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Universidade Federal de Juiz de Fora

Faculdade de Educação - FACED


Políticas Públicas e Gestão do Espaço Escolar -Lorene Figueiredo de Oliveira
Curso de Licenciatura em Ciências Sociais
Grupo: Izabella Barcellos Faria / 201672151CL
Lara Fraga T. Carvalho / 201673097C

Reformas educativas no Brasil: uma questão de acumulação de capital

As mudanças no âmbito da educação no Brasil ocorrem há anos, com uma gradual


inserção dos interesses privados na construção de uma educação pública - seja ela nos anos
iniciais ou no ensino superior. Antes de analisar algumas políticas que vêm sendo
implementadas desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, perpassando pelos governos
de Lula, Dilma Rousseff, Michel Temer e, atualmente, de Jair Bolsonaro - é importante que
compreendamos que o desmonte da educação pública e da ciência é um projeto que
acompanha a história do pensamento político brasileiro. Com o discurso liberal de
melhoria na qualidade do ensino, as políticas públicas criadas abriram as portas para o setor
privado, de modo que uma educação tecnicista e com foco na criação e manutenção da mão
de obra voltada para o mercado, foi desenvolvida nas escolas públicas do país. Se pensarmos
que o Brasil é um país de capitalismo dependente, que explora a mão de obra do proletariado
em detrimento do capital externo, essa realidade fica ainda mais perversa, precária e
vulnerável.
Na lógica do capitalismo dependente, o país segue a tendência do mercado mundial,
que desde 2010 vem aniquilando os direitos dos trabalhadores e incentivando novos formatos
de mão-de-obra, como a plataformização dos serviços também chamado de uberização. As
reformas trabalhistas aprovadas a partir de 2015 regulamenta a terceirização e o trabalho
intermitente, esvaziam o papel dos sindicatos e promove a certificação do
Microempreendedor Individual (MEI) para a contratação sem vínculos, sem pagamento de
benefícios e impostos, como Vale-Transporte e Previdência Social. Contudo, tais reformas
apenas aumentaram a precarização dos empregos e não a oferta deles. Nesse movimento, a
autora Amanda Moreira analisa essa classe como o “precariado”, uma vasta parcela do
proletariado que tem seu trabalho cada vez mais precarizado, sem a garantia das leis
trabalhistas e sem perspectiva de carreira, devido à expansão do MEI e dos trabalhos
intermitentes.
Os docentes também estão incluídos no "precariado", visto que segue a onda da
terceirização e da uberização do trabalho, mesmo com os concursados ou com contratos
estáveis em redes públicas de ensino. Moreira aponta que 27% dos professores têm contratos
temporários, e que nas escolas estaduais mais de 50% do quadro de trabalhadores são
temporários ou eventuais, esses "colaboradores" intermitentes foram os que mais sofreram
durante a crise sanitária, pois sem aulas não são remunerados. Contudo, os professores
concursados, que têm alguma segurança com a estabilidade no contrato de trabalho, também
são atingidos fortemente pela precarização, com salários comumente abaixo do piso,
acarretando na sobrecarga no trabalho e consequentemente o aumento processo de
adoecimento físico e psíquico, gerando afastamentos e grande número de faltas.
Durante a pandemia do COVID-19 houve a intensificação dessa precarização, devido
ao necessário custeamento pessoal dos instrumentos de trabalho e a retirada da autonomia
pedagógica, com o monitoramento constante vindo das plataformas de chamadas de vídeo,
como o Meets e o Zoom. Outro fator importante a ser citado é a modificação dos limites entre
vida pessoal e profissional, em razão do uso de plataformas como o WhatsApp, que estão
sempre conectadas e habitualmente utilizadas para os dois fins, geraram uma maior
sobrecarga de trabalho, havendo uma obscuridade no fim da jornada de trabalho, visto que os
aparelhos estão sempre a disposição.
Temos como exemplo máximo dessa dinâmica de uberização e privatização, a
tentativa da implantação de um aplicativo em Ribeirão Preto em que os professores seriam
acionados por um aplicativo, com 30 minutos para responder e 1 hora para chegar até ao local
de trabalho, com o objetivo de substituir alguma falta ou vacância no quadro de horário.
Apesar dessa tentativa ter sido duramente confrontada e não aprovada, é uma tendência que
se concretizou de outras maneiras, sobretudo após a pandemia. A partir da crise sanitária,
houve a ampliação e aceleramento da privatização e presença de empresas, como a Google,
que ajudaram a moldar objetiva e subjetivamente a jornada de trabalho dos professores.
Através desse cenário, foram criadas medidas que pudessem abarcar e disfarçar o que
acontecia diante de diversas mudanças na área da educação. Como exemplo disso, o Plano
Nacional de Educação (PNE), o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e, a
mais recente, a Reforma do Ensino Médio. Apesar de terem sido desenvolvidos em
momentos e governos distintos, o objetivo era o mesmo: estabelecer a educação nos moldes
do mercado capitalista internacional, inclusive com a aprovação de grupos de empresários e
do Banco Mundial.
O Plano Nacional de Educação (PNE), segundo os autores do texto “Plano Nacional
da Educação 2014: notas críticas” (2015), é mais uma forma de destruição da educação
brasileira, com as manobras criadas pelo governo federal, através da parceria entre o setor
público e o setor privado, para atender aos interesses do capital, da Estado e dos governos
municipais e estaduais.
Para Saviani (2007), o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) é na verdade
um conjunto de ações a serem desenvolvidas pelo MEC, no qual capitalizou a opinião pública
em torno das políticas educacionais, ao mesmo tempo em que utilizou de agendas lançadas
por grupos de empresários interessados na mudança estratégica - econômica e política - da
educação. Dessa forma, o autor afirma que o PDE, se construído e aplicado de maneira
correta, poderia indicar uma mudança na atividade docente, na situação das escolas e dos
alunos e, principalmente, no papel que a escola pública desempenha na sociedade.
Com uma proposta semelhante, de melhorar os índices de ensino nas escolas, a Base
Nacional Comum Curricular (BNCC) veio para uniformizar o currículo das disciplinas da
educação básica, além de assinalar quais as competências e habilidades a serem
desenvolvidas em cada ano. Apesar de já estar em vigor há alguns anos - e carregar consigo
um histórico de mudanças - a BNCC simboliza um quadro de tensões entre os movimentos
sociais e organizações educacionais e a coalizão liberal-conservadora do governo Dilma
Rousseff.
É nesse contexto de extrema precarização do trabalho docente, de maior aliança entre
público e privado que surge a Reforma do Ensino Médio, que mais uma vez coloca em
perspectiva o ensino público, visando uma maior manipulação da mão de obra para o capital
externo e interno. Com os itinerários formativos, a necessidade de “notório saber” para
ministrar as aulas, o aumento da carga horária sem a estrutura física e de gestão para tal são
exemplos do motivo pelo qual o Novo Ensino Médio tem sido amplamente criticado e
encontrou grande resistência para ser de fato implementado.
Pode-se, pois, concluir que as reformas educativas na educação básica são uma luta
constante dos estudantes e trabalhadores da educação, com a árdua tarefa de tentar que os
interesses mercantilistas do capital não interfiram na qualidade do ensino público e para que o
trabalho do professor seja valorizado na medida certa.

Referências Bibliográficas:

Adufal TV. Precarização do Trabalho Docente em Tempos de Pandemia. YouTube,


04/08/2020. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=amU DLObTyIY>
CARDOSO, Miriam. Capitalismo Dependente, Autocracia Burguesa e Revolução Social em
Florestan Fernandes. IEA, Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo,
USP, São Paulo, 1995

HISTRAEB - História, Trabalho e Educação no Brasil. Formas e Tendências de


Precarização do Trabalho Docente. YouTube, 23/11/2020. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=9C4Nxqg8WwI>
KUENZER, Acácia Zeneida. AS MUDANÇAS NO MUNDO DO TRABALHO E A
EDUCAÇÃO: novos desafios para a gestão. Disponível em:
<https://docplayer.com.br/344576-As-mudancas-no-mundo-do-trabalho-e-a-educacao-novos-
desafios-pra-a-gestao-acacia-zeneida-kuenzer-introducao.html>
GERALDO, Débora Sabina da Silva; LAMARÃO, Marco Vinicius Moreira; MOTTA, Vânia
Cardoso da; PICCININI, Cláudia Lino; SILVA, Simone Maria. PLANO NACIONAL DE
EDUCAÇÃO 2014: notas críticas. VII Jornada Internacional de Políticas Públicas. UFMA,
Maranhão, 2015.
SAVIANI, Dermeval. Plano Nacional da Educação: análise do projeto do MEC. São
Paulo, 2007.
ANDRADE, Maria Carolina Pires e MOTTA, Vania Cardoso. Base Nacional Curricular
Comum e Novo Ensino Médio. Rev. HISTEDBR On-line. v.20 1-26. Campinas, 2020

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