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6- Françoise Dolto e o Pagamento

Simbólico.

Françoise Dolto foi pediatra e psicanalista,


nascida em 6 de novembro de 1908 em
Paris. Faleceu em 25 de agosto de 1988.

Françoise Dolto foi uma pediatra e


importante psicanalista que debruçou-se
na psicanálise infantil, trazendo muitas
inovações para a área, fortemente
influenciada por Jacques Lacan. Sendo
Dolto influenciada por Lacan, ela
considerava a linguagem um ponto chave
em sua construção teórica. Mas a sua
principal contribuição teórica foi a imagem
inconsciente do corpo. Essa conceituação
vai para além da imagem especular.

A palavra “imagem” foi decomposta


por Dolto para dar sentido a sua
teorização. “I” de identidade, “ma” de
mamãe, “ge” de eu. Isso reforça o
conceito de que o “eu” se forma a partir
de uma relação com um outro, que por
meio da linguagem vai dar sentido às
experiências desse. A imagem
inconsciente do corpo são as experiências
vividas que se relacionam intimamente
com o outro, mas que mesmo se tratando
de experiências já vividas, manifestam
grande influência em nossas experiências
atuais por considerar a atemporalidade do
inconsciente.

Sobre a técnica

Pagamento simbólico das sessões

Dolto introduziu o pagamento


simbólico das sessões. Segundo ela, a
criança podia pagar pelo processo a sua
própria maneira, através de desenhos ou
outros elementos que significam algo de
valor para a ela. Dolto utiliza essa prática
para distanciar o efeito da sedução de se
posicionar no lugar dos pais,
responsabilizando a criança por sua
própria sessão. Segundo Dolto, a criança
no início do édipo, já se dispõe de
autonomia e, em consequência disso, já
seria capaz de atribuir valor aos objetos.
O pagamento simbólico dá ao sujeito um
sinal sobre seu desejo de vir as sessões,
e Dolto relata que algumas crianças
nunca esqueciam as pedrinhas que
seriam usadas para pagar as sessões.
Não havendo poder de compra, o objeto
simbólico sustentaria a autonomia da
criança, responsabilizando-a pelo seu
processo de análise. O que mais se nota
é a existência relacionada a
responsabilidade. Essa responsabilidade
está relacionada com o livre arbítrio de
querer vir ou não as sessões.

Lugar dos pais

Dolto não atuava com crianças


separadamente dos pais. Ela atendia a
criança nas entrevistas preliminares junto
com os pais. Também não hesitava em
dar conselhos aos pais. Conselhos esses
que podemos relacionar a uma
experiência educativa.

Dolto não poupava críticas a qualquer


prática que ofuscasse o desejo da
criança, limitando a sua expressividade.

Após as sessões preliminares, Dolto


começava o atendimento com a criança,
onde ocorre uma adaptação a linguagem
da criança por entender que ela não é
capaz de associar livremente. Partindo
disso, Dolto utiliza em seu método,
desenhos e modelagem. Segundo ela,
brinquedos já prontos limita o imaginário
de criança. Então ela propõe que a
criança possa criar seu próprio brinquedo
através da modelagem e dos desenhos.
Françoise Dolto traduz para a criança, na
língua dela, o que a analista pensa dos
efeitos que a situação familiar produziu na
criança.

FRANÇOISE DOLTO E A VERDADE

Dolto, em seu livro “Seminário de


Psicanálise de Criança”, fala como o
analista deve agir diante de verdades que,
ao ver da função materna, seria
insuportável para a criança, e com essa
perspectiva ela acabaria por fazer de suas
convicções uma projeção na criança.

Segundo Dolto, é necessário confiar


nas potencialidades da criança para
suportar essa verdade, mas a forma em
que isso chegará até ela tem que vir
adaptada para a linguagem da criança. A
forma de levar isso até a criança é
fazendo da mãe uma espécie de
testemunha no processo de análise,
quando ela revelar o fato na frente da
criança.

A função materna se sente


angustiada por esconder certas coisas da
criança, por achar que vai prejudicá-la e,
segundo Dolto, o objetivo do analista é
fazer com que a função materna confie na
capacidade da criança de lidar com essa
verdade.

Dolto ressalta que não vale a pena


colocar a criança em psicoterapia, se não
tiver a intensão de que ela saiba a
verdade. Esse receio diz mais sobre a
função materna do que necessariamente
sobre a criança e por essa razão, é
necessário que seja feito um trabalho com
a função materna, para ajudá-la a lidar
com esse sentimento que a pertence.

Sobre a forma de dizer essa verdade,


Dolto ressalta a importância de que seja
dita sempre mostrando uma oposição ao
negativismo que carrega esse fato. Dolto
usa um exemplo em seu livro que
organiza muito bem isso. Trata-se de uma
mãe que escondia a prática da
prostituição de sua mãe, no caso avó da
criança. Essa verdade foi dita de forma a
naturalizar isso. Exemplo: essa era a
forma que sua avó tinha de cuidar da sua
mãe. Por meio dessa prática, sua avó
pôde criar sua mãe e se não fosse isso,
você não teria nascido.

Nesse exemplo, Dolto traz uma


oposição positiva para conflitar com a
carga negativa que esse fato socialmente
carrega.

Algo recorrente é a tentativa dos


adultos de privarem as crianças dos
sofrimentos, as isentando dos fatos da
vida, como a morte, separação dos pais
etc. Isso porque os adultos tendem a
proteger seus filhos, por entenderem
essas situações como negativas. Mas
isso parte dos próprios adultos, e de fato
é um sentimento compreensível. Mas
quando a criança se depara com essas
situações na vida, ela não sabe como
lidar e pode acabar desenvolvendo algum
transtorno. A melhor maneira de lidar com
isso é não isentar a criança das questões
naturais da vida, naturalizando esses
fatos de acordo com a linguagem da
criança.

Exemplo: brincar com uma criança


e no meio da brincadeira tornar a morte
algo natural e com uma carga positiva,
para que isso possa, de alguma forma,
fazer parte da estrutura psíquica da
criança. Isso fará com que ela aceite
melhor quando algo do tipo vier a
acontecer.

A morte é um fato, mas a forma


que a experienciamos é o que a torna um
problema. Quando analisamos a cultura
oriental, percebemos uma aceitação da
morte. Se uma cultura pode lidar bem
com um fato e a outra não, temos aí um
indicativo de que a forma em que lidamos
com o fato é que é o problema e não o
fato em si.

Quando tentamos de alguma forma


maquiar um fato para uma criança,
estamos atrapalhando a digestão de algo
que vai acontecer. Então é necessário
naturalizar, não só a morte, mas outras
situações naturais da vida. Quando isso
for um problema para os adultos, então
esses precisarão de análise para
conseguirem lidar melhor com esses
fatos.

Ao posicionar a criança como sujeito,


o analista deve confiar a ela a sua
capacidade de lidar com as questões
mais espinhosas da vida. Vale ressaltar
que tudo isso deve ser feito com a
compreensão de que cada criança é de
um jeito e cada uma tem sua linguagem
própria.

Bruno Bettelheim, em seu livro


“Psicanálise dos Contos de Fadas”, afirma
que não devemos privar as crianças das
verdades da vida através dos contos de
fadas e sim, deixar que essa criança
saiba sobre os fatos naturais da vida.

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