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ATKINSON, Dennis. Art, disobedience, and ethics: The adventure of pedagogy.

Springer,
2017.

Os eventos de aprendizagem podem ser provocados por muitos fatores:


Os eventos de aprendizagem não seguem um padrão previsível e não estão restritos a
condições específicas. Sua ocorrência pode ser desencadeada por diversos fatores, sendo
influenciada tanto pelo contexto educacional quanto pelas características individuais dos
participantes do evento. A presença de heterogeneidade e contingência destaca a
diversidade de elementos que podem contribuir para a emergência desses eventos.
Encontrar contradições entre conhecimentos prévios e novas informações, por exemplo,
pode gerar eventos de aprendizagem. Além disso, ferramentas e recursos tecnológicos
também podem criar oportunidades para eventos de aprendizagem, proporcionando
novas formas de interação e exploração do conteúdo. Na nossa narrativa, o evento em
questão foi a dificuldade de diálogo com a turma.

O trecho menciona uma revisão na utilização do termo "real learning" (aprendizado real) que o
autor havia utilizado extensivamente em uma publicação anterior. No livro anterior (Atkinson,
2011), o "real learning" era concebido como um salto para um estado ontológico novo ou
modificado, cujos efeitos e relações produzem uma expansão no agir e pensar. No presente
livro, o autor optou por substituir o termo (exceto no Capítulo 4) pela ideia de "eventos de
aprendizagem", onde o evento é considerado uma multiplicidade composta por virtualidades e
atualidades, conforme descrito por Deleuze e Guattari. Eventos de aprendizagem emergem de
um domínio do virtual, do infinito, o que Guattari chama de "chaosmosis", e precipitam
atualizações específicas ou fases de consistência de acordo com o contexto do evento. Esses
eventos de aprendizagem incluem forças e relações humanas e não humanas, orgânicas e
inorgânicas. A noção de não-humano refere-se a fases de transformação que vão além da
influência e da captura de estruturas transcendentais que já constituem o humano. Tais eventos
de aprendizagem contrastam com o que poderíamos chamar de aprendizado normativo, que
pode ser entendido em termos de realizações de padrões estabelecidos de possibilidades.
Essas ideias serão discutidas mais detalhadamente nos capítulos subsequentes (p. 9).

O autor está considerando ética, política e estética em relação ao projeto da educação como
um processo de construção de uma vida. Esse processo é visto como uma transdução, um
conceito de Simondon equiparado ao processo de individuação ou ontogênese. A transdução é
caracterizada por um elemento genético inicial, como a formação de um cristal em
individuações físicas, um núcleo catalítico, ou um evento gerador que se propaga por um
domínio, neste caso, um domínio humano. Durante esse processo, o evento transforma ou
reconfigura o domínio. Aqui, podemos dizer que o humano fica exposto ao não-humano, a
perspectivas e formas de se tornar desconhecidas que podem nos levar além das limitações
humanas. Os eventos de aprendizagem são vistos como uma mudança para fases ontológico-
epistêmicas novas ou modificadas, não apenas como uma reconfiguração de experiências
anteriores, mas como um processo de transformação, a gênese de um novo mundo ou
realidade, onde experiências anteriores e vida são transformadas.
Esse processo transdutivo, argumenta o autor, envolve uma indissolubilidade entre saber (não
conhecimento), ética e estética, como sugerido na ideia de formar novos mundos ou no
processo de construir uma vida. Susan Buck-Morss destaca o dilema persistente enfrentado
pelos sistemas de educação institucionalizados: o choque entre tradição e o novo, "o
verdadeiramente novo, que nenhuma de nossas tradições de conhecimento antecipou",
constituindo um período de perigo político. O autor busca refletir sobre o "fora de tempo" no
trabalho pedagógico e nos encontros de aprendizagem, momentos em que um professor é
confrontado com uma prática de aprendiz que não se encaixa nos parâmetros anteriores, ou
quando um aprendiz inova nas formas de ver, pensar ou criar.

Existe uma contradição, pois as políticas institucionais de educação geralmente demandam


homogeneidade e linearidade, enquanto os territórios existenciais dos eventos de
aprendizagem ou do "fora de tempo" da aprendizagem referem-se a processos locais
contingentes e heterogêneos, algo frequentemente ignorado pelas políticas educacionais (p.
21).

Tradução e Explicação de EVENT AND ENCOUNTER


O conceito de evento permeia este livro, que se preocupa especificamente com
eventos locais de aprendizagem, seus compromissos situados e as
sensibilidades que podem permitir aos professores respondê-los no contexto
da educação artística. Em um livro anterior (Atkinson, 2011), usei o trabalho de
Alain Badiou sobre o evento como a principal fonte filosófica para explorar
eventos no trabalho pedagógico.
Para Badiou, um evento é o que ocorre em uma situação, mas cujo efeito é
"uma profunda transformação da lógica de uma situação" (2005, p. 130).
Podemos ver o pensar como um evento, uma ideia apoiada por Deleuze que
concebeu o pensamento em termos de transgressão e violência (1994, p. 175).
Badiou vê um evento como algo que abre espaço para um procedimento de
verdade manifestado em termos de ser fiel a uma nova ideia, uma forma de
pensar ou agir. Envolve uma ruptura do conhecimento pela verdade de um
evento e a subsequente perseverança com essa verdade e seu potencial
transformador.
Ser fiel a um evento é se mover dentro da situação que este evento
complementou por pensar... a situação 'segundo' o evento. E isso, é claro – já
que o evento foi excluído por todas as leis regulares da situação – obriga o
sujeito a inventar uma nova maneira de ser e agir na situação. (2001, p. 41).
Há alguns anos, meu supervisor de doutorado, Bill Brookes, frequentemente
discutia a ideia de perturbação em experiências de ensino quando um
professor é confrontado com algo misterioso que perturba seu modo de
funcionar. Isso poderia ser, por exemplo, um trabalho específico produzido por
uma criança ou aluno, ou a resposta de um aluno a uma pergunta. Portanto,
para mim, o evento se relaciona a uma perturbação, uma ruptura de formas de
entender ou agir que tem o potencial de precipitar novos modos de ser. Estou
usando o termo eventos de aprendizagem para referir à aprendizagem como
um processo arriscado de encontro com aquilo que está além das estruturas
estabelecidas de conhecimento e cujos efeitos podem nos transportar para um
novo território ontológico e epistemológico e uma reconfiguração do ser. O
termo se aplica igualmente a professores/educadores e alunos/estudantes.
A ideia de verdade então está relacionada à noção de ser verdadeiro a algo, e
esse processo de verdade denota um processo de subjetivação que pode ser
visto como um "compromisso com" uma ideia, um afeto, uma nova prática, uma
nova forma de ver, uma nova forma de fazer sentido, e assim por diante, o que
envolve uma luta onde podemos ser levados além de nossa gama normal de
respostas.
Para Badiou, a subjetivação surge como consequência de um evento pelo qual
um sujeito se torna sujeito ao perseverar com uma verdade, de ser verdadeiro
a algo. Ranciere tem uma visão semelhante sobre a subjetivação:
"Por subjetivação (subjectivación) quero dizer a produção, através de uma
série de ações, de um corpo e de uma capacidade de enunciação não
previamente identificáveis dentro de um determinado campo de experiência,
cuja identificação é assim parte da reconfiguração do campo de experiência."
(1999, p. 35, meu colchete). (p. 92).

Atkinson (2017) explora o conceito de evento no contexto de eventos locais de


aprendizagem, especialmente na educação artística, ressaltando a influência filosófica
de Alain Badiou sobre essa ideia. Segundo Badiou, um evento é algo que ocorre em
uma situação, mas cujo efeito é uma transformação profunda na lógica dessa situação.
Ele destaca que um evento abre espaço para um procedimento de verdade, que implica
ser fiel a uma nova ideia, uma forma de pensar ou agir. Isso implica uma ruptura do
conhecimento pela verdade do evento e a persistência com essa verdade, com o
potencial de ser transformadora. Para Badiou, ser fiel a um evento significa se
movimentar dentro da situação conforme alterada pelo evento, promovendo a irrupção
de novas maneiras de ser e agir. Atkinson relaciona essa concepção de evento à noção
de perturbação. Nesse contexto, um evento é percebido como uma perturbação, uma
ruptura nas formas estabelecidas de entender ou agir, com o potencial de desencadear
novos modos de ser.
O termo "eventos de aprendizagem" é utilizado para descrever o processo
arriscado de encontro com algo além das estruturas estabelecidas de
conhecimento, que pode levar a uma reconfiguração ontológica e
epistemológica, tanto para professores quanto para alunos. A ideia de verdade
está relacionada à noção de ser verdadeiro a algo, envolvendo um processo de
subjetivação e compromisso com uma ideia, um afeto, uma prática ou uma
nova forma de compreensão.

Ambos Badiou e Rancière compartilham a visão de que a subjetivação ocorre


como resultado de um evento, onde um sujeito se torna sujeito ao perseverar
com uma verdade, sendo fiel a algo. A subjetivação, nesse contexto, implica a
produção de um corpo e de uma capacidade de enunciação não previamente
identificáveis dentro de um determinado campo de experiência, contribuindo
para a reconfiguração desse campo.

Denis Atkinson (2017) conceitua um evento de aprendizagem como um


encontro com algo que transcende as estruturas consolidadas de
conhecimento, apresentando o potencial de perturbar as formas usuais de
compreensão e ação do indivíduo. Esses eventos podem perturbar as
expectativas e, consequentemente, abrir novas possibilidades de
aprendizagem e podem ocorrer tanto para docentes quanto para estudantes.
Os eventos de aprendizagem podem ser provocados por muitos fatores.

[…] event relates to a disturbance, a rupture of ways of under-


standing or acting which has the potential to precipitate new
modes of becoming. I am using the term events of learning to
refer to learning as a risky process of encounter with that which
lies beyond established frameworks of knowledge and whose
affects may transport us into new ontological and epistemologi-
cal territory and a reconfiguration of being (p. 92).

Segundo Atkinson, a aprendizagem é um processo de transformação que


envolve a ruptura das formas de conhecimento estabelecidas. Essa relação
entre aprendizagem e estados de incerteza é curiosa, quase contraditória. Por
um lado, a aprendizagem é frequentemente vista como um processo de
aquisição de conhecimento. Por outro lado, a aprendizagem também envolve a
experiência de estados de não-saber. Essa relação curiosa se deve ao fato de
que a aprendizagem envolve a própria essência do ser. A aprendizagem nos
leva a questionar o que sabemos e como agimos, o que pode nos levar a
experimentar estados de incerteza, mistério e encantamento.

A ruptura de formas estabelecidas de conhecimento, através de eventos de


aprendizagem, significa que os aprendizes precisam ser capazes de lidar com estados
de incerteza à medida que novas formas de saber e novas competências começam a
emergir. Isso sugere uma relação ontológica curiosa e quase contraditória da
aprendizagem com estados de não-saber e a experiência de afeto, mistério e
admiração. p. 93.
The disruption of established ways of knowing, through learning events, means that learners
need to be able to handle states of uncertainty as new ways of knowing andnew competences
begin toemerge. This suggests a rather curious almost contradictory ontological relation of
learning to states of not knowing and the experience of affect, mystery and wonder (p. 93).

Para Atkinson, a aprendizagem é um processo disruptivo e emancipador. Ao


questionar as estruturas estabelecidas, a aprendizagem abre caminho para novos
potenciais de se tornar e de coexistir no mundo.
Hipoteticamente, podemos considerar que os eventos de aprendizagem produzem a
possibilidade do que eu chamo de potenciais desobedientes. Paul Klee afirmava que a
arte não representa o visível, mas o torna visível; em certo sentido, ela perturba e é
desobediente às formas estabelecidas de ver e pensar. Savransky (Ibid, p. 166) faz
uma afirmação disruptiva similar ao dizer que 'um evento não é o que é tornado
possível, mas o que torna o possível'. Estou usando, então, a noção de desobediência
em relação a eventos que precipitam rupturas nos parâmetros estabelecidos de ser e
coexistir e expõem os aprendizes a novos potenciais de se tornar, o evento da
desobediência. (p. 94).
Speculatively, we might consider events of learning as producing the possibility for
what I call disobedient potentials. Paul Klee made the point that art does not represent
the visible, but makes visible; in a sense, it disrupts and is disobedient towards estab-
lished ways of seeing and thinking. Savransky (Ibid, p. 166) makes a similar disrup-
tive claim by stating that, ‘an event is not what is made possible but what
makes the possible’. I am using the notion of disobedience, then, in relation to
events that precipitate disruptions to established parameters of being and co-
existence and expose learners to new potentials for becoming, the event of
disobedience. (p. 94).

A força da arte, como será discutido no próximo capítulo, invoca uma força de ruptura dos
fluxos maquínicos de conexão estabelecidos. É como se essa força iniciasse pontos de ruptura.
Ao lado da noção de linhas de fuga, Deleuze e Guattari utilizam a ideia do diagrama ou da
máquina abstrata para discutir tais momentos de ruptura e de viragem para o que ainda não é
conhecido. Dito de outra forma, a força da arte ultrapassa as estrias estabelecidas da prática,
modos de ver, pensar e sentir e entra num espaço mais suave, da territorialização para a
desterritorialização para a reterritorialização. A força da arte está sempre no meio entre o
virtual e o atual. A máquina abstrata, que parece sinônimo da noção de virtual, é, portanto,
orientada para um mundo ainda não conhecido, um povo ainda por vir (alunos e professores
ainda por vir) (p. 148).

Neste capítulo, quero discutir a força da arte como uma força de invenção; um evento de vir a
ser, uma força criativa virtual/real de transformação além da captura de representação,
identidade, conhecimento estabelecido ou parâmetros estéticos estabelecidos. Essa força
transformadora consiste em uma força vital de aparecer e uma força de ruptura; uma força de
aparição que rompe com as formas de reprodução estabelecidas, uma força de
experimentação e não de julgamento; desloca relações de poder, produção e regulação. A força
da arte não pode ser capturada pela linguagem; é em excesso de tal captura. A força da arte é
uma multiplicidade virtual em excesso de formas estabelecidas e resultados da prática. A força
da arte está relacionada ao seu 'trabalho' que transforma as formas existentes de
representação e as formações estéticas (p. 156).

A força da arte para desafiar os parâmetros estabelecidos, sua desobediência para inventar
novos fluxos de afeto e modos de expressão, pode trazer novas qualidades de ser, inventar
'coordenadas mutantes' e qualidades impensáveis de ser (Ibid, pp. 126-134). . Para Guattari
(Ibid, p. 131) 'A obra de arte [...] é uma atividade de desenquadramento, de ruptura de sentido
[...] que leva a uma recriação e reinvenção do próprio sujeito'. A força da arte está, portanto,
além do conhecimento e sem critério; situa-se além do humano na medida em que é composto
de blocos de afetos e percepções que são eles próprios não-humanos. Isso quer dizer que
afetos e percepções surgem além das formas transcendentes do humano. O valor ontogenético
radical da prática artística é que ela está além da arte, fora da arte e, portanto, em alguns
casos, tem a capacidade de expandir o que significa ser humano por meio das materialidades
da prática artística, um devir pintura, devir- filme, devir-metal, devir outro, através do qual se
produzem perceptos e afetos (p. 172).

Pedagogia do Evento Dennis Atkinson Goldsmiths, Universidade de Londres

Acredito que podemos desenvolver essa linha de investigação pensando sobre o aprendizado
real que surge por meio de um evento que envolve um movimento para um estado ontológico
novo ou alterado. A aprendizagem pode, assim, ser concebida como um problema da
existência, pois envolve essa evolução ontológica. Se a aprendizagem real, como eu a chamo,
envolve uma ruptura de estados estabelecidos de conhecimento e prática pedagógica por meio
dos quais os alunos são reconhecidos, mas por meio da qual tal reconhecimento também pode
ser restritivo, então é necessária uma pedagogia compatível com tal ruptura, uma pedagogia
que chamo de uma pedagogia contra o Estado, ou talvez uma pedagogia do acontecimento,
para ampliar nossa compreensão do que é aprender e levar à possibilidade de formar novas e
mais efetivas comunidades de aprendizagem.
Para Atkinson (ano) a aprendizagem real é aquela que envolve uma mudança
ontológica, ou seja, uma mudança na forma de ser do indivíduo. Essa mudança
pode ser provocada por um evento, que é uma situação ou experiência que
tem um impacto significativo na vida do indivíduo. A aprendizagem real é um
problema da existência, pois envolve uma transformação do próprio ser do
indivíduo. A aprendizagem real é uma ruptura com os estados estabelecidos de
conhecimento e prática pedagógica. Esses estados estabelecidos podem ser
restritivos, pois limitam o potencial de aprendizagem dos indivíduos. Para que a
aprendizagem real seja possível, é necessária uma pedagogia que seja
compatível com essa ruptura. Ele chama essa pedagogia de Pedagogia contra
o Estado, ou Pedagogia do Acontecimento. Essa pedagogia deve ser capaz de
promover uma transformação ontológica nos indivíduos, permitindo-lhes
alcançar novos estados de conhecimento e ser.

Por uma nova definição da verdade* Alain Badiou


Ágora (Rio de Janeiro) v. XVIII n. 2 jul/dez 2015 169-180
Nós nos encontramos diante de problemas de escala: as verdades, como o ser, são, em
essência, infinitas, já os corpos, tal qual aparecem nos mundos, parecem
irremediavelmente marcados de finitude (p. 3).
Essa questão do retorno, eu a abordei uma primeira vez em O ser e o acontecimento
(BADIOU, 1988), sob a denominação de “teoria do forçamento”: força-se a
transformação do saber comum a partir de uma nova verdade. É uma teoria bastante
complexa, mas que, grosso modo, consiste em dizer que a verdade possui uma potência
de modificação dos saberes, conforme sua disposição no mundo (p. 4).

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