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Resumo de Português: 2º Teste – Frei Luís de Sousa e a Crónica de D.

João I

Frei Luís de Sousa: Ato I – Cenas I a IV


Cena I – Contextualização e apresentação de Madalena

Contextualização:

 Século XVII (século 17);


 Local onde a ação decorre: casa em Almada – espaço requintado e luxuoso, sendo que os objetos e
decorações correspondem ao nível social de quem detém os mesmos (os que habitam aquele espaço têm
uma forte ligação com a religião cristã). É também luminoso e aprazível (calmo) a partir do facto de que a
vista é o rio Tejo e a própria Lisboa.
 Decorre num dia ao final da tarde, no ano de 1599.

A didascália presente no início da cena pretende situar a ação no tempo e no espaço, através da
descrição do mesmo.

“Naquele engano d´alma ledo e cego/que a fortuna não deixa durar muito”: referência ao episódio de
Inês de Castro, mais particularmente aos versos, que reenviam para um indício de tragicidade e
fatalidade – é provável que algo trágico acontecerá com Madalena.

Madalena nunca experimentou ser totalmente feliz (“felicidade suprema”), invejando Inês que, apesar
de ter morrido de morte trágica, vivenciou a tal felicidade. Madalena refere que, quem já vivenciou essa
felicidade pode morrer em paz e com satisfação.

“…que não o saiba ele…”: “ele” refere-se a Manuel de Sousa Coutinho, atual marido de Madalena.

A personagem é muito amada por Manuel, contudo vive uma vida amedrontada e aterrorizada, daí que
não pode vivenciar a “felicidade suprema”.

“Oh! Que amor, que felicidade… que desgraça a minha!”: Se Madalena (que mostra estar, no momento,
confusa) tem tudo para ser feliz, porque não o é? – Aura de mistério que envolve todo o discurso,
deixando o leitor confuso e sem perceber a razão que impede Madalena de ser feliz.

Em suma, a cena I é um monólogo de Madalena, associado a uma reflexão originada pela leitura do
episódio de Inês de Castro. Tanto a pontuação (reticências, pontos de exclamação) como a linguagem
utilizada (medo, terrores, desgraças…) associada à interjeição “Oh!” reenviam para um discurso reflexivo,
onde a emoção impera, assumindo uma carga negativa.

Cena II - Diálogo entre os personagens que esclarece o mistério da cena I

Apresentação de uma nova personagem: Telmo, aio e amigo de D.João de Portugal e da sua família, que
acompanhou Madalena desde sempre, quando esta era muito jovem.

“… meu senhor… quero dizer como o Sr. Manuel…”: Telmo vai sempre considerar como seu senhor
D.João, sendo o único que acredita que não está morto e que retornará, considerando-se como eterno
aio e amigo do seu amo.

Caracterização de Manuel de Sousa Coutinho (atual marido de Madalena):

 Culto (“… acabado escolar…”);


 Possui grandes conhecimentos literários e ligados à comunicação (“… muitas letras…”);
 Tem modos, sabe comportar-se (“… galante…”);
 Detém determinados valores, sendo solidário e empático (“…cavaleiro…”);
 Mostra ser sério, no sentido de ser pragmático (“… uma gravidade…”).

Caracterização de Maria (filha de Madalena e Manuel):

 Ativa, obediente e bondosa;


 Possui uma maturidade acima da média (“… tão fora da sua idade…”);
 Curiosa (“… está sempre a querer saber…”);
 Débil/fraca fisicamente (“… não é uma criança… muito forte…”).

Madalena conheceu Telmo quando estava prestes a casar-se com D.João. Como Telmo já conhecia há
bastante tempo o seu amo e passou a conhecer bastante Madalena (para além de que possui uma idade
mais elevada), era tratado como membro da família.

Telmo refere que não consegue esquecer o passado, pois continua a pensar que o seu amo não está
morto. A expressão “Terá…” coloca a seguinte questão: será que D.João está mesmo morto?

Maria e Telmo aparentam ter uma relação muito próxima. Tudo o que Telmo diz, Maria acredita. Por isso,
Madalena pede a Telmo que não revele a Maria o passado da mãe, nomeadamente o 1º casamento.

Entende-se que Maria poderá ser portadora de uma condição, devido ao facto de que os “ares
apestados” (peste negra em Lisboa) poderão condicionar ainda mais a saúde de Maria.

Telmo e Madalena aparentam estar numa brincadeira/”disputa” saudável: quem gosta mais de Maria?
Surge então uma explicitação do amor de Telmo por Maria:

 No início, Telmo não gostou do facto que Madalena se casaria com Manuel, ou seja, pela segunda vez, e
muito menos do nascimento de Maria, pois em teoria, ainda estava casada com D.João. – Explicação do
porquê de Madalena estar sempre aterrorizada: se D.João regressar, será a sua desgraça, daí que a
felicidade do agora de Madalena ser a sua possível desgraça;
 Ao longo do tempo, o amor de Telmo por Maria cresce, devido às suas qualidades e características únicas
e distintas.

Telmo acusa Madalena de ter trazido uma criança ao mundo, com a incerteza no ar: se D.João voltar,
Manuel e Madalena terão de se separar, pelo facto de que aos olhos da igreja (como Madalena e D.João
ainda não se separaram), o casamento é adultério. Assim, Maria é considerada como filha ilegítima,
sofrendo também devido à separação dos pais.

Madalena explicita a sua história, revelando detalhes, depois da crítica de Telmo:

 Telmo já foi aio do pai de D.João, logo é um senhor de idade;


 Madalena justifica toda a sua estima por Telmo, tratando-o como pai e amigo, não como criado;
 A mesma perdeu D.João e a família na “jornada” em África, ficando viúva aos 17 anos.
 Durante 7 anos, Madalena procurou por D.João, gastando dinheiro na sua busca e pedindo a vários que o
procurassem – não acreditou que este estivesse morto, mesmo com uma grande quantidade de provas a
afirmar o contrário.
 Tudo foi feito: D.João não apareceu e foi declarado como morto. Após 7 anos do desaparecimento,
Madalena casa-se com Manuel de Sousa Coutinho.

Madalena justifica-se, alegando que durante 7 anos teriam sido feitas extensivas buscas por terras de
além para encontrar o marido, mas tudo foi em vão, pois foi dado como morto. No entanto, Telmo
continua a duvidar da suposta morte, ao que Madalena tenta explicar-lhe, de forma meiga, que essa
dúvida deriva das saudades e do apego que Telmo tem ao amo.

Telmo refere a carta enviada por D.João, onde este menciona que vivo ou morto, voltaria a ver
Madalena. Por isso, Telmo afirma que se D.João não apareceu morto ou não aparecer morto a Madalena
(em forma de “fantasma”/”sombra”), aparecerá, em breve, vivo.

Madalena fica mais uma vez aterrorizada com a situação e o pensamento do regresso do seu antigo
marido, pois cairia em desgraça toda a sua família e ela própria (casamento inválido e filha ilegítima).
Logo, Madalena pede a Telmo que pare de referir o 1º marido.

Telmo compara Manuel e o amo: Manuel nunca será tão bom como D.João. Sendo assim, Telmo
mantém-se fiel a D.João. Critica Madalena por esta nunca ter amado verdadeiramente o seu 1º marido,
sendo um casamento de negócio. Já com Manuel, Madalena casou por amor.
Madalena critica Telmo de volta: com a família feliz, Telmo ameaça a felicidade da mesma, visto que
continua a trazer ao de cima o fantasma e o assunto do suposto falecido marido. Com isto, pede a Telmo
que não conte a Maria a história do seu passado, da batalha de Alcácer Quibir e de D.Sebastião, para não
despertar curiosidade e fomentar o espírito patriota e nacionalista de Maria.

Maria é, então, uma das pessoas que acredita no regresso do rei. Se descobrir as histórias da mãe, do rei
e da batalha, acabará por descobrir quem é D.João e “morrerá” por dentro, o que muda totalmente a
sua vida.

Com receio, Telmo promete a Madalena que tal não acontecerá, ficando apenas com os pensamentos de
D.João para ele.

A mãe de Maria revela-se preocupada com o marido, pois ainda não regressou. Teme que o marido terá
caído numa “desgraça política”. Com isto, vem associado a mudança de tempo brusca: de um momento
para o outro, tudo pode mudar, assim como o estado em que a família de Madalena se encontra. Por
fim, dá-se o reforço da ideia do conflito político: castelhanos contra portugueses.

Cena III – Maria e o Sebastianismo

No início da cena, Maria mostra desagrado e insatisfação, pois estaria à espera de Telmo para lhe contar
a história de D.Sebastião (neste caso, de como este ainda estaria vivo), mas este deixou-a pendurada.
Madalena nega o facto do rei estar vivo: os relatos dos tios Frei Jorge e Lopo de Sousa, assim como a
desvalorização das crenças populares (sendo assim quimeras/ilusões) pretendem afastar Maria das
ideias sebastianistas. Logo, Madalena não compactua com o povo e as suas crenças: ou não acredita no
mito, ou não quer acreditar.

Maria acredita no Sebastianismo: acredita que D. Sebastião está vivo e vai regressar num “dia de névoa
muito cerrada”. Fundamenta a sua posição em argumentos como a fé e a crença do povo. Devido à
esperança que os portugueses detêm, Maria acredita no mito. – “Voz do povo, voz de Deus…”: provérbio
popular que demonstra que haverá algum fundo de verdade.

Curiosa e intuitiva, questiona por que razão o pai, sendo tão patriota e nacionalista, não gosta de ouvir
falar no regresso do rei. Chega a considerar a possibilidade do pai ser pró-castelhanos, mesmo possuindo
uma postura patriótica. Segundo Maria, o seu pai, muda de expressão e fica pensativo e carrancudo
quando mencionado o tema do regresso. – Se é tão patriótico, porque que razão não acredita
totalmente no mito sebastianista?

Nota-se como as palavras e atitudes de Maria revelam todo o seu extraordinário poder de observação e
de análise de comportamentos.

Quando verifica que a sua argumentação não resulta, Madalena começa a chorar:

 As reações dos pais devem-se ao facto de que a sobrevivência e o regresso de D. Sebastião e D. João de
Portugal, cuja morte nunca foi confirmada, implicariam a invalidez do seu casamento e a ilegitimidade de
Maria. Deste modo, as constantes referências ao assunto intensificam os receios e terrores de Madalena.

Maria mostra-se sensível ao consolar a mãe, culpando Telmo por lhe contar histórias e sobre esses
assuntos. Assim, Telmo retira-se.

Cena IV – Evitar as questões de Maria

Depois de consolar a mãe, verifica-se que há uma relação de muito carinho entre Maria e Madalena,
através do uso de expressões como “mãe”, “filha” e “minha querida”.

Maria não consegue entender nem compreender a perturbação e preocupação dos pais com ela. As
reticências presentes na fala mostram pausas, mas emoção, revelando um cuidado tomado com as
palavras proferidas, numa tentativa de abordar o assunto da melhor maneira. Contudo, Madalena não
pode revelar a causa das suas preocupações.
Maria mostra ser intuitiva, afirmando que lê nos olhos, nas estrelas e sabe muitas coisas, mostrando-se
portadora de uma forte imaginação.

Para evitar os seus “desvarios”, Madalena não responde às questões da filha e pede-lhe que fale do seu
jardim. Maria deixa cair as flores que colheu no regaço da mãe, afirmando que estão murchas:

 as flores simbolizam a brevidade da vida;


 as flores de Maria murcharam, logo é um indício de tragicidade, apontando para a possível morte de
Maria.

Maria afirma que não pode realizar as esperanças do pai, a partir da expressão “E não lhas posso realizar,
bem sei.” – Sabe que não as vai concretizar. Porquê? Isto suscita no leitor uma sensação de mistério.

Madalena afirma que Maria passa o seu tempo a estudar e a ler, ao contrário de outras donzelas. Para
complementar, Maria refere que é tudo menos o que devia ser: “… senão que o que devia ser não sou…”
– Reenvia para a possível ilegitimidade de Maria.

Maria questiona o porquê de pai não continuar a propagar a fé cristã. A mãe responde que foi a vontade
de Deus, mas apenas responde dessa forma porque, na realidade, se o pai não tivesse deixado a religião,
não teria casado com Madalena e Maria não teria nascido.

A cena acaba com um reforço da preocupação de Madalena, pois Manuel ainda não regressou.

Crónica de D.João I – Capítulos 11 e 148

Crónica: vai à procura de factos reais, contados por um cronista, isto é, vai à procura de informação
fidedigna para depois contar esses momentos históricos. Esta passa-se no período de 1383 até 1385.

Capítulo 11 – “Do alvoroço que foi na cidade cuidando que matavom o Meestre, e como aló foi Alvoro
Paeez e muitas gentes com ele.”

“Acorree”/”Acorramos” – o uso imperativo e do modo conjuntivo com valor exortativo, de forma a


incitar a população a acudir ao mestre.

Foi ordenado ao Pajem que gritasse pelas ruas que o Mestre de Avis seria morto no palácio da Rainha. A
repetição desta ideia procura criar um efeito de revolta e de tomada de ação no povo. Depois desta
surpresa inicial, o povo reage, procurando armar-se com o intuito de salvar o mestre. Álvaro Pais já se
encontra pronto para lutar, reforçando assim a ideia de que toda a algazarra era combinada. É
mencionado que Álvaro já não participava em algo assim há anos.

São apresentados argumentos que justificam o salvamento do rei:

 1º argumento: é filho de um rei, logo, tem sangue real.

 2º argumento: “que matem sem por quê?” – injustiça de uma possível morte gratuita.

Verifica-se a presença de várias interrogações retóricas que evidenciam o estado de exaltação e de


revolta da população por verificar que as portas se encontravam “carradas”, não permitindo, desta feita,
entra nos “Paaços” e salvar o “Meestre”. Perante este obstáculo, apresentam-se várias soluções para o
ultrapassar:
 arrombar as portas (“…dizendo que as britassem”);

 incendiar o Paço e “queimar o treedor e a aleivosa”, ou seja, vingar a suposta morte do Mestre, matando
o seu carrasco (Conde Andeiro) e o mandante deste ato hediondo (“aleivosa” = prostituta: termo
depreciativo e insultuoso dirigido à Rainha D. Leonor Teles, ficando evidente o quão detestada era pelo
povo) (“Deles braadavom por lenha, e que veesse lume pera poerem fogo aos Paaços, e queimar o
treedeor e a aleivosa”);

 arranjar uma escada que permitisse espreitar por cima das portas e, assim, tentar perceber as
movimentações dentro do Paço (“Outros se aficavom pedindo escaadas pera subir acima, pera veerem
que era do Meestre”).

Instala-se a confusão, o caos, já que ninguém se entende (“ e todo isto era o arroido atam grande que se
não entendiam uus com os outros”), aumentando a revolta e a fúria contra a rainha, continuando a
insultá-la (“dizendo muito doestos”).

É relevante, mais uma vez, a ideia de visualismo que procura retratar, de forma fiel, a confusão
generalizada às portas do “Paaços da Rainha”. Para tal, também contribuem os verbos de movimento
presentes neste excerto: dá- se uma enumeração de ações (“Uas viinham”, “outras tragiam”, “para
acender o fogo”…) que, para além de evidenciar toda a agitação na tentativa da população em tentar
entrar no Paço, também conferem maior expressividade à descrição feita.

Aqueles que conseguiam ver para dentro do palácio espalhavam o boato de que o Mestre estava vivo,
mas os que não conseguiam ver mantinham-se incrédulos e desconfiados. Com o receio de que o
tumulto se possa descontrolar, o Mestre resolve mostrar-se ao povo de “ua grande janela que viinha
sobre a rua”. O facto de se apresentar num espaço mais elevado do que aquele em que se encontravam
os que o viam, ou seja, apresentando um plano de cima (Mestre) para baixo (“Alvoro Paaez e mais força
de gente”) e de se mostrar de uma “grande janela”, é revelador do poder que ele passou a ter aos olhos
dos demais que o idolatram; como se fosse um prenúncio da posição que estaria prestes a ocupar, isto
é, o próximo rei de Portugal, escolhido pelo povo, a seus pés.

O Mestre dirige-se a todos, de forma a provar que é mesmo ele e que se encontra “são e salvo” e
também para apelar à calma, apaziguando a multidão. Destaca-se a apóstrofe “amigos” com a qual
inicia o apelo ao seu auditório, que se pretende amistoso, com o intuito de o colocar do seu lado,
obtendo, assim, a sua atenção e conseguindo o seu objetivo (acalmar a multidão).

Depois de se certificar de que se trata realmente do Mestre de Avis, a população fica eufórica. A revolta
contra a rainha aumenta a tal ponto que deseja que, para além de ter matado o Conde Andeiro, o povo
deseja que o Mestre tivesse feito o mesmo à Rainha, sendo esta vista como uma pessoa maldosa e
traiçoeira. É, ainda, feita uma grave acusação: o facto de a rainha poder ter tido algo a ver com a morte
do rei D. Fernando, seu marido (“já nos matou uu senhor e agora queria matar outro”).

A voz do povo continua a fazer-se ouvir, dirigindo-se, agora, diretamente ao Mestre “Ó Senhor!”,
pedindo-lhe que saia dos Paços da Rainha e que se junte a ele (“Viinde-vos, dae ao demo esses Paaços,
nom sejaes la mais.”). Nesta passagem, é bem visível a emoção desta voz, quer através da forma de
tratamento “Senhor”, quer da interjeição “ó”, que a precede e do ponto de exclamação que atribui à
frase a expressividade que a caracteriza. Por outro lado, é textualmente afirmado que “muitos
choravom com prazer de o veer vivo”.

A voz do povo se faz ouvir através das frases interrogativas que dirige ao Mestre, “Que nos mandais
fazer, Senhor?” e “que querees que façamos?”. Assim, é possível perceber que o povo está rendido ao
seu líder, a quem pretendem obedecer. Está presente uma ideia de submissão, reconhecendo o Mestre
como o seu futuro rei, acreditando que é esse o seu destino, visto ter escapado, por vontade divina, à
morte (“Mantenha-vos Deos, Senhor. Beento seja Deos que vos guardou de tamanha traiçom, qual vos
tinham bastecida”).

No fim, ocorre um desfile triunfal do Mestre pelas ruas de Lisboa, seguido do povo e de vários membros
ilustres da nobreza, cujos nomes são enumerados, de forma a demonstrar que até a classe, que
maioritariamente apoiava a Regente, estava agora rendida ao Mestre.

Capítulo 148 – “Das tribulações que Lixboa padecia per mingua de mantimentos.”

Neste capítulo, dá-se o cerco à cidade de Lisboa. Com isto, todos os portugueses estão cercados, logo, é
importante a entreajuda, de forma a facultar alimentos para a população cercada. É visível um excesso
de população dentro das muralhas e por isso, dá-se uma escassez de alimentos.
Para tentar diminuir a escassez de alimentos, havia embarcações que partiam em busca de alimento e
tentavam regressar para o cerco. Havia um sino que funcionava como meio de comunicação. Assim,
sempre que as embarcações que procuravam abastecer os cercados eram avistados pelos castelhanos,
tocava-se o sino e todos se uniam para lutar contra os castelhanos. Aqui verifica-se a presença de uma
consciência coletiva.
A referência ao milagre da multiplicação dos pães de Jesus Cristo procura reforçar o desespero e a fome
experienciados pelos cercados, realçando que só um milagre os poderia salvar.
As esmolas escasseiam e já não há como socorrer os pobres. Encontra-se então uma solução: expulsar
alguns dos cercados: primeiro os mais frágeis, pois não tinham forças para lutar contra os castelhanos.
Depois as prostitutas e os judeus. A decisão coletiva de expulsão, assim como a defesa dos que traziam
mantimentos são alguns dos comportamentos que evidenciam uma consciência coletiva. Por isso, as
ações do povo surgem, maioritariamente, coletivizadas.
Na cidade, há carência de todo o tipo de alimentos, como trigo, milho e vinho. O preço destes produtos
é elevado e, por isso, os hábitos alimentares mudam e até há quem procure apenas grãos de trigo na
terra ou quem beba tanta água que acabe por morrer. A carne e os ovos são outros dos alimentos em
falta e muito caros.
As crianças não têm o que comer e andam pela cidade a pedir; as mães não têm leite para os seus filhos
e veem-nos morrer. Toda a cidade está envolta num ambiente de tristeza, de pesar e de morte. As
pessoas dirigem preces a Deus. O desespero é tal que há até rumores de que o Mestre vai expulsar da
cidade todos os que não têm o que comer. Porém, esse rumor é desmentido.
Num estilo vivo e emotivo, o cronista narra e descreve, pormenorizadamente, o sofrimento da
população: a procura arriscada de trigo, à noite e em barcos; a falta de meios (esmolas) para socorrer os
pobres; a expulsão de todos aqueles que não podiam combater, bem como dos judeus e das prostitutas;
a recusa dos castelhanos em receber no seu acampamento os que foram expulsos; a pro- cura
desesperada de algo que comer e beber. O sofrimento é evidenciado através de pormenores, como, por
exemplo, o preço exorbitante de alguns alimentos.
Perante este cenário, o narrador mostra-se solidário e pretende mesmo comover/sensibilizar os leitores.
Por isso, dirige-lhes, repetidamente, perguntas retóricas carregadas de intensidade. O narrador
considera o leitor como bem-aventurado, pois não teve de enfrentar os sofrimentos descritos.

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