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A equipe terapêutica se usa do psicodrama como estratégia para que Fabián possa
se expressar. Assim, a psicopedagoga propõe que cada um construa sua casa,
podendo utilizar tudo que estava disponível no consultório. Em um dado momento,
Fabián convida todos para “visitá-lo” em sua casa. Quando a família entra, a “porta”
cai. Depois de tentar, sem sucesso, arrumá-la, ele pede o auxílio da equipe
terapêutica. E, quando questionado sobre como gostaria da sua porta, ele diz: “eu
quero uma porta que se possa abrir e fechar quando eu quiser”.
Este é o momento em que ele começa a elaborar suas questões internas, físicas e
psicológicas. Fernández (2001) explica que:
Nota-se que há, aqui, uma hipoassimilação, uma vez que ele engole informações e
cospe, sem elaborá-las, sem questioná-las. Daí a importância do jogo simbólico:
este, por ser de predominância assimilativa, permite que a criança manipule objetos
de diversas maneiras, criando diferentes usos para eles (como as almofadas
enquanto paredes para as casas, por exemplo), gerando esta “mastigação” do que
lhe é dado.
A partir disso, ocorre um segundo fato importante. Passada esta brincadeira com as
casas, pais e filhos foram divididos. Antes que as psicopedagogas pudessem iniciar
a entrevista com os irmãos, Fabián escreve em um cartaz, “com letra de imprensa e
perfeita caligrafia, PROHIBIDO PASAR”.
É importante notar que há uma ênfase no fato de que ele escreve com uma
caligrafia perfeita, uma vez que já era de conhecimento da equipe que a professora
havia dito que Fabián não sabe escrever - o que nos indica que se trata de um
sintoma. O não saber - ou não conseguir no contexto escolar - nos indica que há
algo por trás disso: a necessidade de colocar limites. Fernández explica que “esse
menino podia agora pedir um limite, “marcar seu terreno”. Podia fazer aquilo que
permite que o humano, com instrumentos simbólicos, consome o que o animal
realiza marcando o terreno com sua urina”.
E este cartaz, ao mesmo tempo que nos indica que há uma elaboração de um
conflito interno - a dificuldade de delimitar seu espaço e colocar limites -, nos indica
um outro sintoma, que está relacionado aos três tempos de Édipo. No terceiro
tempo é quando esse outro - o pai - efetivamente se instala e promove esta ruptura
entre mãe e filho. E o que ocorre é que Fabián ainda não aceitou que “mamãe e
papai são um casal e que “eu não sou o esposo de minha mãe””.
Voltando à temática do xixi, esta é a forma que seu corpo tem de,
inconscientemente, delimitar seu espaço, seu “território”. E o que ocorre agora é
que, a partir do momento em que ele pôde começar a elaborar suas questões, ele
encontrou outro meio de expressar seus limites. Ele se usa do cartaz e, um pouco
mais adiante na entrevista, desenvolve uma brincadeira com as psicopedagogas:
passa a atirar nelas roupas sujas de xixi e cocô, em um desejo de livrar-se delas.
Logo entra o psicólogo na sala, que sugere que as roupas sejam lavadas na
lavadora - sugestão esta que é acatada pelos meninos.
Então eles passam a lavar a roupa suja. E é interessante que esta é uma
expressão, tanto em português, quanto em espanhol (língua na qual o texto foi
originalmente escrito), que significa resolver os problemas. E neste momento há
uma “elaboração simbólica” da questão, que permite que não seja necessário atuar
no sintoma.
Por meio do jogo simbólico, a criança consegue criar a partir dos recursos
disponíveis. No caso do Fabián, o menino usa almofadas para construir uma casa.
Nesse processo, a criança usa de instrumentos simbólicos para falar sobre si, sendo
capaz de assumir outros papéis e vivenciar outros pontos de vista. Segundo,
Fernández, “o jogo é uma ilusão mas não é só uma ilusão. O jogar-brincar também
contata com limites, também mostra carências”. Desse modo, o psicopedagogo
consegue enxergar o que está inconsciente na criança através do jogo simbólico, ao
mesmo tempo em que o brincar é uma oportunidade para ela elaborar aspectos que
a circundam e que fazem parte da sua realidade conforme a intervenção do
psicopedagogo, atuando sobre o sintoma.
Assim, através do jogo simbólico a criança é capaz de aprender, sendo que este se
situa no mesmo espaço que o jogar: um espaço “entre” a subjetividade e a
objetividade. Desta forma, psicopedagogo participa do jogo simbólico assumindo um
papel dentro da narrativa: o de promover o encontro do sujeito com a sua própria
subjetividade. É nesse momento que sua intervenção acontece, na interação com a
criança. Logo, é possível conhecê-la a partir do que ela traz no jogo, e assim
ajudá-la no processo de elaboração das questões trazidas, as quais, em sua
maioria, são inconscientes.
3) Por que podemos afirmar que o psicodrama se oferece como um “espaço
transicional” no tratamento psicopedagógico?
Por meio do jogo simbólico, a criança nomeia, constrói, experimenta, atua, aprende
de maneira criativa e pensante, ao mesmo tempo em que manifesta alguns
aspectos inconscientes que podem estar relacionados com os sintomas
apresentados. Desse modo, a depender da forma como se dá a intervenção do
psicopedagogo, o espaço de jogo pode ser uma oportunidade de elaboração de
aspetos da própria realidade, de maneira criativa e educativa.