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Poder Judiciário

Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas


Gabinete do Desembargador Sabino da Silva Marques
_____________________________________________________________________
Primeira Câmara Cível
Apelação nº 0252106-18.2010.8.04.0001
Apelante: Espólio de Doracy Araújo Maia
Procuradora: Dra. Alda Heloísa Tavares Toledo
Apelado: Estado do Amazonas
Advogado: Dr. Ivânia Lucia Silva Costa
Relator: Des. Sabino da Silva Marques

EMENTA: ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO.


ESQUECIMENTO DE AGULHA CIRÚRGICA NO ABDÔMEN DA PACIENTE. DANOS
MORAIS CARACTERIZADOS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE
PROVIDO.
I. O § 6º do art. 37 da Constituição Federal prevê a responsabilidade civil objetiva da
Administração. As entidades estatais e seus desmembramentos administrativos tem a
obrigação de indenizar o dano causado a terceiro por seus servidores,
independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão. Assim, para a
reparação do dano, imperioso se demonstre o nexo causal entre o fato lesivo
(comissivo ou omissivo) e o dano. Comprovados esses dois elementos surge
naturalmente a obrigação de indenizar.
II. Diante das provas existentes nos autos, observo preenchidos todos os requisitos
que ensejam a reparação do dano e consequente dever de indenizar do Estado. O
nexo causal e o fato lesivo foram devidamente demonstrados nos documentos
juntados que comprovam que a mesma tinha se submetido a cirurgia cesariana para o
nascimento de seu filho na Maternidade Ana Nery e a existência de uma agulha
cirúrgica em seu abdômen (detectada nos exames, inclusive com a sua retirada às fls.
36; 55 e 148/192) e o dano nas fortes dores que sentia gerando-lhe uma má qualidade
de vida e na busca incessante para a solução do problema.
III. Todos os profissionais no desempenho de suas atividades laborais devem atuar
com zelo, cuidado redobrado, e, ainda com mais atenção os profissionais da saúde. A
negligência evidenciada nos autos no esquecimento de agulha cirúrgica gera o dano
moral pleiteado. No caso, a Autora narrou as dores que sentia e o sofrimento ao longo
de vários anos, vez que nenhum médico sabia o que lhe incomodava. Por outro lado,
não ficou comprovado nos autos que o mencionado objeto estranho causou-lhe
sequelas graves, motivo pelo qual deverá ser fixado o valor do dano moral em R$
30.000,00 (trinta mil reais).

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº


0252106-18.2010.8.04.0001, em epígrafe, acordam os Excelentíssimos Senhores
Desembargadores que compõem a Primeira Câmara Cível do Egrégio Tribunal de
Justiça do Estado do Amazonas, por unanimidade, conhecer e dar parcial provimento
ao presente recurso, nos termos do voto do relator que passa a integrar o presente.
PUBLIQUE-SE.
Sala das Sessões da Primeira Câmara Cível do Egrégio Tribunal de
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Processo nº 0252106-18.2010.8.04.0001
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Justiça do Estado do Amazonas, em Manaus/AM, data do sistema.

Desembargador Presidente

Sabino da Silva Marques


Relator
assinado digitalmente

01. Relatório

01.01. Trata-se de recurso de Apelação Cível (fls. 266/273) interposto pelo


espólio de Doracy Araújo Maia em face da r. sentença (fls. 250/265) proferida pelo
MM. Juiz de Direito da 4ª Vara Especializada da Fazenda Pública Estadual que, nos
autos da Ação de indenização por perdas e danos c/c antecipação de tutela nº.
0252106-18.2010.8.04.0001, ajuizada em desfavor do Estado do Amazonas e da
Maternidade Balbina Mestrinho (antiga Ana Nery), julgou improcedente o seu pedido
formulado na inicial, com fulcro no art. 269, I c/c art. 333, I do Código de Processo
Civil, face à ausência de provas necessárias capazes de ensejar o direito à
indenização.

01.02. Diz que pretende a indenização por danos morais, pela presença
de uma agulha cirúrgica deixada no corpo de Doracy Araújo Maia quando esta
realizou um parto cesariano, em 06.07.1980, na Maternidade Ana Nery, atualmente
Balbina Mestrinho.

01.03. Afirma que em contestação o Apelado afirmou a inexistência de


prova e a ausência de erro médico; o MM. Juiz, assim, julgou improcedente seu
pleito, afirmando sobre a ausência de prova e de nexo causal entre a cirurgia ocorrida
há mais de 30 anos e a agulha cirúrgica deixada em seu corpo, não havendo como
atribuir responsabilidade ao requerido, ora Apelado, de indenizar.

01.04. Argumenta, porém, que a última cirurgia realizada foi a referida


cesariana, a partir da qual a mesma passou a sentir fortes dores abdominais, porém
só em 2009, através de raio-x solicitado por um urologista, descobriu a causa das
dores. E, ainda, somente após a realização da audiência no Juízo a quo foi
autorizada a extração da agulha cirúrgica, através de tutela antecipada.

01.05. Registra, que, após a extração do tal objeto e a juntada do


prontuário médico que afirma ter a autora passado por 3 (três) cirurgias sendo que a
última foi a tal cesariana -, o Graduado Órgão Ministerial do primeiro grau opinou pela
parcial procedência, vez que restou comprovado o nexo causal.
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01.06. Destaca, ainda, que não pode ser culpada pela inexistência do
prontuário médico da época da cirurgia cesariana, se ficou cabalmente comprovado
nos autos que a maternidade Ana Nery, agora Balbina Mestrinho, só passou a ter os
prontuários dos pacientes a partir de 2000.

01.07. Requer, assim, seja o recurso conhecido e provido, com o fim de


reformar a r. sentença e julgar procedente o pedido da inicial, com a condenação do
Estado ao pagamento de danos morais, além de honorários e demais cominações
legais. E, ainda, reitera todos os benefícios da justiça gratuita.

01.08. O recurso foi recebido no duplo efeito.

01.09. O Apelado apresentou contrarrazões (fls. 278/285) afirmando ser


absurda a alegação de que a certidão de nascimento (fl. 28) e o cartão do berçário da
internação (fl. 29) faziam prova suficiente do nexo de causalidade entre a cirurgia e o
dano e que o MM. Juiz teria ignorado os mesmos, pois que tais documentos não têm
o condão de comprovar o nexo causal entre a cesariana e o dano sofrido.

01.10. Acrescenta, ainda, que a descoberta da agulha deu-se de forma


ocasional, pois deixou claro que essa não estava provocando nenhum sintoma que
pudesse ameaçar a saúde da de cujus.

01.11. Requer, assim, seja negado provimento ao recurso.

01.12. Instado a se manifestar o Graduado Órgão Ministerial informou a


desnecessidade de sua intervenção (fls. 295/297).

01.13. É o relatório, passo a fundamentar.

02. Voto

02.01. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto pelo espólio de


Doracy Araújo Maia em desfavor da r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da
4ª Vara da Fazenda Pública Estadual da Capital, nos autos da Ação de Obrigação de
Fazer cumulada com Indenização por Danos Morais nº 0252106-18.2010.8.04.0001,
em face do Estado do Amazonas e Outro, que julgou improcedente o pedido
formulado na ação, diante da ausência de provas necessárias capazes de ensejar o
direito à indenização.

02.02. O cerne da demanda cinge na existência de responsabilidade do


Estado pelos danos morais sofridos em razão do esquecimento de uma agulha
cirúrgica deixada no abdômenda Sra. Doracy Araújo Maia em decorrência da cirurgia
cesariana realizada em 06/07/1980 na Maternidade Ana Nery, atual Balbina
Mestrinho.
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02.03. É oportuno gizar que a mencionada senhora, no curso do processo,


faleceu em 17/10/2011, conforme certidão de óbito juntada fls. 214/215. Dessa forma,
a patrona habilitada nos autos apresentou petição para expor e requer a habilitação
do espólio, o viúvo Sr. Raimundo Renato da Silva Maia (fls. 209/210).

02.04. Naquela instância, realizada audiência judicial (fls. 218/219), o viúvo


compareceu em substituição processual, momento em que o Juiz a quo concedeu
prazo a parte ativa para a prática de seus respectivos atos - habilitação dos demais
sucessores da Autora, ante a existência de três filhos maiores e capazes -, e após,
havendo concordância, deveriam as partes apresentar suas alegações finais.

02.05. Observo que os demais sucessores foram habilitados, conforme


petitório fls. 221/222, tendo as partes, posteriormente, apresentado suas alegações
finais (fls. 236/242 e 247). Por conseguinte, a substituição processual da Sra. Doracy
Araújo Maia ocorreu pelos seus sucessores, na forma do art. 43 do Código de
Processo Civil1.

02.06. Consta nos autos que a Sra. Doracy Araújo Maia, após o
nascimento do seu último filho, começou a sentir fortes dores na região da bacia,
pernas, lombar e que depois de anos de investigação descobriu a existência de uma
agulha na região pélvica. Para provar o alegado, observo no caderno processual: i) a
certidão de nascimento e o cartão do berçário da internação (fls. 28/29) –
demonstrando, assim, os fatos que originaram o dano alegados pela mesma; ii) o
laudo da radiografia – que especifica a existência da agulha cirúrgica na projeção
pélvica datado de 08/05/2009 (fls. 36), ratificado pela ressonância magnética da pelve
datado de 10/08/2009 (fls. 55); iii) prontuário médico (fls. 148/192) do procedimento
cirúrgico para a retirada do corpo estranho (agulha de fio cirúrgico em parede
abdominal, fls. 151).

02.07. O §6º do art. 37 da Constituição Federal2 prevê a responsabilidade


civil objetiva da Administração. Todas as entidades estatais e seus desmembramentos
administrativos tem a obrigação de indenizar o dano causado a terceiro por seus
servidores, independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão. Assim,
para a reparação do dano, imperioso se demonstre o nexo causal entre o fato lesivo
(comissivo ou omissivo) e o dano. Comprovados esses dois elementos surge
naturalmente a obrigação de indenizar.

1
Art. 43. Ocorrendo a morte de qualquer das partes, dar-se-á a substituição pelo seu espólio ou pelos
seus sucessores, observado o disposto no art. 265.
2“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência, e, também, ao seguinte:
(...)
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos
responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito
de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”
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02.08. Leciona Hely Lopes Meirelles que para o Estado eximir-se dessa
obrigação incumbirá “comprovar que a vítima concorreu com culpa ou dolo para o
evento danoso. Enquanto não evidenciar a culpabilidade da vítima, subsiste a
responsabilidade objetiva da Administração. Se total a culpa da vítima, fica excluída a
responsabilidade da Fazenda Pública; se parcial, reparte-se o quantum da
indenização” (MEIRELLES, 2010, p.692).

02.09. Diante das provas existentes nos autos, observo preenchidos todos
os requisitos que ensejam a reparação do dano e consequente dever de indenizar do
Estado. O nexo causal e o fato lesivo foram devidamente demonstrados nos
documentos juntados que comprovam que a mesma tinha se submetido a cirurgia
cesariana para o nascimento de seu filho na Maternidade Ana Nery e a existência de
uma agulha cirúrgica do abdômen da Requerente (detectada nos exames, inclusive
com a sua retirada às fls. 36; 55 e 148/192) e o dano nas fortes dores que sentia
gerando-lhe uma má qualidade de vida e na busca incessante para a solução do
problema.

02.10. Por seu turno, o Apelado não se desincumbiu do ônus da prova


quanto a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor,
nos termos do art. 333, II do Código de Processo Civil.

02.11. Na contrarrazão alega, em síntese, a inexistência de nexo de


causalidade, pois não há como precisar se a agulha foi realmente deixada neste
procedimento médico e como tomou conhecimento em 2007, fica claro que não
ameaçava a sua saúde (fls. 278/285).

02.12. O Apelado alega sem trazer nenhuma prova capaz de subsidiar os


fatos apresentados, ao passo que a Apelante, quando afirma que a agulha foi
esquecida por ocasião da cirurgia cesariana, faz prova que naquele ano esteve no
hospital sendo submetida neste procedimento, conforme documento fls. 29, estando a
agulha na região abdominal.

02.13. O prontuário médico não consta nos autos, pois conforme


documento emitido pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Amazonas
juntado pela Apelante fls. 71, “não havia nenhum instrumento legal que obrigasse a
guarda permanente de documentos (prontuário médico). A norma determinante de
obrigação de guarda permanente só ocorreu a partir de 2000”. Assim, socorre-nos as
demais provas colacionadas pela Apelante as quais entendo suficientes para
comprovar que esta se submeteu a uma cirurgia cesariana em 1980 na Maternidade
Ana Nery, momento em que foi esquecida um agulha cirúrgica, visualizada nos
exames realizados e na sua extração.

02.14. O fato de ter descoberto a causa de seu desconforto e das suas


dores muito tempo depois não retira a negligência na atuação do Estado e tampouco
descaracteriza a ameaça a sua saúde. Destarte, configurado o dever de indenizar,
passo a fixação do dano moral.
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02.15. Sérgio Cavalieri Filho, ao discorrer sobre o tema, assinala que “(...)
só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que,
fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do
indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero
dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da
órbita do dano moral (...)”.(CAVALIERI, 2009, p. 83)

02.16. A indenização por danos morais possui três finalidades, quais


sejam, a prestação pecuniária como meio de compensação pelos constrangimentos,
aborrecimentos e humilhações experimentados pela parte ofendida, punição para a
parte ofensora e prevenção futura quanto a fatos semelhantes. Portanto, na fixação
do valor do dano no presente caso, é preciso ponderar acerca da atuação do
profissional da saúde e os danos efetivos suportados pela Requerente.

02.17. Todos os profissionais no desempenho de suas atividades laborais


devem atuar com zelo, cuidado e diligência, e, ainda com mais atenção os
profissionais da saúde. A negligência evidenciada nos autos no esquecimento de
agulha cirúrgica gera o dano moral pleiteado. No caso, a Autora narrou as dores que
sentia e o sofrimento ao longo de vários anos, vez que nenhum médico sabia o que
lhe incomodava. Por outro lado, não ficou comprovado nos autos que o mencionado
objeto estranho causou-lhe sequelas graves, motivo pelo qual fixo o valor do dano
moral em R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

02.18. Corroborando o presente entendimento, segue jurisprudência em


caso semelhantes:

RESPONSABILIDADE CIVIL. ESQUECIMENTO DE AGULHA DENTRO DE


BRAÇO DE PACIENTE. DANO MORAL. REEXAME DE PROVAS. O
tribunal a quo manteve a indenização por danos morais ao fundamento de
que "a documentação colacionada ao processado demonstra, à saciedade,
o dano decorrente do fato de ter sido esquecida no braço da autora uma
agulha utilizada na aplicação de um medicamento, uma vez que, como
atestado pela perícia médica realizada, não bastasse o induvidoso abalo
psicológico experimentado pela autora, 'houve perda parcial e temporária da
capacidade funcional do membro superior esquerdo, com limitação da
mobilidade do punho e mão esquerdos, durante o período que a autora
esteve com o corpo estranho (agulha) no antebraço esquerdo, além do
período pós-operatório da retirada da agulha, até a retirada dos pontos' (fls.
133)" - fl. 266. Espécie em que a alteração do acórdão recorrido, quanto ao
ponto, demandaria o reexame da prova, o que é inviável em sede de recurso
especial (STJ, Súmula nº 07). Agravo regimental desprovido.
(STJ - AgRg no AREsp: 164295 MG 2012/0071151-9, Relator: Ministro ARI
PARGENDLER, Data de Julgamento: 15/08/2013, T1 - PRIMEIRA TURMA,
Data de Publicação: DJe 21/08/2013)

AGRAVO REGIMENTAL - AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL -


RESPONSABILIDADE CIVIL - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
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MÉDICO - FRAGMENTO DE MATERIAL CIRÚRGICO DEIXADO NO
ORGANISMO DO PACIENTE - AUSÊNCIA DE OMISSÕES NO ACÓRDÃO
- DANOS MORAIS - FIXAÇÃO - RAZOABILIDADE - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
- REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO - IMPOSSIBILIDADE
- SÚMULA 7/STJ - DECISÃO AGRAVADA MANTIDA - IMPROVIMENTO.
1.- Não se detecta qualquer omissão, contradição ou obscuridade no
Acórdão Recorrido, uma vez que a lide foi dirimida com a devida e suficiente
fundamentação, apenas não se adotou a tese do Agravante.
2.- Ultrapassar os fundamentos do Acórdão e acolher a tese sustentada pelo
Agravante, afastando a culpa reconhecida pelo Tribunal a quo, demandaria
inevitavelmente, o reexame de provas, incidindo, à espécie, o óbice da
Súmula 7 desta Corte.
3.- A intervenção do STJ, Corte de caráter nacional, destinada a firmar
interpretação geral do Direito Federal para todo o país e não para a revisão
de questões de interesse individual, no caso de questionamento do valor
fixado para o dano moral, somente é admissível quando o valor fixado pelo
Tribunal de origem, cumprindo o duplo grau de jurisdição, se mostre
teratólogico, por irrisório ou abusivo.
4.- Inocorrência de teratologia no caso concreto, em que Foi fixado o valor
de indenização de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) devido pela ora
Agravante à autora, a título de danos morais decorrentes da presença de
fragmento de agulha de sutura esquecido no corpo da paciente.
6.- Aferir se houve ou não litigância de má-fé é providência inviável em sede
de Recurso Especial, a teor do óbice constante do enunciado nº 7 da
Súmula do Superior Tribunal de Justiça.
7.- Agravo Regimental improvido.
(AgRg no AREsp 422.718/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA
TURMA, julgado em 11/02/2014, DJe 13/03/2014)

ADMINISTRATIVO - PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO -


RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO - ESQUECIMENTO DE
INSTRUMENTO CIRÚRGICO NA CAVIDADE ABDOMINAL DE PACIENTE -
CICATRIZ LONGITUDINAL - ERRO MÉDICO CARACTERIZADO - DANO
MORAL E ESTÉTICO CONFIGURADOS - QUANTUM INDENIZATÓRIO -
MANUTENÇÃO - JUROS DE MORA - TERMO INICIAL - HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS - MAJORAÇÃO.
1 - Conforme dicção do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, o Estado
responde objetivamente pelos danos provocados por atos de seus agentes,
não se exigindo a comprovação de culpa ou dolo.
2 - O esquecimento de agulha no ventre de paciente durante um
procedimento cirúrgico de parto cesariana, dando ensejo à necessidade de
realização de outra cirurgia com incisão longitudinal e dela resultando em
cicatrizes proeminente no abdômem, configura danos de ordem moral e
estéticos.
3 - Para a fixação do quantum indenizatório por danos morais, deve o
magistrado levar em consideração as condições pessoais das partes, a
extensão do dano experimentado, bem como o grau de culpa do agente
para a ocorrência do evento danoso, justificando-se a manutenção do valor
arbitrado quando observados os princípios da proporcionalidade e
razoabilidade.
4 - Na responsabilidade extracontratual, os juros de mora incidem a partir

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do evento danoso (Súmula 54/STJ). Todavia, na hipótese vertente, impõe-se
a manutenção da data da citação como marco inicial para a incidência dos
juros moratórios, sob pena de reformatio in pejus.
5 - Vencida a Fazenda Pública, os honorários advocatícios devem ser
fixados nos termos do § 4º, art. 20, do CPC, atendidos os requisitos
estabelecidos nas alíneas "a", "b" e "c" do § 3º do mesmo dispositivo legal.
Na hipótese, majora-se a verba honorária para adequá-la aos parâmetros
legais.
6 - Apelação interposta pelo Distrito Federal não provida. Recurso adesivo
da autora parcialmente provido.
(Acórdão n.537671, 20070111540185APC, Relator: NÍDIA CORRÊA LIMA,
Relator Designado:HUMBERTO ADJUTO ULHÔA, Revisor: HUMBERTO
ADJUTO ULHÔA, 3ª Turma Cível, Data de Julgamento: 14/09/2011,
Publicado no DJE: 29/09/2011. Pág.: 80)

02.19. Ao ensejo de conclusão, por acolher as ponderações feitas pelo


graduado órgão ministerial na primeira instância, passo a transcrevê-la:

“(...)
Embora não arguido pelas partes, por ser matéria de ordem pública,
portanto objeto de apreciação pelo parquet, passamos a analisar a
prescrição. Segundo Leonardo José Carneiro da Cunha, “qualquer
pretensão que seja formulada em face da Fazenda Pública está sujeita a
um prazo prescricional de 05 (cinco) anos. E já se viu que, no conceito de
Fazenda Pública, se inserem não somente a União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios, mas também suas autarquias e fundações
públicas. Essa, aliás é a regra inserta no art. 2º do Decreto-Lei nº
4.597/1942, que assim dispõe:
“Art. 2º O Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, que regula a
prescrição quinquenal, abrange as dívidas passivas das autarquias, ou
entidades e órgãos paraestatais, criados por lei e mantidos mediante
impostos, taxas ou quaisquer contribuições, exigidas em virtude de lei
federal, estadual ou municipal, bem como a todo e qualquer direito e ação
contra os mesmos.” (A Fazenda Pública em juízo / Leonardo José Carneiro
da Cunha – 7 ed. Rev., ampl. e atual. - São Paulo: Dialética, 2009, pag.
72).

Não obstante, no caso em concreto, o fato ter ocorrido no ano de 1980, a


sua descoberta se deu em 2009, sendo a ação proposta em 2010, portanto
dentro do prazo prescricional, considerando o conhecimento da lesão.

Neste sentido é a jurisprudência do STJ:

(…)

No mérito, a questão gira em torno da ocorrência ou não do dano, segundo


relato da requerente e caso positivo se há ou não a responsabilidade do
Estado do Amazonas.

Art. 333. O ônus da prova incumbe:

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I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou
extintivo do direito do autor.
Parágrafo único. É nula a convenção que distribui de maneira
diversa o ônus da prova quando:
I - recair sobre direito indisponível da parte;
II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do
direito.

Após análise dos autos, principalmente os relatos da Requerente em


confronto com os exames apresentados, constata-se que o referido
dispositivo foi oriundo de uma operação de cesária realizada em 1980 na
maternidade Balbina Mestrinho. A Requerente logrou êxito em provar os
fatos que originaram o dano experimentado pela mesma, bem como o
nexo causal entre a conduta da Requerida e o dano experimentado, posto
que segundo as avaliações pré-anestésicas as dores sofridas pela mesma
ocorriam na região lombar, justamente onde sofreu intervenção cirúrgica,
por ocasião de uma cesária.

Não obstante, o requerido não combateu os fatos alegados pela


requerente não se desincumbindo de demonstrar o fato impeditivo ou
modificativo do direito da requerente, afastar em consonância com o artigo
citado.

Quanto a responsabilidade da requerida, a mesma é objetiva,


necessitando apenas provar o dano e o nexo causal, que aliás logrou êxito
em fazê-lo.

Relativamente ao quantum a jusrisprudência dos Tribunais já se


pronunciou sobre o assunto:

(…)

Assim, embora a requerente permanecesse com o objeto estranho em seu


corpo, por mais de 20 (vinte), o mesmo não lhe ocasionou maiores
sequelas, haja vista que após a retirada, mediante cirurgia, não houve
relatos de complicações.” (fls. 194/200)

02.20. Ante todo o exposto, conheço e dou parcial provimento para o


recurso de Apelação Cível, reformando a sentença combatida, para condenar o
Estado do Amazonas ao pagamento de indenização por danos morais os quais fixo
em R$ 30.000,00 (trinta mil reais) à Requerente, incidindo juros de mora e correção
monetária pelo IPCA-E, a partir do arbitramento, nos termos da Súmula 362 do
Superior Tribunal de Justiça

02.21. Custas e honorários advocatícios pela Apelante, o qual arbitro em


R$ 1.000,00 (um mil reais), vez que o Apelado decaiu da parte mínima do pedido, nos
termos do parágrafo único, art. 21 do Código de Processo Civil, ficando, todavia,
suspensa sua exigibilidade por força da gratuidade concedida, nos termos do art. 12
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Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas
Gabinete do Desembargador Sabino da Silva Marques
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da Lei nº 1.060/50.

02.22. Encaminhe-se ao setor competente para que proceda a retificação


e atualização no cadastramento da parte ativa ante a substituição processual ocorrida
desde o primeiro grau.

É como voto.

Manaus, 2015.

Sabino da Silva Marques


Relator
assinado Digitalmente

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Processo nº 0252106-18.2010.8.04.0001
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