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FACULDADE DO MARANHÃO - FACAM

Direito Penal III

Ana Paula Cristina Cunha Nunes *1

Explique o que seria Eutanásia, Ortotanásia e Distanásia. Após, identifique


em qual hipótese de homicídio se adequa (simples, privilegiado, qualificado?),
discorrendo sucintamente sobre a hipótese de homicídio.

Os avanços da Medicina têm proporcionado uma melhoria na qualidade de vida


das pessoas, principalmente nas sociedades em países desenvolvidas, até mesmo na tentativa
da diminuição da mortalidade, com tratamentos injustificáveis, com a obstinação terapêutica a
qualquer custo.
No ordenamento jurídico brasileiro e no campo da Medicina, muito tem se
discutido questões como eutanásia, distanásia e ortotanásia. O direito sobre a morte digna do
paciente, mesmo sendo uma vontade própria, passa por regulamentação e proibição dos
órgãos representativos da classe médica e Poder Judiciário.
Os conceitos de eutanásia, distanásia e ortotanásia são estudados pela ciência da
bioética: a eutanásia termo que significa por fim a vida de um doente terminal, não é uma
conduta licita em nosso ordenamento jurídico, estando tipificada no código Penal. Já
ortotanásia que é efetivamente o contrário da eutanásia, significa deixar viver, apenas com
cuidados paliativos, não se aceitando o prolongamento da vida através de meios artificiais. E a
distanásia por seu turno é o prolongamento da vida a qualquer custo, com todos os meios
artificias possíveis de se usar.
Mas todos esses termos trazem entre si uma relação que é a questão da vida ou
morte humanas, em relação a hipótese de homicídio, trataremos especificadamente sobre cada
um:
Eutanásia
Tem se falado de eutanásia como uma morte provocada por sentimento de piedade
à pessoa que sofre. Ao invés de deixar a morte acontecer, na eutanásia, no sentido atual, age

1* Graduanda do Curso de Direito na Faculdade do Maranhão


sobre a morte, antecipando-a. Utilizando a concepção atual da expressão, admite-se que só se
pode falar em eutanásia quando ocorre a morte movida por piedade, por compaixão em
relação ao doente.
A eutanásia verdadeira é a morte provocada em paciente vítima de forte
sofrimento e doença incurável, motivada por compaixão. Se a doença não for incurável,
afasta-se a eutanásia.
Diante do Código Penal brasileiro, o que acabamos de chamar de eutanásia pode
atualmente ser considerada homicídio privilegiado. Se não estiverem presentes aqueles
requisitos, cai-se na hipótese de homicídio simples ou qualificado, dependendo do caso.
Quando se busca simplesmente causar morte, sem a motivação humanística, não
se pode falar sobre eutanásia. A eutanásia é comumente provocada por parentes, amigos e
médicos do paciente. A eutanásia eugênica, utilizada pelo nazismo contra judeus, não é
considerada eutanásia própria, mas hipótese de homicídio simples ou qualificado. Também a
morte de velhos, pessoas com deformações e doentes, mesmo incuráveis, mas que não se
encontram em estado terminal e submetidos a forte sofrimento, também não é eutanásia.
Só é eutanásia a morte provocada em doente com doença incurável, em estado
terminal e que passa por fortes sofrimentos, movida por compaixão ou piedade em relação ao
doente. E constitui crime de homicídio, perante o atual Código Penal.
No Brasil não há tipo específico para a eutanásia, esta pode se encaixar na
previsão do homicídio, do auxílio ao suicídio ou pode, ainda, ser atípica. O que se chama de
eutanásia é considerado crime; encaixa-se na previsão do art. 121 Código Penal, homicídio.
Se trata mesmo da eutanásia verdadeira, cometida por motivo de piedade ou compaixão para
com o doente, aplica-se a causa de diminuição de pena do parágrafo 1º do artigo 121, que
prevê: "Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral,
ou sob domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz
pode reduzir a pena de um sexto a um terço". Considerando o então em homicídio
privilegiado. Inclusive o médico pode cometer a eutanásia e sua conduta se resume ao referido
tipo legal.
Ortotanásia
De acordo com Pittelli Oliveira (2009, pg. 14), “a boa morte ou morte digna tem
sido associada ao conceito de ortotanásia”. Ortotanásia significa morte correta – orto: certo;
thanatos: morte. Traduz a morte desejável, na qual não ocorre o prolongamento da vida
artificialmente, através de procedimentos que acarretam aumento do sofrimento, o que altera
o processo natural do morrer.
Na ortotanásia o indivíduo em estágio terminal é direcionado pelos profissionais
envolvidos em seu cuidado para uma morte sem sofrimento, que dispensa a utilização de
métodos desproporcionais de prolongamento da vida, tais como ventilação artificial ou outros
procedimentos invasivos. A finalidade primordial é não promover o adiamento da morte, sem,
entretanto, provocá-la; é evitar a utilização de procedimentos que aviltem a dignidade humana
na finitude da vida.
É assegurado o direito à vida, e não se admite que o paciente seja obrigado a se
submeter a tratamento. O direito do paciente de não se submeter ao tratamento ou de
interrompê-lo é consequência da garantia constitucional de sua liberdade, de sua liberdade de
consciência, de sua autonomia jurídica, da inviolabilidade de sua vida privada e intimidade e,
além disso, da dignidade da pessoa, erigida a fundamento da República Federativa do Brasil,
no art. 1º da Constituição Federal.
O inciso XXXV do art. 5º garante, inclusive, o direito de o paciente recorrer ao
Judiciário para impedir qualquer intervenção ilícita em seu corpo contra sua vontade. A
inviolabilidade à segurança envolve a inviolabilidade à integridade física e mental. Isso leva à
proibição, por exemplo, de intervenções não admitidas pelo paciente em sua saúde física ou
mental.
Na situação em que ocorre a ortotanásia, o doente já se encontra em processo
natural de morte, processo este que recebe uma contribuição do médico no sentido de deixar
que esse estado se desenvolva no seu curso natural. Apenas o médico pode realizar a
ortotanásia. Entende-se que o médico não está obrigado a prolongar o processo de morte do
paciente, por meios artificiais, sem que este tenha requerido que o médico assim agisse. Além
disso, o médico não é obrigado a prolongar a vida do paciente contra a vontade deste.
A ortotanásia é conduta atípica frente ao Código Penal, pois não é causa de
morte da pessoa, uma vez que o processo de morte já está instalado.
A ortotanásia serviria, então, para evitar a distanásia. Ao invés de se prolongar
artificialmente o processo de morte, deixa-se que este se desenvolva naturalmente.
Distanásia
A distanásia o prolongamento artificial do processo de morte, com sofrimento do
doente. É uma ocasião em que se prolonga a agonia, artificialmente, mesmo que os
conhecimentos médicos, no momento, não prevejam possibilidade de cura ou de melhora. É
expressão da obstinação terapêutica pelo tratamento e pela tecnologia, sem a devida atenção
em relação ao ser humano. Ao invés de se permitir ao paciente uma morte natural, prolonga-
se sua agonia, sem que nem o paciente nem a equipe médica tenham reais expectativas de
sucesso ou de uma qualidade de vida melhor para o paciente.
A modalidade de distanásia fere o art.5°, III, da Constituição/88, pois o princípio
da dignidade humana é bem claro “ninguém será submetido a tortura nem tratamento
desumano ou degradante”.
A distanásia é um dos procedimentos mais frequentes no Brasil porque ainda
existe muita pressão familiar para prolongar a vida do paciente e questões religiosas. O que
até o momento não é considerado um homicídio, levando em consideração o estado terminal
do paciente, onde só se busca utilizar meios para sua “sobrevivência” mesmo que em estado
irreversível.
A distanásia, ortotanásia, ou eutanásia, dizem respeito a pacientes em estado
irreversível, quando já fora aplicado os cuidados médicos necessários para a recuperação do
paciente.
Talvez, para o jurista, a maior delicadeza em tratar deste assunto — delicadeza
esta até maior do que o teor moral da ação — seja por tratar da vida enquanto objeto, a qual é
resguardada pela Constituição Federal de 1988, no caput de seu artigo 5º, “Todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida...”.
Referências

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Vade Mecum. São
Paulo: Rideel, 2021.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,


DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

PITTELLI SD, Oliveira R A. Eutanásia e sua relação com casos terminais, doenças
incuráveis, estados neurovegetativos, estados sequelares graves ou de sofrimento intenso
e irreversível e morte encefálica. Saúde, Ética & Justiça, 2009.

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