Resumo do Texto: Processo de ensino-aprendizagem como processo de
transmissão cultural intergeracional
O Processo de Ensino e Aprendizagem (PEA) envolve simultaneamente os
atores envolvidos realizando assim, o Processo de Transmissão Cultural Intergeracional (PCTI). Esses dois processos, por sua vez, são inseparáveis, assim como seus sujeitos, professor e aluno enquanto agentes. O PEA atua por mediatização, que diz da dinâmica interativa de promoção de funções cognitivas em seres aprendentes. A cognição é, ao mesmo tempo, da estrutura biológica do ser humano e mecanismo social que nasce da interação dos indivíduos. O processo evolutivo humano com a bipedia e a bimania, levou-o a maior encefalização e complexidade neurofuncional. Com o tempo, o homo sapiens passou a desenvolver ferramentas cada vez mais complexas concomitantemente às formas de organização social e comunicação. Assim, o PEA é o substrato da transmissão cultural, do homem que aprende, cria e ensina às gerações posteriores suas técnicas e conhecimentos. Essa transmissão interativa e intersubjetiva faz emergir funções cognitivas peculiares a ele como: ● Atenção; ● Percepção; ● Memória; ● Lógica; ● Planificação; ● Resolução de problemas; ● autorregulação. Infere-se portanto, que na perspectiva antropológica a mediatização emerge de uma adaptação evolucionista imprescindível, a capacidade de coordenar comportamentos sociais mútuos em situações diversas. Assim, a espécie humana nasce preparada para adquirir conhecimentos por meio da mediatização. O ser humano é o animal vertebrado com a infância mais prolongada. Para tornar-se independente necessita aprender várias coisas de seus pares mais velhos para, só assim, poderem acrescentar algo inovador. Nesse viés, a mediatização é uma exaptação dos humanos, que surgiu de suas habilidades internacionais, intersubjetivas e socioculturais. Somente no homo sapiens encontra-se a possibilidade de aprendizagem, ou seja, a aptidão para a cultura. A cognição se integra e desenvolve-se precocemente na criança, que se integra e automatiza. Essa tem por base a transmissão social e a cognição individual. É, primeiramente, social e interpessoal e depois que se internaliza, intrapessoal. A cognição social é condição necessária para o pleno desenvolvimento das crianças e adolescentes, sem a qual, esses não se tornariam mais reflexivos, autorregulados, nem capazes de apreender perspectivas simultâneas sobre um mesmo conhecimento, separar objetos em categorias e hierarquias, ou internalizar aprendizagens e comportamentos. A mediatização é uma competência adaptativa própria do homo sapiens, surgiu há 250 mil anos. Esse mecanismo bio-cognitivo sediado no cérebro, insere-se na herança sociocultural e constitui a sociogênese. Embora outras espécies possam aprender algo, apenas o homo sapiens pode ensinar. A cultura é o conjunto de tradições produzidas pelo grupo, que é transmitida dos mais velhos aos mais novos. Essa transmissão cultural é a matriz do PEA e emerge da sociogênese. Compõe-se de pequenas unidades, peças e componentes. A mediatização é prolongada e diligente. Os seres mais experientes apresentam aos jovens seu mundo, e isso só é possível pela capacidade de perceber e interpretar as intenções dos outros. Esse processo Intergeracional é uma característica fundamental da evolução humana. O PEA só é possível pela concepção que os homens têm de seus semelhantes, nesse contexto, o "outro" é interpretado como alguém que possui uma vida mental idêntica à do "eu". Assim, a aprendizagem é concebida através do outro. Isto constitui o segredo e o mistério do processo evolutivo humano, compreender o outro como um agente intencional e portador de consciência, e assim, com ele aprende, dele e através dele aprender. A construção mútua dos sujeitos está na raiz da sociogênese. Há três dimensões temporais da cognição humana. Os seres humanos possuem competências cognitivas que resultam de uma herança biológica em um tempo filogenético, aprendem e apropriam-se da herança sociocultural no tempo sociogenético e realizam o desenvolvimento cognitivo individual num tempo ontogenético. Algumas capacidades do homo sapiens como prospectar a longo prazo e pesquisar o futuro estão ligadas à expansão cerebral funções pré-frontais com as funções executivas: atenção planificação, regulação, autocontrole, inibição, manutenção, organização, priorização, monitorização, planificação, pensar no agir, pensar no pensar (metacognição). Há um novo patamar cognitivo na espécie, a partir do ganho de capacidades de se perceber como ser casual e intencional. A evolução depende da cognição da ação e não somente da ação, competências transmitidas pela mediatização. Habilidades metacognitivas de autorregulação, perguntas feitas a si mesmo, auto-avaliação e autocorreção são condições para a aprendizagem bem sucedida. A aprendizagem social é responsável pelo aparecimento de novas capacidades cognitivas. Nesse aspecto, Tomasello (1999) identifica alguns mecanismos: ● Exposição e observação de modelos sociais - o inexperiente é exposto à proximidade com o experiente, e o tem por modelo. ● Expansão e prolongamento dos estímulos – se dá por processos e estratégias interativas introduzidas pelos experientes, para que os inexperientes são atraídos ● Mimetização – reprodução e cópia (presença de neurônios-espelho sustentam a Teoria da Mente) ● Imitação - os inexperientes reproduzem e propagam os comportamentos e concomitantes estratégias dos experientes. Esses mecanismos se integram sistematicamente na espécie humana e se espalham. Para a incorporação da criança no mundo social é necessária a mediação de um adulto. Geralmente a mãe introduz a prole em comportamentos e formas de comunicação que a integram no seu grupo social. A postura bípede reduziu o tempo de gestação do ser humano, o que torna o bebê completamente suscetível e dependente de cuidados, essa situação favorece a emergência da mediatização. A descoberta de si próprio e do mundo no ser humano, é resultado da interação com o outro que é mediatizadora. No bebê humano a capacidade de aprender reside na dialética entre processos neuronais e sociais. À medida que cresce, a criança percebe-se como ser intencional e assim a seus semelhantes. Esse é o paradigma da sociogênese. Na ontogênese a criança percebe-se como um agente mental, com movimentos, sentimentos, pensamentos e capacidades cognitivas próprias. A aprendizagem humana decorre da união de instrumentos fora do corpo (práxis) a símbolos dentro do cérebro (linguagem), mediatizados por pessoas mais experientes. Esses mecanismos influenciaram complexas dinâmicas genéticas, neurológicas e de seleção natural no homo sapiens.
Glossário
Filogênese: aquisições realizadas na história da espécie, suas possibilidades e
limites adquiridos através do tempo (evolução);
Microgênese; história de vida peculiar de um sujeito em específico com suas
particularidades adquiridas frente aos fatos em combinação com as reações que tem a eles.
Ontogênese: refere-se ao desenvolvimento de um ser específico da espécie a partir
de sua constituição e programação biológica;
Sociogênese: plano com origem na história da cultura na qual o sujeito está imerso e que influencia massivamente sua aprendizagem;