Você está na página 1de 9

Políticas e Programas de Privatização Educativa em Moçambique

Estudante: 706230510 - Pedro Vasco Lúcas


Email: pedrovasco197@gmail.com
Prof. Doutor Gaspar Lourenço Tocoloa

RESUMO:

Este artigo busca caracterizar as formas pelas quais, a partir da década 90, a privatização da educação básica vem
se materializa em Moçambique. Adopta-se o termo privatização, no lugar de mercantilização, parceria público-
privada, comoditização entre outros, por se entender que o mesmo abarca, mais precisamente, os processos aqui
analisados. Estes se referem às medidas que têm subordinado, directa e indirectamente, a educação obrigatória
aos interesses de corporações ou de organizações a estas associadas. O estudo pretende fornecer um melhor
entendimento das relações internacionais de poder no âmbito da privatização da educação em Moçambique. O
estudo parte de um amplo conceitual teórico para abordar, na actualidade, um actor relevante no cenário das
políticas educacionais globais e que influência directamente políticas educativas nacionais, sendo ainda pouco
conhecida e estudada em Moçambique. O trabalho partiu da leitura dos planos sectoriais da Educação ou dos
documentos transitórios submetidos à Parceria Global para a Educação quando da solicitação de apoio financeiro
ao fundo pelo governo de Moçambique.

Palavras-chave: Politicas, Privatização, Educação

ABSTRACT:

This article seeks to characterize the ways in which, from the 90s onwards, the privatization of basic education has
materialized in Mozambique. The term privatization is adopted, instead of commodification, public-private
partnership, commoditization, among others, as it is understood that it encompasses, more precisely, the
processes analyzed here. These refer to measures that have subordinated, directly and indirectly, compulsory
education to the interests of corporations or organizations associated with them. The study aims to provide a
better understanding of international power relations within the scope of the privatization of education in
Mozambique. The study starts from a broad theoretical concept to address, at present, a relevant actor in the
scenario of global educational policies and which directly influences national educational policies, which is still little
known and studied in Mozambique. The work started from reading the Education sector plans or transitional
documents submitted to the Global Partnership for Education when requesting financial support for the fund by
the government of Mozambique.

Keywords: Policies, Privatization, Education

INTRODUÇÃO
Moçambique é um país cuja independência aconteceu em 1975, quando o Estado português decidiu
reconhecer o direito à autodeterminação dos moçambicanos. Para que tal acontecesse, o povo
moçambicano rebelou-se e organizou uma luta armada de libertação nacional. Mas antes do início da
luta, em 1962, os moçambicanos criaram a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), movimento
político armado que conduziu com sucesso a guerra pela independência. Quando o país ficou
independente, os novos gestores do povo e do território moçambicano herdaram um pesado fardo:
elevada taxa de analfabetismo, estimada em cerca de 90%; carência de infra-estruturas; sistema de
saúde precário, no qual o meio rural tinha grande desvantagem; carência de quadros e de técnicos a
todos os níveis e em todos os sectores importantes da economia.

Para a redução desta elevada taxa de analfabetismo, foram levadas a cabo duas estratégias
fundamentais, nomeadamente a massificação do ensino primário e as campanhas de alfabetização e
educação de adultos a partir do ano de 1978. A FRELIMO, apesar da euforia da vitória sobre o
colonialismo, tinha já consciência de que o desenvolvimento futuro do país recém-nascido exigiria a
introdução duma política social capaz de acelerar a educação e erradicar o analfabetismo.

Ao longo da história de Moçambique existiram propostas diferentes em relação aos contornos e rumos
que a educação deveria tomar no novo país independente. Os diferentes posicionamentos foram
evidentemente acompanhados pela adopção de políticas educativas e pelas suas estratégias de
implementação

JUSTIFICATIVA

Pretende-se com esse trabalho analisar as políticas educacionais contemporâneas moçambicanas.


Considera-se que o sistema educativo formal tem a dupla função de, por um lado, transmitir ou facilitar
a aquisição de conteúdos, valores e condutas, e, por outro, certificar perante a sociedade que o
indivíduo, depois de convenientemente avaliado, atingiu certo nível educativo.

O poder político moçambicano, através dos seus textos legais, procura assegurar a todos o direito à
educação, mas o que se observa é um descalabro total no que tange ao cumprimento destes preceitos
legais, que vai desde a omissão pura e simples até a ignorância de questões fundamentais como por
exemplo: falta de meios didácticos e carteiras nas escolas para todos, o incumprimento dos objectivos
traçados nas suas políticas educativas criadas desde o Plano Estratégico de 1999-2005, escassez de
vagas para os alunos, optando por superlotar as turmas, péssimas condições de trabalho, excessiva
burocratização na mudança de carreiras dos seus profissionais, conflituosa formação dos professores
entre o Ministério de Educação e as instituições de formação dos professores, que resulta na
insuficiência e fraca qualidade dos mesmos, entre outros.

Apesar dos esforços do novo governo pós-independência, cuja intenção visou reverter o cenário da
educação herdada do regime colonial, factores adversos - entre eles, o tamanho e o ritmo de
crescimento da população em idade escolar, a crise e a depressão da década 80, bem como a guerra civil
de 1976-1992, entre o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e a Resistência
Nacional de Moçambique (RENAMO) - fizeram com que até a fase actual as políticas públicas no sector
de educação em Moçambique dependessem em grande.

ESTRUTURA DO ARTIGO

O artigo está estruturado da seguinte maneira: Resumo, onde é apresentado o tema do artigo e sua
contextualização, introdução, justificativa, desenvolvimento e a conclusão onde apresenta-se a síntese e
por fim referências bibliográficas.

REVISÃO DA LITERATURA
PRIVATIZAÇÃO DE ENSINO
Na concepção de Beltrão e Tafarell (2017), os processos privatizantes estão inseridos na ideologia do
capital para submeter os objectivos das escolas aos seus interesses económicos, pedagógicos,
ideológicos etc.
O termo "privatização" é urna designação genérica de vários programas e políticas educativas que
podem ser globalmente definidos como "a transferencia de actividades, provisão e responsabilidades do
governo/instituições e organizações públicas para individuos e organizações privadas". Muitas vezes a
privatização é vista como urna "liberalização" quando os agentes säo libertados das regulações
governamentais e urna "mercantilização" - quando são criados novos mercados que proporcionam
alternativas aos serviços do governo ou aos sistemas de distribuição estatal. (Belfield & Levin, 2002).

Segundo Freitas (2016, p. 141) apud Moreira & Souza, (2020), a privatização é a destinação final das
políticas dos reformadores empresariais, pois advém da crença de que a melhoria da qualidade
educacional se dá pela concorrência em mercado aberto, tal como no interior dos negócios. O mercado
depuraria as instituições de menor qualidade, mantendo apenas as de maior qualidade. Para entender o
desenvolvimento da privatização é necessário, no entanto, entender como a lógica da
responsabilização/meritocracia produz as razões da privatização.

Verger, (2019), para os reformadores empresariais e os adeptos da privatização, as escolas públicas têm
muito para aprender com as escolas privadas, sendo necessário que as políticas educacionais sejam
adaptadas para que todos os sistemas possam trabalhar nessa perspectiva, ou seja, na busca por
resultados.

A qualidade da educação evidenciada e defendida pelos adeptos do sector privado é a ênfase sobre a
política de resultados, reflectida nas avaliações em larga escala. Estas são avaliações que têm a
característica de padronizar as escolas e as redes de ensino, objectivando que todas tenham condições
de realizar as provas com autonomia e significativo grau de compreensão (Freitas, 2014) apud Moreira &
Souza, (2020). A forma que o Ministério da Educação (MEC) divulga esses resultados é vista como
desigual, uma vez que as avaliações não valorizam a realidade local de cada escola, assim como a região
na qual o município, a escola e os alunos estão situados.

Adaptado de Silva (2018), as cinco principais categorias que se referem a privatização da educação são:

1. Valorização da iniciativa privada;


2. Uso do sector privado encorajado;
3. Direito de escolha;
4. Evocação da educação como serviço público de gestão privada; e
5. Diminuição da interferência do Estado. Pode-se dizer, que a privatização de facto é um processo
aparentemente não relacionado com as políticas públicas, que ocorre por iniciativa dos pais, das
comunidades e da sociedade civil, independentemente das políticas promovidas pelos Estados.
Por outro lado, a privatização por panejamento ocorre quando as autoridades públicas
promovem, de maneira proactiva, a privatização da educação e implementam medidas
explícitas para a promover, como, por exemplo, parcerias público-privadas e vouchers.

A tendência para a privatização é muito forte, ocorrendo em vários países e sectores da economia. O
sector da educação, constituindo um dos maiores fardos orçamentais do governo, é muitas vezes
pressionado para ser privatizado, surgindo essa pressão de variadas formas. Por exemplo, a educação
pode ser privatizada se: a) os alunos se inscreverem em escolas privadas, ou b) se o Ensino Superior for
pago com fundos privados.

No primeiro caso, a escolarização deixa de ser fornecida pelo Estado, no segundo, o governo deixa de
financiar a educação através dos impostos ou de empréstimos. Deste modo, os pais dos alunos que
frequentam escolas privadas podem fazer pressão para a privatização, tal como os contribuintes que
sustentam o Ensino Superior. Simplificadamente, a privatização pode apresentar-se de três formas.
IMPLEMENTAR PROGRAMAS DE PRIVATIZAÇÃO
Em termos gerais, há várias oportunidades para privatizar o fornecimento, financiamento e
monitorização dos serviços educativos. De facto, estudos internacionais demonstram que muitos países
puseram em prática algum tipo de privatização (Patrinos, 2000) apud (Belfield & Levin, 2002).

Por exemplo, foram experimentados sistemas semelhantes de subsídios a alunos para frequentarem
escolas privadas, no Brasil, no Botswana, na China, no Gana, na Índia, nas ilhas Maurícias e na Tanzânia.
São atribuídas bolsas de estudos em escolas privadas no Bangladesh, no Brasil, na China, na Colômbia,
na Gâmbia, Guatemala, Indonésia, México, Marrocos, Moçambique, Senegal e Tanzânia.

Estes países, de todos os continentes, têm sistemas de educação e mercados de trabalho muito
diferentes, mas o recurso a estes programas sugere que a privatização do ensino – pelo menos através
de pequenas medidas e não de urna reorganização geral - é urna hipótese praticável (West, 1997). Há
ainda muitas experiencias em diversos países em diferentes fases do processo de privatização a partir
das quais se podem tirar conclusões gerais.

Os panificadores e responsáveis educativos deverão decidir quais as reformas apropriadas e que teriam
maior impacto na melhoria da qualidade dos serviços educativos, distribuindo os recursos de forma
equilibrada a fim de responder as necessidades sociais.

Na óptica de Belfield & Levin, (2002), a privatização da educação pode parecer um esforço para reduzir
as desigualdades do ensino público. Em países, as famílias mais abastadas podem escolher a escola, quer
comprando urna casa na zona escolar que lhes interessa quer enveredando pelo sistema privado de
ensino ou mesmo exercendo a sua pressão política para evitar que os seus filhos sejam obrigados a
frequentar escolas problemáticas de baixa qualidade.

A ASCENDÊNCIA FINANCEIRA E A PRIVATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO


Moreira & Souza, (2020), a política de privatização da educação pública, por meio da compra de sistemas
de ensino de grupos educacionais privados, não pode ser entendida de forma singular e nem como algo
que afecta apenas as escolas de educação básica e os professores. Pelo contrário, um olhar na
perspectiva da historicidade dos factos indica-nos que se trata de algo já sólido nas relações sociais.

O modo de produzir a vida na contemporaneidade está constituído pelo “[...] drama ambiental, a
tragédia social e o caos financeiro” (Dowbor, 2017, p.36). A administração do planeta favorece uma
minoria e os recursos necessários para financiar políticas sociais estão “[...] nas mãos de algumas
centenas de grupos que sequer conseguem administrar, com um mínimo de competência, as massas de
dinheiro que a controlam” (Dowbor, 2017, p.36).

Em meio a este cenário o desafio actual tem sido reorientar os recursos para financiaras políticas sociais
destinadas a gerar uma economia inclusiva (Dowbor, 2017). Contudo, o modo de produção capitalista se
manifesta de forma irracional, possui a capacidade exponencial de produzir mercadorias, conhecimento,
concentrar riqueza e a incapacidade de partilhar a produção de bens para o atendimento às
necessidades básicas humanas. Nesse meio temos o domínio do capital financeiro especulativo4 que
nada produz, mas que assalta a capacidade da actividade produtiva.

Dowbor (2017, p.32) alega que as dificuldades actuais que diversos países passam não provêm da falta
de recursos financeiros, mas deve-se pela apropriação por corporações financeiras que os usam para
especular em vez de investir. “O sistema financeiro passou a usar e drenar o sistema produtivo, em vez
de dinamizá-lo”.Acrisede2008temseusimpactos até o actual momento (2019), esta começou a ser
enfrentada pelas grandes transferências de recursos públicos ao sector privado. Para manter este
sistema de acumulação de papéis financeiros (especulação).

[...] produziu-se paulatinamente a anulação do poder político dos Estados


nacionais, transferindo o verdadeiro governo do mundo para os grandes grupos
económicos, hegemonizados pelo capital financeiro, e pelos organismos
internacionais que o os representam, mormente a Organização Mundial do
Comércio e o Banco Mundial. (Frigotto, 2017, p. 19).
A fase do capitalismo financeiro formou uma rede mundial de controlo corporativo, na qual funciona
para 1% da população, mas não para o restante do planeta. As aplicações financeiras rendem acima de
5%, enquanto o PIB mundial cresce entre 1% e 2,5% o ano (Dowbor, 2017).

Neste cenário de financeirização de riquezas e serviços nota-se a problemática


da privatização e da desvalorização do sector público, sendo possível observar
uma crescente lógica mercantil no campo educacional. Este campo no Brasil
sempre foi marcado por interesses diversos e contraditórios na história do país.
É na década 80 que a educação passa a ser uma questão nacional, porém é no
debate da nossa primeira LDB que se intensifica a correlação de forças entre o
público e o privado (Saviani, 2001).
Em sua história Moçambique produziu uma sociedade desigual e violenta, ancorada na colonização e no
sistema escravocrata, no qual o colono associou-se de forma subordinada aos centros hegemônicos do
capital, não construiu uma nação autónoma e não garantiu os direitos básicos à população. Nessa
acepção, o colono é considerada por Frigotto (2017) como antipovo, antinação e antidireito universal a
qualquer sector, inclusive à escola pública de qualidade.

A PRIVATIZAÇÃO DE ENSINO NO CONTEXTO MOÇAMBICANO


O presente artigo pretende analisar e reflectir sobre as principais tendências no âmbito da privatização
da educação em Moçambique. A análise e os debates sobre a privatização do ensino despertam em
alguns países sobretudo Moçambique, actualmente, cada vez maior interesse por parte dos especialistas
e responsáveis da educação. As razoes que justificam a reatualização deste antigo debate educativo
estão estritamente associadas aos processos de reforma do Estado que têm lugar tanto nos países
desenvolvidos como nos países em desenvolvimento.

Neste contexto, é possível observar modificação significativa nos termos tradicionais com os quais se
analisou o tema do ensino privado. Como se sabe, o debate tradicional em torno do ensino público e
privado girou Fundamentalmente sobre um eixo ideológico: tratava-se, em definitivo, de uma luta pelo
controle das instituições responsáveis pelo processo de socialização das pessoas. O carácter ideológico
da discussão baseava-se em que o conteúdo do processo socializador oferecido por essas instituições
era substancialmente diferente.

Nessa óptica, na incapacidade de gerir e financiar a educação, o Estado moçambicano optou


pela privatização da educação desde 1990 como forma de se livrar dos encargos financeiros.

O Estado, com uma proposta secularizadora, competia com outras agências tradicionais, especialmente
a Igreja, pelo controle da socialização de certos sectores da população, embora, em outros, deu-se em
torno da formação das elites.

Actualmente, por outro lado, esta discussão inclui um número mais amplo de
eixos, de atores e de variáveis. Do ponto de vista dos atores, o sector não-
governamental comprometido com acções educativas (denominação com a qual
hoje se designa o sector privado) inclui uma diversidade muito ampla de
instituições com diferente poder socializador. Em relação às variáveis, também
se observam mudanças significativas. Ao eixo ideológico, que hoje se define
muito mais em termos culturais (reivindicações linguísticas, autonomias locais,
etc.) se agregam os aspectos financeiros e de gestão, que ocupam um lugar
tanto ou mais destacado que os aspectos ideológicos. (Moreira & Souza, 2020).
A ampliação do debate está, ademais, associada a uma forte revalorização da privatização como
estratégia mais apropriada para resolver os problemas de eficiência e qualidade nos serviços públicos.
Neste sentido, os principais argumentos que se mencionam para justificar a necessidade de expandir o
ensino privado são, ao menos, os seguintes:

1. A pressão de determinados grupos para manter seus padrões culturais. Neste caso, a religião é
um factor muito importante. A Igreja Católica, o Islão, etc, desenvolveram sistemas paralelos de
educação, onde os padrões culturais ocupam um importante lugar no desenho curricular. Em
muitos desses casos, os grupos religiosos demandam subsídios financeiros públicos para
sustentar as actividades das escolas.
2. O desafio de melhorar a qualidade da educação em contextos de restrição orçamentária. De
acordo com esta assertiva, o ensino privado compensaria as dificuldades do sector público para
absorver a demanda educativa, particularmente nos níveis superiores do sistema.
3. A necessidade de dinamizar o funcionamento das instituições educativas. Na última década
expandiu-se a convicção segundo a qual o ensino privado permite aos pais exercer o direito de
escolher a educação de seus filhos e que aquele (ou um sistema misto, público e privado)
estimula a eficiência e o dinamismo das instituições.
4. O maior interesse privado pela educação, em virtude da revalorização do conhecimento como
factor de produção. Neste sentido, a necessidade de aumentar a competitividade económica
está produzindo uma mudança de enfoque muito significativa, referente à capacitação dos
recursos humanos e à produção de conhecimentos, que colocam novamente a educação na
agenda de prioridades das inversões privadas.

Algumas instituições de cooperação internacional apoiam explicitamente esta opção de política


educativa. O Banco Mundial, por exemplo, tem sustentado uma política favorável à privatização da
educação. Segundo seus estudos, a privatização oferece aos pais e à comunidade a possibilidade de um
controle mais direito sobre o pessoal e a direcção das escolas, permite aos pais estabelecer padrões de
qualidade para a educação de seus filhos, incrementa a habilidade dos professores, administradores e
pais para adaptar os programas às necessidades e condições da comunidade, estimula a possibilidade de
obter financiamento da comunidade para as actividades da escola e melhora a eficiência para estimular
a competência entre os estabelecimentos.

No entanto, as evidências empíricas disponíveis e as análises teóricas em favor ou contra esses


argumentos não são conclusivas. O propósito deste artigo consiste, por isso, em apresentar os dados
sobre a evolução da cobertura do ensino privado nos últimos anos e discutir as possibilidades de que ela
cumpra com os prognósticos anunciados por seus defensores, no contexto dos países em
desenvolvimento particularmente afectados por situações de crise económica.

Segundo Moreira & Souza, (2020), esta análise parte de uma constatação importante: a actual situação
social e económica mundial mostra o fracasso ou o menor êxito relativo tanto às experiências de
monopólio estatal da actividade económica e dos serviços sociais como às políticas ultraliberais de
desregulamentação. Ao contrário, o maior grau de êxito tem sido obtido pelas experiências
de capitalismo organizado, como Japão e Alemanha, ou de capitalismo com forte regulamentação e
presença do Estado no sistema bancário, como França, Itália e Coreia.
Deste ponto de vista, parece necessário introduzir uma certa dose de ceticismo acerca das posições que
aconselham universalizar um determinado estilo de estratégia política, à margem dos contextos sociais,
económicos e culturais e à margem, também, das experiências históricas concretas dos países
considerados.

A privatização no âmbito da educação está presente em todas as etapas e modalidades, haja vista que
as políticas contemporâneas, resultado da configuração das reformas, estão pautadas em perspectivas
de filantropia, parcerias público-privado, mercantilização das propostas educacionais, competitividade,
ênfase na produção e nos resultados.

Nesse contexto, “não se pode desconsiderar que o advento da subvenção pública aos estabelecimentos
privados lucrativos inaugurou uma situação favorável à sobrevivência dos pequenos empresários
educacionais do sector, reforçando o trato mercantil a um direito”.

As políticas educacionais contemporâneas estão sendo configuradas por aspectos que levam à
interpretação que a responsabilização baseada em avaliação e a pressão por resultados são mais
significativas do que a busca pela melhoria da qualidade do ensino, entendendo-a, segundo Moreira &
Souza, (2020), como:

[...] um espaço de democratização, em que todos têm condições igualitárias de


acesso e permanência na escola, um lugar que vivencia a inclusão, a democracia
e a qualidade social, bem como a efectivação de políticas públicas ofertadas
pelo Estado para os profissionais da educação, as quais disponibilizam condições
materiais e financeiras para concretização dos objectivos educacionais.
De acordo com Barroso (2005), o desafio em acreditar e vivenciar uma educação igualitária está “na
necessidade de provermos colectivamente um serviço público que garanta o pleno direito à educação e
o acesso a uma cultura comum, para todas as crianças e jovens, em condições de equidade, de
igualdade de oportunidades e de justiça social” (p. 747).

Nessa perspectiva, Moreira & Souza, (2020), salientam que o modelo de gestão considerado eficaz é o da
iniciativa privada, cujo centro está no controle e responsabilização, ou seja, em processos de fixação de
metas objectivas submetidas a avaliação e divulgação, associadas a prémio ou punição, na dependência
dos resultados obtidos. Os supostos básicos do seu bom funcionamento são o controlo gerencial e a
concorrência sob as leis do mercado. Na área pedagógica, esse modelo alinha objectivos de
aprendizagem previamente definidos com o processo de ensino e com a avaliação sistemática e
frequente desses objectivos.
CONCLUSÃO
As políticas educativas são um conjunto de acções definidas pelo Estado com vista a responder às
necessidades básicas de educação, define política educacional como sendo o “conjunto de intenções e
acções com as quais os poderes públicos respondem às necessidades de escolarização dos diversos
grupos da sociedade”.

Nos últimos anos, pode-se observar um aumento significativo de pesquisas, publicações, grupos de
pesquisas, linhas de pesquisa em programas de pós-graduação e eventos específicos sobre políticas
educacionais. Cada país formula as suas próprias políticas educacionais, baseadas na constituição desse
país e dos instrumentos orientadores dessas políticas. O que diferencia a política de educação de outras
políticas são os seus objectivos e a população alvo dessas políticas para as quais foram direccionadas.

As políticas educacionais dependem das condições históricas, económicas e culturais de cada país. Por
isso os sistemas de ensino são diferentes. O tema da qualidade de educação, dada a sua complexidade e
abrangência, tem sido abordado de diferentes formas pelos autores que analisam os seus variados
ângulos. Essa diversidade de pontos de vista demonstra, por um lado, a riqueza do conceito e, por
outro, a dificuldade prática de se alcançar um fácil consenso em torno do assunto.

Ao discutir sobre a actuação de grupos educacionais privados envolvidos na oferta de seus produtos a
educação básica pública e a influência dessa transmissão de recursos financeiros públicos ao sector
privado, pode-se constatar que a educação pública para as empresas educacionais é um mercado em
expansão. Estes grupos usam o discurso naturalizado do serviço privado como sinónimo de eficiência e
qualidade e disseminam as boas chances que os municípios possuem de alcançarem os índices
adequados nas avaliações nacionais e internacionais.

A adopção de sistemas privados de ensino pela rede pública é uma forma de privatização disfarçada,
pois essa acção convence as instituições de ensino, a equipe escolar e a sociedade que a alternativa para
alcançar a qualidade da educação é o modelo educacional proposto pelas empresas educacionais. Por
fim, averiguou-se, também, que a preocupação desse mercado educacional, representado pelas
empresas expostas nessa análise, não é garantir as necessidades humanas e nem de fato melhorar a
qualidade da educação, mas prioritariamente assegurar a extracção de mais valor nos diferentes
sectores de sua produção.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROSO, João. (2005). O Estado, a educação e a regulação das políticas públicas. Revista Educação e
Sociedade, Campinas

BELFIELD, Clive & LEVIN, Henry. (2002). A privatização da educação: causas e implicações. (1ª ed). ASA

BELTRÃO, J. & TAFARELL, C. (2017). A ofensiva dos reformadores empresariais e a resistência de quem
defende a educação pública. Revista Retratos da Escola, Brasília

DOWBOR, L. (2017). A era do capital improdutivo: a nova arquitectura do poder, sobre dominação
financeira, sequestro da democracia e destruição do planeta. São Paulo: Autonomia Literária.

FRIGOTTO, G. (2017). A génese das teses do Escola sem Partido: esfinge e ovo da serpente que ameaçam
a sociedade e a educação. Rio de Janeiro: UERJ, LPP, 2017.

MOREIRA, J. & SOUZA, T. (2020). Políticas de privatização na educação pública e a actuação de grupos
educacionais privados. Revista Práxis Educacional. Vitória da Conquista–Bahia

SAVIANI, D. (2001). Antecedentes históricos da nova LDB. A nova lei da educação: trajectória, limites e
perspectivas. Campinas, SP: Autores associados.

SILVA, R. (2018). Privatização da educação em 24 países africanos: tendências, pontos comuns e atípicos.
Educação & Sociedade, Campinas, v. 41, 2020.

VERGER, Antoni. (2019). A política educacional global: conceitos e marcos teóricos chave. Revista Práxis
Educativa, Ponta Grossa

Você também pode gostar