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Paradigma funcionalista:
desenvolvimento de teorias e
institucionalismo nos anos 1980 e 1990*

Miguel P. Caldas
Roberto Fachin

Introdução

Como discutido na introdução ao primeiro módulo deste livro, em 1979 Bur-


rell e Morgan mostravam que, dentre os quatro paradigmas sociológicos em seu
modelo, o funcionalismo – no quadrante da objetividade e da sociologia da regu-
lação – constituía até aquele momento a “ortodoxia” em estudos organizacionais.
Embora o funcionalismo ainda seja a ortodoxia do campo, o texto de Burrell e
Morgan (1979) não visualizava a expansão do paradigma interpretacionista como
ocorreu nas décadas de 1980 e 1990, nem a inflexão crítica e pós-moderna que
foi infundida no campo a partir da influência européia, em especial na década de
1990. Mas, apesar de tudo, é indiscutível que – em boa parte devido à represen-
tatividade institucional do mainstream norte-americano – o funcionalismo conti-
nuou a expandir sua hegemonia até hoje no campo de estudos organizacionais.
De 1980 até o momento, o campo de estudos organizacionais cresceu expo-
nencialmente, e, como já foi mostrado em inúmeros estudos sobre o desenvol-
vimento da área (por exemplo, Machado-da-Silva et al., 1990; Bertero; Keinert,
1994), abraçou especialmente a ortodoxia funcionalista como plataforma, apesar
do crescimento relativo também de vertentes interpretacionistas, críticas e, mais
recentemente, pós-modernistas.
No entanto, como também discutido em outros trabalhos sobre o campo (por
exemplo, Bertero et al., 1999), a adoção do paradigma funcionalista no Brasil

* Artigo originalmente publicado na RAE – revista de administração de empresas, v. 45, n. 2, p. 46-51,


abr./jun. 2005.

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teve até certo ponto qualidade questionável e critérios duvidosos. Com isso, mui-
to do que foi incorporado nos anos 1980 e 1990, em vez de buscar atualização
nos últimos desenvolvimentos teóricos desse paradigma, abrigou-se na ortodoxia
estruturalista-sistêmica que dominou o funcionalismo até a década de 1970, em
especial no contingencialismo. Com isso, salvo raras exceções (como as abaixo
citadas no caso do neo-institucionalismo no Brasil desde os anos 1990), predomi-
nou no campo um distanciamento, por um lado, entre os debates mais recentes
do paradigma funcionalista que parece ter abraçado, e, por outro, as replicações
estruturalista-sistêmicas e contingencialistas que a maioria da nossa produção
de cunho funcionalista parecia espelhar. O resultado é uma geração de pesqui-
sadores de orientação funcionalista que acabou tendo menor acesso a esses no-
vos debates e às novas teorias desse paradigma, e com ênfase maior nas revisitas
infindáveis a lugares-comuns do contingencialismo sistêmico. Foi abraçada uma
ortodoxia, no mais das vezes, sem manter com ela um mínimo vínculo de atuali-
zação. O resultado desse distanciamento é fácil de visualizar, seja na nossa pes-
quisa ou no ensino de teoria organizacional que oferecemos.
No âmbito da pesquisa, é possível notar essa lacuna por estudo de conteúdo
ou por análise bibliométrica da nossa produção. Enquanto o funcionalismo efer-
vescia nos anos 1980 e 1990 por acalorados debates intrafuncionalistas, a maior
parte da nossa produção de mesma orientação desconhecia ou ignorava as teo-
rias no centro desse debate, como o neo-institucionalismo, a ecologia populacio-
nal, as teorias da agência e de custos de transação, e o neocontingencialismo. As
honrosas exceções saíam dos principais programas de pós-graduação filiados à
ANPAD, cujos pesquisadores tinham acesso às principais publicações estrangei-
ras, ou tinham se familiarizado com os novos desenvolvimentos do campo ao de-
senvolverem seus doutoramentos em instituições estrangeiras.
Obviamente, tendemos a não ensinar o que não conhecemos, e o resultado é
que, nos cursos de graduação e pós-graduação em todo o Brasil, repetia-se o fe-
nômeno: a teoria organizacional ensinada era tipicamente um funcionalismo de-
satualizado, comumente pré-contingencialista. Novos pesquisadores e docentes
que emergiam desse tipo de educação repetiam o ciclo, passando adiante uma
versão ainda limitada e desconectada do debate corrente da ortodoxia funciona-
lista. Por sua vez, livros-texto de “teoria de Administração” que surgiram na épo-
ca – e ainda amplamente adotados no Brasil – praticamente ignoram qualquer
desenvolvimento teórico posterior ao estruturalismo sistêmico ou, na melhor das
hipóteses, ao contingencialismo do final da década de 1970.
Como prometido no primeiro módulo deste livro, iremos neste e nos pró-
ximos capítulos procurar estreitar esta lacuna, veiculando textos dos principais
debates nos quais o funcionalismo se engajou desde a década de 1980. Neste se-
gundo módulo, nosso interesse é oferecer um texto que sirva de guia das direções
que esses debates e novas teorias funcionalistas tomaram nos últimos 25 anos, e
iniciar a viagem por uma das teorias que o funcionalismo engendrou no último
quarto de século: o neo-institucionalismo.

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Debates do funcionalismo em teoria organizacional nos anos 1980 e 1990

O texto, de Astley e Van de Ven (Capítulo 5), é hoje um texto clássico no en-
sino do funcionalismo em teoria organizacional, e pode ser um excelente guia
para compreender os caminhos do desenvolvimento teórico desse paradigma
hegemônico no campo depois da predominância contingencialista até o final da
década de 1970.
Como mencionado anteriormente, o funcionalismo encontrava-se, em 1979,
severamente entrincheirado na ortodoxia estruturalista-sistêmica, mais especifi-
camente no determinismo contingencialista, e no foco da relação organização-
ambiente, ambos amplamente inspirados nos achados da chamada Escola de As-
ton (Westwood; Clegg, 2003, p. 5).
É preciso lembrar que, em 1983, Astley e Van de Ven limitavam a teoria or-
ganizacional ao estruturalismo sistêmico, por entenderem que este abrangia a to-
talidade do campo. O seu maior mérito é ter, naquele momento, acertadamente
fornecido ao funcionalismo organizacional, estreitamente definido, uma agenda
de desenvolvimento teórico que iria centrar-se nesses debates fundamentais.
Astley e Van de Ven previam que entre as quatro perspectivas teóricas cen-
trais que viam no campo emergiriam ao menos seis debates principais, que orien-
tariam o desenvolvimento teórico da área. Não que esses autores tenham acerta-
do em todos os debates principais; na verdade, deixaram de ver diversas forças
latentes à época e deram atenção demais a alguns vetores teóricos que acabaram
não tendo expressão. No entanto, a simples constatação de que o determinismo
sistêmico não mais simbolizava um consenso no campo, e de que o contingen-
cialismo não mais expressava a única teoria possível, parece o bastante para dar
ao leitor ainda não iniciado em tais debates um ponto de partida para explorar o
funcionalismo, além do tradicional contingencialismo.
Ao menos quatro desses debates de fato emergiram fortemente no campo,
geraram tradições teóricas concorrentes que expandiram a tradição funciona-
lista e povoaram suas publicações nos últimos 25 anos. O primeiro deles é de
natureza intrinsecamente determinista, entre perspectivas de “adaptação” e de
“seleção”; o segundo, entre perspectivas deterministas e voluntaristas; o terceiro
é o debate entre ação individual e ação coletiva; e o quarto, entre modelos ra-
cionais e modelos normativo-institucionais, que eles chamam de “organizações”
versus “instituições”.
É do debate entre as perspectivas deterministas de “adaptação” e de “seleção”
que surgem as separações entre os contingencialistas (adaptação) e os teóricos
da chamada ecologia populacional (seleção). Este embate permitiu uma expan-
são teórica do campo. Na essência, Astley e Van de Ven acertaram ao sugerir que
a perspectiva da seleção expandiria o campo ao mostrar empiricamente como o
determinismo contingencialista era simplista em superestimar a capacidade de as
organizações perceberem, reagirem e responderem a ditames ambientais, e subes­

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timava forças ambientais aleatórias e de longo prazo que tornariam a ação do


administrador muito menos significativa para a sobrevivência organizacional do
que faziam crer os contingencialistas. O argumento central dos ecologistas popu-
lacionais é que não são as “organizações” que se adaptam ou não a seus ambien-
tes, mas (a) as “populações organizacionais” que têm ou não tal adaptação; e (b)
nem organizações nem populações se adaptam: elas já estão adaptadas ou não a
variações ambientais aleatórias quando estas ocorrem. Um outro mérito impor-
tante desse debate é a sugestão de que a pesquisa sobre sobrevivência e adapta­
ção organizacional deveria ser deslocada do âmbito organizacional de análise
para o âmbito populacional, ou seja, a “população”, e não a “organização” indivi-
dual, seria a unidade de análise adequada. Pouco no Brasil tem sido escrito sobre
esse debate, à exceção do trabalho de Carvalho (2002). E menos ainda sobre as
limitações da perspectiva contingencialista, mesmo usando a ecologia populacio-
nal como base. A despeito da idade avançada desse debate, o Brasil ainda poderia
se beneficiar de agendas de pesquisa que, mesmo numa tradição determinista,
procurassem investigar indústrias inteiras em cortes longitudinais de longo pra-
zo, em vez de se concentrarem apenas em alguns representantes esparsos e em
um corte transversal de tempo.
O segundo debate ocorreu de fato entre os representantes do “determinis-
mo” – ou seja, aqueles que assumem que as organizações apenas sobrevivem
quando obedecem a ditames exógenos, seja de eficiência ou ambientais –, repre­
sentados em especial pelo contingencialismo até então imperante e por perspec-
tivas em expansão, como a ecologia populacional e as teorias econômicas da or-
ganização (ambas discutidas neste livro, Capítulos 8 e 9 respectivamente), e os
representantes do “voluntarismo”, que questionavam a existência ou necessidade
dessa dependência passiva da organização a ditames externos. Astley e Van de
Ven citam, como exemplos de teorias voluntaristas, correntes como a da escolha
estratégica (Child, 1972), que inserem, na ação organizacional, componentes de
cognição do corpo dirigente e coalizões políticas que filtrariam e escolheriam
quais ditames externos perceber e atender, e quais ignorar. Mais importante do
que tentar estabelecer um grupo de teorias voluntaristas, o que o debate determi-
nismo-voluntarista propiciou foi o fim da hegemonia da hipótese determinista, e
em seu lugar o estabelecimento de um espectro que iria do alto determinismo ao
alto voluntarismo, dentro do qual uma variedade de teorias poderia emergir. E
isso, de fato, representa um rico debate que surgiu e expandiu o campo nos últi-
mos 25 anos. Teorias como o neo-institucionalismo e a teoria da agência, que são
representadas neste livro, são exemplos de vertentes nascidas em parte da expan-
são desse espectro, ao permitir abordagens mais distantes do extremo determi-
nista, para posições mais intermediárias. No Brasil poderia ser muito melhorado
o entendimento, em termos de posicionamento e potencial teórico, dessa simples
diferença na visão da ação organizacional com relação ao ambiente. O artigo de
Machado-da-Silva, Fonseca e Crubellate (2005) é exemplo de posição intermediá­
ria no contexto brasileiro ao defender uma perspectiva estrutural-fenomenológi-

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ca para o neo-institucionalismo, no sentido de superar diversas dicotomias nos


estudos organizacionais, em especial a dicotomia determinismo-voluntarismo.
O terceiro debate, localizado na oposição entre a ação individual e a ação
coletiva, é mais importante por simbolizar o caminho seguido pela expansão do
campo na direção da análise do ambiente organizacional como unidade de aná-
lise. Tanto no exterior como no Brasil, essa expansão é bem exemplificada pela
mudança de foco da organização, em particular para redes organizacionais, do-
tadas de maior nível de análise e maior fluidez interacional. Em nosso país, essa
extensão do campo foi sentida tanto nos estudos sobre redes organizacionais,
como é o exemplo da linha de redes feitas a partir da UFBA, sob a liderança de
Tânia Fischer, como nas áreas de estratégia e estudos organizacionais, a partir
de vários centros de pesquisa e pós-graduação entre os quais foram exemplos a
FGV/EAESP e o CEPPAD/UFPR nas décadas de 1990 e 2000. Ainda há muito no
Brasil para se compreender sobre a dinâmica interorganizacional nesse nível de
análise, e o artigo de Astley e Van de Ven pode ser uma referência inicial para o
pesquisador ainda não iniciado nesse novo veio de pesquisa.
Por fim, o quarto debate é aquele entre modelos racionais e modelos nor-
mativo-institucionais, ou entre “organizações” e “instituições”. De todos, talvez
esse tenha sido o debate mais frutífero do funcionalismo nos últimos 25 anos em
termos de desenvolvimento e expansão teórica. No seio do próprio funcionalis-
mo, esse debate já vinha das discussões provocadas por March e Simon a partir
do conceito de racionalidade limitada. Mas, mesmo além dessa origem, diversas
outras confluências – entre elas o interesse crescente sobre cultura organizacio-
nal na práxis dos anos 1980 e os desenvolvimentos em teoria sociológica difíceis
de ser ignorados entre os anos 1960 e 1980, como o interacionismo simbólico, o
construtivismo social e a etnometodologia – provocaram debates internos no fun-
cionalismo entre objetivistas-racionalistas e os que defendiam posturas teóricas e
abordagens metodológicas mais próximas do que Burrell e Morgan (1979) cha-
maram de “interpretacionismo”. Na tradição funcionalista dominante até o iní-
cio da década de 1980, dominada pelo imperativo objetivista-racional de teorias
como contingencialismo e economia organizacional, os atores organizacionais
seriam objetivos e racionais. Como tal, não apenas respondem a ditames técnicos
e ambientais, mas o fazem como “instrumentos” de eficiência e racionalidade, em
prol de objetivos organizacionais compartilhados e incontestes. Desde o início da
década de 1970, novas perspectivas passaram a questionar essa natureza exclu-
sivamente técnica e racional do ator organizacional, e a salientar elementos po-
líticos, cognitivos, e mesmo culturais ou normativos do ambiente, que limitariam
a ação organizacional racional e neutra, e favoreceriam outros elementos inter-
nos e externos da ação organizacional. Em todo o mundo, inclusive no Brasil, co-
meçou-se a ver novas explicações e abordagens teóricas que passaram a atribuir
significado, valor simbólico e/ou político à ação organizacional, o que tornaria
mais viável explicar, por exemplo, por que organizações tecnicamente ineficazes
teimariam em sobreviver – e, por outro lado, as eficazes desapareceriam. Ou,

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noutros termos, por que elementos normativos como legitimidade social ou ade-
rência cultural importariam mais do que ditames técnicos do ambiente? A teoria
neo-institucional é um excelente exemplo dessa inflexão subjetivista e menos ra-
cionalista que o funcionalismo testemunhou nos últimos 25 anos, como veremos
na discussão do texto seguinte deste módulo.

Contribuição do (neo-)institucionalismo ao desenvolvimento de


teorias funcionalistas

O Capítulo 6 deste livro traz o famoso artigo de DiMaggio e Powell sobre o


isomorfismo, que, junto com o texto de Meyer e Rowan, de 1977, é provavel-
mente o principal alicerce da chamada “teoria neo-institucional”, que se distin-
gue em certos aspectos do institucionalismo de Selznick e seus seguidores, que
o neo-institucionalismo busca expandir.
Escolhemos esse texto e o neo-institucionalismo porque são exemplos ideais,
no funcionalismo organizacional, daquilo que, no texto de Astley e Van de Ven
discutido anteriormente, se referia a vertentes menos voluntaristas, e que supe-
rava a barreira do nível organizacional para mostrar a interdependência entre
organizações e os campos interorganizacionais, que, conceitualmente, situam-se
no nível de análise seguinte. Além disso, o neo-institucionalismo é um dos me-
lhores exemplos de como o próprio funcionalismo de inclinação estruturalista vi-
veu, na década de 1980 em diante, um processo de contínuo questionamento e
superação do modelo voluntarista-racionalista, classicamente representado pelo
contingencialismo e suas ramificações administrativistas. Como previam Burrell
e Morgan (1979), o funcionalismo procurava, em elementos mais subjetivistas da
teoria sociológica, caminhos para sua extensão territorial.
Desde o início, a teoria organizacional tem se preocupado em identificar a
melhor forma de organizar, e, particularmente, a literatura sobre estratégia tem
acentuado a competência distintiva (Selznick, 1971) que define o caráter de uma
organização em relação às demais existentes no mercado. Mas, em termos da
melhor forma de organizar, dentre os textos mais citados – e talvez menos lidos –
está o do sociólogo alemão Max Weber, que cunhou o termo burocracia como
exemplo de uma estrutura de poder que, universalmente adotada, define a me-
lhor forma de obter conformidade das pessoas na organização.
O texto de DiMaggio e Powell, que foi publicado na American Sociological Re-
view e, agora, é publicado em português (Capítulo 6; DiMaggio; Powell, 2005),
constitui-se em um bom exemplo da vertente sociológica nos estudos organiza-
cionais. É com a iron cage (stahlhartes Gehäuse) ou “jaula de ferro”, nomeada por
Max Weber em A ética protestante e o espírito do capitalismo, que provoca o leitor,
já no início, explicitamente afirmando que “a ordem racionalista se tornara uma
jaula de ferro na qual a humanidade foi [...] aprisionada” (Weber apud DiMaggio;
Powell, 1983, p. 147). A burocratização passou a ter características de irreversibi-

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lidade, e, embora Weber afirmasse que a burocratização se originara de uma eco-


nomia de mercado capitalista, a tese defendida pelos autores do texto em exame é
que foram modificadas as causas da burocratização e da racionalização, não sendo
mais a economia capitalista de mercado a causa por excelência, mas o “Estado” e
as “profissões”, de onde surgem, posteriormente, os mecanismos isomórficos ins-
titucionais. Em tese, a grande proposição de DiMaggio e Powell é que a mudança
estrutural acontece, hoje, não por razões de eficiência ou da necessidade de en-
frentamento da concorrência, mas em razão de outros processos que tornam as
organizações mais semelhantes sem necessariamente fazê-las mais eficientes. É
nesse ponto que os autores acentuam a importância da percepção e entendimento
da “estruturação de campos organizacionais” (Giddens, 1989) para a compreen-
são do processo de isomorfismo institucional. Destacamos que a preocupação com
os “campos organizacionais” está fortemente presente na introdução do livro de
Vieira e Carvalho (2003), que constitui a primeira coletânea de artigos de autores
representativos da teoria institucional e da teoria crítica no Brasil.
O segundo momento do artigo de DiMaggio e Powell introduz a questão prin-
cipal de seus estudos, que é buscar explicar por que as organizações apresentam
tanta “homogeneidade” em suas estruturas, diferentemente da busca da “variação”
entre as diferentes organizações, como em Hannan e Freeman (1977) – traduzido
neste livro –, que questionam por que há tantos tipos diferentes de organizações.
É nesse segundo momento que os autores lidam mais extensamente com o
conceito de campo organizacional, e buscam explicar por que as inovações orga-
nizacionais, ou novas práticas, normalmente impulsionadas por desejos de me-
lhoria de desempenho, podem ficar impregnadas de valor além das exigências
técnicas da tarefa, como Selznick (1971) já afirmara. E, portanto, como Meyer
e Rowan (1977) concluíram, a adoção da inovação consegue legitimidade, mas
não chega a melhorar o desempenho. A partir desse ponto, com exemplos de pes-
quisas pertinentes, o texto avança no tratamento do isomorfismo como o conceito
que melhor capta o processo de homogeneização, descrevendo, em seguida, dois
tipos de isomorfismo – o competitivo e o institucional – e três mecanismos de mu-
dança institucional isomórfica – a coercitiva, a mimética e a normativa –, já sobe-
jamente trabalhada nos textos brasileiros (veja os trabalhos de Machado-da-Silva
e Fonseca, 1993, 1996; e de Machado-da-Silva e Gonçalves, 1998).
No Brasil, a teoria neo-institucional teve grande acolhida no campo de estu-
dos organizacionais. A origem pioneira dessa popularidade é o trabalho de Cló-
vis Luiz Machado-da-Silva, que publicou o primeiro texto com uso da perspectiva
institucional de análise no campo dos estudos organizacionais no país (Macha-
do-da-Silva, 1991), e que desde meados da década de 1980 já indicava os tex-
tos de Meyer e Rowan, bem como o presente artigo de DiMaggio e Powell, para
gerações de orientandos que teve em Santa Catarina (UFSC), ­Paraná (UFPR) e,
mais recentemente, na FGV-EAESP. Esses orientandos difundiram o conceito para
muitos outros Estados, em especial Alagoas, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Rio
de Janeiro e São Paulo. O conceito de isomorfismo, em particular, foi também

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popularizado por pesquisadores não diretamente influenciados por Machado-da-


Silva, vindos de instituições tão diversas quanto a FGV, FEA-USP, PUC-RJ, UFMG,
UFRGS e Univali. A maioria dos trabalhos produzidos investigou a difusão de
modismos ou modelos de gestão, a homogeneização organizacional ou estrutu-
ral, e a questão de campos institucionais.
Naturalmente, tanto com sua difusão no Brasil quanto com a passagem do
tempo propriamente dita, vieram também os muitos críticos do modelo institu-
cional. Segundo tais críticos, o neo-institucionalismo “deu o que tinha que dar”,
e, portanto, desencorajam o prolongamento de sua adoção aos dias de hoje (por
exemplo, Donaldson, 2001; Donaldson; Hilmer, 1996). Muitas dessas críticas
procedem. Por exemplo, ao afirmarem que, embora o institucionalismo tenha
tido seu papel ao estabelecer limites ao voluntarismo e ao racionalismo exacer-
bados de postulados contingenciais clássicos, ele pode ter se limitado demais aos
aspectos normativos da realidade organizacional e interorganizacional. Com isso,
acreditam que ele deixa tanto de indicar caminhos para a melhoria do desempe-
nho – na tradição funcionalista – quanto para a superação de limitações cogniti-
vas que impedem a autonomia constitutiva de organizações.
Por outro lado, é também verdade que o institucionalismo pode ser ainda um
rico veio de pesquisa no Brasil, razão que nos levou à escolha deste texto para a
série, pelo menos por duas dimensões. A primeira, como plataforma para ampliar
o conhecimento teórico do campo, inserindo-se no avanço científico internacio-
nal dessa linha teórica; a segunda, talvez mais realista no caso brasileiro, é o uso
da teoria institucional como veículo para o entendimento de fenômenos sociais
passíveis de institucionalização.
Quanto à primeira dimensão de contribuição potencial da teoria institucional
no Brasil, é verdade que muito do que tem sido pesquisado no país usando essa
teoria teria dificuldade de oferecer avanços no campo de conhecimento interna-
cionalmente, pois tende a se limitar à replicação de postulados feitos em traba-
lhos estrangeiros há mais de uma década. Mas também é verdade que isso não
se aplica a todos os estudos acerca do institucionalismo no Brasil. Os esforços de
Machado-da-Silva e seus diversos colaboradores, nos últimos anos, no sentido de
tentar ligar institucionalismo e cognição, trabalhando fortemente a noção cultu-
ral-cognitiva, mas sem dissociá-la dos pilares normativo e regulativo, podem ser
um rico veio de pesquisa, mesmo em âmbito internacional. Em especial, a pers-
pectiva “estruturacionista” que adotam no tratamento da relação entre estrutu-
ra e agência desde 1993 (Machado-da-Silva; Fonseca, 1993), mas que ganhou,
recentemente, mais densidade mediante o uso e o aprofundamento de conceitos
como estruturas cognitivas e múltiplas lógicas institucionais em diferentes ní-
veis de análise: organizações, redes organizacionais e campos organizacionais
(Machado-da-Silva; Fonseca; Crubellate, 2005; Machado-da-Silva; Guarido Fi-
lho; Rossoni, 2006). Outro exemplo é a ligação entre institucionalismo e face-
tas mais ou menos evidentes de “poder”, particularmente pela associação com o

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neo-estruturalismo em sociologia, e a expansão e o resgate do trabalho de Bour-


dieu, como têm buscado os esforços de pesquisadores como Marcelo Milano Fal-
cão Vieira (FGV-EBAPE), Cristina Carvalho (UFPE), Rosimeri Carvalho da Silva
(UFSC) e Maria Ceci A. Misoczky (UFRGS), bem como seus colaboradores. Essas
e outras tentativas nacionais de expandir a teoria institucional são possibilidades
concretas de contribuir para o desenvolvimento teórico do institucionalismo.
No entanto, a realidade é que, em nosso país, o uso da teoria institucional
como veículo para o entendimento de fenômenos sociais passíveis de institu-
cionalização parece ser mais promissor em termos de volume, ou seja, usar o
institucionalismo mais para entender melhor outros objetos – eis que, aí, tanto
modelos racionalistas quanto voluntaristas têm menor poder explicativo  – do
que para estender a teoria per se. Foi esse o maior uso que já se fez no Brasil do
institucionalismo, inclusive do texto de DiMaggio e Powell. Por exemplo, o uso
de isomorfismo mimético para entender a difusão dos mais variados elementos,
desde modismos em gestão até teorias e modelos científicos entre campos orga-
nizacionais; ou a utilização do isomorfismo coercitivo para entender a institucio-
nalização e aplicação de elementos tão diversos quanto programas de qualidade
e burocratização em diversos campos organizacionais; ou, ainda, a aplicação do
isomorfismo normativo para compreender a institucionalização de objetos diver-
sos, desde códigos de ética e programas de mudança organizacional até a pro-
fissionalização de empresas familiares e a “empresarialização” de organizações
do terceiro setor. Múltiplas outras possibilidades surgem ao se tomarem outras
dimensões do trabalho do institucionalismo, desde a discussão do processo de
institucionalização como uma resultante, e não apenas determinante, na ação
organizacional e interorganizacional ou, ainda, as respostas cognitivas e intra-
organizacionais a pressões institucionais exteriores, até a expansão em múltiplos
níveis de análise do conceito de campos institucionais. Vários teóricos de orien-
tação institucionalista no país, em especial aquele já mencionado grupo de pes-
quisadores liderado por Clóvis Luiz Machado-da-Silva, têm-se dedicado a procu-
rar colaborar para o desenvolvimento da teoria no Brasil, em especial mediante
o uso da perspectiva estruturacionista na análise da dinâmica da mudança ins-
titucional, o que parece uma iniciativa louvável e oportuna ao campo. Enfim, as
possibilidades são inúmeras.
Nossa esperança é que, com a publicação desse importante trabalho neo-ins-
titucionalista na série “RAE-Clássicos”, maior número de pesquisadores brasilei-
ros possa ter acesso a esse veio de pesquisa, e que novas possibilidades de aplica-
ção possam surgir, além das abordagens racionalistas, voluntaristas e da análise
limitada ao nível organizacional. E, por extensão, que esses novos pesquisadores
possam levá-lo não apenas a replicações de pouca profundidade ou novidade,
mas a novas fronteiras teóricas que expandam, no Brasil e no campo internacio-
nal criado em torno dessa tradição acadêmica, o entendimento da realidade or-
ganizacional que nos cerca.

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Nota de Agradecimento

Os autores reconhecem e agradecem ao Prof. Dr. Clóvis Luiz Machado-da-Sil-


va pelas diversas sugestões de melhoria que nos fez nesta revisão do texto para
sua primeira edição em livro. A versão de 2007, editada com suas recomendações,
corrige muitas injustiças que foram apontadas após a publicação original deste ar-
tigo na RAE. Como sempre, o Prof. Clóvis não é apenas fundamental às correntes
aqui discutidas, como mencionado desde a primeira versão do texto, mas também
um bom amigo e um mestre dedicado ao esmero de sua obra e trabalho.

Referências

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13
Teoria crítica e pós-modernismo:
principais alternativas à hegemonia
funcionalista*

Marcelo Milano Falcão Vieira


Miguel P. Caldas

Introdução

Observamos em outras partes deste livro (Vergara; Caldas, 2005) que, a des-
peito da predominância da ortodoxia funcionalista no campo de estudos orga-
nizacionais, ao menos desde o final da década de 1980, vertentes de resistência
têm surgido para enfren­tar tal hegemonia na área. Por um lado, ainda mais pró-
ximo do que Burrell e Morgan (1979) chamariam de “sociologia da regulação”,
surge a alternativa inter­pretacionista, à qual dedicamos um módulo deste livro.
Por outro, afastando-se da sociologia da regulação, surgem a teoria crítica das
organizações – mais orientada à mudança social – e, mais recentemente, aborda-
gens pós-modernas em estudos organizacionais, cuja alocação nos quadrantes de
Burrell e Morgan é problemática, pois, embora surja da contradição à ortodoxia
positivista, nega igualmente a teoria crítica e os modelos mais radicais.
Neste último módulo, oferecemos aos vários docentes que não tiveram até
hoje muito acesso a tais abordagens críticas e pós-modernas uma primeira apro-
ximação às alternativas epistemológicas mais recentes ao mainstream funciona-
lista. A eles dirigimos esta introdução, com o pedido de escusas aos muitos já ini-
ciados, para quem ela parecerá um tanto básica. Além de introduzir os dois textos
incluídos nesta parte como amostras da produção acadêmica crítica (no caso do
texto de Valérie Fournier e Chris Grey) e da pós-moderna (artigo de Robert Coo­
per e Gibson Burrell), objetivamos aqui oferecer uma primeira aproximação a
tais tradições alternativas, procurando mostrar as diferenças entre as duas ver-

* Artigo originalmente publicado na RAE – revista de administração de empresas, v. 46, n. 1, p. 59-70,


jan./mar. 2006.

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292 Teoria das Organizações • Caldas e Bertero

tentes, bem como sua diversidade interna, posto que, longe de serem monolíticas
e convergentes, possuem grande diversidade e variância internas. Objetivamos
também analisar brevemente sua utilização no Brasil nos últimos 20 ou 25 anos,
bem como discutir possíveis direcionamentos para pesquisa futura dentro dessas
tradições alternativas.
De início, precisamos esclarecer alguns pontos de partida, de forma que o
leitor possa entender, consistentemente ao tópico em discussão, os pontos de
vista aqui expressos de maneira crítica, reflexiva e relativa, e não confundi-los
com uma pretensa expressão da “verdade”, neutra e distanciada, tão típica da
hegemonia funcionalista. Primeiro, devemos deixar patente que nós, autores des-
ta introdução, não somos neutros, temos nossa posição e percepção de mundo,
da teoria e do nosso campo, subordinadas a nossas posições sociais e contextos
pessoais. Por exemplo, escrevemos ambos no contexto da análise organizacional,
que per se apresenta diferenças fundamentais em relação à análise crítica e pós-
moderna em outros campos, como filosofia, artes, ou mesmo sociologia de forma
geral. Ambos tivemos ao menos parte de nossa formação acadêmica no exterior, o
que indica que nossa visão de mundo foi até certo ponto parametrizada por essa
experiência. Ambos, embora um mais do que o outro, distanciamos nossa própria
produção da tradição mais funcionalista, o que direciona certo viés em prol das
vertentes alternativas ao mainstream funcionalista que aqui apresentamos. Am-
bos temos pessoalmente mais simpatia intelectual e epistemológica por uma de-
las do que pela outra e, portanto, nela vemos mais potencial no Brasil.
Segundo, precisamos também deixar patente que, para nós, a mera coloca-
ção dessas duas vertentes alternativas – crítica e pós-moderna – no mesmo espa-
ço (como aqui se faz, ou como também fez o próprio Handbook de estudos orga­
nizacionais (Alvesson; Deetz, 1999)) é problemática, e pode confundir mais do
que elucidar o leitor não bem informado. Pode-se entender por que isso é feito:
afinal, todo espaço editorial que ainda se consegue hoje em dia para vertentes
epistemológicas alternativas à hegemonia funcionalista e positivista é raro e pre-
cioso. No entanto, a dificuldade reside em que, freqüentemente, o leitor ou aluno
que têm sua primeira aproximação a essas alternativas epistemológicas ao mains-
tream funcionalista por esse tipo de via – em que ambas são apresentadas conjun-
tamente – pode cair no erro de achar que, por serem justamente “alternativas”,
seriam semelhantes ou coincidentes. Nada mais incorreto: teoria crítica e pós-mo-
dernismo, de fato, têm em comum a sua clara intenção – dentre outras intenções
distintas que cada uma apresenta – de serem vertentes epistemológicas resistentes
e alternativas ao positivismo lógico. Mas praticamente param aí as suas semelhan-
ças, tal como a física newtoniana e a física quântica, que têm em comum a crença
em leis abstratas que governam a natureza e o distanciamento da tradição pré-
científica de união da ciência com a filosofia, mas que não são nem de longe idên-
ticas ou coincidentes entre si; ou ainda as geometrias não euclidianas, e tantos
outros exemplos do gênero. Críticos e pós-modernos têm em comum praticamen-
te apenas a sua oposição ao mainstream que os precedeu. Vários textos no nosso

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Teoria crítica e pós-modernismo: principais alternativas à hegemonia funcionalista 293

campo, dentro e fora do Brasil, tendem a reincidir nesse erro e até certo ponto
pluralizar essas duas vertentes distintas. Em nossa opinião, a união de correntes
tão distintas sob o rótulo de “crítica” é um erro de ordem ontológica.

Teoria crítica

Há muita confusão em torno da teoria crítica, principalmente na área de


Administração. Um pouco dessa confusão deve-se ao desconhecimento de quem
se dispõe a fazer uso da teoria crítica sobre sua origem e fundamentos teóricos
e críticos. Outra parte deve-se ao oportunismo relativamente comum em áreas
com característica aplicada, particularmente naquelas em que o mercado orienta
a produção do conhecimento prático.
No ano de 2004, a TV Cultura produziu uma série de palestras, com renoma-
dos pensadores, intitulada “Os Fundadores do Pensamento Social Contemporâ-
neo”. O filósofo Marcos Nobre ficou encarregado de apresentar o tema “teoria crí-
tica”. Foi extremamente esclarecedora sua “aula” sobre a origem da teoria, bem
como seus princípios fundamentais. São algumas das idéias expostas por Marcos
Nobre que passamos a reproduzir agora de forma comentada, relacionando-as,
posteriormente, à área de Administração, com a intenção de que isso venha a es-
clarecer alguns problemas relacionados ao uso da teoria crítica na área. Ressal-
tamos que qualquer equívoco na interpretação das idéias apresentadas a seguir é
de nossa exclusiva responsabilidade.
Nossa reflexão nesta seção divide-se em duas partes. Na primeira, tratamos
de uma questão de fundo, qual seja, os conceitos de teoria e de prática. Na se-
gunda, debruçamo-nos sobre a origem da teoria crítica e seus desdobramentos
contemporâneos.
A questão da teoria e da prática é central para a teoria crítica devido a sua
oposição à “visão tradicional” de teoria e de prática. Uma teoria é composta por
um conjunto de hipóteses ou de argumentos utilizados para compreender fenô-
menos reais. Portanto, uma teoria visa a descrever como as coisas são, ou, nou-
tras palavras, como a realidade é. Uma teoria, para ser considerada científica,
deve, ainda, ser capaz de produzir prognósticos, ou seja, de dizer o que está para
acontecer se as condições precedentes forem satisfeitas. Uma teoria é corrobora-
da ou refutada quando os prognósticos baseados nas suas hipóteses se confirmam
ou não. Dessa forma, a teoria se opõe à prática. Conhecer e agir são, portanto,
coisas distintas.
Com isso decorre uma questão central para a teoria crítica: como trabalhar
a noção de emancipação – que, como veremos a seguir, é o ponto central da teo-
ria – sem que a teoria esteja vinculada à prática transformadora? Como fugir da
distinção entre descrição e prescrição? Para solucionar esse problema, a teoria
crítica questiona a distinção vigente entre teoria e prática a partir do uso da ca-

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294 Teoria das Organizações • Caldas e Bertero

tegoria “crítica”. Criticar não significa abdicar de conhecer o mundo como ele é e
tampouco de pensar como ele deveria ser.
A base da teoria crítica está, pois, no seguinte postulado: é impossível mostrar
as coisas como realmente são, senão a partir da perspectiva de como elas deveriam
ser. Na verdade, o “dever ser” se refere às possibilidades não realizadas pelo mun-
do social. Não tem caráter utópico, mas analisa o que o mundo poderia ter de me-
lhor se suas potencialidades se realizassem. A identificação das potencialidades
permite entender mais claramente como o mundo funciona e, dessa forma, iden-
tificar os obstáculos à realização das suas potencialidades. Assim, a teoria crítica
aponta para a prática a partir da realização desses potenciais, por meio da identi-
ficação e rompimento dos obstáculos. É a teoria no ato. O ato é aquele da realiza-
ção dos potenciais do mundo, e tais potenciais são de natureza necessariamente
emancipatória.
Para os teóricos críticos, aqueles que se dedicam apenas a descrever o mundo
como ele é acabam por fazê-lo sempre de forma parcial e incompleta, pois abdi-
cam de identificar o que ele poderia ser, ou seja, o que ele tem potencialmente
de melhor. Isso nos remete à segunda parte de nossa reflexão: a origem da teoria
crítica e seus desdobramentos contemporâneos.
A teoria crítica aponta para a prática como a realização dos potenciais eman-
cipatórios do mundo. Para tanto, parte do princípio de que o mundo se organiza
em torno de dois grupos de tendências estruturais. O primeiro grupo de tendên-
cias são os agentes da permanência dos obstáculos à realização das “potencialida-
des melhores” do mundo. O segundo grupo são os agentes potenciais da ação que
permite superar os obstáculos. Assim, a teoria crítica dá sentido à ação e a ação
vira objeto da teoria. Portanto, os embates políticos e ideológicos são centrais na
teoria. Ela não se quer neutra.
O primeiro a utilizar o termo “teoria crítica” foi Horkheimer no livro Teoria
tradicional e teoria crítica, publicado em 1937. Nele o autor deixa explícito que
“produz teoria crítica todo aquele que quer continuar a obra de Marx”. Ao afir-
mar isso, Horkheimer define o campo teórico da teoria crítica como o marxismo,
e este como um campo de conhecimento distinto de outros campos.
Jameson (1991) afirma que a importância contemporânea de Marx se deve
exatamente ao fato de que ele foi o filósofo político que se dedicou a tratar
do capitalismo. Neste momento de exuberância e exacerbação do capitalismo,
como ignorar que Marx tem uma importância relativamente mais destacada?
Quem, senão ele, forneceu a maior base da crítica ao que mais tarde se denomi-
nou capitalismo?
Entretanto, cabe salientar que, mesmo reconhecendo a grande importância
e contemporaneidade de Marx, a visão de que “faz teoria crítica todo aquele que
quer continuar o trabalho de Marx” é, no nosso entendimento, uma visão par-
cial e, em certa medida, excludente. Wacquant (2004), por exemplo, esclarece
que existem dois sentidos para a noção de crítica, no que se refere à sua origem:

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Teoria crítica e pós-modernismo: principais alternativas à hegemonia funcionalista 295

o primeiro vem de Kant e diz respeito à avaliação de categorias e de formas de


conhecimento com o objetivo de determinar sua validade cognitiva e seu valor.
O segundo é de Marx, cuja noção está ligada à análise da realidade sócio-histó-
rica com o objetivo de expor as formas de dominação e exploração que a defi-
nem. Para Wacquant, o pensamento crítico mais frutífero é aquele que se situa na
confluência dessas duas tradições, ou seja, da crítica epistemológica e da crítica
social, questionando sistematicamente tanto as formas estabelecidas de conheci-
mento como as de vida coletiva.
A teoria crítica não pode ser resumida num conjunto de idéias ou de teses
imutáveis, pois, de acordo com o próprio Marx, a verdade é temporal e histórica.
O teórico crítico é, portanto, aquele que está sempre mudando, mas ao mesmo
tempo orientado pelo princípio da transformação social e da emancipação. Nes-
se sentido, pode-se ser teórico-crítico contemporâneo, tendo rompido com Marx,
mas não com as categorias centrais da crítica, que envolvem criticar o positivismo
como forma estabelecida de conhecimento e o mercado como forma estabeleci-
da de vida coletiva. Para nós, da área de Administração, essa é uma informação
fundamental, pois a partir daí podemos separar de forma definitiva quem produz
teoria crítica de quem não a produz e apenas se apropria indevidamente dela.
Com relação à base da crítica ao positivismo, no início desta seção referimo-
nos brevemente a ela ao tratarmos da dissociação entre teoria e prática. Passamos
agora a outro breve relato, o da base da crítica à forma dominante de organiza-
ção social: o mercado. Retomando a idéia de que não se deve abdicar de conhecer
o mundo como ele é, a primeira tarefa da teoria crítica é compreender o mercado
e sua unidade central, qual seja, a mercadoria. O mercado é regido pela lógica da
troca. Ela determina os valores no mercado, e nele tudo vira produto capaz de ser
trocado; tudo adquire valor de troca.
É na Revolução Industrial, quando o grande avanço tecnológico propiciou
que a riqueza acumulada no campo se transferisse para as fábricas e centros urba­
nos por meio da aquisição de tecnologia, que surge a separação entre a força de
trabalho e os instrumentos que permitem produzir bens. É o nascimento do capi-
talismo como uma construção histórica. Sem ela o capitalismo não teria existido.
Evidencia-se, assim, a nova divisão estrutural da sociedade: o capital e o traba-
lho, que se organizam no mercado. O mercado, portanto, congela as desigualda-
des iniciais entre capital e trabalho e as aprofunda.
Não cabe aqui descrever as formas com que o mercado aprofunda essas de-
sigualdades iniciais. Há literatura abundante sobre o assunto na área, principal-
mente aquela ligada à análise do processo de trabalho e ao controle nas organi-
zações. É importante, sim, evidenciar que o mercado aparece como instituição
neutra, em que trocas justas são realizadas. Além disso, o mercado promete rea-
lizar a liberdade e a igualdade. Ora, sabe-se de longa data que as trocas entre in-
divíduos e organizações não são trocas iguais simplesmente pelo fato de que am-
bos detêm recursos de poder consideravelmente diferentes, em volume também

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296 Teoria das Organizações • Caldas e Bertero

diferente. Sabe-se, ainda, que liberdade e igualdade não são conceitos aplicáveis
quando a lógica é a da competição.
A teoria crítica dedica-se, assim, a examinar o mercado e suas relações à luz
da emancipação, que significa a busca da realização concreta da liberdade e da
igualdade. O conceito de emancipação está no centro da teoria crítica, atribuin-
do-lhe unidade. Podemos, portanto, enunciar dois princípios básicos da teoria:

• Orientação para a emancipação do homem na sociedade. Permite compre-


ender a sociedade e agir. Não se limita a compreender o mundo, mas
examina-o, visando a possibilidades.
• Manutenção de comportamento crítico. O teórico crítico mantém e reali-
menta seu comportamento crítico frente a tudo que existe, sem se con-
formar com o que é dado como descrição do real.

A teoria crítica não admite a neutralidade positivista por achá-la parcial. Nes-
ta, a distinção entre cientista e cidadão é um pressuposto básico, enquanto na-
quela é uma impossibilidade lógica.
Uma vez difundida essa teoria em vários campos das ciências sociais, logo
apareceram teóricos críticos em Administração, especialmente na área de estudos
organizacionais, opondo-se ao mainstream funcionalista. Enquanto no Brasil esse
grupo teve forte influência no campo, como discutimos a seguir, no mundo anglo-
saxão sua recepção foi menos acolhedora e sofreu ampla resistência (para uma
revisão, veja, por exemplo, Alvesson, 1987). Como qualquer grupo científico que
tende a politizar-se, que busca definir territórios e excluir desavenças, e também
combater a falta de espaço editorial e de debate para abordagens não positivis-
tas na hegemonia norte-americana, muitos desses teóricos críticos estrangeiros
acabaram se organizando em torno do grupo hoje conhecido como Estudos Críti-
cos em Administração (Critical Management Studies, ou CMS). O CMS tornou-se
hoje, depois de quase duas décadas de constituição, um grupo restrito e até certo
ponto restritivo de teóricos, com suas próprias definições e parâmetros das fron-
teiras do que seria ou não crítico em estudos organizacionais (veja, por exemplo,
Alvesson; Wilmott, 1992). Mas é preciso notar (como discutiremos mais adiante)
que tal quase-associação e seus parâmetros de inclusão crítica não estão ainda
definitivamente aceitos e resolvidos, nem devem necessariamente pautar o seu
uso e expansão em terra brasilis.
Na área de Administração no Brasil, temos a tradição de pensamento crítico,
embora ele não represente o mainstream da academia nacional. Um ótimo exem-
plo é o trabalho de Alberto Guerreiro Ramos (1989, 1996), particularmente nas
obras A redução sociológica e A nova ciência das organizações. Na primeira, critica-
va a ciência domesticada, fundamentada na reprodução não criativa e distancia-
da do nosso tempo-espaço e, conseqüentemente, dos nossos problemas; incapaz,
portanto, de oferecer soluções apropriadas e emancipatórias. Na segunda, criti-
cava o mercado como forma dominante de organização da vida social. Chamava

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Teoria crítica e pós-modernismo: principais alternativas à hegemonia funcionalista 297

a atenção para os problemas decorrentes da expansão do mercado e propunha a


“delimitação dos sistemas sociais”. Maurício Tragtenberg, especialmente na obra
Administração, poder e ideologia, publicada em 1980, dedicou parte da sua obra à
análise da teoria da administração como uma ideologia. Argumentava que a Ad-
ministração dedica-se ao estudo da legitimação burocrática do poder e que esta
possui caráter repressivo, dada sua ênfase no controle sobre o homem. Seu fa-
zer acadêmico não era “neutro”, como deixava claro em sua produção. Fernando
C. Prestes Motta (1985, 1986a, 1986b, 1986c, 1987, 1988, 1990) desenvolveu
estudos sobre burocracia, poder e tecnologia, educação e, mais tarde, sobre cul-
tura. Explicitava ao tempo em que criticava o que chamou de esforço constan-
te e sistemático das teorias administrativas dominantes em fundir racionalidade
substantiva e instrumental como modo de aperfeiçoar as formas de dominação
sobre o indivíduo. Também acreditava na necessidade e possibilidade do desen-
volvimento de novas teorias, que possuíssem caráter emancipatório e apropriado
ao nosso tempo-espaço.
Guerreiro Ramos, Tragtenberg e Prestes Motta trabalharam de forma crítica,
sempre pensando em como nossa sociedade poderia ser e não é. O sucesso e o
reconhecimento que esses autores obtiveram acreditamos serem devidos a esse
fato, que atribui, por si só, relevância e pertinência ao trabalho do cientista-cida-
dão. Sua relevância é auto-evidente.
Esses autores, que, pode-se afirmar, iniciaram a tradição crítica na área de
Administração no Brasil, formaram escolas de pensamento e deixaram seguido-
res. Vários trabalhos contemporâneos são inspirados diretamente em sua obra,
na tradição por eles fundada. Algumas escolas e programas de pós-graduação
atribuem ênfase maior a essa tradição do que outras. A Escola Brasileira de Ad-
ministração Pública e de Empresas e a Escola de Administração de Empresas
de São Paulo, ambas da Fundação Getulio Vargas, foram, em certa medida, a
“casa” desses pensadores (Maurício Tragtenberg e Fernando Prestes Motta em
São Paulo e Guerreiro Ramos no Rio) e, talvez por essa razão, mantenham pre-
sente de maneira mais forte essa tradição. Guerreiro Ramos ainda tem influên-
cia em trabalhos desenvolvidos no Curso de Pós-Graduação em Administração
da Universidade Federal de Santa Catarina, onde também lecionou. Entretanto,
como afirmamos, suas idéias continuam a ter ressonância no trabalho de diver-
sos pesquisadores brasileiros (veja, por exemplo, Tenório 2002a, 2002b, 2004; e
Paula, 2001, 2002, 2004a, 2004b, 2005a, 2005b).
A produção crítica brasileira não se limita, entretanto, à tradição mencionada
anteriormente. A título de ilustração, podemos citar os trabalhos com perspectiva
marxista de Faria (2001, 2004, 2005) e de Misoczky (2002), os de realismo crí-
tico de Faria (2004, 2005a, 2005b), e de Faria e Wensley (2005), os de Vieira e
Vieira (2003, 2004) com uma perspectiva geopolítica, e, ainda, os que assumem
a perspectiva conhecida do CMS, como os de Davel e Alcadipani (2002, 2003).
Um ótimo exemplo do vigor, das perspectivas e dissonâncias da teoria crítica no
Brasil pode ser visto no recente debate realizado na Revista de Administração Con-

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temporânea (RAC), no primeiro número de 2005, entre Maria Ceci Misoczky e


Jackeline Andrade, Alexandre Faria e Rafael Alcadipani. Nele os autores expõem
suas idéias, deixando claras suas diferenças e abrindo, dessa forma, o mundo das
diferentes possibilidades de se fazer crítica em Administração em geral, e parti-
cularmente nos estudos organizacionais.
O texto sobre teoria crítica que nos cabe introduzir, intitulado Hora da verda-
de: condições e prospectos para os estudos críticos de gestão, de Valérie Fournier e
Chris Gray (Capítulo 15 deste livro), apresenta uma visão da história do já men-
cionado CMS (Critical Management Studies) e sua quase-associação. Nesse sen-
tido, apresenta uma visão parcial da teoria crítica em estudos organizacionais. É
evidente que há crítica e teoria crítica para além das fronteiras do CMS. Mas, para
quem quer conhecer o que se pode chamar de mainstream dos estudos críticos na
área de Administração, o texto é muito elucidativo.
Os autores descrevem brevemente as origens dos estudos críticos, relembram
a tradição dos estudos sobre o processo de trabalho e informam que, na sua pers-
pectiva, os estudos críticos em Administração apenas se tornam um corpo siste-
matizado de conhecimento na década de 1990, quando têm início as conferên-
cias com o mesmo título. Atribuem seu surgimento a uma onda de oposição, na
academia britânica, à Nova Direita, capitaneada pela primeira-ministra Marga­ret
Thatcher, que originou a gerencialização (managerialization) da administração
governamental. Passam depois para a discussão das disputas internas no âmbito
dos estudos críticos em Administração e concluem com um tímido questionamen-
to do argumento inicial de que o Reino Unido é o espaço de formulação e disse-
minação da crítica.
Ao situar a crítica no Reino Unido e ao caracterizá-lo como o lugar por exce-
lência, os autores direcionam a natureza da crítica, adotando uma visão colonia-
lista da questão. Assim, para nós, essa crítica deixa de ser crítica por perder seu
caráter emancipatório, que, como vimos, é essencial à definição de teoria crítica.
Além disso, os autores parecem situar a crítica no âmbito das escolas de negócios
do Reino Unido. Ao construir esse espaço institucional, a crítica perde força, pois
adquire caráter de “crítica autorizada”, legitimada e preocupada em ser positiva
(outra teoria do mainstream, a teoria institucional, particularmente o neo-institu-
cionalismo sociológico, é capaz de explicar adequadamente este ponto).
Como já afirmamos, embora achemos que o CMS tenha acabado por estabe-
lecer um tipo de “mainstream de estudos críticos em Administração”, acredita-
mos que a teoria crítica não se limita ao Reino Unido, e tampouco ao CMS. Pa-
rece-nos importante lembrar que, no contexto europeu, pelo menos uma outra
importante tradição crítica existe: a francesa, ainda que não possa ser facilmente
identificada por alguma marca. Não é possível ignorar a tradição da qual fazem
parte, por exemplo, Sartre, Althusser, Poulantzas, Foucault e Bourdieu. Recente-
mente, o trabalho de Solé (2003, 2000) também tem tido alguma ressonância no
Brasil. Obviamente que essa lembrança mantém uma perspectiva eurocêntrica e,

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Teoria crítica e pós-modernismo: principais alternativas à hegemonia funcionalista 299

portanto, ignora a tradição crítica dos países não europeus. Apenas para ficar no
contexto latino-americano, lembramos os desenvolvimentos teórico-práticos que
têm por base a filosofia da libertação, que passam pela teologia, pela educação e
pela cultura (veja, por exemplo, Freire, 1994).
No Brasil, o espaço em que trabalhamos a crítica é bem mais amplo do que
a academia britânica permite e, seguramente, deve optar por uma visão apro-
priada ao nosso tempo-espaço, diferente do eurocêntrico. Alguns autores brasi-
leiros, entretanto, parecem preferir a crítica institucionalizada. Ao defenderem
o pluralismo das abordagens que se abrigam sob o manto do CMS (Alcadipani,
2005), acabam por adotar uma posição conservadora, de manutenção do status
quo, desvinculada de um dos princípios da teoria crítica, a ação transformado-
ra. A revista Ephemera: Theory & Politics in Organization, em 2004, oferece uma
ótima reflexão sobre essa questão, particularmente no editorial de Steffen Böhm
e Sverre Spoelstra (Böhm e Spoelstra, 2004) e na resenha de Stephen Ackroyd
(2004) sobre o livro Studying management critically, organizado por Alvesson e
Willmott (2003).
O espaço dos estudos organizacionais no Brasil nos possibilita a oportunida-
de de romper com a dependência acadêmica. Permite-nos pensar que só é pos-
sível discutir emancipação quando resgatarmos a consciência da nossa posição
relativa no mundo, e que dela decorrem outras relações no âmbito interno de
nossas organizações. Talvez seja útil o resgate dos conceitos de centro e periferia.
Eles nos permitem ações transformadoras, pois não contêm o falso rótulo de neu-
tralidade que esconde, quase sempre, relações perversas de dominação.

Pós-modernismo

O primeiro desafio para introduzir o leitor no movimento pós-moderno e suas


possibilidades é sua mera definição. Primeiramente, há múltiplas facetas e subcor­
rentes pós-modernas; segundo, há formas de defini-lo, e cada uma tende a não
reconhecer as outras como “legitimamente pós-modernas” (Norris, 1990). Mas,
de forma genérica, pode-se dizer que o pós-modernismo corresponde a um movi-
mento teórico multidisciplinar que vai da filosofia à estética, envolvendo as artes
e a sociologia e chegando ao campo dos estudos organizacionais. O denominador
comum é a resistência à modernidade e, em particular, a crítica à razão iluminista
(veja, por exemplo, Harvey, 1993; Clegg, 1990; Wood, 1999).
Obviamente, apenas se pode entender a abordagem pós-moderna a partir do
entendimento da chamada “era pós-moderna”, isto é, o conjunto particular de
eventos e condições que caracterizariam o final do século XX e início do século
XXI, e que um grupo de filósofos e cientistas sociais entendeu constituir uma rup-
tura em relação à era moderna (Lyotard, 1984).
Muitos autores, como Harvey (1993) e Derrida (2004), caracterizam a cha-

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mada “era pós-moderna” por diversos elementos, como a globalização; o rela-


tivismo e o pluralismo, caracterizados pela dissipação da objetividade e da ra-
cionalidade, tidas como tipicamente modernas; a espetacularização da sociedade,
marcada pela centralidade da mídia e da imagem; a cultura de massa; a norma-
lização da mudança pela perpetuação de tudo como volátil e transitório; o papel
do indivíduo na sociedade primordialmente como consumidor; e a comoditização
do conhecimento.
Mas será essa uma ruptura com a modernidade, ou será um estágio mais
recente e transformado de modernidade tardia? O pós-modernismo como movi-
mento intelectual se define justamente por aqueles que vêm no fim de século XX
uma ruptura com a era moderna, e pelo argumento de que nossas percepções de
mundo, a estética, a ciência e o conhecimento devem também adequar-se a essa
mudança. Portanto, as convicções modernistas e os resíduos do projeto iluminista
devem ser abandonados.
É importante salientar, no entanto, que há um conjunto significativo de au-
tores que não entendem ser a “pós-modernidade” uma ruptura com a moderni-
dade, e sim um estágio “tardio” da modernidade – como Habermas ou Giddens
(1991a, 1991b) – ou como estágios distintos da modernidade, como o concei-
to de “moder­nidade sólida” e “modernidade líquida” de Bauman (1998, 2001).
Habermas, por exemplo, parece sintetizar o que se poderia chamar de “crítica
modernista ao pós-modernismo”. Para ele, ao negar a crítica e a razão como um
todo, bem como o projeto iluminista, os pós-modernos enganam-se duplamente.
Primeiro, porque o projeto iluminista ainda não estaria completo, o que indicaria
que a modernidade perdura; e, segundo, porque sem razão e crítica negariam va-
lor ao indivíduo, e com isso acabariam por levar a sociedade ao totalitarismo.
Por sua vez, os teóricos pós-modernistas reagem a essas críticas, entendendo
serem “lamentos modernistas em um mundo pós-moderno”, como crédulos incau-
tos do potencial “salvador” da humanidade de si mesma, ou como racionalizantes
da razão e do universalismo iluminista (veja, por exemplo, Lyotard, 1984).
Pós-modernistas devotos como Lyotard acabaram promovendo o movimento
pela radicalização de suas visões de mundo, conhecimento e ciência, e pelo seu
deliberado afastamento dos movimentos críticos, como Habermas e outros teóri-
cos de Frankfurt, que percebem como arraigados a um modernismo ultrapassado.
Para eles, a crença na razão e no projeto iluminista não faz mais sentido no mun-
do pós-moderno. Tanto a teoria crítica quanto os modelos a que esta se opõe cons-
tituiriam todos, de per se, metanarrativas, modelos universais e generalizações,
que os pós-modernistas negam e das quais quase se divorciam por completo.
Criticando os modernistas e a sua fé na razão iluminista, os autores pós-mo-
dernistas tendem a argumentar que a racionalidade é muito mais difusa do que o
Iluminismo supunha, e que o conhecimento apenas pode ser entendido à luz do
tempo, espaço e contexto social em que é construído por indivíduos e grupos. Por-
tanto, indicam, entre outros métodos, o uso de Derrida (2004) e do conceito de

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desconstrução desse conhecimento construído, para revelar e entender seus pres-


supostos e suas contradições. Segundo Derrida, as contradições no texto e no dis-
curso revelariam tanto os múltiplos sentidos do conhecimento como a dinâmica e
o contexto de sua construção. Outra abordagem típica do pós-modernismo em ci-
ências sociais é o uso de genealogias, inspiradas em Foucault (1987, 1988), pelas
quais, utilizando métodos historiográficos, esses teóricos procuram “desfamiliari-
zar” construções modernistas e expor suas contradições e manipulações internas.
No âmbito organizacional, o movimento pós-modernista chega, em especial,
por meio de teóricos europeus vindos da tradição pós-estruturalista, e por críticos
da tradição positivista em sociologia e em estudos organizacionais (veja Calás;
Smircich, 1999a; Hassard, 1993; Hassard; Parker, 1993; ou Chia, 1995, para uma
evolução do movimento).
O artigo da perspectiva pós-moderna incluído neste módulo é um exce­lente
ponto de partida para o leitor interessado em entender melhor as abordagens
pós-modernas, seus principais postulados e suas origens no âmbito organi­za­
cional. O texto de Cooper e Burrell, Modernismo, pós-modernismo e análise orga-
nizacional: uma introdução (Capítulo 14 deste livro), é, na verdade, a introdução
ao que deveria ser uma série de quatro números da revista Organization Studies
sobre a perspectiva pós-moderna em estudos organizacionais, que cobriria suas
origens e contribuições. Os artigos nos números subseqüentes deveriam cobrir as
contribuições de Derrida (Cooper, 1989), Habermas (Burrell, 1994). Sugere-se
fortemente ao leitor mais interessado nessa corrente que, como complemento do
artigo aqui incluído, consulte também os números subseqüentes da série.
Como mostram Cooper e Burrell, a base da análise pós-moderna – dentro e
em volta do campo de estudos organizacionais – inicia-se pela oposição a teóri-
cos sociais críticos que cunhavam de “modernistas” (como Habermas, Luhmann
e Bell), em função do que afirmavam ser uma crença infundada de que a huma-
nidade, por meio da razão e do “progresso”, poderia aperfeiçoar a si mesma. Os
primeiros pós-modernistas em estudos organizacionais, inspirados nos trabalhos
de autores como Derrida, Lyotard e Foucault, tipicamente se definiam por dois
elementos. Primeiro, pela radical oposição a esse que chamariam de viés “racio-
nalista etnocêntrico” dos teóricos modernistas, mesmo os chamados “críticos”.
Segundo, pela firme oposição ao positivismo que impera(va) na teoria social he-
gemônica, sustentado pelo amplo contingente de teóricos pós-estruturalistas que,
desde o princípio, juntaram-se ao movimento, mas que não encontravam nos ar-
gumentos da teoria crítica um continente para suas preocupações mais contem-
porâneas (Alvesson; Deetz, 1999; Chia, 1995).
Autores como Gibson Burrell e John Hassard, no Reino Unido, e Marta Calás
e Linda Smircich, nos Estados Unidos, foram fundamentais na disseminação do
movimento em estudos organizacionais, a princípio, mas não apenas pelo apor-
te de perspectivas e metodologias desconhecidas às teorias até então utilizadas
no campo. Autores de orientação pós-modernista se multiplicavam, e dentro do

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escopo geral de crítica à modernidade e ao positivismo, focaram a relevância do


discurso, do relativismo, da personalização e das relações de poder no que cha-
mam de “construção” da verdade e do conhecimento.
Armados de metodologias desconstrutivas, teóricos pós-modernistas em estu­
dos organizacionais partiram para a crítica a elementos da modernidade que
se enraizariam em pressupostos iluministas, freqüentemente usando metodolo-
gia de análise de discursos e narrativas (Hassard, 1993; Hassard; Parker, 1993;
Chia, 1995). Obviamente, não apenas de análises desconstrutivas vive o pós-mo­
dernismo em estudos organizacionais. Os teóricos pós-modernistas também po-
pularizaram o uso de metodologias de inspiração pós-estruturalista, especialmen-
te as análises genealógicas e historiográficas inspiradas no trabalho de Foucault
(1987, 1988): são exemplos em análise organizacional, entre outros, o trabalho
de Sewell e Wilkinson (1992), que traça a genealogia do movimento da quali-
dade e relaciona práticas de qualidade total com o panóptico, e o de Towney
(1993), que desenha a genealogia da função de RH e a compara com censos po-
pulacionais, normatizantes e familiarizados pelo costume.
No Brasil, como já apontou Wood (1999), poucos foram os adeptos de aborda­
gens pós-modernistas em estudos organizacionais, embora sua produção esteja
longe de ser pouco significativa. É verdade, no entanto, que parece ser bem mais
fácil encontrar os sinais da influência do movimento pós-modernista na produção
brasileira em organizações, por exemplo, por meio da influência de seus expoen-
tes (Foucault, Derrida, Baudrillard e Latour), do que pela assunção direta desse
rótulo pelos pesquisadores. De fato, alguns poucos autores claramente declaram
essa inclinação em suas publicações (por exemplo, Tonelli; Alcadipani [2000]
em comportamento organizacional, Mendes [2004] em organizações, ou Casot-
ti [1998] em marketing), enquanto muitos outros parecem limitar-se a utilizar
referências ou metodologias de inspiração pós-moderna em meio a outras abor-
dagens, a despeito de, com elas, o pós-modernismo poder apresentar evidente
disparidade e contradição.
Balanços recentes das abordagens pós-modernas em estudos organizacionais
evidenciam avanços sentidos também no Brasil. Calás e Smircich (1999a) mos-
tram que, após quase duas décadas da influência do movimento no campo, qua-
tro vertentes teóricas parecem ser as principais “herdeiras” do pós-modernismo
em análise organizacional, e que nele ainda residem com forte potencial de ex-
tensão e contribuição: (i) teorias feministas (ou de gênero) pós-estruturalistas;
(ii) análises pós-colonialistas; (iii) teoria actor network (actor network theory,
também chamada de teoria da translação),1 além da (iv) análise desconstrutiva
de discursos e narrativas sobre conhecimento.
Quanto à primeira, teorias feministas pós-estruturalistas, os trabalhos da pró-
pria Marta Calás (Calás, 1992; Calás; Smircich, 1999b) e de Calvert e Ramsey
(1992) são bons exemplos. São ilustrações de uma aproximação brasileira a esse
tipo de perspectiva, entre outros, os trabalhos de Cappelle et al. (2004) e de An-

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drade et al. (2002). Na segunda vertente, ligada à análise pós-estruturalista, que


ficou conhecida como teoria pós-colonialista, bons pontos de partida podem ser
vistos, por exemplo, em Bhabha (1995) ou em Young (2001). Embora essa linha
não tenha sido ainda devidamente explorada no Brasil, uma primeira aproxima-
ção pode ser vista em Caldas e Alcadipani (2006). Na vertente da teoria actor-
network, ou da translação, a influência do trabalho de autores como os franceses
Bruno Latour (1992, 1994, 1997) e Michel Callon (1999), e o britânico John Law
(1994) pode ser melhor entendida, no âmbito organizacional, por revisões abran-
gentes como a de Law e Hassard (1999), ou por aplicações práticas como a de Ka-
ghan e Phillips (1998). Como a vertente anterior, esta linha teórica é muito pou-
co explorada em análise organizacional no Brasil, tendo sido publicados apenas
alguns estudos ligados à área de tecnologia da informação (por exemplo, Souza;
Fontana, 2005). Por fim, sobre a já mencionada análise de narrativas, exemplos
desse tipo de pesquisa em estudos organizacionais incluem, entre outros, o tra-
balho de Kilduff (1993); no Brasil, a pesquisa de Lengler, Vieira e Fachin (2002)
é uma ótima ilustração de aplicação local.
Obviamente, um movimento tão polêmico e tão abrangentemente abrasivo
às abordagens anteriores não poderia deixar de ter seus desafetos e críticos, mui-
tos deles de alto calibre, como já brevemente mencionamos no início desta seção.
Primeiramente, alguns críticos sugerem que o movimento não passa de um aglo-
merado de descontentamentos e argumentos que têm entre si apenas a insistente
antipatia ao modernismo e aos projetos iluministas (veja resumo dessa e de ou-
tras críticas em Norris, 1990). Em segundo lugar, diversos autores de peso, como
Habermas, Giddens e Bauman, negam-se a aceitar a idéia de ruptura de uma épo-
ca moderna para uma pós-moderna. Preferem entender a realidade pós-moderna
como um estágio mais recente ainda dentro do escopo da modernidade (uma dis-
cussão nesse sentido pode ser vista em Berman, 1982). Em terceiro lugar, críticos
do pós-modernismo também questionam a ausência de uma proposição ou con-
tribuição positiva que derive da “desconstrução” pós-modernista ou da exposição
das premissas de teorias prevalecentes, parafraseando a expressão popular, como
exercício intelectual: parece ser interessante, mas para que serve? Ou, afinal, o que
existe depois da desconstrução? (Calás; Smircich, 1999a). Mesmo autores como
David Harvey sugerem que se torna difícil a sustentação de um movimento que
nada tem a propor ao progresso, porque questiona a noção básica de progresso,
ou que nada tem a sugerir para um mundo mais justo, porque não compartilha
da percepção de universalidade nem sequer de princípios como justiça ou eqüi-
dade. Habermas chega a argumentar que, no limite, o pós-modernismo não deixa
de ser um movimento conservador, que preserva o status quo, pois, a ser deixada
em suas mãos, nenhuma mudança jamais deverá ser feita, restando-nos a letargia
de um subjetivismo radical (sobre esse debate no pensamento de Habermas, veja
resumo em White, 1988). E por fim, em quarto lugar, críticos mais radicais, com
argumentos nessa mesma direção, chegam a argumentar que os teóricos pós-mo-
dernistas têm pouco a oferecer simplesmente porque não teriam muito a dizer.

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Alan Sokal, por exemplo, sintetiza esse tipo de ponto de vista segundo o qual o
movimento pós-modernista não passaria de exercícios de verborragia e semânti-
ca, sem maior significado ou propósito além do de demarcar um território para si
mesmo. Para provar seu argumento, Sokal – um físico – submeteu a um periódi-
co pós-modernista um artigo propositadamente sem sentido (sobre perspectivas
pós-modernas da física e da matemática); o artigo foi aceito e publicado (veja re-
lato e discussão em Sokal e Bricmont, 1998).
Talvez não seja preciso chegar a tanto. Não há dúvida de que o pós-modernis-
mo trouxe importantes contribuições, ao menos em análise organizacional, como
discutiremos a seguir, na conclusão.

Considerações finais

A teoria crítica e o pós-modernismo são alternativas ao modo de gerar conhe-


cimento. Assim, podem trazer avanços e inovações em uma área como a nossa,
tão afeita à reprodução do conhecimento.
Quanto à teoria crítica, acreditamos que ela pode ser muito útil à Adminis-
tração em geral, e ao campo dos estudos organizacionais em particular. Acredita-
mos que essa abordagem é um dos caminhos possíveis na busca da emancipação
do homem, na direção de uma sociedade melhor e mais justa. Na academia, ela
ajuda a construir um tipo de conhecimento e a realizar um tipo de ciência mais
apropriados, no sentido do Guerreiro Ramos, às nossas raízes históricas e cultu-
rais. Isso não significa isolamento ingênuo ou romantismo em relação ao local,
mas uma posição de tomada de consciência sobre nosso papel no mundo. Para
tanto, parece-nos imprescindível evitar a crítica dócil, que opera quase como uma
nova “jaula de ferro”, uma vez que tem origem em uma visão do norte sobre o sul
ou, se o leitor preferir, do centro sobre a periferia. Isso nos emancipa? Isso nos
garante desenvolvimento? Talvez a boa crítica seja aquela cujo fruto é o diálogo
respeitoso entre o norte e o sul.
Outro ponto importante sobre esse tema é a necessidade de que nossos tex-
tos sejam usados por outros autores nacionais para o debate de idéias. As críticas
não devem ser tomadas como pessoais, como costuma ser nossa tradição. Entre-
tanto, é importante não confundir isso com o caráter positivo da crítica. Como
dizia Horkheimer, um elemento de negatividade é importante. A crítica positiva,
ou construtiva, na linguagem mais comum, guarda em si um caráter da manuten-
ção. A transformação se dá na via oposta. Seja como for, só elas, as críticas, são
capazes de produzir reflexividade e conduzir ao avanço acadêmico.
No que se refere ao pós-modernismo, no campo de estudos organizacionais,
é importante reconhecer que o movimento trouxe uma contribuição significativa.
Entretanto, com essas contribuições, o pós-modernismo parece trazer também
seus próprios dilemas e paradoxos, como discutido na seção anterior. Entende-

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mos ser nosso dever discutir aqui, um pouco, tanto essas potencialidades quanto
suas limitações.
Quanto às potencialidades, o pós-modernismo legitimou metodologias como
a desconstrução de narrativas e análises genealógicas que vêm crescentemente se
expandindo nas últimas décadas. Trouxe também ao campo, em função da visão
representacionista da teoria, a pertinência de se demandar do pesquisador ou do
ator produtor de conhecimento a explicitação do propósito (para que e para quem
se cria conhecimento) e do contexto (tempo, espaço e ambiente) em que esse co-
nhecimento é produzido. E trouxe, além disso, a forçosa revisão da propriedade
de elementos da modernidade e do projeto iluminista que se manifestam nas or-
ganizações de hoje. Enfim, sem dúvida ofereceu ao campo a visão fresca de que
uma teoria pode ser construída de forma distinta do que até então se praticava
(Calás; Smircich, 1999a). Mais especificamente no Brasil, o pós-modernismo de
fato oferece um sem-número de novos caminhos, metodologias e questões de
análise em estudos organizacionais.
Do ponto de vista metodológico, embora Derrida argumente não ser essa
uma metodologia apenas, é sem dúvida bem-vindo o uso rigoroso de análise e
desconstrução de narrativas, bem como competentes análises genealógicas. Tal-
vez muito da nossa produção no campo que tenta distanciar-se do funcionalismo
esteja excessivamente baseado em ensaios, e a crítica de falta de base empírica
demande esse tipo de aporte metodológico. E talvez muito da nossa produção de
conhecimento seja descontextualizada, e o sujeito desse conhecimento de fato
possa ser colocado em questão.
Do ponto de vista temático, vários dos mais atuais temas preferidos pelo mo-
vimento parecem ter grande potencial no Brasil. Por exemplo, a perspectiva pós(e
neo)-colonialista parece bem apropriada a um país e uma realidade que vivem à
margem de países ditos desenvolvidos, em uma relação que está longe de ter sido
bem mapeada e resolvida, inclusive no campo organizacional. Os estudos pós-
estruturalistas de gênero também parecem especialmente apropriados: por um
lado, o crescimento da produção brasileira em temas de gênero ressente-se das
mesmas limitações que o paradigma funcionalista, as quais as abordagens (e es-
pecialmente metodologias) pós-modernas podem ajudar a superar. Por outro lado,
o foco em gênero poderia aqui ser expandido para a análise de outras dimensões
e desconstruções de exclusões, como de raça, condição social e orientação sexual.
Afinal, a verdade é que o país e suas organizações ainda sofrem os elementos e
múltiplos efeitos das muitas exclusões que reproduzimos, e que nossos teóricos
têm majoritariamente ignorado.
No entanto, é difícil deixar de mostrar os dilemas que uma leitura mais pu-
rista do pós-modernismo pode trazer. Em um mundo crescentemente conflituo-
so, abundante em iniqüidades e em miséria, a postura pós-modernista radical de
questionar o projeto e as potencialidades da crítica e da autonomia humana pa-
rece, no mínimo, de difícil aceitação.

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Ou talvez, como diria Zygmunt Bauman, aceitá-las por completo fosse até
imoral. Em recente trilogia – Globalização (1999), Em busca da política (2000),
e A modernidade líquida (2001) –, Bauman analisa as mudanças nas condições
da vida social e política entre fins do século XX e início do século XXI. Para ele,
essas mudanças caracterizam uma transformação, mas dentro da modernidade.
Enquanto em estágios anteriores a modernidade parecia sempre preservar algum
elemento de permanência e imutabilidade que lhe daria sentido, nos dias de hoje,
ditos “pós-modernos”, tudo, inclusive a identidade do indivíduo e as relações hu-
manas, teria se tornado efêmero e volátil. Bauman acredita fundamentalmente
na busca da autonomia. A transmutação da identidade, nesse mundo de “mo-
dernidade fluida”, pode enganosamente nos levar a crer que somos livres para
escolher o que somos e quem somos. Porém, Bauman não vê nisso liberdade ou
efetiva emancipação, mas a gênese, nesta modernidade fluida, de um mundo ex-
cessivamente egoísta e competitivo, onde não há lugar para solidariedade, e onde
se abre espaço para uma evolução ainda mais sinistra do capital do que na época
do surgimento do capitalismo. O autor admite que não oferece soluções, embora
sua defesa da política e da assunção do papel de cidadão pelo indivíduo seja pun-
gente. Contudo, defende sua busca incansável do diagnóstico e do alerta profun-
dos do que entende ser uma era alarmante para a humanidade. E nesse ponto,
distanciando-se dos pós-modernos, afirma que olhar a miséria humana subliman-
do qualquer alento de consciência ou dando de ombros à escassez de soluções ad-
vinda da descrença da razão e da emancipação, vendo-as como “metanarrativas”,
implica não apenas cumplicidade, mas também um ato de absoluta imoralidade.
Enfim, como sugerimos desde o início, as alternativas mais radicais que se
colocam hoje em dia ao funcionalismo em análise organizacional são ao mesmo
tempo diversas e multifacetadas, mas também carregam, como qualquer projeto
epistemológico, seus próprios dilemas e limitações. Nada é de graça. Nossa espe-
rança é de que, nesta introdução, possamos ter oferecido pistas ao leitor que se
inicia no entendimento dessas polêmicas vertentes em estudos organizacionais, e
que anseia chegar às suas próprias conclusões.

Nota
1
Apesar de alguns autores brasileiros noutros campos, como em psicologia e
educação, usarem a expressão teoria de rede de atores, não nos pareceu que essa
tradução esteja suficientemente validada e aceita localmente e, portanto, preferi-
mos a indicação em inglês. Referências ao tema podem ser vistas pelas indicações
bibliográficas de Rafael Alcadipani e Christine McLean, na revista de administra-
ção de empresas, v. 42, n. 2, p. 122, 2002.

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