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13/04/2022 11:31 Introdução à Educação Física

INTRODUÇÃO À EDUCAÇÃO FÍSICA

CONTEXTO
HISTÓRICO
Autoria: Me. Dilson Villela; Ma. Taís Feitosa Da Silva

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Introdução

Nesta viagem de estudos através dos tempos, convido-o para conhecer as


escolas de ginástica alemã, sueca e francesa, e as concepções de Educação
Física higienista, militarista, competitivista e popular.
Conheceremos os grandes nomes dos métodos de ginástica, como Guts Muths,
Friederich Ludwig Jahn e Adolph Spiess, que idealizaram o modelo alemão de
ginástica. Da Suécia apresentaremos Pier Henrik Ling, um dos mais importantes
nomes e idealizador do método sueco de ginástica. Da França, nomes como
Francisco de Paula Amorós Y Ondeano e Georges Demeny, considerados os
idealizadores da ginástica francesa. Esses autores e métodos ginásticos irão
influenciar a Educação Física brasileira desde os primórdios da República até os
dias atuais.
Apresentaremos as diversas concepções de Educação Física, como a higienista,
militarista, pedagogicista, competitivista e popular. Essas correntes da Educação
Física irão predominar em diferentes momentos da nossa história, sempre em
consonância com os interesses políticos e econômicos e as respectivas
ideologias dominantes em cada momento da história brasileira. Por meio destes
estudos, você vai conhecer, entender e refletir de forma crítica sobre a Educação
Física brasileira.
Bons estudos!

Tempo estimado de leitura: 64 minutos.

1.1 A história da Educação Física escolar

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Figura 1 - Mulheres da sociedade de Washington que jogam bola em Washington, 1931

#PraCegoVer: na figura, temos a fotografia de algumas mulheres jogando bola


ao ar livre. Elas estão com os braços para cima, com o objetivo de pegar a bola,
que está no ar. Ao fundo, pode-se observar uma escada de uma construção de
tijolos à vista.

1.1.1 A Educação Física escolar no Brasil


No Brasil, a Educação Física escolar apresentou predominância de diferentes
vertentes metodológicas sem consonância com interesses políticos e
econômicos e a respectiva ideologia dominante em cada momento histórico.
Vamos apresentar um panorama das grandes correntes ideológicas e
pedagógicas que embasaram a Educação Física escolar brasileira. Cabe advertir
que todas as tendências ainda coexistem na atualidade, com maior ou menor
difusão. O surgimento de uma nova corrente pedagógica não elimina as
anteriores; o novo convive com o velho. Podemos considerar que a Educação
Física escolar no Brasil passou a existir no ano de 1837, quando o Colégio Pedro
II do Rio de Janeiro incluiu aulas de ginástica em seu currículo.
Após essa iniciativa pioneira, a primeira tentativa de generalizar a Educação
Física como prática obrigatória no sistema escolar ocorreu em 1884. Neste ano,
o então ministro Couto Ferraz incluiu a ginástica como matéria obrigatória no
ensino primário e a dança no secundário. Em 1882, Rui Barbosa, um grande
defensor da Educação Física escolar, deu um parecer sobre o projeto de reforma
de ensino primário que tornou obrigatória a ginástica para ambos os sexos,
tanto nas escolas primárias quanto na formação de professores. Propôs

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também que os professores que ministrassem essa disciplina fossem


equiparados aos de outras disciplinas escolares em termos de autoridade, valor
e vencimentos.

VOCÊ O CONHECE?
Rui Barbosa (Rui Barbosa de Oliveira) foi um advogado, jornalista, jurista,
político, diplomata, ensaísta e orador que nasceu em Salvador, BA, em 5
de novembro de 1849 e faleceu em Petrópolis, RJ, em 10 de março de
1923. Ele foi membro fundador da Academia Brasileira de Letras – uma
instituição cultural brasileira inaugurada em 1897, sediada no Rio de
Janeiro, cujo objetivo é o cultivo da língua e da literatura nacionais. Para
ler mais sobre este importante homem brasileiro, clique no link a seguir!

Acesse (http://www.academia.org.br/academicos/rui-barbosa/biografia)

No período compreendido entre 1837 e 1930, a ginástica escolar praticada em


alguns estabelecimentos de ensino consistiu principalmente na ginástica
calistênica e na ginástica alemã. A razão disso estava no fato de que os
professores, mais conhecidos à época como instrutores de ginástica, eram, na
quase totalidade, militares. Como a academia real militar, fundada em 1810,
contratava instrutores alemães para dirigir a preparação física dos soldados, o
método alemão tornou-se o predominante nessa época.

Os objetivos fundamentais relacionados à ginástica escolar


entre 1837 e 1930 centravam-se em dois objetivos: saúde e
eugenia (melhoria da raça).

Essas preocupações eram condicionadas pela situação


político-econômica do Brasil, que havia se tornado
politicamente independente de Portugal, mas precisava

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superar problemas econômicos e raciais, visto que grande


parte da população era constituída de negros, índios e
mestiços.

A questão da saúde tornara-se relevante em nosso país, com a


valorização conquistada pela categoria dos médicos, no séc.
XIX, a partir dos conhecimentos que adquiriram na Europa
acerca do manejo sanitário, dos micróbios e das vacinas.

Pode-se assim reconhecer que as origens da Educação Física brasileira se


vinculam a dois discursos distintos e complementares: o médico e o militar
(Kolyniak Filho, 2008).

Figura 2 - Ruy Barbosa, o Águia de Haia, c. 1923


Fonte: academia.org.br

#PraCegoVer: na figura, temos a fotografia em preto e branco de Ruy Barbosa.


Ele está usando óculos de grau, tem o cabelo ralo na parte de cima e bigode
branco. Barbosa está com um leve sorriso e com o rosto levemente pendente

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para à esquerda, com a mão do mesmo lado em seu rosto.

Então, sem mais demora, vamos conhecer e, principalmente, reconhecer cada


uma das escolas e tendências encontradas.

1.1.2 Escola alemã de ginástica


Um dos principais objetivos da ginástica alemã no início do séc. XIX era a defesa
da pátria, criando um espírito nacionalista no qual homens e mulheres fossem
saudáveis fisicamente. Os mentores desses ideais acreditavam que esse corpo
forte e saudável e o espírito nacionalista seriam desenvolvidos otimizando a
ginástica como instrumento para atingir esse objetivo.

Figura 3 - Guts Muths


Fonte: wikipedia.org

#PraCegoVer: na figura, temos a fotografia em preto e branco de Guts Muths. Ele


está de perfil, virado para o lado esquerdo. Tem cabelos compridos e franja
curta. Veste roupas de época.

Guts Muths, que foi um dos principais defensores dessas ideias, assim se
expressou sobre os fundamentos dessa ginástica:

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Eu bem sei que uma verdadeira


teoria de ginástica deverá ser
fundada sobre as bases
fisiológicas e que a prática de
cada exercício ginástico deverá
ser calculada segundo a
constituição de cada indivíduo.
(MARINHO, 1985)

A ginástica deveria ser ministrada pelo Estado diariamente para homens,


mulheres e crianças. Sua fundamentação teórica se baseava nas teorias
pedagógicas de autores como Rousseau, Basedow e Pestalozzi, que
preconizavam a tese do homem universal, ou seja, completo, e os exercícios
físicos eram os pilares dessas ideias.

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VOCÊ SABIA?
Formado pela Universidade de Halle, onde estudou teologia e frequentou
cursos de matemática, medicina, línguas modernas e pedagogia, Guts
Muths iniciou seus trabalhos como tutor particular na pequena cidade de
Quedlinburg, seu local de nascimento. Foi convidado para trabalhar na
escola Philantropinum de Schnepfenthal, na qual lecionou, em 1786, o
conteúdo de ginástica. Baseado na experiência adquirida com a educação
corporal das crianças, Guts Muths escreveu Ginástica para a juventude.
No início do livro, ele afirma compreender a importância da fisiologia e da
intensidade da prática dos exercícios de acordo com as características
individuais de seus alunos, considerando, portanto, a fisiologia como um
conhecimento necessário ao professor de ginástica, devendo esse
conhecimento ser aliado à sua experiência. Para ler mais sobre Guts
Muths, clique no link a seguir!

Acesse (https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
32892012000200008)

Outro grande nome da escola alemã foi Friederich Ludwig Jahn (1778-1825). Ele
foi o criador dos aparelhos de ginástica, que atualmente podemos encontrar em
academias com roupagem nova, sofisticada e moderna.
Friederich Ludwig Jahn defendia a tese de que a ginástica deveria utilizar jogos e
o conceito de moral e saúde e preparar os homens para a guerra. Ele foi um dos
idealizadores do movimento TURNEN, que era constituído de grandes festas
gímnicas, caracterizadas como grandes encontros de massas muito
disciplinadas, organizadas a partir de 1814, sobretudo depois de 1860.

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Figura 4 - Friedrich Ludwig Jahn


Fonte: wikipedia.org

#PraCegoVer: na figura, temos uma imagem colorida de Friedrich Ludwig Jahn.


Ele está olhando para frente, levemente virado para a direita. Tem cabelos ralos
em cima, bigode espesso e uma longa barba grisalha com ondas.

Conforme Soares (2012), encontra-se, no TURNEN, uma das principais formas de


instrução física militar, destinada às massas, que corresponde às necessidades
práticas da burguesia.

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VOCÊ O CONHECE?
Turnen, Turn e Turner é um radical alemão que também está presente em
várias línguas germânicas, tanto em línguas desaparecidas quanto em
vivas, e em todas elas significa torcer, virar, voltear, dirigir, mover, fazer
grande movimento. Foi criado ou resgatado por Friedrich Ludwig Jahn.
Para ler mais sobre as obras de Friedrich Ludwig Jahn, clique no link a
seguir!

Acesse
(http://revista.cbce.org.br/index.php/RBCE/article/view/2149/1106)

Adolph Spiess (1810-1858) foi outro grande nome na escola alemã de ginástica.
Preocupava-se com a ginástica na escola e defendia a importância das
atividades físicas todos os dias para os alunos. Segundo Accioly (1949, apud
Soares, 2012) “Spiess conceituava a educação como indivisível, abraçando toda
a natureza da criança e situando a ginástica como responsável pela perfeição do
corpo que a poria em equilíbrio com a alma”.
Accioly esquematizou o sistema de ginástica de A. Spiess da seguinte forma:

Sistema de ginástica

Exercícios livres (sem aparelhos), membros superiores e


inferiores.

Exercícios de suspensão

Barras, paralelas, cordas.

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Exercícios de apoio

Apoio propriamente dito, suspensões, balanceamentos.

Ginástica coletiva

Marchas e exercícios ou ordem unida.

Como podemos constatar, o sistema de ginástica de A. Spiess é absolutamente


mecânico e funcional, muito embora a historiografia da Educação Física
enalteça valores pedagógicos no seu método. Em seus escritos, o autor A. R.
Accioly observa que o método de Spiess conceituava a educação como
indivisível, abraçando toda a natureza da criança e situando a ginástica como
responsável pela perfeição do corpo que a poria em equilíbrio com a alma.

VOCÊ QUER VER?


Assista ao vídeo a seguir para ver como era a ginástica alemã feminina na
prática.

Acesse (https://youtu.be/1iIwMdZecPo)

O movimento de ginástica na Alemanha se caracterizou por um forte


nacionalismo, sendo que os TURNEN se desenvolveram fundamentados sobre
orientações nacionalistas, socialistas, ultranacionalistas e racistas.

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VOCÊ QUER LER?


O artigo A Educação e o Turnen no Rio Grande do Sul, uma questão de
etnicidade: 1852–1940, que diz respeito ao movimento caracterizado por
manifestações de um povo, o alemão, num momento de agitação político-
socioeconômico na Alemanha e o seu transplante para o Brasil, procurou
identificar, acompanhar e analisar o esforço de um grupo em preservar a
sua identidade étnica e sua cultura por meio do Turnen.

1.1.3 A escola alemã no Brasil


A implantação da ginástica alemã no Brasil aconteceu na metade do séc. XX.
Segundo a historiografia da Educação Física brasileira, a implantação da
ginástica alemã ocorreu com a chegada dos imigrantes alemães, que tinham por
hábito a prática da ginástica. Suas implantações ocorreram por meio dos
soldados da guarda imperial, que eram de origem prussiana e que, concluindo o
serviço militar, não mais regressavam à Alemanha, permanecendo no Brasil com
seus familiares.
No ano de 1860, o modelo alemão foi consagrado como método oficial do
exército brasileiro. Esse modelo alemão permaneceu de forma oficial na escola
militar até o ano de 1912, quando foi substituído pelo método francês.

1.1.4 Escola francesa de ginástica


Na França, a ginástica integra a ideias de uma educação que tinha como objetivo
o desenvolvimento social, para o qual são necessários homens completos. Todo
cidadão tem direito à educação. Esse país é o berço das concepções clássicas
liberais de educação, concepções essas que incluíam o exercício físico como
algo importante à educação do homem universal. É sobre essa ótica que a
ginástica será estruturada não somente para os militares, mas também para
toda a população, colocando-se como uma prática capaz de contribuir para a
formação do homem completo e universal.
A ginástica na França surgiu na primeira metade do séc. XIX, fundamentada na
tese dos alemães Friederich Ludwig Jahn e Gutz Muths, contendo, além das
preocupações básicas com o corpo anátomo-morfológico, um forte traço moral
e patriótico.

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O seu fundador foi Francisco de Amorós y Ondeano (1770-1848), que assim a


fundamentou: “A prática de todos os exercícios que tornam o homem mais
corajoso, intrépido, mais inteligente, mais sensível, mais forte, mais habilidoso,
mais adestrado, mais veloz, mais flexível e mais ágil predispondo-o a resistir a
todas as dificuldades, a triunfar de todos os perigos e de todos os obstáculos
que encontre, a prestar enfim, serviços assinalados ao estado e à humanidade”
(MARINHO, 1985 e SOARES, 2012).

ESTUDO DE CASO
Francisco de Paula Amorós y Ondeano nasceu em Valência em 1770 e
morreu em Paris em 1843. Iniciou sua carreira militar aos 9 anos de idade,
como um cadete de nobreza, devido à vocação de serviço à pátria que
caracterizara sua família. Seu pai tinha sido tenente do Regimento Ancião
do Rei e fizera parte do contingente de tropas espanholas que lutaram na
América durante a Guerra da Independência dos Estados Unidos, e seu
avô tinha recebido o título de Marquês de Sotelo, título este que o coronel
Francisco Amorós herdou em 1839.

Em 1791, aos 21 anos de idade, Francisco de Paula Amorós y Ondeano


participou da campanha militar de Oran e dois anos depois nos Pirineus,
que o levaram a ser promovido a capitão em 1794. Seu tio, também
general, na época governador de Cádiz, chamou-o ao seu serviço e
nomeou-o arquivista da Biblioteca de Mapas do Ministério da Guerra. Em
1796, foi transferido para Madri, se casou e teve três filhos. Em 27 de
agosto de 1807 (Francisco Amorós tinha então 37 anos) foi promovido a
coronel.

Muito apreciado pelo monarca Carlos IV, e também por seu ministro
Godoy, Amorós foi Secretário de Estado, além de secretário do Gabinete
da Guerra e, posteriormente, conselheiro das Índias. Para saber mais a
respeito das contribuições de Amorós para a Educação Física, clique no
link a seguir!

Acesse (http://revista.cbce.org.br/index.php/RBCE/article/view/170/179)

Essas qualidades físicas, psicológicas e morais seriam desenvolvidas por meio


da ginástica, que objetivava a saúde, homens fortes, melhoria de vida e aumento
da riqueza tanto do indivíduo quanto do Estado.

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O slogan da ginástica na Europa no séc. XIX era: “Da flexão muscular ao sucesso
das lutas industriais e nas guerras”. O problema da produção também se
colocava. Os corpos saudáveis eram também uma exigência do capital. A
ginástica seria instrumento a ser utilizado para eliminar a fraqueza e tornar viris
os homens.

Figura 5 - Francisco Amorós


Fonte: wikipedia.org

#PraCegoVer: na figura, temos um desenho em preto e branco de Francisco


Amorós. Ele tem cabelos curtos e está levemente virado para a direita.

Segundo Marinho (1985) e Soares (2012), Amorós estruturou desta forma seu
método ginástico:

Ginástica civil e industrial

Ginástica militar

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Ginástica médica

Cênica ou funambulesca

A ginástica civil foi a que mais despertou interesse entre os brasileiros e, por
isso, foi a mais disseminada. Vejamos como é desenvolvida uma lição de
ginástica conforme o método francês de Amorós:

Exercícios elementares ritmados e sustentados por cantos,


com o objetivo de desenvolver a voz e ativar movimentos
respiratórios.

Exercícios de marchar e correr em terrenos os mais


variados, escorregar e patinar. Habituar-se às corridas de
fundo e velocidade.

Exercícios de saltar em profundidade, altura e largura, em


todas as direções, para frente, para os lados, e para trás,
com ou sem armas, com o auxílio de uma vara ou de um
bastão, ou de um fuzil ou lança.

Exercícios de equilíbrio ou de passagem sobre pinguelas,


barra fixa ou oscilante, horizontal ou inclinada, a cavalo ou
a pé, progredindo para frente ou para trás, a fim de
habituar-se às passagens de ribeiros ou precipícios,
utilizando-se de ramos de árvores ou de uma vara.

Exercícios de transposição de obstáculos naturais, como


barreiras, muros, fossos, etc., conduzindo ou não uma
carga.

Exercícios das mais diversas lutas para desenvolver a


forma muscular, a destreza, a resistência à fadiga e
subjugar o adversário.

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Exercícios de trepar em escada vertical ou progredir em


escada horizontal, fixa ou oscilante, com auxílio dos pés ou
das mãos, ou então ao longo de uma corda cheia de nós,
ou descer escorregando, ou de qualquer outra maneira.

Exercícios de nadar, nu ou vestido, com ou sem carga,


sobretudo armado, de mergulhar e manter-se longo tempo
em equilíbrio sobre a superfície limitada, de aprender a
salvar uma pessoa, sem, entretanto, se deixar agarrar por
ela.

Exercícios para transpor um espaço determinado com


suspensão variável de braço, mãos e pés, ou somente com
auxílio das mãos ou com o auxílio de uma vara ou corda
esticada.

Exercícios, parado ou em movimento, com habilidades,


segurança, de suspender corpos de conformações várias,
incômodos e pesados, algumas vezes homens ou crianças,
salvá los em perigo, arrastar ou empurrar pesos ou massas
consideráveis para poder aplicá-los em casos de utilidade
militar ou de interesse público.

Exercícios de prática da esferística antiga e moderna,


atlética e militar em todas as suas modalidades de lançar
bolas, balões, e péla de diferentes pesos e tamanhos e
arremessar toda espécie de projéteis sobre ponto
determinado.

Exercícios de tiro ao alvo, fixo ou móvel.

Exercícios de esgrima, a pé ou a cavalo, exercício para


manejo de toda espécie de arma branca.

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Exercícios de equitação: fazer o treinamento no cavalo de


pau e repeti-lo depois com o animal.

Exercícios para prática de danças pírricas ou militares e


das danças de sociedade, dando a estas o mais amplo
desenvolvimento.

Podemos aprender o caráter utilizado destas 15 séries de exercícios propostos


por Amorós conforme a ideologia da época; assim também é possível aprender
a sua preocupação com o desenvolvimento da força física, defesa, agilidade e
resistência, qualidades físicas essenciais tanto para o trabalho fabril quanto para
as lutas pela defesa da pátria, sob a ótica da burguesia ascendente.

Figura 6 - Jovem aquecendo para exercício


Fonte: Shutterstock, 2021.

#PraCegoVer: na figura, temos a fotografia de uma mulher sentada no chão,


sobre um tapete laranja. Ela está de top e shorts preto, tênis, com uma faixa
branca na cabeça. Ela está se alongando, tocando as mãos nos tênis, em
direção à esquerda. Do lado direito, encontramos dois pequenos halteres rosa.
Ao fundo, há uma grande janela com dois vasos de plantas à direita.

Na França, a partir de 1850, a ginástica amorosiana integrou os currículos de


todas as escolas primárias e foi obrigatória para as escolas normais. A partir
dos trabalhos de Amorós, ocorreu um crescente envolvimento de estudos da

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biologia, da fisiologia, assim como de médicos em torno da problemática do


exercício físico.

VOCÊ QUER VER?


O vídeo a seguir nos mostra a ginástica francesa e a força de trabalho.
Confira clicando no link a seguir!

Acesse
(https://laureatebrasil.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/c
onteudos/SAU_INEDFI_19/unidade_1/ebook/index.html)

Outro grande nome da escola francesa de ginástica foi Georges Demeny (1850-
1917). Ele tinha formação em biologia, fisiologia e pedagogia e defendia a tese
de que a Educação Física deveria abandonar procedimentos empíricos e
inspirar-se em leis físicas e biológicas para constituir uma prática a partir de
resultados de experiências feitas por meio do método científico.

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VOCÊ SABIA?
Georges Demeny nasceu 1850 na Holanda e faleceu em 1917 em Paris.
Fonte: clique aqui
(https://www.imdb.com/name/nm2930046/mediaviewer/rm2605404928)
.

Além de biólogo e pedagogo que gostava de praticar ginástica, foi


inventor, cineasta e ginasta. Se destacou por inventar uma câmera
cronofotográfica para estudar os movimentos e fundou a Sociedade de
Ginástica Racional. Para saber mais sobre as contribuições de Demeny à
Educação Física, acesse: clique aqui
(http://revista.cbce.org.br/index.php/RBCE/article/view/2099/1048).

Para assistir a um vídeo mostrando os estudos de movimento de


Demeny, clique aqui (https://www.youtube.com/watch?
v=H7LH5B3PYDM).

Segundo Demeny, o problema da Educação Física deveria ser tratado por todos
os meios de que a Ciência dispõe, uma vez que é susceptível de precisão. Cada
vez que um problema é trabalhado de forma experimental, a partir das medidas,
as noções em relação a ele tornam-se mais claras, e irá contribuir de modo
muito mais significativo para a causa da Educação Física do que simplesmente
formular críticas e opiniões pré-concebidas (LANGLADE & LANGLADE apud
SOARES, 2012).
Ele era um seguidor do positivismo e defendia assim a Educação Física: “O
conjunto de meios destinados a ensinar ao homem a executar um trabalho
mecânico qualquer com a maior economia possível de gasto de força muscular”
(LANGLADE & LANGLADE apud SOARES, 2012). Demeny teve uma grande
preocupação com os exercícios físicos destinados às mulheres. Seus estudos
sobre movimento arredondado contínuo e também com ritmo, influenciados pela
dança, levaram-no a trabalhar com a ginástica feminina.
Com relação à saúde da mulher, além de preconizar exercícios físicos próprios,
procurou combater os “hábitos elegantes” por julgá-los nocivos à saúde da
mulher. Condenava o uso de saltos altos, porta-seios, cintas, enfim, todos os
meios de sustentação que fossem artificiais porque eles apenas acentuavam “a
flacidez das paredes naturais, facilitando hérnia, a prisão de ventre, a má
circulação e contribuindo para partos difíceis” (MARINHO, 1985).

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Essas preocupações com a saúde da mulher, particularmente com sua função


reprodutora, estão marcadamente presentes nos discursos e nas propostas dele,
bem como dos intelectuais brasileiros. Tanto Rui Barbosa quanto Fernando de
Azevedo, em momentos distintos, articulados, porém, no plano ideológico, não
pouparam páginas em seus trabalhos para enaltecer os efeitos higiênicos dos
exercícios físicos sobre as formas femininas.
Se Demeny pode ser considerado inovador devido às suas preocupações mais
totalizantes em relação ao exercício físico, ele continua, entretanto, sendo
conservador, uma vez que com o seu método “propõe-se a aumentar a energia
física do indivíduo e acrescentar-lhe rendimento (...). Tal método diz respeito ao
homem universal isolado da prática real e de todas as relações sociais, tendo
como objetivo entidades abstratas, a motricidade, o movimento, a atividade
humana” (SOARES, 2012).
Desse ponto de vista, os métodos de ginástica até agora por nós discutidos
assemelham-se. Diferenciam-se apenas na forma: umas são mais analíticas,
outras mais sintéticas. Todavia, o conteúdo anátomo-fisiológico ditado pela
ciência constitui o núcleo central das distintas propostas, além, é claro, da moral
de classe, do culto ao esforço individual, da disciplina, obediência, ordem,
adaptação e formação de hábitos.
Orientados para o desenvolvimento físico e para a saúde, o que se evidencia é
que esses métodos ginásticos convêm à burguesia porque trazem,
marcadamente, a possibilidade de enaltecer indivíduos abstratos, separados das
relações e que são porta-vozes de uma prática neutra, cultuando o mito do
homem natural e biológico.

1.1.5 A escola francesa no Brasil


No Brasil, a ginástica francesa foi oficialmente implantada em 12 de abril de
1921 pelo Decreto nº 17784. A sua chegada, porém, deu-se no ano de 1907, por
meio da missão militar francesa, que veio ao país com a finalidade de ministrar
instrução militar à força pública do Estado de São Paulo, onde fundou uma sala
de armas que deu origem, mais tarde, à Escola de Educação Física do Estado de
São Paulo.
Anos mais tarde, em 1929, o Ministério da Guerra, por meio de uma comissão
formada por civis e militares, elaborou um anteprojeto de lei cujo conteúdo
determinava que a Educação Física fosse praticada por todos os residentes no
Brasil e com obrigatoriedade em todos os estabelecimentos de ensino
(CANTARINO FILHO, 1982 apud SOARES, 2012).
Definiu também em seu artigo 41 o método a ser adotado: “Enquanto não for
criado o método nacional de Educação fica adotado em todo o território
brasileiro o denominado método francês, sob o título de regulamento geral de

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Educação Física” (MARINHO, 1985).


O anteprojeto recebeu severas críticas da Associação Brasileira de Educação
(ABE) pois considerava que os órgãos governamentais eram incapazes de
“resolver um problema educativo nacional” quanto às finalidades e
inconvenientes de transplantar para o Brasil um sistema estrangeiro de
ginástica, tornando-o obrigatório.
A sistematização da ginástica sueca ocorreu no início do séc. XIX e teve como
objetivo extirpar os vícios da sociedade, especialmente o alcoolismo. Esse
método sueco de ginástica se colocava como o instrumento capaz de criar
indivíduos fortes, libertos de vícios e com uma boa moral. Esse perfil de homem
era o que se esperava que seria útil à produção e à pátria. Nesse momento da
história, a Suécia iniciava o seu processo de industrialização, e homens
saudáveis eram necessários para trabalhar nas fábricas e também, se
necessário fosse, estariam prontos para compor as fileiras do exército para uma
possível guerra.

VOCÊ O CONHECE?
Pier Henrik Ling (1776-1839) nasceu na Suécia, em SödraLjunga,
Småland, em 1776. Viveu sua infância num ambiente científico fértil.
Tornou-se poeta e estudou teologia. Era um homem ligado ao mundo da
literatura e às letras e trabalhava em Estocolmo, no Serviço Social.
Estudou literatura francesa e alemã na Dinamarca. Porém, insatisfeito por
perceber a concepção de ginástica vigente à época apenas como veículo
para uma saúde física, voltou para a Suécia para se tornar professor de
esgrima na Universidade de Lund, em 1805. Convencido de que a prática
da ginástica e a criação de um sistema deveriam ser um propósito de
Estado, começou a solicitar a compra de aparelhos para a execução de
exercícios. Continue lendo sobre Ling no site:

Acesse (http://www.scielo.br/pdf/rbce/v37n2/0101-3289-rbce-37-02-
0128.pdf)

Pehr Henrick Ling (1776-1839) propôs um método de ginástica com forte viés
nacionalista que tinha como objetivo regenerar a população sueca, formar
homens fortes, saudáveis e que pudessem preservar a paz na Suécia.

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Figura 7 - Pier Henrik Ling


Fonte: wikipedia.org

#PraCegoVer: na figura, temos uma pintura de Pier Henrik Ling, que está
levemente virado para a esquerda. Ele tem cabelos ralos em cima e curtos, com
costeletas.

Esse modelo de ginástica era dividido em quatro partes que tinham objetivos
diferentes:

Pedagógica: a ginástica pedagógica ou educativa


Independentemente de sexo ou idade e até mesmo condições materiais e
sociais, todos poderiam praticá-la. O seu principal objetivo era desenvolver o
indivíduo normal e harmoniosamente, assegurando a saúde, evitando vícios,
defeitos posturais e enfermidades.

Militar: a ginástica militar


Objetivava preparar jovens para uma possível guerra. Eram exercícios militares
acrescido de ginástica pedagógica. O treinamento de tiro e esgrima integrava
esta prática de ginástica.

Médica: a ginástica médica e ortopédica

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13/04/2022 11:31 Introdução à Educação Física

Tinha como objetivo eliminar vícios posturais e curar certas enfermidades por
meio de movimentos especiais para cada caso específico. Também
fundamentada na ginástica pedagógica.

Estética: a ginástica estética


Utilizava a dança e movimentos harmoniosos que proporcionavam beleza e
graça ao corpo. Era baseada na ginástica pedagógica.

Vejamos como é definida uma lição do método sueco conforme Marinho (1985):

Exercícios de ordem

Exercícios de pernas ou movimentos preparatórios


formando uma pequena série. Esta série se decompõe
assim:
- Movimentos de pernas;
- Movimentos de cabeça;
- Movimentos de extensão dos braços;
- Movimentos do tronco para frente e para trás;
- Movimentos laterais do tronco;
- Movimentos outros de pernas.

Extensão da coluna vertebral

Suspensões simples e fáceis

Equilíbrio

Passo ginástico ou marcha

Movimentos dos músculos dorsais

Movimentos dos músculos abdominais

Movimentos laterais do tronco

Movimentos das pernas

Suspensões mais intensas do que as do número 4

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13/04/2022 11:31 Introdução à Educação Física

Marcha ou movimento de pernas, executados mais


rapidamente que outros para preparar para os saltos

Saltos

Movimentos de pernas

Movimentos respiratórios

A ginástica feminina é idêntica à masculina, com as seguintes restrições:

Evitar movimentos muito acentuados para trás;

Não realizar movimentos que possam congestionar a


bacia;

Abster-se do trabalho físico durante a menstruação;

Os aparelhos utilizados pelo método sueco eram e ainda são:

Barra móvel para exercícios de suspensão e equilíbrio;

Cavalo de pau, plintos, carneiros

Espaldares e banco sueco.

VOCÊ QUER VER?


O vídeo a seguir nos mostra a ginástica sueca e os aparelhos de
ginástica. Assista e sinta-se naquela época!

Acesse
(https://laureatebrasil.blackboard.com/bbcswebdav/institution/laureate/c
onteudos/SAU_INEDFI_19/unidade_1/ebook/index.html)

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13/04/2022 11:31 Introdução à Educação Física

1.1.6 A escola sueca no Brasil


No Brasil, Rui Barbosa foi um grande defensor da ginástica de Ling,
fundamentalmente por ela basear-se na ciência e ser bem acolhida.
No ambiente médico brasileiro, outro grande nome foi Fernando Azevedo, grande
incentivador desse método ginástico. Esses pensadores atribuíam à ginástica
sueca uma adequação maior ao estabelecimento de ensino dado o seu caráter
essencialmente pedagógico.
Essa defesa por tais intelectuais da classe médica serviu para propagar a
ginástica sueca no Brasil. Com isso, lentamente a ginástica alemã foi se
restringindo aos quartéis e a ginástica sueca se tornando mais adequada e
aceita nas escolas e no âmbito civil.

1.1.7 Educação Física higienista


Segundo esta concepção, a questão da saúde está em primeiro plano. Cabe à
Educação Física um papel importante na formação de homens e mulheres
sadios, fortes e dispostos à ação. Mas a Educação Física higienista não se
responsabiliza somente pela saúde individual das pessoas. Na verdade, ela atua
como protagonista em um projeto de assepsia social, idealizado pelos dirigentes
políticos, da saúde e da educação da época. Dessa forma, a ginástica, o
desporto e os jogos recreativos objetivavam melhorar os hábitos das pessoas no
sentido de levá-las a se afastarem das práticas capazes de provocar a
deterioração da saúde e da moral que comprometeriam a vida coletiva.
Assim, a perspectiva da Educação Física higienista vislumbrou a possibilidade e
a necessidade de resolver o problema da saúde pública pela Educação. O
objetivo central foi disseminar os padrões de condutas forjados pelas elites
dirigentes entre todas as outras classes sociais. Os meios para alcançar tal
padrão foram encontrados na adoção de um correto programa de Educação
Física. Essa concepção de Educação Física entende que, independentemente
das determinações impostas pelas condições de existência material, o indivíduo
pode e deve adquirir saúde. Essa concepção se preocupa em utilizar a Educação
Física como agente de saneamento público, na busca de uma sociedade livre de
doenças infecciosas e dos vícios deterioradores da saúde e do caráter do
homem do povo.

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Figura 8 - Jovens em cabo de guerra


Fonte: Shutterstock, 2021.

#PraCegoVer: na figura, temos a fotografia de jovens em cabo de guerra. Há dois


homens do lado esquerdo, mais ao fundo, e três pessoas do lado direito, mais à
frente da foto. Todos seguram uma corda branca e tentam puxá-la para seus
grupos. Ao redor, pode-se observar vegetação.

No início do séc. XX, o pensamento liberal representou uma visão política muito
marcante no Brasil. Esse pensamento acreditava que salvação da humanidade
somente poderia ocorrer por meio da educação e da escola. A Educação Física
higienista resultou desse pensamento. Assim, as elites intelectuais brasileiras
depositaram suas esperanças na educação e na escola para construir uma
sociedade democrática e desprovida de problemas sociais.
É interessante reproduzir aqui uma passagem escrita por Rui Barbosa, um dos
mais importantes liberais da sua época:

É impossível formar uma nação laboriosa e produtiva sem que

a Educação higiênica do corpo acompanhe pari passu, desde

o primeiro ensino até o limiar do ensino superior, o

desenvolvimento do espírito. Assim, nesta quadra da vida

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13/04/2022 11:31 Introdução à Educação Física

estará arraigado o bom hábito, firmada a necessidade, e o

indivíduo, entregue a si mesmo, não faltará mais a esse dever

primário da existência humana. Acredita-se, em geral, que o

exercício da musculatura não aproveita senão a robustez da

parte impensante da nossa natureza, a formação de membros

vigorosos, a aquisição de forças estranhas à inteligência.

Grosseiro era o cérebro, a sede do pensamento envolve o

organismo, e o organismo depende vitalmente da higiene que

fortalece os vigorosos e reconstitui os débeis. (Lourenço Filho,

1954 apud GHIRALDELLI JUNIOR, 2007)

Defendendo a tese de que a higiene do corpo e a higiene da mente são


inseparáveis, Rui Barbosa vai encontrar na Educação Física a disciplina escolar
capaz de satisfazer o apetite infantil pelo movimento e atividade física. Vários
aspectos defendidos pelo pensamento liberal em relação à Educação Física, e
que desembocam naquilo que estamos designando de Educação Física
higienista, estão vivos ainda hoje permeando os discursos de autoridades
políticas, médicas e pedagógicas e de professores de Educação Física.
Podemos constatar nos dias de hoje com a proliferação das academias de
ginástica a crença de que existe uma real possibilidade de aquisição de saúde e
beleza por meio da Educação Física.
O cuidado com o corpo surge, então, desprendido das possibilidades (ou
impossibilidades?) que cada indivíduo, inserido nesse sistema social, tem para
adquirir e preservar a saúde e manter o padrão estético corporal imposto pela
mídia (GHIRALDELLI JUNIOR, 2007).

1.1.8 Educação Física militarista


A Educação Física militarista ocupou uma posição de destaque nas décadas de
1920 a 1930. A ideia central dessa concepção de Educação Física era o
aperfeiçoamento da raça, fundamentada nas falsas conclusões da biologia
nazifascista. Objetivava a formação do homem obediente, adestrado,

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respeitador da hierarquia, sem uma visão crítica da sociedade. Muitos


intelectuais daquela época defendiam essas teses, como Lyra Filho em 1958,
que, segundo Ghiraldelli Junior (2007), assim dissertou:

O estádio, assim como o quartel, desperta o sentimento da

obediência às regras das operações; adestra a capacidade

aplicada ao raciocínio e à decisão; remarca o cunho da

solidariedade e aprofunda os laços de respeito ao valor, à

autoridade e ao dever.

O autor Souza Ramos, em 1936, assim se manifestou sobre o tema: “Cabe aos
espertos suprir as falhas dos processos de seleção racial e do seu
aperfeiçoamento”. Logo após, em 1938, Vasconcelos assim redigiu: “As etapas a
vencer ao serviço da pátria exigem cada vez mais um corpo sadio, pois com o
enobrecimento físico surgirá uma alma sadia, um pensamento sadio e o
desdobramento do esforço coletivo” (GHIRALDELLI JUNIOR, 2007).
Assim surgiria uma consciência nacional, uma nova mentalidade e novas
possibilidades decorrentes de cada indivíduo se transformar em uma máquina
de colaboração e rendimento.
Um aspecto importante para uma melhor compreensão dessa concepção
militarista é que não devemos confundir a educação militarista com a Educação
Física militar. Apesar de haver ligações entre ambos os conceitos, a Educação
Física militarista não se resumiu a uma prática militar de preparo físico. Foi,
acima disso, uma concepção que visou a impor a toda a sociedade padrões de
comportamento semelhantes aos quartéis do exército. Ela se preocupava com a
saúde individual e com a saúde pública, mas o seu principal objetivo era preparar
os jovens para suportar o combate, a luta, a guerra.
A Educação Física militarista atuou como uma selecionadora de elites
condutoras capaz de distribuir melhor os homens e mulheres nas atividades
sociais e profissionais. Defendeu a ideia de que o seu papel era colaborar no

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processo de seleção natural, eliminando os fracos e premiando os fortes no


sentido de depuração da raça brasileira.

Essa tese se originou na eugenia, baseada na melhoria da raça


e aplicada na Alemanha nazista. As atividades esportivas
como a ginástica, o desporto e os jogos recreativos só tinham
utilidade se visassem à eliminação dos incapazes fisicamente.
A coragem, a vitalidade, o heroísmo e a disciplina exacerbada
compunham a plataforma básica dessa concepção.

Outro objetivo era a formação do cidadão-soldado, capaz de


obedecer cegamente, e sem questionar, as ordens de
superiores hierarquicamente. Um dos instrumentos utilizados
naquele período para divulgar as teses da concepção
militarista foi a revista da Escola de Educação Física do
Exército, que se tornou uma grande divulgadora das ideias
dessa concepção.

No ano de 1945, com a derrota do nazifacismo, essa corrente da Educação


Física foi obrigada a se reciclar, abandonando os argumentos, ou seja, os ideais
nazifascistas. Apesar disso, nos dias de hoje é possível encontrar resquícios dos
princípios norteadores dessa concepção militarista nas aulas de Educação
Física em escolas e clubes brasileiros.

1.1.9 Educação Física pedagogicista


Esta concepção de Educação Física surgiu com proeminência no período pós-
guerra (1945-1964). Ela se fundamentou nas teorias psicológicas de John Dewey
e da sociologia de Durkheim que podemos encontrar no movimento da Escola
Nova que, desde a década de 1920, valorizava a Educação Física como elemento
da Educação Integral.

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Figura 9 - John Dewey


Fonte: wikipedia.org

#PraCegoVer: na figura, temos uma fotografia em preto e branco de John Dewey.


Ele está levemente virado para a esquerda e olha para frente. Tem cabelos
curtos e brancos, assim como um bigode singelo. Usa óculos de grau, terno e
gravata.

A escola tradicional, representada principalmente pelas escolas religiosas, por


sua vez também acolhia os exercícios físicos como fator de disciplina e de
saúde. Foi essa aglutinação de interesses político-econômicos, militares e
educacionais que criou condições para generalizar-se a obrigatoriedade da
Educação Física nos currículos escolares, consolidada pela constituição de 1937
(KOLINIAK FILHO, 2008).

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VOCÊ SABIA?
John Dewey nasceu na cidade de Burlington, nos EUA, em 1859. Filho de
comerciantes, foi educado para ser um homem comum voltado ao
trabalho, com valores comunitários e religiosos. Entretanto, graduou-se no
magistério fez doutorado em Filosofia na Universidade John Hopkins.
Posteriormente, estudou Biologia e a teoria da evolução de Darwin, além
da filosofia de Hegel, que contribuíram para que elaborasse o seu primeiro
livro em 1887, intitulado Psicologia. Para saber mais sobre a relevância da
concepção de movimento de Dewey para a Educação Física brasileira,
clique no link a seguir!

Acesse (http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n17/n17a06)

A Educação Física pedagogicista estava preocupada com os jovens que


frequentavam as escolas. Utilizava, portanto, a ginástica, a dança e o desporto
como instrumento de educação, e tinha como objetivo preparar a juventude para
aceitar as regras de convívio democrático, além de preparar as novas gerações
para o altruísmo, o culto, a riqueza e os valores nacionais.
Essa concepção defendeu a tese de que a Educação Física era uma prática
eminentemente educativa e, mais do que isto, advogou a Educação Física do
movimento como a única capaz de promover a chamada Educação Integral.
Nessa concepção há uma nítida diferenciação entre instrução e educação.
Assim, as diversas disciplinas escolares são ditas instrutivas, enquanto a
Educação Física, mais rica, é também educativa. Nesse sentido, é ela quem
colabora decisivamente para que a juventude venha a melhorar a sua saúde,
adquirir hábitos fundamentais, preparar-se vocacionalmente e racionalizar o uso
das horas de lazer.
Outro aspecto importante foi que a concepção pedagogicista defendeu a ideia
da valorização do profissional de Educação Física, pois acreditava piamente que
a Educação Física era útil e boa socialmente e que, portanto, deveria ser
respeitada acima das lutas políticas dos interesses diversos de grupos ou de
classes sociais. Assim, foi possível forjar um sistema nacional de Educação
Física capaz de promover a Educação Física do homem brasileiro respeitando as
suas peculiaridades culturais, físico-morfológicas e psicológicas.

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Entre os anos de 1945 e 1964, aumentaram os estudos sobre Educação Física


comparada, e as revistas e artigos mostraram a organização dos desportos e da
Educação Física nos países desenvolvidos. O modelo americano encantou a
intelectualidade universitária ligada às escolas de Educação Física. Segundo
Silva (1950), a Associação Nacional de Educação Física dos Estados Unidos
preconizou que as finalidades da Educação Física eram as seguintes: a) Saúde,
b) Desenvolvimento de habilidades fundamentais para a vida, c) Formação de
caráter e desenvolvimento de qualidades dignas de um bom membro de família
e bom cidadão, e d) Aproveitamento sadio das horas livres e preparação
vocacional:

Saúde

A Educação Física pode contribuir igualmente para a saúde


física e mental, por meio de atividades consideradas
fisicamente saudáveis e mentalmente estimulantes.

Habilidades fundamentais

Entre as habilidades fundamentais de toda sorte de que o


indivíduo necessita para assegurar seu completo bem-estar e
ajustamento, salientam-se as habilidades físicas como uma
necessidade fundamental em todas as idades.

Caráter e qualidades mínimas de um bom


membro de família e bom cidadão

A Educação Física é uma fase de trabalho escolar que


particularmente se presta para o desenvolvimento do caráter.

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Preparação vocacional

Certos tipos de atividade física, especialmente as competições


desportivas, desenvolvem controle emocional e qualidade de
comando e liderança.

Uso contínuo das horas livres

O mau aproveitamento desse tempo pode destruir a saúde,


reduzir a eficiência e quebrar o caráter, além de degradar a vida.

Em termos históricos, é preciso ter a compreensão de que a adoção da


Educação Física pedagogicista, ligada ao trabalho escolar e muito influenciada
pelas teorias escolacionistas de Dewey, não significava o abandono da prática
de uma Educação Física comprometida com uma organização didática, que
ainda estava sob parâmetros militares. Afinal, não podemos esquecer que até os
anos de 1950 o regulamento número 7, ou método francês, era obrigatório como
diretriz da prática da Educação Física na rede escolar de ensino brasileiro.
Todavia, essa nova concepção promoveu formas de pensamento que, aos
poucos, alteraram a prática de Educação Física e a postura do professor de
Educação Física. Tais novas formas de pensamento instauraram uma apologia
da Educação Física como o centro vivo da escola pública, responsável por todas
as particularidades educativas das quais as outras disciplinas, as instrutivas,
não poderiam cuidar.
As fanfarras da escola, os jogos internos e interescolares, os desfiles cívicos, a
propaganda da escola na comunidade, tudo isso passou a ser incumbência do
professor de Educação Física. Ele, de forma abnegada, devia, além de ministrar
as suas aulas, cumprir com as funções de educador e até mesmo de líder na
comunidade. A Educação Física, acima das desavenças políticas, era capaz de
cumprir o velho anseio da educação liberal: formar o cidadão (GHIRALDELLI
JUNIOR, 2007).

1.1.10 Educação Física competitivista

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13/04/2022 11:31 Introdução à Educação Física

A partir dos anos 1920 e 1930, progressivamente, o desporto de alto nível


ganhou espaço no interior da sociedade e, consequentemente, da Educação
Física. Nos anos de 1960 a 1970, o desporto de alto nível subjugou a Educação
Física, colocando-a como uma atividade menor, em um projeto que privilegiou o
treinamento desportivo.
O desporto de alto nível se tornou referência para toda a Educação Física. Tal
prática estava associada ao alto grau de avanço científico nas áreas da fisiologia
do esforço, da biomecânica e do treinamento desportivo. No aspecto político,
essa concepção se apresentou como uma atividade neutra, acima dos conflitos
políticos.
A tecnização, com a sua aparente aura de neutralidade científica, adequou-se
perfeitamente aos interesses dessa concepção. O sustentáculo ideológico da
Educação Física competitivista foi o mesmo desenvolvido pela tecno-burocracia
militar e civil, que assumiu o poder em março de 1964. Conforme Ghiraldelli
Junior (2007), “desenvolvimento com segurança” era o binômio produzido e
divulgado na Escola Superior de Guerra (ESG) que deu o tom principal para a
ideia de uma tecnização da educação, e da Educação Física, no sentido de uma
racionalização despolitizadora, capaz de aumentar o rendimento educacional do
país e, na área da Educação Física, promover o desporto representativo capaz de
trazer medalhas olímpicas para o Brasil.
O esporte foi sendo utilizado como instrumento de marketing para o governo
brasileiro. Fazia-se necessário eliminar as críticas internas e deixar transparecer
um clima de prosperidade e desenvolvimento. Os problemas políticos
desapareceram com a censura à imprensa e com a expulsão de brasileiros
descontentes com um regime cada vez mais ditatorial no país. A Educação
Física se alinhou a essas ideias, como podemos constatar no Boletim Técnico
Informativo da Divisão de Educação Física do Ministério da Educação e Cultura
(MEC): “Combatem-se a malquerência, a maledicência, a crítica destrutiva, que
dividem, que desunem e abstam os nossos esforços em ajudar o nosso atual
governo a construir uma grande nação: O Brasil Grande”.
Nessa concepção, procurou-se:

Primeiro
Elevar o nível e o conceito do professor de Educação Física,
incentivando-o ao estudo, à pesquisa, à elaboração de
trabalhos e aos planos que foram difundidos entre os
leigos e os licenciados.

Segundo

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Oferecer uma estrutura moderna a toda uma organização


arcaica, obsoleta, ultrapassada, que foi legada aos
dirigentes da nação pela imprevidência, desorganização
político-administrativa, descrença, quando não por falta de
patriotismo de alguns antecessores, muitos dos quais
apenas tiveram em mente atrelar um país de 8,5 milhões
de quilômetros quadrados e cerca de 90 milhões de
habitantes à orientação e países cuja filosofia de governo
não se coaduna com a nossa formação e índole.

Terceiro
Prover ao professor de Educação Física a convicção de que
ele, por força da profissão, era um condutor de jovens, um
líder, e que não podia aceitar ser conduzido por minorias
ativas que intimidavam, que ameaçavam e às vezes
conseguiam, pelo constrangimento, conduzir a maioria
acomodada, pacífica e ordeira (FERREIRA, 1989, apud
GHIRALDELLI JUNIOR, 2007).

Apesar de negar, a Educação Física competitivista foi instrumento das elites


políticas na tarefa de desmobilização da organização popular. O desporto de alto
nível, que é o desporto-espetáculo, foi oferecido de forma exagerada à
população via rádio, televisão e jornais, alienando o povo dos problemas
políticos, sociais e econômicos.
A Revista Brasileira de Educação Física do Ministério da Educação e Cultura
(MEC), em meados dos anos 1970, ao discutir a criminalidade, enfatizava a
necessidade do desporto no meio operário para canalizar as energias. Ghiraldelli
Junior (2007) apresenta frases de Souza (1974) que representam esse
entendimento:

Não tenho dúvidas em afirmar


que o papel da Educação Física
se ombreia aos ensinamentos
de cunho religioso, pois se às

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vezes, até as convicções


religiosas afetam pessoas,
grupos da convivência social, a
Educação Física, principalmente
através do desporto, aproxima,
dirime dissidências e extingue
preconceitos.
Se fadigarmos o corpo e
orientarmos o espírito sem
rumo do desocupado, do
ansioso, ele buscará
recuperação no leite, no
descanso, e não no bar, nas
esquinas.

Se dermos ao operário de
corpo cansado, após uma
jornada laboriosa, uma
atividade desportiva sadia, o
seu repouso será bem mais
reconfortante, soprando nele,
por vezes, a revolta contra os
patrões, contra a própria
atividade funcional.
Se nas escolas aplicamos uma atividade física adequada,

ajudamos jovens a suportar os desajustes familiares. Quanto

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mais quadras de esportes menos hospitais e menos prisões.

Quanto mais calção, menos pijamas de enfermos e menos

uniformes de presidiários.

Essa política nacional de Educação Física fundamentada na teoria de Educação


Física competitivista é, nos dias atuais, o aríete poderoso que atravessa a
sociedade hegemonicamente. Essa concepção não se enraíza na prática e nem
no cotidiano popular, de forma pura, e sim mesclada com todas as outras
tendências que, historicamente, foram fixando marcos no pensamento social
brasileiro. O culto ao atleta-herói, ao individualismo, é a marca registrada
divulgada e glorificada pelos veículos de comunicação.
A ideia de conquistar um lugar ao sol pelo esforço próprio é ilustrada a todo
momento com os ídolos do desporto, principalmente daqueles provindo de lares
mais pobres e que se destacam em grandes equipes esportivas e em
campeonatos nacionais e internacionais, e que, em verdade, escondem a
verdadeira falta de oportunidade de enriquecimento material e cultural na qual
vive a maior parte da nossa população.
Após este estudo, podemos constatar que a Educação Física competitivista foi
incentivada pelo regime militar (1964-1985), pois tal concepção se alinhava com
o sentido da proposta de Brasil Grande defendida pelos militares e políticos
daquele período.

1.1.11 Educação Física popular


Ao contrário das concepções anteriormente citadas, a Educação Física popular
não revela uma produção teórica (livros, teses, periódicos) abundante e de fácil
acesso. Podemos dizer que a Educação Física popular se mantém quase que
exclusivamente numa teorização transmitida oralmente entre as gerações de
trabalhadores deste país. Boa parte dos documentos do Movimento Operário e
Popular que poderiam conter uma teorização não foram encontrados pelos
pesquisadores. Todavia, do material existente é possível resgatar uma
concepção de Educação Física que, paralela e subterraneamente, veio
historicamente se desenvolvendo com e contra as concepções ligadas à
ideologia dominante.

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Figura 10 -
Participantes na meia maratona anual na cidade de Gijon, Espanha, sábado 3 de maio de 2014

#PraCegoVer: na figura, temos a fotografia dos participantes da meia maratona


anual na cidade de Gijon, Espanha, em 2014. Eles estão com roupas adequadas
para a corrida e têm um selo em suas camisetas com seus respectivos números.

A Educação Física popular não estava preocupada com a saúde pública, pois
entendia que tal questão não podia ser discutida independentemente do
levantamento dos problemas criados pela atual organização econômica-social e
política do país. Não pretendia ser disciplinadora de homens e muito menos
estava voltada para o incentivo da busca de medalhas. Ela se fundamentava na
ludicidade e na cooperação.
Utilizava o desporto, a dança e a ginástica como instrumentos para a
organização e mobilização dos trabalhadores. A Educação Física foi utilizada na
chamada solidariedade operária. A Educação Física popular não pretendeu ser
educativa, pois entendeu que a educação dos trabalhadores estava intimamente
conectada ao movimento de organização das classes populares para a as lutas
da prática social. Para melhor compreensão, é preciso entender que não
estamos considerando a Educação Física popular como a Educação Física
praticada por todos os trabalhadores, mas apenas por uma parcela desse
operariado. Ela emergiu da prática social dos trabalhadores e, em especial, das
iniciativas ligadas aos grupos de vanguarda do movimento operário e popular.
Esse movimento teve início com a República, sendo que, no início, as vanguardas
de orientação socialdemocrata estiveram à frente das movimentações e, no
início do séc. XX, perderam a hegemonia para adeptos e militantes do
anarquismo e anarco-sindicalismo.

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Nos anos de 1920, surgiu o Partido Comunista Brasileiro, que passou a exercer
crescente influência nas classes populares urbanas. A Educação Física e o
desporto não eram vistos com simpatia pelas lideranças anarquistas e, com o
Partido Comunista assumindo a liderança do movimento operário e popular,
essa perspectiva mudou. O partido organizou campeonatos de natação no rio
Tietê, na represa Billings e na represa Guarapiranga, além de campeonatos
populares de futebol nos bairros do Brás e da Mooca na cidade de São Paulo,
bem como nas cidades de São Bernardo e Santo André, entre outras, nos quais a
classe operária era numerosa.
Segundo Ghiraldelli Junior (2007), o jornal oficial do partido, chamado A Nação,
no final dos anos de 1920, promoveu e organizou práticas desportivas populares
incentivando o operariado jovem à frequência do desporto lúdico.

VOCÊ QUER LER?


O artigo Educação Física escolar brasileira: caminhos percorridos e
novas/velhas perspectivas objetiva discutir, a partir de raízes históricas, a
Educação Física como componente curricular, na busca de novos rumos
que permitam sua legitimação como tal. A leitura poderá contribuir para
exemplificar como o conhecimento deste tema se aplica atualmente na
área da Educação Física.

Acesse
(https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/TeorPratEduc/article/view/1610
9/8717)

Após a Segunda Guerra Mundial, quando da redemocratização do país (fim da


ditadura do Estado Novo varguista), no curto período em que o partido saiu da
clandestinidade, novamente as preocupações com a educação e, em particular,
com a Educação Física vieram à tona por parte do movimento operário e
popular. Na ocasião houve a formação de comitês populares democráticos em
diversos bairros das grandes cidades brasileiras, e as questões educacionais, de
lazer e de educação física integravam as pautas de discussões dos operários.
Os comitês, formados inicialmente no sentido de lutar pela convocação da
Assembleia Nacional Constituinte, rapidamente se tornaram agremiações

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reivindicadoras e organizadoras que desejavam a participação do poder público


na tarefa de construção de escolas, quadras esportivas, jardins de infância,
praças, etc. (GHIRALDELLI JUNIOR, 2007).
No interior desses movimentos, forjou-se a concepção de Educação Física
popular, privilegiando a ludicidade, a solidariedade, a organização e a
mobilização dos trabalhadores na tarefa de construção de uma sociedade
democrática. Atualmente, diferentemente dos anos de 1920 ou 1930, existem
dois partidos comunistas: o PCB (Partido Comunista Brasileiro) e o PCdoB
(Partido Comunista do Brasil).

TESTE SUAS HABILIDADES

Vivência das tendências da Educação Física


Agora você já conheceu um pouco mais sobre a atuação do profissional de
Educação Física licenciado.
Vamos fazer um treino de habilidades com a vivência das tendências da
Educação Física?
Nossos objetivos com a prática são:

vivenciar as características da área de atuação e a sua


relação com o mercado de trabalho;

identificar a atuação do profissional no mercado de


trabalho

Para a prática, siga as etapas abaixo:


1. Produza um relatório em formato de texto com até 50 linhas, que possibilite
com que você faça uma reflexão dos pontos que foram discutidos.
2. Descrição da atividade: descreva quais são as atividades realizadas por um
profissional de Educação Física licenciado, assim como qual o seu local de
atuação e o público com o qual ele atua.

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3. Demandas observadas: identifique e descreva quais características são


importantes que um profissional de Educação Física licenciado tenha e quais
experiências são importantes durante sua formação para ter uma atuação de
sucesso.
4. Análise crítica: faça uma análise crítica descrevendo qual a importância do
profissional de Educação Física licenciado e se você considera que esta pode
ser considerada uma profissão que proporcione estabilidade financeira ao
profissional.
5. Conclusões: conclua seu relatório trazendo o que você aprendeu sobre a
atuação do profissional de Educação Física licenciado.
6. Poste no "compartilhe", e se houver dúvidas acione o tutor pelo fórum -
esclareça sua dúvidas.

Muito bem! Com este material, você aprendeu


como um profissional licenciado trabalha e o
Feedb quanto ele é relevante para a formação
ack psicossocial de crianças e adolescentes,
entendendo que atua na Educação Básica e na
formação inicial das pessoas.

CONCLUSÃO

Ao concluir este relato sobre as concepções de Educação Física e as escolas de


ginástica ou métodos ginásticos, objetivamos apresentar um panorama da
Educação Física no Brasil desde o ano de 1837, quando o Colégio Pedro II, no
Rio de Janeiro, incluiu as aulas de Educação Física em seu currículo.
No Brasil, constatamos, pelos estudos realizados, que a Educação Física escolar
apresentou predominância de diferentes vertentes metodológicas sempre em
consonância com os interesses político-econômicos e a respectiva ideologia
dominante em cada momento histórico.
Vimos que, no ano de 1882, Rui Barbosa emitiu um parecer sobre um projeto de
lei que versava sobre a reforma do ensino primário e recomendou a inserção
obrigatória da ginástica para ambos os sexos tanto na escola primária como na
formação de professores.

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Aprendemos que, nos anos de 1837 a 1930, os objetivos da Educação Física


eram a saúde e a eugenia (melhoria da raça) e que as origens da Educação
Física brasileira se interligavam em dois discursos distintos e que se
complementavam: o discurso médico e o militar.
A partir de 1930, na chamada Era Vargas, os objetivos da Educação Física se
centravam em desenvolver a força de trabalho para responder às demandas da
produção industrial e em cultivar os valores morais, o civismo e patriotismo.
Constatamos que, em decorrência desses objetivos, a metodologia de ensino
que predominou nesse período (1930–1945) foi o chamado método francês,
adotado no Exército Brasileiro já na década de 1920, substituindo o método
alemão, que já era ministrado desde os primórdios da República (1860) para os
militares brasileiros. Esse método permaneceu até 1912 na Escola Militar do
Exército. O pós-guerra possibilitou a valorização do esporte como instrumento
de educação e inclusão social.
A Educação Física Desportiva Generalizada ocupou espaço nas escolas
brasileiras tendo como objetivo pedagógico o desenvolvimento fisiológico,
psicológico, social e moral do educando. Esse modelo foi idealizado nos
Estados Unidos e difundido pela Associação Nacional de Educação Física dos
Estados Unidos. O embasamento teórico estava nas teorias psicopedagógicas
de Dewey e na sociologia de Durkheim.
Aprendemos que, nos anos de 1964 a 1985, a Educação Física tinha como
objetivo a competição, ou seja, a formação de atletas para competições
nacionais e internacionais. Foi o período do desporto-espetáculo, e nas aulas de
Educação Física o professor enfatizava a técnica das diversas modalidades
esportivas atuando como treinador de equipe e os alunos como atletas de clube.
Nestes estudos, conhecemos alguns nomes que fazem parte da história da
Educação Física mundial como Guts Muths, Friederich Ludwig Jahn e Adolph
Spiess, que são considerados os grandes idealizadores das escolas alemã de
ginástica. Na França, os nomes Francisco de Amorós y Ondeano e George
Demeny são considerados os pais da escola francesa de ginastica. Já na Suécia,
Pehr Henrick Ling é considerado o grande nome da escola sueca de ginástica.
Esses métodos ginásticos – escola alemã, sueca e francesa – são os pilares da
Educação Física brasileira.
Aprendemos sobre as concepções higienista, militarista, pedagogicista,
competitivista e popular. O estudo de tais concepções pelo autor Ghiraldelli
Junior possibilitou uma melhor compreensão dos diversos períodos da
Educação Física desde o início da Republica até os dias atuais.
Essas concepções coexistem nos dias de hoje em quartéis, academias, clubes e
escolas, com maior ou menor difusão. Como em toda prática social, o novo
convive com o velho.

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13/04/2022 11:31 Introdução à Educação Física

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Referências
Ghiraldelli Júnior P. Educação Física Progressista: a Pedagogia Crítico-
social dos Conteúdos e a Educação Física Brasileira. Edições Loyola, 10ª
edição, 2007, 65p.

Kolyniak Filho C. Uma (Nova) Introdução. Editora da PUC, São Paulo, 2ª


edição, 2008, 126p.

Marinho I. P. Introdução ao estudo da filosofia da educação física e dos


desportos. Horizonte, Brasília, 1985, 243p.

Soares C. L. Educação Física: Raízes Europeias e Brasil. Editora Autores


Associados, Campinas, 5ª edição, 2012, 141p.

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