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UFJF

Professora: Alinne Nogueira Silva Coppus Disciplina: Psicanálise da Criança

Aluno: Hiago Abreu Nunes Matrícula: 201932007

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No capítulo "Os Tempos do Brincar", em "A Psicanálise de Crianças e o Lugar dos

Pais", a argentina Alba Flesler debate alguns temas sobre a importância do brincar e como em

cada momento da infância a criança utiliza o brincar com objetivos variados. Na primeira

parte do capítulo, "A polêmica em Jogo", Flesler introduz um debate antigo na psicanálise,

inicialmente uma abordagem criada para adultos, os primeiros analistas que atenderam

crianças eram incertos de como abordar a análise, já que as crianças ainda estavam em

processo de constituição do aparelho psíquico. O método de talking cure não era tão "válido",

principalmente se tratando de crianças menores.

Desse modo, houve uma oposição entre duas visões de como tratar as crianças, uma

parte acreditava que deveriam ser tratadas como adultos e, outra previa o uso de uma

abordagem mais lúdica, que incluiria o brincar. Dentro dessa discussão, é possível ver o

embate entre a escola inglesa de psicanálise e a alemã, a primeira influenciada por Melanie

Klein, com uma abordagem mais analítica, e francamente mais freudiana, e a segunda

influenciada por Anna Freud, com uma visão mais pedagógica.

Flesler observa esse debate e acredita que essa distinção entre adultos e crianças

parece limitada, e assim, prefere distinguir tempos do sujeito, que não se reduzem a

cronologia ou idade. Com essa ideia, a analista fundamenta sua opinião sobre o brincar na

análise infantil, e a relevância do brincar nos seres humanos no geral. Como função intrínseca

constitutiva do ser humano, ela ressalta quatro aspectos principais na sua prática como

analista: o papel essencial do brincar na construção da fantasia; acentuar o ganho clínico que

se obtém dando atenção à dimensão temporal na armação da fantasia; costurar, com ênfase na
análise infantil dos tempos do sujeito aos tempos da fantasia, as manifestações particulares

que o analista lerá no brincar e suas vicissitudes; e por último, prestar atenção às modalidades

singulares do encontro do sujeito com o Outro primordial, que condicionam cada tempo da

infância propiciando ou impulsionando suas progressões, mas também complicando e até

paralisando seu devir.

Em "O brincar na estrutura", a autora afirma que brincar é um dos gozos máximos da

existência e que situar o lugar do brincar na análise infantil é imprescindível. A brincadeira,

"jogo", apesar de se apresentar na infância, não significa que seja apenas natural a ela, a

produção lúdica, ou sua ausência, indica o modo como a estrutura está se estruturando, para

existir essa cena, é necessária uma falta, o pontapé inicial dos jogos vitais para o sujeito na

infância.

A autora expõe na parte sobre "O Primeiro Jogo", que o primeiro jogo apresentado

pela criança é o desmame, que em seu ato de controle sobre o seio materno, e a alternância de

abandono e ânsia pelo mesmo, é vital para a introdução de uma nuance lúdica. Essa relação

do bebê com o seio materno é, desde o começo, uma resposta ao Outro.

Na clínica, a autora exemplifica com alguns casos, como o de uma menina que era

super medicada pela mãe, sem necessidade, e isso foi percebido na clínica quando em uma

brincadeira ela quase comeu, de forma automática, o pó de madeira feito por apontar um

lápis, similar à aspirina triturada que a mãe a dava com constância. Nesse caso, é importante

observar que talvez não se trate de uma intervenção psicanalítica tradicional, mas sim de uma

que reconheça que o tempo do sujeito ainda não apresenta recursos simbólicos para não dar a

demanda materna uma resposta automática. Além disso, o bebê/criança está sujeito por muito

tempos às mãos do Outro, para sua constituição, a criança precisa recriar a perda do objeto

que ela era para o outro, reproduzindo na relação com ele a impossível complementaridade,

exigindo pequenos objetos reais para que esse processo aconteça.


A inclusão no bebê na família já ocorre devido à falta do Outro, no entanto, é

impossível que essa criança supra a necessidade dos pais, pois não é exatamente o bebê que

esperavam, a tolerância do Outro diante dessa perturbação é essencial para estruturar o sujeito

e a realização de que entre a criança e o Outro, não haverá "inteireza". De uma forma quase

paradoxal, mas a perturbação é essencial para que tudo dê certo, a criança, dessa maneira,

quebra os esquemas esperados e marca seu lugar diante ao Outro.

Como exemplo de brincadeira, a autora apresenta o caso do neto de Freud, em que o

menino assimilava o jogar e a recuperação do carretel à saída da mãe para o trabalho.

Em seguida, Flesler apresenta os tempos de brincar da criança, em um primeiro

momento a criança brinca por brincar, ou seja, não mostra e não esconde seu brincar do olhar,

em um segundo tempo, a criança cria um ocultamento da cena do olhar, brincando com

pudor, como um desdobramento do sonho diurno e uma maneira mais pessoal, que a impede

de relatar para os outros. Essa vergonha, se encontra num lugar de pré-recalque, em que o

sujeito repara que sua intimidade está sendo vista, algo que ele não quer mostrar, mas ainda

não consegue preservar totalmente, tendo o temor de que Outro conheça seus pensamentos

mais profundos.

De maneira geral, a autora descreve que a criança utiliza o brincar para se colocar no

mundo, brincando de enganar a demanda do Outro, o sujeito vai recriando o vazio em que

constitui sua existência e o véu que oferece sua aparência, na brincadeira, ele se coloca em

cena, aprende suas vontades. Além disso, quando a criança brinca, ela prepara se prepara para

a aquisição de algo muito importante, a escrita, que dividirá o sujeito entre antes e depois. A

autora ainda pontua, que o brincar não para na infância, os jogos são feitos a vida toda, como

nos jogos amorosos.

Flesler ainda aponta as intervenções do analista e apoia a brincadeira em um espaço

de análise, já que elas revelam os tempos da infância e os destempos das fantasias infantis.
Além disso, a brincadeira se torna grande aliada da transferência, permitindo um trabalho

analítico de qualidade.

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