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Agrupamento de Escolas

Dr. Mário Fonseca

2023-2024

Português 12.º ano - Avaliação sumativa

Parte A
Não sei ser triste a valer
Nem ser alegre deveras.
Acreditem: não sei ser.
Serão as almas sinceras
5 Assim também, sem saber?

Ah, ante a ficção da alma


E a mentira da emoção
Com que prazer me dá calma
Ver uma flor sem razão
10 Florir sem ter coração!1

Mas enfim não há diferença.


Se a flor flore sem querer,
Sem querer a gente pensa.
O que nela é florescer
15 Em nós é ter consciência.

Depois, a nós como a ela,


Quando o Fado os faz passar,
Surgem as patas dos deuses
E a ambos nos vêm calcar.

20 ‘Stá bem, enquanto não vêm,


Vamos florir ou pensar.

PESSOA, Fernando, 2008. Poesia do Eu.


2.ª ed. Lisboa: Assírio & Alvim (pp. 241-242)

1. Variantes do verso, noutras edições: «Dispensar o coração!»


ou «Ser minha sem coração!».

1 Explicita o significado dos três primeiros versos, tendo em conta a globalidade do poema.

2 Considerando a tensão sentir/pensar, comenta a relação entre a «flor» e a «gente»


estabelecidas nas segunda e terceira estrofes.

3 Demonstra a relevância do dístico final do poema, enquanto conclusão das reflexões do sujeito
poético.
Parte B

XXXIV

Acho tão natural que não se pense


Que me ponho a rir às vezes, sozinho,
Não sei bem de quê, mas é de qualquer coisa
Que tem que ver com haver gente que pensa…

5 Que pensará o meu muro da minha sombra?


Pergunto-me às vezes isto até dar por mim
A perguntar-me coisas…
E então desagrado-me, e incomodo-me
Como se desse por mim com um pé dormente…

10 Que pensará isto de aquilo?


Nada pensa nada.
Terá a terra consciência das pedras e plantas que
tem?
Se ela a tiver, que a tenha…
15 Que me importa isso a mim?
Se eu pensasse nessas coisas,
Deixaria de ver as árvores e as plantas
E deixava de ver a Terra,
Para ver só os meus pensamentos…
20 Entristecia e ficava às escuras.
E assim, sem pensar, tenho a Terra e o Céu.

Fernando Pessoa, Poesia de Alberto Caeiro, Fernando Cabral Martins


(Dir.), Lisboa: Assírio & Alvim, 2014, p. 117.

4 Clarifica o sentido dos versos 8 e 9, tendo em conta o contexto em que ocorrem.

5 Explicita o valor das interrogações retóricas utilizadas na última estrofe, relacionando-as com o
sentido do último verso, enquanto conclusão do poema.

6 Completa as afirmações seguintes, selecionando a opção adequada a cada espaço.


Regista as letras – (a), (b) e (c) – e, para cada uma delas, o número que corresponde à opção
selecionada em cada um dos casos.

Neste poema de Alberto Caeiro, são percetíveis várias características da escrita deste
heterónimo pessoano. De facto, o discurso poético pauta-se pelo uso de um tom (a) ,
recriando uma linguagem (b) de artifícios, que se harmoniza com a (c)
comunicativa das ideias apresentadas.

(a) (b) (c)


1. solene 1. despojada 1. complexidade
2. formal 2. repleta 2. ambiguidade
3. coloquial 3. dependente 3. simplicidade

Parte C

7
O apreço pela vida do campo é uma característica que aproxima Caeiro de Cesário Verde. Para
este último é a alternativa saudável à vida na cidade.
Escreve uma breve exposição sobre a forma como Cesário Verde perspetiva a cidade.
A tua exposição deve incluir:
– uma introdução ao tema;
– um desenvolvimento no qual explicites a posição do sujeito poético relativamente à cidade,
fundamentando a tua apresentação com, pelo menos, dois exemplos significativos;
– uma conclusão adequada ao desenvolvimento do tema.

7
Nos poemas ortónimos de Fernando Pessoa, o «eu» revela-se incapaz de conciliar opostos.
Escreve uma breve exposição sobre a tensão sentir/pensar na poesia ortónima de Fernando
Pessoa.
A tua exposição deve incluir:
– uma introdução ao tema;
– um desenvolvimento no qual explicites a dicotomia sentir/pensar na poesia ortónima,
fundamentando as características apresentadas com, pelo menos, dois exemplos significativos;
– uma conclusão adequada ao desenvolvimento do tema.

Grupo II

A vida quotidiana
Valoriza-se pouco a vida quotidiana. Sentimo-nos aprisionados pelas rotinas, num rame-rame
monocórdico capaz de nos fazer hibernar a nós e ao universo. Ou vemo-nos então num vórtice
ofegante de tarefas para as quais só temos esforço, aceleração e cansaço, e não respostas.
O quotidiano muitas vezes se parece a um campo fechado, a uma arena baça onde travamos, a
5 custo, a luta pela sobrevivência (e apenas essa), no meio dos obstáculos e contrastes que o tempo
(esse lutador mais exímio do que nós) nos vai lançando. «Quando penso no quotidiano, o infinito
parece-me uma coisa mais distante» – confidenciou-me, um dia, uma amiga. E ela queixava-se de
como o dia a dia pode ser disfuncional, ensurdecedor, áspero e dissonante; de como, sendo nossa, a
existência diária também nos despersonaliza e torna maquinais mesmo aqueles gestos onde
1 quereríamos tanto estar inteiros. É comum ouvir testemunhos desta dilaceração, como se
0 estivéssemos condenados a descobrir o quotidiano como um domicílio afinal estranho e equívoco,
uma porta familiar que nos resiste, e que as nossas chaves abrirão sempre com maior dificuldade.
Ou, pior ainda, quando dos nossos quotidianos passamos a anotar, com ressentimento, só o
cinzentismo uniforme e nervoso, o pulsar descontente, a energia medíocre e incompleta, o que nos
parece ser a sua insuportável banalidade, o seu embotamento penoso, uma gaguez não de palavras,
1 mas de entusiasmo e de amor.
5 E, contudo, sem desmentir esta exigência que é também real, sem negar o seu peso que
amiúde nos vence, precisamos de nos reconciliar com o quotidiano. Pois, na sua forma
vulnerável e até contraditória, ele é o lugar das aprendizagens mais amplas, dos encontros
mais decisivos, das experiências mais profundas e iluminantes. A vida, se olharmos bem, não
é igual todos os dias. Os dias, se os abraçarmos bem, não são uma antologia de momentos
2 opacos e quebradiços. Os instantes não são lampejos ocasionais sem sentido, nos quais não
0 devemos confiar. O quotidiano é o barco e a viagem. É o barro e a obra a construir. É o
espelho turvo, de que São Paulo fala no célebre hino da Carta aos Coríntios, mas é também o
lugar onde a promessa da visão nítida se tateia. Por isso, em vez de sonolência, ele pede-nos
que abramos verdadeiramente os olhos. Em vez de indiferença e recusa, ele espera de nós
empenho, fidelidade e esperança.
2
MENDONÇA, José Tolentino, 2019. «A vida quotidiana». E (Expresso), n.º 2452, 26 de outubro de 2019 (p. 92)
5

1 De acordo com o primeiro parágrafo do texto, o «tempo» surge como


(A) elemento que contribui para a imutabilidade do quotidiano.
(B) responsável pela monotonia da vida quotidiana.
(C) dimensão que acentua o descontentamento face à monotonia.
(D) promotor dos entraves do quotidiano.

2 Na linha 7, através da referência à confidência de uma «amiga», o autor


(A) exemplifica a opinião mais frequente relativamente ao infinito.
(B) realça o entusiasmo humano no que respeita ao quotidiano.
(C) ilustra uma perceção frequentemente partilhada.
(D) elogia o pragmatismo feminino.

3 O segundo parágrafo do texto


(A) reitera algumas das ideias apresentadas no primeiro parágrafo.
(B) corrobora, apenas, a perspetiva transmitida no primeiro parágrafo.
(C) refuta, perentoriamente, o conteúdo do primeiro parágrafo.
(D) rebate a globalidade das ideias apresentadas no parágrafo anterior.

4 No contexto em que ocorre, a expressão «É o espelho turvo [...] mas é também o


lugar onde a promessa da visão nítida se tateia.» (ll. 23-25) constitui
(A) uma antítese associada às possibilidades proporcionadas pelo quotidiano.
(B) uma metáfora associada à importância da transparência.
(C) uma hipérbole associada à ideia de entorpecimento humano.
(D) uma metonímia associada à complexidade do quotidiano.
5 O enunciado «precisamos de nos reconciliar com o quotidiano» (l. 18) apresenta
(A) modalidade apreciativa.
(B) modalidade deôntica com valor de obrigação.
(C) modalidade epistémica com valor de certeza.
(D) modalidade epistémica com valor de possibilidade.

6 Identifica a função sintática desempenhada por:


a) «pela sobrevivência» (l. 5);
b) «no quotidiano» (l. 6).

7 Classifica a oração «que abramos verdadeiramente os olhos» (ll. 25-26) os olhos» e


refere a função sintática que desempenha.

Grupo III

Num texto de opinião bem estruturado, com um mínimo de duzentas e um máximo de trezentas
e cinquenta palavras, defende uma perspetiva pessoal sobre o impacto do progresso técnico na
qualidade de vida do ser humano no futuro.

No teu texto:
– explicita, de forma clara e pertinente, o teu ponto de vista, fundamentando-o em dois
argumentos, cada um deles ilustrado com um exemplo significativo;
– utilize um discurso valorativo (juízo de valor explícito ou implícito).

Observações:
Para efeitos de contagem, considera-se uma palavra qualquer sequência delimitada por espaços em
branco, mesmo quando esta integre elementos ligados por hífen (ex.: /dir-se-ia/).
Qualquer número conta como uma única palavra, independentemente do número de algarismos que o
constituam (ex.: /2018/).
Relativamente ao desvio dos limites de extensão indicados – entre duzentas e trezentas e cinquenta
palavras –, há que atender ao seguinte:
− um desvio dos limites de extensão indicados implica uma desvalorização parcial (até 5 pontos) do
texto produzido;
− um texto com extensão inferior a oitenta palavras é classificado com zero pontos

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