÍNQUISE (Do gr. synchysis, 'confusão', pelo lat. synchysis). É ª.figura


de sintaxe que consiste na inversão violenta, "a inversão exagerada, Já todo
64 SEBASTIÃO CHERUBIM

inaceitável hoje , em que, o sentido fica obscuro ou mesmo incomprens'1ve,


1

~ qu~ ~e , ? nome d; ~inquese, que ,quer dizer confusão". (Júlio Nogueira,
m f?icwnarw e ~r~matica _d~ Os Lusiadas, p. 296). Era já considerada pelos
a~t1gos como h1perba~o v1c1oso (veja hibérbato). (Cf. A. Magoe, in Princf-
pios elementares d~ llteratura, p. 85). Ex. : "Lícias, pastor - enquanto 0
sol recebe, I Mugindo, o manso armento e ao largo espraia, / Em sede
abrasa , qual de amor por Febe, I Sede também, sede maior, desmaia. "
(Alberto de Oliveira, in "Taça de coral"). Eis o texto em ordem menos
inversa:. Lícias, pastor, enquanto o manso armento, mugindo, recebe o sol
e espraia ao largo, - abrasa em sede, qual desmaia de amor por Febe,
sede também, sede maior.

SOLECISMO (Do gr. soloikismós, pelo lat. soloecismu) . Não é figura. É


todo erro léxico e sintático. Exs. : Haviam muitas pessoas no baile. Custei
muito a encontrá-lo. Hão de me obedecerem.

SONORIZAÇÃO. Figura de metaplasmo que consiste na passagem de


uma consoante surda à sua homorgânica sonora. Só ocorre a sonorização
se a consoante surda estiver em posição intervocálica. As surdas que se
sonorizam são: p - b: capio = caibo; lupu = lobo; sapui = soube; t
- d: civitate = cidade; q - g: aqua = água; amicu = amigo; aqui/a :;::
águia; c-z: acetu =azedo; vicinu = vizinho;facere = fazer;f-v: profectu
=proveito; aurifice =ourives; b-v: caballu = cavalo;faba =fava; populu
-pobo =povo. A passagem de b a v recebe o nome especial de degeneração.

SUARABÁCTI (Do sânscr. svarabhaui, 'separação por meio de vogal'). Figura


de metaplasmo, espécie de epêntese que consiste em desfazer um grupo
de consoantes pela intercalação de uma vogal. Ex.: blatta - brata -barata;
planu -práo -porão. O mesmo que anaptixe.

SUBJEÇÃO (Do lat. subjectione) . Figura pela qual um orador interroga


0 adversário e, supondo a resposta ou prevendo o que responderia, dá
logo a réplica. Exemplos a~resentad_?s por .Massaud Moisés em seu Dic!o-
nário de rernios literários: Quem sao os ncos neste mundo? Os que tem
muito? Não· porque quem tem muito deseja mais; e quem deseja mais,
falta-lhe o q~e deseja, e essa falta o faz pobre." (Pe. Antônio Vieira).

SUJEIÇÃO. O mesmo que subjeção.


SUSPENSÃO (Do lat. suspensione) . É uma figura que consiste numa di-
lação do enredo pela qual se conserva em suspenso a curiosidade do leitor
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 65
ou ou~inte ao longo de perguntas e hipóteses sucessivas. Ex.: " Quem passou
P:la v1d~ em b~anca nuvem, / E em plácido repouso adormeceu; / Quem
na~ sentm o fno da des~raça_. I Quem passou pela vida e não sofreu; /
F01 espectro de ~orne~ , nao foi homem, I Só passou pela vida-não viveu. "
(Francisco Otaviano, m " Ilusões da vida'').

TAPINOSE (Do lat. rapinosis). Figura de retórica ou figura de palavras


que diminui, em qualquer sentido, aquela a que substitui. O mesmo que
eufemismo. Veja auxese.

TAUTOGRAMA (Do gr. tauton. 'o mesmo' . e gramma, 'escrita'). Seqüên-


cia de frases ou versos cujas palavras. na totalidade ou na maioria apresen-
tam a/iteração. Veja a/iteração.

TAUTOLOGIA (Do gr. tauton , 'o mesmo' , + log- + -ia). Figura que con-
siste na repetição da mesma idéia ou desenvolvimento de um único tema
por meio de termos diferentes, sem, contudo, cair em perissologia viciosa
ou redundância vitanda, como em frases deste tipo: "A criança é órfã. Coita-
da não tem pais! "Mole se fez e fraco; e bem parece." (L. III. 139). "Não
chores, meu filho . I Não chores que a vida I É luta renhida: / Viver é lutar.
/ A vida é combate". (Gonçalves Dias apud Hênio Tavares em sua Teoria
lüerária, ci t.)

TEMATOLOGIA (Do gr. thema , 'terra·, + log- + -ia). Em gramática,


parte da Morfologia, que estuda os temas de cad~ uma das cate~oriasgram~­
ticais que entram no discurso. (Aulete). É uma figura que consiste na repeta·
ção com o propósito retórico ou estilístico.
66 SEBASTIÃO CHERUBIM

TMESE (Do gr. tmesis , 'corte'. pelo lat. tmese). É a separação de dois ele-
mentos que compõem uma palavra, habitualmente adjacentes; deste modo,
o preverbo pode ficar separado do verbo na poesia grega. 1. Nas línguas
clássicas (grego e latim), partição de palavras, s~b retudo compo~ta~, pela
intercalação de termo entre seus dois eleme ntos. E semelhante ao h1perbato.
Ex.: saxo cere comminuit brum por saxo cerebrum comminuit (feriu o cére-
bro com uma pedra). 2. Em português, chama-se tmese a intercalação do
pronome complemento entre o radical ( = infinitivo) e as terminações ver-
bais no futuro e no futuro do pretérito: contar-lhe-ei, soltá-los-eis. Sinônimo:
mesóclise. (Cf. Jean Dubois et alii, Dicionário de lingüística, citado, p. 589).
TROCADILHO (Diminutivo de trocado) . Arranjo de palavras seme-
lhantes no som e cuja seqüência propicia equívocos de sentidos dúbios,
principalmente visando a fazer humor ou graça. Ex.: "Se do rosto os primores,
/ Em teu rosto se pintam várias cores, / Vejo, pois, para pena e para gosto
/ As sobrancelhas arco-íris o rosto". (Botelho de Oliveira). Veja calembur.
TROPO (Do gr. trapos , 'desvio', pelo lat. tropa) . Segundo Massaud Moi-
sés, espécie de linguagem figurada , o tropa consiste na translação de sentido
de uma palavra ou expressão, de modo que passa a ser empregada em
sentido diverso do que lhe é próprio. Ex.: dizer vela ou lenho no sentido
de embarcação; ou o Mártir da Inconfidência por José Joaquim da Silva
Xavier. Quando a mudança se opera ao nível da palavra, temos tropa de
dicção, quando ao nível da expressão, trapo de sentença. Num caso ou
noutro, o desvio promana de uma simples associação de idéias, efetuada
por semelhança, conexão ou correlação. Desses três processos advêm os
tropas de dicção: a metáfora, que utiliza a analogia, a sinédoque, a conexão;
e metonímia, a correspondência. Entre os tropas de sentença, classificam-se
a alegoria, a ironia, a litotes, a metalepse , a preterição e outros. Os tropas
integram um capítulo muito complexo da Retórica, em que ainda se estudam
as figuras de linguagem como todas estas que o leitor tem a oportunidade
de consultar neste dicionário.

lu 1
UMLAUT (Do alemão). Palavra alemã que é empregada para designar
a metafonia. Veja metafonia.
DICIONÁRIO DE FIGURAS DE LINGUAGEM 67

VOCALIZAÇÃO (Do lat. vocal, passando ao português· + -iz + _ - )


. d t l . , açao .
F1gura e me ap asmo qu~ consiste na transformação de uma consoante
em vogal. Ex.: nocte - noite; regnu - reino; multo - muito.

1z1
ZEUGMA (Do gr. zeúgma, 'junção' , pelo lat . zeugma). Figura de sintaxe
pela qual uma palavra, expressa em determinada parte do período, é em
outras partes subentendida. "Paulo canta e eu também." Exemplos citados
por Aurélio: "Vieira vivia para fora, para a cidade, para a corte, para o
mundo ; Bernardes para a cela, para si, para o seu coração". (Antônio Feli-
ciano de Castilho, apud Álvaro Lins e Aurélio Buarque de Holanda Ferrei-
ra, Roteiro literário de Portugal e do Brasil, l , p. 169). O adjetivo correspon-
dente a zeugma é zeugmático.
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