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Freire 2022
Freire 2022
Sempre deverá se fazer de baixo para acima,o que lhe imprimi- sobre elas. Além do material visual preparado para a rea-
rá um caráter orgânico. Deverá surgir, não como uma dádiva lização dos debates, deveriam aproveitar-se os esforços do
de uma “elite”, mas como uma reivindicação da comunidade. setor “Teatro”. Neste sentido, alguns dos temas serão dra-
Assim,para a sua instalação,deverão adotar-se procedimen- matizados, sem apresentar solução alguma e entregues aos
tos especiais, prévios e concomitantes ao seu funcionamento. participantes com simplicidade para serem discutidos no
Antes de entrar na preparação dos quadros especializados momento. É importante também que se utilizem integran-
de promotores, deve-se proceder a fixação das aspirações co- tes dos grupos participantes para atuar na dramatização.
munitárias e interpretação dos objetivos das comunidades. Neste sentido, também devem usar-se gravações de entre-
Depois de ter fixado os temas e haver-lhes relaciona- vistas realizadas com técnicos e especialistas, em linguagem
do com os objetivos do Instituto, se iniciará a preparação acessível, para que os grupos discutam livremente sobre elas.
do material. Os temas escolhidos se codificam de modo a Assim, os temas que estão dentro dos objetivos do INDAP,
constituir núcleos de aprendizagem. Esta redução e codifi- serão tratados e discutidos de forma ativa, o que ajudará a
cação se efetuarão com a presença de especialistas dos vá- transformar a consciência “mágica” do homem rural num tipo
rios temas abordados. de consciência crítica e, estabelecendo-se, assim, uma relação
O material visual pode se fazer em Strip-filmes ou em orgânica entre o processo de aprendizagem e seu conteúdo.
cartazes, preferindo o Strip pelo impacto que tem a projeção A criação de um Círculo de Leitura, como já se apontou,
na comunicação visual. não pode ser feita de cima para baixo como se fosse uma dá-
Os núcleos com os temas devem constituir uma série com diva à comunidade. Como instituição de educação e cultura
uma sequencia adequada. As ilustrações dos temas que po- popular, voltada para a promoção do homem, dos grupos da
dem ser fotografias, desenhos, pinturas, etc. corresponderão à comunidade, deve ser entendida por eles como sua própria
realidade existencial dos grupos e aos objetivos do programa. reivindicação.
É absolutamente indispensável a preparação de textos Aproveitando, por exemplo, a reunião de sócios de uma
populares, formando pequenos livros e folhetos ilustrados cooperativa, o encontro de pessoas que assistem a um espe-
para as pessoas já alfabetizadas. táculo ou que se reúnem em qualquer ocasião, é que se pode
Nos Círculos de Cultura, acompanhados pelo pessoal já lhes falar da possibilidade de fazer reuniões – duas ou três
devidamente preparado, os grupos de “participantes” (que vezes por semana – para a discussão de problemas. Se se
substituem os alunos da escola tradicional) decodificam os aceita a sugestão, pode-se propor a criação de um Círculo de
temas codificados. Cultura. Este Círculo de Cultura pode funcionar na casa de
A tendência natural destes Círculos é a transformação uma das pessoas, ou na sede da cooperativa, na sacristia de
gradual, e as vezes muito rápida, de “grupos de estudos” em uma igreja ou na escolinha rural.
“grupos de ação”. Na realidade, a medida que os grupos vão Tem que advertir que, nestas reuniões, não estará nem um
sendo desafiados por situações cada vez mais problemáti- professor, nem um conferencista de ares doutorais, mas que
cas, eles desenvolvem, com o diálogo, sua consciência, escla- os assuntos de maior interesse da comunidade serão discuti-
recendo-a, e passam da compreensão das situações à ação dos democraticamente.
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Depois de obter a adesão do grupo para a discussão dos para a animação dos debates, mas, sobretudo, a respeito da
seus problemas, se fará informalmente uma fixação dos te- condução dos mesmos.
mas de interesse imediato do grupo. O educador perguntará Esta preparação requer:
seguidamente os temas que os assistentes quiserem ter como Uma mudança de atitude. De uma atitude autoritária a
matéria da aprendizagem. A medida que vão surgindo as uma dialogal.
respostas, elas devem ser anotadas pelo educador. A renúncia a exposições verbalistas.
Também se deverá estimular aos assistentes mais passivos Adoção do diálogo que se funda na procura amorosa, hu-
para que eles também tomem parte da reunião. O temário milde e crítica de algo.
será, então, estudado pela equipe central tão rapidamente Superação de uma posição ingênua, para a qual o “ho-
como seja possível. mem simples” nada sabe e, como nada sabe, deve-se lhe en-
A programação deverá efetuar-se baseando-se neste te- sinar uma atitude nova que afirma que o homem simples
mário obtido nas reuniões de base. Os temas se codificam e sabe essencialmente porque é homem. Mas, este conheci-
vêem-se os meios com os quais se vai ativar o Círculo. mento deve ampliar-se e aprofundar-se. A atitude dinâmica
Podem-se instalar tantos Círculos quanto sejam os gru- o identifica com o aprendizado. Deve-se tentar a superação
pos, com um máximo de 25 pessoas interessadas em discutir da captação, compreensão mágica ou ingênua das coisas e
os temas, considerando, além do mais, as disponibilidades dos fatos, por uma captação cada vez mais ajustada da cau-
gerais com que se conta. salidade autêntica da qual resulta uma compreensão cres-
Nas experiências realizadas no Brasil, era impressionante o centemente crítica.
interesse de homens simples por discussão de temáticas con- Esta mudança é promoção em si. É difícil, mas não ir-
sideradas geralmente de interesse estritamente universitário. realizável. Se não se obtém uma mudança desta natureza,
Será muito importante a fixação crescente de temas, os é impossível um esforço de promoção como Autopromo-
mais variados, cuja discussão interessa às comunidades ru- ção. A distância cada vez maior entre “cultos” e “incultos”
rais. A riqueza de material que, deste modo, se reunirá, será provoca atitudes paternalistas com relação a estes últimos.
um aporte valioso para todo esforço de promoção que se Uma atitude paternalista é o trato dos “adultos” para com os
empreenda no futuro. “menores”. Daí a dificuldade para o diálogo.
Será possível, pouco a pouco, o conhecimento da temá- A relação dialogal entre A e B é amorosa, humilde, crí-
tica popular rural, reduzida e codificada. Isto faria possível a tica e esperançada. É uma relação comunicante e criadora.
publicação de um catálogo de temas chilenos. A relação de diálogo é resistida por aquelas pessoas que se
acham donas de uma “verdade” que impõem paternalmente
A capacitação do pessoal aos “Menores”.
Uma formação vertical, anti-dialogal, que se recebe em
Um dos aspectos mais importantes num trabalho como muitas escolas, gera atitudes que resistem à mudança. Resis-
este é a capacitação do pessoal que atuará. Não só no refe- tência que é maior, pois, está referida a um sistema de valo-
rente ao mínimo de conhecimentos básicos indispensáveis res, a uma visão de mundo.
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Anti-diálogo
O anti-diálogo é:
Relação de “simpatia” na procura de algo (Inter-confian- - Desamoroso;
ça). O diálogo é: - Sem humildade;
- Amoroso - Sem esperança;
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Codificação e Decodificação