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Unidade 1:

Aspectos gerais da organização do Ensino Médio e a inclusão de estudantes público-alvo da


Educação Especial.

Juliane Ap. de Paula Perez Campos


Graciliana Garcia Leite

O ensino médio brasileiro continua em busca de sua identidade, marcado por reformas
educacionais articuladas às demandas da sociedade e do mercado de trabalho. Segundo
Nascimento (2007), o ensino médio tem sido, historicamente, seletivo e vulnerável à
desigualdade social, sendo as mudanças quanto à organização e funcionamento deste nível de
ensino pautadas na divisão social do trabalho.
Desde o período do Brasil colônia, o ensino médio no país passou despercebido nas
discussões sobre sua caracterização e identidade, várias foram as tentativas de mudança, no
entanto, o que prevalecia em cada época eram as influências governamentais vigentes. Piletti
(2003) destaca que no período de 1759 a 1996 aconteceram 21 reformas direcionadas ao
ensino médio, sendo que a sociedade em geral teve pouca ou quase nenhuma participação na
tomada de decisão. Atualmente foi aprovada a reforma do ensino médio a reforma do Ensino
Médio, editada pela lei 13.415 (BRASIL, 2017), sendo precedida de outras reformas que ocorreram

após a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Lei nº 9. 394/1996 .


Considerando as reformas realizadas, Moehlecke (2012) destaca que no passado o
ensino médio era destinado a um número restrito de pessoas, com o intuito de preparar a elite
para os exames de ingresso aos cursos superiores. A partir do século XX, precisamente nas
décadas de 30 e 40, com as reformas educacionais de Francisco Campos e de Gustavo
Capanema, o ensino médio profissionalizante (ensino secundário da época) passa a ser
implantado. São criadas as Leis Orgânicas do Ensino (1942 e 1946), com a organização do
Ensino Médio em propedêutico, técnico e normal. O primeiro momento da expansão do Ensino
Médio foi marcado pela divisão entre ensino profissionalizante e o propedêutico, e a dicotomia
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de classes. Enquanto o ensino propedêutico visava (e ainda visa) o ingresso no ensino superior,
o ensino profissionalizante objetivou preparar mão de obra qualificada de maneira atender às
demandas dos setores da indústria e do comércio em nosso país.
Com a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, lei nº 4.024/ 1961, foi
decretado em parágrafo único direito de todos à educação, bem como a equivalência nos
ensinamentos ministrados no ensino profissional e acadêmico; sendo assim a reforma
Capanema perde o seu valor, quando essa lei considera concomitante esses dois tipos de
educação (CORDÃO, 2018). Deste modo, tornar-se possível o ingresso nos cursos superiores a
partir da finalização do ensino profissionalizante; contudo, tal possibilidade não garantiu a
ruptura dos dois ramos distintos de ensino para distintas clientelas, ou seja, a elite e as classes
populares, marcado pela legislação da época enfatiza da dupla finalidade do ensino médio no
país segundo as condições sociais e financeiras de seus estudantes (NASCIMENTO, 2007).
Na década seguinte, ocorreu nova mudança na organização do ensino médio conforme
a LDB de 1971, ou seja, com a criação do ensino básico em primeiro e segundo graus, o ginásio
(duração de quatro anos) desaparece e é integrado à escola primária, formando assim, o 1º
Grau; e o colegial (duração de três anos) torna-se o 2º Grau, tal etapa passa a ser
obrigatoriamente profissionalizante. Tal reforma visou atender aos interesses da época, tendo
em vista frear o crescimento da demanda de vagas aos cursos superiores, fazendo com que
grande parte dos concluintes deste 2º Grau finalizasse o sistema escolar e adentrasse no
mercado de trabalho (NASCIMENTO, 2007). Este cenário permaneceu até o início dos anos 80,
mais precisamente 1982, a escola secundária volta a ter um caráter dualista (propedêutica e
profissionalizante). A falta de profissionais para os cursos profissionalizantes, bem como a
necessidade de novos currículos foram determinantes importantes para a revogação da
obrigatoriedade.
A aprovação da Constituição Federal (BRASIL, 1988) foi um marco para a
redemocratização da educação brasileira, com destaque para o artigo 208, inciso II, que
estabelece o dever do Estado em assegurar a “progressiva universalização do Ensino Médio
gratuito”, possibilitando a ampliação da oferta deste segmento educacional (MOEHLECKE,
2012). A Emenda Constitucional no 59/2009, no inciso I do artigo 208, passou a prever a
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obrigatoriedade escolar dos 4 aos 17 anos, o que torna imperativa a frequência ao ensino
médio. O atual Plano Nacional de Educação (PNE) (2014-2024) prevê “universalizar o
atendimento escolar para toda a população de 15 a 17 anos” (PNE, Meta 3); além de “triplicar
as matrículas da Educação Profissional Técnica de nível médio, assegurando a qualidade da
oferta e pelo menos 50% da expansão no segmento público” (PNE, Meta 11) (BRASIL, 2014).
Conforme aponta Noleto (2018), os compromissos com o ensino médio, previstos no
Plano Nacional de Educação, acrescentam desafios e exigem mudanças de um nível educacional
marcado historicamente por problemas que vão além da evasão e incluem a questão do
modelo curricular ultrapassado, da formação profissional e da integração ao mercado de
trabalho, além do preparo dos cidadãos para o século XXI.
Apesar de quase 20 anos para que a obrigatoriedade do ensino médio fosse
constitucional, a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9.394/ 1996) o
Ensino Médio passa a ter destaque enquanto etapa final da educação básica, com duração
mínima de três anos, com as seguintes finalidades:

I – a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino


fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; II – a preparação básica
para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser
capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou
aperfeiçoamento posteriores; III – o aprimoramento do educando como pessoa
humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e
do pensamento crítico; IV – a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos
dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada
disciplina. (BRASIL, 1996, p.12)

A partir da nova configuração do ensino médio, prevista na LDB de 1996, este nível de
ensino passa a ter maior visibilidade dentre os pontos de pauta da educação brasileira. A
Resolução nº 3, de 26 de junho de 1998, institui as primeiras Diretrizes Curriculares Nacionais
para o Ensino Médio (DCNEM), as quais definem princípios, fundamentos e procedimentos
quanto à organização pedagógica e curricular, tendo em vista a articulação das finalidades
previstas na LDB 9.394/ 1996 (BRASIL, 1998). Conforme apontam Moehlecke (2012) e Zibas
(2005), apesar do caráter inovador das novas diretrizes - que estabeleciam a
interdisciplinaridade e organização do currículo por áreas de conhecimento, contextualização
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dos conteúdos, ênfase na aprendizagem e papel ativo do aluno, e desenvolvimento de


competências por meio da valorização de uma concepção de “educação para a vida e não mais
para o trabalho” - críticas foram feitas quanto à subordinação da educação ao mercado, a
permanência da separação entre formação geral e para o trabalho.
No ano de 2012 são instituídas as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Médio (DCNEM), por meio da Resolução nº 2, de 30 de janeiro de 2012 (BRASIL, 2012). Dentre
as finalidades das novas DCNEM têm-se: a consolidação e aprofundamento dos conhecimentos
adquiridos no Ensino Fundamental propiciando o prosseguimento de estudos; a preparação
básica para o trabalho e a cidadania do aluno; aprimoramento do mesmo como pessoa
humana, englobando a formação ética, desenvolvimento da autonomia intelectual e
pensamento crítico; além da relação entre teoria e a prática no ensino de cada disciplina e
integração de conhecimentos gerais embasados na interdisciplinaridade e da contextualização;
reconhecimento e aceitação da diversidade e da realidade dos indivíduos; associação entre
educação, trabalho, ciência, tecnologia e cultura (BRASIL, 2012). As Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio de 2012 estão articuladas com as Diretrizes Nacionais da
Educação Básica de 2010, tendo como destaque a formação geral incluída nos cursos
profissionalizantes.

(...) a formação geral do aluno deve se tornar inseparável da formação profissional e


vice-versa, em todos os campos onde se dá essa preparação para o trabalho: seja nos
processos produtivos, seja nos processos educativos, tais como o Ensino Fundamental
e o Ensino Médio, seja na formação inicial ou qualificação profissional, seja na
Educação Profissional Técnica e ou na Tecnológica, bem como nos demais
cursos superiores. Significa enfocar o trabalho como princípio educativo,
objetivando superar a tradicional e preconceituosa dicotomia entre trabalho manual e
trabalho intelectual, incorporando a dimensão intelectual ao trabalho produtivo e vice-
versa (...) (PARECER CNE/CEB nº11/2012)

Apesar das DCNEM de 2012 ter como motivação, dentre outros aspectos, a superação
do dualismo entre os ensinos propedêutico e profissional, e sim a articulação entre o Ensino
Médio e a Educação Profissional: a articulada (integrada ou concomitante) e a subsequente,
atribuindo a decisão de adoção às redes e instituições escolares; tais finalidades não foram
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suficientes no enfrentamento dos desafios da diversidade do alunado e a considerável evasão


de matrículas.
Ainda na década dos anos 2010, o Ensino médio passaria por nova reforma que segundo
Silva e Boutin (2018) foi imposta à sociedade brasileira por meio de uma lei que teve início com
uma medida provisória, que, levando-se em conta a “amplitude da reforma e da ausência de
uma discussão democrática, [...] não poderia gerar outra coisa senão a revolta de diversos
segmentos sociais ligados à educação” (p. 523).

A BNCC para o ensino médio, publicada em 2018, provoca discussões e


questionamentos diversos, porque a razão de sua proposição é completar a reforma
inicialmente apresentada como Medida Provisória (MP) n.º 746/2016, intensamente
questionada e rejeitada por inúmeros brasileiros que entenderam ser este
encaminhamento inapropriado para uma alteração curricular numa sociedade que,
considerada democrática, ao menos deveria ter tido a oportunidade de discuti-la. Para
nós, a MP foi o primeiro ato antidemocrático, cuja continuidade se deu quando o MEC
encaminhou a sua versão de BNCC para o Conselho Nacional de Educação (CNE),
interrompendo a discussão que vinha sendo travada, e finalizou com a aprovação da
atualização das DCNEM. (KOEPSEL; GARCIA; CZERNISZ, 2020, p.3)

Em linhas gerais, em atendimento à Base Comum Nacional Curricular, a nova proposta


do Ensino Médio (lei 13.415 de 2017) tem como foco maior alterações na estrutura curricular e
estabelece um tempo máximo de carga horária que deverá ser destinado para o cumprimento
da BNCC que não poderá ser superior a 1.800 horas. Além disso, flexibiliza aos sistemas de
ensino a responsabilidade sobre quantas e quais áreas do conhecimento e conteúdos escolares
serão oferecidas aos alunos; sendo os únicos conhecimentos obrigatórios para todas as escolas
língua portuguesa e matemática nos três anos do Ensino Médio, e, em algum momento do
curso, a língua inglesa. Subentende-se que outras áreas de conhecimento serão oferecidas, ou
não, segundo definição dos sistemas de ensino. Essa medida estabelecida à sociedade brasileira
poderá levar a profundas desigualdades nas escolas (HERNANDES, 2019).
Outro destaque da estrutura curricular são os itinerários formativos. Conforme
apontam Silva e Botin (2018), torna-se preocupante se os itinerários formativos serão
colocados em prática, pois considerando que ficarão a cargo dos sistemas de ensino, pode vir a
não ofertar o itinerário formativo desejado pelo aluno, ou ainda, o sistema de ensino pode vir a
ofertar somente aqueles itinerários que os recursos, muitas vezes precários, permitirem.
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As várias formas de flexibilizar o currículo do Ensino Médio, para os sistemas de


ensino, deverão trazer desigualdades acentuadas a essa etapa da educação básica.
Escolas com maior poder econômico poderão utilizar o tempo dos seus estudantes
com ensinos significativos para o seu desenvolvimento científico e cultural, como
linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e sociais. Enquanto
isso, as escolas mantidas pelo Poder Público, para as classes populares, poderão
proporcionar a seus estudantes doses homeopáticas de conteúdos escolares com
formação aligeirada profissionalizante ou profissional, que poderão ser ministradas por
graduados não licenciados (HERNANDES, 2019, P. 14-15).

Frente ao exposto, verifica-se que o cenário do ensino médio sempre esteve marcado
por críticas, sendo que as mudanças recentes requerem um período para verificação dos
resultados e impactos na escolarização dos estudantes. Conforme previsto no documento da
Declaração de Incheon (UNESCO, 2016) é ponto fundamental a continuidade dos esforços para
ampliar o acesso à educação secundária, tendo como tônicas em todo o sistema educativo a
inclusividade, a igualdade e a qualidade.
Nesta perspectiva, o período do Ensino Médio é um marco importante na trajetória de
vida dos jovens; sendo acompanhado por uma série de transformações e dilemas, busca pelo
autoconhecimento, novas experiências e formas de se relacionar como os amigos, família,
escola e sociedade. Os jovens tendem a adquirir maior autonomia e independência, à medida
que avançam para novas fases da vida. Para Silva (2021), é importante destacar a contribuição
que o Ensino Médio ocupa como um espaço de conclusão de uma etapa formativa; o que
requer a oferta de uma estrutura que permita aos estudantes a continuidade dos estudos, e,
que também, prepare para a carreira e trabalho (SILVA, 2021).
Inseridos neste contexto tem-se os estudantes público-alvo da educação especial, ou
seja, pessoas com deficiência, com transtornos do espectro do autismo, com altas habilidades/
superdotação. De acordo com os dados do Relatório Técnico do censo escolar de 2021, o
percentual de estudantes PAEE matriculados em classes comuns tem aumentado
gradualmente. A maior proporção de alunos incluídos é observada na educação profissional
subsequente/concomitante, com inclusão de 99,5%.
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As matrículas da educação especial, no nível ensino médio, tiveram aumento


significativo no período de 2017 a 2021 (INEP, 2021), conforme pode verificar na Tabela 1.

Tabela 1: Número de Matrículas da Educação Especial em Classes Comuns, no Ensino Médio no


Brasil.
Curso Técnico
Ensino Médio Ensino Médio Integrado Total
Ano Propedêutico Normal/Magistério (Ensino Médio
Integrado)
2017 89.209 647 3.375 93.231

2018 109.454 729 4.868 115.051

2019 118.353 651 5.994 124.998

2020 138.721 773 8.051 147.545

2021 162.141 754 10.002 172.897

Fonte: Elaborado pelas autoras a partir das Sinopses estatísticas (2017- 2021).
As informações apresentadas na Tabela 1 sinalizam o crescimento contínuo de
matrículas de estudantes PAEE no ensino médio nas Classes Comuns. Nota-se que em 2017 o
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total de matrículas no ensino médio era 93.231, em 2021, a quantidade de estudantes


matriculados passou para 172.897, ou seja, aproximadamente um acréscimo de 79.500 novas
matrículas no período analisado. Embora se verifique a tendência crescente de inclusão no
ensino médio nos últimos anos de estudantes PAEE, observa-se uma concentração maior das
matrículas registradas ainda no nível fundamental.
No que diz respeito à oferta do Atendimento Educacional Especializado (AEE), embora o
percentual de alunos incluídos em classes comuns venha aumentando nos últimos anos, a
inclusão nem sempre vem acompanhada com a oferta do AEE. A Figura 1, apresenta o
percentual de alunos em salas comuns com e sem acesso ao AEE no período de 2017-2021.

Figura 1 - Percentual de matrículas de alunos de 4 a 17 anos de idade com deficiência,


transtorno global do desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação que frequentam
classes comuns – com e sem atendimento educacional especializado (AEE) – ou classes
especiais exclusivas – Brasil – 2017-2021

Fonte: INEP (2021).

Conforme podemos verificar na Figura 1, em 2017, o percentual de alunos incluídos em


classes comuns era de 90,8% e, em 2021 passou para 93,5%; contudo, o acesso ao AEE, passou
de 51% em 2017 para 53,8% em 2021, o que significa que cerca de 46% dos alunos incluídos nas
classes comuns não estão frequentando o AEE. Apesar das diretrizes nacionais indicarem que a
educação especial e o AEE são serviços transversais, ou seja, perpassam todas as etapas de
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ensino, os dados do INEP (2020) indicam a necessidade de ampliar a oferta do AEE para os
estudantes incluídos nas escolas regulares. Além disso, apesar das matrículas no Ensino Médio
estarem aumentando continuamente nas escolas regulares, ainda há necessidade de ampliar o
acesso dos estudantes PAEE para essa etapa do ensino.
No Brasil existem aproximadamente 9.289,5 de jovens entre 15 e 17 anos. Os números
publicados pela organização Todos pela Educação (2021) indicam que em 2021 cerca de 4,4%
desse total de jovens, o que representa cerca de 407,4 mil jovens com idade entre 15 e 17 anos,
estavam fora da escola sem ter completado o Ensino Médio. Destaca-se também a redução dos
estudantes matriculados no Ensino Médio Regular ou que já concluíram o Ensino Médio. No
ano de 2021, esse total era de 74,9% dos jovens de 15 a 17 anos, e no ano anterior, 2020,
77,0%.
Além da questão da evasão escolar, historicamente o Ensino Médio apresenta
diferentes problemas em sua organização que atinge diretamente a participação e o processo
de escolarização dos estudantes, e com consequências que repercutem nos altos índices de
evasão escolar, alta proporção de estudantes em distorção idade-série, salas de aulas
superlotadas, escolas com infraestrutura insatisfatória e a complexidade do mercado de
trabalho. Neste contexto, é importante considerar que a inclusão dos estudantes PAEE no
ensino médio precisa responder a esses desafios estruturais presentes, e garantir que o sistema
educacional forneça recursos e serviços necessários capazes de atender as necessidades e
demandas que esses estudantes requerem nessa etapa de ensino da escolarização
(FERNANDES; BENITEZ, 2022).

Com a perspectiva de um imenso contingente de adolescentes, jovens e adultos que se


diferenciam por condições de existência e perspectivas de futuro desiguais, é que o
Ensino Médio deve trabalhar. Está em jogo a recriação da escola que, embora não
possa por si só resolver as desigualdades sociais, pode ampliar as condições de inclusão
social, ao possibilitar o acesso à ciência, à tecnologia, à cultura e ao trabalho (BRASIL,
2012, p. 167).

Percebe-se, que essa conjuntura presente no Ensino Médio repercute diretamente no


processo formativo dos estudantes. Os jovens com deficiência, na maioria das vezes, deparam
com outros desafios relacionados à permanência e à garantia de aprendizagem à medida que
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buscam progredir e manter-se na escola durante esse período. “As desigualdades sociais
ascendem mediante as disparidades formativas e o distanciamento curricular das variadas
realidades vivenciadas por estudantes em todo país” (SILVA, 2021, p.2-3). Para muitos desses
jovens, a trajetória escolar não segue um fluxo contínuo, trata-se de um processo marcado por
permanência em um mesmo ano de ensino, reprovações, interrupção dos estudos, resultando
em muitos casos o abandono da escola.
Outro desafio da inclusão é a preparação dos professores. A formação inicial dos
professores nem sempre contempla os aspectos da inclusão especificamente de maneira
satisfatória. Muitos professores não se sentem preparados para atender às diversas
necessidades dos estudantes na sala de aula. A falta do desenvolvimento de competências
necessárias para a inclusão afeta o processo de ensino e a aprendizagem dos estudantes. Nesse
sentido, a inclusão educacional precisa de avançar na consolidação de uma formação inicial dos
professores que abranjam os processos centrais para enfrentar as barreiras da participação e
da aprendizagem dos estudantes.
A formação dos professores influencia diretamente em sua atuação e nas práticas
pedagógicas desenvolvidas. No nível ensino médio, promover práticas pedagógicas capazes de
atender as demandas e interesses considerando as individualidades dos estudantes é uma
tarefa complexa.
Felício (2017) em sua pesquisa de mestrado analisou as concepções e atuação de
professores do Ensino Médio frente aos alunos Público-alvo da Educação Especial. Os
resultados evidenciaram que a maioria dos professores se mostrou favorável à inclusão escolar,
porém apontaram a necessidade de melhoria na estrutura física e organizacional da escola;
profissionais especializados para acompanhar estes alunos; dificuldades na prática pedagógica,
principalmente ao que se refere à carência de conhecimentos sobre tópicos específicos da
Educação Especial; além da importância da participação da família no ambiente escolar, de
modo a contribuir para a aprendizagem de seus filhos, e de uma gestão escolar participativa
que acompanhe o trabalho docente com este público e que dialogue sobre questões referentes
à inclusão escolar.
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Acrescenta-se outro desafio, o fato que muitos professores que atuam no Ensino Médio
não contam com um professor especializado para o desenvolvimento do planejamento
pedagógico. Especialmente no ensino médio nota-se a insuficiência de docentes especializados
nas classes comum, e da precariedade do AEE (FERNANDES; BENITEZ, 2022).
Em muitos municípios do estado de São Paulo, o serviço da rede estadual que concentra
o maior percentual de matrículas no nível ensino médio dos estudantes PAEE está organizado
em salas de recurso funcional, e não, multifuncional, isto é, as salas são organizadas por um
tipo específico de deficiência, isso ocasiona um desafio maior para promover o acesso do
serviço para um número maior estudantes com diferentes deficiências, além de inviabilizar o
deslocamento dos estudantes, e consequentemente comprometer à frequência nesses
espaços. Embora no Brasil existem diretrizes que discorrem sobre a acessibilidade arquitetônica
dos ambientes públicos. A acessibilidade dos espaços escolares é um outro desafio que precisa
ser avançado na inclusão educacional. Para Fernandes e Benitez (2022) muitas unidades
escolares ainda não dispõem de estrutura adequada para atender as necessidades dos
estudantes no que diz respeito à acessibilidade arquitetônica, de mobiliários e equipamentos. A
inclusão dos estudantes PAEE nas escolas regulares requer a organização dos espaços escolares
com infraestrutura e recursos adequados capazes de atender as especificidades dos estudantes
e garantir a acessibilidade do ambiente.
Para Mendes, Vilaronga e Zerbato (2014) uma possibilidade seria pensar na proposta do
ensino colaborativo, trazendo o professor especializado como apoio para os professores da
classe comum. A proposta do ensino colaborativo, parte do princípio da colaboração entre o
professor de Educação Especial e o professor da sala comum. Ambos os profissionais assumem
conjuntamente a responsabilidade pelo planejamento, avaliação e demais procedimentos de
ensino para todos os estudantes, considerando a sala de aula comum como o espaço de
aprendizagem (MENDES; VILARONGA; ZERBATO, 2014).
As possibilidades de atuação do professor de educação especial junto ao professor
regente e estudantes PAEE, como exemplo a proposta do ensino colaborativo no contexto do
ensino médio, serão apresentados e discutidos na próxima unidade.
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A Unidade 1 teve como objetivo discutir a organização e funcionamento do Ensino


Médio, em diferentes momentos da história da educação brasileira; bem como o panorama
atual de matrículas de estudantes público-alvo da educação especial, demandas e desafios da
inclusão escolar no Ensino Médio. Esperamos que tais temáticas tenham elucidados reflexões e
problematização da realidade da inclusão escolar no ensino médio.

Referências:

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