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A força do trade marketing

Renata Leite

Indústria desenvolve novas ferramentas para relacionar-se com o varejo

Os pontos-de-venda do varejo estão cada dia mais coloridos por materiais de divulgação de
empresas que buscam conquistar a atenção do consumidor no momento da compra. Os esforços
da propaganda no ponto-de-venda (ou merchandising) não param por aí. Muitas vezes, há
também a organização de eventos, brincadeiras e degustações, aumentando o nível de percepção
dos produtos. Tudo arquitetado por criativas equipes de trade marketing que desejam
potencializar o espaço de vendas. Essa área recebe cada vez mais investimentos pela crescente
importância que conquistam nas estratégias de divulgação das indústrias.

Essas empresas buscam maior visibilidade da marca no ponto comercial e para alcançarem esse
objetivo oferecem capacitação a funcionários do varejo, monitoramento em relação ao giro dos
produtos e técnicas de disposição das mercadorias, além de desenvolverem atividades
promocionais e materiais de divulgação para as lojas. Trata-se de uma parceria com prestação de
serviço, cujo objetivo é o aumento do giro do estoque de produtos através de um auxílio à venda
nos canais de distribuição.

Esse movimento de sofisticação dos mecanismos de visibilidade do produto no ponto-de-venda já


alcançou os diversos setores do comércio, mas encontra-se com maior grau de profissionalização
principalmente nas indústrias de alimentos, bebidas e tabaco. Neste último setor, a importância
do trade marketing ganhou significativo destaque no Brasil após serem proibidas as campanhas
com publicidade nas mídias tradicionais.

Varejo é responsável pela criação da marca

"No cenário atual, o varejo é o grande responsável pela construção da nossa marca, o que fez
com que os esforços fossem realocados no trade marketing", afirma Rodrigo Pádua, gerente de
Marketing de Serviços da Souza Cruz. Essa estratégia, no entanto, exige mais cuidados e,
conseqüentemente, gastos maiores. É importante promover a comunicação integrada e conhecer
os hábitos do consumidor nos canais de venda antes de planejar e elaborar ações. Só quando
estas informações estiverem disponíveis deve-se criar peças de divulgação, sem correr o risco de
jogar dinheiro fora. "Promovemos pesquisas periódicas relacionadas ao comportamento do nosso
consumidor para entendermos a demanda dele, além de medirmos o seu índice de satisfação",
explica Pádua.

Outra característica do trade marketing que também impacta nos investimentos é a segmentação
dos consumidores e das peças publicitárias. São desenvolvidas linguagens próprias para cada
nicho de mercado, assim como para as diversas lojas. "Com 400 mil pontos-de-venda espalhados
pelo Brasil, é fundamental para a Souza Cruz oferecer serviços e valores diferenciados e alcançar
um número maior de clientes", afirma o gerente.

Essa necessidade de customizar as estratégias é enfatizada por José Eduardo Lúcio, diretor de
Trade Marketing da Kibon, sorvete fabricado pela Unilever. Segundo ele, em locais onde o
consumidor permanece durante pouco tempo, como uma loja de conveniência, o material deve
ser impactante e, assim, chamar a atenção do consumidor em meio a tantos apelos visuais. Já em
supermercados, por exemplo, o importante é disponibilizar campanhas relevantes, que informem
mais a respeito da marca.

Segundo Lúcio, a diretoria de Trade Marketing da multinacional existe há pelo menos 10 anos e
trabalha para garantir distribuição eficiente do portfólio de produtos da marca líder no mercado de
sorvetes, comunicação eficaz com o consumidor e o posicionamento adequado de preços e
promoções.
Para alcançar a meta de dobrar a taxa crescimento a cada ano, a vodca Absolut também passou a
investir maciçamente em trade marketing, no início deste ano. "Estava claro que precisávamos
trabalhar merchandising e promoções", explica Gustavo Klauss, gerente de Marca da empresa de
bebidas. Para ele, o foco do departamento está na expansão geográfica, nos planos de
distribuição, no aumento dos espaços ocupados pelos produtos nos pontos-de-venda e na criação
de novos tamanhos de produtos.

As atividades de trade marketing têm sido renovadas a cada 45 dias. Entre as campanhas
desenvolvidas estão a divulgação da mudança do volume de um de seus produtos, que passou de
750 ml para 1 l sem alterações de preço; o lançamento de novo sabor da bebida, com degustação
em lojas; merchandising para aumentar a presença nos pontos-de-venda; e a primeira produção
de brindes promocionais, agregando valor ao produto.

Para manter esse ritmo, estão sendo destinadas 40% do orçamento de


marketing para o trade. Os resultados dos esforços já são visíveis. O market share da marca, que
lidera o mercado atingindo 70% dos consumidores da categoria, saltou de 36%, em 2005, para
70%, no primeiro semestre deste ano.

Relação entre indústria e varejo está em evolução

A relação entre indústria e varejo vem evoluindo de forma intensa ao longo das duas últimas
décadas. Antes disso, os pontos-de-venda não tinham uma identidade própria e não ofereciam
serviços aos consumidores, cabendo somente às indústrias a formação de marcas fortes. Esse
poder sofreu migração e, hoje, existem multinacionais no setor de varejo maiores do que muitas
indústrias, como é o caso da rede Wal-Mart.

As empresas perceberam a necessidade de criar novas plataformas de serviços nesses locais para
atrair a atenção do consumidor, que cada vez mais escolhe o que comprar no próprio ponto-de-
venda. A inversão da tradicional relação entre oferta e procura, fez com que os intermediários
atacadistas e varejistas ganhassem importância na distribuição.

A exigência do público também evoluiu diante da diversificação das marcas e ofertas, tornando a
fidelização dos clientes algo efêmero.

Além disso, é cada vez mais difícil atingir o público-alvo pelos veículos tradicionais, em virtude da
constante mudança de costumes da sociedade como um todo. O consumidor de baixa renda é o
único que ainda é certamente impactado por investimentos na televisão aberta, mas, mesmo
assim, ainda pode ser mais eficiente customizar a informação para cada nicho de mercado.

Verônica Feder Mayer, professora de pós-graduação de marketing no Ibmec, trabalhava na


extinta Mesbla, quando ainda não havia a profissionalização do varejo. A Triumph, marca de
lingerie, fazia o controle do seu próprio estoque, já que a loja era muito desorganizada e não
tomava para si essa função. Isso já consistia uma iniciativa de trade marketing, sem muita
complexidade, já que era uma forma de melhorar o desempenho da marca no varejo. No entanto,
essa relação não era equilibrada. A empresa impunha seus interesses diante da falta de
conhecimento da loja.

Hoje, o varejo participa ativamente das negociações. Segundo Verônica, o poder migrou de mãos
e é a indústria que sofre imposições, como a cobrança de taxas de desembarque. "É cada vez
mais caro distribuir para as grandes redes, que são fundamentais para muitas marcas. O varejo
está muito truculento", critica a professora.
Mídia digital é a próxima ferramenta

A mídia digital, implementada através da disponibilização de televisões de plasma nos pontos-de-


venda, já é comum em países do exterior. Segundo Christopher Montenegro, sócio-diretor da
POPMarketing, agência especializada em ações no ponto-de-venda, essa prática só não se
popularizou no Brasil em função dos altos custos dos equipamentos e infra-estrutura necessárias
para a utilização dessa ferramenta.

"A tendência é o progressivo barateamento da tecnologia e a conseqüente adesão das empresas a


esse novo instrumento", garante Montenegro. Segundo o sócio-diretor da POPMarketing, o Ponto
Frio já realizou alguns projetos de uso das televisões para divulgação de seus fornecedores, mas
os resultados ainda são incipientes.

A utilização desses aparelhos alavanca as vendas em lojas do exterior e ajuda a indústria na


construção da marca. Pesquisa da Arbitron constatou que um em cada três consumidores dos
Estados Unidos fez uma compra por impulso porque assistiu a um vídeo. Nesse país, a receita
com mídia digital foi de US$ 103 milhões em 2004. Com previsão de crescimento de 67% ao ano,
deve movimentar US$ 3,7 bilhões em 2011. A rede Wal-Mart, por exemplo, tem 125 mil pontos
de mídia digital distribuídos por 3 mil lojas e sua TV interna já é a quinta em audiência dos
Estados Unidos, gerando uma receita milionária.

Assuntos com esse foram debatidos no 1º Seminário de Trade Marketing realizado, na semana
passada, pela POPMarketing, em São Paulo. Cerca de 50 representantes de empresas, como LG,
Masterfood, Souza Cruz, Kraft, Interfood, Schincariol, DPZ e da Popai (associação mundial de
publicidade no ponto-de-venda), compareceram ao evento. O foco principal foi o merchandising,
mas as discussões não se restringiram a esse tema.

Segundo Montenegro, o mercado não tem organizado palestras bem estruturadas sobre trade
marketing e a proposta do seminário era suprir essa carência. "O seminário foi muito importante
para o alinhamento das questões de trade marketing e mostrou sua importância no planejamento
estratégico das empresas e ações de marketing de suas marcas", avaliou.

A importância de se conhecer o público-alvo através de investimento em pesquisa e o futuro do


trade com a chegada das mídias digitais ao Brasil foram temas amplamente debatidos no evento.
Os palestrantes mostraram cases de aplicações desse tipo de estratégia no mercado e enfatizaram
a importância de se impactar tanto o grande, quanto o pequeno varejo.

Outra questão que permeou o seminário foi o crescimento da relevância do público com menor
poder aquisitivo para o comércio. Essa parte da população tem visto seu poder de compra
aumentar consideravelmente e se torna, cada vez mais, alvo das campanhas de marketing.

Fonte: Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 4 set. 2006. Gerência, p.B9.

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