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INTRODUÇÃO

O termo Neolítico – Período da Padra Polida – foi criado em 1865 pelo naturalista inglês Sir
John Lubbock, em sua obra Prehistoric Times, em oposição ao Paleolítico. Ainda que essa
classificação continue em uso, a noção de Neolítico mudou bastante. Hoje em dia, se considera
que outros aspectos dessa fase histórica seriam mais representativos dos desenvolvimentos
ocorridos em muitas populações, como a invenção da agricultura, o início dos agrupamentos
urbanos e à vida sedentária. Tais denominações são, assim, insuficientes para traduzir a real
complexidade de uma nova Sociedade, cujas características transcendem a mera utilização da
pedra. Dessa forma, alguns autores denominam o Período como o da Grande Revolução
Agrícola, Professor Dr. Yuval Harari, por exemplo. Outro, ainda, enfatizam o aspecto da
formação de uma nova organização social.

O desenvolvimento dessas primeiras comunidades seguiu um ritmo distinto nas diversas


regiões da Terra. Iniciado em momentos diferentes e com duração variável, esse processo
evolutivo foi, em muitas áreas, concomitante, o que dificulta, bastante, a fixação de datas de
aplicação generalizada. As datas tem, assim, um caráter indicativo e aproximativo, inclusive
porque, na ausência da escrita, não são disponíveis evidências comprobatórias definitivas de
datação dos fatos e acontecimentos. As regiões para as quais se dispõe de razoável número de
dados e informações são a mesopotâmia, a Europa e os vales do Nilo, do Indo e do Amarelo.

Considera-se que o Neolítico revê início na região Mesopotâmica, há uns 12 mil anos; no Sul
da Europa (Grécia, Bálcãs) e Anatólia, há 9 mil anos; no Vale do Indo, há 7 mil anos; e na China,
há uns 6 mil anos; independentemente desse desenvolvimento na Eurásia, o Período Neolítico
teria começado na América Central e México por volta de 8 mil anos atrás.

O processo evolutivo, não ocorreu, assim, por igual e simultaneamente, nas diversas regiões da
Terra. Com defasagem e sujeita a condições locais, as diversas comunidades tiveram, contudo,
uma base comum ou uma cultura neotípica comum; mesmo no caso de sociedades isoladas,
como é o caso da América Central, como atestam a agricultura, a cerâmica e os metais. O
desenvolvimento técnico foi, bastante, equivalente, nesse Período, nas diversas partes do
Mundo. A explicação se encontra no fato de que a invenção, impulsionadora da Técnica, é
produto do meio, de sua época, e não de um indivíduo. Tais foram os casos, por exemplo, da
linguagem, da agricultura, da cerâmica e da domesticação dos animais.

Na realidade a primeira grande inovação surgiu da necessidade de subsistência de uma


população cada vez maior, cujo os produtos de caça, pesca e coleta já não eram suficientes
para satisfazê-la. As crescentes dificuldades para o deslocamento de um grupo cada vezes
maiores, atrás de alimentos aleatórios, contribuíram decisivamente para a busca de
suprimento garantido, abundante e menos penoso de alimentos. As plantas locais,
complemento das necessidades alimentares em momentos de escassez de caça e fruto, viriam
a se constituir na principal fonte de alimentos. Depois de inúmeras tentativas, erros e acertos,
e, para alguns autores, após uma boa dose de sorte, aquelas populações adquiriram a técnica
do cultivo do arroz e do sorgo (China e Sudeste da Ásia), do trigo e da cevada, do centeio, da
aveia e de leguminosas (Mesopotâmia, Anatólia, Sul da Europa), do milho, do feijão e da batata
(América Central, Região Andina). A fatura resultante da incipiente agricultura incentivou o
aumento demográfico, o qual requereu novas técnicas a fim de aumentar a produção e a
produtividade. A expansão da fronteira agrícola para novas terras férteis propiciou a invenção
do arado, enquanto a irrigação e a barragem foram utilizadas nas terras abundantes de Água. A
agricultura fixou o Homem à Terra, transformando-o em um ser sedentário, que passariam a
viver em pequenas granjas ou vilas agrícolas. A transição decorrente da implantação da
agricultura teria amplas e profundas consequências, transformando uma Sociedade predadora,
nômade e formada de agrupamentos familiares em uma produtora, sedentária e de dimensão
multifamiliar. O resultado mais significativo para essa nova e emergente Sociedade foi o
nascimento de um novo modo de vida totalmente diferente do de seus antepassados.

A cultura Neolítica também foi oral, o que significa não haver registro escrito desse período. O
conhecimento atual desse período é, assim, necessariamente superficial e tentativo. As
descobertas de utensílios, adornos, restos mortais, vestimentas, rodas e ruinas de construções
são algumas das evidências do tipo de cultura de tradição oral dessas populações. A
antropologia, ao estudar as comunidades ágrafas contemporâneas, e as informações dos
primeiros documentos escritos tem contribuído, também, para uma compreensão da cultura
dos povos Neolíticos.

Dependentes exclusivamente da memória para a transmissão de conhecimento, não foi


permitido a tais povos alcançar saber teórico, mas lhe foi possível obter e desenvolver a técnica
de como fazer as coisas. Os grandes avanços técnicos, movidos pelas crescentes necessidades,
em um meio hostil, e pela capacidade inventiva e imaginativa, podem ser assim resumidas: a)
utilização de novos materiais; b) alimentação mais rica e variada (apesar de autores
refutar/contradizer essa hipótese); c) vestimentas e agasalhos mais confortáveis; d)
desenvolvimento de cortume; e) domesticação f) utilização de energia eólica; g) invenção da
roda; h) identificação das plantas i) construções de moradias. (p. 43-4). Esses extraordinários
avanços não se limitam ao campo técnico ou ao campo das Artes, vinculados à satisfação das
necessidades materiais e culturais de uma Sociedade mais complexa e sofisticada.
Transformações profundas na organização social, decorrentes das novas exigências
comunitárias, foram os pontos altos desse processo evolutivo.

As novas e variadas atividades na agricultura, no pastoreio, no artesanato de cerâmica, na


construção de moradias, no comercio com outros comunidades, na defesa da vida e dos
interesses comunitários, ao promover uma incipiente especialização, estabeleceram uma
divisão de trabalho da qual surgiu a classe dos proprietários, a dos empregados e a dos
mercadores. A necessidade de um chefe, a fim de poder agir em conjunto, tanto para a defesa
da comunidade, diante de um inimigo, quanto para dirigir os esforços na obtenção da sua
subsistência, introduziu na sociedade a ideia de uma autoridade política. Consolidar-se-ia, com
o tempo, a figura do chefe e de seus auxiliares mais próximos, e surgiria, como representante
do poder espiritual, a casta¹ sacerdotal, aliada e suporte dos detentores do poder políticos.
(p.44).

Essa divisão de trabalho se refletiu no processo de urbanização, ao separar o poder defensivo e


religioso. Localizados nas vilas, das populações camponesas, vivendo próxima das lavouras,
seria nesses centros populacionais, onde passaram a habitar os chefes militares e religiosos e
parte dos artesãos, e onde se estocariam os alimentos, que seriam adotadas as decisões
políticas regulatórias da vida comunitária. O dispositivo funcional, escreveria Daumas, se
transformou progressivamente ao ponto que se produziu uma separação tanto social quanto
territorial entre a maioria rural, engajada na produção alimentar, e a minoria urbana, dedicada,
nos planos profanos e religiosos, ao capital coletivo. Desses centros urbanos – onde se
concentravam a riqueza e o poder (militar e religioso) – surgiram as noções técnicas, como a
metalurgia, que só tardiamente beneficiariam as populações do campo. A noção de
propriedade se firmaria definitivamente, e os novos detentores do poder passariam a gerir a
coisa pública. Os processos de estratificação social e de organização política se acentuariam,
enquanto o sistema produtivo se tornaria cada vez mais complexo. Algumas comunidades mais
avançadas deixariam de sacrificar os prisioneiros de guerra em cerimoniais de antropofagia,
para apresá-los como trabalhadores cativos, surgindo, desse modo, o escravismo.

Como seus antepassados, o Homem desse Período tinha como prioridade absoluta sua
sobrevivência em um meio hostil. Daí sua objetividade, seu pragmatismo, seu interesse no
desenvolvimento de coisas práticas e úteis que lhe facilitassem enfrentar as dificuldades do dia
a dia. Não havia outra preocupação além das de assegurar uma melhoria das condições de
vida.

No mundo Pré-literário, a natureza, tão diversa e misteriosa, deve ter maravilhado, e


apavorado, aqueles habitantes, ainda impossibilitados de compreender os fenômenos naturais
ou de procurar uma explicação racional e lógica para o que acontecia ao seu redor. Apesar de o
Homem Primitivo constatar, através da observação, a ocorrência de fatos extraordinários, como
o movimento dos corpos celestes, variação climática, sucessão do dia e da noite, chuva,
eclipse, tremor da terra, doença e morte, não lhe ocorria, nem o preocupava, buscar
explicações para fenômenos, carentes de que eram espíritos críticos e analítico. Sua própria
observação dos fenômenos era passiva, deficiente, assistemática e sem objetividade. Sua
reduzida capacidade de observação e sua imaginação lhe seriam suficientes, contudo, para
deslanchar impressionantes desenvolvimentos técnico. Sua imaginação desempenharia um
papel central em sua evolução mental e cultural. (p.45).

Como ensina Ivan Lins, era inevitável que o homem primitivo atribuísse os fenômenos ou
acontecimentos a vontades fictícias. Surgiria, como consequência, como fruto da imaginação, a
magia, que procuraria expressar uma síntese do Mundo natural e de seu relacionamento com o
Homem. Para Colin Ronan, a “magia exprimiu o que, de um modo geral, era uma visão
anímica... em um mundo onde as forças eram personificadas.”

O mundo tornar-se-ia compreensível somente através da ideia de que os objetos e fenômenos


tinham vida própria ou eram manifestações de deuses ou divindades, que deveriam ser
agradados de forma a terem boa vontade para com os homens em sua labuta diária.

A medicina, ou melhor, a arte de curar, nas culturas orais ou ágrafas, era inseparável da magia.
O valor do especialista na cura não era devido a sua habilidade cirúrgica ou ao uso correto de
plantas medicinais, mas seu conhecimento das causas sobrenaturais da enfermidade.

Surgiu, então, a figura do feiticeiro, mago, curandeiro, que incentivaria a imaginação popular e
criaria uma ritualística pela qual seria possível prestar homenagem para essas forças
misteriosas. Detentor dessa capacidade de interpretar a vontade superior de tais entidades, o
feiticeiro transformou-se em uma das autoridades da Sociedade. Como escreveu Darcy Ribeiro,
“os especialistas no trato com o sobrenatural, cuja importância social vinha crescendo,
tornando-se agora dominadores. Constituem não apenas os corpos eruditas que explicam o
destino humano, mas também os técnicos que orientam o trabalho, estabelecendo os períodos
aproximados para diferentes atividades agrícolas.”

Preces, invocações, feitiços, sacrifícios, purificações, amuletos e poções seriam, então,


utilizados para apaziguar e festejar essas divindades e espíritos.

Essa visão anímica do Mundo e da Natureza, essa mentalidade fetichista levaria,


inexoravelmente, a uma visão do absoluto; o Homem acreditaria ter posse do absoluto, pois
não encontraria nenhuma dificuldade ou problema em si satisfazer com a interveniência de
divindades para justificar os fenômenos. O problema da compreensão não surgiria, assim, para
o Homem Neolítico, já que a explicação fetichista lhe satisfazia. Bastavam-lhe as constatações
do que acontecia ao seu redor e a crença em que um poder superior, responsável pelo que
ocorria e ao qual deveria submeter-se e adequar. (p. 74).

1. A MAIOR FRAUDE DA HISTÓRIA

Durante 2,5 milhões de anos, os humanos se alimentavam coletando plantas e caçando


animais. Tudo isso mudou acerca de 10 mil anos, quando os sapiens começaram a dedicar
quase todo o seu tempo e seus esforços à manipulação da vida de umas poucas espécies de
animais e plantas.

Esse trabalho, pensaram eles, lhes garantia mais frutas, grãos e carne. Foi uma revolução no
modo como os Humanos viviam – a Revolução Agrícola.

A transição para a agricultura começou por volta de 9500 a.C à 8500 a.C. nas regiões
montanhosas que abrangem o sudeste da Turquia, o oeste do Irá e o Levante. Teve início lento
e numa área geográfica restrita. Trigo e cabras foram domesticados aproximadamente a 9000
a.C; ervilhas e lentilhas em 8 mil a.C; oliveira em 5 mil a.C; cavalos em 4 mil a.C; e videira em
3500 a.C. a principal onda de domesticação estava concluída. Mesmo hoje, com todas as
nossas tecnologias avançadas, mais de 90% das calorias que alimentam a Humanidade vêm das
poucas plantas que nossos ancestrais domesticaram, por volta de 9500 - 3500 a.C – trigo, arroz,
batata, milho, cevada. Nenhuma planta ou animal digno de nota foi domesticado nos últimos 2
mil anos.

É consenso que a agricultura surgiu de forma independente, e não porque os camponeses do


Oriente Médio exportaram sua revolução. (p. 92).

Dos milhares de especes que nossos ancestrais coletavam e caçavam, apenas alguns eram
candidatos adequados para o cultivo e pastoreio.

Os pesquisadores costumas dizer que a Revolução Agrícola tinha sido um grande salto da
humanidade. Harari irá dizer que

[...] contavam uma história de progresso potencializado pela capacidade cerebral humana: a
evolução aos poucos havia produzido pessoas cada vez mais inteligentes. Com o passar do
tempo, elas ficaram tão engenhosas que foram capazes de decifrar os grandes segredos da
natureza, possibilitando a domesticação de ovelhas e o cultivo do trigo. Tão logo isso
aconteceu, elas alegremente abandonaram a vida duríssima, perigosa e muitas vezes
espartanas dos caçadores e coletores, fixando em locais onde podiam desfrutar de uma
existência farta e agradável como camponeses. Essa história é uma fantasia. Não há provas de
que a pessoas foram ficando mais inteligentes com o passar do tempo. Os coletores conheciam
os segredos da natureza muito antes da Revolução Agrícola. (HARARI, p. +92). Uma vez que sua
sobrevivência dependia de um conhecimento intimo dos animais que caçavam e das plantas
que colhiam.

A Revolução Agrícola certamente aumentou o volume total de comida, porém essa quantidade
não se traduziu numa dieta melhor ou mais lazer. Pelo contrário, gerou explosões
populacionais e consequentemente mais trabalho. Em média, o camponês trabalhava mais que
o coletor, obtendo em troca uma dieta inferior. A Revolução Agrícola foi a maior fraude da
história. Quem era responsável? Nem reis, nem sacerdotes, nem comerciantes. Os culpados
foram um punhado de espécie de plantas. Essas plantas domesticaram o Homo Sapiens, e não
o contrário. (p.94).

Pensemos por um momento na Revolução Agrícola a partir da perspectiva do trigo. Como é


que essa gramínea passou de insignificante para onipresente? Não foi fácil. O trigo exigia muito
deles. O trigo não gostava de pedra e pedregulhos, por isso os sapiens davam duro para limpar
os campos. O trigo não gostava de partilhar espaço, água e os nutrientes com outros plantas,
por isso homens e mulheres labutavam por longos períodos arrancando ervas daninha sob o
sol escaldante. O trigo adoecia, por isso os sapiens precisavam se precaver contra vermes e
pragas. O trigo era atacado por coelhos e nuvens de gafanhotos, por isso os camponeses
construíam cerca e vigiavam os campos. O trigo tinha muita sede, por isso homens abriam
canais de irrigação ou carregavam pesados baldes de água dos poços para regá-los. Os Sapiens
até coletavam fezes de animais para enriquecer o solo em que o trigo crescia.

O corpo do Homo Sapiens não havia evoluído para exercer essas tarefas. Coluno vertebral,
joelhos, pescoço e arco dos pés humano pagaram o preço. Estudos de esqueletos antigos
indicam que a transição para a agricultura gerou uma serie de problemas físicos, tais como
artrite e varias hérnias, inclusive de disco.

O que o trigo ofereceu em troca? Não foi uma dieta melhor. Nas Sociedades agrícolas, até
recentemente, a maior parte da ingestão de calorias dependia que uma pequena variedade de
plantas domesticadas. Em muitas áreas, estavam sujeitas a um único item básico, como o trigo,
batata ou arroz. Camponeses morriam aos milhares e aos milhões, caso a chuva não viesse.

O trigo tampouco podia oferecer segurança contra a violência humana. A perda de um pasto
para vizinhos invasores, podia significar a diferença entre a subsistência e a fome. Por isso, os
camponeses tendiam a lutar até o amargo fim. O trigo não ofereceu nada para as pessoas
como ínvido. Todavia. Concedeu como espécie. O cultivo do trigo propiciou mais comida por
unidade de Terra e, desse modo, permitiu ao Homo Sapiens se multiplicar de modo
exponencial. Quando as pessoas se alimentam colhendo planta silvestres e caçando animais
selvagens, sustentavam no máximo um bando nômade de cem pessoas relativamente
saudáveis de bem nutridas. (p.97).

Essa é a essência da Revolução Agrícola: a capacidade de manter mais gente viva em condições
piores. A Revolução Agrícola foi uma armadilha. (p.98).

A ARADILHA DO LUXO

A ascensão da agricultura aconteceu de modo gradual, ao longo de séculos e milênios.


Os bebês e as crianças pequenas, que se movem devagar e que exigiam muita atenção,
constituíam um fardo para os coletores nômades. As mulheres faziam isso amamentando.
(p.98). isso diminuía significativamente as chances de uma nova gravidez. Com a transição para
povoações permanentes e o aumento de nos suprimentos de comida, a população começou a
crescer.

A mortalidade infantil cresceu depressa à medida em que as pessoas passaram a viver em


povoações infestadas de doenças, pelo menos um em cada três membros morriam antes de
completar 20 anos.
O individuo levava uma vida mais dura do que quem viveu entre 9500 à 13mil a.C. Mas
ninguém dava conta do que estava acontecendo. (p,100). Paradoxalmente, uma série de
“melhorias”, cada qual com o objetivo de tornar a vida mais fácil, aumentava o fardo sobre
aqueles camponeses. As pessoas pensavam: “sim, vamos ter que trabalhar mais duro, mas a
colheita vai ser abundante!”. Se trabalhassem mais duro, teriam uma vida melhor. Esse era o
plano (p.101.).

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