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ENVELHECIMENTO E IKIGAI1

Caroline da Costa Rocha


Ísis de Araújo Silva
Lucas Nascimento da Silva
Segundo Papalia e Feldman (2013), a idade de 65 anos é o ponto de partida para a
idade adulta avançada. Logo, existem dois tipos de envelhecimento: o primário, que consiste
em um processo gradual e inevitável de deterioração física; e o secundário, que é um processo
de envelhecimento que resulta de doenças, abusos e maus hábitos que geralmente podem ser
evitados. Estudos realizados com populações mais velhas apontaram que indivíduos mais
idosos têm menores índices de satisfação com a vida (Motel-Klimgebiel et al., 2004). Assim,
tem-se o ikigai como alternativa para mudar a situação, uma vez que de acordo com Garcia e
Miralles (2018), ikigai traduzido para o português significa “razão de ser” e para os nativos de
Okinawa, a ilha com maior índice de centenários do mundo, o ikigai é a razão pela qual nos
levantamos pela manhã. Logo, ter um ikigai claro e definido, uma grande paixão, dá
satisfação, felicidade e significado a vida.
Dessa maneira, compreende-se que devido o envelhecimento da população global o
ikigai se faz um tópico importante, uma vez que o aumento da população idosa irá trazer
modificações para a dinâmica social, com novas demandas para atender os indivíduos dessa
faixa etária (Sousa et al., 2020). Assim, é essencial pensar nas necessidades enfrentadas por
essa população idosa em uma sociedade em que a produtividade é sinônimo de sucesso e que
a juventude é considerada a melhor fase da vida (Calado et al., 2020). Como fica o
psicológico e emocional dessas pessoas? Como essas pessoas podem se manter motivadas e
dispostas para viver?
Dessa forma, o presente artigo tem como objetivos, compreender os fatores que levam
muitos idosos a, segundo Zanatta et al. (2021), sentirem a falta de um propósito, o que torna
para muitos o tempo da velhice indesejável. Além disso, traremos conceitos da logoterapia
que se relacionam com o ikigai os quais, segundo Garcia e Miralles (2018), estimulam a
pessoa a descobrir conscientemente o sentido de vida, para que possa enfrentar suas neuroses.
Logo, pretende-se que o esclarecimento da abordagem supracitada contribua para uma
intervenção no modo de vida da população inserida na idade adulta avançada e que sofre com
a dificuldade em encontrar um ikigai, para que possa ter uma melhora significativa em sua
saúde mental, física e espiritual.
Em primeiro lugar, segundo Zanatta et al. (2021), entende-se que os indivíduos
tendem a se concentrar nas perdas ocorridas durante seu envelhecimento, perdas que podem
ser biológicas, como o agravamento de enfermidades, ou sociais, como a redução de laços
afetivos. Assim, com a qualidade de vida comprometida, os autores explicam que ao decorrer
dessa fase se torna difícil para o idoso identificar um propósito frente aos dilemas de sua
própria vivência.
Outro fator que dificulta o processo de ter um direcionamento de vida durante a
velhice é a visão da sociedade para com a população idosa. Como consequência disso, tem-se
os estereótipos negativos associados aos idosos, por exemplo, de que são inoportunos, de que
atrapalham os demais, de que são improdutivos – logo, no sistema econômico ocidental, são
descartáveis- etc. (Zanatta et al., 2021; Calado et al., 2020).
A negatividade e desvalorização chega aos mais velhos. Os estereótipos já
mencionados não afetam a todos do mesmo modo. Todavia, aqueles que os absorvem passam
a enxergá-los como a única realidade possível para si, compreendendo o tempo de envelhecer
como um período negativo de decaídas, sem conseguir idealizar outras possibilidades. Forma-
se, desse modo, uma relação negativa com essa fase da vida (Zanatta et al., 2021).
Soares et al. (2020) enfatizam a multidimensionalidade do ser humano no que diz
respeito à satisfação com a vida. Dessa forma, vários elementos estariam ligados a esse
processo. No entanto, o que se destaca é a percepção do indivíduo idoso sobre sua capacidade
de desempenhar tarefas de seu dia a dia ou de permanecer socialmente ativo.
Nota-se que o ato de conseguir experiências positivas ao realizar atividades cotidianas,
mesmo diante de um certo declínio de seu funcionamento físico e cognitivo, torna-se algo
especial para a população idosa. A diminuição das interações sociais, o aparecimento ou
agravamento de doenças e as limitações físicas possuem ligação direta com a visão que o
indivíduo tem de sua própria existência como ser humano. Como já dito anteriormente,
experienciando esses fatores e com toda a sociedade enfatizando esses obstáculos, como
visualizar uma potência na vida? (Soares et al., 2020)
Em segundo lugar, tem-se a logoterapia relacionada ao ikigai, visto que, segundo
Rodrigues e Barros (2009), a logoterapia (logos: sentido e terapia: cura), é fundamentada por
meio do conceito de que a vida possui um sentido. Dessa maneira, ela – a logoterapia –
entende o ser humano como único, responsável e capaz de posicionar-se diante dos obstáculos
da vida, já que possui uma dimensão espiritual, fundamentada pelas dimensões psicológicas,
sociais e físicas.
Nesse sentido, de acordo com Garcia e Miralles (2018), o propósito principal da
logoterapia é encontrar motivos para viver. Dessa forma, “quem conhece um sentido para a
sua vida encontra ajuda para superação das dificuldades externas e dos desconfortos internos”
(Frankl, 1991, p. 32).
Ademais, segundo Garcia e Miralles (2018), o processo da logoterapia se resume
nesses cincos passos: o indivíduo sente um vazio, uma frustação ou ansiedade; o terapeuta o
faz ver que ele deseja ter uma vida relevante; o paciente apercebe o sentido de sua existência
(desse momento de sua vida); por meio da determinação, o paciente escolhe entre aceitar ou
não esse destino; esse novo impulso vital o ajuda a superar os empecilhos e as tristezas.
Desse modo, é notório perceber a importância do tema e da necessidade de uma
reflexão acerca do que mais pode ser feito pelas pessoas durante o envelhecimento. A
população idosa necessita de cuidados especiais para seu conforto e bem-estar, mas não
somente para com sua integridade física, como também para com sua integridade psicológica,
social e espiritual. Assim, seguindo uma visão holística do que é ser humano, compreende-se
que intervenções cuja abordagem abrangesse a existência do indivíduo por completo, como a
logoterapia, seriam eficazes.
Portanto, se faz indispensável abordar o tema por meio do resgate do positivo na vida
durante o envelhecimento: estar consciente daquilo que se apresenta de forma preservada e do
que pode ser feito em relação ao que não pode ser recuperado. Dessa forma, seria possível
fortificar o impulso vital do idoso, possibilitando a autopercepção: alguém que existe, que
ainda é articulador de sua própria existência e capaz de determiná-la, encontrando, assim, o
ikigai que ainda não estava elucidado.
Referências

Calado, E. C. M., Caetano, N. M. R. P., Coelho, S. M. F., & Ferrito, C. R. A. C. (2020).

Intervenções para mitigar a solidão na pessoa idosa: revisão narrativa. Cadernos de

Saúde, 12, 58-59. https://revistas.ucp.pt/index.php/cadernosdesaude/article/view/10259.

Frankl, V. E. (1991). Psicoterapia para todos (2 ed.). Vozes.

Garcia, H., & Miralles, F. (2018). Ikigai: o segredo dos japoneses para uma vida longa e feliz (1

ed.). Intrínseca.

Motel-Klingebiel, A., Kondratowitz, H., & Tesch-Romer, C. (2004). Social inequality in the later

life: cross-national comparison of quality of life. Europe Journal of Ageing, 1(1), 6-14.

https://link.springer.com/article/10.1007/s10433-004-0001-6.

Papalia, D, E., & Feldman, R, D. (2013). Desenvolvimento humano (12 ed.). AMGH.

Rodrigues, L. A., & Barros, L. A. (2009). Sobre o fundador da Logoterapia: Viktor Emil Frankl e

sua contribuição à Psicologia. Revista de Ciências Ambientais e Saúde, 36(1), 11-31.

https://seer.pucgoias.edu.br/index.php/estudos/article/view/1016.

Soares, A. F., Gutierrez, D. M. D., & Resende, G. C. (2020). A satisfação com a vida, o bem‐

estar subjetivo e o bem‐estar psicológico em estudos com pessoas idosas. GIGAPP

Estudios Working Papers, 7(154), 275‐291.

https://www.gigapp.org/ewp/index.php/GIGAPP-EWP/article/view/186.

Sousa, M. C., Barroso, I. L. D., Viana, J. A., Ribeiro, K. N., Lima, L. N. F., & Vanccin, P. D. F.

(2020). O envelhecimento da população: aspectos do Brasil e do mundo, sob o olhar da

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https://ojs.brazilianjournals.com.br/ojs/index.php/BRJD/article/view/15567/12804.
Zanatta, C., Campos, L. A. M., & Coelho, P. D. S. (2021). A pessoa idosa e a busca do sentido.

Um olhar de esperança. Rev. Abordagem Gestalt, 27(1), 104-113.

<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-

68672021000100011&lng=pt&nrm=iso>.

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Projeto/artigo apresentado como requisito para a obtenção de nota parcial da N1/N2 na disciplina
Psicopatologia I, ministrada pela Profa. Dra. Luciane Patrícia Yano, no curso de Psicologia, do CFCH
da Universidade Federal do Acre. Período Letivo Regular 2022.

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