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ILUSTRÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA JUNTA ADMINISTRATIVA DE RECURSOS


DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO – JARI DO ESTADO DO ACRE

AIT Nº A000859572
ARTIGO 165 CTB

SENHOR PRESIDENTE,

Eu, AVERALDO AZEVEDO DE OLIVEIRA , portador do RG n.º 201090 SSP ACRE e da


CNH nº 03818498536, inscrito no CPF sob o nº 359.570.422-34, residente e domiciliado a
Coronel Honório Alves nº 253 APT 05 Bairro Quinze em Rio Branco estado do Acre, venho,
mui respeitosamente à presença de Vossa Excelência apresentar o presente recurso contra a
aplicação de penalidade a despeito da Notificação exarada no Auto de Infração nº
A000859572,artigo 165 do CTB,referente ao veículo de placa: NAC 0662 , Renavam
00319051323, modelo:CITROEN/C3 AIRCROSS ECM, lavrada em 09/06/2018 Hora da
Infração:23:00, na RODOVIA AC 40 KM 18 - SENADOR GUIOMARD / AC, o que faz
pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.

I. DOS FATOS

No dia 09/06/2018, fui abordado por um agente do Detran Acre para realizar exame
de alcoolemia.

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Feita a abordagem, em nenhum momento foi oportunizado, nem sequer questionado a


possibilidade de realizar o teste de alcoolemia. Estranhamente e em total desacordo
com todas as disposições que serão exaustivamente discutidas, mesmo autuando
secretamente de imediato o que, não solicitaram a assinatura da Notificação. Embora
a autuação possua vícios insanáveis de produção, diversos outros fatos notórios que
ensejam no efetivo vício na produção do auto serão devidamente aventados, conforme
demonstrar-se-á a seguir.

II. DO DIREITO

II.I. DA FALTA DE NEGATIVA DO AUTOR EM SUBMETER-SE AO


TESTE DE ALCOOLEMIA

Pretende a Diretoria de Trânsito a imposição e cobrança de multa por infração assim


descrita na Notificação de Infração de Trânsito:

Art. 165-A. Recusar-se a ser submetido a teste, exame clínico, perícia ou


outro procedimento que permita certificar influência de álcool ou outra
substância psicoativa, na forma estabelecida pelo art. 277:
Infração - gravíssima;
Penalidade - multa (dez vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12
(doze) meses;
Medida administrativa - recolhimento do documento de habilitação e
retenção do veículo, observado o disposto no § 4º do art. 270.

Parágrafo único. Aplica-se em dobro a multa prevista no caput em caso


de reincidência no período de até 12 (doze) meses.
(Artigo 165-A incluído pela Lei n. 13.281/16, em vigor a partir de
01/11/16)

Porém, a respectiva tipificação não abarca minha conduta no fatídico dia. Nada mais
preciso do que logo na frase inaugural do referido artigo, delimitarmos a conduta
típica com os seguintes dizeres:

“Recusar-se a ser submetido a teste(...).. grifo nosso.

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Eis aqui a configuração do que se constitui no Direito como conduta atípica, eivada de
vício insanável, pois não há nexo de causalidade, uma vez que não recusei
absolutamente a nada, tampouco foi solicitado a realização do teste tratado. Pelo
contrário, cumpri com todos os procedimentos solicitados pelo Senhor Agente.

Considere-se que os procedimentos administrativos atinentes às infrações de trânsito,


por óbvio, não estão imunes aos princípios constitucionais que norteiam e obrigam
todo e qualquer procedimento do qual se extraiam consequências jurídicas.

Assim, a imputação de uma infração de trânsito, como de resto a imputação de


qualquer ato infracional, deve necessariamente reverter-se da absoluta
caracterização da ocorrência do fato tido como infracional, além da
individualização do condutor do veículo, já que a punição obrigatoriamente restringe-
se à pessoa do infrator e deve assentar-se na comprovada materialidade infracional
(dogmas constitucionais).

Em que pese o nobre saber jurídico do Agente da Autoridade de Trânsito que elaborou
o Auto de Infração e da Autoridade de Trânsito que expediu a Notificação de
Autuação, tal não pode e não deve prosperar, senão vejamos:

Inicialmente, atesto que em nenhum momento foi sugerido a realização de teste


de alcoolemia. Consta salientar que não fora nem sequer foi oportunizado a
possibilidade de realização e submissão ao teste de alcoolemia. Após a retenção do
veículo fui questionado sobre a ingestão de bebida alcóolica pela autoridade de
trânsito. Imediatamente informei que não havia ingerido substância alcóolica. Feito
isso, DIFERENTEMENTE DO QUE CONSTA NO AUTO DE INFRAÇÃO, o
Agente de trânsito restitui o documento de CNH e informou que poderia seguir meu
transcurso. Nesse momento presumi que não haveria nenhum óbice ao seguimento do
meu trajeto, pois nada me foi informado quanto a qualquer irregularidade que pudesse
ter sido considerada.

A feitura de Notificação nos termos das razões expostas, viola os princípios


Constitucionais Consagrados da Ampla Defesa e Contraditório. Eis que aqui,
sobremaneira, aplicou-se a conduta típica, sem que esta tenha se materializado, sendo
assim, pelas inverdades apontadas, requer o cancelamento da autuação ora aqui
especificada.

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II.II. DO EFEITO SUSPENSIVO EM RAZÃO DO RECURSO DE


DEFESA A JARI

Após a lavratura do auto de infração pelo agente, por ter, em princípio, cometido uma
infração de trânsito, o cidadão dispõe de alguns remédios administrativos para exercer
sua defesa contra a aplicação das penalidades previstas.
Dispõe o CTB, da possibilidade de recurso em segunda instância, conhecidamente via
de Recurso a JARI. Nessa fase o Código estabelece que se o recurso não for julgado
em 30 dias, poderá ser concedido o efeito suspensivo.
Na prática significa que se a pessoa optou por recorrer à J.A.R.I. sem pagar, não
poderá ter cobrada a multa enquanto pendente o julgamento.
Portanto, requer-se a aplicabilidade do efeito suspensivo na autuação aplicada em
desfavor , conforme determina o Código de Trânsito Brasileiro.

II.III. DA ABSOLVIÇÃO POR NÃO CONSTITUIR O FATO INFRAÇÃO


ADMINISTRATIVA

Como exposto, na data dos fatos, não tomei conhecimento da possibilidade de


realização de exame de alcoolemia. Não me fora solicitado a realização de teste para
que fosse possível por meios apropriados investigar o “suposto” estado de alcoolemia.
Pelo contrário, de forma coercitiva e questionável fora aplicada a tipificação de
conduta sem que esta tenha existido. Houve absoluto cerceamento de defesa. Após a
retenção do meu veículo foi questionado sobre a ingestão de bebida alcóolica pela
autoridade de trânsito. Ao fornecer resposta negativa, nada justificaria a hipótese de
ter sido posteriormente autuado, uma vez que não me fora informado da sanção
aplicada. Ainda porque, feito isso, o Agente da autoridade de trânsito restituiu o
documento de CNH e informou que poderia seguir meu transcurso. Nesse momento
presumi que não haveria nenhum óbice ao seguimento de meu trajeto, pois nada me
fora informado quanto a qualquer irregularidade que pudesse ter sido considerada.

Eis aqui a configuração do que se constitui no Direito como conduta atípica, eivada de
vício insanável, pois não há nexo de causalidade, uma vez que e não me recusei a
nada, tampouco foi solicitado a realização do teste tratado. Pelo contrário, cumpri
com todos os procedimentos solicitados pelo Agente.

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Assim, a imputação de uma infração de trânsito, como de resto a imputação de


qualquer ato infracional, deve necessariamente reverter-se da absoluta caracterização
da ocorrência do fato tido como infracional, além da individualização, já que a
punição obrigatoriamente restringe-se à pessoa do infrator e deve assentar-se na
comprovada materialidade infracional (dogmas constitucionais).

Logo, considerando a deficiência da prova técnica, as observações preliminares


absolutamente confusas e inconclusivas e a violação do direito constitucional de
ampla defesa e contraditório (CONTRAPROVA), a melhor solução para o feito
desconsiderar a medida administrativa.

II.IV. DA PREVISÃO CONSTITUCIONAL E NAS LEIS ESPECIAIS DA


SIMETRIA - DIREITO DO “IN DUBIO PRO REO”

Conforme consta no campo de observações da autuação, no ato da Constatação da


autuação, ocorrera a seguinte observação:

“Condutor recusou-se a fazer o teste, apresenta odor característico, face


ruborizada, falta de coordenação, voz embrulhada, liberado para
condutor habilitado”.

Não bastassem os erros maculados comprometedores da autuação ora aqui


especificada, o desprestígio da prestação administrativa por vezes se justifica por atos
questionáveis da própria Administração. Perguntamo-nos como pode um cidadão ser
compelido a ter de produzir contraprovas de condição situacional que de fato não
ocorrera. Inaceitável é que nas considerações do campo de “observação” suscitada,
nenhuma das situações descritas de fato ocorreram. Em absoluto reforça-se que
NÃO RECUSEI A FAZER O TESTE DE ALCOOLEMIA (Ora pois sequer fora
convidado a fazê-lo), NÃO APRESENTAVA NENHUM SINAL DE
EMBRIAGUEZ, NEM ODOR CARACTERÍSTICO, NEM FACE
RUBORIZADA, TAMPOUCO APRESENTAVA FALTA DE
COORDENAÇÃO, A VOCALIZAÇÃO ERA PERFEITA E SEM
ESTRANHAMENTOS E NÃO BASTASSE AS OUTRAS FANTASIAS E
INVERDADES INDICADAS, O CARRO FOI LIBERADO PARA SEGUIR O
TRAJETO,DIFERENTE DO QUE FORA ANOTADO PELO AGENTE.

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PARECE QUE A ADMINISTRAÇÃO TRABALHA DE FORMA


PADRONIZADA. ANOTA AS MESMAS MENSAGENS NO CAMPO DE
OBSERVAÇÃO DE TODOS OS CONDUTORES, PARA IMPOSSIBILITAR O
QUESTIONAMENTO POSTERIOR INTENCIONALMENTE, AINDA QUE
SEJA NECESSÁRIO MENTIR EM TODA DESCRIÇÃO. Em suma, TODAS AS
CONSIDERAÇÕES, CADA APONTAMENTO, CADA TERMO, TODOS
EQUIVOCADOS.

Além disso, há muito se sabe que a aplicação da Simetria no Direito Moderno é


medida que se impõe nas considerações que abranjam outras áreas do Direito, tal
como o Direito Administrativo de trânsito.
Consideremos a aplicação do conceito da expressão latina “In dubio pro reo” que
significa literalmente na dúvida, fica-se a favor do réu. Este instituto é um dos pilares
do Direito e está intimamente ligada ao princípio da legalidade.
O contraditório e a ampla defesa em nosso ordenamento jurídico tratam-se de uma
cláusula pétrea, disposta no art. 5o, LV da CRFB/88[1], que nos diz:

"Art. 5o Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer


natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:(...)

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos


acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com
os meios e recursos a ela inerentes;(...)"

Maria Sylvia Zanella Di Pietro esclarece em breves linhas sobre tais princípios,
mostrando que:

"O princípio do contraditório, que é inerente ao direito de defesa, é


decorrente da bilateralidade do processo: quando uma das partes alega
alguma coisa, há de ser ouvida também a outra, dando-se-lhe
oportunidade de resposta. Ele supõe o conhecimento dos atos
processuais pelo acusado e o seu direito de resposta ou de reação.
Exige: 1- notificação dos atos processuais à parte interessada; 2-
possibilidade de exame das provas constantes do processo; 3- direito de

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assistir à inquirição de testemunhas; 4- direito de apresentar defesa


escrita"(DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 20a
edição, São Paulo, Atlas, 2007, p. 367).”

José Afonso da Silva em brilhantes linhas nos ensina que o devido processo legal está
baseado em três princípios, quais sejam: o acesso à justiça, o contraditório e a
plenitude de defesa.
Caso tratar-se de mero procedimento fica afastada por simples dedução a observância
do devido processo legal.
Demais disso, na Constituição Federal do Brasil em seu Art. 5o, resta consignado
ainda que:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,


garantido-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade dos direitos à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança
e a propriedade, nos termos seguintes:”.

Além disso, importante salientar que a Convenção Americana sobre Direitos


Humanos (1969), in verbis, dispõe:

Art. 8o Garantias judiciais.


[...]
2. Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua
inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante
o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes
garantias mínimas:
[...]
g) direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-
se culpada;

É válido, relembrar o que diz os termos do artigo 8°, no (com destaque para a alínea
“g”), da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969), também conhecida
por “Pacto de São José da Costa Rica”, onde:

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“Toda pessoa acusada de delito tem o direito a que se presuma sua


inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o
processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes
garantias mínimas [...] direito de não ser obrigado a depor contra si
mesma, nem a declarar-se culpada”.

A lei é clara, com respeito, ao desfazimento dos atos eivados de ilegalidade dá-se o
nome de invalidação ou anulação. Esta nada mais é que a restauração da ordem
jurídica, tendo em mira o princípio da legalidade e a indisponibilidade do interesse
público. Conveniente, nesse lanço, darmos a palavra à insigne professora da
Universidade de Fortaleza, CLARISSA SAMPAIO SILVA (27), para que reforce
nosso pensamento:

“O desfazimento dos atos viciados pela própria Administração ocorre


mediante a invalidação, que pode ser conceituada como a eliminação de
um ato administrativo, por outro ato ou por decisão judicial, em virtude
de violação à ordem jurídica, com a desconstituição dos efeitos por ele
produzidos. (grifos nossos).”

“A invalidação ou anulação é, pois, feita por meio de um ato


administrativo que desfaz o outro (tal técnica foi elaborada pelo
Conselho de Estado Francês no início do século XX), incidindo apenas
sobre o ato, na hipótese de este não ter ainda gerado efeitos, ou sobre o
ato e seus efeitos”. (Limites à invalidação dos atos administrativos. Ed.
Max Limonad: São Paulo, 2001, p. 77). (grifo nosso).

Já a Súmula 473 do STF prescreve:

“A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados dos


vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou
revogá-los, por motivo de conveniência e oportunidade, respeitados os
direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação
judicial”.

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Destarte, a expressão latina “In dubio pro reo” que significa literalmente na dúvida,
fica-se a favor do réu, é um dos pilares do Direito e está intimamente ligada ao
princípio da legalidade.
Portanto na dúvida não é a causa/motivo de se absolver o réu (nesse caso o ‘suposto’
infrator de trânsito) mas, ao contrário, é a falta elementos de convicção que
demonstrem ligação do acusado com o fato delituoso é que geram, no julgador, a
dúvida acerca do nexum entre materialidade e autoria.
Nesse passo, solicito que Vossa Senhoria, se imagine no meu lugar, como cidadão
recorrendo desta punição injusta e eu, como Julgador.
Qual atitude você acha que eu tomaria como Julgador? Com certeza, a da Justiça, a da
legalidade, a de não punir um inocente que demonstra com sua limitada capacidade de
produzir provas que não estava embriagado e dirigindo veículo automotor.
Agora que Vossa Senhoria conhece a realidade dos fatos e, tem provas suficientes do
não cometimento da presente infração de trânsito, o mais justo a ser feito é não deixar
prosperar a presente e injusta acusação a que se submete.

II.V. DO ILEGALIDADE DA AUTUAÇÃO DO ART 165, NOS TERMOS


DO PARECER Nº 243/2014/CETRAN/SC

Não menos importante, cabe mencionar o entendimento da prestigioso CONSELHO


ESTADUAL DE TRÂNSITO DE SANTA CATARINA, dentro do Sistema Nacional
de Trânsito, que uma vez proferidas, espraiam-se, podendo influenciando mesmo
aqueles que não se encontram sob sua circunscrição. Em entendimento uníssono ao de
outros CETRANS, bem como uniforme a diversos julgamentos judicias, anote-se:

(...)“Há quem defenda que com as inovações trazidas pelos diplomas


legais acima mencionados, independentemente do comportamento do
condutor despertar suspeita contra sua sobriedade, estaria ele sujeito a ser
submetido ao teste de alcoolemia e, caso se recusasse, deveria responder
pelo ilícito do art. 165 do CTB. Com o devido respeito aos partidários
dessa tese, apesar das inovações normativas introduzidas pela Lei nº
12.760/12 e pela Resolução nº 432/13 do Contran, o fato é que os
pressupostos jurídicos alinhados no Parecer nº 120/11 deste Conselho,
extraídos da Constituição Federal e dos princípios gerais do Direito,
aplicáveis à espécie, permanecem indicando que a suspeita de ebriedade
continua sendo um elemento indispensável para justificar a submissão do

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condutor aos testes e exames de alcoolemia e, por esta razão, não seria
lícito autuar alguém pela infringência do art. 165 do CTB
simplesmente porque ele se recusou a fazer o teste.” Grifo nosso.

Não obstante, prossegue o brilhante parecer:

(...) Com efeito, acreditamos que não é a oposição pura e simples do


condutor à realização dos procedimentos previstos no caput do art.
277 do CTB que o sujeita às penalidades e medidas administrativas
estabelecidas no art. 165, também do CTB, mas a prevalência da
suspeita de ebriedade diante dessa objeção.
Para compreender essa assertiva, primeiro deve-se identificar o objeto
jurídico tutelado pela norma. Entendendo-se que a punição decorre da
recusa, pura e simples, do condutor em realizar os exames propostos pelo
agente público, tem-se que o bem que se pretende garantir é a própria
Administração Pública, especialmente o cumprimento de suas
determinações o que, com o devido respeito, não parece ser o caso.
O §3º do art. 277 do CTB, ao estabelecer que o condutor que se recusar a
se submeter a qualquer dos procedimentos necessários para certificar seu
estado de sobriedade, será punido com as mesmas penalidades e medidas
administrativas cominadas no art. 165, CTB, põe em evidência que o que
se pretende defender é a incolumidade pública, ameaçada diante da
nocividade da conduta que o referido art. 165/CTB descreve como
infração gravíssima.

Não obstante, sustenta ainda o respeitável parecer da desobrigatoriedade da submissão


ao teste de alcoolemia:

Quanto a possibilidade de tomar como obrigação do condutor submeter-


se aos testes ou exames de alcoolemia quando instado à fazê-lo por
agente da autoridade de trânsito, bom lembrar que o Tribunal Regional
Federal da 5ª Região, ao julgar a Apelação Cível nº 223518 (AC
200005000385751), atinente a Ação Civil Pública proposta pelo
Ministério Público Federal com o intuito de que fosse declarada a
inexistência de relação jurídica válida, que obrigasse os condutores de
veículos a se submeterem aos exames de sangue e ao uso do bafômetro,
ao referir-se a constitucionalidade do art. 277 do CTB, restringiu-lhe
uma das interpretações possíveis, afastando aquela que implicasse na

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sujeição compulsória do condutor de veículos automotor aos


mencionados testes e exames, condenando a União na obrigação de
tolerar a recusa dos condutores de veículos de se submeterem aos
referidos testes, ressalvada a prova do fato (embriaguez) pelos demais
meios de prova juridicamente admitidos. Transcreve-se, abaixo, a ementa
do acórdão citado:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DECLARAÇÃO DE


INCONSTITUCIONALIDADE COM EFEITO "ERGA OMNES".
USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL. VEDAÇÃO. INTELIGÊNCIA DO ART. 102, I, A, DA
CF. PRECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.
INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. CARÊNCIA DE
AÇÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM JULGAMENTO DE
MÉRITO. PROVIMENTO DO APELO. CONHECIMENTO
IMEDIATO DO MÉRITO PELO TRIBUNAL.
OBRIGATORIEDADE DE TESTE DE ALCOOLEMIA.
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DE RECUSA DA PROVA AUTO-
INCRIMINATÓRIA. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. - O
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, NA SUA COMPOSIÇÃO
PLENA, JÁ ADMITIU A POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DA
AÇÃO CIVIL PÚBLICA COMO INSTRUMENTO ADEQUADO E
IDÔNEO DE CONTROLE INCIDENTAL DE
CONSTITUCIONALIDADE, PELA VIA DIFUSA, DE QUAISQUER
LEIS OU ATOS DO PODER PÚBLICO, MESMO QUANDO
CONTESTADOS EM FACE DA CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA, PROCLAMANDO NÃO SE REGISTRAR, EM TAL
HIPÓTESE, SITUAÇÃO CONFIGURADORA DE USURPAÇÃO
DA SUA COMPETÊNCIA, DESDE QUE A
INCONSTITUCIONALIDADE SEJA INVOCADA COMO
FUNDAMENTO, COMO CAUSA DE PEDIR, CONSTITUINDO
QUESTÃO PREJUDICIAL AO JULGAMENTO DO MÉRITO, NÃO
COMO PEDIDO DE APRECIAÇÃO DA VALIDADE
CONSTITUCIONAL DE LEI EM TESE (RCL 600-SP, REL. MIN.
NÉRI DA SILVEIRA - RCL 602-SP, REL. MIN. ILMAR GALVÃO;
RDA 206/267, REL. MIN. CARLOS VELLOSO - AG 189.601-GO
[AGRG], REL. MIN. MOREIRA ALVES). - NA ESPÉCIE, O
PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO
ART. 277 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO, POR
VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DE RECUSA DA PROVA AUTO-
INCRIMINATÓRIA, NÃO SE CONSTITUI NO PEDIDO
PROPRIAMENTE DITO, MAS SIM NA CAUSA DE PEDIR, VALE
DIZER, SIMPLES QUESTÃO PREJUDICIAL, INDISPENSÁVEL À

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RESOLUÇÃO DA LIDE PRINCIPAL. PROVIMENTO DO APELO. -


TENDO SIDO EXTINTO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO (ART.
267, VI, CPC), VERSANDO A QUESTÃO EXCLUSIVAMENTE DE
DIREITO E ESTANDO O PROCESSO EM CONDIÇÕES, É DE SER
IMEDIATAMENTE JULGADO. INTELIGÊNCIA DO ART. 515,
PARÁGRAFO 3º, CPC. - NINGUÉM, À LUZ DAS NORMAS E
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS, ESTÁ OBRIGADO A
PRODUZIR PROVAS CONTRA SI MESMO, POIS O DIREITO DE
PUNIR, JUDICIAL E ADMINISTRATIVAMENTE, NO DIREITO
BRASILEIRO, REGE-SE PELO PRINCÍPIO NEMO TENETUR SE
DETEGERE, QUE FACULTA AO INDICIADO/AUTUADO
ADOTAR OU NÃO A CONDUTA QUE PRODUZIRÁ A PROVA
QUE LHE SERÁ DESFAVORÁVEL. PRECEDENTES DO STF E
TRF´S (HC Nº 77.135/SP, REL. MIN. ILMAR GALVAO; HC Nº
79.812/SP, REL. MIN. CELSO DE MELLO; RHC Nº 34000071702, -
200234000071702/DF, REL. DES. FED. LUCIANO TOLENTINO
AMARAL, V.G.). - NÃO SE TRATANDO, NA ESPÉCIE, DE
DECLARAR A INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTAL DO
ART. 277 DA LEI Nº 9.503/97 -CTB, É DE SE LHE RESTRINGIR
UMA DAS INTERPRETAÇÕES POSSÍVEIS PARA AFASTAR
AQUELA QUE IMPLIQUE NA SUJEIÇÃO COMPULSÓRIA DO
CONDUTOR DE VEÍCULOS AUTOMOTORES A TESTES DE
ALCOOLEMIA, EXAMES CLÍNICOS, PERÍCIA OU OUTRO
EXAME QUE PERMITA A CERTIFICAÇÃO DE SEU ESTADO,
EM SEU PREJUÍZO. - PROCEDÊNCIA DO PEDIDO PARA
CONDENAR A UNIÃO NA OBRIGAÇÃO DE TOLERAR A
RECUSA DOS CONDUTORES DE VEÍCULOS DE SE
SUBMETEREM AOS MULTICITADOS TESTES, RESSALVADA A
PROVA DO FATO (EMBRIAGUEZ) PELOS DEMAIS MEIOS DE
PROVA JURIDICAMENTE ADMITIDOS. (TRF5 - Apelação Cível
nº 223518 - AC 200005000385751 – Primeira Turma – Rel. Des. Fed.
Alcides Saldanha – DJ 04/04/2003) (1)

Reforça por fim a Inconstitucionalidade da aplicabilidade de sanção fundamentada


pela recusa à submissão coercitiva da Administração referente a aplicação de
Notificação dada à não realização de teste de alcoolemia, o qual pedimos vênia para
reproduzir:

Numa interpretação conforme a constituição é de se reconhecer que a


norma supra [art. 277 do CTB] dirige-se à Administração Pública, não ao
Administrado. Isto porque a legislação não pode, em flagrante

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conflito com a Constituição Federal – art. 5º, LXIII, violar a


garantia constitucional contra a auto-incriminação. A Administração
está obrigada a tentar submeter o Administrado suspeito de haver
excedido os limites legalmente previstos para o consumo de bebidas
alcoólicas a teste de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame
que por meios técnicos ou científicos permita a comprovação da sua
condição, contudo o Administrado não está obrigado a se submeter a
tal exigência. A Administração deve propor, mas a realização da
aferição há de estar condicionada à sua concordância.
Ninguém, à luz das normas e princípios constitucionais, está
obrigado a produzir provas contra si mesmo pois o direito de punir,
judicial e administrativamente, no direito brasileiro, rege-se pelo
princípio nemo tenetur se detegere, que faculta ao indiciado/autuado
adotar ou não a conduta que produzirá a prova que lhe será
desfavorável.
O acórdão em tela arrima-se, ainda, em precedentes do STF e de
Tribunais Regionais Federais da 4ª e 1ª Regiões (HC Nº 77.135/SP, Rel.
Min. Ilmar Galvão; HC Nº 79.812/SP, Rel. Min. Celso de Mello; RHC
Nº 34000071702, - 200234000071702/DF, Rel. Des. Fed. Luciano
Tolentino Amaral, V.G.), evidenciando sua robustez e a temeridade de
esposar entendimento diverso que implique na compulsoriedade, por
parte do condutor de veículo automotor, de se submeter aos testes e
exames de alcoolemia.
Não obstante, considerando que a matéria ingressa na seara do Direito
Constitucional, nada melhor do que conhecer o entendimento que o
Pretório Excelso, a quem compete a guarda da Constituição nos termos
do art. 102, CRFB/88, expõe acerca do assunto. Nessa senda, o Supremo
Tribunal Federal, nos autos do Habeas Corpus nº 93.916-3/Pará, relatado
pela Ministra Cármen Lúcia em 10/06/2008, asseverou que é possível a
indicação de outros elementos juridicamente válidos, no sentido de que o
acusado estaria embriagado, ressalvando, contudo, que “não se pode
presumir que a embriaguez (sic) de quem não se submete a exame de
dosagem alcoólica: a Constituição da República impede que se extraia
qualquer conclusão desfavorável àquele que, suspeito ou acusado de
praticar alguma infração penal, exerce o direito de não produzir prova
contra si mesmo” (Habeas Corpus 93.916-3, do Pará – Primeira Turma
do STF – Rel. Min. Cármen Lúcia – j. 10/06/2008).
Referido julgado, além de evidenciar a inconstitucionalidade de
considerar apenas a recusa do suspeito em submeter-se ao exame de
alcoolemia como bastante para imputar-lhe o cometimento do ilícito,
evidencia a contemporaneidade das disposições de Direito alinhadas pelo
STJ no acórdão antes referido.

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Desta feita, resta claro que não há de se considerar a materialidade da minha conduta
na referida Autuação. Não há que se falar em aplicação de sanção em tais condições,
por contrariar todas as disposições legais de referência, razão pela qual não se opera
outra medida necessária senão o cancelamento da autuação ora aqui tratada.

II.VI. DAS VIOLAÇÕES CONSTITUCIONAIS DO ART. 165 CTB

Conforme averbou Celso Antônio Bandeira de Mello:

“Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema,


verdadeiro alicerce dele, dispositivo fundamental que se irradia sobre
diferentes normas compondo lhes o espírito e servindo de critério para
sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e
a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe
dá sentido harmônico.”

(…) Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma
qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um
específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos.
É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme
o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra
todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia
irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra”.
(2000, pp. 747 e 748).

Todavia, esse posicionamento já mereceu reprovações, havendo mesmo parecer por


parte da Procuradoria Geral da República no sentido da inconstitucionalidade no
dispositivo uma vez que sua incidência acabaria, por via indireta, como meio de
compelir o cidadão a se submeter a procedimento que possa ensejar autoincriminação.

Desta forma, temos posicionamento da Procuradoria Geral da República acerca da


recusa do motorista em concordar com a aferição de alcoolemia, o parecer da PGR na
ADI 4103 afirma que, “com fundamento no direito geral de liberdade, na garantia do
processo legal e das próprias regras democráticas do sistema acusatório de processo
penal, não se permite ao Estado compelir os cidadãos a contribuírem para a produção

14
15

de provas que os prejudiquem”. Trata-se do chamado direito à não incriminação, que


possui previsão normativa no direito internacional, no direito comparado e no direito
constitucional. No Direito Constitucional brasileiro, a vedação à autoincriminação é
identificada como princípio constitucional processual implícito, relacionada à cláusula
do devido processo legal e ao princípio da presunção de inocência. Mas, para a PGR, a
previsão contida na Lei Seca viola direito à não incriminação e não é admitida pela
normatividade constitucional e infraconstitucional, nem pela jurisprudência do STF e
pela doutrina especializada.

No mais, é incrível que o legislador ainda insista nessa espécie de coação


inconstitucional à produção de prova contra si mesmo (Princípio da não
autoincriminação), acrescentando a isso agora também uma flagrante violação ao
Princípio da Presunção de Inocência, Estado de Inocência ou não culpabilidade. O
dispositivo sob comento vem sofrendo as críticas da doutrina em seu confronto com
os Princípios Constitucionais sobreditos, aplicáveis ao caso mediante analogia a
disposições constitucionais (art. 5º, LVII e LXII, CF) e diplomas internacionais que
versam sobre Direitos Humanos e garantias individuais de que o Brasil é signatário.

Ainda que se considerasse que o nemo tenetur se detegere não tem aplicação no
campo administrativo, o que não se sustenta a partir da solar constatação de que nossa
Constituição estende o Devido Processo Legal, no bojo do qual se encontra o referido
princípio, aos processos administrativos (art. 5º, LV, CF), não se poderia esquecer que
para além da infração administrativa em casos de embriaguez ao volante, estamos ante
a real possibilidade de responsabilização criminal do suposto infrator (artigo 306,
CTB, sem falar do novo artigo 291, § 1º, I, CTB).

II.VII. DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE


INOCÊNCIA – ART. 5º, LXII

Este princípio é um instituto previsto no artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal
de 1988 e refere-se a um tipo de garantia processual que se atribui ao acusado,
oferecendo a ele a prerrogativa de não ser considerado culpado por qualquer ato
delituoso até que a sentença penal condenatória transite em julgado, garantindo ainda
ao acusado um julgamento justo que respeite à dignidade da pessoa humana.

De acordo com Moraes, em regra, direitos constitucionais definidos como direitos


fundamentais democráticos e individuais são de eficácia e aplicabilidade imediata. E a
própria Constituição Federal, em uma norma síntese, determina esse fato, expressando

15
16

que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação


imediata, e ainda leciona que o princípio da presunção de inocência é um dos
princípios basilares do Estado de Direito. E como garantia processual penal, visa à
tutela da liberdade pessoal, salientando a necessidade de o Estado comprovar a
culpabilidade do indivíduo, que é de forma constitucional presumido inocente, sob
pena de retrocedermos ao estado de total arbítrio estatal. (MORAES, 2007).

No mais, pode-se dizer que se trata de um princípio que se encontra manifestado de


forma implícita em nosso ordenamento.

Pode-se perceber, que o princípio constitucional da presunção de inocência é


considerado um dos mais importantes e intrigantes institutos do ordenamento jurídico.

Todavia, ressalta-se que os princípios constitucionais são instrumentos limitadores do


poder estatal e principalmente garantem a proteção da dignidade da pessoa humana.

O instituto da inocência presumida é, portanto, garantia fundamental e instituto


essencial ao exercício da jurisdição.

Para tanto, cite-se as palavras de Ferrajoli

“que a presunção de inocência não é apenas uma garantia de liberdade e


de verdade, mas também uma garantia de segurança ou, se quisermos,
de defesa social” (FERRAJOLI, 2010, p.506).”

Assim vejamos os entendimentos jurisprudenciais:

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL.


IMPOSSIBILIDADE DE SE EXTRAIR QUALQUER CONCLUSÃO
DESFAVORÁVEL AO SUSPEITO OU ACUSADO DE PRATICAR
CRIME QUE NÃO SE SUBMETE A EXAME DE DOSAGEM
ALCOÓLICA. DIREITO DE NÃO PRODUZIR PROVA CONTRA
SI MESMO: NEMO TENETUR SE DETEGERE. INDICAÇÃO DE
OUTROS ELEMENTOS JURIDICAMENTE VÁLIDOS, NO
SENTIDO DE QUE O PACIENTE ESTARIA EMBRIAGADO:
POSSIBILIDADE. LESÕES CORPORAIS E HOMICÍDIO CULPOSO
NO TRÂNSITO. DESCRIÇÃO DE FATOS QUE, EM TESE,
CONFIGURAM CRIME. INVIABILIDADE DO TRANCAMENTO
DA AÇÃO PENAL. 1. Não se pode presumir que a embriaguez de
quem não se submete a exame de dosagem alcoólica: a Constituição
da República impede que se extraia qualquer conclusão desfavorável

16
17

àquele que, suspeito ou acusado de praticar alguma infração penal,


exerce o direito de não produzir prova contra si mesmo: Precedentes.
2. Descrevendo a denúncia que o acusado estava “na condução de
veículo automotor, dirigindo em alta velocidade” e “veio a colidir na
traseira do veículo” das vítimas, sendo que quatro pessoas ficaram
feridas e outra “faleceu em decorrência do acidente automobilístico”, e
havendo, ainda, a indicação da data, do horário e do local dos fatos, há,
indubitavelmente, a descrição de fatos que configuram, em tese, crimes.
3. Ordem aprovada. (HC 93916, Relator (a): Min. CÁRMEN LÚCIA,
Primeira Turma, julgado em 10/06/2008, DJe-117 DIVULG 26-06-2008
PUBLIC 27-06-2008 EMENT VOL-02325-04 PP-00760 RTJ VOL-
00205-03 PP-01404).

De tal forma, o condutor não poderá sofrer quaisquer sanções administrativas por
causa da recusa em realizar testes e exames, tendo em vista que na ausência de prova
da sua efetiva utilização de substância psicoativa, há de prevalecer a presunção de
inocente.

II.VIII. DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA NÃO


AUTOINCRIMINAÇÃO – ART. 5º, LXIII

O princípio (a garantia) da não autoincriminação (Nemo tenetur se detegere ou Nemo


tenetur se ipsum accusare ou Nemo tenetur se ipsum prodere) significa que ninguém é
obrigado a se autoincriminar ou a produzir prova contra si mesmo (nem o suspeito ou
indiciado, nem o acusado, nem a testemunha etc.).

Nenhum indivíduo pode ser obrigado, por qualquer autoridade ou mesmo por um
particular, a fornecer involuntariamente qualquer tipo de informação ou declaração ou
dado ou objeto ou prova que o incrimine direta ou indiretamente.

Fiori (2008, p. 45) caracteriza o Nemo Tenetur se Detegere como o direito


fundamental de que ninguém poderá ser obrigado a colaborar ou produzir prova contra
si mesmo. Nucci (2007, p. 91) chega a afirmar que exigir a colaboração do acusado
seria a admissão da falência da máquina estatal e a fraqueza das autoridades se
dependesse do suspeito para colher elementos suficientes a embasar a ação.

17
18

Vejamos o que dispõe Convenção Americana de Direitos Humanos – CADH (art. 8º,
2, “g”) :

Artigo 8º – Garantias judiciais:

[…]

1. Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma


sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa.
Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às
seguintes garantias mínimas:
[…]

1. g) direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a


confessar-se culpada;

E o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos – PIDCP (art. 14, 3, “g”):

Artigo 14:

[…]

1. Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena


igualmente, a, pelo menos, as seguintes garantias:
[…]

1. g) De não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a


confessar-se culpada.

No sentido de que o princípio da não autoincriminação pressupõe a existência de


vontade em decidir o que fazer ou não. É o que se vê dos seguintes acórdãos do STF:

“HABEAS CORPUS – JÚRI – RECONSTITUIÇÃO DO CRIME –


CERCEAMENTO DE DEFESA – NÃO-INTIMAÇÃO DO
DEFENSOR PARA A RECONSTITUIÇÃO DO DELITO – PACIENTE
QUE SE RECUSA A PARTICIPAR DA REPRODUÇÃO SIMULADA
DOS FATOS – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO CONTRADITORIO –
INOCORRENCIA – PRISÃO CAUTELAR – INSTITUTO
COMPATIVEL COM O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA NÃO-
CULPABILIDADE (CF, ART. 5., LVII) – CONCESSÃO DE
LIBERDADE PROVISÓRIA – MERA FACULDADE JUDICIAL –
ORDEM DENEGADA. – A RECONSTITUIÇÃO DO CRIME

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19

CONFIGURA ATO DE CARÁTER ESSENCIALMENTE


PROBATÓRIO, POIS DESTINA-SE – PELA REPRODUÇÃO
SIMULADA DOS FATOS – A DEMONSTRAR O MODUS
FACIENDI DE PRÁTICA DELITUOSA (CPP, ART. 7.). O SUPOSTO
AUTOR DO ILÍCITO PENAL NÃO PODE SER COMPELIDO,
SOB PENA DE CARACTERIZAÇÃO DE INJUSTO
CONSTRANGIMENTO, A PARTICIPAR DA REPRODUÇÃO
SIMULADA DO FATO DELITUOSO. O MAGISTÉRIO
DOUTRINÁRIO, ATENTO AO PRINCÍPIO QUE CONCEDE A
QUALQUER INDICIADO OU RÉU O PRIVILÉGIO CONTRA A
AUTOINCRIMINAÇÃO, RESSALTA A CIRCUNSTÂNCIA DE
QUE É ESSENCIALMENTE VOLUNTÁRIA A PARTICIPAÇÃO
DO IMPUTADO NO ATO – PROVIDO DE INDISCUTÍVEL
EFICÁCIA PROBATÓRIA – CONCRETIZADOR DA
REPRODUÇÃO SIMULADA DO FATO DELITUOSO. – A
RECONSTITUIÇÃO DO CRIME, ESPECIALMENTE QUANDO
REALIZADA NA FASE JUDICIAL DA PERSECUÇÃO PENAL,
DEVE FIDELIDADE AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO
CONTRADITÓRIO, ENSEJANDO AO RÉU, DESSE MODO, A
POSSIBILIDADE DE A ELA ESTAR PRESENTE E DE, ASSIM,
IMPEDIR EVENTUAIS ABUSOS, DESCARACTERIZADORES DA
VERDADE REAL, PRATICADOS PELA AUTORIDADE PÚBLICA
OU POR SEUS AGENTES. – NÃO GERA NULIDADE
PROCESSUAL A REALIZAÇÃO DA RECONSTITUIÇÃO DA CENA
DELITUOSA QUANDO, EMBORA AUSENTE O DEFENSOR
TECNICO POR FALTA DE INTIMAÇÃO, DELA NÃO PARTICIPOU
O PRÓPRIO ACUSADO QUE, AGINDO CONSCIENTEMENTE E
COM PLENA LIBERDADE, RECUSOU-SE, NÃO OBSTANTE
COMPARECENDO AO ATO, A COLABORAR COM AS
AUTORIDADES PUBLICAS NA PRODUÇÃO DESSA PROVA. – A
LEGITIMIDADE JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DAS NORMAS
LEGAIS QUE DISCIPLINAM A PRISÃO PROVISORIA EM NOSSO
SISTEMA NORMATIVO DERIVA DE REGRA INSCRITA NA
PROPRIA CARTA FEDERAL, QUE ADMITE – NÃO OBSTANTE A
EXCEPCIONALIDADE DE QUE SE REVESTE – O INSTITUTO DA
TUTELA CAUTELAR PENAL (ART. 5., LXI). O PRINCÍPIO
CONSTITUCIONAL DE NÃO-CULPABILIDADE, QUE DECORRE
DE NORMA CONSUBSTANCIADA NO ART. 5., LVII, DA
CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA, NÃO IMPEDE A UTILIZAÇÃO,
PELO PODER JUDICIARIO, DAS DIVERSAS MODALIDADES QUE
A PRISÃO CAUTELAR ASSUME EM NOSSO SISTEMA DE
DIREITO POSITIVO. – O RÉU PRONUNCIADO – AINDA QUE
PRIMARIO E DE BONS ANTECEDENTES – NENHUM DIREITO
TEM A OBTENÇÃO DA LIBERDADE PROVISORIA. A

19
20

PRESERVAÇÃO DO STATUS LIBERTATIS DO ACUSADO


TRADUZ, NESSE CONTEXTO, MERA FACULDADE.” (HC
69.026/DF, Rel. Min. Celso de Mello, Primeira Turma, julgado em
10/12/1991, DJ de 04/09/1992, p. 14091).

II.IX. DAS VIOLAÇÕES AS DECISÕES JUDICIAIS UNÍSSONAS AO


DIREITO PLEITEADO PELO AUTOR

Não obstante, todo exposto conclamado, trazemos algumas decisões judiciais que
demonstram como o judiciário tem decidido nestes casos:

Multa por se recusar a fazer o teste é inconstitucional! (imperatativo nosso):


PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. AUTO DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. TESTE DO
BAFÔMETRO. RECUSA. NECESSIDADE DE OUTROS MEIOS DE
PROVA. ANULAÇÃO.
– O art. 277 do CTB dispõe que a verificação do estado de embriaguez,
ao menos para cominação de penalidade administrativa, pode ser feita
por outros meios de prova que não o teste do etilômetro.
A despeito das discussões acerca do art. 277, §3º, CTB, a jurisprudência
exige que a embriaguez esteja demonstrada por outros meios de prova,
não podendo ser decorrência automática da recusa em realizar o teste. –
Quando, além de não ter se envolvido em acidente de trânsito, não há
nenhum indício externo de que o condutor esteja dirigindo sob o efeito
de bebidas alcoólicas, a simples recusa em fazer o teste do etilômetro
(‘bafômetro’) não pode ser considerada como caracterizadora do estado
de embriaguez. não preencheu o termo de constatação ou fez constar no
auto de infração ou no próprio boletim de ocorrência qualquer das
informações acima referidas.
Ao contrário de outras irregularidades suscitadas pela parte autora, a falta
de exame, teste, perícia ou termo de constatação que aponte a
embriaguez do autor constitui falta grave e insanável, que diz respeito à
própria prova da materialidade do ato infracional e cuja ausência torna
insubsistente o auto de infração.

20
21

Deve constar no auto de infração a fundamentação da exigência do


etilômetro. Agravo de Instrumento nº 5027527-62.2015.4.04.0000/RS –
3ª Turma do Tribunal Regional Federal da Quarta Região.

(TRF4, AI nº 5006245-46.2013.404.7110/RS, 3ª Turma, Rel. Des.


Federal Fernando Quadros da Silva, D.E. 12/02/2015)

ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. AUTO DE INFRAÇÃO


DE TRÂNSITO. TESTE DO BAFÔMETRO. RECUSA.
NECESSIDADE DE OUTROS MEIOS DE PROVA. ANULAÇÃO.
1) O art. 277 do CTB dispõe que a verificação do estado de embriaguez,
ao menos para cominação de penalidade administrativa, pode ser feita
por outros meios de prova que não o teste do etilômetro. A despeito das
discussões acerca do art. 277, §3º, CTB, a jurisprudência exige que a
embriaguez esteja demonstrada por outros meios de prova, não podendo
ser decorrência automática da recusa em realizar o teste.
2) Quando, além de não ter se envolvido em acidente de trânsito, não há
nenhum indício externo de que o condutor esteja dirigindo sob o efeito
de bebidas alcoólicas, a simples recusa em fazer o teste do etilômetro
(‘bafômetro’) não pode ser considerada como caracterizadora do estado
de embriaguez. Deve constar no auto de infração a fundamentação da
exigência do etilômetro. Anulação do Auto de Infração.
(TRF4, AC nº 5008069-64.2013.404.7102/RS, 3ª Turma, Rel. Juíza
Federal Salise Monteiro Sanchotene, D.E. 14/04/2015)

Estas decisões judiciais já têm sido acolhidas também na esfera administrativa, onde
se tem conseguido anular um número cada vez maior de infrações onde não há
qualquer registro de sinal ou sintoma de embriaguez. Tais decisões têm sido
embasadas também em um princípio válido no direito brasileiro que é chamado de
Nemo tenetur se detegere (nome em latim), ou também conhecido como princípio da
não autoincriminação. Este princípio é consagrado em nossa Constituição Federal no
art. 5º, mas sua previsão é feita de forma expressa no Pacto de São José da Costa Rica,
no artigo 8º, inciso 2, alínea g.
Assim, podemos concluir que a matéria sobre a lei seca apresenta várias nuances que a
tornam um dos pontos de nossa legislação que mais sofreu alterações nos últimos
anos. Não só isso, apesar das inúmeras reformas ainda pairam muitas dúvidas sobre
sua aplicabilidade.

21
22

O Judiciário vem reformando as aplicações administrativas de infrações com base


apenas no artigo 277, parágrafo 3º, por entender que são necessários mais elementos
para impor as penalidades administrativas ao Condutor do que a simples recusa ao
exame de embriaguez. Este entendimento repercute em toda a esfera administrativa,
vez que as decisões administrativas são passíveis de reforma pelo Judiciário, com isso
as multas da lei seca podem ser canceladas.
As autoridades administrativas deverão acompanhar o entendimento do Judiciário,
pois adotar um procedimento diferente daquele que é definido como correto pelo
Poder Judiciário é um contrassenso, mas mais do que isto, é a violação de princípios
que regem o direito administrativo, tal como o da economicidade, eficiência e
moralidade.
A própria legislação (artigo 277, §2°, do CTB) e o Contran (Resolução n° 423/2013)
divergem com a redação do artigo 165-A, já que, determinam outros meios para a
produção da prova da embriaguez. Se é possível a constatação da alteração da
capacidade psicomotora por tantos outros meios de prova, não existe a obrigatoriedade
do etilômetro e, consequentemente, não haveria motivo para punir a sua recusa.
Em razão da recente vigência da lei, ainda não há decisões sobre a temática em
específico, entretanto, a recusa do bafômetro já havia sido protegida por decisões
exaradas pelo Judiciário, sustentando a aplicabilidade do princípio nemo tenetur se
detegere, citando o dispositivo constitucional que assegura tal direito. Alguns
exemplos:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. AUTO DE INFRAÇÃO


DE TRÂNSITO. TESTE DO BAFÔMETRO. RECUSA. – O art. 277 do
CTB dispõe que a verificação do estado de embriaguez, ao menos para
cominação de penalidade administrativa, pode ser feita por outros meios
de prova que não o teste do etilômetro. A despeito das discussões acerca
do art. 277, §3º, CTB, a jurisprudência exige que a embriaguez esteja
demonstrada por outros meios de prova, não podendo ser
decorrência automática da recusa em realizar o teste. (TRF4, AC
5001367-22.2015.404.7106, TERCEIRA TURMA, Relator p/ Acórdão
RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em
12/05/2016)

ADMINISTRATIVO. TRÂNSITO. AUTO DE INFRAÇÃO. TESTE


DO BAFÔMETRO. RECUSA. NECESSIDADE DE OUTROS
MEIOS DE PROVA. ANULAÇÃO. O art. 277, caput e § 3º, do
Código de Trânsito Brasileiro, com a redação dada pela Lei n.º

22
23

12.760/12, dispõe que ao condutor que se recusa a realizar o teste do


bafômetro serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas
estabelecidas no seu art. 165. A embriaguez deve ser demonstrada por
outros meios de prova, não podendo ser atestada como decorrência
automática da recusa do condutor de realizar o teste do etilômetro
(“bafômetro”). Precedentes. (TRF4 5014123-06.2014.404.7201,
QUARTA TURMA, Relatora p/ Acórdão VIVIAN JOSETE
PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 03/05/2016)

ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA. TRÂNSITO.


AUTO DE INFRAÇÃO E NOTIFICAÇÃO DE AUTUAÇÃO. ART.
165 E 277 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO. RECUSA EM FAZER O
TESTE DO “BAFÔMETRO”. AUSÊNCIA DE SINAIS DE
EMBRIAGUEZ. FALTA DE PROVAS. 1. Consta dos autos que a
autoridade afirmou que a autuação ocorreu diante da recusa do autor em
realizar o teste do etilômetro. A despeito das discussões acerca do art.
277, §3º, CTB, a jurisprudência exige que a embriaguez esteja
demonstrada por outros meios de prova, não podendo ser decorrência
automática da recusa em realizar o teste. 2. A antecipação de tutela
deve ser concedida para que, até o julgamento final da ação, seja
suspensa a penalidade de impossibilidade de uso da CNH, bem como a
multa, no que se refere somente à infração prevista no artigo 277,
parágrafo terceiro, c/c artigo 165, do CTB. (TRF4, AG 5001455-
04.2016.404.0000, TERCEIRA TURMA, Relatora p/ Acórdão MARGA
INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 07/04/2016)

II.X. DO ÔNUS DA PROVA:

Cumpre destacar ainda que o ônus da prova da alegação da recusa em se submeter a


qualquer verificação do estado de embriaguez é de quem alega, ou seja, do agente
público que lavrou o auto de infração. Cabe destacar que não há qualquer
comprovação da recusa em se submeter aos outros testes que evidenciem a suposta
embriaguez, o que restringe-me a ser submetido a imputação do art. 165 do CTB
apenas pela a recusa do teste do etilômetro, o que inclusive vai contra o que dispõe o
próprio artigo de lei.
O artigo 165-A do CTB afirma que recusar-se a ser submetido a teste, exame clínico,
perícia ou outro procedimento que permita certificar influência de álcool ou outra
substância psicoativa é causa de imputação de infração administrativa, porém tal

23
24

dispositivo não dispõe quantas recusas devem ocorrer para a configuração da infração,
não existindo nem na doutrina um entendimento consolidado sobre o tema.
Veja, não me recusei a realizar qualquer exame clínico ou outro procedimento que
atestasse meu suposto estado de embriaguez, este se recusou apenas em ser submetido
ao exame do etilômetro. É sabido que os agentes administrativos devem pautar seus
atos segundo os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Dessa forma, se
torna desproporcional me responsabilizar de forma tão gravosa por uma conduta que a
própria legislação deixa margem a dúvidas e que para uma parte dos doutrinadores vai
de encontro contra a Constituição Federal.
Pelo princípio da universalidade do direito ao trânsito seguro, previsto no art. 1º, § 2º,
do Código de Trânsito Brasileiro c/c art. 144, § 10, I, II, da Constituição Federal, o
agente autuador, através da fiscalização, deve trabalhar para que haja a preservação da
ordem pública e da incolumidade das pessoas e do seu patrimônio. Todavia, não se
pode chegar ao exagero de punir quem não oferece nenhum risco, como no caso em
tela.
Por esse motivo, e seguindo o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade,
pautado pelos prejuízos que posso sofrer caso seja imputado a infração prevista no art.
165. Entretanto, requeiro a anulação e arquivamento do auto de infração.

II.XI DO CABIMENTO DO PRINCÍPIO DA NÃO AUTO-


INCRIMINAÇÃO:

A decisão ainda afirma que quanto a recursos administrativos a lei distinguiu


claramente a esfera criminal, onde o acusado não pode ser punido por se negar a
produzir prova contra si, já na esfera administrativa, não é possível a aplicação
da regra probatória derivada do princípio da presunção de inocência, uma vez
que a infração de trânsito é ilícito civil, ou seja, tal princípio só é cabível na
esfera criminal.
É sabido que o princípio da não auto-incriminarão tem base constitucional,
estando disposto em seu artigo 5º, mas também é previsto de forma expressa no
Pacto de São José da Costa Rica, no artigo 8º, inciso 2, alínea g, cuja redação é
a seguinte:

Art. 8º – Garantias judiciais:

24
25

2. Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se


presuma sua inocência, enquanto não for legalmente
comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem
direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:
g) direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a
confessar-se culpada.
Importante a observação de que o princípio da não auto-incriminação está
prevista no Pacto de São José da Costa Rica, que possui status de supra
legalidade, devendo prevalecer sobre legislação ordinária que o contrarie.
Concluímos com o enunciado do artigo que por força do Tratado, ou em face da
Constituição Federal tal princípio não se limita apenas na esfera criminal,
podendo ser utilizado em qualquer esfera, incluindo a administrativa. Seria
inclusive contraditório a não incidência de tal princípio na esfera administrativa,
uma vez que o mesmo pode ser invocado no PAD (Processo administrativo
disciplinar) que faz parte da esfera administrativa.

Dessa forma é o entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça,


vejamos:

“RECURSO ORDINÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA – PROCESSO


ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – EMBRIAGUEZ HABITUAL NO
SERVIÇO – COAÇÃO DO SERVIDOR DE PRODUZIR PROVA CONTRA
SI MESMO, MEDIANTE A COLETA DE SANGUE, NA COMPANHIA DE
POLICIAIS MILITARES – PRINCÍPIO DO NEMO TENETUR SE
DETEGERE – VÍCIO FORMAL DO PROCESSO ADMINISTRATIVO –
CERCEAMENTO DE DEFESA – DIREITO DO SERVIDOR À LICENÇA
PARA TRATAMENTO DE SAÚDE E, INCLUSIVE, À APOSENTADORIA
POR INVALIDEZ – RECURSO PROVIDO1.
É inconstitucional qualquer decisão contrária ao princípio nemo tenetur se
detegere, o que decorre da inteligência do art. 5º, LXIII, da Constituição da
República e art. 8º, § 2º, g, do Pacto de São José da Costa Rica. Precedentes.2.
Ocorre vício formal no processo administrativo disciplinar, por cerceamento de
defesa, quando o servidor é obrigado a fazer prova contra si mesmo, implicando
a possibilidade de invalidação da penalidade aplicada pelo Poder Judiciário, por

25
26

meio de mandado de segurança.3. A embriaguez habitual no serviço, ao


contrário da embriaguez eventual, trata-se de patologia, associada a distúrbios
psicológicos e mentais de que sofre o servidor.4. O servidor acometido de
dependência crônica de alcoolismo deve ser licenciado, mesmo
compulsoriamente, para tratamento de saúde e, se for o caso, aposentado por
invalidez, mas nunca demitido, por ser titular de direito subjetivo à saúde e
vítima do insucesso das políticas públicas sociais do Estado.5. Recurso provido
(RMS 18007, 6ª T., Rel. Min. Paulo Medina, DJU 02.05.2006, p. 390).
Como decorrência deste princípio, o cidadão ao se negar a se submeter à prova
do etilômetro atesta um mero exercício regular de um direito. Como tal, ato
perfeitamente lícito, a teor do artigo 23, inciso III, do Código Penal, não
devendo ser punível como expressa o Código de Trânsito Brasileiro.
Recusar-se a soprar o etilômetro, em que não pode ser obrigado a fazer, sendo
uma faculdade, e a sua negativa não deve ser de qualquer modo prejudicial à
sua defesa, seja no âmbito criminal, quanto no administrativo. Posto isto, não
será lícito fazê-lo sofrer a incidência das penalidades previstas no art. 165-A, do
CTB, a menos que se aceite que em um Estado Democrático de Direito possa
alguém vir a ser penalizado por estar no exercício regular de um direito previsto
na Constituição Federal, qual seja, a não auto-incriminação.

Da mesma forma é o entendimento do doutrinador Luiz Flávio Gomes que


afirma que: “as dimensões do direito de não auto-incriminação que acabamos de
elencar valem (são vigentes, incidem) tanto para a fase investigatória (qualquer
que seja ela: inquérito policial, CPI etc.) como para a fase processual
(propriamente dita). Vale também perante qualquer outro juízo (trabalhista,
civil, administrativo etc.) É irracional imaginar que alguém possa invocar a
garantia perante o juízo penal, sendo obrigado a se incriminar perante um juízo
trabalhista, civil, administrativo etc. A prova decorrente dessa auto-
incriminação lhe compromete”.

Da mesma forma é o entendimento da jurisprudência quanto à recusa em se


submeter a teste do etilômetro com base no princípio da não auto-incriminação:
“APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. INFRAÇÃO DE
TRÂNSITO. RECUSA EM REALIZAR TESTE DE ALCOOLEMIA

26
27

(BAFÔMETRO). APLICAÇÃO DE MULTA E DE SUSPENSÃO DO


DIREITO DE DIRIGIR. SENTENÇA QUE DENEGOU A SEGURANÇA.
IRRESIGNAÇÃO DO IMPETRANTE.
O impetrante foi autuado em fiscalização conhecida como Lei Seca por estar
conduzindo veículo e ter-se negado à realização do teste de alcoolemia.
Denegada a segurança, sob o fundamento de falta de provas capazes de elidir a
presunção de legalidade e legitimidade de que gozam os atos administrativos,
apelou o autor. A recusa em submeter-se ao teste do bafômetro não implica, por
si só, em inexorável reconhecimento de estado de embriaguez, sob pena de
violação da vedação a autoincriminação, do direito ao silêncio, da ampla defesa
e do princípio da presunção de inocência. Se o indivíduo não pode ser
compelido a se autoincriminar, nemo tenetur se detegere, não pode ser obrigado
a efetuar o referido teste do bafômetro, competindo à autoridade fiscalizadora
provar a embriaguez por outros meios de modo a aplicar as sanções previstas
pelo artigo 165 do Código de Trânsito Brasileiro. Não há qualquer menção
sequer sobre a tentativa de realização de prova indireta que pudesse atestar o
estado de ebriedade do condutor no momento da abordagem. Concessão da
segurança ao impetrante, ora recorrente, para que o impetrado se abstenha de
apreender a sua carteira de habilitação, devolvendo-lhe o prazo legal para
apresentação de recurso, com o devido contraditório e ampla defesa.
CONCESSÃO DA ORDEM. RECURSO CONHECIDO e PROVIDO
(0417843-17.2014.8.19.0001 – APELAÇÃO; Des (a). CEZAR AUGUSTO
RODRIGUES COSTA - Julgamento: 14/02/2017 - OITAVA CÂMARA
CÍVEL).”
“AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO.
OPERAÇÃO "LEI SECA". RECUSA EM REALIZAR TESTE DE
ALCOOLEMIA (BAFÔMETRO). AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO NO AUTO
DE INFRAÇÃO DE SINAIS DE EMBRIAGUEZ. ART. 277, CAPUT, DO
CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. NULIDADE DO AUTO.
SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. REFORMA.Vigia à época
dos fatos narrados a redação dada pela Lei 11.275/2006 ao art. 277, caput, do
Código de Trânsito Brasileiro, a dispor que o condutor de veículo alvo de
fiscalização seria submetido a exame caso houvesse suspeita de ingestão de
álcool. Contudo, no auto de infração impugnado, ou em qualquer outro
elemento dos autos, não há anotação de indícios nesse sentido, ao passo que o
art. 277, § 3º, do referido diploma (ao prever a penalidade a quem se recusar a

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realizar o teste do bafômetro), deve ser interpretada em harmonia com o


disposto no caput. Por outro lado, sabendo-se que o ato administrativo tem
presunção de veracidade e legitimidade, com a indicação de sinais de
embriaguez passaria a militar presunção em desfavor do condutor, que poderia
ser desfeita com a realização do teste de alcoolemia (bafômetro). Mas diante da
ausência de anotação dos referidos indícios, nenhuma presunção foi feita contra
o demandante. Finalmente, a recusa em realizar o teste é legítima, diante do
direito de não autoincriminação previsto no Pacto de San José da Costa Rica, do
qual o Brasil é signatário, não podendo ser aplicada penalidade pela simples
negativa de realização. Assim, diante da ausência de regularidade no auto de
infração, e sendo legítima a recusa em realizar o teste do bafômetro, mostra-se
nulo o auto de infração, devendo ser reformada a sentença.Precedentes.
PROVIMENTO DO RECURSO. (TJ-RJ - APL: 01699181420118190001 RJ
0169918-14.2011.8.19.0001, Relator: DES. CARLOS SANTOS DE
OLIVEIRA, Data de Julgamento: 20/08/2013, VIGÉSIMA SEGUNDA
CÂMARA CIVEL, Data de Publicação: 25/09/2013 14:02).
Entretanto, por todo o exposto, concluísse que o artigo 165-A, do CTB está em
descompasso com a Constituição Federal, ferindo o direito da não-
autoincriminação (art. 5º, inciso LXIII), já que, ao exercer tal direito, o condutor
será punido na via administrativa.

X.XII DOS PEDIDOS

Por todo exposto, requer:


a) Que seja acolhida a preliminar suscitada, para que essa Egrégia Junta de Recurso de
Infrações receba o presente recurso com efeito suspensivo, para se abster de lançar
qualquer restrição, inclusive para fins de licenciamento e transferência, nos arquivos
do órgão ou entidade executivo de trânsito responsável pelo registro do veículo até
que a presente demanda seja julgada.

b) Conforme dispõe o CTB, jurisprudências de nosso Egrégio Tribunal de Justiça,


bem como os doutrinadores supra citados, que seja mantida a integralidade da minha
CNH até que se esgotem todas as possibilidades de exercer meu amplo direito de
defesa, conforme prevê também a nossa Constituição Federal, em seu artigo 5o.

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e) Caso não seja esse entendimento desta Junta de Recurso de Infrações, que seja
acolhida a presente defesa em desfavor da notificação da autuação de infração de
trânsito, na forma das razões apresentadas, juntamente com as documentações anexas,
com o seu regular processamento, apreciação, e ao final o acolhimento das
preliminares nesta peças aventadas, de acordo com Código de Transito Brasileiro,
para julgar inconsistente o AIT de número A000859572 , gerando a correta e legal
anulação do Auto de Infração ora recorrido, com a consequentemente determinação de
cancelamento da penalidade e, posterior arquivamento do mesmo;

f) Requer também que seja respeitada a Constituição Federal e o Pacto de São José da
Costa Rica, onde Vossa Senhoria apresente uma decisão legalmente fundamentada;
para que, no caso de não acolhimento do pedido mencionado na alínea “A”, esta servir
de subsídios para uma ‘possível’ correção da ilegalidade e dos atos de quem
administrativamente tem obrigação de corrigi-los (SÚMULA 473 STF), via Poder
Judiciário, de maneira a fundamentar o não acolhimento de maneira técnica e
precisa.

g) Requer a imediata exclusão dos pontos registrados no meu prontuário com a


intimação via postal do resultado da decisão, para requerer o que entender de direito.
h) Protesta provar por todos os meios de provas em direito admitidos.
i) Por fim requer seja o presente recurso julgado TOTALMENTE PROCEDENTE,
declarando o auto de infração objeto da lide INSUBSISTENTE, gerando assim a
ANULAÇÃO E ARQUIVAMENTO do mesmo, nos termos da fundamentação retro,
por medida da mais lídima e salutar JUSTIÇA!

Nestes Termos, pede deferimento.

Rio Branco, AC 01 de novembro de 2021

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AVERALDO AZEVEDO DE OLIVEIRA

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