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MÉTODOS E CRITÉRIOS DE DEMARCAÇÃO CIENTÍFICA

INDUTIVISMO vs FALSIFICACIONISMO

INDUTIVISMO

I. CRITÉRIO VERIFICACIONISTA DE DEMARCAÇÃO CIENTÍFICA


O QUE É UM CRITÉRIO DE DEMARCAÇÃO CIENTÍFICA?
Um critério de demarcação científica apresenta uma definição de ciência onde são expostas as condições
que permitem distinguir a ciência da não ciência, entendendo-se por não ciência quer as disciplinas que não
se consideram ciência, como a arte, a literatura, a filosofia ou a religião, quer as disciplinas que se consideram
ciência (pseudociência), mas que o não são, como a psicanálise, astrologia e a teoria económica marxista,
etc.
Assim, um critério de demarcação científica justificará por que razão a teoria newtoniana da gravidade é
ciência e a teoria empirista do conhecimento não é, ou ainda porque é que a teoria da evolução das espécies
é ciência enquanto a teoria de Adão e Eva não é.

O CRITÉRIO VERIFICACIONISTA DE DEMARCAÇÃO DA CIÊNCIA*


No século XIX, com o desenvolvimento da física, o movimento positivista apresentado o primeiro critério de
“cientificidade” que teve como objetivo eliminar da filosofia as teorias metafísicas de forma a tornar esta
disciplina mais rigorosa.
Os positivistas, defensores de uma ciência indutivista, propuseram o critério verificacionista segundo o qual:
UMA TEORIA É CIENTÍFICA
SSS
está FUNDADA NA EXPERIÊNCIA e é VERIFICÁVEL

CONDIÇÕES DE VERIFICABILIDADE DAS TEORIAS


Para satisfazer o critério verificacionista, é necessário formular os enunciados (hipóteses e previsões) de
forma que sejam facilmente confirmados, escapando à refutação. Vejamos, então as condições que
contribuem para a verificabilidade das teorias científicas:
a) Relativamente à Hipótese, se o enunciado tiver um ÂMBITO RESTRITO, esta será mais facilmente
verificada
b) Relativamente às previsões, se o enunciado for POUCO PRECISO, estas serão mais facilmente
confirmadas, ou se, escapam mais facilmente à refutação

Exemplos: AMBITO DAS PROPOSIÇÕES


P1. Todos os corpos terrestres submetem-se à lei da gravidade
P2. Todos os corpos submetem-se à lei da gravidade

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P1 tem um âmbito mais restrito do que P2 porque faz uma afirmação que se restringe aos objetos da terra
enquanto P2 afirma que as leis da gravidade se aplicam a todos os objetos do universo, ou seja, a objetos na
terra e fora da terra.
Neste sentido, P1 é mais verificável do que P2 na medida em que a probabilidade de aparecer um
contraexemplo a P1 é menor do que aparecer um contraexemplo a P2.

Exemplos: PRECISÃO DAS PROPOSIÇÕES


P3. A crise em Portugal vai ter consequências no valor dos bens imobiliários
P4. A crise em Portugal vai fazer descer o valor dos bens imobiliários
P3 é menos precisa do que P4, porque a expressão “ter consequências” não esclarece se a alteração é no
sentido de uma subida de preços ou de descida de preços.
Assim, P3 é mais facilmente verificável uma vez que quer os preços dos bens imobiliários subam ou desçam,
P3 verifica-se sempre. P3 só será refutado caso os preços se mantenham.
O mesmo não acontece com P4, uma vez que é refutado se os preços se mantiverem e se os preços subirem.

I. MÉTODO INDUTIVISTA
PROBLEMAS
A questão levantada pelos filósofos da ciência consiste em saber em que consiste o método científico.
A resposta a esta questão passa por analisar:
P1 - como descobrimos as hipóteses - o papel da observação para a formulação das hipóteses
P2 - como se testam as hipóteses – o papel da observação na validação das hipóteses

PROBLEMA 1 – qual o papel da observação na formulação da hipótese?


TESE
O INDUTIVISMO defende que as hipóteses científicas devem ser INDUZIDAS a partir da observação pura e
isenta de preconceitos. Portanto, a observação (experiência) é o ponto de partida e constitui a 1ª etapa do
método científico.
ARGUMENTOS
1) A observação é um bom ponto de partida
Segundo os indutivistas, a observação pura é o único ponto de partida (o argumento indutivista está fundado
no empirismo), porque só ela é capaz de nos mostrar regularidades (repetições/padrões) que tornam possível
a generalização da lei. Isto significa que as hipóteses não são inventadas (intuídas) - perspetiva racionalista
– nem deduzidas de teorias filosóficas ou crenças religiosas, mas derivam indutivamente de observações
sistemáticas (amostras amplas e representativas), rigorosas e imparciais.

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PROBLEMA 2 – qual o papel da observação na validação da hipótese?
TESE: POSITIVISMO LÓGICO
Segundo o POSITIVISMO, a experiência tem a força de DEMONSTRAÇÃO no sentido em que a confirmação
sucessiva de previsões* garante a verdade da hipótese, uma vez que se assume a regularidade da natureza.
Deste ponto de vista, uma experimentação bem sucedida VERIFICA a hipótese. Esta posição designa-se de
VERIFICACIONISMO
*Para testar uma hipótese é necessário deduzir, da hipótese, proposições particulares (PREVISÕES) e submetê-las à
EXPERIMENTAÇÃO, ou seja, ver se as proposições derivadas da hipótese se confirmam ou não.

TESE: NEOPOSITIVISMO
Segundo o neopositivosmo, a experiência tem a força de PROVA no sentido em que a confirmação sucessiva
de previsões aumenta o grau de probabilidade da hipótese, ou seja, contribui para sua validade material.
Deste ponto de vista, uma experimentação bem sucedida CONFIRMA a hipótese.
ARGUMENTO
Segundo os neopositivistas, a confirmação de previsões (casos particulares deduzidos da hipótese) prova a
hipótese, ou seja, confere uma elevada probabilidade à hipótese, uma vez que do ponto de vista material,
uma amostra ampla e representativa, sem contraexemplos, confere validade material (ou racionalidade
indutiva) à conclusão dela derivada.
Assim, se o número de experiências/testes realizadas é suficiente e em nenhum caso ocorreu um
contraexemplo, estamos legitimados em concluir que experiencias/testes futuras continuarão a confirmar a
hipótese.
Neste sentido, os neopositivistas consideram que a experiencia/testes empíricos podem servir de prova, ou
seja, conferem probabilidade à hipótese.

CONCLUSÃO
O INDUTIVISMO defende que as hipóteses científicas devem ser INDUZIDAS a partir da observação e
VALIDADAS pela mesma. Ou seja, a observação é o ponto de partida e o ponto de chegada da investigação
científica:
1) a observação é o ponto de partida - a partir a qual se induz e generaliza a lei
2) a observação é o ponto de chegada - a partir da qual se demonstra/prova a lei

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CRÍTICAS AO INDUTIVISMO E AO VERIFICACIONISMO – Karl Popper
O indutivismo tem sido alvo de várias críticas.
A primeira delas dirige-se à 1ª fase do método – o papel da observação -, a segunda dirige-se à última fase
do método – o valor da experimentação.
1ª critica: A observação não é o ponto de partida
Vários são os cientistas que reconhecem que a hipótese não é tirada da observação. Segundo Popper, não
há observação pura, uma vez que “toda a observação está impregnada de hipóteses”. As observações são
sempre dirigidas e orientadas por uma ideia prévia, face a um determinado problema, ou seja, observamos
para testarmos as nossas hipóteses ou para escolher entre diferentes pontos de vista.
É neste sentido que os cientistas Claude Bernard e Darwin afirmaram, respetivamente:
• “quem não sabe o que procura não entende o que encontra”
• “toda a observação deve ser ou por ou contra algum ponto de vista”

2ª crítica: Não podemos verificar uma hipótese – as leis não são demonstráveis nem provadas
A hipótese nunca é testada diretamente, mas indiretamente através da dedução de previsões que depois são
testadas com o intuito de confirmar a hipótese.
Segundo os verificacionistas/confirmacionistas, a verificação sucessiva das previsões (amostra ampla e
representativa de previsões sem ocorrência de contraexemplos) legitima a validação da hipótese, no sentido
em que o número de verificações demonstra (caso dos radicais) ou confere validade indutiva à Hipótese. Se,
por exemplo, enunciarmos a hipótese que “toda a água ferve a 100ºC”, e se todas as experiências que fizemos
confirmaram que, independentemente do tipo de água que observámos, do lugar onde foi recolhida e do
momento em que foi recolhida, ela ferveu sempre a 100ºC”, então é legitimo afirmar que a experiencia
demonstra/prova a hipótese e que esta é verdadeira.
Assim, de acordo com a perspetiva verificacionista radical/moderada, se a experiência confirmar sempre as
previsões, e não ocorrer nenhum contra-exemplo, podemos concluir racionalmente que a hipótese é
verdadeira e afirmamos que a lei está VERIFICADA/PROVADA pela experiência).
No entanto, Popper considera que o verificacionismo tem um problema lógico. Isto acontece porque na prova
empírica, deduzimos da hipótese um conjunto de previsões e da confirmação destas previsões concluímos a
verdade da hipótese.
H ® P
P
\H
Ora, como sabemos da lógica formal, este raciocínio incorre na FALÁCIA DA AFIRMAÇÃO DO
CONSEQUENTE, uma vez que numa implicação verdadeira, a verdade do consequente não implica a
verdade do antecedente, uma vez que o antecedente tanto pode ser verdadeiro como falso.
P ® Q
F V V
V V V

Assim, aplicando a lógica ao método verificacionista, percebemos que não podemos concluir a verdade de
uma hipótese a partir da verdade da previsão dela deduzida, ou seja, a prova empírica é irracional.

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FALSIFICACIONISMO
I. CRITÉRIO DE DEMARCAÇÃO CIENTÍFICA
Contra o verificacionismo, Popper defende o falsificacionismo/refutacionismo. Segundo este critério, uma
teoria é científica se e somente se é falsificável. Mas o que é que isto quer dizer e que implicações tem este
critério sobre os enunciados. Vejamos.

CONDIÇÕES DE FALSIFICABILIDADE DAS TEORIAS


Popper defende que a falsificabilidade de uma teoria depende de dois fatores: o grau de universalidade da
teoria e o grau de precisão das previsões. Este critério permite excluir da ciência todas as teorias filosóficas,
a astrologia e as teorias que se apresentam como científicas, mas que, na realidade, por serem irrefutáveis,
constituem aquilo que Popper designa de PSEUDOCIÊNCIA. Exemplos de teorias pseudocientíficas são a
teoria psicanalítica de Freud, a teoria económica de Karl Marx, a homeopatia, astrologia, etc.
Assim, o critério de demarcação da ciência é o seguinte:
UMA PROPOSIÇÃO É CIENTÍFICA
SSS
É POSSÍVEL DELA DERIVAR INSTÂNCIAS OBSERVACIONAIS CAPAZES DE A REFUTAR

EXEMPLOS DE HIPÓTESES NÃO CIENTÍFICAS (IRREFUTÁVEIS):


• Deus existe
• O fim do homem é a felicidade
Nestes dois exemplos, acontece que as hipóteses não são refutáveis uma vez que não permitem a
dedução de previsões precisas que as possam refutar.

EXEMPLOS DE PREVISÕES PSEUDOCIENTÍFICAS* (IRREFUTÁVEIS):


• Este ano o céu vai brilhar
• Este ano vai perder um familiar
Estes exemplos são tirados de previsões astrológicas. A versão científica destas previsões poderia ser:
• No dia 14 agosto de 2019, pelas 12h33, ocorrerá o eclipse do sol
• O seu tio tem menos de 12 h de vida

*POR QUE RAZÃO A PSICANÁLISE E A ASTROLOGIA SÃO IRREFUTÁVEIS


Segundo Popper, a psicanálise não é uma ciência porque as previsões são muito vagas. A imprecisão das previsões
traduz-se por afirmações disjuntivas do tipo PÚ~P. Por exemplo, se a teoria previa que a causa de uma certa patologia
era ausência de afeto materno e o paciente dizia que tinha tido muito afeto, o psicanalista para salvar a teoria argumentava
que ausência de afeto materno é tão negativo quanto excesso de afeto materno e que, neste caso, o excesso de afeto
seria a causa da perturbação. Como vemos, neste exemplo, a imprecisão, ou a falta de rigor, das previsões contribui para
a confirmação das mesmas e, nesse sentido, para dificultar a refutação da teoria.

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II. O MÉTODO HIPOTÉTICO DEDUTIVO OU O MÉTODO CRÍTICO DAS
CONJETURAS E REFUTAÇÕES

PROBLEMA 1: Qual o papel da observação na descoberta da hipótese?


TESE: Nenhum: As hipóteses não são induzidas, mas são conjeturas inventadas
As hipóteses não são induzidas a partir da experiência, mas inventadas; elas são palpites ou, como Popper
afirma, Conjeturas, entendo por isto, tentativas de solução dos problemas que o cientista quer resolver.
Contra o indutivismo/empirismo, Popper propõe, na linha dos racionalistas, que o cientista invente as suas
hipóteses, libertando-se do que observou ou do que já sabe.
O método proposto é o MÉTODO HIPOTÉTICO-DEDUTIVO, onde o ponto de partida é o problema, seguido
da hipótese. Designa-se hipotético-dedutivo precisamente para evidenciar a preferência pela invenção e
dedução em detrimento da observação e da indução.
Vejamos as etapas do método:
Método Indutivista Método Hipotético-dedutivo
1. observação 1.problema
2. hipótese 2.hipótese
3. experimentação 3.experimentação
4. verificação da lei 4.corroboração da lei

ARGUMENTO
O argumento de Popper fundamenta-se no facto de não haver observações puras, pois toda a observação é
orientada e condicionada (enviesada) por ideias, pré-hipóteses, ou como o filósofo diz: na ciência, toda a
observação está prenhe da hipótese.
Por outro lado, inventar hipóteses parece ser a forma mais adequada de nos aproximarmos da verdade e o
risco associado à intuição/invenção é eliminado pelo MÉTODO CRÍTICO, ou MÉTODO REFUTACIONISTA, que se
encarrega de deitar por terra as hipóteses erradas.

PROBLEMA 2: Que condições deve preencher uma hipótese científica?


TESE: Uma hipótese científica tem que ser falsificável
Já vimos que as hipóteses são inventadas, mas elas têm que cumprir uma série de condições, se queremos
que elas sejam científicas.
Segundo o critério falsificacionista, uma proposição é científica se e somente se for refutável. Neste sentido,
uma hipótese científica tem que ser FALSIFICÁVEL. Mas o que quer isto dizer?
Popper explica que uma hipótese para ser falsificável tem que ter MUITO CONTEÚDO EMPÍRICO e ter muito
conteúdo empírico implica:
1) Hipótese ser MUITO UNIVERSAL
2) Hipótese permitir a dedução de PREVISÕES COM MUITA ESPECIFICIDADE.
A UNIVERSALIDADE das hipóteses depende do número de objetos que a hipótese cobre: uma hipótese é
tanto mais universal quanto maior é o número de objetos a que se aplica.

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Assim, uma teoria como a de Einstein é mais universal do que a de Newton porque explica o comportamento
de fenómenos na terra e fora da terra, enquanto a teoria de Newton só explica os fenómenos na terra.
A ESPECIFICIDADE das previsões depende do número de EVIDENCIAS EMPÍRICAS (factos) que a previsão
exclui: uma previsão com muita precisão determina com muito rigor os factos que se espera observar,
proibindo um conjunto muito vasto de factos, enquanto uma previsão pouco precisa, determina de forma vaga
as evidencias empíricas esperadas, proibindo poucos factos, ou seja,
PREVISÕES PRECISAS ! PROÍBEM MUITO
PREVISÕES IMPRECISAS ! PROIBEM POUCO.
Por exemplo, se de acordo com a teoria T1, a previsão for que os doentes a quem foram administradas as
novas terapêuticas “melhoram”, esta previsão não é tão precisa quanto a previsão da teoria T2 de acordo
com a qual os doentes a quem foram administradas as novas terapêuticas “verão a febre descer ao fim de 4
horas”. É fácil de perceber que a previsão da teoria T2 proíbe mais do que a previsão da teoria T1. Na teoria
T2, a previsão proíbe contabilizar como evidencia empírica todos os casos em que a febre baixou depois de
4h, enquanto na teoria T1 a previsão permite que se aceite como evidencia empírica todos os casos em que
a febre baixou, independentemente do tempo que demore.
A vantagem das previsões serem especificas é que elas expõem mais a teoria à falsificação do que as
previsões mais vagas pois, como vimos acima, quanto maior for o número de consequências proibidas pela
previsão, mais provável é a sua não confirmação.
Por exemplo: a previsão (a) “uma crise política no Reino Unido tem como consequência a descida do valor
das ações”, é mais específica do que a previsão (b) “uma crise política no Reino Unido tem como
consequência a alteração do valor das ações”, e está mais exposta à refutação.
Assim, concluímos que previsões com muita precisão constituem TESTES SEVEROS capazes de deitar por
terra uma teoria. É isto que Popper defende no texto da Sociedade Aberta quando afirma que a previsão de
Einstein, do eclipse do sol, era tão precisa que, se os acontecimentos não ocorressem conforme a previsão,
a teoria da relatividade seria refutada.

PROBLEMA 3: Qual o papel da observação na validação das hipóteses?


A questão consiste em saber qual a função da experimentação, ou seja, que fim serve a experimentação?.
Esta questão equivale a perguntar se os testes devem ser críticos ou não.
TESE: Os testes são tentativas de refutação de forma a assegurar racionalidade absoluta
Para submeter uma hipótese à prova é necessário fazer TESTES CRUCIAIS, ou seja, testes que procuram
refutar em vez de verificar a hipótese. Para isso há que seguir o critério falsificacionista que obriga a:

• deduzir previsões empiricamente testáveis* (falsificáveis)

• procurar contraexemplos às previsões:


H®P
~P
\~H

*testáveis, para Popper, significa falsificáveis, e para isso trata-se de enunciados com muito conteúdo

empírico, ou seja, muito precisos

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EXEMPLO DE TESTES CRUCIAIS/CRÍTICOS.
Procura de contraexemplos
Ao contrário dos verificacionistas, o cientista falsificacionista em vez de procurar instâncias que confirmem a
hipótese, procura casos que refutem, ou seja, procura mostrar que a contrária (existe pelo menos 1 cisne que
não é branco) é verdadeira.
Assim, para testar a hipótese “Todos os cisnes são brancos”, um falsificacionista iria procurar cisnes não
brancos que contrariassem a teoria, em vez de procurar cisnes brancos, uma vez que por mais cisnes brancos
que se observem, nunca nenhum número será suficiente para demonstrar a verdade da proposição.
Um exemplo mais interessante é o da previsão de Einstein relativamente à deflexão da luz. Segundo a teoria
de Newton, a curvatura da luz das estrelas devia ser de 0,86 segundo de arco. Desafiando a teoria
newtoniana, Einstein concebeu uma hipótese que fazia prever uma deflexão da luz completamente diferente:
em vez dos 0,86 segundo de arco, ele previu um desvio de 1,75. Este teste era “crítico” no sentido em que se
a previsão falhasse, a hipótese seria refutada sem qualquer possibilidade de salvação. Ou seja, a
experimentação não deveria deixar margem para dúvidas de forma a garantir o caráter crítico da mesma.
Este tipo de teste constitui aquilo que Popper chama teste CRUCIAL ou SEVERO
NOTA: Apesar de Popper defender os testes cruciais, ele admite a possibilidade de uma hipótese, quando confrontada
com um contraexemplo, poder ser revista antes de ser rejeitada como falsa. Contudo esta revisão tem um preço, que
consiste no facto da teoria se tornar menos científica, porque menos refutável.

PROBLEMA 4: Qual o contributo da experimentação/testes na validação das hipóteses?


Tese: Os testes refutam mas não provam.
Caso as previsões não se confirmem, conclui-se a falsidade da hipótese e esta fica REFUTADA.
Caso as previsões se confirmem, não se pode concluir logicamente a verdade da hipótese, uma vez que essa
conclusão incorreria na falácia da afirmação do consequente. Aquilo que se deve concluir é que a hipótese
foi CORROBORADA, entendendo-se por isso, que ela é uma hipótese muito RESISTENTE. Efetivamente,
uma hipótese que se submeteu a testes severos de falsificação, e que não foi refutada, é mais resistente do
que uma hipótese que se submeteu a testes onde só se procuraram instancias positivas que pudessem
verificar a teoria.
Popper considera, contudo, que uma hipótese resistente, ou seja, corroborada pelos factos, continua
falsificável e é por essa razão que ele defende que todas as teorias (leis) são CONJETURAS.
Por esta razão Popper defende que a experimentação é assimétrica, uma vez que ela DEMONSTRA A
FALSIDADE, MAS NÃO PROVA A VERDADE. Efetivamente, basta uma previsão não se confirmar para
demonstrar que a hipótese é falsa, mas por mais previsões que se confirmem, elas nunca serão suficientes
para demonstrar a verdade da hipótese.
ARGUMENTO
O argumento a favor do método falsificacionista é lógico, uma vez que defende o uso exclusivo da razão, ou
seja, da dedução. Efetivamente, o falsificacionismo consegue eliminar a indução uma vez que a única
conclusão que se está autorizado a retirar da experiência é inteiramente lógica: a hipótese é falsa se a
previsão falhar, mas nunca será verdadeira mesmo que os factos não a desmintam.
A vantagem deste método é que consegue racionalidade absoluta (formal) e está em conformidade com a
atitude crítica própria da ciência, demarcando-se das pseudociências.

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CRÍTICAS AO FALSIFICACIONISMO
O falsificacionismo é contraintuitivo
Esta crítica fundamenta-se no facto da teoria falsificacionista não corresponder à intuição geral das pessoas.
Se nenhuma evidência refuta uma teoria, o que é natural concluir é que a teoria está provada, e não que a
teoria resistiu à tentativa de refutação. Do mesmo, quando uma pessoa aposta num cavalo e este vence a
prova, ninguém conclui à maneira refutacionista e diz que o cavalo não perdeu.

O falsificacionismo pode ser contraproducente


Esta crítica chama à atenção para os perigos de concluir precipitadamente a falsidade de uma teoria com
base na refutação de previsões deduzidas da teoria, dado que estas podem ser mal deduzidas.
EXEMPLO: Quando Copérnico propôs a teoria heliocêntrica, os seus opositores, na tentativa de refutarem a
teoria, afirmaram que esta implicava (1) a paralaxe das estrelas ao longo do ano e (2) a queda oblíqua dos
objetos a partir de uma torre. Apesar destas previsões não se confirmarem, a teoria não foi posta de lado, o
que foi bom, pois efetivamente só mais tarde se percebeu que a teoria não implicava efetivamente estes
factos.

O falsificacionismo não descreve aquilo que os cientistas fazem, mas aquilo que seria desejável
Esta crítica fundamenta-se na observação da prática científica. Aquilo que a prática científica nos mostra é
que os cientistas mais facilmente ignoram casos que contrariam uma teoria do que sacrificam teorias que
funcionaram e funcionam bem. Claro que se um contraexemplo é descoberto, os cientistas não o ignoram
logo de início, mas tudo farão para encontrar uma justificação de forma salvar a teoria.
Por sua vez, a observação no início da investigação tem muito mais valor do que aquele que Popper lhe
atribui, porque contribui para a descoberta de problemas e para a formulação de hipóteses.

O falsificacionismo não é uma teoria científica.


Esta crítica defende que a teoria falsificacionista, não tem valor científico uma vez que não é refutável. Neste
sentido tem apenas valor filosófico.

CONCLUSÃO
É verdade que o falsificacionismo é contraintuitivo e não representa aquilo que muitos cientistas fazem,
contudo percebemos que o critério refutacionista contribui para conferir RACIONALIDADE CRÍTICA à ciência
e DEMARCAR A CIÊNCIA DA PSEUDOCIENCIA. Assim, e em defesa do falsificacionismo, concluímos que
esta teoria da ciência funciona como um ideal de ação, um ideal regulador da ciência, na busca e aproximação
da verdade.

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