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Introdução

Constança Urbano de Sousa


Direito das Migrações
Noção: ramo do direito público que regula os movimentos de pessoas que saem do seu país de
residência, independentemente dos motivos, para entrarem num outro país com o intuito de aí residir
(Ana Rita Gil).
• Conjunto de normas e princípios jurídicos que regulam a entrada, permanência, estatuto e saída de estrangeiros do território
nacional.

Abrange

• Entrada e permanência de estrangeiros por curtos períodos (turistas, beneficiários de serviços, etc.).
• Direito de Imigração: Entrada e residência de estrangeiros, que por motivos económicos, familiares ou outros pretendem
instalar-se em TN; estatuto jurídico do imigrante; Afastamento/Expulsão de estrangeiros; Repressão da imigração ilegal.
• Direito de Asilo: Entrada e residência e estatuto jurídico de categorias especiais de estrangeiros com necessidade de proteção
internacional: refugiados (não podem ou não querem regressar ao seu país por aí correrem risco de perseguição) e beneficiários
de proteção subsidiária (não querem ou não podem regressar ao seu país por aí correrem risco de ofensa grave, como pena de
morte, tratamento desumano ou degradante ou perigo para a vida ou integridade física resultante de guerra)
O que é a imigração?
Ato de entrar num País estrangeiro para nele permanecer de forma duradoura

• Ação pela qual um indivíduo estabelece a sua residência habitual no território de outro Estado, por um período cuja
duração real ou prevista é, no mínimo, superior a 12 meses (art. 2.º Regulamento 862/2007 sobre estatísticas relativas à
migração e proteção internacional).

Migrações – uma constante da história da humanidade

Tipologia/ principais causas

• económica
• familiar
• por razões humanitárias – Asilo
• Proteção de refugiados (Convenção de Genebra de 1951 relativa ao Estatuto dos Refugiados + Protocolo Adicional de NY
de 1967)
• Proteção subsidiária
• Proteção temporária
Nacional, cidadão, estrangeiro

Cidadania - O feixe de direitos e deveres que decorrem da ligação de um indivíduo a um Estado; conjunto de
direitos e deveres de que gozam os indivíduos que tenham com o Estado um especial vínculo jurídico de
nacionalidade.

• Cidadãos
• Membros do Estado, da Civitas, os destinatários da ordem jurídica estatal, os sujeitos e os súbditos do poder (Jorge Miranda)
• Participantes da autoridade soberana, formando a sua coletividade, o Povo, o substrato pessoal do Estado e sujeito do poder (Rosseau)

Nacionalidade - vínculo jurídico que liga uma pessoa a um Estado (porque aí nasceu, porque descende de um
dos seus nacionais ou porque adquiriu a nacionalidade por alguma das formas previstas na lei)
Estrangeiro” (extranearius): pessoa que é de outro país ou de outra nação, que não tem a nacionalidade do
Estado onde se encontra
• Estrangeiro stricto sensu: tem a nacionalidade de outro Estado
• Apátrida: toda a pessoa que não seja considerada por qualquer Estado, segundo a sua legislação, como seu nacional.” (art. 1.º da
Convenção NU sobre o estatuto dos apátridas, de 28 de Setembro de 1954
Imigrante (sentido estrito) e refugiado
Imigrante em sentido estrito: estrangeiro que se estabelece num país que não é o da sua nacionalidade de forma
permanente ou pelo menos durável, por motivos económicos, familiares ou outros (por exemplo: estudo) – Política
de Imigração

• Não é imigrante em sentido estrito


• O estrangeiro que permanece de forma temporária num país que não é o da sua nacionalidade (por ex. o turista)
• O diplomata
• O refugiado ou beneficiário de proteção internacional (estrangeiro que devido a uma perseguição ou a uma situação de sistemática violação dos
seus direitos fundamentais é obrigado a emigrar/imigrar, não podendo regressar ao seu país de origem )
• O deslocado: beneficiário de proteção temporária

Refugiado: Estrangeiro que, receando com razão ser perseguido em virtude da sua raça, religião, nacionalidade,
filiação em certo grupo social ou das suas opiniões políticas, não pode ou, em virtude daquele receio, não quer voltar
ao Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual (Art. 1.º- A Convenção de Genebra de 1951); - Política
de Asilo
• Beneficiário de proteção subsidiária: Estrangeiro, que não sendo refugiado, não pode ou não quer regressar ao seu país por aí correr risco de ofensa
grave aos seus direitos fundamentais (pena de morte, tortura, tratamento desumano ou degradante, ofensa à integridade física em virtude de
guerra).
• Deslocado beneficiário de proteção temporária: estrangeiro que não pode regressar ao seu país de origem por aí existir um conflito armado
(procedimento coletivo em caso de afluxo maciço).
Cidadão da UE

• Direito de entrada e residência em TN

Estrangeiro na aceção do DUE: nacional de


Categorias de Estado Terceiro
estrangeiros • Privilegiado: beneficiário do regime de livre circulação que
vigora para os cidadãos UE
• Membros da família do cidadão da UE que exerce o
direito de livre circulação e residência;
• Nacionais do EEE e da Suíça.
• Não privilegiado: submetido ao Direito de Imigração e Asilo
(harmonizado pelo DUE)
Princípios gerais de DIP em matéria de Direito da Imigração
Direito à emigração e a regressar ao Estado da nacionalidade (art. 13.º DUDH; art.º 12 PIDCP; art. 2.º 4.º protocolo
adicional CEDH); direito a procurar e beneficiar de asilo;

Prerrogativa soberana dos Estados de fixar as condições de entrada e permanência de estrangeiros no seu território,
sem prejuízo de obrigações decorrentes de tratados por ele celebrados
• Nenhum estrangeiro tem direito a entrar e permanecer no território de um Estado que não seja o da sua nacionalidade; Exceções: Direito de
residência dos cidadãos da UE e membros da sua família; proteção contra refoulement; proteção da vida familiar (em determinadas circunstâncias);
• O estrangeiro pode ser excluído do gozo de certos direitos e submetido a certos deveres especiais. Exceções: Standard mínimo de direitos
fundamentais; Equiparação pode resultar do direito interno (por ex. art. 15.º da CRP) ou do Direito da UE (direito ao tratamento nacional dos
cidadãos UE)
• Qualquer Estado tem o direito de afastar do seu território o estrangeiro que se encontre em situação ilegal ou que ameace a sua ordem pública.
Limitações: proibição de expulsões arbitrárias (art. 13.º PIDCP); proibição de expulsões coletivas (protocolo 4 – CEDH); garantias processuais do
imigrante em situação legal em caso de expulsão (protocolo 7 – CEDH – apenas quando prevista na lei, após exame individual do caso e desde que
garantido direito de defesa).

Soberania dos Estados em matéria de imigração limitada pela obrigação de respeito pelos direitos humanos (de
qualquer pessoa)
• As restrições de Direitos Fundamentais têm de ser necessárias e corresponderem a objetivos de interesse geral ou à necessidade de proteção de
direitos e liberdades de terceiros (princípio da proporcionalidade)
• Direitos humanos (reconhecidos a qualquer pessoa, independentemente da nacionalidade ou estatuto legal) podem constituir limites ao poder dos
Estados em matéria de entrada e residência de estrangeiros
• Por ex. impedindo a expulsão de estrangeiros (princípio do non refoulement) ou de residentes de longa duração (por ex. Proteção da vida privada e
familiar).
• Em determinadas circunstâncias - Direito à entrada e residência (por ex. Direito ao reagrupamento familiar; princípio do non refoulement –
Jurisprudência do TEDH, Caso Hirsi v. Itália (2012)
Direito ao respeito pela vida privada e familiar (art. 8
CEDH; art. 7 CDFUE)
Não é absoluto: É lícita ingerência, desde que prevista na lei e necessária para a salvaguarda
da segurança, bem estar económico do país, defesa da ordem pública, prevenção de infrações
penais, proteção da saúde pública, proteção de direitos de terceiros.

Jurisprudência do TEDH: não garante, de forma imediata, um direito a entrar e residir no


território de um Estado estrangeiro, mas pode impor limitações ao direito dos Estados de
controlar a entrada e residência dos estrangeiros no seu território.

As normas sobre entrada e residência de estrangeiros podem implicar ingerências no direito


dos estrangeiros à vida privada e familiar, cuja proteção pode implicar

• Direito à entrada e residência – reagrupamento familiar (obrigação positiva do Estado)


• Um direito à permanência - Limite à expulsão (obrigação negativa do Estado)
Proteção da vida privada e familiar - Direitos derivados do
estrangeiro
O direito ao reagrupamento familiar (obrigação positiva do Estado de aceitar a
entrada e residência de estrangeiros) depende das circunstâncias do caso.
• Critério de proporcionalidade: há ingerência na vida familiar quando existem obstáculos sérios que
impedem a vida familiar fora do território do Estado de acolhimento.
• Por ex. quando parte da família não tem qualquer laço com o país de origem, sendo
desproporcionado se tiverem de sair do país de acolhimento para poder viver em família (TEDH: caso
Sem v. NL, 2001 )

O direito à permanência (limite à expulsão): jurisprudência TEDH

• Em princípio, há ingerência no direito à vida privada e familiar quando por razões económicas o Estado
expulsa um estrangeiro que tem a sua vida familiar e privada no seu território.
• Quando a expulsão é justificada pela condenação pela prática de crimes é necessário ter em
consideração a gravidade do crime, a duração da residência e da situação familiar, a existência de filhos
e a sua idade, a solidez dos laços com o país de acolhimento e com o país de origem, as dificuldades da
família em se integrarem no país para o qual o estrangeiro vai ser expulso, etc
Princípio do non refoulement como limite à recusa
de entrada ou à expulsão

Ninguém pode ser afastado ou expulso para um Estado onde possa ser perseguido
(art. 33.º Convenção de Genebra)

“Ninguém pode ser afastado, expulso ou extraditado para um Estado onde corra sério
risco de ser sujeito a pena de morte, a tortura ou a outros tratos ou penas desumanos
ou degradantes” (art. 19.º, 2 CDFUE)

“Ninguém pode ser submetido a torturas, nem a penas ou tratamentos desumanos ou


degradantes” (art. 3.º CEDH)
Proibição de expulsão coletiva de estrangeiros
(art. 4.º. Protocolo n.º 4 CEDH; art. 19.º, n.º 1
CDFUE)TEDH: qualquer medida destinada a
afastar estrangeiros como um grupo; qualquer
medida de expulsão ou afastamento tem de se
Outros direitos basear numa apreciação individual e
fundamentada de cada caso.
humanos em
matéria de Garantias processuais em caso de expulsão de
estrangeiros estrangeiros com residência legal (art. 1.º
Protocolo n.º 7 CEDH): decisão em conformidade
com a lei, com contraditório e possibilidade de
se fazer representar, salvo quando a expulsão se
baseie em razões de ordem pública ou segurança
nacional.
Fontes do Direito das Migrações

Direito Internacional Público Direito da União Europeia Direito Interno

• Por ex. CEDH; Convenção de Genebra • Por ex. Código de Fronteiras Schengen; • CRP (em especial, artigos 15.º, 33.º, 74.º,
sobre refugiados. Código Comunitário de Vistos, n.º 2, al. j))
• Convenção entre PT e CV sobre segurança Regulamentos e Diretivas na área da • Lei ordinária
social; política comum de vistos e Direito de Asilo • Regulamentação
• Acordo de Mobilidade CPLP e de Imigração
• Acordo admissão trabalhadores imigrantes • Convenção de Aplicação do Acordo de
com Marrocos (2022) e Índia (2021) Schengen (art. 18 a 22.º)
• Acordos de readmissão de pessoas em
situação irregular;
• Acordo sobre concessão de visto
temporário para tratamento médico a
cidadãos da CPLP (2002);
• Acordo sobre isenção de taxas de emissão
e renovação de AR para cidadãos da CPLP
• etc.
Legislação ordinária (seleção)

• Lei 37/2006 – entrada e residência cidadãos UE e equiparados e membros da sua família


(independentemente da nacionalidade)
• Lei 23/2007 (várias alterações, por último Lei 56/2023, de 6 de outubro): regime jurídico de
entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do TN – Lei de Imigração
• Lei 27/2008 (alterada pelas Leis 26/2014, 18/2022, DL 41/2023): concessão de asilo ou proteção
subsidiária e estatuto jurídico do requerente de asilo, do refugiado e do beneficiário de proteção
subsidiária – Lei do Asilo

Direito das
• Lei 34/94 (alterada pelo DL 41/2023)– regime de acolhimento de estrangeiros em centros de
instalação temporária
• Código do Trabalho: art. 4.º (igualdade de tratamento do trabalhador estrangeiro), art. 5.º

Migrações:
(contrato de trabalho com estrangeiro), art. 6.º e 7.º (destacamento de trabalhadores)
• DL 154/2003 (alterada pelo DL 41/2023) – atribuição e registo do estatuto de igualdade cidadãos
brasileiros a residir em PT

Legislação • DL 67/2004 - registo nacional de menores estrangeiros que se encontrem em situação irregular
• Lei 67/2003 (alterada pelo DL 41/2023) – proteção temporária
• Etc.

Regulamentação (seleção)

• Decreto-Regulamentar 84/2007 (alterado, por último, pelo DR 4/2022): Regulamenta a Lei


23/2007 (Lei de Imigração): em vias de alteração.
• Portaria 1334-E/2010 (alterada pela Portaria 305-A/2012): Taxas
• Portarias 1563/2007 e 760/2009: meios de subsistência
• Portarias 1334-D/2010 e 164/2017: certificado de registo e documento de residência cidadão UE
Regime geral: Lei 23/2007 (alterada, por último, pela Lei 56/2023, de 6 de
outubro): regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento
de estrangeiros do TN – Lei de Imigração

Entrada e Regimes especiais


residência
de • Refugiados e beneficiários de proteção subsidiária: Lei 27/2008 (alterada pela Lei 26/2014,
estrangeiros DL 41/2023): concessão de asilo ou proteção subsidiária e estatuto jurídico do requerente
de asilo, do refugiado e do beneficiário de proteção subsidiária – Lei do Asilo
em PT • Regime de livre circulação e residência: Lei 37/2006 (alterada pelo DL 41/2023) – entrada e
residência cidadãos UE e equiparados e membros da sua família (independentemente da
nacionalidade)
• Cidadãos da UE (nacionais de outro EM da UE)
• Membros da família estrangeiros (nacionais de países terceiros) de um cidadão da UE ou
beneficiário de livre circulação na UE
• Membros da família estrangeiros (nacionais de países terceiros) de um cidadão português
Entrada e permanência de nacionais de países terceiros
Até 90 dias De 90 a 1 ano Mais de 1 ano – Imigração

• Visto de curta duração (Regulamento • Visto de estada temporária • Visto de residência + AR


2018/1806 – por ex. Afeganistão, • Visto para procura de trabalho (120 • Regimes de regularização
Angola, Bolívia, China, Cabo Verde, dias, prorrogável por 60 dias): integra • Concessão de AR com dispensa de
Rússia, Turquia, etc.; Código agendamento na AIMA para obtenção visto de residência (“manifestação de
Comunitário de Vistos - Regulamento de AR, quando formalizada a relação interesse”)
810/2009 (alterado por último pelo laboral. • Concessão de AR ao titular de visto
Regulamento 2019/1155) • Art. 18.º CAAS: vistos de longa duração de procura de trabalho (se no
• Schengen (estada superior a 90 dias) são período de validade do visto
• VTL emitidos pelos EM de acordo com a formalizar relação laboral): já vem
• Isenção de visto (Regulamento legislação nacional e devem ter com agendamento.
2018/1806 – por ex. Argentina, período máximo de validade de 1 ano. • Regime excecional (discricionário).
Austrália, Brasil, Venezuela, etc.): Se EM autorizar estrangeiro a
• AR Cidadão CPLP (basta que tenha
permite apenas estadas por um permanecer por período superior a 1
entrado legalmente)
período máximo de 90 dias num ano deve substituir o visto por um TR.
período de 180 dias a contar da
primeira entrada (EM podem
prorrogar)
Lei de Imigração – Lei 23/2007 (alterada por último
pela Lei 56/2023, de 6 de outubro)
• A quem se aplica?
• Estrangeiros e apátridas (art. 4.º, n.º 1)
• Salvo referência expressa em contrário e sem prejuízo de aplicação subsidiária, não é aplicável a (art. 4.º,
n.º 2)
• Cidadãos da UE e equiparados (NO, ICE, Liechtenstein, CH) e membros da sua família nacionais de
Estado terceiro
• Refugiados e beneficiários de proteção subsidiária
• Membros da família de cidadão português que tenham nacionalidade de Estado terceiro
• Aplicável sem prejuízo de regimes especiais constantes de convenções internacionais celebradas pela UE ou
por Portugal no âmbito da CPLP ou com Estados terceiros (art. 5.º, n.º 1).
• Aplicável sem prejuízo das obrigações decorrentes da Convenção de Genebra de 1951 (refugiados) e
convenções internacionais em matéria de direitos humanos e de extradição de que Portugal seja parte (art.
5.º, n.º 2)

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