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Temos então ao lado da sociedade nacional/interna (à qual se aplica o Direito Interno) a sociedade
internacional (à qual se aplica o Direito Internacional).
- Para sabermos importa que nos detenhamos nas particulares históricas em que surgiu o
direito internacional na sua forma moderna.
Dentro dos vários obstáculos que, durante a idade media, entravaram a concentração de
poderes que é própria do estado moderno, dois merecem destaque especial.
® FEUDALISMO: em traços gerais, podemos caracterizar como um sistema de
organização social baseado na propriedade da terra e em laços de servidão pessoal
entre vassalos e os seus senhores. O dever de lealdade do vassalo ao senhor passou
ao dever de fidelidade do súbdito perante o rei. A assimilação, por outra parte, de
direitos de natureza política a verdadeiros direitos de propriedade, favoreceu o
entendimento do governo como poder realmente absoluto.
- As raízes do moderno direito internacional, que nos revelam em simultâneo duas funções
que, desde o início da sua existência ele é chamado a desempenhar são:
1. Compete lhe permitir a coexistência entre estados heterogéneos e juridicamente
iguais, num clima de paz.
2. Cabe lhe satisfazer necessidades e interesses comuns que, entretanto, começaram
a surgir entre os membros da comunidade internacional.
® Podemos então resumir as duas funções principais cometidas ao direito internacional
desde a paz de Westfália à coexistência e cooperação.
V – Os termos sociedade e comunidade internacional
- Definimos o direito internacional como o direito que se aplica à sociedade internacional.
Mas, certo é, que ele também é muitas vezes apresentado como sendo o direito da
comunidade internacional.
- Tendo em conta que temos vindo a utilizar indistintamente os dois termos, cumpre tornar
claro que, em bom rigor, eles não são sinónimos.
- Fica a dever-se a uma conhecida teoria sociológica alemã a distinção entre comunidade e
sociedade. A tal propósito escreve Marcelo Caetano:
‘’...a primeira será, pois, um produto espontâneo da vida social que
se estrutura naturalmente, enquanto a segunda resulta da vontade
dos indivíduos manifestada em obediência a um certo propósito que
os leva a juntar-se a colaborar entre si. Desta maneira encontramo-
nos nas comunidades, mas encontramos nas associações. Na
comunidade os membros estão unidos apesar de tudo quanto os
separa; na associação permanecem separados apesar de tudo
quanto os faça unir.’’
Deriva do exposto que em qualquer agrupamento se encontram entre os seus membros
interesses comuns e interesses divergentes ou fatores de agregação/aproximação e fatores
de conflito/afastamento. Pois bem, de acordo com a teoria a que temos feito referência, na
comunidade os fatores de agregação superam os conflitos, passando se exatamente o
contrário na sociedade.
- À primeira vista, o conceito de comunidade internacional constituirá uma pura utopia. São
por demais evidentes os desequilíbrios e os elementos de tensão na sociedade internacional,
de tal sorte que parece não haver aí lugar para a coesão, a afetividade e a solidariedade que
os laços comunitários necessariamente pressupõem.
- É também questionável a existência, nas relações interestaduais, de um importante
elemento subjetivo que radica na vontade de os Estados viverem em comum, apesar de tudo
aquilo que os separa. Importa reconhecer que, em torno de um conjunto de valores e
princípios fundamentais, que correspondem a outras tantas exigências mínimas de sã
convivência, se terá formado já um assentimento geral entre os sujeitos primários da
comunidade internacional.
® Pode ainda acrescentar-se que o vínculo comunitário assenta, de igual modo, na
consideração da sociedade internacional como comunidade jurídica, isto é, na
circunstância de todos os estados estarem submetidos ao mesmo ordenamento jurídico e,
consequentemente, também às instituições encarregadas de o aplicar, sobretudo a ONU.
- Como quer seja, parece claro que perpassem dois movimentos antinómicos nas relações
interestaduais:
® De um lado, a tendência para os estados afirmarem a sua soberania e independência;
® De outro lado, a sua aspiração a uma verdadeira comunidade;
Ora o direito internacional nasce destes dois movimentos de sinal contrário, tendo por
objetivo compatibilizá-los e harmonizá-los.
- Para concluir este ponto, sublinhe-se ainda que um direito internacional clássico, enquanto
ordem jurídica de mera coordenação de soberanias estaduais, tem vindo a suceder um
direito internacional moderno, paulatinamente constituído após a 2° guerra mundial, que
não repousa já na soberania absoluta e inatingível do estado, mas que, cada vez mais, se
vai abrindo a novos domínios onde prevalecem a coesão e solidariedade entre os estados.
Vale isto por dizer que, nos últimos anos, se assiste a um reforço de laços comunitários
num agrupamento onde antes predominavam claramente as características solitárias.
Capítulo I – Evolução histórica do direito internacional
I – Introdução
Em matéria de sujeitos de direito, era gigante o contraste entre a sociedade internacional dos
primeiros tempos e as sociedades internas, visto que, enquanto estas sempre dispuseram de um
vasto leque de sujeitos, naquela, a personalidade jurídica praticamente se circunscrevia aos estados
soberanos, e eventualmente aos insurretos, caso fossem objetos de reconhecimento internacional.
- Aos estados, enquanto únicos sujeitos de direito internacional, não eram impostos quaisquer
constrangimentos na sua atuação concreta, pelo contrário, a sua liberdade era absoluta, o que
alias se não pode dissociar do facto de não existirem, na sociedade internacional, órgãos
superiores a esses estados.
® A consequência disto era a de uma enorme dispersão de poder, a um tempo,
propiciada e potenciada pela estrutura largamente descentralizada da sociedade
internacional.
- Ao direito internacional, pouco era exigido. O direito internacional clássico é encarado como
um direito de ‘’laisser faire’, que ao ‘’princípio da autonomia da vontade dos estados’’ impõe
ténues ou nenhumas barreiras. Por isso, a eficácia das normas e princípios do direito
internacional era, neste período, uma eficácia limitada, tanto do ponto de vista subjetivo
como objetivo. Tinham por escopo (objetivo) tão só assegurar a repartição do poder entre os
membros da sociedade internacional, sem curar de conformar a realidade a que se dirigiam,
nomeadamente mediante a correção das disparidades e desequilíbrios de facto que
existissem.
- O mesmo sucede no que toca à efetivação das sanções que hajam sido cominadas contra os
infratores das normas de direito internacional. A inexistência de um poder executivo na
sociedade internacional favorece as atuações individuais e descentralizadas dos estados, com
os inerentes riscos de abuso e arbitrariedade, já que no que se refere ao tipo de medidas
adotadas; já no que se prende com a intensidade que podem revestir.
- A precariedade dos limites jurídicos no que concerne ao recurso à força nas relações
internacionais, é outra das características dominantes do direito internacional clássico. Os
estados tinham plena liberdade de fazer a guerra (Jud as Bellum). Recorrer a forca enquanto
instrumento de política exterior, constituía, uma prerrogativa normal, insistia no conceito de
soberania.
Responsabilidade internacional por factos ilícitos
® a prática de um ato ilícito, emergente da violação de uma obrigação internacional, fazia
surgir uma relação jurídica nova, de carater bilateral, entre o estado e a vítima e o
estado autor desse procedimento ilícito, reconduzível ao direito subjetivo do primeiro
exigir reparação dos danos que lhe houvessem sido causados e ao dever do segundo
de assegurar essa reparação. A responsabilidade internacional clássica é uma:
1. Responsabilidade coletiva – a infração às normas de direito internacional
determina apenas a responsabilização das entidades coletivas, que são os
estados e jamais dos indivíduos que hajam ocorrido para a consumação dos
factos ilícitos. É próprio da responsabilidade internacional clássica, o seu
carater sancionatório.
- No plano dos sujeitos de direito, assiste-se a uma mutuação deveras significativa, por
comparação com o período anterior. Tal mutuação foi em simultâneo quantitativa e
qualitativa. Desde logo, em resultado de um grande aumento do número de estados por forca
das sucessivas descolonizações que se foram desencadeando um pouco por toda a parte. O
direito internacional universalizou-se; -> ele deixou de regular apenas o círculo restrito dos
estados europeus, nas suas relações recíprocas, para passar a aplicar-se também aos novos
membros da comunidade internacional.
- Também o indivíduo (pessoa física/singular ou pessoa coletiva) integra hoje o elenco dos
sujeitos de Direito Internacional.
- Quanto às fontes de direito, o modelo da Carta das Nações Unidas trouxe consigo uma
expansão do quadro de fontes tradicional.
® o costume e aos tratados bilaterais do modelo clássico, haverá agora que acrescentar
o costume "selvagem", os tratados multilaterais e as resoluções das organizações
internacionais.
- As organizações internacionais têm hoje uma personalidade jurídica distinta da dos Estados
membros, vendo que o poder de emitir atos normativos de alcance geral ou individual, se
conta entre os corolários daquele atributo. A designação mais apropriada para aqueles atos é
o termo resolução. As resoluções podem ser de diversa natureza, em função da maior ou
menor vinculatividade de que se revistam, assumindo, designadamente a forma de decisões,
recomendações ou pareceres.
- Se, no direito clássico, o recurso à força nas relações internacionais era considerado legítimo,
o modelo moderno, pelo contrário, caracteriza-se pelo lugar prominente que no edifício
normativo do Direito Internacional passa a ocupar o princípio da proibição do recurso à força
nas relações internacionais. O cerceamento aos Estados de liberdade de fazer a guerra,
conduziu a que, na Carta das Nações Unidas, se procurasse torná-los comparticipantes num
sistema de segurança coletiva, em que o recurso à força constitui uma espécie de último ratio,
que apenas a um órgão internacional caberá decretar.
- Ao contrário do modelo clássico, a violação das normas que tutelam interesses fundamentais
da comunidade internacional não constituía já mero assunto privado entre os Estados autor e
vítima do ilícito; bem pelo contrário, em tais casos, a responsabilidade internacional
universaliza-se, convertendo- se em assunto público.
- Neste contexto insere-se a distinção entre crimes e delitos internacionais, adotada pela
Comissão de Direito Internacional, indiciando a existência de regimes distintos de
responsabilidade internacional artigo 19° do projeto da CDI - o termo crime internacional)
como fonte de muitas confusões e incertezas, resultantes da própria formulação tautológica
e ambígua do artigo, mas também da indefinição quanto às consequências jurídicas que
decorriam da pratica de um crime internacional e das conotações penalísticas que são
próprias da palavra crime, numa sociedade com as características de sociedade internacional
não se poderiam aceitar.
- Escasseiam, nessa sociedade, as estruturas de subordinação que são conaturais a uma forma
de responsabilização criminal. Daí que a expressão crime internacional tenha sido substituído
pela designação violação grave de obrigações de normas imperativas de Direito Internacional
(art°40 e 41 da CDI). No modelo moderno, a responsabilidade por factos ilícitos se ter
individualizado, no sentido em que, em certos casos, o sujeito passivo da relação jurídica
emergente da violação internacional passa a ser o próprio individuo infrator, com o que o
princípio da responsabilização apenas das entidades coletivas cessou de constituir um
elemento distintivo daquele instituto do direito internacional.
- A responsabilidade dos Estados por atividades não proibidas pelo Direito Internacional,
constitui outro tipo de responsabilidade, não fundada na ilicitude, que foi consagrada, no séc.
XX, por convenções internacionais. A jurisprudência internacional, continuou a firmar certas
situações suscetíveis de desencadear os mecanismos da responsabilidade objetiva. Em
resposta a esses desenvolvimentos normativos, a comissão de direito internacional, que havia
empreendido os seus trabalhos, direcionou os seus esforços para esta nova forma de
responsabilização internacional, que surge ligada ao processo científico e tecnológico da
sociedade em que vivemos.
- Que conclusões nos permite uma análise geral e perfunctória do art.º. 389 do ETIJ?
1. Primeiro: Não é exaustiva a lista de modos de revelação de normas de Direito
Internacional. Há outros procedimentos idóneos à criação das normas internacionais
deixadas fora deste artigo. Ex. Direito das Organizações Internacionais e Atos jurídicos
unilaterais dos Estados.
2. Segundo: Não há relações de hierarquia entre fontes formais. No direito das
organizações internacionais, já dispõem de sistemas jurídicos internos organizados,
pelo que, a uma hierarquia de órgãos corresponde uma hierarquia de atos emanados
por cada um deles. A ausência de hierarquia entre fontes formais de Direito
Internacional não vale senão no âmbito do direito estritamente interestadual. Existe
uma ordem: as convenções internacionais 1º, depois o costume e só depois os
princípios gerais de direito, existe uma ordem sucessiva de tomada em consideração.
Os juízes do Tribunal Internacional de Justiça, nos casos que lhe são submetidos para
apreciar e julgar, deverão recorrer primeiro às convenções internacionais, cuja
existência é mais fácil de demonstrar; depois costume; e na falta destas duas os
princípios.
3. Terceiro: Nenhuma definição foi dada das fontes nele elencadas. Isto resulta da
circunstância de existir uma norma imanente de validade geral, revelada
consuetudinariamente que nos diz quais são e em que consistem as formas de
produção jurídica admitidas na comunidade internacional. O art° 38 dá expressão à
norma consuetudinária pré-existente, mais não a visou do que declará-la e confirmá-
la.
II – Convenções internacionais
1. Noção
- Manifestação de vontades concordantes, entre dois ou mais sujeitos de Direito
Internacional, destinada a vincular juridicamente a conduta desses sujeitos, e regulada
concorrentemente pelo direito interno e pelo Direito Internacional. É uma "manifestação de
vontades", pois a celebração de um acordo pressupõe, efetivamente, um encontro de
vontades idóneas a proporcionar o surgimento de normas jurídicas que, no futuro, irão
disciplinar a conduta dos intervenientes.
® "Entre dois ou mais sujeitos de Direito Internacional", até determinada altura
tais sujeitos eram apenas os Estados, mais tarde, tendo aumentado o número
dos sujeitos de Direito Internacional, assistiu-se ao surgimento de outras
categorias de tratados.
® "Destinada a vincular juridicamente a conduta desses sujeitos", uma
convenção internacional é assimilável a um negócio jurídico, do qual resultam
certas normas obrigatórias para as partes contratantes.
® "Regulada concorrentemente pelo direito interno e pelo Direito
Internacional", estamos em presença de uma matéria interdisciplinar, em
que, amiúde, se torna imprescindível o recurso aos direitos internos dos
Estados. É o que sucede, por exemplo, no que concerne ao procedimento de
conclusão das convenções internacionais. Daí que estas não seja, de facto, em
exclusivo reguladas pelo Direito Internacional.
- Critério do número das partes - Tem-se, principalmente, em vista a summa divisio entre
tratados bilaterais e tratados multilaterais, consoante na respetiva celebração tenha
participado duas ou mais partes. Dentro dos tratados multilaterais, cabe, ainda, distinguir os
multilaterais restritos e fechados.
- Critério da forma - Tem-se agora em vista a distinção entre tratados escritos e tratados orais,
conforme se materializem num documento escrito ou resultem, antes, de um comportamento
verbal.
® A este respeito estipula o art. 277. ° n°2 da CRP. Deve, antes de mais, salientar-se que são
muitas as dúvidas que esta norma tem suscitado ao intérprete. Por um lado, não se percebe
a razão de se falar em tratados regularmente ratificados, se, justamente estamos perante
casos de ratificações irregulares ou imperfeitas. Não faz igualmente sentido e menção à
inconstitucionalidade orgânica. Não o já fazia à luz de regime antes da penúltima revisão
constitucional. Muito menos faz sentido agora, uma vez que só a AR tem competência para
aprovar tratados solenes. Donde, não ser, face à regulamentação atual, configurável qualquer
situação de ratificação que tenha subjacente uma inconstitucionalidade orgânica. Vale, então,
dizer que teria sido mais avisado o legislador constituinte ficar-se pela referência às
inconstitucionalidades formais. Daí que, em nosso entender, a intenção de transpor para o
plano interno o regime internacional das ratificações imperfeitas tenha sido traído por uma
redação manifestamente infeliz do art. 227. ° n.92, da CRP.
® Sendo, porém, a regra a da não produção de efeitos ultra partes pelas convenções
internacionais, não se poderá negar a existência de casos em que delas nascem direitos
ou obrigações para Estados terceiros, mediante o consentimento destes, ao lado de
situações em que os tratados se aplicam a terceiros, mesmo sem o seu consentimento.
A estas duas hipóteses distintas caberá dedicar as considerações subsequentes.
- Cláusula da nação mais favorecida - No que toca ao problema da aplicação das convenções
internacionais a Estados terceiros, com o seu consentimento, não poderíamos deixar de fazer
menção a um outro mecanismo, também muito corrente as relações internacionais,
sobretudo de carácter económico: é ele o da cláusula da nação mais favorecida. Trata-se de
um expediente técnico destinado à criação de direitos em benefício de um Estado terceiro.
De que forma opera?