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© 2016 Carlos Pessoa

Revisão
Renata Gomide • Retextualizar

Coordenação Editorial
André Senna

Projeto Gráfico
Estúdio Bogotá

Ficha catalográfica

C672c
COELHO JÚNIOR, Carlos Pessoa.

O comprador: táticas e estratégias para alavancar o poder


de influência na negociação em compras. Belo Horizonte:
edição do autor, 2016. 2943 p.

ISBN 978-85-904077-3-6

1. Gestão de compras. 2. Compras . I. Coelho Júnior,


Carlos Pessoa. II. Título.

CDU : 658.7

Elaborada por
Stela Catarina Medeiros de Carvalho CRB 6/770
O COMPRADOR

TÁTICAS E ESTRATÉGIAS PARA


ALAVANCAR O PODER DE INFLUÊNCIA
NA NEGOCIAÇÃO EM COMPRAS

BELO HORIZONTE

CARLOS PESSOA COELHO JÚNIOR

2016
AGRADECIMENTOS
Muitas pessoas me ajudaram a materializar este livro.

A ideia foi transformar minhas experiências profissionais e pessoais numa


obra que procura contribuir para o melhor desempenho dos executivos e
gestores de compras frente aos desafios de um mercado competitivo e em
contínua transformação.

Portanto, gostaria de agradecer especialmente:

Ao Dr. Matheus Drumond Costa, que, com sua ampla experiência e vitoriosa
carreira como dirigente das unidades de suprimentos de grandes corporações,
enriquece o livro com um texto de sua autoria, e também porque, com seu
entusiasmo contagiante, envolveu-me na realização deste projeto.

À Renata Gomide (da Retextualizar), que foi a responsável pela revisão dos
textos originais.

Às dedicadas amigas Marcela Dantés, Renata Polastri e Paula Cotta (do Estúdio
Bogotá), que deram vida e beleza a esta obra.

Ao André Senna, que coordenou todo o projeto de edição e tornou possível a


existência deste livro.

Aos empresários Sérgio Pedrosa, Laércio Nogueira Júnior e Darnon Álvares de


Medeiros, e ao Prof. Adão Ladeira Martins, que endossaram os conteúdos e
recomendaram a leitura do livro.

Expresso minha especial gratidão ao empresário Kaumer Chieppe, que, além de


me honrar e engrandecer o livro com seu prefácio, é um grande incentivador da
conduta ética e dos procedimentos de compliance nos processos de negociação.

Carlos Pessoa
Em memória de meus pais, Célio e Alayde, que
me concederam o direito à vida e me acolheram
com tanto amor. Minha eterna gratidão.
09 PREFáCIO

SUMÁ-
13

17

255
APRESENTAçãO

OBJETIvO
dO LIvRO

CONSIdERAçõES
FINAIS

259 ANEXO 1

269 ANEXO 2

RIO
23 CAPíTULO 1 51 CAPíTULO 2
SUPRIMENTOS: NOvO PAPEL
QUAL O SEU dO COMPRAdOR
REAL vALOR?

57 CAPíTULO 3 71 CAPíTULO 4
CONdUTA éTICA E BLEFE NA
REPUTAçãO NEGOCIAçãO

81 CAPíTULO 5 101 CAPíTULO 6


vISãO ESTRATéGICA LOGíSTICA E
EMPRESARIAL GESTãO dA CAdEIA
dE SUPRIMENTOS

119 CAPíTULO 7
RELACIONAMENTO 149 CAPíTULO 8
COM FORNECEdORES POdER E
INFLUêNCIA

199 CAPíTULO 9
ESTRATéGIAS E 223 CAPíTULO 10
TáTICAS dE PLANEJAMENTO
NEGOCIAçãO dA NEGOCIAçãO
PREFÁCIO

Calejados pelas periódicas crises no Brasil, os


empresários sabem que não podem perder oportuni-
dades que assegurem melhores resultados para seus
negócios. Há 18 anos gerenciando a Vix Logística,
P R E FÁC I O

organização que conta com 8.000 colaboradores


e desenvolve atividades que vão do norte do País à
Argentina, tenho vivenciado todos os desafios dos
09

processos de aquisição de suprimentos e disputa de


mercado na oferta de produtos.

Surpreendido com a solicitação de prefaciar este


livro do conceituado Professor Carlos Pessoa,
tive três reações distintas. A primeira foi não ter
conseguido parar de ler o livro, tal a importância
do conteúdo e tamanha a atratividade visual da
publicação, que conseguiu quebrar a aridez do tema
– processo de compras – e provar, por si, o quanto
o conteúdo e a apresentação de um produto são
determinantes no processo de compra.
A segunda foi orientar de Minha terceira e tardia reação,
imediato que minha secretária porque julgo que deveria ser
providenciasse a compra de a primeira, foi responder ao
exemplares para que organizás- e-mail de solicitação do Prefácio
semos grupos de estudo com todo agradecendo a distinção. Mas
o pessoal de compras, porque me perdoei sinceramente pela
compartilhar este livro com os demora de algumas horas no
gestores é uma excelente oportu- agradecimento devido à atrati-
nidade para que qualquer empre- vidade da leitura e à inevitável
sa melhore seus resultados. compulsão de um empresário
que enxerga um ótimo produto e
Nesse sentido, basta citar
automaticamente toma a provi-
uma informação de Matheus
dência necessária – no caso, a
Drumond Costa, autor de um dos
aquisição de exemplares para
artigos deste valioso livro:
debater com os gestores.

Os 10 capítulos são muito inte-

P R E FÁC I O
“A maioria das
ressantes, indo do potencial de
empresas gasta, em
lucro com a atividade compras
média, o equivalente

10
à necessidade de construção de
a de 40% a 80% da
valor com os fornecedores, e do
receita bruta com a
planejamento da negociação a
aquisição de maté-
táticas para melhores resultados.
rias-primas, produtos
e serviços. Portanto, Mais do que atrativo, o livro é
pequenas reduções atualíssimo, adentrando no tema
nos custos das aqui- que se configura como o mais
sições podem reper- importante no Brasil nesta segun-
cutir de maneira da década do século XXI, a ética.
altamente positiva no
lucro da empresa”.
O livro discute os riscos e as questões relativas à
conduta para lidar com os contínuos desafios que
os profissionais de compras enfrentam no relaciona-
mento interpessoal com seus públicos relevantes.

A todos, boa leitura.

Ao autor, parabéns e obrigado pelo


compartilhamento da obra.

KAUMER CHIEPPE
Diretor Geral
Divisão Logística
GRUPO ÁGUIA BRANCA
P R E FÁC I O
11
12 P R E FÁC I O
APRESENTAÇÃO

Se você se interessou em adquirir


este livro, provavelmente, está
envolvido em algum processo de
A P R E S E NTAÇÃO

compra profissional e, talvez, até


experimentando a sensação de que
pode melhorar ainda mais o seu
desempenho. Ou, quem sabe, você
13

esteja procurando novas ideias


para aumentar sua expertise como
executivo ou gestor de compras.

Seja qual for a sua intenção, acredito que você


compartilhará comigo uma constatação que me intri-
ga há muito tempo. Nos cursos sobre estratégias de
negociação para empresários, dirigentes de empresas
e equipes profissionais de que participo há muitos
anos como instrutor ou palestrante, jamais presen-
ciei quaisquer seminários, workshops ou convenções
com foco nas atividades de compras. Esses eventos
sempre eram destinados às equipes de vendas e visavam a motivação
dos vendedores. Além disso, se abrirmos qualquer revista de negócios
para executivos, frequentemente, encontraremos artigos destinados
ao aumento da competência dos vendedores ou à melhoria da estra-
tégia competitiva das empresas. Raramente, essas revistas apresen-
tam um artigo destinado aos compradores, como se a atividade de
compras estivesse “descolada” da estratégia competitiva das empresas.

OS TÍTULOS VARIAM

• “As melhores práticas de vendas: mude a forma


de persuadir”.

A P R E S E NTAÇÃO
• “Nos negócios como na guerra: estrategistas
ensinam como lutar contra a concorrência e
ganhar o cliente”.

14
• “Fusões, alianças, aquisições, parcerias e joint-
ventures: transforme seu rival num parceiro e
aumente sua competitividade”.

• “Benchmarking, posicionamento, segmentação,


diferenciação, fidelização de clientes: ferramen-
tas estratégicas para perenizar sua empresa”.

Os títulos podem até mudar, mas a intenção é uma só: tornar o


comprador refém ou dependente do fornecedor; sem a possibilidade de
alternativas; ou totalmente fragilizado.
A realidade atual no mundo corporativo é muito clara: com gigan-
tescas contas a pagar, o foco das grandes organizações passou a ser
gerar caixa para quitar as dívidas que começavam a se manifestar
ameaçadoramente no horizonte, evidenciando que os custos deveriam
ser reduzidos. Nesse novo cenário, na maioria das empresas, a ativida-
de de compras foi elevada a um nível de importância estratégica, tendo
em vista sua importância para a perenidade das organizações.

Se isso tudo é procedente,


por que a atividade de compras
ainda não conseguiu alcançar
o mesmo “prestígio” e reconhe-
cimento de outras atividades
funcionais na empresa?
A P R E S E NTAÇÃO

Imagino que, para entender melhor essa “discriminação”, talvez, fosse


útil nos remeter a um passado não muito distante, em que as diver-
15

sas funções nas empresas eram denominadas como atividades “fim”


e atividades “meio”. As atividades “fim” eram chamadas de “geradoras
de recursos ou de caixa”, como as funções relativas à produção, às
finanças e às vendas (somente essas). As demais funções exercidas na
organização, como as realizadas nos setores de logística, compras,
jurídico, recursos humanos, contabilidade, auditoria, segurança/
serviços gerais, engenharia, etc., eram consideradas “meio”, isto é,
“overhead” ou “gerador de custos”.

Principalmente em relação à função de “compras”, essa imagem –


embora improcedente – era merecida, pois, em uma empresa padrão
no mercado, essa função era a que “gastava” mais dinheiro do que
todas as outras funções somadas. E, tendo em vista sua reduzida
transparência, tornava ainda mais opaca sua reputação ou notorie-
dade. Por isso, não faz muito tempo, havia muito poucas chances de
questões sobre compras entrarem na agenda do management estraté-
gico das empresas.

Todavia, a abordagem moderna corporativa revela que não existem


mais as chamadas atividades “fim” e “meio” nas organizações, e preco-
niza que todas elas, agora, são “meio”, e que o negócio da empresa é
que é o “fim”.

Nessa perspectiva, todas as funções na empresa são igualmente impor-


tantes, de modo que não faz sentido uma determinada função ter
mais prestígio ou importância que outra.

Assim, as questões relativas a compras e à cadeia de suprimentos


lideram (e continuarão a liderar) a lista de questões a serem discu-
tidas por equipes de dirigentes e gestores, ajudando a redirecionar

A P R E S E NTAÇÃO
uma função há muito negligenciada e que, agora, começa a fazer uma
enorme diferença nos resultados da empresa.

16
A atividade de compras mudou.
Existe uma nova ordem nos proces-
sos. Não adianta mudar as pessoas e
utilizar os mesmos processos anti-
gos e superados, nem utilizar novos
processos, mas insistir em continu-
ar realizando as tarefas de compras
repetindo o mesmo procedimento
anterior. Processos e pessoas defa-
sados entre si são incompatíveis!
OBJETIVO DO LIVRO

O objetivo deste livro é oferecer


O BJ E TIVO D O LIVRO

algumas ideias que levem o leitor


a refletir sobre o processo da
atividade profissional de compras,
convidando-o a nos acompanhar
no caminho que busca desvendar
17

os fatores-chave de sucesso dessa


função tão importante e estratégi-
ca para as organizações.

Todos nós temos estereótipos. Minha imagem estereo-


típica de um executivo ou gestor de compras é a de um
mestre em negociação e gestão estratégica: alguém
que tenha desenvolvido suas habilidades negociando,
de um lado, com fornecedores astutos, de outro, com
as pessoas responsáveis pelas finanças na empresa, de
outro ainda, com os representantes da engenharia,
e, no dia a dia, com os exigentes usuários internos de sua própria
organização; alguém também que seja competente no relacionamento
interpessoal e que seja acostumado a assumir riscos e a desempenhar
junto aos seus diversos públicos relevantes um papel duplo do “aten-
der” (representado pela solução para as demandas dos seus clientes
“internos”) e do “educar” (representado pela orientação sobre as
melhores alternativas de solução).

Nos últimos 35 anos, paralelamente à atividade executiva como


dirigente de empresas, e, a partir de minha própria experiência profis-
sional, me especializei em negociação e gestão estratégica. Realizo,
também, com frequência, consultorias a empresas e empresários, com
os quais obtenho um aprendizado sempre contínuo. São exatamente
essas ideias que tenho o propósito de compartilhar com todos vocês,
objetivando ajudá-los a consolidar a sobrevivência competitiva das

O BJ E TIVO D O LIVRO
organizações de que participam.

Para tornar a leitura mais atraente, o texto será apresentado em


forma de diálogo entre um trainee recém-admitido em uma empresa
na função de comprador e um profissional sênior (ex-gerente de

18
compras), que, atuando com o papel de um “mentor”, orientará seu
trainee para as atividades de suprimentos.

O livro está estruturado em 10 capítulos interligados entre si, mas


cada um com seu foco específico. O que se busca é estimular os respon-
sáveis pelas compras nas unidades de suprimentos das organizações
não só para a adoção do processo de “desaprender” velhos hábitos,
mas, principalmente, para o aprendizado dos efeitos dos novos movi-
mentos estratégicos empresariais, que proporcionarão novas respostas
aos verdadeiros problemas e oportunidades que emergem da realidade.
01
O primeiro capítulo confirma o
potencial de lucro que a atividade de
“compras” pode proporcionar às empre-
sas, e a importância estratégica que a
unidade de suprimentos representa hoje
(e cada vez mais) nas organizações.

02
O segundo capítulo apresenta uma
proposta para um novo posicionamen-
to – seja do gestor ou do executivo de
compras – que favoreça a exploração da
O BJ E TIVO D O LIVRO

totalidade de seu potencial estratégico


e que possa permitir a mudança do seu
papel de andar somente na “garupa”
(“dowstream”), tornando-se o prota-
19

gonista das decisões estratégicas da


empresa no “upstream”.

03
O terceiro capítulo aborda a importân-
cia da reputação, bem como os riscos e
as questões relativas à conduta ética
para lidar com os contínuos desafios
que os profissionais de compras enfren-
tam no relacionamento interpessoal
com seus públicos relevantes.
04
O quarto capítulo disseca a diferença
entre os aspectos relativos à “forma”
e à “essência” do blefe, e os cuidados
que devem ser observados na aplicação
desse procedimento durante o processo
da negociação.

05
O quinto capítulo mostra a visão
estratégica das organizações, posicio-
nando a unidade de suprimentos (e
o processo de compras) no contexto

O BJ E TIVO D O LIVRO
global da empresa, e alinhando as
estratégias de suprimentos às estraté-
gias globais corporativas.

20
06
O sexto capítulo expõe os aspectos
relativos à logística e à cadeia de
suprimentos, reforçando a ideia de que
a amplitude das decisões empresariais
está além de suas próprias fronteiras,
isto é, as fontes de suprimentos não
podem mais se restringir geografica-
mente apenas aos “quintais” dos arredo-
res ou da vizinhança das organizações.
07
O sétimo capítulo aborda o relaciona-
mento com os fornecedores, a relação
custo/benefício da base “single” ou
“multi-sourcing” das fontes de forne-
cimento, as diversas alternativas da
“Matriz Estratégica de Compras” (Kraljic
Portfolio Purchasing Model) e as possi-
bilidades de construir “valor” com as
empresas fornecedoras (value sourcing).

08
O oitavo capítulo descreve os princí-
pios e as fontes de poder (genéricas e
O BJ E TIVO D O LIVRO

exclusivas) que comumente são utiliza-


dos durante o processo da negociação, e
que, dependendo da influência dessas
forças, podem alterar os resultados
21

do acordo.

09
O nono capítulo examina as estraté-
gias aplicadas pelos fornecedores e a
contrapartida que pode ser utilizada
pelos compradores, inclusive, através
do emprego de abordagens mais efetivas
e complementares. Descreve também as
táticas de negociação que poderão ser
utilizadas para o alcance dos melhores
resultados para as metas pretendidas.
10
O décimo capítulo trata sobre o plane-
jamento da negociação, ou seja, como se
preparar adequadamente para desen-
volver negociações organizadas, mais
conscientes e melhor estruturadas.

Apenas para nivelar sua expectativa, caro leitor, este livro


apresenta opiniões, pontos de vista, fatos reais, conceitos
e casos, mostra caminhos, indica alternativas e descre-
ve experiências pessoais, mas não oferece uma solução

O BJ E TIVO D O LIVRO
estratégica específica para a perenidade e o posicionamento
competitivo de sua empresa, afinal, esta constitui a parte
criativa do negócio!

22
Boa leitura!

Carlos Pessoa
01
SUPRIMENTOS:
QUAL SEU REAL
VALOR?
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?
CA P Í TU LO 1
24
João Pedro está ultrarradiante. Acaba de ser infor-
mado que foi aprovado e que será contratado como
trainee em uma renomada organização multina-
cional. Ao receber a notícia através da Gerente de
Recursos Humanos, uma enorme alegria manifestou-
se na alma de João Pedro, porque essa oportunidade
representava a realização do maior sonho da sua
vida: trabalhar e construir uma carreira bem-sucedi-
da em uma grande empresa.

João Pedro foi nomeado para trabalhar na Superin-


tendência de Suprimentos como trainee de compras.
Após um período de adaptação pareciam prestigiar a atividade de
trabalhando nessa função, um suprimentos, e os fornecedores
“mentor” (consultor sênior, – esses, então – comportavam-
ex-gerente de compras da própria se com verdadeira cortesia e
empresa) foi designado para amabilidade, sempre dispostos a
acompanhá-lo durante um perí- atender prontamente qualquer
odo de tempo, orientando-o em necessidade que surgisse.
suas tarefas do dia a dia.
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

Entretanto, o que ele não conse-


Hoje, João Pedro reconhece guia compreender claramente
que, na ocasião, não poderia era a conduta de alguns colegas
nem em sonho imaginar quão de outras unidades da empresa
valiosa foi a contribuição desse (como finanças, produção, manu-
“mentor” para sua formação e tenção e engenharia de produto)
crescimento profissional. Para que demonstravam uma inflexibi-
se preparar melhor, ele parti- lidade, muitas vezes, inexplicável
CA P Í TU LO 1

cipou de um curso de dois dias para adotar determinadas opções


de estratégia de negociação, no mais atraentes apresentadas pela
qual obteve os primeiros ensina- área de compras para solucionar
25

mentos sobre como conduzir um um específico tipo de problema,


processo de compras eficiente. além de apresentar outros
A partir desse momento, sentiu- comportamentos claramente
se seguro para conduzir suas contraditórios.
atividades profissionais com o
desempenho desejado.

João Pedro começou a vivenciar


uma grande e agradável surpre-
sa no desempenho dessa nova
função de compras técnicas: seus
colegas de equipe eram colabo-
rativos, os dirigentes da empresa
ExEMPLOS
Certa vez, João Pedro foi pressionado a adquirir de
imediato determinada peça sobressalente, o que o
obrigou a consultar o mercado fornecedor e comprar
emergencialmente, pagando um preço mais elevado por

S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?


aquele item por conta da urgência da entrega. Entre-
tanto, um mês depois, visitando a área requisitante, ele
constatou que a peça sobressalente ainda se encon-
trava em estoque, sem utilização. Ele, então, pensou:
“Se eles já sabiam que não iriam utilizar a peça sobres-
salente de imediato, porque solicitaram urgência na sua
compra, provocando, com isso, um resultado lesivo aos
interesses da empresa?”

CA P Í TU LO 1
De outra vez, um fornecedor o contatou perguntan-
do se ele já havia recebido a Ordem de Compra (OC) da
Gerência de Manutenção requisitando uma determina-

26
da peça. Ao responder que ainda não havia recebido a
OC, o representante de vendas do fornecedor o “tran-
quilizou”, afirmando que ele já tinha a peça disponível
para entrega. Dois dias depois, João Pedro recebeu a OC
especificando a peça e indicando aquele fornecedor
como o único em condições de atender às necessidades
“técnicas” da Gerência de Manutenção.

Ao questionar o requisitante daquela peça, contes-


tando sua ingerência e informando que ele teria que
apresentar mais dois outros fornecedores para que
pudesse desenvolver o processo de compras de forma
adequada e obter um preço justo, João Pedro foi
surpreendido com a declaração taxativa do seu colega
da manutenção:

“Se você atrasar a compra por causa da sua burocracia


ou não adquirir a peça do fornecedor que recomendamos
(qualquer que seja o preço), a ‘manutenção’ não poderá
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

atender às necessidades de reparo dos equipamentos


e, se ocorrer qualquer parada na linha de produção,
prepare-se para arranjar as justificativas para o Diretor
Industrial, porque a culpa será toda sua!”

João Pedro pensou na hora:

“Se Sou refém do forne-


CA P Í TU LO 1

cedor que eleS indicam,


Sem chance de negociar
27

o preço, qual é exata-


mente o meu papel como
comprador?”

Em outra oportunidade, João Pedro foi procurado


pelo Gerente Administrativo da empresa que solicitou
sua colaboração para reduzir o custo operacional
da cozinha industrial através da redução do preço
dos principais insumos utilizados na confecção dos
alimentos, sendo que as carnes representavam o maior
índice de preços altos. Tentando atender a essa solici-
tação, ele contatou os frigoríficos responsáveis pelo
fornecimento das carnes e, pressionando-os de forma
insistente, conseguiu reduzir os preços desses produ-
tos sem oferecer qualquer contrapartida.

O gestor administrativo ficou muito feliz e agradecido

S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?


com a redução dos preços. Mas, algum tempo depois,
João Pedro foi procurado pelo mesmo gestor acompa-
nhado da nutricionista da empresa, que afirmou estar
tendo um grande transtorno com o fornecimento das
carnes, uma vez que o fornecedor as entregava com
diversos prazos de validade, o que a levava a mudar
constantemente as receitas já aprovadas pela Diretoria
de RH da empresa.

CA P Í TU LO 1
Ao contatar o fornecedor para verificar a possi-
bilidade de entregar as carnes com igual prazo de

28
validade (o mais longo possível), João Pedro ouviu a
seguinte resposta:

“Bem, você insistiu em reduzir o preço e assim o fizemos,


mas, para isso, é necessário que nosso fornecimento
contemple datas diferentes de prazo de validade, para
que possamos rentabilizar nosso estoque. Caso contrário,
teremos que voltar ao preço anterior. Você decide!”

João Pedro refletiu e chegou à conclusão que, de fato,


o fornecedor tinha razão.
Ele pensou:

“temoS que optar por


uma ou por outra alter-
nativa. Sem qualquer
contrapartida,
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

não adianta Só preS-


Sionar para Ser o
único ganhador na
negociação!”
CA P Í TU LO 1

Foi exatamente nesse momento que gostaria de saber a opinião


29

que João Pedro foi apresentado a do mentor se ele estava fazendo a


seu “mentor”, que, após os cumpri- escolha certa ao decidir traba-
mentos iniciais, o parabenizou lhar na unidade de suprimentos
e solicitou que ele relatasse um da empresa como trainee de
pouco sobre sua vida pessoal e compras. Na verdade, o que João
suas experiências profissionais. Pedro gostaria de saber mesmo
Por fim, disse que gostaria de era qual a real importância que a
conhecer um pouco mais a respei- atividade de compras representa-
to de suas expectativas em rela- va nas organizações, para confir-
ção ao seu futuro na empresa. mar se a escolha dele havia sido
acertada. Assim, sua indagação
João Pedro respondeu que aquele
para o mentor foi muito direta:
emprego representava a realiza-
“No seu entendimento, o senhor
ção de um sonho já antigo, mas
acha que a atividade de compras é apresenta as razões pelas quais
realmente importante ou estraté- a atividade de compras tem uma
gica para nossa empresa?” enorme importância (principal-
mente estratégica); e a segunda
O mentor respondeu: “Eu não
mostra o potencial de lucro que
tenho a menor dúvida disso, e vou
a unidade de suprimentos pode
justificar meu ponto de vista para
proporcionar às empresas.”
você fazendo uma análise segun-

S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?


do duas abordagens: a primeira

1 a a importância eStratégica
da atividade de compraS

A aquisição de materiais e contratação de serviços representa, na


generalidade dos negócios, mais de 50% dos custos totais das empre-

CA P Í TU LO 1
sas. Assim, o potencial de lucro associado a uma gestão eficiente das
atividades de compras é muito significativo e, à medida que os mate-

30
riais e os mercados vão se tornando mais complexos, a atividade de
compras tende a tornar-se cada vez mais estratégica.

COMPRAS COMO
PORCENTAGEM DOS
CUSTOS TOTAIS 78%
70% 65%
FONTE C A P S R E S E A RC H

CONSTR UÇÃO
C IVI L

I N D ÚSTR IA
QUÍMICA

FA B R ICAÇÃO DE
COMPUTA D O R ES
CUSTOS
+ LUCRO
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

PREÇO
CA P Í TU LO 1

Além disso, num passado não


muito distante, as empresas
31

apuravam seus custos, coloca-


vam a margem de lucro desejada
sobre eles e chegavam ao preço de
venda de seus produtos ou servi-
ços. E o mercado pagava!
LUCRO
- P RE Ç O

S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?


CUSTOS
CA P Í TU LO 1
Entretanto, já há algum tempo, só melhor, mas com respeito ao
a realidade dos negócios mudou cliente) durante todas as fases do

32
drasticamente: o preço agora é a processo. O lucro – sob a forma
variável dominante determinada de dinheiro ou de desenvolvimen-
pelo mercado, que passou a ditar to econômico e social – passou a
as regras, uma vez que a competi- ser uma variável dependente.
ção aumentou significativamente
No entanto, os acionistas e
em todos os setores.
investidores disseram que era
Mas não foi somente a ordem inaceitável o lucro ser a variável
dos fatores que mudou. Entra- dependente, e passaram a exigir
ram novas variáveis que apenas dos gestores uma ação segundo
as empresas especiais cuidavam: uma fórmula, em que o desafio
o preço com qualidade intrín- seria cuidar da competitividade,
seca e o bom atendimento (não oferecendo produtos e serviços
com qualidade intrínseca, direito de quem investe e dever
melhor preço e bom atendimen- de quem administra –, os custos
to, e, ao mesmo tempo, garantir terão que ser reduzidos também.
a rentabilidade/lucratividade,
Estamos aprendendo na pele e no
gerando resultados para o inves-
bolso que, agora, o custo é que é
tidor, o acionista e todos aqueles
a variável dependente e, com isso,
definidos como clientes dos
a atividade de compras posicio-
resultados (públicos relevantes,
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

na-se no centro das decisões


como a sociedade, os colaborado-
estratégicas das empresas.
res e os parceiros). Isso significa
que, para fechar a equação em
que os preços vêm sendo relativa-
mente reduzidos em relação aos
preços do passado – porque são
ditados por um mercado cada vez
mais competitivo e o lucro é uma
CA P Í TU LO 1

parcela permanente, pois é um


33

2 a potencial de lucroS atravéS


daS compraS ( “doWnStream” )

Nenhuma outra função na empresa ou decisão gerencial da alta


administração proporciona tanta possibilidade de redução nos custos
do que a atividade de compras. O aumento da lucratividade pode ser
alcançado mais facilmente através das ações estratégicas de compras
do que por qualquer outro movimento estratégico que a empresa
pretenda realizar.

Apenas para ilustrar, observe, sob óticas diferentes, duas situações


relativas à demonstração de resultados de uma empresa qualquer.
SITUAÇÃO 1

RECEITAS x CUSTOS

aume nta nd o aS reduZin d o aS


e xe mplo ve ndaS e m 5 0% compraS em 5%

S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?


ite m

va lo r % va lo r % valor %

receitaS 1.0 0 0.0 0 0 10 0 1.50 0.0 0 0 100 1.000.000 100

cuStoS 90 0.0 0 0 90 1.3 50.0 0 0 90 85 0.000 85

total 10 0.0 0 0 10 150.000 10 150.000 15

CA P Í TU LO 1
DUAS OPÇõES PODEM
SER ADOTADAS:
34
• A primeira (muito difícil de executar, quase inviável) consi-
dera a possibilidade de aumentar as vendas (receitas) em 50%,
mantendo-se a mesma estrutura de custos com compras (90%
das receitas) e, com isso, alcançar o aumento de 50% nos
resultados;

• A segunda (difícil também, porém viável) compreende a alter-


nativa de reduzir as compras em 5%, mas mantendo-se o mesmo
nível de vendas (receitas) anterior. O resultado também será
aumentado em 50%.
SITUAÇÃO 2

UMA OUTRA PERSPECTIVA

i te m valor

1.000.000
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

v e ndaS tota i S

m ate r i a i S e Se rvi çoS 600.000


Sa l Á r i oS 200.000
cuSto f i xo 100.000
100.000
CA P Í TU LO 1

luc ro
35

OPÇõES PARA AUMENTAR


O LUCRO EM 50%

• Aumentar a receita de vendas em 50%, mas


mantendo-se os mesmos custos (!?);

• Reduzir os salários de todos os empregados


em 25% (!?);

• Eliminar as despesas fixas em 50%(!?);

• Reduzir os custos de compras em 8,3%.


Analisando a demonstração de resultados de uma empresa sob outra
perspectiva, ainda com o objetivo de aumentar o resultado em 50%,
poderemos considerar outras possibilidades a serem adotadas.

Comparando-se todas essas alternativas, a redução do custo de


compras em 8,3% parece ser a opção mais exequível e realista, embora
não signifique que seja fácil de ser realizada na prática.

Entretanto, o mentor alertou:

S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?


“todo eSSe potencial de lucroS
atravéS da atividade de compraS
pode Ser deSperdiçado Se oS
profiSSionaiS reSponSÁveiS
peloS SuprimentoS daS empreSaS

CA P Í TU LO 1
continuarem a proceder naS
negociaçõeS de compra com

36
uma viSão limitada e puramente
proceSSual, Sem oBServar outraS
variÁveiS eStratégicaS.”

Até então, João Pedro havia entendido toda a argumentação do


mentor, mas sua última declaração o deixou confuso e ele não conse-
guiu segurar sua curiosidade, perguntando: “Mas, o que o senhor quer
exatamente dizer com isso?”

O mentor coçou a cabeça e, apresentando uma expressão facial leve-


mente maliciosa, perguntou: “Como você desempenha seu ‘papel’ de
comprador na empresa? Adquirindo os produtos (ou serviços) especi-
ficados, na qualidade e quantidade indicadas, com o prazo de entrega
adequado e pelo menor preço possível?”

João Pedro respondeu: “Sim, esse é o meu papel como comprador!”

O mentor continuou com as perguntas:

“E, como você consegue alcançar seus resultados? Com a requisição em


mãos (a ordem de compra), você contata, no mínimo, três fornecedores
pré-qualificados e, jogando uns contra os outros, negocia usando as
seguintes táticas de negociação para fortalecer sua posição:

• fica evaSivo, não informando


realmente o que você deSeJa;

• acena com a concorrência,


declarando que tem alternati-
vaS melhoreS de outroS produ-
toS ou fornecedoreS;

• alega reStrição orçamentÁria,


declarando que Seu orçamento
eStÁ muito aBaixo do preço que
eleS eStão ofertando e que não
“É assim que você age?”, ele
perguntou com ar de censura.

A resposta de João Pedro foi


automática, embora cautelosa:
“Claro, é assim mesmo que me
comporto para conseguir os
melhores resultados.”

quer Se endividar;

• provoca oS fornecedoreS,
SinaliZando com a poSSiBilidade
de negócioS futuroS;

• faZ uSo do tempo e adia a deci-


São para ‘eStudar melhor’;

• preSSiona, afirmando que oS


fornecedoreS têm que reduZir
o preço!”
Os comentários apresentados a me explicar com clareza quais são
seguir pelo mentor foram devas- as razões de seus comentários?”
tadores e causaram uma profun-
O mentor, então, respondeu:
da decepção em João Pedro em
“Desculpe-me se fui muito prag-
relação ao seu desempenho:
mático, mas quero deixar claro
“Desculpe-me, meu caro João que entendo perfeitamente que
Pedro, mas, se você utiliza somente esse comportamento profissio-
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

esses argumentos (que representa nal dos compradores pode até


um ‘procedimento padrão’), você é estar em conformidade com os
um: ‘COMPRADORSSAURO’!” procedimentos de auditoria das
demonstrações financeiras: quan-
Era insuportável para João Pedro
do uma empresa é auditada, ela
ser considerado um “compra-
é avaliada, entre outros aspectos,
dorssauro”, tendo em vista
pelos seus processos e controles
que aquele procedimento era
internos. Mais do que isso, no caso
frequentemente observado em
CA P Í TU LO 1

específico de compras, deve haver


todas as unidades de compras
procedimentos padronizados das
que ele conhecia, realizado,
atividades a serem exercidas no
inclusive, por outros colegas da
39

setor, bem como a execução fiel


equipe na própria empresa em
deles. Por isso, se algum controle-
que trabalhava. Assim, ele não
chave (que impacte as contas de
conseguia entender por que o
resultado da empresa) for falho,
mentor depreciava tanto aquela
pode até gerar uma ressalva no
forma de conduta.
parecer emitido pela auditoria
Ele queria entender o que estava
externa. Dessa forma, as empresas,
por trás daquela declaração
e nesse caso específico, o setor
e perguntou: “Sua declaração
de compras, devem seguir os
me causou um grande espanto,
procedimentos exatamente como
mal-estar e um profundo senti-
descrito nos manuais do setor.
mento de culpa. Minha autoesti-
Entretanto, o que quero ressaltar
ma está no chão. O senhor poderia
é que a utilização apenas desse
procedimento padrão pelos execu- exemplo, colocar o foco exclusiva-
tivos de compras para alcançar os mente no preço (e não no ‘custo
melhores resultados na negocia- total de propriedade’) e inibir a

COMPRA
ção coloca o processo acima do criatividade, limitando a visão
resultado e pode provocar alguns estratégica do real papel da unida-
efeitos nocivos e colaterais às suas de de suprimentos no sucesso do
próprias organizações, como, por empreendimento.”

DORS-
SAURO!
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

1° efeito
foco apenaS no preço

(E NÃO NO “CUSTO TOTAL DE


PROPRIEDADE”)
CA P Í TU LO 1

O mentor, então, continuou com suas explanações:


“À medida que os esforços de redução dos custos
intensificam-se para que as empresas se tornem
41

bem-sucedidas em relação às competições local e


global, a atenção dos compradores fica concentrada
principalmente em baixar os preços e comprar o que
for necessário com o menor gasto possível. Entretanto,
é importante questionar se o negócio de menor preço
realmente reduz o custo total de aquisição.

Apenas para ilustrar, veja a notícia publicada no


jornal O Estado de S. Paulo, em 15 de janeiro de 2007:
PNEU FURADO ATRASA
SAÍDA DA FORÇA
PO L ICIAIS DEIXARAM BRAS Í L I A
4 HO RAS MAIS TAR DE POR CAUSA

S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?


DO P ROBLEMA
VANILDO MENDES
BRASÍLIA

Um enorme contratempo obrigatórios danificados,


marcou a saída, ontem, das duas irregularidades puni-
tropas da Força Nacio- das pelo Código de Trânsito.

CA P Í TU LO 1
nal de Segurança Pública Faltava até macaco.
destacadas para combater
facções criminosas que
CA M I NH ÃO

42
comandam ataques no Rio
desde dezembro. Alugado de
DE M U DA NÇ A
última hora para transpor-
CA R R EGA DO
tar armas e equipamentos,
COM AR M AS
um caminhão de mudança
N ÃO TI NH A
teve dois pneus furados
M ACACO
a caminho da Base Aérea
de Brasília e a partida dos O tropeço irritou o coronel
policiais atrasou por mais Aurélio Ferreira, coman-
de quatro horas. dante da força. “É um
absurdo um problema desse
O veículo estava com pneus
prejudicar nossa missão.”
carecas e equipamentos
Ele destacou um grupo rodovias da divisa do Rio
tático, armado de fuzis com Estados vizinhos, onde
e em posição de combate, vão combater o tráfico de
para proteger o caminhão, drogas e de armas.
enquanto outro descarre-
Outras equipes continu-
gava os equipamentos na
arão seguindo para o Rio
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

Base Aérea para retornar e


nas próximas semanas, até
resgatar a carga.
atingir um total de 6 mil
A operação, num domingo policiais destacados para
chuvoso, chamou a atenção a segurança dos jogos
de motoristas que passavam Pan-Americanos, em junho.
pela Avenida L-2 Sul. O inci- A segunda equipe, com
dente ocorreu no meio do 300 policiais, retardada
percurso de 20 quilômetros pelo incidente dos pneus,
CA P Í TU LO 1

entre a Academia Nacional embarcou em dois aviões


da Polícia Federal, na saída Hércules, da Força Aérea
43

norte de Brasília, onde Brasileira, com pouso


estavam concentrados os previsto para o aeroporto
policiais, vindos de vários do Campo dos Afonsos, no
estados, e o aeroporto. Realengo. Solicitada pelo
governador Sérgio Cabral
Seguiram para o Rio 500
(PMDB), a força deve ficar
policiais em duas turmas. A
no Rio até agosto.
primeira, com 200 homens,
saiu de madrugada e seguiu
por terra, em 52 veícu-
los. Eles já foram para
os pontos das principais
O texto apresenta detalhes críticos ocorridos com a contratação de
um veículo de carga destinado a transportar todo o armamento e
munição para a tropa da Força Nacional de Segurança Pública, desta-
cada para combater o crime das facções criminosas do Rio de Janeiro.
Para a contratação desse veículo, é de se supor que um procedimento
padrão foi realizado: receberam-se as propostas de três fornecedores
(no mínimo) pré-qualificados e optou-se por aquele que apresentou o
preço mais baixo. Qual foi o resultado? Um desastre! O veículo estava

S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?


com os pneus ‘carecas’, não tinha macaco e ainda estava com os equipa-
mentos obrigatórios danificados.

Esse é o grande efeito nocivo de se focar apenas no preço e não no


“Custo Total de Propriedade” ou “Total Cost of Ownership” (TCO).
Em outras palavras, o que, de fato, interessa é o custo ‘vitalício’ de
propriedade e, não apenas, o custo inicial de aquisição.

O mentor, então, deu outro exemplo: “Certa vez, observei um cartaz no

CA P Í TU LO 1
vidro traseiro de um carro moderno e importado que alertava:

‘goStou do carro? eSpera Só

44
para ver o cuSto da primeira
manutenção!’.

Ou seja, você adquire um bem, mas esquece de considerar os custos futu-


ros de propriedade desse bem.”

Como consumidores, entendemos implicitamente esse conceito: a maioria


de nós um dia se arrependeu de ter comprado um aparelho eletrodo-
méstico sem marca porque era 20% mais barato do que outro similar de
marca conhecida – a chamada ‘falsa economia’ – apenas para constatar
que o produto mais barato quebra com facilidade ou precisa ser substi-
tuído com uma frequência duas vezes maior do que o do concorrente.
Qualquer um que tenha comprado algum dia um automóvel mais sofisti-
cado sabe que uma simples troca de óleo é feita a um preço exorbitante e
que cada pneu novo vale uma pequena fortuna.

e o que é ‘cuSto total de


propriedade’?
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

Um dos conceitos fundamentais que suportam o posicionamento


proativo das atividades da unidade de suprimentos de uma empresa é
o Custo Total de Propriedade, que envolve todos os itens que podem
gerar problemas para o cliente a partir da compra de um bem ou da
contratação de um serviço. Essa abordagem busca discriminar todos
os custos associados à aquisição, posse, utilização e “desuso” de um
bem ou serviço, de forma que as decisões da unidade de suprimentos
CA P Í TU LO 1

sejam as melhores possíveis para a empresa.

É o valor da compra que inclui outras dimensões de longo prazo, como


o custo de disponibilidade e de serviços, a confiabilidade e o prazo de
45

entrega. E inclui, ainda, outras variáveis, como a qualidade, o serviço


pós-venda, a durabilidade, o rendimento, os estoques, a garantia, entre
outros.

Os profissionais de compra há muito consideram a qualidade do bem


ou do serviço a adquirir no momento de tomar uma decisão, e mesmo
o mais míope dos departamentos de compras reconhece a durabilidade
de um determinado produto e que isso é um ponto-chave em seu custo
vitalício, mas é apenas um entre muitos fatores.
Alguns equipamentos, por exemplo, exigem maiores
custos de manutenção e reparos do que outros, e isso,
certamente, tem um impacto no custo de propriedade.
Há também outros fatores, mais sutis ou ocultos, que
afetam a equação dos custos totais:

• Alguns equipamentos poderão necessitar de um

S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?


menor número de horas de trabalho do operador ou,
talvez, precisem de operadores menos especializados e,
portanto, mais baratos, e isso também deve ser levado
em consideração no cálculo de custos;

• Um item defeituoso, depois de montado, poderá


danificar todo o conjunto, e isso pode levar a um
custo adicional de desmontagem e substituição, ou, em

CA P Í TU LO 1
alguns casos, ao descarte do produto inteiro, além da
perda de produtividade.

Custos ocultos como esses são encontrados de várias

46
outras formas: entregas erráticas provocam um
excesso de estoque de segurança, ingredientes de baixo
rendimento exigem que uma maior quantidade de
produto ou de outros ingredientes seja usada, exigên-
cias de grandes pedidos podem resultar em custos
adicionais de estocagem, e assim por diante.
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

2° efeito
foco apenaS no proceSSo

(O QUE LIMITA A CRIATIVIDADE


E A VISÃO ESTRATÉGICA)
CA P Í TU LO 1

O mentor continuou: “Seguir apenas uma operação


processual, mesmo sendo necessária, pode impedir
a visão estratégica da situação. Por exemplo: se a
47

empresa mantém um contrato de longo prazo com


algum fornecedor, é muito confortável para o compra-
dor requisitar produtos ou serviços a esse fornecedor
e pagar de acordo com o estabelecido no contrato. Ele
estará agindo corretamente e rigorosamente de acordo
com o processo. Entretanto, os mercados são voláteis.

Em determinados momentos, os preços e as condições


de aquisição podem estar mais vantajosos para os
compradores (do que os estabelecidos no contrato de
longo prazo) e, em outros momentos, favoráveis aos
fornecedores, mas seguir o processo e tentar fazer
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?
GASTOS

CA P Í TU LO 1
48
cumprir as letras do contrato
nessas situações de exceção pode
G AN HO S

apresentar resultados lesivos


a uma das partes e, com isso,
inviabilizar a continuidade do
compromisso.”
“Caro trainee”, disse o mentor, obrigação de quem administra.
“estou me referindo às consequên- Mas preste atenção: lucro não é a
cias desses tipos de procedimento única finalidade da empresa, é sua
padrão em compras com o objeti- justificativa ética.
vo de alertá-lo sobre os erros que
A finalidade da empresa é
podem ser cometidos numa ativi-
aumentar o seu ‘valor’ (para seus
dade que representa (e isso será
públicos relevantes: acionistas,
cada vez mais evidente) um dos
S U P R I M E NTO S : Q UAL S E U R EAL VALOR?

comunidade, colaboradores etc.), e


mais importantes fatores-chave de
o dinheiro é a métrica que revela
sucesso das organizações. Lembre-
se a empresa está aplicando seu
se sempre de que uma organi-
talento para incorporar valor aos
zação (qualquer uma) tem como
recursos que utiliza.
papel fundamental transformar
certos investimentos e gastos com
recursos (como talentos, proces-
portanto, o
CA P Í TU LO 1

sos, tecnologias etc.) em ganhos


(resultados) de maior valor.
aumento do
Portanto, qualquer organização só Seu valor é
49

tem direito de existir se conseguir


a finalidade
ganhar mais do que gasta.
da empreSa.
No entanto, ter perenidade não é
assim tão simples, pois a maio-
dinheiro é a
ria das organizações que existiu Sua métrica.”
um dia não existe mais. Por isso
é que, pensando eticamente, a
primeira responsabilidade social
de qualquer empresa consiste em
ser bem-sucedida como empre-
sa. Isso significa que é a hora e a
vez de resgatar o lucro como um
direito de quem investe e uma
02 NOVO PAPEL
DO COMPRADOR
O trainee estava inconsolável
e, dando vazão à sua ansiedade,
perguntou ao mentor: “Mas a forma
que os profissionais de compra têm
atuado está completamente errada?”

N OVO PA P E L D O COM P R AD OR
E o mentor respondeu: “Na verdade,
ela pode ser aperfeiçoada. Veja como:

De uma maneira geral, o comprador


inicia sua tarefa de aquisição dos
produtos ou contratação dos serviços

CA P Í TU LO 2
solicitados a partir, por exemplo, de
uma “Ordem de Compra” recebida.

52
Mas, com esse procedimento, o comprador atuará somente no ‘dowstream’
do processo de compras, condicionado a uma margem mínima de manobra,
e terá uma influência irrelevante (não mais que 10%) sobre todo o ciclo da
demanda, conforme mostra o Gráfico 1:

CUSTO DA
DECISÃO
100%
90%

75%
N OVO PA P E L D O COM P R AD OR

CONCEPÇÃO PROJETO AQUISIÇÃO


(10% DO PROCESSO) TEMPO
CA P Í TU LO 2

UPSTREAM dOWNSTREAM
53

Entretanto, para alcançar um novo Mas o reconhecimento desse valor


posicionamento que favoreça a estratégico da função somente
exploração da totalidade de seu será perfeitamente assimilado
potencial estratégico e que possa pelos colegas das outras unidades
permitir a mudança do seu papel de negócios da empresa (produ-
de andar somente na ‘garupa’ ção, manutenção, projetos, finan-
(dowstream), tornando-se o prota- ças, logística, etc.) se, e somente se,
gonista das decisões estratégicas o profissional de compras conse-
da empresa, a unidade suprimen- guir ser percebido e respeitado
tos deverá, cada vez mais, intervir como um ‘consultor’ por todos os
no ‘upstream’ dos negócios da representantes dessas unidades.
organização. Isso significa mudar o papel do
executivo ou gestor de compras de mas trabalhar pelos resultados,
gerador de custos (‘overhead’) para pois o que interessa mesmo é o
gerador de resultados (‘business’). resultado! Sabe por quê?
Portanto, é preciso agir.
São os outros que validam sua
Um velho ditado afirma que boas existência e pagam pelo que você
intenções não movem montanhas, gera de benefícios para eles, por
tratores sim. A missão (ou filosofia) isso é que a essência do trabalho
da empresa representa as boas do gestor ou executivo de compras
intenções, as estratégias são os é o resultado, e quem valida o

N OVO PA P E L D O COM P R AD OR
tratores. Ou, como dizia Santo Agos- resultado é só ele.”
tinho, deve-se rezar por milagres,

“NãO AdIANTA vOCê SOMENTE


SE ESFORçAR, AFINAL, SE O

CA P Í TU LO 2
MUNdO NãO O vALIdAR, vOCê
SERá APENAS UM PERdEdOR

54
ESFORçAdO!”

1 a ABORdAGEM: “ESTOQUES”

E o mentor continuou: “Os estoques são grandes aprisionadores de


caixa. Uma das principais metas da unidade de suprimentos é minimizar
o caixa utilizado nos estoques. Mas, para isso, é necessário sincronizar o
“timing” da compra dos materiais, sua entrega na empresa e sua utiliza-
ção na produção (ou venda).
O segredo é abrir um canal de informações com os fornecedores e com
os ‘clientes internos’ (usuários) a respeito dos cronogramas de utilização
dos materiais.

Com que frequência você é informado sobre as tendências de utilização e


o cronograma de chegada dos materiais na sua empresa? O departamento
de Tecnologia da Informação (TI) pode oferecer muitas dessas informações.
Mas você aprenderá muito mais nos contatos presenciais (reuniões) com
os gestores das unidades de produção e finanças, por exemplo. Se você já se
reúne com essas pessoas, aumente a frequência!”, concluiu o mentor.
N OVO PA P E L D O COM P R AD OR

2 a ABORdAGEM: “PARCERIAS”

Sobre a segunda abordagem, o mentor explica: “Épocas de dificuldades


CA P Í TU LO 2

inspiram as pessoas a construir relacionamentos duradouros com forne-


cedores e clientes:
55

• Se sua empresa está diante de uma queda no faturamento,


eles também estão diante de uma queda no faturamento;

• Se sua empresa precisa de caixa, eles também precisam de


caixa;

• Vocês dois precisam cortar custos;

• Você não tem como estabelecer parcerias com todos os


fornecedores, de modo que é importante identificar os que
serão parceiros sustentáveis.
Você precisa fazer seus fornecedores serem mais do que fornecedores.
Eles têm que se tornar colaboradores no que já é uma parceria. Isso signi-
fica que você não pode se impor brutalmente a seus fornecedores, como
algumas empresas fazem. Em uma parceria, a informação flui nos dois
sentidos e todos saem ganhando. Em um contexto cada vez mais difícil,
não se pode esperar que um parceiro arque sozinho com as perdas.”
O mentor, então, finalizou:

“dESCONFIO, MEU CARO JOãO

N OVO PA P E L D O COM P R AD OR
PEdRO, QUE vOCê Já ESTá COME-
çANdO A PERCEBER QUE A ATIvI-
dAdE dE COMPRA PROFISSIONAL,
PARA SER dESEMPENHAdA COM

CA P Í TU LO 2
COMPETêNCIA, NãO POdE SER

56
JURáSSICA E SE LIMITAR APENAS A
UM SIMPLES PROCESSO dE ABOR-
dAGEM A TRêS FORNECEdORES
(NO MíNIMO) PRé-QUALIFICAdOS”

Conforme veremos nos próximos capítulos, um grande número de


alternativas pode ser imaginado ou desenvolvido com o objetivo de
atingir a excelência no processo de compras.
0
3
CONDUTA ÉTICA
E REPUTAÇÃO
LUNCH
FREE
NO
“MILTON FRIEDMAN”

58 CA P Í TU LO 3 CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO
João Pedro havia aprendido que deveria conduzir seu papel profissio-
nal de forma sempre coerente com seus princípios éticos e, por isso, ele
se sentia incomodado e não sabia o que fazer quando os fornecedores
ofereciam “mimos”, “agrados” ou pequenos presentes, como canetas,
pen drives, agendas, DVD’s e convites para almoços, happy hour, etc.

Essas dúvidas martelavam sua mente o tempo todo e sua convivência


com elas já estava se tornando insuportável. Por isso, ele resolveu
esclarecer esses pontos de maneira definitiva com o mentor, que, é
claro, já deveria ter passado pelas mesmas situações ou questiona-
CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO

mentos. Ele, então, abordou o mentor e, manifestando seu interesse em


desvendar essas questões, indagou:

“Qual é realmente a aplica-


ção do conceito de ética nas
empresas? o Que o compor-
CA P Í TU LO 3

tamento ético tem a ver com


nossa reputação?”
59

O mentor respondeu: “Acredito que falar sobre ética é um desafio


expressivo para qualquer pessoa, porque, muitas vezes, temos a impres-
são de estar julgando alguém ou de estar acima do erro, quando, na
verdade, somos seres humanos comuns, falíveis e sujeitos a toda sorte de
tentações e fraquezas.”

João Pedro, então, retrucou: “Mas eu gostaria mesmo é de saber se o


senhor acha que o fato de aceitar esses pequenos ‘mimos’ dos forne-
cedores, ou até mesmo solicitar a eles uma oportunidade de emprego
ou estágio para um parente (afinal, eles mesmos é que oferecem essas
‘oportunidades’), pode ‘ferir’ os valores morais da empresa ou a nossa
relação com eles? Afinal, o senhor há de concordar comigo que não há
qualquer inconveniência nesse tipo de comportamento, tendo em vista
que todos fazem isso.”

“Meu caro João Pedro”, respondeu o mentor, “a questão é muito mais


profunda do que você pode imaginar. No mundo corporativo, corre-se o
risco de se ficar fascinado por uma pseudorrealidade, e a ilusão é refor-
çada diariamente pelas nossas próprias percepções e anseios.

Conhecemos escândalos de toda ordem com alguns políticos e até com


juízes. Todas essas pessoas, supostamente respeitáveis e bem educadas, deci-

CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO
diram abraçar o caminho da desonestidade para poder vencer, acreditando
que ficariam impunes e que outras pessoas decentes pagariam a conta.

Há, também, aqueles que sempre praticam a ética da esperteza, do


jeitinho, da malandragem. Para uns, a contravenção torna-se coisa
normal. Para outros, o caminho mais procurado é o do ‘pistolão’ ou do
apadrinhamento de ricos, poderosos e políticos, visando, unicamente, à

CA P Í TU LO 3
obtenção de benefícios.

Imagino que alguns ‘conceitos-comuns’ levem tais pessoas a negar a


promoção dos valores éticos. O mesmo poderia ser dito para todos nós

60
quando, em algum momento, sentimos a tentação de nos desviar daquilo
que sabemos ser certo, utilizando argumentos injustificáveis para aliviar
nossa consciência e reduzir nosso sentimento de culpa.”

“Mas, Sr. mentor, o que dizer de alguns tipos de ação tão irrelevantes como
receber uma agenda ou uma caneta de um fornecedor? Não posso admitir
que alguém possa se aproveitar de atos tão simples, inexpressivos e sem
importância com a intenção de obter alguma vantagem como retribuição.”

“É um ato irrelevante, sem importância?”, questionou o mentor, com um


misto de indignação e ironia na voz.

“Meu caro João Pedro, quando achamos que esse é um ato sem impor-
tância, justificando que ‘só isso não tem problema’, nosso sentimento
de culpa é menor. Sua repetição, “Como assim ‘todos fazem isso’?”,
entretanto, faz com que nos respondeu o mentor, com certa
acostumemos e acaba nos agressividade. E continuou: “É a
levando, sem querer, a praticar primeira alegação que pronuncia-
erros bem maiores, com absoluta mos quando vamos fazer algo que
tranquilidade. fere nossa consciência, para justi-
ficarmos o nosso ato. Ao praticar-
Adquirimos maus hábitos através
mos o mal sozinhos, sentimos um
de pequeninas condutas incorretas.
desconforto enorme, pois teremos
Quando começarmos a proceder
que arcar igualmente sozinhos
CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO

com condutas erradas, justificando


com toda a culpa. Por isso, tenta-
que ‘é um ato sem muita impor-
mos amenizar essa culpa dizendo
tância’, estaremos dando início à
que todos fazem o mesmo.
nossa degradação moral. Por menor
que seja, por mais insignificante Devemos nos lembrar, entretanto,
que seja, o que é errado é errado. de que, mesmo que todas as pesso-
CA P Í TU LO 3

Devemos adquirir o hábito de esta- as estejam fazendo algo errado,


belecer claramente o limite entre o um erro continuará a ser erro. Nem
bem e o mal.” que você esteja sozinho, avance
61

decididamente no caminho correto


e terá escolhido o rumo da vitória.
“mas, sr.
“E se for apenas uma vez?”, desa-
mentor, essa fiou João Pedro.
é uma prática “O que é isso? Como pode ser
no mercado, somente uma vez?”, respondeu o

todos fazem mentor, já sem paciência.

isso!” “Quando praticamos qualquer ato


errado com a justificativa de ser
‘só uma vez’, seremos tentados a
repetir o erro.”, disse o mentor,
e continuou: “Na primeira vez, de contrapartida. Pode ter certeza
faremos com certo receio, mas, absoluta disso.
depois (nas próximas vezes),
Você sabe qual é a maior inven-
estaremos bem mais ousados,
ção dos últimos 400 anos, mais
porque a nossa consciência já
importante do que a pólvora, o
estará relativamente anestesiada
rádio, a televisão ou o telefone?
e conseguirá encontrar algumas
Muito simples: Se alguém lhe
desculpas como ‘já fiz uma vez e
oferecesse um pedaço de papel
deu certo, por que não repetir?’.
que você pudesse trocar pelo que

CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO
Assim, chegaremos ao ponto de
quisesse, quando quisesse e onde
não conseguirmos deixar de prati-
quisesse; que pudesse se transfor-
car tal ato errado.
mar em comida, melhores vinhos,
No começo, isso incomodará nossa viagens, sexo ou ficar guardado
consciência, mas, com as suces- como potência e sonho, você acre-
sivas repetições, não sentiremos ditaria? Não parece papo do gênio

CA P Í TU LO 3
mais nenhum remorso, como se da lâmpada, promessa do Santo
estivéssemos fazendo algo absolu- Graal ou história das mil e uma
tamente normal. Por isso, devemos noites? Mas esse pedacinho de

62
tomar muito cuidado no início. papel, decorado com cores suaves
Ainda que seja só uma vez, o que e apresentando as assinaturas do
é errado é errado. Devemos seguir Presidente do Banco Central e do
sempre o caminho certo, porque Ministro da Fazenda, possibilita a
não existe uma maneira certa de você realizar tudo isso.
praticar um ato errado.”
Há mais de 400 anos que a vida
“Não se iluda, meu caro João na sociedade moderna (a nossa
Pedro”, continuou o mentor, vida) baseia-se em dinheiro.
“qualquer benefício que for ofere- Dinheiro é um papel milagroso
cido a você tem como objetivo porque representa a possibilidade
obter, cedo ou tarde, algum tipo de todas as coisas, o passaporte
para a liberdade. Somos livres por sentimentos de culpa, assustado
causa do dinheiro. mortalmente pelos fantasmas
que ele mesmo criou, tendo que
Nos tempos atuais, dinheiro é
mentir, esconder-se, lamentar-se e
como Deus na Idade Média: o
escapar das próprias responsabili-
sentido único e todos os sentidos
dades, que são os estigmas do ser
de todas as coisas.”
humano caído na imoralidade, do
“Caro João Pedro”, ressaltou
ser humano que esqueceu a razão
o mentor, “fique sempre em
de existir, representante de uma
estado de alerta, porque não são
CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO

raça derrotada, uma espécie em


poucos os profissionais de vendas
vias de extinção.
(principalmente aqueles ines-
Imagino que a fronteira entre o
crupulosos) que vão lhe propor
certo e o errado é perfeitamente
ofertas tentadoras e envolventes,
conhecida por todos, mas pode
que se manifestam desde a prática
ficar ainda mais evidente se
sutil de assédio até a promessa
CA P Í TU LO 3

pudermos responder afirmati-


de vantagens econômicas, com o
vamente a todos os três pontos
objetivo único de tentar fragilizá
apresentados a seguir:
-lo na negociação.
63

Rechace com veemência todas


essas tentativas. É preciso acabar
com essas armadilhas sempre
prontas para sabotar nossos
propósitos. Quem aceita essas
práticas, rapidamente é apri-
sionado em gaiolas mentais e,
reduzido a um anão psicológico,
tem que vagar no próprio universo
profissional com o rabo entre as
pernas, encurvado sob o peso dos
1° nosso procedimento é
compatível com nossos
princípios?

é tica

PRINCÍPIOS CONVENIÊNCIA CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO


CA P Í TU LO 3
64

Devemos estabelecer nossos princípios segundo nossos padrões de mora-


lidade e compará-los aos princípios da nossa empresa ou da sociedade
a que pertencemos. Se não forem coerentes, ou não prestamos para a
empresa/sociedade ou a empresa/sociedade a que pertencemos não
presta para nós. A questão fundamental é: nosso comportamento pode
se tornar público sem qualquer constrangimento para nós?
a ética compreende a vitória
dos princípios soBre a
conveniência.

2° nosso procedimento é leGal à


luz da lei?
CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO

Tem que ser, porque se não for legal, mesmo sendo coerente com nossos
princípios, não é ético. O ‘jogo do bicho’, por exemplo, tem princípios
– um pedaço de papel qualquer equivale ao recibo –, mas é ilegal e,
portanto, é uma contravenção penal.
CA P Í TU LO 3

3° nosso comportamento é
65

imparcial?

Estamos beneficiando alguém ou a nós mesmos em prejuízo de terceiros


ou de nossa própria empresa? Se for o caso, estaremos favorecendo uma
relação assimétrica perde/ganha, o que não é justo.

Temos que focalizar primeiro a realização do todo e, por consequência,


nossa própria realização, porque somos parte desse todo. Se, entretanto,
a dimensão do interesse do indivíduo for colocada como prioridade em
prejuízo do todo (como fazem alguns políticos), não é ético.
Temos o livre arbítrio para viver eticamente ou não. Para viver de
maneira ética, nossos procedimentos têm que ser legais, imparciais e
coerentes com nossos princípios. Cumprir todas essas ‘exigências’ pode
se tornar um problema difícil para nós. Mas, é exatamente por isso que é
uma oportunidade valiosa para nosso crescimento, porque a dificuldade
de um problema não é definida pelo caráter do problema em si, mas
pela relação entre o problema e a pessoa que o enfrenta. Por outro lado,
se ficarmos fazendo somente aquilo que é fácil, manifestaremos apenas
uma parcela de nossa força interior.

CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO
E, ao optar livremente pela ética e exercê-la efetivamente, estaremos
seguindo o caminho mais difícil, mais resistente, que vai exigir mais de
nós, e que, por isso mesmo, irá nos fortalecer mais.

A conduta ética é função da autoestima, pois quem está bem consigo


mesmo é resistente às pressões de toda ordem e faz o que é certo, não
o que é tendencioso ou lucrativo. O que difere as pessoas, o que as faz

CA P Í TU LO 3
construir um destino diferente, é a direção das suas crenças. Pessoas
que estão firmemente ancoradas em seu interior têm o condão de ver
barreiras imensas como pequenas dificuldades circunstanciais, têm

66
coragem e clareza para mudar a realidade para si e para os outros.

Indivíduos que se depreciam não têm consciência do próprio valor,


não se respeitam e possuem uma necessidade incontrolável de serem
apreciados pelos outros, e, por isso mesmo, sentem-se impotentes para
resistir a pressões externas, tornando-se moralmente fracos.

A sensibilidade ética, longe de ser um luxo nas negociações, deve


governar nosso comportamento e ser nossa melhor conselheira. É no
agir livre em busca de sua realização pessoal e social que o ser humano
expressa o que lhe é próprio e exclusivo, pois é isso que constitui
verdadeiramente sua dignidade e o sentido de sua vida.
meu caro João pedro, você tem,
portanto, motivos de soBra para
criar uma Boa reputação e isso se
presta como um compromisso Que
torna seus movimentos estraté-
Gicos diGnos de crediBilidade.
CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO

Construir uma reputação (ou estabelecer credibilidade) significa, no


sentido estratégico, que os outros esperam que você execute seus
movimentos incondicionais, cumpra suas promessas e, inclusive, realize
suas ameaças.”

“Mas, Sr. mentor, qual é, realmente, o conceito e a verdadeira importância


da reputação, e como construí-la?”, perguntou João Pedro.
CA P Í TU LO 3

“A reputação indica que você deve conduzir sua vida, ser e agir de
acordo com seus princípios, crenças e valores. Tudo isso define o seu
posicionamento. Mas, tão importante quanto ser e agir é parecer. E isso
67

também serve para definir competência: Os outros devem acreditar que


você é bom no que faz.

não se esQueça disso: os outros têm


Que acreditar em sua capacidade!
E você, João Pedro, sabe a importância do ‘posicionamento’? Posicionar-se
significa ser o primeiro a ser lembrado. Quando ouvimos, por exemplo, a
expressão ‘lâmina de barbear’, conectamo-nos imediatamente à marca
Gillette. Esponja de aço para limpeza? Lembramos do Bombril.

Portanto, você tem que construir sua reputação para


ser lembrado e respeitado:

‘Ele é duro na negociação, mas é justo.’

CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO
‘Fulano é muito exigente, mas é confiável.’

‘Ele é focado no resultado, mas sabe ouvir


e quer que você ganhe também.’

CA P Í TU LO 3
Mas a supremacia extrema do posicionamento é você ser percebido e
respeitado como um ‘consultor’ por seus clientes internos (pelas demais
unidades funcionais da empresa). Seu ponto de vista passa a ter peso e a

68
ser considerado como valioso por todas as pessoas da sua organização.”

“E como devo fazer para construir minha reputação?”


perguntou João Pedro.

O mentor, então, respondeu: “É importante lembrar-se de que


todas as grandes obras são constituídas pelo conjunto de partes
insignificantemente pequenas. As grandes pontes, os grandes viadutos,
os enormes edifícios arranha-céus também são construídos de pequenos
tijolos, barras delgadas de aço, minúsculos grãos de areia e pó de
cimento. Isso significa que quem não se descuida das pequenas tarefas,
dos detalhes, consegue realizar grandes obras.
Imagine vários filamentos de aço totalmente frágeis. Quando reunimos
todos esses filamentos numa trança, o resultado é o cabo de aço, forte
e resistente para suportar cargas expressivas. Da mesma forma, a
construção de nossa reputação obedece a esses princípios.

Se eu perguntasse, João Pedro, qual sua opinião a respeito dos diversos


colegas que dividiram a carteira de escola com você durante anos, tenho
certeza de que não vacilaria em apontar a reputação de cada um deles:
quem era estudioso, quem não se preparava e somente colava nas provas,
quem participava dos trabalhos em grupo apenas assinando-os, quem
CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO

era confiável e quem não era, quem você contrataria na sua empresa e
quem você não contrataria, etc.

Portanto, deveríamos começar a construir nossa reputação tão logo


nascêssemos, e isso tinha de se perpetuar por toda a nossa vida em
relação à nossa família, aos nossos colegas de escola, à nossa empresa,
aos nossos amigos, e assim por diante.”
CA P Í TU LO 3

João Pedro, então, indagou: “Mas, construída nossa reputação durante


um longo período de tempo, ela se perpetuará por si só ou teremos que
69

estar continuamente nos esforçando para mantê-la viva?”

O mentor foi enfático: “O que você leva anos para conquistar pode ser
perdido numa fração de segundo! Basta um só erro, uma escolha errada,
para pôr tudo a perder. Mas, se você age de acordo com seus valores, não
precisará fazer qualquer esforço para manter sua reputação, porque
estará sendo coerente com a sua natureza.

Existe uma canção cuja letra é: ‘Um elefante incomoda muita gente...
Dois elefantes incomodam muito mais...’ Costumamos nos preocupar
com os ‘elefantes’ da nossa vida porque eles são mais visíveis, mas
negligenciamos as formiguinhas, e são elas que podem construir ou
prejudicar nossa reputação, dependendo de como as gerenciamos.
ExEMPLO
Uma pessoa lhe encaminha uma mensagem e você não
responde; alguém solicita algo e você não se preocupa, nem
dá uma satisfação; você escuta (mecanicamente) o que lhe
dizem, mas está alheio e não presta atenção ao que é dito;
você esquece de cumprir algo que prometeu... São esses
pequenos detalhes que destroem a sua reputação, não são os

CO N D UTA É TI CA E R E P UTAÇÃO
grandes, porque, para esses, com certeza, você dá mais aten-
ção. O perigo verdadeiro encontra-se nos pequenos elemen-
tos, nos detalhes.

Assim, meu caro João Pedro, se eu pudesse transmitir um


pouco da minha experiência para você agora, diria alguns
pontos que você deveria considerar:

CA P Í TU LO 3
1º O ditado popular “no free lunch!”, apresentado no início
deste capítulo, afirma que não há almoço grátis. Isso

70
significa que tudo tem um preço na vida;

2º O amor baseado na recompensa é um amor interesseiro,


e o dia que não existir mais a recompensa, o outro vai te
odiar. E isso se aplica até aos nossos filhos;

3º Existe um ditado no oriente que diz: “Quando a árvore


cai, os macacos se dispersam” (e saem em busca de outra
que esteja em pé, porque aquela não tem mais serven-
tia). Os bajuladores de hoje irão abandoná-lo imedia-
tamente assim que não conseguirem mais enxergar o
crachá funcional pendurado em seu peito.”
BLEFE NA
NEGOCIAÇÃO
João Pedro sabia que o blefe represen-
tava um comportamento muito utiliza-
do nos processos de negociação, mas
sentia uma grande inquietação quando
blefava com o objetivo de fragilizar o
outro, imaginando que assim esta-
ria ferindo os princípios éticos. Por
0
isso, ele desejava saber se esse tipo de
conduta era válido e quais eram os
limites éticos de sua aplicação.
04
72 CA P Í TU LO 4 B LE F E N A N E G O C I AÇÃO
Para esclarecer de vez essa dúvida que o atormentava,
ele perguntou ao mentor:

“E com rElação ao blEfE na nEgocia-


ção? EssE tipo dE comportamEnto
ou tática não podE dEstruir nossa
imagEm E rEputação? afinal, Estamos
dEclarando algo quE podE não sEr
vErdadEiro ou quE não é procEdEntE,
B LE F E N A N E G O C I AÇÃO

não é mEsmo? qual é a ligação EntrE


o comportamEnto ético E o blEfE nas
nEgociaçõEs? como fica a rElação
CA P Í TU LO 4

dE confiança nEssE caso?”


73

O mentor respondeu: “A nego- pôquer, blefam porque suas verda-


ciação, como a maioria de nós deiras posições não devem ser
eventualmente aprendeu, é, em mostradas ao outro (o objetivo, no
grande parte, a arte de enviar caso, é fortalecer o próprio poder
mensagens enganosas a respei- na negociação).
to das nossas condições limites.
As negociações de qualquer
Muitas negociações têm caráter
natureza parecem requerer certo
de interesse pessoal e carregam,
talento para enganar. Em transa-
em si, incentivos à mentira ou,
ções mais simples, quando alguém
pelo menos, à atitude enganosa, e
pergunta, ‘até onde você pode
os negociadores, comportando-se
chegar?’ ou ‘qual é o seu limite?’,
como se estivessem numa mesa de
poucos negociadores dirão a
pelo outro lado é abandonar a mesa
verdade. Eles se esquivam, mudam
de transação e não processá-lo por
de assunto ou mentem com a cara
má fé na negociação.”
mais limpa do mundo.
E o mentor continuou: “Caro João
Em negociações mais complexas,
Pedro, não estou incentivando-o a
que envolvem múltiplos aspec-
blefar, estou apenas conceituando
tos, mesmo os negociadores mais
o blefe. Vamos aprofundar um
cooperativos, muitas vezes, inse-
pouco mais nessa questão.
rem questões inteiramente sem
importância ou exageram a impor- O blefe tem que representar
tância de problemas menores para apenas a forma na condução

B LE F E N A N E G O C I AÇÃO
ganhar concessões naquilo que do processo da negociação. A
realmente interessa. Parece que essência, entretanto, tem que ser
em quase todos os processos de verdadeira. Se você faz categorica-
negociação, uma habilidade-chave mente alguma afirmação que irá
é a capacidade de comunicar que beneficiar o outro, e ele, por sua

CA P Í TU LO 4
você está relativamente firme em vez, baseia toda sua decisão com
suas posições, quando, na verdade, base nisso, você tem que cumprir
você é flexível, ou seja, você blefa a sua parte, caso contrário, seu

74
respeito de suas intenções. comportamento é desonesto.

Em qualquer tipo de transação, O exemplo a seguir ilustra essa


todas as partes, presumivelmente, questão. Vamos imaginar uma
tentarão obter o melhor resultado pessoa que esteja devendo uma
para si. Assim, não se pode carac- promissória que está no cartório
terizar o interesse próprio como prestes a ser protestada. Como ela
má fé. Nenhuma demanda parti- está sem dinheiro para liquidar
cular em uma negociação pode ser a dívida e não pode permitir que
taxada de desonesta, mesmo que o título seja protestado (porque
pareça intolerável à outra parte. seu crédito será cortado), decide,
O recurso adequado a ser adotado então, procurar uma agência de
automóveis usados para tentar atraente, eu vou pensar se o vendo
vender seu carro e usar o dinheiro ou não.’ Esse é um blefe que está
da venda para o pagamento do vinculado à forma como o vendedor
débito. Imagine que, na negociação (nesse caso) camufla sua fragilida-
com o comprador da agência, essa de na negociação.
pessoa conte que está precisando
Agora, vamos imaginar que o
vender emergencialmente seu
comprador decida adquirir o carro
carro usado para poder pagar uma
e faça uma pergunta fundamen-
promissória que já se encontra no
tal: ‘Como está o motor do carro?’.
cartório para ser protestada. Após
Na realidade, o motor do carro não
essa declaração do vendedor, qual
B LE F E N A N E G O C I AÇÃO

vale mais nada e já está meca-


será o preço que o comprador da
nicamente comprometido, mas
agência estará disposto a pagar
o vendedor mente na resposta:
pelo carro? O mínimo possível! Ele,
“Tenho feito revisões periódicas
talvez, comece sua proposta de
e o motor está muito bom, nunca
CA P Í TU LO 4

preço perguntando ao vendedor


deu problema comigo!’ Isso não
algo do tipo: ‘Qual é o valor da sua
é um blefe, é desonestidade ou
promissória que está no cartó-
fraude, porque fere a essência da
75

rio?’ Nessa situação, o vendedor


relação. Logo depois, o compra-
se tornará refém do comprador e
dor vai descobrir que o vendedor
estará completamente fragilizado
mentiu, vai se sentir lesado e a
na transação comercial.
relação entre os dois será definiti-
Com o objetivo de evitar essa debili- vamente rompida.”
dade e fortalecer sua posição como
João Pedro, então, perguntou:
negociador, o vendedor do carro
“Quais situações em que o blefe
então blefa, e diz: ‘Na verdade, eu
pode ser caracterizado apenas
não estou precisando vender meu
como forma na condução do
imaculado carro, mas se o senhor
processo de negociação, ou seja,
estiver interessado em comprar,
em que a intenção ou a declara-
e se (e somente se) a proposta for
ção não é fraudulenta? E quando
o blefe pode ser considerado O trainee continuava com
fraude, ou seja, quando ele fere a dúvidas e não esperou para
essência da relação?” perguntar ao mentor: “Mas, e se
um vendedor disser, por exemplo,
O mentor respondeu: “Uma decla-
que é melhor você comprar um
ração é fraudulenta quando causa
bem qualquer hoje porque ele
danos. Um vendedor de automó-
tem outro comprador pronto para
veis, por exemplo, comete fraude
agarrar a oportunidade amanhã?”
quando volta o hodômetro e
vende seu carro como sendo mais O mentor, então, respondeu: “Essa
novo e menos usado. O vendedor é uma declaração sobre um fato

B LE F E N A N E G O C I AÇÃO
sabe que o carro não é novo e que não é material. E, mesmo se
apresenta enganosamente essa for mentirosa, não será fraudu-
condição ao comprador. A condi- lenta, porque a maior parte dos
ção do carro é um fato importante compradores sabe como evitá-las
para a transação e, por isso, se o ou se defender delas.”

CA P Í TU LO 4
comprador considera as declara- E continuou: “A definição comum
ções do vendedor de que o carro de fraude compreende a situa-
é novo para tomar uma decisão, ção em que o declarante esteja

76
e, depois, descobre que isso não é consciente do fato que está repre-
verdade, pode resultar em danos sentando enganosamente: a decla-
irreparáveis, pois ele se sentirá ração é intencional. Isso significa,
lesado nessa transação. Simi- em geral, que o declarante sabe
larmente, uma pessoa que está que o que diz é falso.
vendendo seu negócio comete
Da mesma forma, manter-se inten-
fraude quando mente a respeito
cionalmente calado a respeito
da quantidade e da natureza das
de uma questão ou apresentar
dívidas de tal negócio. Mentiras
manobras e evasivas verbais (por
a respeito de fatos importantes
exemplo, ‘eu não sei nada sobre
não são coisas desconhecidas nas
isso’ ou ‘essa não é uma questão
transações de negócio.”
a respeito da qual eu me sinta à
vontade para discutir’) também de cobertura, e os segurados
pode ser considerado como fraude. devem informar integralmente
seus riscos de seguro. Por outro
Você se sentiria enganado se não
lado, se você solicitar uma apólice
contassem a você um fato oculto?
de seguro de vida e não informar
Ou você se culparia por não ter
suas condições de saúde, você
descoberto por si mesmo? As
estará cometendo uma fraude.
seguradoras, por exemplo, devem
informar integralmente o escopo

o ponto fundamEntal aqui


B LE F E N A N E G O C I AÇÃO

não é sE a dEclaração Em
quEstão é puramEntE um fato,
mas sE a dEclaração foi arqui-
CA P Í TU LO 4

tEtada para ocultar uma sériE


77

dE fatos prEjudiciais à posi-


ção do nEgociador.

Se os negociadores fazem declarações com interesse próprio, ou se


emitem opiniões que contradizem claramente os fatos relacionados
ao objeto da transação, eles criam impressões falsas e cometem,
assim, uma fraude.
Um texto que trata sobre mentiras e verdades, escrito pelo ex-Minis-
tro do Planejamento (Governo Sarney) João Sayad, é bem oportuno
nesse momento:

• ‘As casas não têm apenas portas que dão para a rua,
contra os ladrões e intrusos. Têm também portas nos
quartos, no banheiro e nas salas. O que se fala no quarto
do casal nem sempre pode ser ouvido no quarto das

B LE F E N A N E G O C I AÇÃO
crianças. As crianças fecham a porta para falar dos adul-
tos. Os adultos usam palavras difíceis que as crianças
não devem entender. Elas, por sua vez, usam gírias para
que os adultos não as entendam.

• O que a namorada falou no ouvido do namorado que

CA P Í TU LO 4
sentiu um arrepio das costas até a ponta do cabelo, se
fosse dito numa reunião empresarial, seria inaceitável.
Mas a namorada não mentiu.

78
• O que o candidato fala no palanque – ‘não pagaremos
a dívida externa com o sangue do povo!’ – não deve ser
dita ao banqueiro sentado à cabeceira da longa mesa de
reuniões na sala coberta por lambris escuros.

• Será que fechamos as portas para falar a verdade, e


de portas abertas, mentimos? Os parlamentos têm o
plenário onde todos se reúnem, e outras salas de reuni-
ões menores e confidenciais – a sala da liderança, a da
oposição e a do governo.
• Em família, portas servem para amaciar verdades,
especialmente sobre a vida sexual ou sobre a violência
do mundo, até que as crianças amadureçam um pouco
mais. Em política, portas protegem as negociações da
irritação e do radicalismo dos adversários.

• As portas protegem a ambiguidade.

• A mentira é outra coisa. ‘Vou ficar trabalhando até


mais tarde’. ‘O Iraque tem armas de destruição em
massa’. A mentira é intencional. A mentira é o instru-
B LE F E N A N E G O C I AÇÃO

mento do poder. O mentiroso esconde sua convicção


ou a versão em que acredita. É ato de dominação do
mentiroso que pretende manipular e controlar o seu
ouvinte. Descoberta, a mentira causa ódio, raiva e
CA P Í TU LO 4

indignação.’

Em outras palavras, ao iniciar uma negociação, trate de


conduzi-la através do que você entende que é certo ou
79

errado e, para isso, sua consciência pode ser sua melhor


conselheira”, concluiu o mentor.
“SUA CONSCIÊNCIA
PODE SER SUA MELHOR
CONSELHEIRA”
80 CA P Í TU LO 4 B LE F E N A N E G O C I AÇÃO
05
VISÃO ESTRATÉGICA
EMPRESARIAL
VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL
CA P Í TU LO 5
O trainee acordou de sobressalto na manhã daque-
le dia porque havia sonhado com temas relativos à

82
visão, missão, princípios e valores, e seus alinhamen-
tos estratégicos nas empresas. Ele queria aprofundar
essas questões com o mentor porque, além de não
domina-las com clareza, também não compreendia
qual era o fio condutor que conectava todas elas à
atividade de compras.

Ele, então, abordou o mentor e imediatamente entrou


no assunto: “Sr. mentor, meu objetivo hoje é aprender
alguns conceitos sobre a visão estratégica empresa-
rial e a importância do vínculo e do alinhamento das
‘estratégias de compra’ com as ‘estratégias corporativas’
definidas pelos dirigentes das organizações.”
O mentor, então, respondeu: “O Pode apostar que, numa organiza-
alinhamento estratégico começa ção onde a liderança não conse-
com a equipe de compradores gue compartilhar com todos seus
tendo uma ‘visão compartilhada colaboradores como cada um pode
do negócio’.” contribuir para a consolidação
da filosofia empresarial (visão,

A FILOSOFIA missão e valores) de sua organi-


zação – e isso é mais frequente do
EMPRESARIAL que se imagina –, o funcionário
VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL

E O PAPEL DOS subalterno terá absoluta convic-

COMPRADORES ção de que aquilo é algo que


interessa somente aos Gerentes e
“Jamais se esqueça, meu caro
à Diretoria”, explicou o mentor.
trainee”, disse o mentor, “de que é
O trainee, um pouco confuso ainda
imprescindível que o papel profis-
sobre como ele poderia alinhar
sional de qualquer funcionário da
CA P Í TU LO 5

seu papel profissional com a filo-


empresa – e isso inclui também os
sofia empresarial de sua empresa,
gestores e executivos de compras
solicitou ao mentor: “Eu gosto
– esteja alinhado com a filosofia
83

muito quando o senhor esclarece


empresarial de sua organização.
as questões através de exemplos.
Às vezes, é importante refletir a
O senhor poderia me apresentar
respeito do que se passa na mente
alguns deles para que eu possa
de um funcionário subalterno na
entender melhor os conceitos que
organização ao se deparar com um
está querendo me transmitir?”
quadro reluzente colocado nas prin-
“Perfeitamente João Pedro”, disse
cipais paredes da empresa apresen-
o mentor, “Vou apresentar algu-
tando sua visão, missão e princípios.
mas situações para exemplificar
Será que ele entende que o que está
essas distorções:”
escrito nos quadros tem a ver com a
função dele ou ele pensa que aquilo
é algo que interessa somente aos
Gerentes e à Diretoria?
1a
Como uma copeira de uma instituição financeira, cuja
missão é ‘oferecer soluções financeiras personalizadas
e ágeis, viabilizando negócios seguros e rentáveis’, pode
contribuir para consolidar esse objetivo? Ela pode, ao
ser convocada para servir café e água para um cliente
na Diretoria, identificar o nome desse cliente com a
secretária do Diretor e, tratando-o pelo nome, abordá-lo
antecipadamente para saber qual é a preferência dele:
se é café comum, expresso ou cappuccino; se prefere

VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL


puro, com açúcar ou adoçante; se a água é comum ou
gasosa, gelada ou à temperatura ambiente, etc. Imagi-
ne um cliente sendo tratado pelo próprio nome por
uma copeira que ele nunca viu na vida e, ainda, aten-
dendo seu pedido de modo personalizado. A missão do
banco terá mais credibilidade para esse cliente, que
pensará: ‘até a copeira oferece serviços personalizados’.

CA P Í TU LO 5
2a
Considere o caso de uma empresa que presta serviços

84
de manutenção para aeronaves executivas e tem como
missão ‘oferecer soluções em aviação executiva com
segurança, agilidade e qualidade’. Em dado momento,
o responsável pelo setor de compras, para cumprir sua
restrição orçamentária, adquire uma peça de reposição
para uma aeronave com custos mais baixos através
de fornecedores que, embora sejam credenciados e
confiáveis em relação à qualidade de suas peças, não
conseguem cumprir os prazos contratados de entre-
ga dos produtos. Essa demora na entrega pode causar
um expressivo transtorno para os seus colegas da
manutenção; para o cliente, que terá prejuízo com a
aeronave parada; e também para a própria empresa,
que não poderá cumprir sua missão de ‘agilidade’ e
‘qualidade’ (prazo).

3a
É uma situação que diz respeito à forma de relaciona-
mento comercial entre os compradores e os fornece-
dores de uma organização que tem como principais
VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL

valores a justiça e o respeito nas relações com seus


públicos relevantes (colaboradores, fornecedores, clien-
tes, acionistas, comunidade e governo). Muitas vezes,
o comprador, para viabilizar seu orçamento ou suas
metas, utiliza seu poder de barganha e ‘esmaga’ seu
fornecedor, que, fragilizado, submete-se aos caprichos
do comprador. Este, talvez, pode até ficar com uma
CA P Í TU LO 5

imagem favorável junto ao seu chefe imediato (pois


alcançou suas metas e desempenhou sua função com
maestria), mas, tendo em vista seu comportamento
85

inadequado com o fornecedor, não respeita um dos


principais valores de sua organização, que é a justiça e o
respeito nas relações com seus públicos relevantes.”
A VALORIZAÇÃO Quando o tempo dos gestores
e executivos é utilizado para a
EXCESSIVA DOS solução dos problemas, quem
PROCESSOS estará disponível para identificar
e rentabilizar as oportunidades?
O mentor, então, continuou a sua
Assim, o empreendedorismo
explicação: “Todos nós pertence-
esmaece, agindo com o propósito
mos a um grupo que possui uma
de promover a estabilidade, mas
vigorosa cultura de especialização
o foco no negócio e os resultados
– fruto da forma tradicional com

VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL


ficam eclipsados. Dentro dessa
que temos organizado o trabalho
perspectiva, concentrar as ações
e a educação para o trabalho –,
somente no retorno financeiro e
mais forte no know-how do que no
no caixa (embora imprescindível)
know-why (saber o ‘porquê’), com
resulta em um procedimento
uma tendência de valorizar mais
míope e perigoso, ainda que
os processos do que as pessoas.
aparentemente correto. Torna-se

CA P Í TU LO 5
Existe uma consciência coletiva
importante, então, plantar para o
de que os problemas têm que ser
futuro, plantar valor, para se obter
solucionados de forma competen-
resultados em outros campos.

86
te e, assim, o urgente se sobrepõe
ao importante, e a capacidade de
A gERAÇÃO DE
ação, e não a capacidade de refle-
xão e imaginação, transforma-se
VALOR COEREntE
na única medida de desempenho COM A MISSÃO é
profissional. Mas essa atitude, que
O ObjEtIVO MAIS
valoriza mais o presente e o curto
prazo do que o futuro e o longo
AMPLO DE uMA
prazo, representa um impercep- ORgAnIZAÇÃO.
tível e traiçoeiro comportamento
Caro trainee, pense em quais são
empresarial. O futuro fica ampla-
as alternativas e ações que sua
mente inexplorado!
organização deve desenvolver
para sobreviver e perenizar nesse mercado em que todos estão se
digladiando na busca por sua própria segurança.

Como comprador, você tem alguma ideia de como sua empresa está se
movimentando para manter-se acima da ‘linha d’água’, e, mais ainda, como
você pode contribuir para favorecê-la nessa missão?”, questionou o mentor.

AMEAÇAS EStRAtégICAS
Continuando sua explanação, o mentor disse: “Caro trainee, lembre-se
VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL

de que, hoje, nenhuma organização tem condições de ignorar a necessi-


dade de competir. Isso vale também para todas as pessoas na organiza-
ção, inclusive, e principalmente, os responsáveis pelas compras.

Todas as organizações devem procurar compreender e exercer a competi-


ção com maestria. Observe o relato apresentado a seguir:

Vamos imaginar um pescador desatento que vive na beira de um rio pisco-


CA P Í TU LO 5

so. Diariamente, ele vai ao rio para pescar com seu caniço e é bem-sucedido.
Ele se alimenta daqueles peixes e leva sua vida com tranquilidade. Essa
situação se repete por muito tempo, fazendo com que o pescador não se
87

preocupe com mais nada a não ser ir ao rio buscar seu sustento diário.
Entretanto, duas situações diferentes podem ocorrer (não simultaneamen-
te), o que, certamente, mudará os rumos da vida desse pescador:

1a
Um dia, surpreso, ele encontra com vários pescadores desco-
nhecidos (que ele nunca havia visto antes) pescando no rio
bem no local onde ele jogava seu caniço. Ele ficou sabendo
que se tratava de pescadores que estavam subindo o rio
na esperança de encontrar peixes, porque na região deles
(rio abaixo) os peixes haviam sumido. Ele reparou também
que eram pescadores diferentes, porque estavam de barco e
usavam não só redes de pesca como também um equipamen-
to chamado sonar, para o mapeamento da posição dos peixes
no rio. Nesse dia, infelizmente, ele não pegou nenhum peixe,
mas reparou que os pescadores desconhecidos foram muito
bem-sucedidos. Essa situação se repetiu por todos os dias
seguintes, e, daí para frente, sem ter como se sustentar com a
pesca, nosso pescador se viu obrigado a começar a comprar os
peixes desses pescadores concorrentes.

2a
O pescador observa que o nível de água do rio começa a baixar
rapidamente. Alguns dias depois, o rio vira apenas um riacho

VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL


e, em pouco tempo, seca. Apavorado, ele procura saber a
razão para que isso esteja acontecendo e fica sabendo que 15
quilômetros rio acima alguém decidiu construir uma represa
hidrelétrica e desviou o curso do rio. De uma hora para outra,
ele simplesmente ficou sem seu sustento.

Qual é a mensagem que quero transmitir com essas histórias? Nosso

CA P Í TU LO 5
pescador, desatento aos movimentos que estavam ocorrendo rio acima
(a montante, no upstream) e rio abaixo (a jusante, no downstream),
viu-se, de repente, impossibilitado de obter seu sustento, ou seja,

88
o suprimento de suas necessidades. É exatamente por isso que as
organizações têm que estar continuamente atentas aos movimentos
estratégicos de ‘rio acima’ (‘movimento defensivo’) e de ‘rio abaixo’
(‘movimento ofensivo’), como veremos posteriormente.”

O trainee, não conseguindo dominar sua curiosidade, perguntou:


“Mas, Sr. mentor, até agora, eu não consegui compreender a diferença
entre estratégia, gestão estratégica e planejamento estratégico. O Sr.
poderia me esclarecer?”

O mentor respondeu: “Bem, já que você não consegue controlar sua


ansiedade e expectativa, vou tentar esclarecer (apenas isso: esclarecer)
o significado desses conceitos, porque, de todos eles, focalizaremos
com profundidade apenas a estratégia empresarial, para fazer as devi-
das conexões com a atividade de compras.
EStRAtégIA EMPRESARIAL
VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL

A estratégia corresponde à ideia de como será nossa


empresa no futuro e como fazer para isso acontecer.
Michael Porter, emérito professor de Harvard Univer-
sity, certa vez, declarou: ‘A estratégia consiste em criar
uma posição competitiva exclusiva e sustentável,
CA P Í TU LO 5

difícil de imitar.’
89

COMO SERÁ
COMO FAZER
PARA tAntO, AS
EMPRESAS DISPõEM DE
tRêS CAMInHOS:

VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL


Definir uma oferta de produto ou serviço que
pode ser determinada por um preço menor
(estratégia de custo);

CA P Í TU LO 5
Oferecer um serviço diferenciado para os

90
clientes (estratégia de valor);

3
Esforçar-se para acertar um único alvo (estra-
tégia de enfoque).

Por isso, a atividade de compras está


visceralmente vinculada ao alinhamento
estratégico adotado.
PLAnEjAMEntO EStRAtégICO

O planejamento estratégico compreende a formalização de planos


(fixação de metas e objetivos, divisão de tarefas ou etapas a serem
realizadas, e estabelecimento de prazos, orçamentos e indicadores de
desempenho) que visam a implementação das estratégias definidas e a
avaliação dos resultados alcançados. Dessa forma, o planejamento estra-
VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL

tégico ajuda a transformar as estratégias pretendidas em estratégias


realizadas. Entretanto, a estratégia não é a consequência do planeja-
mento, mas seu ponto de partida.

gEStÃO EStRAtégICA
CA P Í TU LO 5

A gestão estratégica compreende as ações realizadas no dia a dia para


permitir à empresa o alcance do seu marco estratégico. A expectativa
é que cada responsável pelos planos de ação desenvolva suas próprias
91

premissas e diretrizes, orientadas não somente para o campo econômi-


co-financeiro, mas, principalmente, para a integração entre os demais
campos de resultado: mercado e imagem, qualidade para os clientes,
tecnologia e processos, e patrimônio humano”, concluiu o mentor.
João Pedro ainda tinha algumas dúvidas a respeito da implicação da
estratégia corporativa das empresas na atividade de compras e, por
isso, perguntou ao mentor: “Como a formulação estratégica da empresa
influencia e direciona os procedimentos dos compradores?”
Em resposta, o mentor apresentou alguns movimentos estratégicos
que afetam a atividade de compras:

1a ALIAnÇAS EStRAtégICAS
Sobre as alianças estratégicas, o mentor explicou: “A compe-
tição deixou de ser entre empresas individuais. Um exemplo
claro disso é o atual setor de companhias aéreas, no qual, cada

VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL


vez mais, as batalhas não se travam entre empresas individu-
ais, mas entre alianças de múltiplas empresas (Star Aliance +
TAM, rede de hotéis, locadoras de automóveis + agências de
viagens) e os fornecedores que as sustentam. Há alguns anos,
a FIAT se aliou à GM para constituir a Wideworld Purchasing
(WWP), com o objetivo de ganhar escala em compras.

CA P Í TU LO 5
Quem não tiver intenção de participar de uma rede, tem
que fazer aliança com os concorrentes para poder sobreviver.
Quem era concorrente, passou a ser aliado; quem ainda nem

92
existia, passou a ser rival. E a guerra de verdade é travada e
vencida nas trincheiras da cadeia de valor, porque, em uma
situação, o inimigo pode ser o mesmo, e em outra, completa-
mente diferente.

A busca pela competência essencial, através do reposiciona-


mento nas cadeias de valor, considerando os processos de
alianças estratégicas, terceirizações e parcerias, deixa para as
empresas o campo reservado para aquilo que elas sabem fazer
de melhor (observação importante: essa é uma decisão estra-
tégica clássica, mas, hoje, já é possível constatar que o sucesso
das empresas vencedoras oriundas dos mercados emergentes
indica que elas utilizam exatamente a estratégia contrária:
a verticalização). E a compreensão do reposicionamento nas
cadeias de valor, com certeza, levará a soluções mais acertadas
de integração nas cadeias de suprimentos. Isso significa que
é necessário que as empresas busquem parcerias estratégicas
para todas as atividades para as quais não são especializa-
das, no sentido de agregarem valor aos produtos e serviços
oferecidos.
VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL

No entanto, alguns fatores são inerentes a todos os movimen-


tos de criação de alianças (movimentos cooperativos), como a
relação de confiança, a compatibilidade de sistemas, a cultura
para mudanças, a flexibilidade e o comprometimento de longo
prazo. Esses aspectos constituem a essência dos movimentos
colaborativos e são os fortalecedores dos elos nas cadeias de
suprimentos.
CA P Í TU LO 5

As principais alianças nas cadeias de suprimentos têm ocorri-


do com fornecedores no ambiente de gestão de compras. Em
geral, as iniciativas de ‘strategic sourcing’ (que determinam
93

onde, por quem e como produtos e serviços serão produzidos),


de ‘procurement’ (processos de compras e gerenciamento de
materiais e produtos), de ‘vendor management inventory’
(processos de suprimentos liderados por fornecedores no
ambiente físico do cliente), entre outros, têm pautado as
relações de integração. Daí a importância de se entender o
relacionamento com fornecedores como um dos elos mais
importantes na realização eficiente do gerenciamento das
cadeias de suprimentos.

Entretanto, como as estratégias têm que ser muito dinâmicas,


as empresas devem mobilizar suas estruturas para regenerar
suas estratégias frequentemente, em situações em que os
índices de risco/recompensa aparecem muito diferentes
daqueles com os quais os gestores estão acostumados.

A todo o momento, as empresas devem permanecer em proces-


so de transformação para ocupar uma nova posição estratégica.

Nenhuma empresa deve abandonar o foco tradicional em seu


negócio, nem os gestores (mesmo os de compras) devem parar
de tentar identificar as alavancas fundamentais para criar

VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL


e captar um valor sustentável para o cliente. Entretanto, as
estratégias tradicionais, direcionadas somente para dar forma
a posições de longo prazo e protegê-las, têm que ser suplan-
tadas por um foco na transformação contínua, voltado para
forjar as capacitações exigidas para vencer o próximo jogo, e o
próximo, e o próximo...

CA P Í TU LO 5
2a IntEgRAÇÃO VERtICAL
Integração vertical significa o grau de domínio, controle ou

94
posse que uma organização pretende ter da rede da qual faz
parte, desde os fornecedores de seus fornecedores até os clien-
tes de seus clientes.

A importância estratégica da integração vertical reside na


análise que a organização faz quanto à conveniência de adqui-
rir fornecedores e/ou clientes. Isso quer dizer que, com relação
aos seus fornecedores, por exemplo, cabe à organização decidir
se ela mesma realiza um serviço ou produz um componente de
que necessita, ou, então, compra de terceiros. A decisão estra-
tégica de expandir as operações através da integração vertical
deve examinar três fatores importantes:
1° FAtOR:
DIREÇÃO DA EXPAnSÃO

A estratégia de expandir-se no sentido dos fornecedo-


res (suprimentos) representa uma integração vertical a
‘montante’ (‘rio acima’ ou ‘upstream’), também chamada
VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL

de integração para trás. A integração vertical a montante


permite que uma organização controle seus fornecedo-
res, obtenha benefícios com as vantagens da redução
dos custos e, ainda, evite que seus concorrentes tenham
acesso aos fornecedores importantes. Por isso, a integra-
ção vertical a montante é considerada um movimento
estratégico defensivo.
CA P Í TU LO 5

A expansão no sentido dos clientes (demanda) representa


uma integração vertical a ‘jusante’ (‘rio abaixo’ ou ‘downs-
95

tream’), também conhecida como integração para a frente.


A integração vertical a jusante (como, por exemplo, a aqui-
sição de varejistas ou atacadistas) aproxima uma organi-
zação de seu mercado e também proporciona a vantagem
de estar próximo de seus consumidores finais. Por isso, a
integração vertical a jusante é considerada um movimento
estratégico ofensivo.
2° FAtOR:
AMPLItuDE DA IntEgRAÇÃO
VERtICAL

Após definir o sentido de sua integração vertical, cabe


à empresa decidir até onde deseja estender seu domí-

VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL


nio ou posse:

• Em pequeno grau de amplitude: fornecedores ou clien-


tes imediatos (vamos chamá-los de ‘primeiro ciclo’);

• Em grande grau de amplitude: fornecedores dos forne-


cedores ou clientes dos clientes (vamos denominá-los de
‘segundo ou terceiro ciclo’).

CA P Í TU LO 5
3° FAtOR:

96
EQuILÍbRIO nA IntEgRAÇÃO

O equilíbrio na integração compreende o nível de capa-


cidade de cada etapa da rede que é dedicado a fornecer
componentes à etapa seguinte. Um relacionamento de rede
totalmente balanceado é aquele em que uma etapa produz
insumos para a próxima etapa e a satisfaz totalmente em
suas exigências.
A Fiat Power Train (FTP), por exemplo, é uma indústria perten-
cente à Fiat, fornecedora de sistemas de tração (motores
e transmissões) para automóveis e caminhões. Como sua
capacidade de produção é superior à demanda da Fiat, ela
vende esses componentes também para outras montadoras,
alcançando, assim, o balanceamento necessário para a sua
produção, sem comprometer o suprimento à Fiat.
VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL

MOVIMENTO
OFENSIVO: fornecedor de
CA P Í TU LO 5

INTEGRAÇÃO matérias-primas
A JUSANTE
fornecedor
97

de outros itens

Indústria

“Atacadista”

MOVIMENTO
DEFENSIVO:
“Varejista”
INTEGRAÇÃO
A MONTANTE
Alguns exemplos de movimentos defensivos:

• A Usiminas, para se ver livre do enorme poder de barga-


nha de seu fornecedor de minério de ferro, adquiriu, no
início de 2008, o controle de três mineradoras na região
do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais: a Mineração J.
Mendes, a Somisa Siderúrgica Oeste de Minas e a Global

VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL


Mineração. A Usiminas esclareceu que essa aquisição
alinhava-se à estratégia de longo prazo da companhia,
que preservou, em todo caso, seu plano de expansão já
anunciado e sua capacidade de pagamento;

• A ArcelorMittal adquiriu, em agosto de 2008, 49%


do capital social da Mineração Pirâmide Participações

CA P Í TU LO 5
(MPP), com sede em Corumbá, no Mato Grosso do Sul. A
MPP concentra suas atividades na exploração de miné-
rio de ferro e de reservas de manganês na região;

98
• A MRV, construtora de edifícios residenciais, para
evitar um colapso no fornecimento de blocos de concreto
(uma de suas mais importantes matérias-primas), o
que poderia ser provocado pelo assédio a esse tipo de
fornecedor por outras construtoras concorrentes, deci-
diu investir na expansão dos fabricantes de blocos de
concreto e garantir suas fontes de suprimentos.
Alguns exemplos de movimentos ofensivos:

• A ArcelorMittal adquiriu a Manchester, um centro de


serviço e distribuição de aço em Minas Gerais, para dar
vazão aos seus produtos;

• A Usiminas, além de utilizar empresas metalúrgicas


VI SÃO E STR AT É G I CA E M P R E SAR I AL

terceirizadas para oferecer produtos com valor agre-


gado aos seus clientes, adquiriu as maiores empresas
distribuidoras de aço no país, e atende diretamente a
seu mercado comprador;

• A Dell Computadores, percebendo que não estava


tendo vantagem competitiva com a compra de compo-
CA P Í TU LO 5

nentes para seus computadores, produzidos em países


com baixo custo de mão de obra (como a Índia e a
China), pois seus concorrentes estavam fazendo exata-
99

mente o mesmo, decidiu se preparar para vender seus


computadores diretamente aos seus clientes usuários,
reduzindo drasticamente seus custos com distribuido-
res e varejistas.

Assim, quando uma organização decide comprar produtos ou serviços de


um fornecedor, está implicitamente tomando a decisão de não fabricar
ou produzir ela mesma esses produtos ou serviços.
é PARtE DA RESPOnSAbILIDADE

DO SEtOR DE COMPRAS InVES-

tIgAR SE A EMPRESA EStARá

MAIS bEM SERVIDA COMPRAn-

VI SÃO E STR AT É GI CA E M P R E SAR I AL


DO PRODutOS E SERVIÇOS DE

FORnECEDORES EXtERnOS

Ou PRODuZInDO-OS EM CASA.

ESSA é A CHAMADA DECISÃO DE

CA P Í TU LO 5
‘FAZER Ou COMPRAR’.

10 0
CADEIAS DE SuPRIMEntO
3a
(SuPPLY CHAIn MAnAgEMEnt)
A grande constatação é a de que as empresas não podem ser
constituídas apenas por ‘ilhas’ de produção, mas por uma cadeia
formada por grupos de fornecedores e clientes. Em outras pala-
vras, o fluxo de insumos ou matérias-primas, de produtos, de
serviços e de informações que fluem através da empresa, abran-
gendo desde a atividade de compras até a entrega do produto
ao cliente final, envolvendo todas as atividades de distribuição,
transporte e armazenamento, representa a ‘cadeia de suprimen-
tos’ de uma organização”, concluiu o mentor.
O trainee notou que sua respiração estava ofegante.
Não era para menos, porque hoje seria um dia muito
importante: o mentor ia explanar sobre os aspectos
mais importantes do processo de compras estratégi-
cas, e o primeiro deles seria a importância da Logística
e da Gestão da Cadeia de Suprimentos (Supply Chain
Management – SCM).

Como ele já conhecia as definições desses processos


(embora fosse útil que o mentor também abordasse
essas definições, com o ponto de vista dele para nive-
lar o seu conhecimento), o que lhe interessava mesmo
era a teia que conectava todos esses processos e sua
aplicabilidade na prática.
6
0
LOGÍSTICA E GESTÃO DA
CADEIA DE SUPRIMENTOS
102 2 CACA
4 P Í PTU
Í TU 3 6 COLO
LOLO NDGUTA
Í STI CA
É TIECA
G EESTÃO DA CA D E I A D E S U P R I M E NTO S
R E P UTAÇÃO
João Pedro, então, assim que O mentor respondeu: “Parabéns
encontrou com o mentor, comu- pelo seu interesse! Os temas que
nicou seu objetivo e esclareceu iremos abordar a partir de agora
que, apesar de ter interesse em serão fundamentalmente impor-
conhecer conceitualmente os tantes para o seu aperfeiçoamen-
LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS

aspectos relativos à logística e to, e irão fornecer elementos para


sua importância na gestão da consolidar seu conhecimento sobre
cadeia de suprimentos, seu inte- a gestão de compras estratégicas.
resse maior estava atrelado aos
De início, eu diria que uma
exemplos de sua aplicabilidade
importante questão estratégica
prática no dia a dia das empresas
que precisa ser considerada no
e, principalmente, ao modo pelo
mundo corporativo é a de que as
qual um executivo de compras
organizações terão que conviver,
poderia contribuir para a exce-
cada vez mais, com uma realidade
lência desses processos.
muito simples:
CA P Í TU LO 6

QUE A AMPLITUDE DAS DECISÕES


10 3

EMPRESARIAIS E DO RELACIONAMENTO
COMERCIAL DEVERÁ LEVAR EM CONTA
ALGUMAS VARIÁVEIS QUE ESTARÃO ALÉM
DE SUAS PRÓPRIAS FRONTEIRAS.

Isso significa compreender que o acesso aos fornecedores que fazem


(ou que poderão fazer) parte de sua cadeia de suprimentos não pode se
restringir geograficamente aos arredores da sua empresa.

Há alguns anos, o CEO da revista AMANHÃ (uma revista de negócios


publicada no Rio Grande do Sul) comentou que a confecção (edição) de
um dos números da revista havia sido realizada no Chile, porque, naquele
específico momento, era muito mais vantajoso, em termos de custo/bene-
fício, editar a revista naquele país do que no Brasil.

Outro exemplo ocorreu na década de 1990 com a Biobras, único fabrican-


te brasileiro de insulina durante muitos anos, tendo sido, posteriormen-

LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS


te, incorporado pela dinamarquesa Novo Nordisk. Na época, em conversa
com gestores sêniores da empresa, fiquei sabendo que a insulina era
produzida a partir do pâncreas bovino e, como esse insumo estava escas-
so no Brasil em determinada época por causa da redução do abate de
gado, a Biobras se viu obrigada a desenvolver uma estratégia de diversi-
ficação de produtos, tendo em vista sua enorme dificuldade para manter
seu nível de produção de insulina. Assim, a empresa iniciou a comercia-
lização de outro tipo de produto, que era produzido na Rússia em forma
líquida e, depois, enviado à Irlanda, que o processava, transformando-o
em cristais sólidos. Esse produto era, então, encaminhado a uma indús-

CA P Í TU LO 6
tria do setor químico/farmacêutico em São Paulo, onde era prensado em
forma de comprimido e embalado para venda.

10 4
A Biobras colocava seu selo de qualidade no produto e o vendia no
mercado com a etiqueta de sua marca, através de sua rede de distribui-
dores credenciados. Não há dúvidas de que a Biobras teve que investir
muitos anos para construir essa cadeia de suprimentos mundial confi-
ável. Mas valeu a pena, porque a tornou menos vulnerável à escassez da
matéria-prima (pâncreas bovino) para a produção da insulina, carro-
chefe de vendas da empresa.

A realidade de uma economia de mercado indica que, onde quer que


estejam os melhores recursos humanos e a mão de obra mais barata, é
para lá que as empresas e as organizações naturalmente vão migrar.

Não é segredo para mais ninguém que não são poucos os exemplos de
indústrias dos Estados Unidos e da Europa que fabricam seus produtos
(computadores, aparelhos de telefonia, utensílios e eletrodomésticos,
ferramentas, etc.) em países asiáticos porque essas regiões oferecem uma
mão de obra com custo consideravelmente mais baixo.

Obedecendo à impiedosa tirania da redução de custos e totalmente fiéis


às lições dos economistas clássicos de que o trabalho tem de ir para onde
LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS

pode ser feito melhor, as empresas prestadoras de serviços (call centers,


diagnóstico médico, declarações de renda, softwares e aplicativos) também
deslocam suas atividades para países asiáticos. Por isso, é preciso conside-
rar também que não é somente o baixo custo de mão de obra o único moti-
vo que leva as empresas a deslocar regionalmente sua produção ou serviço.
A empresa pode buscar a excelência na fabricação de diversas partes ou
componentes do seu produto final em outras regiões do planeta.

Um exemplo que poderia se aplicar magnificamente a essa realidade


é apresentado pela indústria de aviões Boeing. Quem acompanhava os
avanços da indústria aeronáutica, esteve ansioso pela chegada ao merca-
CA P Í TU LO 6

do do Boeing 787 Dreamliner, apresentado à imprensa em Everett, WA, em


8 de julho de 2007. Esse novo avião era uma obra-prima da engenharia
10 5

moderna e trazia inúmeras inovações, como sensores que reduzem os


solavancos em casos de turbulência; ventilação especial que filtra gases
que causam desconforto e dor de cabeça; iluminação especial que simula
a sensação de dia e de noite na cabine, minimizando o jet lag; janelas 75%
maiores, que escurecem com o toque de um botão, sem cortinas; assentos
com 47 cm de largura na classe econômica, quatro a mais que os tradi-
cionais; e, como sua fuselagem é 50% de fibra de carbono, é 5 toneladas
mais leve e o consumo de combustível é 20% inferior aos concorrentes,
com turbinas 60% mais silenciosas. Antes mesmo de chegar ao mercado o
Boeing 787 já era o maior sucesso de vendas da indústria aeronáutica.
Será que tanta inovação e sucesso só foram possíveis porque a Boeing
tinha os melhores engenheiros do mundo e dominava a melhor tecnologia
no seu segmento? Pelo contrário, o projeto do 787 somente foi viabilizado
porque vários fornecedores passaram a participar do desenvolvimento do
avião e assumiram grande responsabilidade em relação às inovações:

LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS


A coreia forneceu a extremidade A frança, a porta de entrada de
das asas; passageiros;

CA P Í TU LO 6
O japão, os flaps, a asa, a caixa A suécia, a porta do compartimento
central das asas e o compartimen- de carga;
to central do trem de pouso;

10 6

A austrália, o encaixe dos flaps;

A inglaterra e os estados Unidos,


a turbina;

Os estados Unidos a fuselagem


A itália, a fuselagem central e o traseira, o estabilizador vertical e as
estabilizador horizontal; cápsulas das turbinas.
Os fornecedores entregaram a aeronave praticamente montada à Boeing,
que teve apenas que encaixar as peças.

O processo é realmente fascinante: além da excelência de seus compo-


nentes (alcançada através do fornecimento de seus mais qualificados e
globais parceiros), a Boeing é também premiada por um efeito colateral
LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS

ainda mais valioso: A redução no prazo de montagem da aeronave, com o


respectivo aumento de sua vantagem competitiva.

Já que todas as peças são desenhadas por computadores para a monta-


gem, e a cadeia de fornecimento global da Boeing permite fazer o deslo-
camento just-in-time das peças de uma instalação para outra, há uma
redução do prazo de construção da sua próxima geração de aviões para
poucos dias, em vez de diversos anos como era no passado.

Portanto, para serem competitivas, as organizações devem considerar


CA P Í TU LO 6

sua posição em uma ou mais cadeias de suprimentos e o grau de inte-


gração entre todos os elementos dessas cadeias. Repetindo: não é mais
surpresa para ninguém que as empresas não competem mais entre si:
10 7

a competição ocorre entre as cadeias de suprimentos às quais perten-


cem. O controle e a gestão dos fluxos acima descritos nessas estruturas
expandidas – desde os fornecedores dos fornecedores até os clientes dos
clientes –, proporcionando benefícios expressivos relativos à velocidade,
confiabilidade, custos e qualidade, em comparação com a simples gestão
do fluxo interno da empresa, é o que constitui a gestão da cadeia de
suprimentos (o ‘Supply Chain Management’).
APENAS RESUMINDO:
• A cadeia de suprimentos abrange todos os esforços envol-
vidos na produção e entrega de um produto ou serviço

LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS


final, do fornecedor do fornecedor ao cliente do cliente;

• A gestão da cadeia de suprimentos inclui a gestão da


oferta e da demanda; a obtenção de matérias-primas
e componentes; a fabricação e a montagem; a armaze-
nagem e o rastreamento de estoques; a entrada e a admi-
nistração de pedidos; a distribuição por todos os canais; e
a entrega ao cliente”, finalizou o mentor.

CA P Í TU LO 6
O trainee, mesmo um pouco se sua pretensão é ser apenas um
desconfortável com tanta infor- medíocre ‘compradorzinzinzinho’,

10 8
mação, sentiu-se encorajado para você realmente não necessita ter
desafiar o mentor: “Mas, no meu informações a respeito da ativi-
entendimento, o que é que tem a dade de vendas ou do mercado de
ver a minha atividade de compras sua empresa. Mas esse, até onde
com a atividade de vendas da eu sei, não é o seu caso. Por isso,
minha empresa? Por qual razão eu para ter domínio sobre a ativi-
teria que estar ‘ligado’ nas vendas dade de compras, você necessita
se o meu papel funcional é estar conhecer a atividade comercial
focado na aquisição de produtos de vendas ou marketing de sua
e serviços? O que uma coisa tem a empresa. A razão é muito simples:
ver com a outra?” o cliente final é o único que tem a
moeda ‘real’ em toda a cadeia de
O mentor olhou serenamente
suprimentos. Quando um cliente
para ele e respondeu: “Meu caro,
da sua empresa decide realizar de vendas, exatamente por ter a
uma compra, ele dispara uma ação área de produção entre elas, o que
ou várias ações ao longo de toda resulta em uma espécie de miopia
uma cadeia. Todos os negócios na de compras.
cadeia de suprimentos transferem,
O diferencial está exatamente
LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS

de um para o outro, porções do


em buscar informações sobre a
dinheiro do cliente final, cada um
demanda de produtos acabados
retendo a margem correspondente
e não somente sobre a simples
ao valor por ele agregado.
operação de estocagem para as
Esse conceito coloca em posição necessidades da linha de produ-
de fragilidade a estratégia de ção. E é exatamente por isso que a
algumas empresas quando elas competência na gestão das cadeias
apenas fortalecem a área de de suprimentos pode significar o
suprimentos sem criar um canal sucesso ou o fracasso das organi-
direto de comunicação com a área zações. Veja o quadro abaixo:
CA P Í TU LO 6

FOCO ESTRATÉGICO VANTAGEM DO SUPPLY


CRITICIDADE
10 9

DA EMPRESA CHAIN MANAGEMENT

Lançar produtos rapidez de Chegada permite identifiCar os


inovadores no merCado gargaLos ou os foCos
de atraso na Cadeia.

Competir no merCado preço Competitivo proporCiona uma


para produtos de anáLise de Custo e
Consumo vaLor em toda a Cadeia,
e pode reveLar fontes
para reduções poten-
Ciais de Custo.
Algumas situações, entretanto, podem provocar barreiras à gestão da
cadeia de suprimentos, principalmente quando o fornecedor atende a
dois tipos de prioridades do mesmo cliente.

O quadro a seguir demonstra essa relação em alguns segmentos:

LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS


CLIENTE PRIORIDADE NECESSIDADE

Linha de produçÃo Linha de produçÃo


(demanda pLanejada) (demanda pLanejada)

montadora
de veÍCuLos
merCado de reposiçÃo rapidez no
(demanda “spot”) atendimento

refeiçÃo industriaL Custo e QuaLidade


(demanda pLanejada) dos insumos

serviços de

CA P Í TU LO 6
aLimentaçÃo
eventos espeCiais rapidez no
industriaL
e Comemorações atendimento
(demanda “spot”)

110
E A LINHA DE PRODUÇÃO DO
FORNECEDOR É A MESMA...

Essas barreiras à gestão da cadeia de suprimentos são originadas pela


volatilidade das vendas que causam erros, e também pela volatilidade na
cadeia de suprimentos, ou seja, quanto mais para trás vamos ao longo da
cadeia produtiva, maior é a variabilidade da demanda e, portanto, maio-
res precisam ser os estoques de segurança para prover o mesmo nível de
serviço do elo anterior.
111 CA P Í TU LO 6 LO G Í STI CA E G E STÃO DA CA D E I A D E S U P R I M E NTO S

FORNECEDOR
2° SUB
FORNECEDOR
1° SUB
FORNECEDOR
Esse fenômeno, conhecido como produção e dos níveis de esto-
efeito chicote (bullwip effect), foi que de cada um dos diferentes
identificado e formalizado por elos da cadeia de suprimentos.
Jay Forrester, em 1958, no MIT, e Infelizmente, a maneira pela qual
é análogo ao jogo infantil ‘tele- esses diferentes elos da cadeia
fone sem fio’: provoca distorções de suprimentos definem seus

LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS


proporcionais ao crescimento do lotes de produção pode causar (e,
número de elos nas cadeias. A usualmente, causam) distorções
principal causa de ocorrência do que fazem com que os volumes de
efeito chicote é o gerenciamen- produção variem nos fornecedores
to independente dos índices de a montante.”

INDúSTRIA

CA P Í TU LO 6
112
Nesse momento, o trainee inter- descompasso nas relações entre o
rompeu a explanação do mentor cliente e o fornecedor, o que, com
insistindo que seu interesse certeza, alimenta o processo de
maior era conhecer exemplos agregação de custos repassados
da aplicabilidade prática da ao consumidor final, com efeitos
logística da cadeia de suprimen- negativos na competitividade
LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS

tos no dia a dia das empresas e, sustentada por toda a cadeia.


principalmente, saber como um Quanto melhor for sua informação
executivo de compras poderia sobre o que está sendo vendido e
contribuir para a excelência o que não está, mais competente
desses processos. você vai ser para escapar dos dois
E o mentor respondeu: “Veja, meu maiores perigos dessa atividade:
caro trainee, quando, por exemplo,
a empresa percebe uma inefici- eSTOQUE DE
ência no sistema de entregas ou
MENOS E ESTO-
falha no cumprimento do prazo
CA P Í TU LO 6

limite estipulado pela área de


QUE DEMAIS.
produção e passa a formar esto- AMBOS SIGNIFI-
ques de segurança, faz com que o
CAM QUE VOCÊ
113

seu custo de propriedade aumen-


te. Os efeitos da formação de esto-
ESTÁ PERDENDO
ques levam a pedidos irregulares, DINHEIRO.
que podem se tornar uma das
Um exemplo clássico disso é
causas primordiais do baixo nível
mostrado no livro Mundo é Plano,
de serviço nas entregas pontuais,
escrito por Thomas L. Friedman
criando, assim, um círculo vicioso
em 2005, no qual ele apresenta,
de inadequação logística, cujo
com toda pompa e circunstância,
resultado final é a redução do
a desenvoltura do maior ícone em
valor para a empresa.
logística de operações da cadeia
Esse círculo, caracterizado pela
de suprimentos: o Walmart. Veja
ineficácia operacional, provoca um
um trecho do livro:
‘De um lado, um sem-número de caminhões brancos do
Walmart descarrega caixas de mercadorias de milhares
de fornecedores diferentes. Caixas de todos os tama-
nhos são depositadas em esteiras rolantes em cada

LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS


ponto de carregamento, e as esteiras menores desem-
bocavam todas noutra maior. Pequenos afluentes de
um grande rio. Vinte e quatro horas por dia, sete dias
por semana, os caminhões dos fornecedores abastecem
os 20 quilômetros de esteiras de transporte, que, por
sua vez, alimentam o grande rio principal de caixas
cheias de produtos. Mas isso é só metade do espetáculo.
Enquanto o rio do Walmart corre, uma célula elétrica
lê os códigos de barra de todas as caixas. Chegando ao
outro extremo do prédio, o volumoso caudal volta a

CA P Í TU LO 6
dividir-se numa centena de regatos, nos quais braços
elétricos separam as caixas conforme as lojas de destino
e conduzem cada uma para sua respectiva esteira rolan-

114
te; esta transportará aqueles produtos até o caminhão
que os espera para levá-los para as prateleiras de um
Walmart em alguns pontos dos Estados Unidos. Lá, um
cliente vai pegar um desses produtos e levá-lo para o
caixa, onde seu código de barras será lido por uma leito-
ra óptica; nesse exato momento, será gerado um sinal
que vai atravessar toda a rede do Walmart e chegará
ao fornecedor daquele artigo – quer ele se localize no
litoral do Maine ou no litoral da China. O sinal vai piscar
na tela do computador do fornecedor, dizendo-lhe que
fabrique outro item daqueles e o envie pela cadeia de
fornecimento, reiniciando todo o processo outra vez.
Assim, basta o cliente tirar o produto da prateleira de
uma loja do Walmart e passá-lo pelo caixa para outro
braço mecânico começar a fabricar seu substituto em
LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS

algum lugar do mundo. É uma verdadeira ‘Sinfonia


do Walmart’ em vários movimentos – só que sem um
finale. A sinfonia vai se repetindo, repetindo, repetin-
do, 24 horas por dia, sete dias por semana, 365 dias por
ano: entrega, seleção, embalagem, distribuição, compra,
fabricação, novo pedido, entrega, seleção, embalagem...’

À medida que crescia, o Walmart localizava suas novas lojas, de modo


CA P Í TU LO 6

que cada uma estivesse a uma distância razoável de um polo de distri-


buição centralmente localizado. A empresa tinha adotado um sistema
de comprar mercadorias em grandes quantidades direto dos fabrican-
115

tes, armazená-las em enormes centros de distribuição, e fazê-las sair


de lá rapidamente para as lojas (isso se chama cross-docking), que eram
abastecidas várias vezes por semana. Fazer as mercadorias fluírem com
rapidez reduzia os custos de estocá-las, não é óbvio?

O Walmart percebeu, antes de qualquer outro, que lucro no varejo


vem da fluidez: chegou-vendeu-chegou-vendeu... Os custos baixavam
também porque os caminhões da empresa saíam sempre cheios dos
depósitos para as lojas.

Como você pode observar, meu caro trainee, ao controlar a sincronia


entre a informação (por exemplo, o aumento ou a redução da demanda)
e as atividades associadas a essa informação (o aumento ou a redução
dos estoques ou aquisições), você libera o dinheiro que estava preso.
Para ilustrar melhor, eu gostaria de encerrar essa parte de nossa
conversa apresentando um texto a respeito desse tema escrito pelo
brilhante Prof. Clemente Nobrega e publicado em uma de suas colunas
na revista Negócios:

LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS


‘Nas transações comerciais, há sempre dinheiro preso
esperando para ser liberado. Como assim? Simples.
O dinheiro fica preso em ineficiências, gargalos e
fricções que existem entre a sequência de atividades
que qualquer empresa (e seus fornecedores) tem de
desempenhar para fazer o que faz. Conceber, projetar,
produzir, vender, entregar e dar suporte àquilo que
vendem. Toda empresa faz isso, independentemente do
setor em que atue. Quanto mais ágil (fluido, sem atrito)

CA P Í TU LO 6
for o fluxo de informações e atividades entre os elos
dessa cadeia, mais dinheiro a empresa ganha, porque
menos dele fica preso nas ineficiências do caminho.

116
ExEMPLO
Eu saio para comprar minha cerveja favorita, mas me
informam que ela está em falta, o distribuidor não
entregou nesta semana. O fabricante está deixando de
ganhar dinheiro porque há algum gargalo na cadeia que
traria seu produto até mim. Pode ser que esteja faltando
alumínio para as latinhas, pode ser que o fabricante não
esteja dando conta de um aumento de consumo. Pode ser
que o distribuidor é que não tenha providenciado mais
caminhões para a entrega. Pode ser um monte de coisas
em vários elos da cadeia. O fato é que o gargalo, esteja
onde estiver, está prendendo dinheiro. O mesmo estaria
ocorrendo se o fabricante tivesse produzido cerveja
LO G Í STI CA E G E STÃO DA CAD E I A D E S U P R I M E NTOS

demais, excedendo à demanda. Ela ficaria encalhada


e o varejista teria de dar descontos para minimizar
o prejuízo. Em ambos os casos, o dinheiro está sendo
perdido pela falta de sincronia entre a oferta de alguma
coisa e a demanda por essa coisa. Se eu só fico sabendo
dos gargalos depois que eles já ocorreram, já perdi
dinheiro. Ou, pior, se eu considero que os gargalos são da
natureza intrínseca daquela atividade e nada pode ser
feito contra eles, perderei dinheiro permanentemente.
São nesses cenários que surgem os inovadores para
CA P Í TU LO 6

libertar um dinheiro preso que os outros achavam que


ninguém jamais conseguiria libertar.’
117

Como se vê, meu caro João Pedro, caminhão meio cheio – como hotel
meio cheio, como hospital meio cheio, como avião meio cheio – significa
que você está ganhando somente meio dinheiro. Bom mesmo é ganhar
dinheiro inteiro. Dinheiro cheio”.
MEIO

MEIO
CHE IO
DINHEIRO

118 CA P Í TU LO 6 LO G Í STI CA E G E STÃO DA CA D E I A D E S U P R I M E NTO S


RELACIONAMENTO COM
FORNECEDORES
0
O trainee estava sentindo seu coração bater tão forte-
mente que parecia que ia sair pela boca, afinal, o tema
que seria abordado dessa vez o interessava muito: o
relacionamento com os fornecedores. Por isso, assim
que encontrou com o mentor, o trainee foi logo
perguntando: “Devo considerar o fornecedor como um

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


aliado ou como um inimigo?”

E o mentor respondeu: “Dependendo da forma como você


se relaciona com ele, pode transformá-lo num aliado ou
num inimigo. Depende única e exclusivamente de você!”

07
CA P Í TU LO 7
120
E já iniciou a conversa entrando todos esses players e são os que
diretamente no assunto: “O fato mais podem impactar os resulta-
é que a interação de qualquer dos no processo de compras.
organização com seus públicos
Isso significa que, considerando
relevantes em seu contexto de
a hipótese que os fornecedores
atuação (sejam eles representados
querem sempre extrair mais recur-
pelo governo, clientes, funcioná-
sos dos seus clientes em troca do
rios/colaboradores, acionistas,
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

que oferecem, é exatamente com


comunidade ou fornecedores)
eles que o profissional de compras
compreende sistematicamente
pode contar e obter as melhores
a permuta entre algum tipo de
condições para preservar a riqueza
ganho ou benefício e um paga-
da sua empresa. Esse paradoxo
mento (ou saída de dinheiro do
tem favorecido algumas iniciati-
caixa da empresa).
vas nas relações de integração e as
A grande verdade é que todos principais alianças ocorridas com
CA P Í TU LO 7

esses ‘players’ querem, de forma os fornecedores no ambiente da


justa ou não, sempre mais pelo gestão de compras.
que oferecem, nunca menos. Cabe,
Estudos e pesquisas efetivadas por
121

então, aos dirigentes, gestores e


empresas e instituições (nota-
executivos de qualquer empresa,
damente nos Estados Unidos)
a busca incessante pela melhor
trouxeram alguns termos comu-
contrapartida para os recursos
mente utilizados em inglês para
alocados ou disponibilizados.
representar as várias possibilidades
E, embora muito dos recursos
de alavancar a tarefa de compras,
possam ser poupados (vamos
como Purchasing portfolio model,
denominar aqui de ‘saving’)
Procurement, Value sourcing, E-sour-
através da melhoria de processos
cing, etc.”, destacou o mentor.
internos na empresa, os fornece-
dores constituem o grupo mais
importante e estratégico entre
“Os fOrnecedOres cOnstituem O grupO

mais impOrtante e estratégicO entre

tOdOs esses players e sãO Os que mais

pOdem impactar Os resultadOs nO

prOcessO de cOmpras.”

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


João Pedro guardava uma incer- O mentor respondeu: “Existem
teza há muito tempo e estava dois meios distintos através dos
disposto a esclarecer essa dúvida quais uma empresa pode se
com o mentor. Por isso, interrom- relacionar situacionalmente com
peu sua explanação perguntando: seus fornecedores, e cada um deles
“Sr. Mentor, dentro dessas consi- corresponde a uma filosofia de

CA P Í TU LO 7
derações sobre a importância dos gerenciamento muito diferente.
fornecedores, quais são os meios de Digo situacionalmente porque
se relacionar com eles e qual desses cada um deles pode apresentar

122
métodos é o mais vantajoso?” pontos fortes ou fracos dependen-
do do contexto:

• O primeiro meio diz respeito à utilização das habilidades


de negociação e de grande poder de barganha na compra;

• O outro meio envolve a criação de relacionamentos de


parceria com seus fornecedores, baseado na confiança mútua
e num compromisso de interdependência, e requer habilida-
des de aprendizagem conjunta e resolução de problemas.
Os dois métodos podem ser efica- contratos, consolidam pedidos de
zes, já que ambos possibilitam grande volume e aplicam sistemas
atingir os objetivos de reduzir os digitais de compra, como leilões
custos de compra. Por isso, a esco- reversos, etc.
lha entre um ou outro não pode ser
Um exemplo da aplicação da
definida baseando-se somente em
estratégia de negociação com
qual deles funciona: deve ser defi-
ampla utilização do poder de
nida com base nos valores e cren-
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

compra é facilmente identificado


ças da empresa e seus dirigentes.
nas ‘normas de negociação para
Muitas empresas têm atacado compradores’, da cadeia multina-
ferozmente seus fornecedores cional de hipermercados Carrefour,
para que abaixem o preço inicial revelado no artigo publicado na
antes de qualquer procedimento, revista trimestral da McKinsey.
agindo da maneira mais óbvia
Veja como o texto foi veiculado,
em relação a eles: renegociam
tornando-se folclórico no meio
CA P Í TU LO 7

empresarial:
123

‘A cadeia Carrefour pediu à Nestlé alguns descontos


extras. Diante de uma resposta negativa por parte da
multinacional suíça, o Carrefour decidiu suspender a
compra de uma série de produtos. As compras passa-
ram de cerca de 250 itens para 25! Mas a retaliação
não ficou aí. O Carrefour tirou a Nestlé (temporaria-
mente) da lista, ‘não apenas no Brasil, mas também
na França e em outros países europeus, tentando
aplicar pressão num contexto global’.
NORMA DE NEGOCIAÇÃO
PARA COMPRADORES
Srs. Compradores, segue um resumo das técnicas de

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


negociação para os compradores de nossa rede:

1o Nunca demonstre simpatia a um vendedor,


mas diga que é parceiro.

2o Considere o vendedor como nosso inimigo nº 1.

3o Peça, peça, peça, que eles acabam concedendo.

CA P Í TU LO 7
4o Nunca aceite jamais a primeira oferta, deixe
o vendedor implorar, isto dá margem à maior
barganha para nós.

124
5o Use sempre o lema ‘você pode fazer melhor do
que isto’.

6o Cadastre sempre no computador o menor


preço possível e sempre peça mais, até o
vendedor parar de dar.

7o Seja sempre subordinado de alguém, e consi-


dere que o vendedor também tem um supe-
rior, que sempre tem desconto a mais para dar.
8o Quando o vendedor dá facilmente ou pede para
ir ao banheiro ou telefonar e vem com a aprova-
ção, considere que o que ele está dando já podia
ser dado, peça mais.

9o Seja inteligente. Finja-se de idiota.


R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

10 o Não faça concessões sem contrapartida.

11 o Lembre-se de que o vendedor que chega


pedindo, sabe que tem que dar.

12 o Lembre-se de que o vendedor que não pede,


já está esperando que o comprador peça e, em
geral, não exige nada em troca.
CA P Í TU LO 7

13 o Repare que o vendedor que faz sugestão, em


geral, é mais organizado e mais esclarecido.
125

Use seu tempo para explorar mais os vendedo-


res desorganizados, que querem entrar ou têm
medo de sair da rede.

14 o Não tenha dó do vendedor, jogue o ‘jogo


dos maus’.

15 o Não hesite em usar argumentos, mesmo que


sejam falsos, por exemplo: o concorrente do
vendedor sempre tem melhor oferta, maior
giro e prazo.
16 o Mantenha-se repetindo as mesmas objeções,
mesmo que sejam absurdas. E de tanto repetir,
o vendedor acaba acreditando.

17 o Não se esqueça de que 80% das condições


são obtidas na última etapa das negociações.

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


Deixe o vendedor com medo de perder.

18 o Nunca se esqueça de que devemos obter o


máximo de informações sobre a sua persona-
lidade e as necessidades dos vendedores que
nos visitam. E diariamente descubra o ponto
fraco deles.

CA P Í TU LO 7
19 o Sempre convide o vendedor para participar
de uma promoção, acene com volume alto,
consiga o maior desconto que puder, faça a

126
promoção rápida e lucre com o saldo.

20 o Desestabilize o vendedor exigindo coisas


impossíveis, ameace romper a negociação
a qualquer momento. Deixe-o esperando.
Marque horário e não cumpra, faça outro
vendedor passar na frente dele, ameace tirar
os produtos dele de linha, ameace diminuir
espaço dos produtos dele, expulse o promotor
ou repositor da loja, dê pouco tempo para
ele decidir, faça cálculos, mesmo que sejam
falsos. O vendedor acaba dando mais.
21 o Lembre-se de que ‘desconto’ tem outros nomes
como bonificação, cortesias, brindes, patrocínios,
verba, inserção no tabloide, diferença de ICMS,
crédito de ICMS, IPI, troca, indenização de encalhe,
promoção, lançamento, cadastramento de item,
enxoval, reinauguração, aniversário, eventos,
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

todos são sempre bem-vindos.

22 o Não se deixe cair num impasse, é o que há de


pior para um comprador.

23 o Fuja do assunto ‘margem’ como o capeta foge da


cruz.

24 o Se o vendedor demorar para dar uma resposta,


CA P Í TU LO 7

diga que já fechou com o concorrente.

25 o Jamais deixe o vendedor questionar qualquer


127

promoção.

26 o Tenha como lema que ‘vendo o que compro e


nem sempre compro o que vendo’. Isto é, o mais
importante para nós é comprarmos produto que
dê lucratividade, produtos de alto giro é um mal
necessário.

27 o Evite que o vendedor fique ‘lendo’ nossas infor-


mações no visor. Quanto mais desinformado o
vendedor for, mais ele acredita em nós.
28 o Não se assuste com os novos equipamentos dos
vendedores, não quer dizer que estejam mais
bem preparados para negociar.

29 o Se o vendedor for do tipo ‘antigo’ ou jovem, são os


que mais cedem, o ‘antigo’ porque acha que sabe

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


tudo, e o jovem porque é inexperiente.

30 o Se o vendedor estiver acompanhado de um supe-


rior, exija mais descontos, mais participação nas
promoções, ameace tirar de linha. O superior não
vai querer perder o pedido e o cliente na frente
do vendedor.

31 o Sempre que outra rede concorrente estiver fazen-

CA P Í TU LO 7
do uma promoção, pergunte ao vendedor ‘o que
você fez lá’ e exija as mesmas condições.

128
32 o Finalmente, não se esqueça da regra de ouro de
um bom comprador: não perca tempo com vende-
dores profissionais, invista seu tempo no vende-
dor despreparado, não se assuste com as grandes
marcas (por trás de uma grande marca pode estar
um vendedor despreparado que só conta com a
marca), invista seu tempo no vendedor que não
faz cálculos, que cede facilmente, que quer entrar
ou que tem medo de sair da rede.’
Folclórico ou não, muitos profissio- mas”, alertou o mentor, “esses
nais de compras são estimulados procedimentos podem conduzir
por esse modelo de comporta- as empresas para ‘fora dos trilhos’,
mento com seus fornecedores”, porque outras variáveis, como
explicou o mentor. os serviços externos – logística,
design e trabalho de campo –,
João Pedro, então, perguntou:
que são cada vez mais impor-
“Mas esse modelo é ‘truculento’!
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

tantes para o sucesso da maioria


É eficaz? Funciona?”
das empresas, recebem atenção
O mentor respondeu: “Talvez, no
insuficiente.
caso do Carrefour e, dependendo
Essas iniciativas, com pouca
do contexto, é possível que sim.
probabilidade de propiciar ganhos
Entretanto, em situações em que
duradouros ou melhorar o rela-
os bens e serviços a serem adqui-
cionamento com os fornecedores,
ridos e contratados são muito
resultam em situações em que
mais do que simples commodi-
CA P Í TU LO 7

as empresas deixam de colher


ties, ou em situações em que os
benefícios a longo prazo depois
mercados apresentam grande
de obterem resultados iniciais
129

volatilidade, a imposição brutal


encorajadores. Situações clássicas
sobre os fornecedores pode não
que evidenciam essas distorções
ser a melhor conselheira.1
podem ser observadas na contra-
Na melhor das hipóteses, essas
tação de bens e serviços para a
táticas de negociação podem
implantação de grandes projetos,
significar apenas o primeiro passo
como a construção de novas fábri-
para o alcance da redução dos
cas ou a expansão de empresas.
preços no processo de compras,

1 Um bom artigo sobre o histórico do relacionamento com fornecedores na indús-


tria automobilística, escrito pelo Prof. Sumantra Ghoshal, que detinha a Cadeira
de Robert P. Bauman de “Liderança Estratégica”, na London Business School (onde
ele também era o Diretor do Centro Indiano Aditya V. Birla) é apresentado no
anexo I, ao final deste livro.
ExEMPLO 1: PRAZO DE ENTREGA

• O preço contratado para o fornecimento de bens e serviços nem sempre


é o fator mais importante. Às vezes, o mais importante é o cumprimen-
to dos prazos estabelecidos, já que os atrasos na entrega de um bem

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


ou serviço, ou seja, falhas intermediárias, podem comprometer todo o
cronograma determinado para a implantação final do projeto.

ExEMPLO 2: SUBCONTRATADOS

CA P Í TU LO 7
• Os fornecedores de equipamentos optam por utilizar empresas players
de sua cadeia de suprimentos com muita frequência, e isso tem acar-
retado custos acentuados e não previstos na fase de negociação, como

130
viagens adicionais para a inspeção e o diligenciamento, além de possíveis
atrasos nos fornecimentos, já que esses subfornecedores não têm nenhu-
ma responsabilidade ou relação direta com o contratante final do projeto;

• Os fornecedores de serviços usualmente subempreitam sem fazer uma


pesquisa adequada quanto à saúde financeira e, até mesmo, quanto aos
conhecimentos sobre os padrões de segurança dessas pequenas empresas
subcontratadas, o que pode acarretar custos adicionais de fiscalização,
bem como problemas mais graves, uma vez que, por não terem uma base
econômica e uma estrutura de gestão adequadas, podem apresentar
tantos problemas financeiros que acabam tendo um insucesso empre-
sarial, indo à falência e saindo do projeto, não sem antes provocarem
grandes problemas sociais e dívidas nas comunidades onde atuavam,
transferindo esses efeitos nocivos para o contratante final do projeto.
Entretanto, existem outros caminhos que podem conduzir a resulta-
dos também atraentes e que ainda proporcionam um ambiente para
evitar que as rusgas não se tornem uma tragédia para os negócios”,
pontuou o mentor.

O trainee, um pouco sobressaltado com tantas informações, tentou


conduzir a conversa para um tema que ele estava muito interessado.
Por isso, perguntou ao mentor: “Independentemente do modelo de
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

relacionamento adotado com os fornecedores, quais devem ser os obje-


tivos do setor de compras das empresas? Por exemplo, o que é melhor:
aumentar ou reduzir o número de fornecedores, comprar por preço ou por
confiabilidade? Além disso, quando se deve substituir um fornecedor?”

O mentor, então, respondeu: “Era exatamente sobre isso que eu ia


falar com você agora! Vejamos:

OBJetiVOs da atiVidade de cOmpras


CA P Í TU LO 7

nas empresas
Há alguns aspectos básicos que a unidade de compras deve observar
131

para saber se sua decisão de compra está acertada:

1 o preÇO mais adequadO


O benefício mais evidente de comprar por um preço mais adequado é que
isso dá à empresa uma vantagem significativa em relação aos custos. A
diferença radical entre comprar por um preço mais baixo e comprar por
um preço mais adequado é que preço ‘mais baixo’ pode demandar contra-
partidas inconvenientes pelo fornecedor, como flexibilidade na entrega,
qualidade inferior ou exigência na aquisição de quantidades adicionais (já
falamos sobre isso). A decisão de comprar por um preço mais baixo é válida
quando todos os demais parâmetros de referência são equivalentes.
2 o entrega nO mOmentO certO
Custos ocultos gerados por falhas no atendimento dos prazos de entrega,
seja pelo atraso (que pode provocar a paralisação ou a redução da produ-
ção e perdas de oportunidade), seja pela antecipação (que gera novas
despesas relativas a custos financeiros para capital de giro e necessida-
de de áreas físicas adicionais e não previstas para estocagem), podem
causar impactos desastrosos no desempenho da empresa junto aos seus

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


próprios clientes.

Outros aspectos também ligados à falta de confiabilidade em relação


ao cumprimento dos prazos de entrega por fornecedores exigirão ainda
custos adicionais não previstos para suportar as atividades conhecidas
por ‘follow up’, ou seja, uma empresa cliente forçosamente terá que arcar
com custos e disponibilizar pessoal para acompanhar e monitorar o aten-
dimento da requisição junto aos seus fornecedores.

CA P Í TU LO 7
3 o qualidade adequada de Bens e
serViÇOs

132
A falha na qualidade dos produtos comprados e serviços contratados, assim
como qualquer tipo de suspeita na sua conformidade, certamente, aumen-
tarão os custos, afetando a velocidade de produção e podendo, ainda,
atrasar a entrega dos produtos ou serviços finais ao cliente. Como não é
possível mais o cliente assumir a responsabilidade pela ‘inspeção’ dos bens
e serviços adquiridos, os fornecedores devem garantir que assumem eles
próprios a responsabilidade de fornecer ‘correto da primeira vez’.

Os fornecedores podem ter sua qualificação certificada, garantindo


que seus sistemas e processos estão em conformidade com as normas
internacionais, como a ISO 9000 e tantas outras. Entretanto, é preciso
ficar atento, porque as certificações indicam apenas que determinado
fornecedor tem a capacitação de atingir boa qualidade, mas não garan-
tem a entrega dos produtos e serviços com a boa qualidade esperada.

4 o cOmprandO da fOnte adequada


As empresas podem optar por adquirir produtos ou serviços de fornece-
dores exclusivos, denominados de ‘single-sourcing’ (como acontece com
frequência no segmento das montadoras de veículos), ou de vários deles
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

simultaneamente, denominados de ‘multi-sourcing’.

Numa primeira análise, parece importante eleger o fornecedor dos


produtos ou serviços que oferecerá benefícios diretos e imediatos após
compará-lo com outras fontes em relação à qualidade, prazo de entrega e
preço adequados. No entanto, é necessário investigar também qual será
seu procedimento no que diz respeito a possíveis alterações nos termos
acordados no decorrer do fornecimento.
CA P Í TU LO 7

Exemplo: O departamento de compras pode rejeitar a oferta do forne-


cedor A e optar pelo fornecedor B porque este apresenta uma proposta
melhor ou mais vantajosa em termos de preço e prazo de entrega. No
133

entanto, o fornecedor B pode se mostrar inflexível para alterar posterior-


mente os termos acordados, ou mesmo não ter a capacitação e o domínio
de tecnologia necessária para desenvolver novos produtos ou serviços
que possam ser necessários no futuro. O fornecedor A, por sua vez, embo-
ra não tenha superado a cotação inicial da empresa B, pode oferecer
um melhor potencial para aprimoramentos, ou possua a qualificação
necessária para atender novas necessidades futuras do cliente, além de
demonstrar uma melhor atitude e disposição para investir no aperfeiço-
amento dos produtos ou serviços que oferece.

Mas não se iluda. A escolha pela opção A não é assim tão fácil, porque
representa uma decisão estratégica com visão de futuro, enquanto a
auditoria interna da empresa se baseia em fatos:
é muitO difícil cOnVencer
um auditOr sOBre O mOtiVO
de ter escOlHidO um fOrne-
cedOr que apresentOu uma
prOpOsta mais desVantaJOsa

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


quandO O cOmpradOr tinHa
Outras fOntes cOm cOtaÇões
melHOres, mais atraentes e
dispOníVeis.

CA P Í TU LO 7
Nessas condições, o processo decisório não pode ser conduzido isolada-
mente pelo executivo de compras. Essas situações exigem uma decisão

134
colegiada (inclusive envolvendo os representantes da auditoria interna).
As vantagens e desvantagens de optar por um fornecedor exclusivo
(“single-sourcing”) ou de possuir uma base com vários fornecedores
(“multi-sourcing”) são apresentadas no quadro a seguir:

Vantagens desVantagens

• Maior economia de escala. • Maior vulnerabilidade no


caso da ocorrência de falhas
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

• Maior confidencialidade.
no fornecimento.
• Melhor comunicação.
• O fornecedor apresenta
• Cooperação amigável no
mais fragilidade no caso
desenvolvimento de novos
de flutuação nos níveis de
“SINGLE-SOURCING”

produtos e serviços.
demanda.
• Maior comprometimento e
• A empresa cliente pode se
esforço em função da maior
tornar refém do fornecedor
dependência.
que pode forçar os preços
• Relações mais fortes e para cima, caso não haja
duráveis. alternativas de suprimentos.
• Qualidade potencialmente
CA P Í TU LO 7

melhor devido às maiores


possibilidades de sistemas
fOrnecimentO

de garantias de qualidade.
135

• O comprador pode forçar • Dificuldade de encorajar


os preços para baixo atra- o comprometimento do
vés da competição entre fornecedor.
os fornecedores.
• Fornecedor tende a investir
• Existe possibilidade menos em novos processos.
“MULTI-SOURCING”

de mudar de fornecedor
no caso de falhas no • Maior dificuldade de obter
fornecimento. economia de escala.

• Várias fontes de conhe- • Maior esforço de


cimento e especializações comunicação.
disponíveis.
• Dificuldade em desenvol-
ver sistemas de garantia de
qualidade eficazes.
5 o reduZindO O nÚmerO de
fOrnecedOres
As empresas, praticamente em todos os setores, vêm cortando drastica-
mente o número de fornecedores com os quais farão negócios, e impie-
dosamente eliminando legiões de empresas que estão fora desse grupo.
Qual é a razão? A tendência da redução da base de fornecedores surgiu
em função da descoberta dos grandes benefícios gerados pelo desenvol-

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


vimento de relacionamentos cooperativos de longo prazo com fornece-
dores, em vez de manter uma negociação com rédeas curtas baseada em
hostilidade e na rivalidade entre compradores e vendedores.

A noção de que, se alguma competição entre os fornecedores é um bom


negócio para os compradores, e que mais deve ser melhor, e que muito
mais deve ser ótimo, está sendo desafiada. Certamente, existem riscos
associados à dependência de um único fornecedor e, embora existam

CA P Í TU LO 7
indicadores para proteger a empresa desses riscos, é fácil entender
porque uma organização não desejaria colocar todos os seus ovos em
um único cesto. Mas grandes pensadores da atividade de compras vêm

136
aumentando suas críticas às noções convencionais de um processo lici-
tatório que envolve vários fornecedores, e apontando os custos ocultos,
cada vez mais frequentes, criados por esse tipo de sistema. Primeira-
mente, há o custo de qualificação de cada um dos fornecedores, o que,
por si só, pode ser algo considerável. Além disso, informar cada fornece-
dor a respeito das necessidades do comprador toma tempo e dinheiro,
porque implica no envolvimento de várias pessoas de outros departa-
mentos da empresa nas reuniões de alinhamento da demanda.

Somadas todas essas despesas, é possível verificar que se trata de um enor-


me custo não contabilizado, mas que terá que ser absorvido pela organiza-
ção. E pior: ele aumenta à medida que se acrescenta mais um fornecedor.
É possível considerar também que, na tentativa de gerenciar hordas de
fornecedores e se concentrar com extremo rigor em extrair mais alguns
centavos do preço final, muitos estão perdendo a oportunidade de imple-
mentar programas de melhoria contínua capazes de reduzir os custos
da operação como um todo. O tempo que normalmente se gasta apenas
para acelerar os processos dos inúmeros fornecedores poderá ser gasto
com mais eficácia se trabalharmos apenas com alguns deles, buscando
encontrar maneiras de melhorar continuamente.
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

Um dos elos mais importantes na realização de valor com equilíbrio


de custos é a eficiente formação de alianças estratégicas, e também
um bom processo de suprimentos, em que os fornecedores tornam-se
elementos essenciais para a fluidez das relações comerciais.

Para se manter competitivas, as empresas devem desenvolver saltos


qualitativos. Portanto, por que não convidar os fornecedores para se
juntar a essa proposta? Trabalhar com fornecedores selecionados abre
CA P Í TU LO 7

uma imensa janela para opções de melhoria. Além disso, com poucos
fornecedores, haverá mais comprometimento da parte deles, o que leva
a uma maior familiaridade com o negócio do cliente e, provavelmente, a
137

melhores ideias e a uma maior disposição de ambas as partes para fazer


investimentos que facilitarão as melhorias.

6 o suBstituindO fOrnecedOres 2

O que os fornecedores têm feito para evitar que, no final do contrato,


seu cliente não o troque por outra empresa?”, questionou o mentor.

2 Sobre esse assunto, ver o anexo II ao final deste livro, que apresenta um excelen-
te texto, intitulado “Decisão estratégica da troca de um fornecedor” (uma adap-
tação do original “A estratégia de substituir ou manter um fornecedor”), que vale
a pena ler. Publicado aqui com a autorização do autor, Adm. Matheus Drumond
Costa – Gerente Geral de Suprimentos da MANABI S/A.
Nesse momento, João Pedro disse: “Os objetivos de compras estão muito
claros para mim agora. Entretanto, ainda tenho algumas dúvidas.

A primeira diz respeito ao que significa ‘Matriz Estratégica de Compras’,


e também como devo me relacionar com os fornecedores nos diversos
‘quadrantes’ dessa matriz. A outra dúvida, que remete a uma questão
mais estratégica do que de relacionamento, é como devo qualificar os
diversos fornecedores para conseguir construir valor com eles e obter os

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


melhores resultados para todos. Você poderia me esclarecer essas ques-
tões, por favor?” “Muito bem”, respondeu o mentor, “essa é uma questão
essencial para a evolução do seu desempenho na atividade de compras e,
por isso, vou detalhar os conceitos para seu melhor aprendizado:

matriZ estratégica de cOmpras


(KRALJIC PORTFOLIO PURCHASING MODEL)

CA P Í TU LO 7
Um dos modelos que é amplamente usado e que muitas empresas
descobriram ser útil na segmentação de seus fornecedores examina duas
características fundamentais, que, segundo seus praticantes acreditam,

138
devem moldar as decisões de compra:

1o Capacidade de substituição e/ou disponibilidade de


produtos semelhantes.

Essa dimensão avalia o grau de facilidade com que o comprador


poderia obter um fornecedor alternativo, em termos tanto de
custo quanto de facilidade de substituição.

2o Importância estratégica do produto do fornecedor.

Essa dimensão avalia a importância relativa do produto do


ponto de vista tanto estratégico quanto de custo.
Esse modelo, conhecido como relação ao custo final ou à posição
Matriz Estratégica de Compras estratégica da empresa.
(Kraljic Portfolio Purchasing
O modelo sugere também que os
Model), foi desenvolvido por Peter
compradores deveriam assumir
Kraljic e publicado pela primeira
uma postura diferenciada em
vez em 1983, na Harvard Busi-
relação aos fornecedores que
ness Review. Embora tenha sido
tenham capacitações ou produtos
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

desenvolvido há muito tempo,


únicos em detrimento daqueles
esse modelo, além de conhecido
cujos produtos podem ser facil-
e popular, é também muito útil,
mente substituídos. Ao unirmos
e ainda continua sendo utilizado
as duas dimensões acima cita-
por muitas empresas. Seu objetivo
das, teremos a matriz de quatro
é auxiliar os profissionais de
quadrantes, que revela as dire-
compras para otimizar a segu-
trizes da política de compras que
rança e reduzir custos, utilizan-
podem ter implicações significati-
CA P Í TU LO 7

do o máximo de seu poder de


vas na estratégia de suprimentos,
compra e transformando a tarefa
como se vê na figura a seguir:
de compras de uma atividade
139

simplesmente transacional para


uma atividade estratégica.

O fundamento básico desse mode-


lo é o fato de que os compradores
deverão se preocupar primor-
dialmente com os seus produtos
mais críticos ou com aqueles que
representam um maior volume de
custo. Devem, por isso, se preocu-
par menos com os produtos que
não fazem muita diferença em
matriZ estratégica de cOmpras
Ou matriZ de segmentaÇãO de
fOrnecedOres

ALTA

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


COMPRA "ALAVANCÁVEL"
COMPRA "ESTRATÉGICA"
I m pacto OU "COMPETITIVA"
e st r at é g i co
o u f i n a n ce i r o
da com p r a do
p r o duto n o s COMPRA "SIMPLIFICADA" COMPRA "DIRIGIDA"
r e su lta do s
OU "NÃO CRÍTICA" OU "CRÍTICA"

d i ficu l da d e d e s u bst itu ição ou


BAIxA d e o bt e nção d e a lt e r nat ivas ALTA

CA P Í TU LO 7
Cada um desses quadrantes apresenta características próprias:

14 0
1° cOmpra simplificada Ou
nãO crítica:

• Insumos com baixo risco no fornecimento e baixo custo


relativo;

• Abundância de oferta (‘genéricos’);

• As especificações técnicas são simples e parametrizáveis;

• As compras são ‘spots’ (na maioria das vezes), porque


não se repetem com frequência.
2° cOmpra dirigida Ou
crítica (riscO gerenciadO):

• Insumos com alto risco no fornecimento e baixo


custo relativo;

• Os fornecedores são restritos, em geral, de peque-


R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

no porte (sem mecanismos de gestão), ou, então,


monopolistas;

• A especificação técnica é relativamente complexa e


pouco parametrizável;

• As compras são ‘spots’ (geralmente), porque não se repe-


tem com frequência.
CA P Í TU LO 7

3° cOmpra alaVancada Ou
cOmpetitiVa:
14 1

• Insumos com baixo risco no fornecimento e alto custo


relativo (‘commodities’ com grandes volumes);

• Existe a possibilidade de utilização de substitutos;

• A unidade demandante tem um papel importante na


redefinição das especificações;

• Os fornecedores são profissionais e podem ajudar o


comprador tecnicamente;

• Na maioria das vezes, as compras são repetitivas.


4° cOmpra estratégica

• Insumos com alto risco no fornecimento e alto custo


relativo (insumos críticos de altíssimo valor);

• Mercado oligopolizado;

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


• A compra exige um maior tempo de negociação;

• O poder de barganha do fornecedor é alto;

• Os bens e serviços, na maioria das vezes, são críticos


para os custos e para a capacidade de produção.

CA P Í TU LO 7
As abordagens que são mais adequadas aos fornecedores em cada

14 2
um desses quadrantes e que devem ser utilizadas pelos comprado-
res serão apresentadas no capítulo que trata sobre as estratégias de
negociação em compras.
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

‘Value sOurcing’
(cOnstruindO ‘ValOr’ cOm
Os fOrnecedOres)

Claramente, as táticas tradicionais concentradas em


reduções drásticas dos preços dos fornecedores não
conseguem impulsionar a lucratividade e as receitas,
CA P Í TU LO 7

ou catalisar uma empresa inteira. Portanto, além de ter


o foco somente na redução dos custos de compras, as
empresas poderiam se concentrar também em utilizar
14 3

seus fornecedores para aumentar o potencial de lucros


nas vendas e, para promover essa iniciativa, os gestores
e executivos de compras deveriam levar em conta as
seguintes questões:
• As compras são vistas como impulsionadoras do cresci-
mento da receita ou somente da redução de custo?

• Os relacionamentos com os fornecedores estão sendo


maximizados?

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


• Os gastos e as categorias de fornecedores estão sendo
segmentados?

• O desempenho econômico do fornecedor está sendo posi-


tivamente afetado por nossas ações?

• É possível estabelecer a colaboração entre o departamento


de compras, os usuários e os fornecedores-chave no desen-

CA P Í TU LO 7
volvimento de novos produtos e na mudança e otimização
dos processos internos atualmente estabelecidos?

14 4
• O departamento de compras tem a mesma importância
das áreas de engenharia e de operações na empresa?

• Existem possibilidades de ganhos de produtividade ou


de economias que estão sob o controle da comunidade de
usuários e que o departamento de compras tem pouco ou
nenhum acesso e envolvimento?
Os consultores Matthew Anderson, David Bovet e Gregory Kochersperger,
da Mercer Management Consulting/USA, desenvolveram um modelo de
relacionamento com fornecedores que criam valor e que podem propor-
cionar um impulso à rentabilidade e acelerar o crescimento das vendas.

Faço, aqui, uma adaptação do modelo considerando o aumento de


desempenho, com o qual se obtém o ganho econômico e o desenvol-
vimento de capacidades, de onde vem o crescimento sustentado. Para
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

identificar qual tipo de relacionamento com os fornecedores é o mais


indicado, vou segmentá-los em três categorias (qualificados, preferen-
ciais e aliados estratégicos), levando em conta o nível de importância
para o negócio e o nível de interdependência com cada um deles.

À medida que cresce a


interdependência e a criticidade,
a cOlaBOraÇãO aumenta e O
CA P Í TU LO 7

fOcO muda de mOnitOramentO


de desempenHO para gestãO
14 5

estratégica de relaciOnamentOs.

1° fOrnecedOres qualificadOs
(Ou BásicOs)
A consolidação dos volumes a adquirir e a qualificação dos fornecedores
são passos críticos para se obter valor em compras. Os focos fundamentais
aqui são concentração de volume e preço. Como existem muitas opções de
suprimentos disponíveis no mercado, com reduzida dependência em rela-
ção às fontes de fornecimento, as compras podem ser ‘spot’ e alavancadas
através da rivalidade entre os diversos fornecedores, com a utilização de
processos de negociação e sistemas de compras, como leilões, por exemplo.
2° fOrnecedOres preferenciais
(Ou assOciadOs)
Nessa categoria, estão incluídos aqueles fornecedores (geralmente, em
número reduzido) com os quais a empresa pretende estabelecer uma
relação de médio para longo prazo e de colaboração mútua, porque
representam níveis médios de interdependência e de importância para
os resultados do negócio.

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


Nesse caso, as práticas de fornecimento devem ser executadas conjuntamen-
te com os líderes das unidades de compras, os consumidores internos e os
fornecedores externos, para proporcionar benefícios a partir de um conceito
ampliado de compras e favorecer, inclusive, o custo total de propriedade.

Os resultados para os consumidores internos é ‘consumir melhor’, o que


ocorre com o gerenciamento coordenado das exigências de qualificação
e do uso de materiais, por meio do questionamento das possibilidades

CA P Í TU LO 7
de padronização, da redução da complexidade, da racionalização das
quantidades consumidas, da aceitação de substitutos de menor custo
ou da redução do número de opções ou modelos requeridos.

14 6
Os fornecedores, por outro lado, beneficiam-se da medição de desempe-
nho, do compromisso de volume, do aumento da economia produtiva, da
redução de estoques, da previsão e do planejamento com visibilidade da
demanda, e da alavancagem para obterem melhores contratos com seus
próprios subfornecedores.

3° fOrnecedOres aliadOs
(Ou estratégicOs)
São aqueles fornecedores que se enquadram nos níveis elevados de
interdependência e de importância para o negócio da empresa. Eles
se caracterizam por manter um relacionamento de longo prazo, com
adoção de investimentos conjuntos em toda a cadeia de suprimentos e
compartilhamento de riscos e benefícios. Nos casos mais representativos,
ocorrem a integração dos fluxos de trabalho e o manuseio de materiais,
e os fornecedores-chave estão fisicamente presentes nas plantas de
produção do cliente (‘inventory’), fornecendo seus produtos (ou serviços)
diretamente à linha de fabricação ou montagem.
R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S

NÍVEL DE RELACIONAMENTO
O
Çã
ra e

figura 3
BO d
la Vel

FORNECEDORES
cO n í

GESTÃO DE INICIATIVAS
ALIADOS
ESTRATÉGICAS
NÍVEL DE INTERDEPENDÊNCIA

FORNECEDORES MELHORIA DE DESEMPENHO


ASSOCIADOS OPERACIONAL
CA P Í TU LO 7

GESTÃO DE DESEMPENHO
FORNECEDORES CONFORME CONTRATO
BÁSICOS
14 7

NÍVEL DE IMPORTÂNCIA PARA O FOCO DA GESTÃO DE


NEGÓCIO (CRITICIDADE) FORNECEDORES

Para determinar o nível desejado de interdependência e de relaciona-


mento com os fornecedores, é necessário combinar os fatores de impacto
nos negócios e a posição na Matriz Estratégica de Compras.
NÍVEL DESEJÁVEL DE RELACIONAMENTO

níVel de interdependência

aliadO preferencial qualificadO


estratégicO Ou assOciadO Ou BásicO

R E L AC I O N A M E NTO COM FOR N E C E D OR E S


nãO críticO críticO alaVancáVel estratégicO
altO
impactO nO negÓciO

CA P Í TU LO 7
médiO

14 8
BaiXO

O posicionamento atual em relação ao desejado permitirá estabelecer


um plano de desenvolvimento do fornecedor ou buscar novas alternati-
vas de fornecimento. Essa decisão deve basear-se em fatores como custo,
risco de mudança, tempo necessário para alcançar a evolução pretendida,
etc. Maltratar ou atormentar os fornecedores pode oferecer resultados
de curtíssimo prazo, mas um relacionamento baseado na colaboração e
vantagem mútuas não só é mais inteligente como também é mais eficaz
no longo prazo”, concluiu o mentor.
PODER E
INFLUÊNCIA

08
PO D E R E I N F LU Ê NC I A
A expectativa do trainee em relação ao seu encontro

CA P Í TU LO 8
com o mentor nesse dia era muito grande, porque o
tema a ser discutido abordava as principais fontes

15 0
de poder na negociação. Assim que ele encontrou
com o mentor, imediatamente solicitou: “Por favor,
explique-me, de forma objetiva, porque o domínio do
poder é tão importante e influencia tão diretamente
os resultados da negociação.”

E o mentor, sorrindo, respondeu: “Acho que posso


responder com uma frase atribuída a Voltaire: ‘Deus
não gosta de quem faz a guerra, mas fica ao lado de
quem atira bem!’
“Realmente, o sistema de poder Por isso, precisamos saber utilizar
dos negociadores exerce uma o poder, porque toda ação provoca
influência tão extraordinária uma reação. Se usarmos o poder
nas decisões das partes que para ‘massacrar’ o outro (principal-
pode conduzir o resultado das mente se ele não tiver alternativas
negociações para patamares, às e estiver à nossa mercê), ele se
vezes, vantajosos para uma delas, sentirá injustiçado e esse senti-
embora inaceitáveis pela outra, mento terá como consequência
mas, tendo em vista as condi- uma revanche futura por parte
ções que se apresentam naquela dele. O poder, portanto, deve ser
situação, impede que o lado que considerado como um recurso
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

se julgar lesado tenha condições neutro”, disse o mentor.


de alterar o curso desse resultado,
“Podemos considerar que o poder
sendo obrigado a aceitá-lo, mesmo
tenha princípios?”, perguntou o
contra vontade.
trainee ao mentor, para esclare-
CA P Í TU LO 8

Entretanto, no mundo dos negó- cer sua dúvida.


cios, ninguém ganha força oriunda
O mentor respondeu: “Sim, há dois
da fragilização do outro lado.
importantes princípios! São eles:
15 1

1° O PODER É INSTÁVEL
Todo poder é efêmero, ou seja, instável, temporário. Na negociação, o
poder muda de mãos com a maior facilidade: basta uma palavra, um
gesto, um sinal ou um suspiro em um momento inoportuno que o
poder passa para o outro.

A simples utilização de uma palavra numa frase muda o poder de mão.


Da mesma forma, informações ou comentários feitos por pessoas desa-
visadas de nossa empresa quase sempre causam impactos desastrosos
no nosso poder na negociação.
Preste bastante atenção! As pessoas ‘técnicas’, geralmente, não têm
malícia em termos de negociação e agem de forma ingênua. Na verda-
de, até sincera demais.

ExEMPLO
Um comprador está negociando duramente com um de
seus fornecedores quando, inadvertidamente, aparece um
técnico da fábrica e comenta em voz alta para todos: ‘Nosso
estoque está zerado. Se a matéria-prima não chegar dentro

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
de dois dias, a linha de produção vai parar!’. Já podemos
imaginar as consequências para o comprador nos resul-
tados da negociação por causa desse comentário ingênuo,
inoportuno e desnecessário.

CA P Í TU LO 8
2° O PODER SE MANIFESTA ATRAVÉS

15 2
DA PERCEPÇÃO DOS INDIVÍDUOS
Todo poder está baseado na percepção. Dessa maneira, para influen-
ciar qualquer pessoa, você não precisa (necessariamente) ter poder,
basta que outro ache que você tenha.

Exemplo: Imagine que você estivesse caminhando sozinho numa rua


afastada e sem movimento e um desconhecido pulasse na sua frente
apontando com uma embalagem de plástico vazia de molho ketchup,
mas envolta sob um blusão, dizendo que é um assalto e ordenando que
você entregasse não só sua carteira como também o celular para ele,
você obedeceria? Claro! Você se submeteria sem resistência, incrédulo
e tremendo de medo. Ele está com uma embalagem de plástico vazia
de molho ketchup, mas, como você não a está vendo (pois ela está
escondida embaixo do blusão), acha que é um revólver apontado para
você”, pontuou o mentor.

João Pedro disse: “Bem, agora, já conheço os princípios. E com relação


às fontes geradoras de poder, quais são elas e qual é a diferença entre
fontes genéricas e fontes exclusivas?

E o mentor respondeu: “Vou descrever para você agora todos os


conceitos relacionados ao tema ‘poder na negociação’. Prepare-se,
porque o assunto é extenso.

FONTES DE PODER
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

As fontes de poder podem ser ‘genéricas’ ou ‘exclusivas’. Diz-se que


são genéricas quando todos os lados envolvidos na negociação podem
possuir igualmente determinada fonte. A informação, por exemplo, pode
ser uma fonte disponível para todos os negociadores, independentemen-
CA P Í TU LO 8

te do lado em que estejam.

Diz-se que uma fonte de poder é exclusiva quando somente um dos lados
15 3

a possui e, em geral, o outro lado se submete. O contexto da negociação


com uma empresa monopolista ou mesmo com um cartel de empresas,
por exemplo, caracteriza uma situação em que somente um dos lados é
possuidor de poder, cabendo ao outro tão somente se submeter às condi-
ções impostas por quem detém o poder.

FONTES gENÉRICAS DE PODER


1 a FONTE DE PODER: INFORMAÇÃO
Na negociação, o objetivo principal da informação é conhecer o limite
real do outro, ou seja, qual é o máximo tolerável que você pode tirar do
outro de tal forma que ele ainda fique satisfeito. Para o comprador, uma
das maiores fontes de poder é conhecer a planilha de custos (breakdown)
do seu fornecedor. Por outro lado, uma das maiores fontes de fragilidade
para o comprador é permitir que os fornecedores tenham acesso irres-
trito aos usuários (técnicos). Permitir que o técnico negocie, então, nem
pensar! Nunca se esqueça de que o cliente interno contata o fornecedor e
compra direto porque o comprador dá espaço!

Entretanto, algumas considerações devem ser feitas com relação à


informação:

INFORMAÇÃO NÃO

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
É CONHECIMENTO

CA P Í TU LO 8
Qualquer pessoa pode produzir incríveis quantidades de fatos, dados

15 4
primários, números, etc. Por exemplo, uma edição diária do New York
Times tem mais informação que uma pessoa no século XVII poderia
obter em toda sua vida. Entretanto, dados, fatos e números apresentados
de forma solta, aleatória, sem conexão não têm valor algum isolada-
mente. É preciso interpretar esses dados e fatos, comparando-os com
as referências que temos, usar nossa intuição para que possamos ter a
informação realmente como conhecimento.

A informação nunca chega ‘pronta’ em nossas mãos; recebemos sempre


partes de informação e precisamos ajustá-las para que possamos ter a
noção do todo, da informação completa. Muitas vezes, apenas um sinal
pode indicar uma valiosa informação.
15 5 CA P Í TU LO 8 PO D E R E I N F LU Ê N C I A

INFORMAÇÃO
CONHECIMENTO
15 6 CA P Í TU LO 8 PO D E R E I N F LU Ê N C I A
Exemplo: Há alguns anos, a Açominas, uma usina siderúrgica de grande
porte, publicou a seguinte mensagem num jornal de grande circulação:

CARVÃO DE BAIxO TEOR FAZ AÇOMINAS


ECONOMIZAR US$ 4,5 MI POR ANO
A açominas está utilizando 27% de carvão de baixo teor
coqueificante (carvão soft) para produzir anualmente
1,2 milhão de toneladas de coque, o maior percentual já
praticado na siderurgia brasileira, segundo informa a
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

empresa. Misturado a carvões de melhor qualidade, o soft


está garantindo anualmente à usina uma redução de US$
4,5 milhões no custo da matéria-prima. No ano passado, o
uso do carvão soft reduziu o custo da tonelada de carbo-
CA P Í TU LO 8

no eletivo (custo do coque dentro do alto forno) de US$


116,45 para US$ 107,54.

Paralelamente ao acréscimo do soft na mistura de


15 7

carvões, a equipe técnica da coqueira vem realizando um


trabalho de otimização da produtividade da unidade, que
está operado a 102% de sua capacidade nominal, com a
mesma qualidade de produto.

Na opinião de Márcio Genelhu, chefe de Seção de Coquei-


ra (orcq ), esse é um passo importante para o aumento da
gradatividade do alto-forno, que deverá produzir este ano
2,2 de toneladas de gusa, 200 mil toneladas a mais que sua
capacidade normal. "Se esse trabalho não tivesse sido reali-
zado, talvez fosse necessário importar coque para atender à
demanda de forno", admite.
De fato, trata-se de uma notícia auspiciosa, porque, com a mudança de
uma matéria-prima (um carvão de baixo teor), a empresa conseguiu
obter uma economia de US$4,5 milhões de dólares por ano. Imagino
que a Diretoria publicou a novidade com o objetivo de prestigiar seus
funcionários, agradar os acionistas e atrair mais investidores. Por
outro lado, essa notícia também deve ter sido muito auspiciosa para os
fornecedores de carvão de baixo teor, porque, informados que o produ-
to que eles forneciam proporcionava essa economia, com certeza, eles
consideraram esse fato nas próximas negociações de preços com os
compradores da Açominas”, disse o mentor.

João Pedro, demonstrando certa ansiedade, “atropelou” o mentor e

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
questionou: “Mas quando devemos obter as informações?”

O mentor esclareceu:

“Parte das informações, o comprador consegue obter antes da negociação,


quase sempre através de terceiros. As demais informações relevantes o

CA P Í TU LO 8
comprador consegue perceber durante o processo, através das declarações
e dos sinais (involuntários, principalmente) apresentados pela outra parte.

15 8
ANTES DA NEgOCIAÇÃO
As informações devem ser obtidas antes da negociação e, quanto mais
cedo o comprador começar a buscar esses dados, mais fácil será obtê-los.
Muitas informações não são obtidas com o outro negociador, mas, sim,
com outras pessoas da empresa dele (secretárias, engenheiros, técnicos,
clientes antigos, porteiros, etc.). Eles responderão espontaneamente se
sua abordagem não for ameaçadora. Muitas vezes, outras pessoas de sua
empresa podem colher informações na empresa dele. Por exemplo, seus
engenheiros com os engenheiros dele, seus advogados com os advogados
dele, etc. De qualquer forma, a coleta e o registro das informações são
imprescindíveis para a montagem do sistema de inteligência, além do
contato com atuais funcionários.
O comprador pode contar também com estudos sobre a modelagem de
custos (cost modeling) dos seus fornecedores realizados pelas unidades
de engenharia de processos da sua empresa. A elaboração de modelos
de custos costuma ser fundamental porque pode oferecer o enten-
dimento necessário para diminuir as margens dos fornecedores ao
menor nível possível.

DURANTE A NEgOCIAÇÃO
A maioria das pessoas tende a ver a negociação como uma oportunidade
de influenciar o outro lado. Como resultado disso, falam mais do que
deveriam e, ao invés de ouvirem enquanto o outro fala, concentram-se
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

naquilo que dirão depois. Durante a negociação, os negociadores hábeis


ocultam seus verdadeiros interesses e necessidades (e, sobretudo, fraque-
zas), por isso é muito difícil conseguir informação nesses momentos.

Entretanto, fortalecer a relação e trocar informações é uma forma ideal


CA P Í TU LO 8

de dois negociadores analisarem a tarefa. Comece com perguntas não


ameaçadoras (principalmente com aquelas que o outro lado tem prazer
15 9

em responder) e, pouco a pouco, vá se aprofundando nas questões mais


importantes. Compartilhe informações. Quando se disponibiliza alguma
informação, alguma informação tende a voltar. Durante as negociações,
os comportamentos são comumente espelhados: quando se grita com
alguém, essa pessoa tende a gritar de volta; quando se pedem desculpas
ao outro, este tende a pedir desculpas também.

É possível aprender também por meio daquilo que não é dito, portanto,
preste atenção aos sinais não verbais e faça muitas perguntas.
• Questões ‘fechadas’, normalmente, usam frases prefixadas,
por isso resultam em respostas sem compromisso, como
‘sim’ ou ‘não’.

Exemplo: ‘Você gosta?’, ‘Você prefere assim?’.

• Questões ‘abertas’, ao contrário, ‘obrigam’ o cliente a


responder de forma informativa, permitindo ao vendedor
alinhar a necessidade do cliente com a sua oferta.

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
Exemplo: ‘Qual sua opinião sobre...?’.

• Questões ‘hipotéticas’ forçam novas ideias.

Exemplo ‘E se...?’.

CA P Í TU LO 8
• Questões ‘inquisitivas’ forçam um compromisso.

160
Exemplo: ‘Que teste você emprega para...?’.

• Questões ‘múltiplas’ têm como objetivo pressionar.

Exemplo: ‘De que forma você pode assegurar preço,


qualidade...?’

• Questões ‘dominantes’ induzem a resposta.

Exemplo: ‘Então, não haverá problema em...?’.


Embora, talvez, não se consiga respostas a todas as perguntas, será
possível obter mais informações observando as declarações e sinais do
outro. Por exemplo, o comprador pergunta ao fornecedor: “Qual é o seu
preço pretendido para realizar esse serviço”? Se ele responder de alguma
dessas formas: “Bem, entre R$X e R$Y”, ou “É mais ou menos...”, ou ainda,
“Está na faixa de...”, qual é, exatamente, a informação que podemos
extrair? Declarações assim significam que o fornecedor está hesitante e
sem saber o que responder, pensando: “Se pedir pouco, me desvalorizo; se
pedir muito, ele pode rejeitar. Vou pedir uma faixa, qualquer valor nessa
faixa me atende”.

Outro exemplo: os animais emitem sinais quando estão prestes a atacar:


PO D E R E I N F LU Ê NC I A

o cão mostra os dentes, o gato eriça o pelo do corpo e engrossa o rabo,


os equinos baixam a orelha. O ser humano também emite sinais: nosso
corpo ‘fala’! Nas últimas décadas, pesquisas realizadas por pesquisadores
do comportamento humano demonstraram que, de fato, 70% das comu-
CA P Í TU LO 8

nicações entre os seres humanos são não verbais. Dito de outra forma, as
declarações verbais apresentadas em um contato pessoal representam
apenas 30% das mensagens que as pessoas realmente querem comuni-
161

car. E mais importante: a comunicação não verbal, além de mais precisa,


é também mais verdadeira”, finalizou o mentor.

O trainee voltou a interferir na explanação do mentor: “Mas quais são


os tipos de informação de que necessitamos?”

E o mentor respondeu: “Quanto mais você souber sobre si mesmo, suas


reais necessidades, seu objeto de negociação (seja produto ou serviço),
sua própria empresa, as tendências dos cenários, o outro negociador e a
empresa dele, mais forte você será. Por isso, dois importantes aspectos
devem ser considerados:
• Desenvolver esforços e dedicar tempo para obter tantas
informações quanto possível sobre todos os componentes
desse campo de forças;

• Controlar de perto o fluxo de informações a seu próprio


respeito (e da sua empresa) para o outro negociador.
Informações ou comentários feitos por pessoas
desavisadas de nossa empresa quase sempre causam
impactos desastrosos no nosso sistema de poder nos
processos de negociação.”

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
João Pedro perguntou: “E quais são os erros que devemos evitar para
preservar o nosso poder na negociação?”

O mentor, então, respondeu:

CA P Í TU LO 8
• “TER CERTEzA (SEM TER) DO QUE O
OUTRO QUER;

162
• REVELAR O PODER MUITO CEDO;
• ACHAR QUE O OUTRO CONHECE SEUS
PONTOS FRACOS;
• REVELAR AO OUTRO O SEU PROBLEMA
EM CASO DE IMPASSE;
• MISTURAR SUPOSIÇõES COM FATOS;
• AFIRMAR QUE TEM CERTEzA DE COISAS
QUE NÃO ESTÁ SEgURO;
• FAzER CÁLCULOS DE CABEÇA.”
2 a FONTE DE PODER:
OPÇõES (CONCORRÊNCIA)
O mentor continuou sua explanação, falando, agora, sobre a segunda
fonte de poder: “Henry Kissinger, ex-Secretário de Estado americano,
disse certa vez que a ausência de opções torna as mentes duras espanto-
samente claras. Pense como você se sentiria numa entrevista de emprego
em duas situações distintas: na primeira, tendo várias outras propostas
para escolher; na segunda, sem qualquer outra proposta para avaliar.
Como transcorreria a negociação nos dois casos? A diferença é o poder!

Veja o exemplo de um concessionário autorizado de uma marca qual-


PO D E R E I N F LU Ê NC I A

quer de automóvel: quando um veículo novo é lançado pela montadora e


é sucesso de mercado (isso significa que todos os consumidores deseja-
rão adquiri-lo), a ‘disputa’ para adquirir esse bem provoca um aumento
em seu preço. Os clientes que desejarem adquirir aquele automóvel terão
CA P Í TU LO 8

que pagar mais, e esse ‘mais’ pode se apresentar disfarçado de várias


maneiras – acessórios adicionais, versões mais sofisticadas do veículo,
prazos de entrega mais longos –, mas, independentemente de qual seja a
163

tática utilizada pelo vendedor, o cliente terá que pagar um ‘ágio’ para ter
o privilégio de receber o carro.

Da mesma forma, os profissionais de compras devem agir com seus


fornecedores para aumentar seus próprios ganhos, o que significa pagar
preços mais baixos por aquilo que estão adquirindo. Como os fornece-
dores ‘disputam’ ou ‘concorrem’ pelo dinheiro que os compradores têm
para adquirir seus produtos ou serviços, os compradores, então, têm que
negociar, forçando os preços para baixo, jogando uns fornecedores contra
os outros e buscando a melhor rentabilidade. Se o fornecedor acreditar
que tanto faz para o comprador adquirir algo dele ou do concorrente
dele, e que seus produtos ou serviços são idênticos, o fornecedor conclui-
rá que só há uma forma de ser diferente: baixando os preços.
Moral da história: ter poder é controlar a incerteza do outro!”, desta-
cou o mentor.

“Ok!”, disse João Pedro, “mas o que devemos fazer para evitar essas
armadilhas?”

E o mentor esclareceu: “Nenhuma técnica de negociação pode garantir


seu sucesso quando o pêndulo da balança está desequilibrado em favor
do outro. Em resposta ao poder, o limite extremo que qualquer método
de negociação pode fazer para que qualquer acordo satisfaça seus inte-
resses o máximo possível é atender a dois objetivos: protegê-lo de fazer
um acordo que você deveria evitar ou extrair o máximo dos recursos que

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
você efetivamente dispõe.

COMO PROTEgER-SE E EVITAR UM


ACORDO DESVANTAJOSO

CA P Í TU LO 8
Quando você está focado em alcançar uma meta muito desejada, todo
seu esforço fica concentrado na sua vontade de realizá-la, e você fica

164
disposto a ousar e assumir riscos. Nesse momento, o vigor e a energia da
intenção são muito fortes. Uma pequena possibilidade de que algo possa
prejudicar seu sucesso no alcance dessa meta, por menor que seja, dispa-
ra um sistema de defesa, para evitar que toda energia, tempo e dinheiro
já investidos nesse objetivo sejam perdidos.

A negociação, frequentemente, apresenta uma situação semelhante:


você se preocupa em não fechar um negócio importante em que investiu
muito tempo de si mesmo. Nessas condições, há um grande perigo que
seja bem receptivo às opiniões do outro lado, e que concorde depressa
demais. Na verdade, tentando se proteger, os negociadores estabelecem
suas posições antecipadamente, baseadas na pior solução aceitável: para
os compradores, o preço mais alto que eles estariam dispostos a pagar, e,
para os vendedores, o preço mais baixo que eles poderiam considerar.
Entretanto, preparando-se somente para discutir posições ou metas
rígidas, os negociadores irão ferir o relacionamento interpessoal, porque
terão o pensamento voltado apenas para ofertas máximas e mínimas, e a
negociação, provavelmente, será transformada numa estressante disputa
de desejos, na qual cada parte, como numa batalha, apresentará suas
armas mais poderosas, insistindo que a sua meta é a que está correta.

Esse procedimento de defesa, embora válido, principalmente em situações


claramente desvantajosas para o negociador, apresenta alguns riscos e
desvantagens. Em primeiro lugar, seu piso mínimo pode ser baixo demais
e, vinculado a uma posição inflexível, impedir que você feche o acordo;
ou seu piso máximo pode ser alto demais e, com isso, gerar em você um
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

sentimento de frustração ou de perda caso o outro aceite fechar o negócio


sem qualquer resistência.

Em segundo lugar, esse procedimento sufoca a criatividade. Por defini-


ção, o preço mínimo é uma posição que não se pretende abrir mão. Se os
CA P Í TU LO 8

negociadores discutem apenas a respeito de posições, eles, provavelmen-


te, não estarão em condições de identificar e explorar os reais interesses
165

que se escondem sob as posições. Esse comportamento inibe a imagina-


ção e reduz o estímulo para inventar outra solução que pudesse conciliar
os interesses de todos. Por exemplo, em vez de vender uma casa por um
piso mínimo, o proprietário poderia vendê-la por um valor mais baixo
ainda, mas compensando essa perda através da entrega do imóvel dali a
seis meses, utilizando a garagem por dois anos, etc.
COMO EXTRAIR O MÁXIMO DOS
RECURSOS DISPONÍVEIS

OBSERVAÇÃO IMPORTANTE:
O conceito de ‘alternativa de escape’, que será descrito
a seguir, foi originalmente definido pelo Projeto de
Negociação da Harvard Business School. O objetivo
principal de contemplar uma alternativa de escape, para

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
os autores, seria impedir que o negociador realizasse um
acordo que deveria rejeitar.

CA P Í TU LO 8
Essa alternativa é conhecida na teoria por diversas siglas: a original
em inglês BTNA (Best Alternative to Negociated Agreement), traduzida
no Brasil por MAANA (Melhor Alternativa À Negociação do Acordo) ou

166
MAPAN (Melhor Alternativa Para o Acordo Negociado).

Proteger-se de fazer um acordo inadequado é uma coisa. Extrair o máximo


dos recursos que estão disponíveis para construir um bom acordo é outra.
O princípio que rege a segunda proposta é o de que o poder relativo de
negociação de duas partes depende, primordialmente, de quão atraente
para cada uma delas é a opção de não chegar ao acordo (‘no deal’).

Em outras palavras, para se fortalecer na negociação, elabore um plano


alternativo (‘plano B’, ‘rota de fuga’ ou ‘plano de escape’) para ser
utilizado caso o outro lado não lhe ofereça uma proposta atraente, ou,
pelo menos, um resultado mínimo aceitável por você. Saber o que você
irá fazer se a negociação não chegar a um acordo, dar-lhe-á confiança
adicional no processo da negociação.
Talvez por excesso de confiança, você pode ter o costume de negociar
temas importantes sem construir, primeiramente, um plano alternativo,
pois pensa: ‘Vou ouvir o que o outro tem a dizer. A partir daí, vou nego-
ciar e ver o que acontece. Como o acordo precisa, obrigatoriamente, ser
aceito por mim, se as coisas não correrem bem, vou pensar o que mais
poderei fazer.’

É possível que você diga a si mesmo que, se não chegar a um acordo,


poderá optar pelas alternativas ‘x’, ‘y’ ou ‘z’, e, em sua mente, você consi-
dere a soma dessas opções mais atraente do que fechar a atual negocia-
ção. O problema é que você não poderá contar com a soma total de todas
essas opções: se não chegar a um acordo, terá que contar com apenas
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

uma delas, e talvez por isso você esteja adotando uma visão rósea
demais das consequências de não chegar a um acordo.

O plano B não é uma acomodação, uma concessão, um acordo menos


interessante ou uma opção por um acordo a qualquer preço, mas, sim,
CA P Í TU LO 8

uma alternativa a um acordo, uma linha de ação passível de ser seguida,


independentemente da concordância do outro. Caso você não chegue a
167

um acordo com sua empresa com relação às suas condições desejadas


de trabalho, seu plano B pode ser perder esse emprego e optar por uma
nova oportunidade já garantida em outra empresa. Opções dependem
da concordância do outro no final. O plano B, não. Portanto, o plano B
significa as ações que você vai adotar para ajudar a garantir que seus
interesses sejam respeitados mesmo que o outro não colabore.
Um plano B para um comprador que tem dificuldades para negociar
com um fornecedor importante e inflexível pode ser representado pelas
seguintes alternativas:

• IMPORTAR O BEM OU SERVIÇO;

• DESENVOLVER NOVOS
FORNECEDORES ALTERNATIVOS;

• ESTIMULAR O MERCADO

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
NACIONAL A PRODUzIR EM
SUBSTITUIÇÃO à IMPORTAÇÃO;

• UTILIzAR PRODUTOS SUBSTITU-

CA P Í TU LO 8
TOS, SUCEDâNEOS OU SIMILARES;

• ANALISAR TODAS AS POSSIBILI-

168
DADES DO MERCADO FORNECEDOR
(INCLUSIVE, PLAYERS MUNDIAIS);

• VERTICALIzAR (PRODUzIR NA
PRóPRIA EMPRESA);

• ANALISAR POSSIBILIDADES DE
APORTE OU INVESTIMENTO DE
CAPITAL NO FORNECEDOR.
Não são todas as negociações que concluem com um acordo. Nem deve-
riam. Em algumas situações, é melhor sair fora, seja porque os custos do
acordo proposto superam os benefícios, seja porque existem outros que
estão mais em condições de oferecer-lhe um negócio melhor.

Construir seu plano B antes da negociação é absurdamente necessário


para ajudá-lo a decidir ficar ou sair da negociação. Alguns negociado-
res entram numa negociação sem saber o que farão se não consegui-
rem fechar o acordo, e ficam inseguros se devem continuar na mesa
e concluir um acordo qualquer, por pior que seja, ou sair fora. Nunca
subestime o poder de se ter a noção exata do que você fará se não conse-
guir alcançar o acordo desejado.
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

Você não pode assumir que já sabe qual é sua melhor alternativa sem
ao menos pensar antes, de maneira mais criativa, a respeito de outras
formas de satisfazer seus interesses. Lembre-se de que a construção
do plano B não é apenas mais um meio para pressionar o fornecedor a
CA P Í TU LO 8

fazer concessões, mas, sim, um conceito poderoso para ajudá-lo a focar


justamente onde você quer chegar e os diferentes caminhos que você
169

pode optar sem ter que aceitar um negócio com condições que não
satisfazem seus interesses.

Saber o que você fará caso não chegue a um acordo exige o desenvol-
vimento de um processo para fortalecer sua situação. Esse processo é
constituído por quatro passos distintos: a) investir na geração e no aper-
feiçoamento de opções (ideias) atraentes; b) validar essas ideias e torná-
las opções reais; c) hierarquizar as opções de acordo com seus interesses;
e d) selecionar e eleger a melhor alternativa disponível.
INVESTIR NA gERAÇÃO E NO APERFEIÇOA-
MENTO DE OPÇõES (IDEIAS) ATRAENTES
O objetivo é criar soluções e inventar uma lista de providências que
poderão ser adotadas caso não se chegue a um acordo. As alternativas
constituem a matéria-prima para a tomada de decisões. Elas repre-
sentam o espectro de escolhas possíveis para a busca por objetivos. As
alternativas de escape podem ser identificadas, em qualquer situação
de negociação, a partir da pergunta: “O que farei se essa negociação
não se concretizar?”

Explorar as opções que podem existir fora da negociação sempre melho-

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
ra seu nível de oportunidade. Alternativas atraentes, entretanto, podem
não ser óbvias de imediato. Leva tempo para identificá-las, e mais tempo
ainda para torná-las atraentes. Mas, em negociações estratégicas, esse
tempo sempre é bem empregado, já que ter fortes alternativas melhora a

CA P Í TU LO 8
habilidade de alcançar um bom acordo na negociação em curso.

VALIDAR ESSAS IDEIAS E TORNÁ-LAS

17 0
OPÇõES REAIS
Acreditar que as alternativas geradas em nossa imaginação irão funcio-
nar na prática como uma fonte extraordinária de poder consiste em um
comportamento amador e leviano, podendo conduzir o resultado da
negociação para situações de absoluto fracasso em relação às nossas
pretensões. Portanto, as alternativas que apresentam uma perspectiva
de serem utilizadas deverão ser previamente validadas, ou seja, deve-
rão estar em condições de serem adotadas sem restrições, caso sejam
a opção desejada. O objetivo é aperfeiçoar algumas das ideias mais
promissoras e convertê-las em opções práticas e reais antes do início da
negociação. Como é impossível saber antecipadamente qual delas será a
escolhida, todas devem estar bem desenvolvidas e validadas. Em outras
palavras, o negociador deve tornar verdadeiras todas as opções, para que,
ao se decidir por uma delas, tenha certeza de que estará efetivamente
disponível para ele.

HIERARQUIzAR AS OPÇõES DE ACORDO


COM SEUS INTERESSES
Assim como determinados cortes e estilos de roupa favorecem certas
pessoas, alguns tipos de alternativas se ajustam melhor a problemas
específicos. Nesse momento, temos que avaliar qual das alternativas
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

elaboradas e validadas atendem melhor aos nossos interesses e colocá-las


numa hierarquia.

Estabeleça critérios objetivos para julgar suas alternativas por grau de


importância para você e compare como cada alternativa pode impactar
CA P Í TU LO 8

esses critérios. Para fazer comparações, é preciso definir como lidar com
cada alternativa e expor as consequências da utilização de cada uma
delas em relação a seus objetivos.
17 1

O que é decidido hoje pode afetar as escolhas de amanhã, e os objetivos


futuros devem ter influência sobre as decisões atuais. Assim, muitas
decisões importantes estão interligadas no tempo. Como as consequên-
cias de uma decisão afetam o futuro, é necessário projetar o pensamento
no tempo a fim de revelar o verdadeiro significado de uma decisão. Por
isso, ao pensar em cada alternativa, em vez de imaginar que poderia
escolhê-la, imagine que já a escolheu. A projeção no futuro o ajuda a
concentrar-se nas consequências de longo alcance, e isso auxilia a obser-
vação em seu contexto real.
SELECIONAR E ELEgER A MELHOR ALTER-
NATIVA DISPONÍVEL
Se você não chegar a um acordo nas negociações, eleja sua melhor alter-
nativa disponível, pois ela representa o ponto em que é mais vantajoso
para você sair da negociação. Funciona como uma balança: de um lado,
você coloca o que está sendo oferecido na mesa pelo outro negociador;
do outro, a sua melhor alternativa de escape disponível.

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
CA P Í TU LO 8
17 2

MELHOR CONDIÇõES
ALTERNATIVA APRESENTADAS
DISPONÍVEL PELA OUTRA
PARTE
Se você tem uma proposta que é mais atraente que sua melhor alternati-
va, incrementando-a você garante a si mesmo um melhor resultado. Mas,
quando essa alternativa consegue atender aos seus interesses melhor do
que a proposta do outro, você deve sair da negociação. E não se surpre-
enda se, nesse momento, o outro lado apresentar concessões adicionais
e oferecer condições ainda melhores para concluir o acordo. Portanto,
nunca entre numa negociação sem ter alternativas de escape, porque
isso favorece a sua autoconfiança e interfere na percepção e no compor-
tamento do outro negociador, já que, quando um dos lados percebe que
o outro possui opções, sente-se enfraquecido (ainda que as alternativas
do outro sejam impróprias).
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

Mas, um alerta importante: todos os negociadores têm uma melhor


alternativa, mesmo não tendo pensando a esse respeito. Assim, ao se
preparar para negociar com um fornecedor, seria útil conhecer também
qual é o limite a partir do qual é melhor para ele sair da negociação.
CA P Í TU LO 8

Um dos maiores perigos em uma negociação é não conhecer as alterna-


tivas de escape do outro lado. Se as alternativas de escape têm a chance
17 3

de ser um ponto forte para o outro negociador, você também deveria


refletir sobre isso previamente, imaginando-se no lugar dele. A pergunta
a ser feita é simples: ‘Se ele não fechar comigo, o que irá fazer?’ ou ‘O que,
exatamente, acontecerá com ele se não fechar comigo?’

Se ele estiver superestimando suas próprias alternativas de escape, você


pode concentrar-se em diminuir-lhe as expectativas. E isso se aplica
tanto ao outro negociador (individualmente) quanto à empresa dele.
Portanto, trabalhe para que o outro fique sem alternativas.
Para exemplificar, vou contar uma história:

‘Um rei prometeu dar um pote de ouro para quem fosse o


maior mentiroso do reino. Uma fila interminável formou-se
no castelo, sem que qualquer candidato pudesse apresentar
ao rei uma mentira ‘verossímil’. Por fim, chegou um jovem
simples, que disse ao rei: ‘Majestade, estou aqui para casar
com a princesa, sua filha!’.

O rei retrucou: ‘Casar com minha filha? Por acaso és

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
maluco?’”

O jovem respondeu: ‘Absolutamente, majestade, o senhor


me prometeu a mão de sua filha em casamento!’

O rei, então disse: ‘És realmente maluco. Eu não prometi a

CA P Í TU LO 8
você a mão da minha filha em casamento.’

O jovem imediatamente lembrou-lhe: ‘Então, majestade, a

17 4
minha declaração é falsa?’

O rei: ‘Claro que é!’

O jovem: ‘Então, é uma mentira o que estou dizendo!’

O rei: ‘Claro que é!’

O jovem: ‘Então, majestade, o pote de ouro é meu!’

O rei, percebendo a esperteza do jovem, ainda tentou resis-


tir: ‘Na verdade, pensando bem, não é uma mentira.’

E o jovem, prontamente argumentou: ‘Então, majestade, que


dia podemos marcar o meu casamento com a princesa?’
Finalizando, quando os dois lados têm alternativas disponíveis muito
atraentes, é bem possível que o melhor resultado na negociação – para
as duas partes – seja não chegar a nenhum acordo. Nesse sentido, uma
negociação bem-sucedida é aquela em que as partes descobrem, educa-
da e gentilmente, que a melhor maneira de alcançar os interesses de
cada uma é não concluir a negociação.

3 a FONTE DE PODER: RISCO


O conceito de risco como fonte de poder na negociação significa que, quem
puder assumir mais riscos – inclusive o de abandonar a mesa durante a
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

negociação até mesmo sem ter chegado ao seu final (‘no deal’) –, sinaliza
para o outro que não necessita daquele resultado e que, por isso, não está
disposto a fazer qualquer tipo de concessão para concluir o acordo. Assim,
beneficiado por sua posição fortalecida, principalmente se o outro estiver
CA P Í TU LO 8

dependendo de concluir aquele acordo, será favorecido com um resultado


mais vantajoso. Da mesma forma, se o outro lado não puder sair da nego-
ciação, mesmo quando o resultado não lhe convém, estará numa situação
17 5

complicada, pois, refém da necessidade imperiosa de fechar o acordo e, por


isso, enfraquecido, terá forçosamente que oferecer concessões expressivas
para conseguir alcançar seu objetivo”, disse o mentor.

“O senhor teria alguns casos para exemplificar essa fonte de poder?”,


perguntou o trainee ao mentor.

“Perfeitamente”, respondeu o mentor, “vou apresentar dois deles:

ExEMPLO 1
Conheci um empresário, recém-divorciado, que relatava, numa roda
de amigos, o recente acordo de pensão alimentícia que havia selado
judicialmente com a ex-esposa. Quando perguntei a ele se, considerando
serem esses tipos de processo tão estressantes e penosos para as partes
(e é o que geralmente acontece com todas as pessoas que vivenciam
circunstâncias semelhantes), como ele havia resolvido a questão assim
de forma tão rápida e facilmente, ele me declarou: ‘Eu não saio de uma
mesa de negociação sem fechar o acordo!’

Eu disse a ele: ‘Então, meu caro, prepare-se para fazer concessões signifi-
cativas todas as vezes que for negociar, porque, se sua intenção é sempre
fechar o acordo, qualquer acordo irá lhe atender, mesmo que seja desvan-
tajoso para você.’

ExEMPLO 2

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
Certo dia, uma amiga me ligou e comentou que estava querendo
comprar uma loja num shopping em São Paulo para iniciar uma ativida-
de comercial, mas que o preço pedido pelo proprietário do imóvel estava

CA P Í TU LO 8
muito alto. Ela, então, solicitou minha orientação para melhorar o seu
poder na negociação e reduzir o preço da loja.

Eu disse: ‘Apresente a ele, de uma forma elegante, alguns argumentos

17 6
que possam favorecê-la na negociação, como, por exemplo, que você
não tem o recurso financeiro suficiente e não quer se endividar, ou que
existem outras alternativas que, embora não sejam do mesmo nível que
a loja dele, estão com preços consideravelmente mais baixos, mas que
você daria preferência para a loja dele e estaria disposta a pagar até um
pouco mais do que o valor das outras lojas, e que, se ele não quisesse
reduzir o preço, você, infelizmente, teria que comprar uma das outras
lojas mais baratas.’

Ela argumentou: ‘Mas eu não posso correr esse risco e perder a oportuni-
dade de adquirir essa loja, porque ela é espetacular e de todas as que eu
já vi é a única que me encantou!’
Eu, então, respondi: ‘Bem, já que você não tem outra alternativa e nem
quer correr o risco de perder a loja, então, pague o preço que o vende-
dor pediu!’

Portanto, o risco como fonte de poder na negociação manifesta-se da


seguinte forma:

• QUEM PODE CORRER MAIS RISCOS


NA NEgOCIAÇÃO, INCLUSIVE DE NÃO
TER NECESSIDADE DE FECHAR AQUELE
NEgóCIO (‘NO DEAL’), TEM MAIS PODER;
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

• QUANDO VOCÊ PRECISA


(OBRIgATORIAMENTE) FECHAR UM
NEgóCIO, SUA POSIÇÃO SE TORNA FRÁgIL.
CA P Í TU LO 8

Mas a capacidade de administrar o risco, e com ela a vontade de correr


17 7

riscos e de fazer opções ousadas são elementos-chave da energia que


impulsiona o dardo na direção certeira do alvo de nossos sonhos e
ambições. Na verdade, é muito bom assumir riscos se você tiver condi-
ções de gerenciá-los bem, pois compreender o risco, medi-lo e avaliar
suas consequências significa consignar o ato de correr riscos em um dos
principais catalisadores para converter o inimigo, que é a incerteza, em
uma oportunidade.

Ninguém enfrenta um risco na expectativa de fracasso. Apenas o teme-


rário corre riscos quando as regras são obscuras, ou faz opções baseadas
nas probabilidades de um resultado sem considerar suas consequências.
A essência da gestão do risco está em maximizar as áreas onde temos
certo controle sobre o resultado, enquanto minimizamos as áreas onde
não temos absolutamente nenhum controle sobre o resultado, e onde o
vínculo entre o efeito e a causa está oculto de nós.

Você deseja uma válvula que não vaze e faz todo o possível para
desenvolvê-la. Mas no mundo real só existem válvulas que vazam
e você tem que determinar o grau do vazamento que pode tolerar”,
argumentou o mentor.

João Pedro, então, perguntou: “E quais são os erros que devemos evitar
com o objetivo de preservar o nosso poder na negociação?”

E o mentor respondeu:

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
• BLEFAR à TOA;

• PAgAR ADIANTADO;

CA P Í TU LO 8
• FICAR INTIMIDADO PELA OFERTA
FINAL;

17 8
• ARRISCAR-SE à TOA (ORgULHO,
IMPACIÊNCIA);

• NÃO CONTROLAR O EMOCIONAL.

4 a FONTE DE PODER: LEgITIMIDADE


O mentor, agora, explanou sobre a quarta fonte de poder:

"O poder da legitimidade se expressa através de documentos, condutas


ou expressões utilizadas pelos negociadores que caracterizam algo que
é muito difícil (ou quase impossível) de ser alterado. Responda sincera-
mente: Você leria um contrato padrão para financiamento de imóveis da
Caixa Econômica Federal? Muito provavelmente, você pensaria assim:
‘É um contrato padrão, utilizado para todos os clientes. Acho que não
vale nem a pena perder tempo em ler para tentar negociar qualquer
cláusula.’ E, assim, todos nós assinamos um contrato sem ler!

Mas, e se o contrato fosse digitado na nossa frente por um advogado


da mesma instituição? Sem dúvida, você leria item por item, tentando
descobrir nas entrelinhas qualquer sinal que pudesse te prejudicar no
futuro. Por que nosso comportamento muda nessas circunstâncias?
Porque formulários impressos, contratos padrão, tabelas de preço, etique-
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

tas elegantes, lista de descontos, condições padronizadas, regras, normas


e procedimentos da sua empresa (principalmente se forem impressos)
têm o poder da legitimidade e, por isso, são obedecidos e não costumam
ser questionados. Seus efeitos são quase mágicos. Eles hipnotizam as
CA P Í TU LO 8

pessoas”, destacou o mentor.

“Como assim?”, perguntou o trainee.


17 9

E o mentor exemplificou: “Veja como as coisas funcionam: você está


numa operadora de telefonia móvel negociando o seu pacote de serviços.
O jovem atendente pergunta o número do seu CPF, aperta um botão no
computador, espera uns segundos e informa: nosso sistema indica que a
franquia mais adequada ao seu perfil de consumo é essa. Ele até mostra
a tela do computador a você, que consegue enxergar seu nome no meio
de uma quantidade enorme de números e figuras.

Você não entende de sistemas de telefonia móvel, não sabe qual é o


cálculo matemático que o computador fez, não tem condições de avaliar
se está certo ou errado, mas – contrariando todas as regras do bom
senso – é capaz de acreditar no que o atendente está sugerindo e aceita
a proposta dele ‘cegamente’. E como negociar com pessoas famosas que
aparecem frequentemente na mídia (diretores de grandes empresas,
presidentes de entidades de classe), com indivíduos de status superior
(gestores ou dirigentes de outras unidades de nossa empresa), ou
mesmo com uma autoridade publicamente reconhecida (um Senador,
um Secretário de Governo, um Presidente da estatal, etc.)? Você fica
intimidado, embora eles sejam seres humanos tão importantes ou
especiais quanto você! Ou, talvez, até menos.

Outros exemplos mais corriqueiros que o comprador pode utilizar para


fragilizar o fornecedor:

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
• ‘É NORMA DA NOSSA EMPRESA PAgAR
SOMENTE COM 28 DIAS. EU NÃO TENHO
AUTORIDADE PARA MUDAR ESSA NORMA.’

CA P Í TU LO 8
• ‘NOSSO ORÇAMENTO É INSUFICIENTE
PARA PAgAR TANTO.’

18 0
• ‘NóS PROVISIONAMOS NO NOSSO
ORÇAMENTO SOMENTE UM VALOR LIMITE
MUITO MENOR (QUE O PREÇO QUE ESTÁ
SENDO COBRADO) PARA CONTRATAR
ESSE SERVIÇO.’

Muitos fornecedores ouvem essas declarações, balançam a cabeça e acei-


tam as condições de prazo de pagamento, e ainda ajustam seus preços
para que se ‘encaixem’ na dotação orçamentária do comprador. Porém,
preste atenção, você pode até usar artifícios para aumentar sua legitimi-
dade e, por consequência, seu poder na negociação, mas não permita que
o outro estipule regras e normas para você, porque, se você os aceitar,
fatalmente ficará fragilizado na negociação, acatando as condições dele.

O fato é que passamos toda nossa vida preenchendo formulários sem


questioná-los, obedecendo a ordens sem qualquer restrição, ouvindo
regras e regulamentos sem a menor resistência. As pessoas estão condi-
cionadas às regras, aos formulários impressos e, por isso, ninguém os
questiona. Isso tudo faz parte do poder da legitimidade.

Apenas como exemplo de ‘legitimidade’, nossa empresa realizava cursos


abertos ao público no mesmo edifício do nosso escritório. O prédio tinha
um auditório de muito bom nível, com poltronas confortáveis, mas, para
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

um conforto ainda maior dos participantes, fornecíamos pequenas pran-


chetas manuais de acrílico, muito bonitas e bem acabadas, para auxiliar
nas anotações de aula. Entretanto, no final do curso, todos os partici-
pantes levavam com eles as pranchetas, embora fossem informados que
elas deveriam ser devolvidas. Esse costume dos alunos nos causava um
CA P Í TU LO 8

transtorno muito grande, porque estávamos sempre preocupados com a


falta delas para a realização dos outros cursos, já que, às vezes, tínhamos
18 1

dificuldade de adquiri-las com o mesmo padrão de acabamento, tendo


que oferecer peças diferentes aos participantes.

Assim, orientados por um condômino do mesmo prédio que havia viven-


ciado esse tipo de problema, adotamos a seguinte estratégia: fixamos
nas pranchetas uma etiqueta fornecida pelo próprio condomínio com
sua logomarca e os dizeres ‘Patrimônio – Gentileza devolver na portaria
após a utilização’. Ninguém mais deixou de devolver as pranchetas.
Finalizando, dizem que:

• NOS ESTADOS UNIDOS, TUDO É


PERMITIDO, EXCETO O QUE É PROIBIDO;

• NA ALEMANHA, TUDO É PROIBIDO,


EXCETO O QUE É PERMITIDO;

• NA ANTIgA RúSSIA, TUDO ERA PROIBIDO,


INCLUSIVE O QUE ERA PERMITIDO;

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
• NO BRASIL, TUDO É PERMITIDO,
INCLUSIVE (E PRINCIPALMENTE) O
QUE É PROIBIDO.”

CA P Í TU LO 8
Neste momento, João Pedro perguntou: “E quais são os erros que deve-
mos evitar para preservar o nosso poder na negociação?”

18 2
O mentor, então, respondeu:

• ACHAR QUE NúMEROS, TABELAS, MÉDIAS


E ESTATÍSTICAS SÃO INEgOCIÁVEIS;

• ACEITAR PASSIVAMENTE ARgUMENTOS


DO TIPO:

• ISSO É INEGOCIÁVEL...

• ISSO É NORMA/PRINCÍPIO DA
EMPRESA...
• ASSIM EU VOU ESTOURAR O
ORÇAMENTO...

• É UM CONTRATO SIMPLES, PADRÃO


PARA TODOS...

• FICAR INTIMIDADO POR STATUS.

5 a FONTE DE PODER: RECURSOS


FINANCEIROS (‘CAIXA’)
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

O mentor passou, então, para a descrição da quinta fonte de poder:

“Situação 1: Se você for um fornecedor capitalizado e o seu comprador


necessitar de financiamento, então, ele terá que pagar o preço que
CA P Í TU LO 8

você estipular.

Exemplo: um prefeito de uma cidade necessita realizar algumas obras,


mas não tem verba disponível para contratar o serviço. Uma empreiteira se
18 3

dispõe a executar a obra, aceitando as restrições financeiras propostas pelo


prefeito, mas o preço cobrado irá refletir nas condições de pagamento.

Situação 2: Se você for um comprador capitalizado e antecipar recursos


financeiros para o seu fornecedor, então, você estabelecerá o preço que
ele deve cobrar pelo produto ou serviço que irá fornecer.

Exemplo, uma empresa cliente investe um capital num fornecedor estraté-


gico que tem dificuldades de alavancar recursos financeiros para expandir
sua produção. Com o recurso disponibilizado, o fornecedor adquire novos
equipamentos e aumenta sua produção, fornecendo esse excedente ao
comprador a um preço mais reduzido, que tem o retorno sobre seu capital
investido. Mas o fornecedor também ganha, pois irá receber por algo que,
sem o investimento do comprador, não seria viabilizado.
6 a FONTE DE PODER: TEMPO
O tempo, talvez, represente a mais importante fonte de poder. Você necessi-
ta de tempo na negociação para colher informações, desenvolver as outras
fontes de poder e planejar. A análise do contexto e a identificação de alter-
nativas somente serão viáveis se reservarmos um tempo para isso. O poder
de correr riscos decorre da nossa capacidade de analisá-los e calculá-los, e
isso exige investimento de tempo.

O tempo é um recurso importante, portanto pode ser considerado como


uma fonte potencial de poder se administrado adequadamente. O
tempo pode ser manipulado para criar poder, principalmente com rela-

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
ção a prazos, para acelerar ou para adiar, interferindo no comportamen-
to do outro. A tática do adiamento, para o comprador, é um meio muito
eficiente de controlar o tempo. O adiamento funciona melhor quando o
comprador dispõe de tempo para decidir e a outra parte não está bem

CA P Í TU LO 8
preparada para enfrentá-lo. É a velha história: se eu conheço seu tempo
limite e você não conhece o meu...

Exemplo: Os compradores sabem que os vendedores têm que cumprir a

18 4
meta no final do mês. Por isso, adiam a decisão de compra até esse momen-
to. Esse ‘atraso’ pressiona o fornecedor, que pode reconsiderar sua posição
inicial e melhorar as condições de sua oferta.
ALGUNS LEMBRETES
FINAIS SOBRE A GESTÃO DO
TEMPO NA NEGOCIAÇÃO:
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

Quem tem mais tempo na negociação, leva vantagem.

1 As piores decisões, invariavelmente, foram tomadas às


pressas, por isso jamais demonstre estar com pressa – a
pressa trai a falta de controle de si mesmo e do tempo.
CA P Í TU LO 8
18 5

Não revele o seu limite de tempo para o outro.

2 Apenas reforçando: se eu sei o seu limite de tempo e você


não sabe o meu, quem leva mais vantagem sou eu.

As concessões e decisões, geralmente, acontecem nos últi-

3
mos 20% do tempo.

Seja paciente, o mais forte é aquele que conseguir supor-


tar mais a tensão do tempo.
Espere o momento certo para agir.

Se houver vantagens na conclusão rápida da negociação,


‘venda’ essa ideia ao outro negociador.
4

Quando o prazo final do outro estiver chegando, você


poderá perceber o nível de tensão dele aumentar e ele
começará a fazer concessões.

Lembre-se de que o outro lado também tem um prazo


5
limite: fique calmo e mais alerta.

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
Se uma pessoa não for capaz de ir além de declarações

CA P Í TU LO 8
como ‘precisamos de uma decisão já’ ou ‘não vamos poder
manter a oferta’, está blefando, pois esses tipos de prazos
limites podem ser alterados, mudados, ou simplesmente

18 6
6
eliminados. A melhor forma de lidar com essa arbitrarie-
dade do ‘faça-e-decida-até-tal-data’ é dizer: ‘Se você quer
uma resposta rápida, ela é ‘não’. Contudo, se me der mais
algum tempo para resolver, a resposta pode ser diferente.’

Nunca permita que ninguém apresse as coisas, redigindo


especificações para você.

Se houver um limite de tempo, eles irão dizer-lhe.’

Nunca peça aos outros para estabelecer prazos.


Isso só os convida a pressionar, finalizou o mentor.
7
João Pedro, então, perguntou: “E quais são os erros que devemos evitar
com o objetivo de preservar nosso poder na negociação?”

O mentor respondeu:

• ACEITAR A PRIMEIRA OFERTA;

• SER APRESSADO, QUERER


FECHAR NEgóCIO RÁPIDO;
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

• FICAR EM PâNICO COM RELAÇÃO


A PRAzOS (QUASE SEMPRE
NEgOCIÁVEIS).”
CA P Í TU LO 8

FONTES EXCLUSIVAS DE PODER


18 7

O mentor, agora, falou sobre as fontes exclusivas de poder:

“Essas fontes exclusivas foram denominadas por Michael Porter


– renomado professor de Harvard, a mais prestigiosa de todas as
‘business schools’ do mundo – de ‘poder de barganha’, em seu primeiro
livro ‘Estratégia Competitiva’, publicado no início dos anos de 1980.”

O trainee achou que o momento era adequado para esclarecer duas dúvi-
das que o atormentavam há muito tempo: “Quais são as situações que
aumentam o poder de barganha dos compradores, e quais são aquelas
que proporcionam um grande poder de barganha aos fornecedores?”

E o mentor respondeu: “Vou apresentar as diversas situações que deter-


minam o aumento das fontes exclusivas de poder de cada um dos lados:
PODER DE BARGANHA
DOS COMPRADORES
O poder de barganha dos compradores aumenta nas seguintes situações:

1o QUANDO ELES ADQUIREM gRANDES


VOLUMES EM RELAÇÃO àS VENDAS

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
DOS FORNECEDORES.
Compradores de grandes volumes são particularmente podero-
sos, principalmente se o fornecedor costumam apresentar altos
custos fixos.

CA P Í TU LO 8
Exemplo: Uma rede mundial de hipermercados pode adquirir
grandes quantidades de um determinado produto num fabrican-
te da Malásia, conseguindo descontos extraordinários de preço

18 8
com esse fornecedor.

2o QUANDO OS PRODUTOS OU SERVIÇOS


QUE ELES ADQUIREM REPRESENTAM
UMA FATIA SIgNIFICATIVA DOS
PRóPRIOS CUSTOS DA EMPRESA.
Nesses casos, os compradores concentram-se em investir os
recursos necessários para comprar a um preço favorável e fazê-lo
seletivamente.
Exemplo 1: No setor de construção civil, as construtoras podem
investir capital nos fabricantes de blocos de concreto – um dos prin-
cipais insumos – para o pagamento antecipado de entregas futuras
ou mesmo para expandir a capacidade produtiva desses fornece-
dores e obter disponibilidade preferencial dessa matéria-prima, e
ainda pagando preços mais baixos.

Exemplo 2: No setor de alimentação industrial, as despesas com a


compra de carnes (boi, frango e peixe) representam um dos itens
mais importantes da planilha de custos. Os responsáveis pelas
compras, para melhorar seu poder de barganha, concentram as
aquisições em pacotes de longo prazo e em um ou dois frigoríficos
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

apenas, para que o volume negociado com cada um seja expressi-


vo e, com isso, poderem ganhar alguma vantagem de escala.

3 o QUANDO OS INSUMOS QUE OS


CA P Í TU LO 8

COMPRADORES ADQUIREM
SÃO PADRONIzADOS OU NÃO
18 9

DIFERENCIADOS.
Nessas condições, os compradores sempre encontrarão fornecedores
alternativos disponíveis em quantidade e qualidade suficientes.

QUANDO OS COMPRADORES
4o ENFRENTAM REDUzIDOS CUSTOS DE
MUDANÇA DE FORNECEDOR.
Custos de mudança – aqueles que prendem o comprador a um
determinado fornecedor – são os custos que os compradores se
defrontam quando mudam de um fornecedor para outro.
5o QUANDO OS COMPRADORES
REPRESENTAM EMPRESAS OU
SETORES QUE APRESENTAM
LUCRATIVIDADE BAIXA.
Lucros reduzidos criam grandes incentivos para reduzir também
os custos de compras.

Exemplo: A atividade siderúrgica é um setor que apresenta uma


lucratividade baixa, e uma das mais importantes matérias-
primas utilizadas pelas usinas siderúrgicas de grande porte na

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
fabricação de aço é o carvão mineral (importado). Como a despesa
com esse insumo incide de forma significativa nos custos de
produção do aço, essas empresas se juntam e, em ‘pool’, adquirem
expressivas quantidades de carvão de fornecedores selecionados,
obtendo grandes vantagens nas condições de compra.

CA P Í TU LO 8
6o QUANDO OS COMPRADORES

190
REPRESENTAM UMA AMEAÇA
CONCRETA DE INTEgRAÇÃO
PARA TRÁS.
Se os compradores são parcialmente integrados ou colocam uma
ameaça real de integração para trás (verticalização), eles estão em
posição de negociar concessões.

Exemplo 1: Uma montadora de automóveis pode tentar reduzir o


preço de um componente do carro (por exemplo, as dobradiças das
portas). Se o fornecedor se mostrar inflexível, a montadora pode
ameaçá-lo, alegando que irá adquirir a chapa diretamente de uma
usina siderúrgica e produzir essa peça internamente (ela mesma).
Exemplo 2 (Caso verdadeiro): Uma mineradora de potássio estava
precisando contratar serviços médicos locais para o atendimento
aos seus funcionários. Assim, solicitou a um grupo selecionado
desses profissionais uma proposta para a prestação desse tipo de
serviço. Os médicos se uniram num cartel e apresentaram uma
proposta com condições de preço inaceitáveis pela mineradora
e, mesmo quando convidados para negociar essas condições, se
mostraram inflexíveis. A mineradora interrompeu as negociações
e duas semanas depois apareceu a seguinte notícia na coluna
sobre economia e negócios de um jornal de grande circulação
nacional: ‘Mineradora de potássio irá construir um hospital
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

modelo na cidade onde explora o minério e contratar os melho-


res profissionais do país para atender a seus funcionários e, em
retribuição à comunidade, disponibilizará o hospital para o aten-
dimento também à população local.’ No dia seguinte, os médicos
CA P Í TU LO 8

locais entraram em contato com a mineradora solicitando uma


reunião para negociar as condições que eles haviam apresenta-
do na proposta de atendimento aos funcionários da empresa. A
191

mineradora tinha a intenção de construir um hospital? Muito


provavelmente não, pois estava fora do seu ‘core business’. Mas,
como ela tinha condições financeiras para construí-lo, tornou-se,
por isso, uma ameaça real aos médicos da região.

7o QUANDO O PRODUTO OU SERVIÇO DO


FORNECEDOR NÃO É IMPORTANTE
PARA A QUALIDADE OU SEgURANÇA
DOS PRODUTOS OU SERVIÇOS DA
EMPRESA DO COMPRADOR.
PODER DE BARGANHA
DOS FORNECEDORES
Os fornecedores podem exercer o poder de negociação sobre os compra-
dores, ameaçando que vão elevar os preços ou reduzir a qualidade dos
bens e serviços fornecidos. Esses fornecedores poderosos podem, conse-
quentemente, sugar a rentabilidade de uma empresa incapaz de repassar
os aumentos de seus custos para os seus próprios preços. As condições
que tornam os fornecedores poderosos tendem a refletir-se naquelas que

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
tornam os compradores poderosos.

O poder de barganha dos fornecedores aumenta nas seguintes situações:

CA P Í TU LO 8
1o QUANDO O MERCADO É DOMINADO POR
POUCAS EMPRESAS FORNECEDORAS

192
E É MAIS CONCENTRADO DO QUE AS
EMPRESAS CLIENTES PARA AS QUAIS
ELES VENDEM, ESSAS EMPRESAS
FORNECEDORAS COMUMENTE FAzEM
CARTÉIS.
Exemplo: O folclore empresarial afirma que as empreiteiras costumam
‘lotear’ obras civis de grande porte (estradas, por exemplo) nas licita-
ções públicas, estabelecendo antecipadamente qual das empresas de
construção civil (participante do cartel) será a vencedora e contratada
para realizar um determinado trecho daquela obra.
2o QUANDO O FORNECEDOR NÃO TEM
QUE COMPETIR COM A OFERTA
DE PRODUTOS SUBSTITUTOS OU
SUCEDâNEOS.
Produtos substitutos são as soluções similares. É o que ocorre, por
exemplo, com embalagens (de vidro, alumínio ou tetra Pack), com
estruturas de galpões (aço, alumínio ou concreto) ou com combustí-
veis para automóveis (gasolina, álcool, gás, bateria ou hidrogênio).

Produtos sucedâneos são aqueles que têm uma amplitude


PO D E R E I N F LU Ê NC I A

maior de concorrência.

Exemplo 1: Na sobremesa, uma pessoa pode desejar comer um


chocolate, mas pode se contentar em saborear um sorvete de
morango; ou, querendo matar a sede, pode optar entre refrigerante,
CA P Í TU LO 8

suco, chá gelado ou mesmo água.

Exemplo 2: Uma videoconferência pode ser considerada como


um serviço sucedâneo de uma viagem aérea, ou seja, essa
193

tecnologia evita que as pessoas tenham que se locomover de


seus locais de trabalho.

Exemplo 3: No passado, o amianto (hoje proibido em função


da suspeita de suas propriedades cancerígenas) era a única
matéria-prima disponível para a fabricação de telhas e caixas
d’água (de cimento amianto). Portanto, a posição do fornecedor
– que era o proprietário da única mina de amianto no Brasil –
nas negociações para o fornecimento dessa matéria-prima era
muito confortável, pois ele não tinha nenhum tipo de ameaça
de produtos substitutos ou sucedâneos naquela época.
3o QUANDO OS COMPRADORES SÃO
FRAgMENTADOS OU NÃO SÃO CLIENTES
SIgNIFICATIVOS PARA O FORNECEDOR,
OU SEJA, QUANDO ELES COMPRAM
PEQUENAS QUANTIDADES EM RELAÇÃO
AO TOTAL DE VENDAS DO FORNECEDOR.
Exemplo: O poder na negociação de qualquer cliente com relação
a descontos de preço nos produtos de um hipermercado é nulo
(mesmo se ele estiver comprando individualmente uma quanti-

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
dade muito grande de alimentos e utilidades domésticas). A razão
é simples: isoladamente, esse cliente não significa absolutamente
nada para o hipermercado. Entretanto, se ele se reunir com todos
seus amigos e, juntos, decidirem comprar 10 toneladas de alimen-

CA P Í TU LO 8
tos e utilidades domésticas, o gerente do hipermercado irá sentar
para negociar as condições de preço.

Mesmo empresas de grande porte, compradoras em potencial de

194
insumos, perdem poder na negociação quando aquilo que neces-
sitam adquirir (ainda que em grandes quantidades para elas) não
significa um volume expressivo para o fornecedor.

Exemplo: Uma montadora de veículos precisava de uma peça


imantada para ser colocada no painel dos carros. Ela produzia
2.000 veículos por dia, ou seja, precisava de quase 750.000
peças por ano, mas o fornecedor produzia também autofalan-
tes, e sua linha de produção fabricava mensalmente 10 milhões
dessas peças, que também eram usadas em seus produtos. A
demanda da montadora era irrisória para ele...
4o QUANDO OS PRODUTOS OU SERVIÇOS
DO FORNECEDOR SÃO IMPORTANTES
PARA A EMPRESA DO COMPRADOR,
OU SEJA, SÃO IMPORTANTES PARA
O SUCESSO DO SEU PROCESSO DE
FABRICAÇÃO OU PARA A QUALIDADE
DE SEU PRODUTO.
Exemplo: As subestações das grandes companhias de eletricida-
de utilizam um componente eletromecânico cujo desempenho é
PO D E R E I N F LU Ê NC I A

fundamental para a segurança das operações de distribuição da


energia elétrica. Uma falha nesse componente é fatal, pois põe em
risco todo o sistema de abastecimento (mesmo com o suporte de
nobreaks ou geradores mecânicos a combustível), podendo provocar
CA P Í TU LO 8

danos irreparáveis, seguidos de processos indenizatórios. Embora


existam no mercado vários fornecedores desse tipo de componente,
as companhias de energia preferem adquirir o melhor e mais confi-
195

ável deles, independentemente do preço ou das condições de venda


desse produto.

5o QUANDO OS PRODUTOS DO
FORNECEDOR SÃO DIFERENCIADOS E
ESSA DIFERENCIAÇÃO É FUNDAMENTAL
PARA O COMPRADOR.
Exemplo: O enxofre é um elemento sempre presente nos carvões
minerais utilizados na fabricação do aço, mas a presença de altos
teores de enxofre no aço compromete sua qualidade, por isso as
5o usinas siderúrgicas utilizam um sistema chamado de dessul-
furação durante o processo de fabricação, para eliminar ou
reduzir a presença desse elemento químico. A usina siderúrgica
da Açominas não possuía esse equipamento de dessulfuração
no início de sua operação. Portanto, para garantir a qualidade
de seu aço, era fundamental que o carvão mineral utilizado na
sua produção apresentasse índices muito baixos de presença do
enxofre. Somente duas minas no mundo (situadas na Polônia)
tinham condições de fornecer esse tipo de carvão. Mas, como
elas sabiam da importância desse insumo para a melhoria da
qualidade do aço fabricado pela Açominas, cobravam um preço

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
‘premium’ para fornecê-lo, enquanto para as outras usinas
siderúrgicas (que tinham o processo de dessulfuração), muito
provavelmente, o preço cobrado era significativamente menor.

CA P Í TU LO 8
6 o O FORNECEDOR DESENVOLVE ALTOS
6o
CUSTOS DE MUDANÇA PARA O

196
COMPRADOR.
Exemplo: A empresa aérea Gol utiliza aeronaves Boeing. Seus
comandantes são treinados no Flyght Simulation, da Boeing, nos
EUA; os mecânicos de manutenção são capacitados para operar
com os equipamentos da Boeing; e os hangares da Gol no Brasil e
no exterior estocam peças de reposição Boeing. Dessa forma, como
a Gol pode mudar a marca de suas aeronaves para, por exemplo,
Airbus? Isso é realmente muito difícil estrategicamente, pois
compreende treinar todos os comandantes na França, capacitar os
mecânicos de manutenção, abastecer todos os hangares com peças
de reposição Airbus e, ainda, comprar as aeronaves. Por isso, o poder
de negociação depende totalmente da Boeing.
7o QUANDO O FORNECEDOR É UMA
AMEAÇA REAL DE INTEgRAÇÃO PARA
FRENTE.
Exemplo: Um fabricante de cimento tenta fornecer para uma
empresa concreteira (ready mix), sem sucesso. Não vislumbran-
do uma chance de reverter a situação, o fabricante ameaça esse
‘quase’ cliente dizendo que irá constituir também uma concre-
teira e concorrer nesse mercado com vantagem, já que possui a
matéria-prima mais importante, que é o cimento.
PO D E R E I N F LU Ê NC I A
CA P Í TU LO 8
197
FONTES ExCLUSIVAS DE
PODER (QUEM DETÉM)
S I TUA Ç ÃO COMP RADOR FORNECEDOR

1 . R E L A Ç Ã O E NTR E O FE RTA M A IO R D EM AN DA M AI O R

PO D E R E I N F LU Ê NC I A
O F E RTA E D E MAN DA QU E A D E M A N DA QU E A O F ERTA

2 . VO LU M ES
S Ig N IF ICAT IVOS I N EX P R ESS I VOS
D E CO M PRAS

CA P Í TU LO 8
3. NúMERO DISPONÍVEL
E L E VA D O R EDUz I D O
DE FORNECEDORES

198
4. N EC ESS I DA D ES PA D RO N IzA DAS D I F ER EN C I A DAS

5 . CUSTO D E MU DAN Ç A BA IXO ALTO

6. POSS I B I L I DADE
PA RA T R Á S PA RA F R EN T E
D E I N TEg RA Ç ÃO

Com a apresentação desse quadro para o trainee, o mentor finalizou


sua explanação daquele dia.
A excitação do trainee estava tão grande que ele
não via a hora de conversar com o mentor, porque
o tema abordado naquele dia seria sobre as táticas
e estratégias de negociação com fornecedores.
Ele tinha dúvidas em relação à diferença entre
“estratégias” e “táticas” durante a negociação. Logo
que se encontrou com o mentor, o trainee solicitou
o esclarecimento dessa dúvida.

O mentor imediatamente respondeu: “As ‘estratégias’


são, em sua maioria, baseadas nas fontes exclusivas de
poder; e as ‘táticas’ são utilizadas na negociação com o
objetivo principal de aumentar o poder de um dos lados
na negociação e/ou reduzir o poder do outro lado. O
desequilíbrio de forças ou poder entre os negociadores
pode ocorrer antes ou durante o processo da negociação.
0
9
ESTRATÉGIAS E TÁTICAS
DE NEGOCIAÇÃO

20 0 CA P Í TU LO 9 E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E G O C I AÇÃO


A diferença fundamental entre as estratégias e as táticas refere-se
apenas ao momento de sua utilização: as ‘estratégias’ são estruturadas
antes do início do processo e utilizadas preferencialmente antes da
negociação, direcionando o caminho mais adequado a ser seguido, ao
passo que as ‘táticas’ de ataque ou defesa têm sua principal aplicação
durante o processo, na mesa de negociação.
E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO

ESTRATÉGIAS UTILIZADAS PELOS


FORNECEDORES (VENDEDORES)
O objetivo do fornecedor é se concentrar prioritariamente naqueles clien-
tes que ele possa ter vantagem competitiva e, para isso, busca mapear
na sua própria carteira de clientes aqueles que têm dificuldade para
apresentar qualquer tipo de poder ou resistência nas negociações. Com
isso, o foco recai nos compradores que são insensíveis a preço (ou seja, por
CA P Í TU LO 9

algum motivo, não se importam ou não podem se importar com os preços


praticados), ou naqueles que não apresentam poder de barganha.
20 1

PRIMEIRO FOCO:
COMPRADOR INSENSÍVEL A PREçO

1° O custo da matéria-prima (insumo) é infinitamente


pequeno em relação ao custo do produto final e, por
isso, os benefícios percebidos para investir tempo na
negociação tentando reduzir preços tendem a ser baixos.
Exemplo: Um dos componentes de um produto final
com altíssima tecnologia (portanto, de preço elevado)
é uma pequena peça de plástico com custo irrisório.
O comprador não tem o menor interesse e nem pode
perder tempo para tentar reduzir o preço desse
insumo, simplesmente porque não compensa.

2° A falha de um componente causa insuportáveis custos


de reparação, ou seja, a penalidade pela falha do

E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO


produto é alta em relação ao seu custo de aquisição
e, caso o comprador tenha que arcar com um prejuízo
substancial, ele tenderá a não ser sensível ao preço.
Exemplo: O comprador não pode optar por um compo-
nente de segurança e estabilidade com preço reduzido
em uma central de banco de dados e comunicação
responsável pelo controle das informações de um
conglomerado financeiro.

CA P Í TU LO 9
3° A qualidade e a eficácia do produto (ou serviço) podem
oferecer grande economia ou melhorar o desempenho
do produto final; ou o comprador compete com uma

20 2
estratégia de alta qualidade para a qual percebe que o
produto adquirido beneficia e contribui para a compe-
titividade do produto final.

4° Insumo produzido sob encomenda ou diferenciado.


Exemplo: Quando o comprador necessita de um
produto diferenciado ou feito sob encomenda, esse
desejo frequentemente vem acompanhado da dispo-
sição de pagar um preço prêmio por ele.

5° O comprador consegue repassar prontamente os


custos dos insumos.
6° A empresa consegue obter grandes lucros e tem
muita rentabilidade.

SEGUNDO FOCO:
COMPRADOR SEM PODER
E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO

DE BARGANHA

1° Aqueles que adquirem pequenas quantidades, pois


terão menor poder para demandar concessões de
preços e outras considerações especiais.

2° Os que não dispõem de fontes alternativas adequa-


das de fornecimento e, por isso, seu poder de nego-
ciação é limitado.
CA P Í TU LO 9

3° Quem enfrenta altos custos de compra, transação ou


negociação, porque o custo para encontrar uma nova
20 3

marca ou um novo fornecedor é grande.

4° Aqueles que não constituem uma ameaça real de


integração para trás e, por isso, perdem um importan-
te apoio para a negociação.

5° Quem se encontra em situações de exceção (como


emergência, por exemplo.).

6° Todos aqueles que enfrentam custos elevados para


uma mudança de fornecedor”, concluiu o mentor.
O trainee, um pouco apreensivo com essas realidades que ele entendia
significarem, de fato, uma fragilidade dos compradores na negocia-
ção com seus fornecedores, tratou de obter algum tipo de orientação
do mentor em relação a isso e perguntou: “Quais poderiam ser as
estratégias de defesas que os compradores poderiam utilizar para supe-
rar essas fraquezas?”

O mentor respondeu: “Em compras, a meta é encontrar mecanismos para

E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO


compensar ou superar essas fontes de poder dos fornecedores. Em alguns
casos, esse poder é inerente à economia do setor e está fora do controle
da empresa (situações de demanda maior que a oferta, por exemplo). Em
muitos casos, porém, ele pode ser amenizado pela estratégia.

ABORDAGENS CLáSSICAS

CA P Í TU LO 9
Nos processos de negociação, os compradores podem apresentar uma ou
várias dessas estratégias:

20 4
1o Criar uma ameaça de integração para trás. Quer o comprador
deseje ou não integrar-se para trás em um determinado item,
sua posição na negociação é fortalecida por uma ameaça real.

Exemplo: ‘Insinuar’ que pode eliminar a demanda


(verticalização).

2o Promover padronização. Essa estratégia ajuda a reduzir a


diferenciação entre os produtos dos fornecedores, aumenta o
número de opções das fontes de suprimento e, ainda, impede a
dependência e a ameaça dos custos de mudança.

Exemplo: Evitar necessidades diferenciadas.


3o Identificar fontes alternativas qualificadas. Pode ser necessário
estimular fontes alternativas a entrarem no negócio, finan-
ciando contratos de desenvolvimento e contratos para uma
pequena parte das compras. Pode ser também aconselhável
ajudar novos fornecedores a minimizarem seus custos para
que se tornem novas fontes qualificadas.

Exemplo: Desenvolver outros fornecedores ou materiais suce-


E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO

dâneos, como aço x alumínio x plástico ou fórmulas originais


x genéricos, etc.

4o Evitar custos de mudança. Significa resistir à tentação de tornar-


se demasiado dependente da assistência técnica do fornecedor
e assegurar que os empregados não sejam cooptados.

Exemplo: Deixar de criar vínculos de dependência com um só


CA P Í TU LO 9

fornecedor.
20 5

5o Diversificar fornecedores. O montante comprado de cada


fornecedor individual tem que ser suficiente para fazer
com que o fornecedor se preocupe com a sua perda – uma
dispersão em excesso das compras não aproveita a posição
de negociação estrutural.

Exemplo: Credenciar fornecedores concorrentes de um


mesmo produto ou serviço. As compras de um item podem
ser dirigidas entre fornecedores alternados para melhorar a
posição de negociação da empresa.
Mas eu gostaria de fazer algumas provocações a respeito do seu
desempenho na atividade de compras”, disse o mentor a João Pedro,
que continuou:

• Você conhece bem seu usuário e demais clientes internos (engenharia,


produção, finanças, vendas)?

• Você conhece bem (mesmo) seus fornecedores?

E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO


• Você conhece bem os fornecedores dos seus fornecedores (a cadeia de
suprimentos deles)?

• Você negocia baseado em fatos, evitando situações de ‘cabo de guerra’?


• Qual é sua importância (enquanto cliente) para seu fornecedor? Como
seu volume de compras impacta os resultados da empresa fornecedora?
Ou, até mesmo, como impacta as metas pessoais dele (vendedor)?

CA P Í TU LO 9
• Você conhece bem a ‘família’ de produtos que adquire? Você sabe:
• Qual é a incidência de M.O.?

20 6
• Quando é o dissídio?
• Como o preço reage em função de variáveis sazonais, políticas,
econômicas, etc.?

• Qual é o melhor lugar para adquirir determinado insumo ou compo-


nente (‘best foot print’)?

Exemplo: Se o insumo exige mão de obra intensiva, talvez, o local


mais indicado seja a China ou a Índia.

• Você sabe como interferir na cadeia de suprimentos dos seus fornece-


dores, abreviar passos, viabilizar um ‘pool’ e impactar os preços deles?

• Você se prepara adequadamente para negociar?


As indagações servem apenas para sua reflexão e para que você possa
avaliar se está conduzindo o processo de compras apenas mecanicamen-
te, no automático, sem considerar abordagens mais completas como as
que serão apresentadas a seguir.

ABORDAGENS MAIS EFETIVAS E


COMPLEMENTARES
E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO

1o Exigir dos fornecedores o mesmo grau de qualidade esperada


pelos clientes da sua empresa.

Exemplo: Empresas brasileiras que atuam no mercado interna-


cional exportando seus produtos, como a Embraer, a Sadia, a
Vale, a New Holland.
CA P Í TU LO 9

2o Verificar a possibilidade de aglutinar e terceirizar operações


20 7

com redução de custos e de tarefas de compras (número de


itens a adquirir e controlar).

Exemplo 1: Substituir a aquisição de alho + sal + tomate +


temperos + M.O. por molho ao sugo pronto (industrializado).

Exemplo 2: Substituir a aquisição de areia + brita + cimento +


M.O. por concreto pronto.

3o Projetar o histórico (estrutura) do preço anterior apresentado


pelo fornecedor e comparar com o preço atual que está sendo
negociado.
Exemplo: Conhecer o breakdown dos custos relativos aos insu-
mos básicos do fornecedor, negociar os reajustes percentuais
somente daqueles itens que sofreram aumento ou variação
(como o petróleo, o álcool, o plástico, etc.) e agir proativamente.

4o Penetrar na cadeia de suprimentos do fornecedor e identificar

E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO


itens relevantes (curva ABC) que possam fazer sinergia com
outros itens também adquiridos pela empresa do comprador.

Exemplos:

• Construção civil: cimento para fabricante de pré-moldados.

• Montadoras: aço para fabricante de auto peças.

• Alimentação industrial: gás e soja para granjas e padarias.

CA P Í TU LO 9
5o Visitar e se reunir com os clientes internos, identificar as difi-
culdades deles e antecipar-se oferecendo soluções criativas e

20 8
eficazes, com custos reduzidos em relação às suas necessidades
de suprimentos (evitando retrabalho/desperdício).

Exemplo: Os usuários na linha de produção de uma usina


siderúrgica reclamavam do alto preço de uma matéria-prima
que era fornecida a granel, acondicionada em tambores de
200 quilos. Presente na área de produção e observando a
operação, um comprador percebeu que os operadores, sempre
que necessitavam introduzir aquela matéria-prima, paravam
a linha de produção para pesar (numa balança eletrônica)
pequenas quantidades daquele produto. Ele, então, sugeriu
que a matéria-prima continuasse acondicionada em tambores
de 200 quilos, mas embalada em pacotes de 20 quilos e, não
mais, a granel. O preço subiria mais ainda, mas não seria
preciso parar a operação, porque bastava jogar os pacotes de
peso conhecido. Levando em conta o aumento da produtividade,
os usuários concluíram que o custo/benefício disso era vantajoso
e concordaram com a ideia proposta pelo comprador.
E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO

6o Conhecer o ‘break even point’ do fornecedor e receber o bene-


fício proporcional que corresponde à redução do custo fixo
unitário, em função do aumento do volume demandado.

Exemplo: Se o comprador pagar R$50,00 por unidade ao


adquirir 100 peças de um produto qualquer com determina-
do fornecedor, não significa que terá que pagar os mesmos
R$50,00 por unidade para adquirir outras 125 peças com esse
mesmo fornecedor. A razão é simples: o custo unitário de cada
CA P Í TU LO 9

peça é menor por causa da redução no custo fixo do fornecedor


em 4% devido à escala.
20 9

100 125
UNIDADES UNIDADES
CUSTO %
CUSTO PREçO CUSTO PREçO
UNITáRIO TOTAL UNITáRIO TOTAL

FIXO 20 R$ 10 R$ 1000 R$ 8 R$ 1000

VARIáVEL 80 R$ 40 R$ 4000 R$ 40 R$ 5000

TOTAL 100 R$ 50 R$ 5000 R$ 48 R$ 6000


7o Construir valor para o fornecedor. O comprador pode reduzir o
preço a pagar, ‘construindo o valor’ para seu fornecedor.

Exemplo: Vamos fazer uma reflexão a respeito da relação


comercial entre uma empresa fornecedora de velas para motor
de automóveis e uma montadora que produz em torno de
2.000 carros por dia. A montadora necessita diariamente de
8.000 velas; por mês, são 240.000 velas e, ao final de um ano,

E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO


quase três milhões de velas. O que isso pode significar para um
fornecedor de velas?

• Volume e escala de negócios garantidos;

• Credencial para se habilitar como fornecedor de velas em


todas as outras montadoras;

• Inserção da sua logomarca no livreto de especificação dos


veículos, representando uma peça genuína que será aplicada

CA P Í TU LO 9
em todos os automóveis na ocasião de qualquer manutenção.

As vantagens adicionais para o fornecedor são tantas que é

210
possível que a montadora pague um preço quase simbólico
pelo fornecimento dessas velas.

8o Matriz Estratégica de Compras:

NÃO CRÍTICOS

• Enfatizar a simplificação do processo de compra (padronizar);


• Não analisar detalhadamente os custos;
• Simplificar o ciclo de compras;
• Gerar valor pela agilidade do fornecimento;
• Reduzir o número de fornecedores.
CRÍTICOS

• Enfatizar o relacionamento de longo prazo, pelo risco da inter-


rupção do fornecimento;
• Formar estoques estratégicos;
• Desenvolver tecnicamente o fornecedor para garantir o
fornecimento;
E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO

• Gerar valor, proporcionando a manutenção e a sobrevivência


do mercado fornecedor;
• Desenvolver alternativas.

ALAVANCáVEIS

• Enfatizar a escala de compra (consolidação);


• Intensificar a disputa (competição) entre os fornecedores,
inclusive utilizando o leilão eletrônico reverso (LER);
CA P Í TU LO 9

• Conhecer bem o mercado fornecedor;


• Decidir pelo preço entre os fornecedores pré-qualificados;
• Atuar junto ao cliente interno para padronizar e unificar.
211

ESTRATÉGICOS

• Enfatizar a criação de valor + relação de longo prazo;


• Construir parcerias e ‘global sourcing’ ou verticalizar;
• Gerenciar a cadeia de suprimentos;
• Gerir o fornecedor: compartilhamento técnico, relação de
confiança, acordos ganha/ganha e de mútuo compromisso;
• Contratos de médio e longo prazos e planos de contingência;
• Explorar oportunidades através de análise e engenharia de valor;
• Identificação conjunta de ‘cost drivers’ e integração com o
fornecedor no início do ciclo de desenvolvimento do produto.
DESAFIOS DOS GESTORES E
EXECUTIVOS DE COMPRAS
Essa proposta para um novo posicionamento dos gestores e executivos
de compras exigirá também novas competências (expertises):

• Ter habilidade para lidar com ambiguidades, riscos e

E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO


contradições;

• Ser capaz de enfrentar novos desafios e conhecimentos;

• Preparar-se para novos cenários nas negociações: de


bilaterais para multilaterais;

• Ter competência para ler (e recodificar) o ambiente;

• Conseguir aprender mais rápido que os usuários, os

CA P Í TU LO 9
clientes internos, os parceiros e os fornecedores;

• Investigar o futuro e estar preparado para o imprevisível;

212
• Saber canalizar produtivamente as emoções;

• Ter disposição para recomeçar.

Ficou claro, agora, meu caro trainee, o que significa ‘compradorssauro’?”,


perguntou o mentor.

“Sim, sem dúvida”, João Pedro respondeu, e continuou: “Mais do


que isso: agora, também está muito claro para mim o que significa a
aplicação da estratégia na negociação, e como essa conduta pode enri-
quecer o meu desempenho profissional na atividade de compras. Mas,
e com relação à utilização de táticas? Quais são elas? Quais são seus
objetivos? E, mais importante, como se defender quando o outro lado
utiliza esses mecanismos?”
O mentor, então, respondeu: “Você tem razão, a habilidade de lidar com
as táticas comumente utilizadas pelos negociadores pode fazer a dife-
rença no resultado do acordo.”

O trainee, curioso, perguntou: “Mas, por que nos submetemos às táticas


utilizadas pelo outro e nos sentimos tão fragilizados e forçados a aceitar
as condições apresentadas por ele nessas situações?”

O mentor respondeu: “Na sua essência, as táticas tentam criar na mente


E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO

das pessoas a percepção de que um negociador aparenta ter muito mais


poder do que realmente tem.

É COMO A IMAGEM DE UM CORPO

QUE PROJETA UMA SOMBRA

DESPROPORCIONAL àS SUAS
CA P Í TU LO 9

DIMENSõES POR CAUSA DO âNGULO


213

DO QUAL LHE LANçAM LUZES.

Os animais são mestres nas táticas: algumas aves abrem a plumagem para
dar a aparência de que são maiores; a cobra naja alarga o pescoço quando
está em posição de ataque; alguns peixes incham o corpo para adquirir
um volume acima do normal e, com isso, amedrontar o adversário.

Nas negociações, as táticas têm a mesma característica: ‘aumentam’ o poder


do negociador, persuadindo o outro para aceitar as condições propostas.
A seguir, serão apresentados resumidamente alguns desses
mecanismos de persuasão que, geralmente, utilizados durante o
processo de negociação:

1 . S EDU çà O

OBJ E T IVO CO N T RA T áT ICA

E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO


USUFRUIR DA INTIMIDADE PARA NÃO PERMITA INTIMIDADES
FRAGILIZAR O COMPRADOR. COM QUEM VOCê NEGOCIA E
PROCURE SEMPRE MANTER
UM RELACIONAMENTO CORTêS
E AMáVEL, PORÉM FORMAL E
PROFISSIONAL (SEMPRE).

2 . CO N EX Ã O

OBJ E T IVO CO N T RA T áT ICA

CA P Í TU LO 9
AMEAçAR O COMPRADOR NÃO SE DEIXE INTIMIDAR E
ACENANDO QUE TEM RELAçõES SOLICITE AO FORNECEDOR

214
ESTREITAS COM PESSOAS DE UMA AUTORIZAçÃO FORMAL
NÍVEL HIERáRQUICO SUPERIOR DA PESSOA CITADA.
QUE APROVAM A PROPOSTA
QUE ELE ESTá APRESENTANDO.

3 . COMPA RA ç Ã O

OBJ E T IVO CO N T RA T áT ICA

ATUAR NA PERCEPçÃO DO NÃO PERMITA QUE O OUTRO


COMPRADOR TENTANDO MINIMI- FAçA COMPARAçõES, POIS ELAS
ZAR AS DESVANTAGENS DE UMA AFETAM SUA PERCEPçÃO E SERÃO
PROPOSTA ATUAL (PÉSSIMA) UTILIZADAS CONTRA VOCê.
COMPARADA COM UMA PROPOS-
TA ANTERIOR (MUITO PIOR).
4. B O M X M AU

O BJ E TIVO CON T RA T áT ICA

UMA VARIANTE DA TOME CUIDADO E NÃO SE


COMPARAçÃO PARA CRIAR ESQUEçA DE QUE O ‘BONZINHO’
LAçOS AFETIVOS COM UM É QUE É O ‘MAU’ VESTIDO NA
NEGOCIADOR ‘BONZINHO’. PELE DE CORDEIRO.
E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO

5. SU R P R ESA

O BJ E TIVO CON T RA T áT ICA

DESESTABILIZAR EMOCIONAL- MANTENHA-SE CALMO, EQUILIBRA-


MENTE O COMPRADOR COM A DO, TENHA ABSOLUTO CONTROLE
MUDANçA REPENTINA E INEX- DE SUAS EMOçõES E AGUARDE
PLICáVEL NO COMPORTAMENTO CALMAMENTE ENQUANTO ELE
CA P Í TU LO 9

ATRAVÉS DE AGRESSIVIDADE, TERMINA DE DAR SEU SHOWZINHO


CHORO CONVULSIVO, ETC. PARTICULAR.
215

6. D ESCO M P R ESSÃ O ( B O DE )

O BJ E T IVO CON T RA T áT ICA

PIORAR ARTIFICIALMENTE DESENVOLVA UMA ALTERNATIVA


UMA SITUAçÃO PARA, DEPOIS, DE ESCAPE E VERIFIQUE SE VALE A
VOLTAR à SITUAçÃO INICIAL, PENA NEGOCIAR.
QUE, AGORA, COMPARADA COM
A ANTERIOR E PIOR, PARECE
MELHORADA.
7. ESCA L A DA

OBJ E T IVO CO N T RA T áT ICA

FRAGILIZAR O COMPRADOR NO EXIJA ALGO EM TROCA QUANDO


FINAL DA NEGOCIAçÃO, QUAN- DECIDIR OFERECER QUALQUER
DO ELE ESTá VISIVELMENTE CONCESSÃO.
CONTANDO COM O ACORDO Já

E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO


FECHADO PARA OBTER MAIS
UMA CONCESSÃO ADICIONAL.

Outras táticas utilizadas pelos fornecedores, como as antiéticas, por


exemplo, já foram amplamente discutidas anteriormente (Capítulo 3),
mas não custa lembrar que esses artifícios, geralmente, são utilizados
por negociadores com os quais você não tem nenhum tipo de relação de

CA P Í TU LO 9
confiança estabelecida, nem tem interesse em construir qualquer relação
duradoura. No entanto, você pode ser afetado por elas, porque o objetivo
desses tipos de tática é torná-lo refém ou destruir seu equilíbrio emocio-

216
nal de tal modo que você se sentirá incapaz de reagir.

Nesse caso, a contra tática mais eficaz é:

NÃO NEGOCIE COM ESSE TIPO


DE GENTE, NÃO VALE A PENA.
Imaginar que, aplicando cláusulas com penalidades pesadas nos
contratos, ficaremos livres de algum dissabor é pura ilusão. Se, neste
mundo em que vivemos, não existe nenhum contrato que garanta o
cumprimento de uma negociação mal feita (começando pela instituição
do casamento, que tem até dois contratos – civil e religioso), como ter
expectativa de que pessoas que não são éticas irão cumprir sua parte
num contrato mercantil?
E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO

Outras táticas também utilizadas, como a ‘escassez’ (‘Nosso estoque está


acabando...’ ou ‘São os últimos exemplares...’) e os ‘prazos limites’ (‘Pode-
mos garantir essas condições somente até...’ ou ‘Ainda consigo segurar o
preço da tabela antiga somente até tal dia...’) são tão infantis que nem
vale a pena perder tempo com elas.

CONSIDERAçõES FINAIS
CA P Í TU LO 9

SOBRE AS TáTICAS
Sabemos que as táticas existem em número limitado e, por isso, são
217

fáceis de serem identificadas. Você pode usar alguns artifícios (dois de


percepção e dois de ação) para identificá-las:

1o Fazer perguntas que você conheça a resposta e comparar com o


que o outro irá responder;

2o Perceber os sinais não verbais emitidos pelo outro. Quando


uma pessoa está mentindo, passa a mão no nariz e vira o rosto;
ou quando está usando alguma tática para enfraquecê-lo,
evita encará-lo visualmente de frente;

3o Sentir seu próprio ‘estômago’ ou seja, sentir as vibrações ener-


géticas do outro;

4o ‘Pagar para ver’.


Mas, o que importa mesmo, é entender o que está por trás do uso das
táticas. Ora, se o objetivo do uso de uma tática por um negociador é
tentar enfraquecer o outro, significa que ele mesmo está sentindo-se
mais fraco, caso contrário, ele não necessitaria usar qualquer tipo de
artifício para se fortalecer na negociação.

Assim, os segredos para lidar com os efeitos de uma tática são:

E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO


1° RECONHECê-LA

Se você reconhece que o outro negociador está usando a tática da compa-


ração, por exemplo, é menos provável que você o considere inflexível. Se
você reconhece um truque que ele esteja usando, não se deixará enganar
pela astúcia dele.

CA P Í TU LO 9
A maioria das táticas depende do fato de você não reconhecer que está
sendo manipulado e agir de uma forma previsível.

218
2° NEUTRALIZá-LA

Se você reconhece a tática empreendida pelo outro negociador e não se


intimida com ela (por exemplo, mantendo-se calmo enquanto o outro
tenta irritá-lo), ele perceberá que ela não está sendo eficaz com você, o
que fará com que ela perca o seu valor, já que é menos provável que você
responda como o outro lado espera.

Exemplo (folclore): Um padre estrangeiro (muito alto e pesado) foi


transferido para uma paróquia numa pequena cidade do interior e
decidiu comprar uma mula para visitar os paroquianos. O vendedor,
sabendo que o padre era estrangeiro e que não entendia nada desses
animais, ‘passou a perna’ nele, vendendo uma mula que ‘empacava’.
No primeiro dia que o padre resolveu fazer a visita aos paroquianos,
teve uma surpresa: ao subir na mula, ela caminhou somente dez
metros e parou. Ele desceu, puxou as rédeas, deu uns tapas no traseiro
dela, acariciou seu pescoço, conversou com ela, mas nada adiantou, a
E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO

mula continuava ‘empacada’. Então, ele teve uma ideia: subiu na mula
novamente, tirou o breviário (livro que contém orações e leituras) e
começou a ler. Uma hora se passou. Duas. Três. Depois de três horas
suportando todo aquele peso encima dela, a mula ‘entendeu’ que era
melhor ‘desempacar’ e seguir o caminho. Assim, todas às vezes que ela
‘empacava’, o padre abria o breviário, e a mula, então, ‘desempacava’.

UMA CRÍTICA FINAL SOBRE AS TáTICAS


CA P Í TU LO 9

UTILIZADAS NA NEGOCIAçÃO
Qualquer processo da negociação compreende uma amplitude de
219

tarefas, que vai desde a preparação, a interação dos negociadores (em


tese) na busca pelo melhor resultado para ambos, a decisão final sobre
o que foi acordado até, o que é muito importante, o aprendizado de
todos. Entretanto, se observarmos com cuidado o momento da interação
entre os negociadores, quando cada um tenta alcançar o melhor resul-
tado para si, parece representar a essência do ato de negociar, ou seja, a
negociação propriamente dita, e é exatamente quando fica caracterizado
também o jogo dos movimentos e concessões. Portanto, o ato de conce-
der e o de negociar são tão imbricados ou interligados (como a unha e a
cutícula) que é difícil imaginar um sem o outro. Talvez, por isso, eu tenha
dado uma ênfase muito grande nesse assunto, porque, afinal de contas,
representa a essência do que significa negociar.
Entretanto, gostaria de tecer dois comentários que julgo muito importantes:

1o Se, realmente, uma relação de confiança tiver sido


construída entre os negociadores, a intenção de todos
será cooperativa na busca pelo acordo mutuamente

E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO


vantajoso para as partes e, provavelmente, as técnicas
apresentadas anteriormente se transformarão em
‘letra morta’, pois não terão qualquer utilidade para
eles, o que é uma demonstração inequívoca de matu-
ridade das partes.

2o Se observarmos as técnicas apresentadas, todas


elas referem-se à disputa por posições. Já sabemos

CA P Í TU LO 9
que uma negociação baseada na defesa de posições
tem forte probabilidade de provocar o desgaste no
relacionamento dos negociadores, e ainda pode

220
conduzir a negociação para o impasse. Uma longa
série de ofertas e contraofertas, em que cada lado
relutantemente concede um item insignificante após
o outro, consome muito tempo e também tende a
fomentar uma espécie de frustração e hostilidade que
pode disparar uma total ruptura nas negociações.

Portanto, todos os conceitos até aqui apresentados com relação aos


princípios, valores e elementos essenciais da negociação podem naufra-
gar se os negociadores não enxergarem os verdadeiros interesses de
todos os envolvidos no processo.
Por isso, vale a pena apresentar uma consideração final que, talvez,
represente a maneira mais inteligente de se alcançar um acordo mutu-
amente vantajoso na negociação:

SE OS NEGOCIADORES ENTENDEREM
OS FATORES MOTIVADORES DO OUTRO,
ELES PODERÃO RECONHECER POSSÍVEIS
E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO

COMPATIBILIDADES DE INTERESSES
QUE LHES PERMITIRá INVENTAR NOVAS
POSIçõES QUE AMBOS ENDOSSARÃO.

Uma das melhores técnicas para conduzir o processo da negociação é


fazer uma pergunta muito simples: por que eles querem o que querem?
Cada negociador precisa buscar o pensamento e a lógica da outra parte
CA P Í TU LO 9

para determinar os fatores que a motivaram a chegar a esses pontos.


221

ExEMPLO
Dois homens discutem numa sala de trabalho. Um deles
quer a janela aberta enquanto o outro prefere a janela
fechada. A briga entre eles é sobre o quanto da janela deixar
aberto: metade, um terço, apenas uma fresta, etc. Assim, eles
não chegam a nenhum acordo, há apenas conflito e desen-
tendimento. Entra, então, uma secretária e pergunta sobre o
motivo da discussão.
Um deles responde: ‘Quero evitar que uma corrente de ar espa-
lhe todos os papéis da minha mesa’.

O outro diz: ‘Eu quero ter um pouco de ar fresco’.

A secretária, então, sugere: ‘Por que não abrimos totalmen-


te a janela da sala ao lado para recebermos ar fresco sem

E STR AT É G I AS E TÁTI CAS D E N E GO C I AÇÃO


corrente de ar?’

Se você enquadra mal o problema, é improvável que consiga resolvê-lo. No


exemplo citado, os dois homens estavam discutindo exclusivamente sobre
suas posições (‘janela fechada’, ‘janela aberta’), enquanto a secretária, ao
fazer a pergunta sobre o motivo da discussão, descobriu os interesses subja-
centes e apresentou uma solução que não era visível quando os dois homens

CA P Í TU LO 9
estavam discutindo somente sobre suas posições.

Sempre avalie as condições do acordo também pelo ponto de vista do outro.

222
Tente identificar itens que são de valor real para o outro participante, propor-
cionais ao que está sendo pedido, mas, principalmente, algo que represente
uma mudança no que você já estaria disposto a oferecer.

E, um recado final: se você estiver negociando com alguém que parece estar
numa posição enfraquecida, evite levar vantagem da situação negociando
termos inaceitáveis que farão com que sejam nulas as chances de execução
do contrato. Nunca tire a dignidade de alguém, ela pode até não significar
nada para você, mas representa tudo para o outro”, concluiu o mentor.
1
PLANEJAMENTO DA
NEGOCIAÇÃO
P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
Uma grande agitação tomou conta do trainee naque-
le dia, afinal, o tema a ser abordado representava o

CA P Í TU LO 1 0
fechamento do ciclo de seu percurso de aprendiza-
gem. João Pedro, então, aproveitou para esclarecer
algumas dúvidas que o perturbavam insistentemente:

224
“Sr. mentor, será que o planejamento da negociação é
realmente importante? Se isso é verdade, por que muitas
pessoas, em geral, têm o hábito de negociar desprepara-
damente? Quais são as razões que levam uma pessoa a
deixar de considerar a preparação da negociação?”
O mentor explicou que três motivos principais favoreciam esse
comportamento nos negociadores, principalmente nos compradores
profissionais: “O primeiro deles podia ser representado pelo fato de que
eles ignoravam como deveria ser feito um planejamento da negociação;
o segundo é que eles imaginavam que era um desperdício de tempo; e o
terceiro, e mais comum, é que eles, realmente, negligenciavam a impor-
tância do planejamento.”

Assim, o mentor comentou porque era indispensável uma preparação


P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

adequada para conduzir uma negociação com o fornecedor:

IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO
“A falta de uma análise prévia da situação, muitas vezes, causada pelo
excesso de confiança, conduz o comprador a comportamentos inadequa-
CA P Í TU LO 1 0

dos. Sua posição fica vulnerável, as surpresas são sempre desagradáveis,


as argumentações apresentadas pelo fornecedor provocam impactos
desastrosos (porque se constituem em algo que não foi previamente
225

estudado) e as perdas, frequentemente, tornam-se irrecuperáveis.

MAs IssO REPREsENTA uMA fALTA DE


zELO PROfIssIONAL E EvIDENCIA uM
COMPORTAMENTO IRREsPONsávEL, POIs,
sEM EsTAR PREPARADO ADEquADAMENTE,
O COMPRADOR PODE COMETER ERROs
INACEITávEIs E AINDA PREJuDICAR suA
IMAgEM PEssOAL E PROfIssIONAL.
É preciso cercear o otimismo exagerado de alguma maneira. Existe uma
grande diferença entre coragem e excesso de confiança:

• Coragem é uma disposição para correr riscos com o


conhecimento das probabilidades;

• Excesso de confiança significa estar correndo riscos


sem conhecer as probabilidades.

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
Essa atitude (induzida, em parte, por comportamentos não racionais)
de confiar mais na inspiração pessoal e na capacidade de improvisação
do que de negociar conscientemente, de modo mais preparado e melhor
estruturado, representa um imperceptível e traiçoeiro comportamento

CA P Í TU LO 1 0
numa negociação. As alternativas ficam amplamente inexploradas.

Planejamento é, basicamente, uma opção. Assim, decisões são essenciais


para o planejamento, porque representam a parte do processo na qual é

226
feita a escolha de uma alternativa. Por isso, o planejamento diz respeito
não a decisões futuras, mas a impactos futuros de decisões presentes.
Embora o futuro exato não possa ser predito e fatores incontroláveis
possam interferir nos planos melhor formulados, a menos que haja
planejamento, os eventos serão deixados totalmente ao sabor do acaso.

O planejamento compensa a incerteza e as mudanças. Focaliza a atenção


em objetivos, favorece a ‘economicidade’ no processo e permite o contro-
le. Portanto, o planejamento torna possível a ocorrência de eventos que,
caso contrário, não aconteceriam. Se o comprador não planeja a negocia-
ção, ele improvisa, e a improvisação provoca a insegurança. Ele se coloca
apenas na defensiva. Se com planejamento imprevistos já ocorrem,
imagine participar de uma negociação sem estar bem preparado?
fALhAR NA PREPARAçãO PODE
REPREsENTAR uM ERRO INsuPORTávEL
NA NEgOCIAçãO. PORTANTO, NãO CONfIE
NA INsPIRAçãO: PREPARE-sE, PREPARE-
sE, PREPARE-sE (IMPROvIsAR é suICíDIO)

sublinhou o mentor, que continuou:


P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

“Jamais se esqueça das palavras do milionário americano Donald Trump:


‘A pior coisa que alguém pode fazer quando discute um negócio é
mostrar-se despreparado para fechá-lo. O outro sujeito sente o cheiro de
sangue, e aí a pessoa estará liquidada’”, concluiu o mentor.

O trainee não se conteve e perguntou: “Mas como se preparar adequa-


damente para uma negociação?”
CA P Í TU LO 1 0

E o mentor respondeu: “Da mesma forma que um conhecimento muito


raso pode ser perigoso, uma preparação que tem um foco muito estrei-
227

to ou somente uma maneira para alcançar o acordo, pode também ser


arriscada. Você começa a se preparar para uma negociação reunindo
informações tanto sobre seus interesses, recursos e alternativas como
sobre os interesses, recursos e alternativas da outra parte.

Para se preparar para a negociação, alguns cuidados devem ser


observados:

1o Estabeleça suas expectativas em termos de metas e priori-


ze seus interesses com clareza, mas não deixe de considerar
também os interesses da outra parte.
Por que os objetivos e as metas são tão importantes? Porque eles
formam a base de avaliação para as alternativas existentes. São, em
outras palavras, seus critérios de decisão. Para a construção de qualquer
planejamento, o estabelecimento de metas nos oferece duas preciosas
vantagens: o controle e o foco. Sabendo para onde desejamos ir, podemos
corrigir os desvios e concentrar toda nossa energia no objetivo.

Quanto mais tivermos refletido antecipadamente sobre nossos interes-


ses, mais provavelmente vamos atingi-los. Todos os negociadores têm

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
interesses – representados por seus problemas, medos, sonhos, desejos
ocultos, gostos, valores humanos, expectativas, esperanças, exigências,
prioridades, preferências, aspirações, metas, motivações – que direcio-
nam as negociações.

Pontos importantes a se considerar com relação às metas:

CA P Í TU LO 1 0
• Quais são as verdadeiras questões (posição e interesses)
que estão em jogo?

228
• Quais são os interesses subjetivos (por que e para que)
que estão por trás de suas posições. Lembre-se de que inte-
resses são diferentes de posições: a posição é apenas um
caminho para satisfazer um interesse e é, portanto, mais
um meio do que um fim. Por exemplo: um comprador de
carro pode dizer ‘Quero uma Ferrari’ (posição), quando, na
realidade, ele precisa do prestígio associado a esse automó-
vel (interesse).

• Priorize seus verdadeiros interesses (o que você realmente


quer e precisa ou gostaria de obter).
• Estabeleça o valor de cada questão, analisando as áreas
em que seus interesses podem coincidir com os da outra
parte e as áreas em que há potencial para a troca.

• Cuidado para não ficar preso a uma ideia predetermina-


da sobre o que a outra parte precisa ou está interessada
em obter.
P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

• Decida o que você fará caso não conclua o acordo.

• Qual é sua melhor alternativa disponível? Construa sua


alternativa de escape ou rota de fuga. Considere uma
faixa de resultados, ou seja, qual é o resultado ideal que
deverá ser buscado e, caso não seja alcançado, qual é o
limite aceitável além do qual não é vantajoso prosseguir na
negociação?
CA P Í TU LO 1 0

• Quais são os temores dos outros que serão significativa-


mente afetados pelo resultado da negociação?
229

2o Faça uma autoavaliação.

• Como está sua capacitação técnica? Você está preparado


para discutir os temas da negociação com competência?

• Qual é seu estilo dominante? Como se adequar ao estilo


do outro?
• Como você reage em situações de tensão aguda? Preste
atenção aos primeiros sinais que você emite e saiba como
controlar-se.

• Quais são os pontos fortes e fracos do seu estilo, da sua


ideia/proposta, da sua empresa ou da situação?

• Gerencie seus pontos fracos. Não perca tempo tentando

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
reduzir seus pontos fracos: isso é causa perdida.

• Como utilizar e potencializar seus pontos fortes para


sensibilizar o outro?

• Qual sua importância para a empresa dele? O que você (ou


sua empresa) significa para ele? Quanto você representa nos
negócios dele?

CA P Í TU LO 1 0
230
3o Obtenha informações

A informação é a matéria-prima do planejamento. Podemos


reunir grandes e pequenas porções de informação, mas
nunca conseguiremos juntar todas as peças. Na falta de
informações, geralmente, recorremos ao raciocínio indutivo
para tentar adivinhar as chances, ou seja, fazemos suposi-
ções, que nos levam a inferências de certeza relativa, pois
expressam somente probabilidade ou possibilidade. Entre-
tanto, por melhor que pareça a suposição, não permita que
ela o arraste a excessos de confiança.
INfORMAçõEs sOBRE O OuTRO
NEgOCIADOR
Além de definir as metas que você realmente deseja alcançar como
resultado de uma negociação (alguém pode não acreditar, mas, muitas
vezes, isso é difícil de identificar corretamente), é preciso saber o que é
importante para o outro negociador e também para as pessoas às quais
ele, de alguma forma, se subordina ou deve algum tipo de satisfação.
P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

NãO sE EsquEçA DE quE uM gRANDE


ERRO A EvITAR NA NEgOCIAçãO
é PENsAR sOMENTE NO quE Nós
quEREMOs: uM POssívEL ACORDO quE
ATENDA sOMENTE NOssOs INTEREssEs é
CA P Í TU LO 1 0

INúTIL sE ELE NãO ATENDER TAMBéM AO


INTEREssE DO OuTRO LADO DE fORMA
231

ADEquADA E sufICIENTE.

Discutindo exclusivamente a respeito de nossos próprios interesses, nós


enviamos uma mensagem que não estamos inclinados a trabalhar lado
a lado, e isso torna mais difícil a busca conjunta por soluções criativas.
Portanto, considere também os interesses do outro lado.

Entretanto, esse é um aspecto difícil da negociação. Frequentemente,


achamos que o outro lado vê o mundo do mesmo modo que nós, mas é
preciso saber quais são os reais interesses do outro lado se quisermos
propor uma opção aceitável por ele. Não importa que tipo de abordagem
usaremos. É muito importante e útil ter alguma ideia dos interesses do
outro negociador antes de nos encontrarmos para negociar.
Pontos importantes a se considerar no mapeamento do outro negociador:

• Qual é sua experiência anterior (como ele se comportou nas


outras negociações)?

• Com relação a ele, qual é seu estilo pessoal dominante (pontos


fortes e fracos – evite focar nos pontos fracos dele); quais são seus
valores humanos, egos, vaidades, motivações, necessidades, exigências,
expectativas, segurança, limitações, gostos e crenças; e, ainda, como

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
ele percebe as pessoas e a situação?

• Se você fosse ele, o que gostaria de obter ou evitar? Classifique ou


priorize os interesses dele.

• Que alternativas ele possui? Qual é a melhor alternativa de


saída que ele tem?

• Quais são os interesses subjetivos dele (por que e para que) que estão

CA P Í TU LO 1 0
por trás das posições? E quais podem ser (exatamente) esses aspectos
subjetivos? Ele pode, por exemplo, querer status, reputação, prestígio,
respeito, sentir-se competente, evitar riscos?

232
• Quais são os temores dos outros terceiros que serão significativamente
afetados pelo resultado da negociação? Lembre-se sempre da ‘terceira
mesa’, ou seja, pessoas a quem ele deve satisfação dos resultados da
negociação (pode ser o chefe, o diretor, o colega do departamento, o
sócio, a esposa, os filhos, o subordinado direto, etc.).

Às vezes, pensamos que é tarefa dele convencer esses terceiros em rela-


ção às decisões da negociação, mas não é, a tarefa é nossa! A principal
razão é porque, mesmo que ele concorde com o nosso ponto de vista ou
argumentação, se entender que esses ‘terceiros’ não concordarão, nem
perderá o tempo dele para convencê-los: ele simplesmente não concorda-
rá também! Por isso é que é um problema nosso ‘pavimentar’ a estrada
com argumentos, provas, fatos e dados para que ele possa convencer
facilmente seus ‘terceiros’.
• Qual é o poder de decisão ou influência dele? Identifique qual é o
processo decisório do outro: quem mais, além dele, pode influenciar a
decisão? Saber quem estará representando a outra parte na mesa de
negociação é útil para avaliar a autoridade dessa pessoa.

NEgOCIE sOMENTE COM quEM


DECIDE Ou INfLuENCIA A DECIsãO!
P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

INfORMAçõEs sOBRE O CONTEXTO


(CENáRIO)
A influência do movimento do mercado sobre os resultados de qualquer
negociação (com ou sem fins lucrativos, do setor privado, estatal, benefi-
cente ou religioso) é uma realidade que também tem que ser considera-
CA P Í TU LO 1 0

da, pois devemos conhecer o contexto da negociação em que todos estão


inseridos.

A pergunta fundamental é: Quais são as tendências dos cenários?


233

A total impossibilidade de influir sobre alguns aspectos do mercado (fora


de nosso controle) e uma dificuldade de perceber algumas tendências (ou,
até mesmo, de acreditar nelas) tornam difícil a estruturação desse sistema.
Assim, numa negociação de grande vulto e importância, ou que tenha
componentes de risco elevados, alguns aspectos devem ser observados:

ASPECTOS
• Capital disponível (fundos,
ECONÔMICOS equipamentos, instalações);

• Mão-de-obra (custo, qualidade,


disponibilidade);

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
• Preços praticados;

• Tendência de preços (inflação,


custo, matéria-prima);

• Tendência de mercado (oferta x


demanda);

• Políticas monetária/fiscal/
tributária (paridade da moeda,

CA P Í TU LO 1 0
imposto para carros populares);

• Política de importação/
exportação.

234

ASPECTOS
• Família (número de filhos);
SOCIAIS • Religião (fanatismo, esoterismo);

• Costumes (casamento, divórcio);

• Ecologia (qualidade de vida,


desperdício);

• Valores morais (‘marajás’, políti-


cos, corrupção).
ASPECTOS
• Maior domínio do espaço/tempo
TECNOLÓGICOS (aviões, dutos, naves, trens);

• Capacidade energética (gerar,


armazenar, transportar e distri-
buir: eletricidade, energia térmi-
ca, nuclear, eólica, solar);

• Novos produtos e processos


(ligas de aço, fibras sintéticas,
P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

plástico, cerâmica);

• Mecanização (robotização,
controle numérico);

• Internet, comunicações.
CA P Í TU LO 1 0

ASPECTOS
• Legislação/regulamenta-
POLÍTICOS
235

ção (microempresa, metanol/


gasolina);
LEGAIS • Expansão da atividade econô-
mica (zona franca, tarifas
especiais);

• Licitação à atividade econômi-


ca (Sindicato, Procon, Código do
Consumidor).
4o Priorize o relacionamento interpessoal e a comunicação.

Um elemento crítico em qualquer negociação – e um dos que causam a


maior parte de nossa ansiedade – é a qualidade do relacionamento que
temos com o outro lado. Um bom relacionamento capacita-nos a lidar
eficientemente com as diferenças. Devemos ter ideia de como construir
um relacionamento interpessoal que possa facilitar o acordo. Na verdade,
a qualidade do relacionamento não acontece por acaso, é o resultado de

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
como nos relacionamos uns com os outros. O processo é importante, pois
pode mudar o espírito de antagonismo entre dois negociadores para uma
relação ganha-ganha e vice-versa. A negociação exige uma boa comunica-
ção bilateral, em que cada lado tem a intenção de influenciar o outro.

5o Saiba fechar o acordo.

CA P Í TU LO 1 0
A qualidade do resultado da negociação é também medida pela quali-

236
dade das promessas que são feitas: os acordos provavelmente serão
melhores se tivermos pensado antecipadamente a respeito das promes-
sas específicas que nós realmente podemos esperar ou fazer durante ou
no ato de conclusão da negociação.

Nos negócios, selamos um acordo dando as mãos ou assinando um


contrato. Essas formalidades prescrevem nossa conduta futura, ainda
que as condições mudem a ponto de desejarmos ter feito um acordo
diferente. Ao mesmo tempo, elas no protegem de sermos prejudicados
pela outra parte.

Entretanto, o ponto mais crítico do fechamento do acordo não é o seu


‘fechamento’ propriamente dito, mas como os negociadores irão imple-
mentar as ações acordadas e, principalmente, como deverão solucionar
as alterações imprevisíveis que ocorrerem no futuro.
Pontos importantes a serem evitados no fechamento da negociação:

Deixar de considerar futuras alterações nos acordos

Se os negociadores falham em discutir como deve-


rão lidar com futuras surpresas, as consequências
podem destruir o relacionamento, e o negócio não
será duradouro.
P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

Assumir que todos estão cientes dos objetivos da reunião

Se um lado entender que a negociação é para lidar


com determinado problema, não significa que o outro
concorde que o produto da reunião seja um plano de
ação para resolvê-lo. Por isso, torne claro o propósito e
CA P Í TU LO 1 0

o processo da reunião. Se você estiver sentado à mesa e


sentir que está perdendo tempo, é porque, certamente,
os participantes não estão preparados. Assim que você
237

estiver preparado para negociar, invista um tempo para


esclarecer o propósito da reunião.

Esquecer de determinar as ações necessárias para


alcançar o acordo

Frequentemente, nós falhamos ao acreditar que uma


decisão sempre se transforma numa ação sem qual-
quer esforço de implementação, mas essa implemen-
tação não ocorrerá se não fizermos um esforço para
que isso aconteça.
Deixar de planejar um processo para conseguir o
compromisso

Prepare uma lista de ações antes da negociação – passí-


vel de ser alterada durante o processo – para que você
tenha um check-list de itens que deverão ser discuti-

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
dos. Certifique-se de que todos os acordos alcançados
estão claros e perfeitamente entendidos por ambas (ou
todas) as partes e registre (formalize) todas as condi-
ções acordadas e ajustadas durante a negociação.
O registro ou a memória dos itens acordados na nego-
ciação não é um documento jurídico, mas é um acordo

CA P Í TU LO 1 0
de valor moral”, finalizou o mentor.

238
“A seguir”, disse o mentor a João Pedro, “Vou apresentar um roteiro
prático de um planejamento que pode facilitar sua preparação todas as
vezes que você for participar de uma negociação, principalmente quando
as metas a serem alcançadas forem muito importantes, seja em termos
estratégicos, seja em termos de montante financeiro.”
ROTEIRO DO PLANEJAMENTO
1° ANáLIsE DO CONTEXTO (CENáRIOs)

quAL é A sITuAçãO PREsENTE, A EsTRATégIA gERAL, As

fORçAs E As fRAquEzAs DO sEu fORNECEDOR?


P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
CA P Í TU LO 1 0

quAL é A POsIçãO DELE NO MERCADO, LíDER Ou sEguIDOR?


239

quAL é A EsTRuTuRA DE COMPETITIvIDADE ENTRE sEu

fORNECEDOR E Os RIvAIs DELE. sãO INIMIgOs, AMIgOs,

TêM CONEXãO Ou AgEM DE fORMA INDEPENDENTE?


quAL é suA IMPORTÂNCIA (COMO CLIENTE) PARA A

EMPREsA fORNECEDORA? quANTO vOCê REPREsENTA

NAs vENDAs DELA (EM TERMOs DE vOLuME E DE

LuCRATIvIDADE)?

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
quAL é suA IMPORTÂNCIA PARA O ‘vENDEDOR’

DO fORNECEDOR (sEJA ELE uM fuNCIONáRIO Ou

CA P Í TU LO 1 0
REPREsENTANTE AuTôNOMO) PARA vERIfICAR ATé quE

PONTO ELE PODE sER uM ALIADO IMPORTANTE PARA vOCê.

24 0

quAL é A TENDêNCIA DE PREçOs, DA ATIvIDADE ECONôMICA,

DOs AsPECTOs POLíTICOs?


2° PERfIL DOs NEgOCIADOREs
vOCê MEsMO

quAL é sEu EsTILO DOMINANTE?


P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

quAIs sãO sEus PONTOs fORTEs quE vOCê DEvE

usAR PARA sENsIBILIzAR O OuTRO?


CA P Í TU LO 1 0

quAIs sãO sEus PONTOs fRACOs quE vOCê DEvE


24 1

TENTAR gERENCIAR?

COMO vOCê REAgE EM sITuAçõEs DE PREssãO?


quAL é suA CAPACITAçãO TéCNICA PARA DIsCuTIR O

TEMA CENTRAL DA NEgOCIAçãO?

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
O OuTRO NEgOCIADOR

COMO ELE sE COMPORTOu NAs OuTRAs

NEgOCIAçõEs (EXPERIêNCIA ANTERIOR)?

CA P Í TU LO 1 0
24 2
quAIs sãO sEus vALOREs huMANOs, EsTILOs

PEssOAIs (PONTOs fORTEs E fRACOs), EgO, vAIDADE,

MOTIvAçõEs, POsIçõEs DECLARADAs?


3° IDENTIfIquE As PARTEs RELEvANTEs

quAIs PEssOAs (DO sEu LADO) sERãO AfETADAs PELO

REsuLTADO DA NEgOCIAçãO?
P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

quAIs PEssOAs (RELATIvAs AO OuTRO NEgOCIADOR)

vOCê AChA quE sERãO AfETADAs PELO REsuLTADO DA

NEgOCIAçãO?
CA P Í TU LO 1 0
24 3
4° CLAssIfIquE Os INTEREssEs

O quE vOCê gOsTARIA DE OBTER?

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
sE vOCê fOssE O OuTRO NEgOCIADOR, O quE gOsTARIA DE

OBTER Ou EvITAR?

CA P Í TU LO 1 0
quAIs sãO Os TEMOREs DOs OuTROs (TERCEIROs) quE

24 4
sERãO sIgNIfICATIvAMENTE AfETADOs PELO REsuLTADO DA

NEgOCIAçãO?
5° fAçA uMA sONDAgEM DOs INTEREssEs
suBJETIvOs POR TRás DAs POsIçõEs

quAIs sãO Os INTEREssEs suBJETIvOs quE EsTãO

POR TRás DAs POsIçõEs (POR quE E PARA quE)?


P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

Os sEus
Os DELE
CA P Í TU LO 1 0

6° CRIE OPçõEs PARA ATENDER A AMBOs


24 5

Os INTEREssEs

sEus INTEREssEs INTEREssEs DELE OPçõEs POssívEIs


quAIs sãO Os REsuLTADOs quE vOCê
DEsEJA ALCANçAR?

• Suas metas devem ser amplas e também devem ser


mensuráveis, coerentes e factíveis, porém desafiantes.

• Qual é o seu resultado ideal?

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
• Dimensione (quanto) e temporize (quando) a realização
de suas metas.

COM BAsE NAs INfORMAçõEs Ou NA

CA P Í TU LO 1 0
PROPOsTA quE vOCê Já TEM, PROCuRE
DEfINIR quAIs PODERIAM sER As
NECEssIDADEs E EXPECTATIvAs DE

24 6
CuRTO E DE LONgO PRAzOs DO OuTRO
NEgOCIADOR.

• Quais devem ser os resultados dominantes objetivados


por ele?

• Em que ordem ele os quer?

• Dimensione (quanto) e temporize (quando) a expecta-


tiva de alcance das metas dele.
7° ENCONTRE CAMINhOs PARA MAXIMIzAR
gANhOs CONJuNTOs

COMBINE RECuRsOs COMBINE RECuRsOs


sIMILAREs PARA DIfERENTEs PARA
CONsTRuIR vALOR PRODuzIR vALOR
P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

vOCê
CA P Í TU LO 1 0

ELE
24 7
RECuRsOs sIMILAREs:

DEsCuBRA MEIOs DE TRABALhAR JuNTOs


PARA fAzER MAIs

• Com habilidades e recursos similares, as partes podem


trabalhar juntas para obter economia de escala.

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
• Com habilidades e recursos diferentes, você deve ser
capaz de trabalhar junto para criar algo que sozinho você
não conseguiria.

CA P Í TU LO 1 0
RECuRsOs sIMILAREs:

DEsCuBRA vALOR NAs DIfERENçAs

24 8
• aversão ao risco

• tempo: As pessoas trabalham em diferentes tempos. Em


alguns lugares, o conceito de tempo (rapidez ou lentidão) é
diferente.

• percepção: Para uns, o status é mais importante; para


outros, o mais importante é a credibilidade.

• valor marginal para o mesmo item: Utilidade decrescente.


8° O quE fAzER CAsO vOCê NãO CONsIgA
ChEgAR A uM ACORDO?

POssívEIs
PRós CONTRAs
ALTERNATIvAs

1.

2.
P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

3.

4.

quAL é A suA MELhOR ALTERNATIvA, ALéM DA quAL é


PREfERívEL NãO NEgOCIAR?
CA P Í TU LO 1 0

EsCREvA Os PAssOs CONCRETOs (AçõEs) quE vOCê


DARá PARA ENRIquECER E vALIDAR suA MELhOR ALTER-
NATIvA ANTEs DE sE DIRIgIR PARA A NEgOCIAçãO:
24 9
9° O quE ELE PODERá fAzER CAsO NãO
CONsIgA ChEgAR A uM ACORDO?

O quE ELE PODE fAzER PARA sATIsfAzER Os


INTEREssEs DELE?

POssívEIs
PRós CONTRAs
ALTERNATIvAs

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
1.
2.
3.
4.

• O quE vOCê fARIA sE fOssE ELE?

CA P Í TU LO 1 0
• quAIs ALTERNATIvAs sERIAM MELhOREs PARA ELE?

25 0

O quE vOCê DEvE fAzER, DE uMA fORMA LEgíTIMA, PARA


TORNAR MENOs ATRAENTE A ‘MELhOR ALTERNATIvA’ DELE?

• Tornando-a difícil de obter? Como?


• Influenciando a percepção dele de quanto a melhor
alternativa dele é onerosa ou insensata? Como?
10° TáTICAs (COMO AuMENTAR sEu
PODER Ou REDuzIR O PODER DO OuTRO?)

TáTICAs CONTRA TáTICAs


vOCê
P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

ELE

11° IMPAssEs

ITENs A AvALIAR EsTRATégIAs DE sOLuçãO


CA P Í TU LO 1 0

•IDENTIfIquE As PROBABILIDADEs

DE OCORRêNCIA DE IMPAssEs E As
25 1

EsTRATégIAs PARA suPERá-LOs

(ARguMENTOs, fATOs, DADOs,

fONTEs DE REfERêNCIA, PROvAs,

MECANIsMOs DE PERsuAsãO).

• IMAgINE sOLuçõEs CRIATIvAs

PARA DIvERgêNCIAs.

• REEsTRuTuRE sEu PACOTE DE

fORMA DIfERENTE PARA INTEgRAR

PONTOs DE COMuM ACORDO.

• LIsTE TODOs Os ITENs quE vOCê

NãO EsTá PREPARADO PARA

NEgOCIAR.
12° CONCEssõEs

ITENs A AvALIAR EsTRATégIAs DE sOLuçãO

• EsTABELEçA As EsTRATégIAs
DE CONCEssãO E O CusTO DELAs
(ACEssóRIOs PARA PERMuTAs/
TROCAs).

• EsTuDE As quANTIDADEs E Os

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
PREçOs, E DEfINA sEu EsPAçO
PARA NEgOCIAR, REsERvANDO
ACEssóRIOs PARA PERMuTA.

• LIsTE TODOs Os ITENs quE vOCê


EsTá PREPARADO PARA NEgOCIAR
(vOCê DEvE usá-LOs COMO
ALTERNATIvAs DE BARgANhA

CA P Í TU LO 1 0
DuRANTE As NEgOCIAçõEs)

• quAIs CONCEssõEs vOCê EsTá


PREPARADO PARA fAzER DuRANTE

25 2
A NEgOCIAçãO?

• quAIs CONCEssõEs vOCê


gOsTARIA DE OBTER DO OuTRO
LADO COMO CONTRAPARTIDA?

13° fORMALIzAçãO DO fEChAMENTO

• Certifique-se de que todos os acordos alcançados estão claros


e perfeitamente entendidos por ambas (ou todas) as partes.

• Registre (formalize) todas as condições acordadas e ajustadas


durante a negociação.”
Neste momento, o mentor integrada, em uma mesma dire-
concluiu que já havia cumprido ção: a do seu desenvolvimento
a sua missão. Mas, ao se despedir pessoal e profissional.
do trainee, fez questão de contri-
A vida é uma experiência trans-
buir com a última e mais valiosa
formacional. E as mudanças, para
de suas recomendações:
serem significativas, precisam
“Caro João Pedro, minha tarefa acontecer, primeiro, no interior
se encerra aqui porque imagino de cada um de nós, para, só então,
P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO

que já transmiti o aprendizado se expandirem rumo ao exterior,


‘informacional’ para você. Porém, contagiando não apenas a própria
lembre-se sempre de que o mais pessoa, mas a todos à sua volta.
importante é o aprendizado
Para promover um aprendizado
‘transformacional’. Você deve
transformacional, não se esqueça
estar pensando: ‘Como alcançar o
de fazer sempre uma avaliação
aprendizado transformacional?’,
CA P Í TU LO 1 0

a respeito do seu desempenho


não é verdade?
pessoal com relação aos resulta-
O aprendizado transformacional dos alcançados em todas as nego-
25 3

diz respeito a tudo aquilo capaz de ciações, não somente naquelas


introduzir mudanças significati- em que você assumiu o papel de
vas no seu ser, uma vez que requer protagonista, mas também naque-
envolvimento, compreensão e las em que você foi coadjuvante.
sentimento. Pode ser um processo
Após a conclusão de qualquer
mais longo que o informacio-
negociação de que você participar,
nal, mas é também muito mais
é útil fazer uma reflexão a partir
profundo e tende a enraizar-se
de algumas perguntas simples:
solidamente na sua mente. Ele
se propaga por cada célula do
seu corpo, colocando a mente, o
corpo e o coração, de uma maneira
• O quE ACONTECEu ?

• O quE DEu CERTO?

• O quE DEu ERRADO?

• O quE ME suRPREENDEu?

P L A N E JA M E NTO DA N E GO C I AÇÃO
• O quE POssO fAzER PARA
MELhORAR?

• COMO ACONTECEu?

CA P Í TU LO 1 0
• POR quê?

25 4
Faça sempre tais questionamentos. Considero que essa é a maior contri-
buição que posso lhe oferecer.

Apenas para reforçar, vou lhe dizer uma frase de George Santayana,
presente em seu livro ‘A vida da razão’, de 1905: ‘Quando a experiência
não é retida, como acontece entre os selvagens, a infância é perpétua. Por
isso, aqueles que não conseguem lembrar do passado, estão condenados
a repeti-lo.’

Pense nisso, meu caro João Pedro. Desejo-lhe muito sucesso!”


CONSIDERAÇõES
FINAIS

O filme “O Gladiador” nos mostra uma cena em que


CO NS I D E RAÇÕ E S F I NA I S

o escravo Maximus, um ex-general romano (no


filme, interpretado pelo ator Russel Crowe), tem
um encontro no Coliseu de Roma com o Imperador
César logo após sua vitória numa luta desigual
contra guerreiros inimigos melhor armados e
25 5

protegidos. Essa luta foi planejada intencionalmen-


te para que ele e todo o seu grupo de gladiadores
fossem assassinados impiedosamente. Quando César
indagou qual era seu verdadeiro nome, Maximus,
que estava de máscara, virou-se e deu as costas ao
Imperador publicamente, um ato completamente
desrespeitoso e inaceitável para um escravo e, por
isso, passível de ser punido com a morte imediata.

Logo depois, quando Maximus se identificou e César


tomou conhecimento de quem se tratava (era seu
desafeto e por quem nutria extremo ódio), sua
vontade suprema foi condenar o escravo gladiador
à morte naquele mesmo momento. Entretanto, como as pessoas (o
povo) que se encontravam assistindo à luta imploraram em coro que
o poupasse, César não teve outra opção senão a de absolvê-lo por
aquele comportamento.

Estou relatando esse caso para fazer uma analogia dessa cena com o
nosso dia a dia. Na nossa vida, quem são nossos “clientes”? Podemos
considerar como nossos clientes todos aqueles a quem servimos.
Nessa perspectiva, nossos pais, nossos filhos, nosso cônjuge, nossos
amigos e todos (repare, todos) nossos colegas na empresa representam
nossos verdadeiros clientes.

O que o “povo” representava naquele momento no Coliseu? E, porque,


César não teve coragem de punir o escravo que lhe deu as costas?

CO NS I D E RAÇÕ E S F I NA I S
A razão é simples: o povo no Coliseu representava o “cliente”, que
se tornou um admirador de Maximus após sua sensacional vitória
contra os guerreiros inimigos.

Tem um ditado popular que diz: “A grande diferença entre Deus e o


cliente é que Deus perdoa.”

Lembre-se sempre disso, caro leitor, 25 6

nossos clientes são as únicas pessoas


que têm o poder, a legitimidade e o
direito de nos julgar.

César não seria perdoado pelo povo se condenasse Maximus à morte.

Moral da história: Se você conquistar seus clientes, pode se dar ao


luxo de virar as costas para o pior dos seus inimigos!
Portanto, meu caro leitor, preste muita atenção: quer goste, quer
não goste dos seus clientes (principalmente seus colegas de empre-
sa), isso é irrelevante; trate de conquistá-los, porque a retaliação de
clientes é insuportável!

APENAS PARA CONCLUIR,


SEGUEM ALGUNS PEQUENOS
LEMBRETES:
CO NS I D E RAÇÕ E S F I NA I S

01
não devemos nos esquecer do longo
prazo: não adianta vencer a batalha e
perder a guerra. Ganhar uma negociação
com foco apenas no curto prazo signifi-
ca uma vitória pífia, de farol baixo;
25 7

02
é fundamental entender que justiça é
uma questão importante em uma nego-
ciação. A outra parte deve ser deixada em
uma posição viável, pois as pessoas que
se sentem injustiçadas têm a tendência
de rejeitar acordos, mesmo quando são
interessantes para elas: prometemos
conforme nossas esperanças, mas agimos
conforme nossos receios;
03
por último, uma consideração muito
importante: a maior parte das nego-
ciações é realizada através da intera-
ção entre seres humanos, e não entre
máquinas, e, como sabemos, na negocia-
ção, as jogadas são sequenciais, ou seja,
voltaremos a nos encontrar novamente.
Assim, para que possamos construir
uma relação duradoura e sustentável,
o caminho tem que estar completamente
limpo e as portas sempre abertas.

CO NS I D E RAÇÕ E S F I NA I S
Sucesso!

25 8
Carlos Pessoa
ANExO 1
Prof. Sumantra Ghoshal
London Business School

BAJAJ AUTO
BAJAJ AUTO é uma indústria automobilística da
Índia que produz, especialmente, triciclos e motoci-
cletas. Somente cerca de 25% dos seus custos totais
A N EXO 1

estão relacionados ao que a empresa produz inter-


namente; 65% estão relacionados aos suprimentos
adquiridos. Ao reduzir 5% dos custos de compra, são
25 9

gerados benefícios muito maiores para a empresa do


que uma redução de custo comparável a qualquer
outra atividade interna.

Embora a redução de custos internos e externos


não seja reciprocamente exclusiva, as participações
relativas a ambos sugerem qual dos dois deve ter
mais prioridade.

A BAJAJ AUTO reconheceu essa prioridade e lançou uma


iniciativa importante para melhorar a gerência de sua
rede de fornecimento. Existem dois meios diferentes de
as empresas realizarem essa tarefa, cada um correspon-
de a uma filosofia de gerenciamento muito diferente.
• O primeiro meio envolve a
utilização do seu grande poder
de compra e as habilidades de
negociação
(Esse foi o meio que José Ignácio Lopez utilizou para
reduzir os custos de compras da general motors (gm) em
vários bilhões de dólares.)

•O segundo meio envolve a criação


de relacionamentos de parceria
com seus fornecedores, baseado na
confiança mútua e num compromisso
de interdependência, e requer
também habilidades de aprendizagem

A N EXO 1
conjunta e resolução de problemas

260
(Esse meio pode produzir resultados notáveis, como os que
Jonh Neil alcançou no grupo unipart, no reino unido).

Os dois métodos podem ser eficazes, já que ambos podem atingir os


objetivos da BAJAJ AUTO de reduzir seus custos de compra. Por isso, a
escolha entre as duas abordagens não pode ser definida baseando-se
em qual das duas funcionam: deve ser definida com base nos valores e
crenças da empresa e seus dirigentes.
A alternativa estratégica que a BAJAJ AUTO deve seguir será determina-
da por quem ou o que ela é ou quer ser como empresa.

RELACIONAMENTOS RELACIONAMENTOS
BASEADOS NO PODER DE PARCERIA

PERDE-GANHA GANHA-GANHA

BASEADO NO
BASEADO NA TRANSAÇÃO
RELACIONAMENTO

CURTO PRAZO LONGO PRAZO

SEU PROBLEMA NOSSO PROBLEMA


A N EXO 1

MEU BENEFÍCIO NOSSO BENEFÍCIO


261

MAXIMIZAR
MAXIMIZAR AUTONOMIA
INTERDEPENDÊNCIA

O RELACIONAMENTO BASEADO NO PODER


José Ignácio Lopez tem sido um dos dirigentes mais controversos e inco-
muns dos anos de 1990. Embora sua carreira tenha terminado de manei-
ra desonrosa, seguida por alegações de roubo de documentos e planos
secretos da GENERAL MOTORS, quando ele deixou a empresa e foi para
a VOLSKWAGEN, até mesmo seus piores caluniadores admitem que ele
desempenhou um papel importante na transformação das duas empresas.
De acordo com suas próprias alegações, Lopez economizou $10 bilhões
de dólares nos custos de compras da GENERAL MOTORS. Segundo a
GENERAL MOTORS, esse valor foi de, aproximadamente, $4 bilhões. Mas,
qualquer que seja o valor real, o mais impressionante é que ele conse-
guiu essa economia em apenas 10 meses, tempo total que permaneceu
em Detroit. Numa empresa tão grande e complexa quanto a GENERAL
MOTORS, a maioria dos gerentes leva esse tempo simplesmente para
descobrir onde ficam os banheiros!

Os métodos que Lopez utilizou para atingir esses resultados em tão


pouco tempo foram muito simples:

• A primeira medida envolvia a centralização das compras.


Como na GENERAL MOTORS a maioria dos itens era compra-
da separadamente, sua primeira atitude foi centralizar

A N EXO 1
todas as compras na empresa.

• A segunda medida foi exigir que os preços fossem reduzi-

262
dos em até 50%. Em troca, ele prometeu volumes de compra
significativamente maiores. Quem recusou as reduções de
preço, foi tirado da lista de fornecedores. Meios criativos
foram encontrados para contornar quaisquer obrigações
contratuais contrárias.

Para a maioria dos fornecedores, havia poucas opções, porque a


GENERAL MOTORS era o maior cliente deles. As altas reduções de
preços foram extremamente dolorosas, mas, pelo menos, eles teriam
algum tempo para criar outras opções. Sendo assim, muitos concor-
daram, o que gerou uma melhoria imediata e espetacular na posição
de custo da GM e, por conseguinte, em sua lucratividade. Embora
algumas dessas economias tenham ocorrido por causa dos ganhos
de escala que os fornecedores puderam alcançar através de volumes
maiores, boa parte delas – pelo menos, no curto prazo – veio da redu-
ção de suas margens.

As negociações eram amplamente transacionais entre a GM e os


fornecedores, protegendo suas autonomias, cada um procurando o
melhor arranjo possível dadas às circunstâncias e solucionando os
problemas existentes.

É difícil dizer como o relacionamento da


gm com seus fornecedores teria evoluído se
Lopez tivesse continuado na gm.

Entretanto, depois da saída de Lopez, o relacionamento com os


A N EXO 1

fornecedores tornou-se um grande problema para a GM. Embora


as economias que ele adquiriu fossem a âncora para que a GM
263

celebrasse a virada, a empresa tem gasto um esforço enorme para


reparar o relacionamento com seus “fornecedores-chave”. Alguns dos
mais inovadores deixaram a empresa e se tornaram os fornecedores
preferidos da FORD ou da CHRYSLER, e a GM teve que se empenhar
muito para persuadi-los a confiar novamente na empresa. No
geral, a produtividade, a eficiência e o custo da gerência da rede
de fornecimento da GM melhorou radicalmente, no entanto, é a
CHRYSLER (e não GM) que é citada atualmente como um modelo de
administração de relacionamento com fornecedores na indústria de
automóveis nos Estados Unidos.
O RELACIONAMENTO DE PARCERIA
A alternativa para esse relacionamento baseado na parceria é melhor
ilustrado pelas experiências do UNIPART GROUP OF COMPANIES, na
Inglaterra. A UNIPART nasceu quando Margaret Thatcher se aborreceu
com a BRITISH LEYLAND, de propriedade do governo, cujos subsídios
governamentais destinados à empresa tinham ultrapassado, e decidiu
privatizar a empresa.

A parte relativamente boa da BRITISH LEYLAND encontrou empresas


compradoras: a JAGUAR foi para a FORD; a divisão de caminhões foi
comprada pela DAF holandesa; a VOLVO sueca foi comprada por uma
empresa de ônibus; e a BRITISH AEROSPACE, do Reino Unido, foi engolida
por uma empresa de carros, e adotou um novo nome ROVER.

Restou como desafio um negócio de peças totalmente não competitivo


e um portfólio de unidades envolvidas com terceirização e distri-
buição. Esse era o resíduo nada promissor da BRITISH LEYLAND, que,

A N EXO 1
após a compra de seus ativos por funcionários e investidores em 1987,
tornou-se a UNIPART GROUP OF COMPANIES.

264
De acordo com um estudo do Departamento de Indústria e Comércio
do Reino Unido, quando foi fundada como uma empresa independente,
a UNIPART sofreu uma desvantagem de dois para um na produtividade
face às empresas de autopeças japonesas, e houve uma lacuna de cem
para um em relação à qualidade. Ela herdou um clima de trabalho
extremamente controverso, consequência de uma força de trabalho
fortemente sindicalizada frente a uma gerência autocrática e tradi-
cional. Os relacionamentos adversários estenderam-se também aos
seus fornecedores e clientes.

Uma década depois, a história tinha mudado completamente.


O turnover reduziu, os lucros quadruplicaram para £32 milhões e
o estudo do Departamento de Indústria e Comércio publicou que a
UNIPART era a única empresa de seu segmento no Reino Unido que
atendia aos padrões de qualidade mundiais. Ela também emergiu como
uma das ações de melhor desempenho no FTSE.

No âmago da transformação da empresa, tinha um homem, Jonh Neil,


CEO da UNIPART, e o comprometimento absoluto com o que ele descre-
via como criar “relacionamentos de parceria”. Atribuindo os proble-
mas crônicos da indústria automotiva no Reino Unido à sua confiança
nos “relacionamentos baseados no poder tradicional”, ele percebeu a
necessidade dos “relacionamentos de parceria” não como um altruís-
mo, mas como essencial para o próprio interesse comercial.

Para Neil, o novo relacionamento não era uma retórica vazia e, logo, o
ideal filosófico foi convertido para uma ação que poderia ser imple-
mentada em todos os segmentos, internos e externos, da empresa. Em
A N EXO 1

relação aos clientes, a tradução tomou a forma do programa “de dez


para zero”. Ao invés de funcionar como um sistema tradicional de
avaliação dos fornecedores, esse programa enfatizava a avaliação do
265

desempenho conjunto dos fornecedores da UNIPART de acordo com 10


critérios que classificavam desde os custos transacionais e o prazo de
entrega até os graus de defeitos e os erros de entrega.

O objetivo era atingir a contagem zero em cada área, tanto para a


UNIPART quanto para os fornecedores, que compartilhavam igualmen-
te os benefícios do processo, a melhoria da qualidade e a redução de
custos. O relacionamento da UNIPART com a TUNGSTONE, uma produ-
tora de baterias criada há cem anos no Reino Unido, forneceu um bom
exemplo de como o programa “de dez para zero” funcionou.

Uma vez desfrutando uma fatia de 25% do mercado do Reino Unido de


bateria de reposição, por volta de 1989, a TUNGSTONE teve um declínio
tão acentuado que a empresa considerou seriamente a opção de fechar
o negócio. Um sintoma de seus problemas profundamente enraizados:
em 1989, menos de 50% de suas remessas para a UNIPART (um de seus
maiores clientes) foram entregues no prazo estipulado.

Assim que Neil convenceu a TUNGSTONE a se unir ao programa “de


dez para zero”, uma equipe conjunta de funcionários da UNIPART-
TUNGSTONE foi designada para ser responsável por cada uma das dez
medidas de desempenho, com o objetivo de atingir uma contagem zero.
Seguindo os procedimentos cuidadosamente definidos, a equipe adotou
uma abordagem sistemática para analisar toda a rede de produção e
distribuição da TUNGSTONE e da UNIPART, observando tudo, desde os
pedidos e fabricação até a entrega e instalação do cliente final.

Em conjunto, a equipe desenvolveu inovações em áreas como preci-


são, troca de dados eletrônicos e processos de produção. Os resulta-
dos foram rápidos e significativos, como a disponibilidade imediata
de produtos e a melhoria de 48%, em 1989, para 96%, em 1991. Esses

A N EXO 1
resultados não foram facilmente obtidos. Eles requeriam que ambas
as partes trocassem informações, mas nenhuma delas se sentiu à
vontade nessa troca. A interdependência criada através das equipes

266
fez com uma se sentisse vulnerável em relação à outra. Às vezes, as
comunicações eram difíceis, já que todas as questões tinham que ser
colocadas abertamente. Mas, com o tempo, quando a relação centrada
em “nós-eles” deu espaço ao aprendizado e à resolução de problemas
conjuntos, foram realizadas inovações que reduziram radicalmente
os custos de toda a rede, ao invés de meramente passar os custos de
uma parte para a outra.
UMA QUESTÃO DE VALORES E FILOSOFIA
José Ignácio Lopez e John Neil atingiram o objetivo de reduzir radical-
mente os custos de suprimentos. Ambos métodos funcionaram muito
bem. Então, a BAJAJ AUTO precisa fazer uma escolha. Independente-
mente do que sua retórica pública possa ser, o que é necessário para
reestruturar a gerência de sua rede de fornecimento refletirá um ou
outro desses dois relacionamentos. A escolha definirá os valores e
a filosofia da empresa – as hipóteses arraigadas que seus dirigentes
fazem sobre a natureza de indivíduos e organizações.

• Se eles admitirem que todos os indivíduos agem somen-


te de acordo com seus interesses próprios, e que, pelo
menos, alguns são indignos de confiança e não podem
ser identificados antecipadamente, então, eles irão prefe-
A N EXO 1

rir o relacionamento baseado no poder, que é, afinal,


o relacionamento que governa todas as transações do
267

mercado.

• Se, ao contrário, eles acreditarem que os indivíduos


se comportam diferentemente em situações diferentes e
tendem a corresponder aos relacionamentos daqueles
com quem estão negociando, então, a empresa pode tentar
uma abordagem de parceria.

Em toda probabilidade, existe um elemento de autossatisfação em


relação ao resultado – o que eles pressupõem pode influenciar o que
eles conseguem.
Os dirigentes da BAJAJ AUTO podem decidir estabelecer relacionamen-
tos de parcerias com alguns fornecedores e relacionamentos basea-
dos no poder com outros, mas isso pode ser feito somente até certo
ponto. Tanto os indivíduos quanto as organizações encontram muita
dificuldade para conviver com valores conflitantes: basicamente, seus
comportamentos refletem num dos dois a característica dominante.

Se a empresa escolhe o relacionamento baseado no poder para alguns,


os comportamentos irão basicamente realçar seus relacionamentos
com os outros. Para alguns dirigentes, o relacionamento de parceria
pode parecer mais atrativo somente porque parece melhor: por que ser a
pessoa má se você pode obter os mesmos resultados sendo a pessoa boa?

Para esses dirigentes, eu gostaria de dar um aviso:

Os relacionamentos de parceria são muito difíceis de se

A N EXO 1
estabelecer, e mais difíceis ainda de serem mantidos. Eles
não podem ser implementados em parte – se você deseja

268
estabelecer relacionamentos de parceria com fornecedo-
res, você terá também de viver de acordo com as mesmas
regras para os funcionários e clientes.

Não é algo que você simplesmente


faz, é algo que você tem que ser!
ANExO 2
Matheus Drumond Costa

DECISÃO ESTRATÉGICA DA
TROCA DE UM FORNECEDOR 3
Um dos maiores problemas que os compradores de
materiais e serviços encontram no dia a dia é a deci-
A N EXO 2

são de permanecer com um fornecedor ou trocá-lo ao


final de um contrato. Quais são os custos e as hipóte-
ses a serem consideradas?
269

Em épocas de excesso de oferta e de capacidade insta-


lada, os compradores parecem não ver nada além de
preços. Isso impede que as empresas fornecedoras
realizem um exame das possibilidades de diferenciar
seu produto ou serviço e de libertá-los dos efeitos
devastadores da concorrência baseada em preços.

3 Adaptação do texto “A estratégia de substituir ou manter um fornecedor”, do


Adm. Matheus Drumond Costa, Gerente Geral de Suprimentos da Manabi AS –
matheus.drumond@manabi.com. Publicado com a autorização do autor (Todos
direitos autorais reservados para Matheus Drumond Costa).
Não existem bens não diferenciáveis, todo produto ou serviço pode se
diferenciar. Empresas de bens industriais ou de consumo procuram a
diferenciação por meio das características de seus produtos visíveis
implícitas ou reveladas por uma referência a atributos ocultos, prome-
tendo resultados ou valores diferentes dos que oferecem os produtos
da concorrência. Empresas de serviços fazem o mesmo. Produtos e
serviços são, quase sempre, combinações do tangível e do intangível.

ExEMPLO
Um automóvel não é só uma máquina de transporte,
visível ou diferenciável pelo design, tamanho, cor,
opcionais ou potência do motor, é também um símbolo
complexo que denota status, gosto, categoria, posse,
aspiração e inteligência (quando se pensa, por exemplo, em

A N EXO 2
economia de combustível). Um serviço pode ser avaliado
por sua garantia, segurança, conformidade, etc.

Clientes (compradores) nunca adquirem apenas o produto ou o 27 0

serviço, compram algo mais que o transcende, e esse “algo mais” ajuda
a determinar de quem compram, o preço que pagam e se serão fiéis ou
inconstantes. É esse “algo a mais” que precisamos nos convencer ao
optar por permanecer ou trocar o fornecedor.

ASPECTOS DE MERCADO
Não há dúvida de que os clientes querem pagar o menor preço possí-
vel. Mas, apesar de sua importância, o preço não constitui um elemen-
to necessariamente determinante na decisão de uma contratação.
O preço deve ser considerado em função de seu valor relativo, ou seja,
o valor percebido pelo cliente, e pode ser estimado ao se fazer uma
relação entre os “elementos-chave” da proposta de valor e o preço que
o cliente demonstra estar disposto a pagar.

Todo material ou serviço tem um comportamento, como apresenta-


do no Gráfico 2: pode ser adquirido em qualquer momento de um
determinado tempo, e seu preço pode variar devido à sazonalidade,
ao comportamento do mercado (oferta e procura), ou até mesmo, a
promoções ou à necessidade do fornecedor em se capitalizar.

PREÇO x TEMPO

200
A N EXO 2

75
27 1

2 3 4 5 6 7
-50

O Gráfico 2 demonstra exatamente o que acontece quando adquiri-


mos um produto ou serviço em um determinado momento e a situa-
ção que nos deparamos mais tarde ao adquirir o mesmo produto ou
serviço novamente. Nesse novo evento, o preço poderá ser maior ou
menor do que o anterior, e isso se deve ao momento em que a compra
foi realizada. Se, no momento anterior, o mercado era vendedor, o
preço era mais baixo e pode, agora, ser maior ou o mesmo. O contrário
também pode acontecer, ou seja, no momento da compra anterior, o
preço era mais baixo porque havia maior oferta, portanto, o preço na
compra futura poderá ser maior.
Todo comprador sente uma enorme frustação ao ver que comprou um
produto num determinado momento, fazendo uma ótima negociação,
mas que, depois, o valor do produto ficou menor. Como poderemos ver,
esse efeito somente será reduzido se houver um monitoramento de
preços constantes, através de compras “spots”, ou mesmo de um moni-
toramento constante se tivermos um contrato de fornecimento.

CONTRATOS COM PREÇO FIXO


Os contratos de materiais e serviços com preços fixos por um determi-
nado período costumam sofrer aumentos ao término de cada período,
seja por variação de preços dos materiais previamente estabelecidos,
isto é, por variação de custos nos contratos de serviços, seja por insu-
mos, mão de obra ou outros motivos. Essa tendência pode ser observa-
da no Gráfico 3, no qual, durante um período, o preço não varia, mas,
após cada repactuação, sofre uma variação para mais:

A N EXO 2
PREÇO x TEMPO

27 2
40

30

20

10

0
1 3 5 7
CONTRATOS COM PREÇOS VARIÁVEIS
EM FUNÇÃO DA QUANTIDADE
Nesses contratos, o preço poderá ser reduzido em função da
quantidade a ser adquirida em um determinado momento, como
demonstra o Gráfico 4:

PREÇO x QUANTIDADE
120

100

80

60
A N EXO 2

40
27 3

20

0
2 4 6 8 10

Uma das grandes tendências da área de compras é eternizar o presen-


te, isto é, se existe um contrato de fornecimento, a ideia é que o preço
seja sempre o mais adequado, porque, quando foi negociado, era o
melhor. Mas não devemos nos esquecer de que o preço poderá ter
sido reduzido devido aos fatores de mercado (sazonalidade, ofertas,
necessidade de caixa, muita oferta, etc.), além, é claro, do comodis-
mo, ou seja, é mais fácil comprar dentro de um contrato já existen-
te e que ainda está dentro do prazo de validade. Ocorre que, num
novo ambiente de negócios como o atual, as mudanças não somente
acontecem a todo o tempo como são vertiginosas, e os mais lentos
ficam sufocados. Na verdade, o processo empresarial é dinâmico e o
mercado é cada vez mais competitivo, de modo que qualquer deslize
fará com que sua empresa perca espaço para o seu concorrente. Nessa
hora, não importa se você é comprador ou vendedor. O que você preci-
sa fazer é se tornar o mais competitivo possível, para poder reter o
seu cliente ou analisar se o momento é adequado para a troca do seu
fornecedor por outro que poderia lhe dar maiores vantagens.

Uma das formas de analisar esse momento é a curva do crescimen-


to ou “curva do S”, assim definida pelo seu criador Richard Foster,
conforme pode-se ver no Gráfico 5:

ESFORÇO x TEMPO

A N EXO 2
27 4

INOVAÇÃO

INOVAÇÃO

A “curva do S” é um gráfico da relação entre o esforço monetário


despendido em melhorar um produto, serviço ou método e os resulta-
dos obtidos como retorno desse investimento.
No início, a resposta aos investimentos feitos é lenta. Depois, ocorre
uma aceleração violenta na curva, quando é obtido o conhecimento
necessário para progredir. No final, a resposta aos investimentos
volta a ser lenta, tornando qualquer progresso muito caro. O
produto ou serviço não consegue mais ser o melhor em custo, não
consegue mais uma performance melhor. A causa disso são os limi-
tes no topo da “curva do S”.

As “curvas do S” identificam mudanças próximas a se refletirem


sobre a obsolescência dos produtos ou a falta de novas tecnologias
nos serviços. Foster chama de “descontinuidade tecnológica” os
períodos de mudanças de um grupo de produtos ou métodos para
outro, e acredita que essas curvas podem ser utilizadas para anteci-
par problemas administrativos.

A “curva do S” explica os retornos decrescentes (sucessos decrescen-


tes) obtidos na vida de um produto, serviço ou método, possibilitando
A N EXO 2

prever os períodos de tempo em que alcançarão os mais altos desem-


penhos. O topo da curva representa o momento em que um contrato
deverá ser repactuado, ou em que é feita uma nova cotação de preço
27 5

no mercado e, nessa hora, se o produto ou serviço de um fornecedor


estiver no topo da curva e ele nada estiver fazendo para oferecer ao
seu cliente alguma vantagem competitiva ou alguma mudança tecno-
lógica, é hora de avaliar a permanência ou não dele.

O desempenho de determinada empresa num mercado competitivo


demonstra o esforço despendido para solucionar problemas de
redução de custos, e isso só pode ser atingido quando o fornece-
dor passar a ajudar seu cliente, interagindo com ele nas análises e
discussões. Só assim poderá haver confiabilidade e fidelidade a um
determinado fornecedor.
SINAIS
CARACTERÍSTICOS

FASE 1
• Alto nível de atividade criativa;

• Busca padrão de atendimento de mercado;

• Frequente e fácil comunicação;

• Pouca política, procedimentos e regulamentos;

A N EXO 2
• Indefinição de responsabilidade;

• Limitação de capital;

27 6
• Construção de protótipos/testes;

• O papel do líder é fundamental.

FASE 2
• Padronização dos processos operacionais;

• Esforço concentrado na melhoria e/ou expansão


dos padrões de desenvolvimento na fase 1;

• Rápido crescimento;
• Comunicação e procedimentos formalizados;

• Sensação de que o crescimento será eterno.

• Ameaças:

Concorrentes com produtos melhores e


mais baratos;

Ciclo tecnológico cada vez mais curto;

Meio ambiente: mutável, exigente e


ambíguo.

FASE 3
A N EXO 2

• Sensação de que o crescimento será eterno.

• Ameaças:
27 7

Concorrência: produtos melhores e mais


baratos;

Meio ambiente: mutável, exigente e ambíguo;

Gerência de denominador;

Controle.
No entanto, por motivos orçamentários e financeiros, as empresas
fornecedoras são tímidas na aceitação de mudanças, preferindo prote-
ger o rentável negócio antigo e protelar os custos da pesquisa e do
desenvolvimento de novos produtos e tecnologias, exceto quando os
concorrentes já inovam com grande vantagem. Nesse momento, abre-
se uma oportunidade para um novo entrante.

Ao longo dos últimos anos, os clientes de quase todos os setores


rebelaram-se contra os fornecedores que até então os mantinham
em servidão. Grande parte dos clientes abandonaram as empresas
cujas marcas tinham sido fiéis durante tanto tempo e debandaram
para produtos genéricos, para marcas próprias, para concorrentes
internacionais e para quem lhes oferecesse a melhor condição, não
importando a procedência.

Empresas que oferecem a poderosa combinação de baixo preço e alta


qualidade estão conquistando o coração e o bolso dos consumidores

A N EXO 2
de todo o mundo. O aumento de participação de mercado das empresas
orientadas para o valor é a causa da dor de cabeça de muitas organi-
zações que praticam preços mais elevados.

27 8
Empresas orientadas para o valor, como as empresas aéreas america-
nas Delta e Southwest Airlines (no Brasil, inicialmente, a Gol e, mais
recentemente, a Azul) e a Dell Computadores, alteraram a natureza
da concorrência porque o comportamento dos consumidores modifi-
cou-se. Também dão origem a reações competitivas porque o valor que
geram para os acionistas chama a atenção de todo mundo.

Nas transações entre empresas, os clientes tornaram-se intolerantes


quanto aos abusos dos fornecedores que faziam o favor de atender
seus pedidos e passaram a não aceitar os aumentos de preços, a má
qualidade e os serviços de segunda categoria, em busca da plena satis-
fação de suas necessidades.
Hoje, as empresas simplesmente instruem seus fornecedores quanto
aos limites de preços, níveis de qualidade mínimos e prazos de entre-
ga aceitáveis. Aqueles que não estiverem à altura dessas exigências
tornam-se ex-fornecedores. Qualquer mudança no comportamento
do fornecedor que não gere valor para o cliente pode alterar todo um
relacionamento, fazendo com que seu cliente busque novas fontes de
fornecimento ou serviços.

Assim como nenhuma vantagem competitiva é permanente, as empresas


precisam oferecer aos seus clientes novas maneiras de parcerias, com
novas tecnologias, que façam com que seus clientes tenham fidelidade
a elas, principalmente quando são identificados sinais de desconti-
nuidade que possam pôr em perigo a organização. Esses sinais são: o
aumento de custo dos clientes, a diminuição de retorno, a diminuição
do “market share” da empresa, o aparecimento de novos concorren-
tes e de novas pressões externas, as mudanças nos valores sociais e a
demanda de novos serviços.
A N EXO 2

UM CASO DE SUCESSO
27 9

A Saint-Gobain, empresa líder mundial na fabricação de abrasivos, com


sede em Guarulhos, chegou à conclusão de que não bastava vender para
aumentar a sua participação no mercado, era preciso interferir nos
negócios dos clientes para arrumar uma vantagem competitiva que fizes-
se com que eles confiassem mais na empresa e fossem sempre fiéis a ela.

Depois de reuniões com alguns dos seus maiores clientes, a Saint Gobain
passou a propor um desafio: reduzir o custo com abrasivos. Sim, ela
se comprometia a ajudar o cliente a gastar menos com aquilo que ela
produz. “Nossa proposta é fazer uma análise de tudo que é usado na
empresa, gerenciar as ferramentas e garantir a redução de custo de retifi-
cação”, disse Paulo Botelho, gerente de mercado da Saint Gobain à época.
“Transferimos para nós toda a responsabilidade e preocupação de
sermos eficientes e atingirmos a redução estabelecida. Trata-se de um
contrato de risco. Se a equipe da Saint-Gobain cumprir o acordo de
redução, ótimo, ganha a fidelidade do cliente, que passa a usar somen-
te os produtos dela na linha de fabricação”, disse ele.

Por enquanto, a Saint-Gobain está realizando a experiência em São


José dos Campos, na Eaton, fabricante de autopeças. Depois de estudar
todas as máquinas da Eaton e identificar as necessidades do negócio,
fornecedor e cliente traçarão uma meta para diminuir em 5% o custo
dos abrasivos. Para a Eaton, a permanência de um profissional espe-
cialista tem ajudado não somente a reduzir os custos, mas também a
melhorar a forma de manusear os equipamentos.

O QUE FAZER?
Fornecedores podem levar a receita dos clientes ao crescimento (com

A N EXO 2
menos tempo de chegada dos produtos ao mercado, itens exclusivos
desenvolvidos em parceiras e melhores níveis de serviços), e também à

28 0
redução do custo operacional e à diminuição da intensidade do ativo,
por meio de terceirização ou estoques administrados por eles.

As inovações gerenciais das últimas duas décadas permitem que


as empresas aumentem a capacidade de produção de suas fábricas,
operem com menores volumes de estoques, reduzam os desperdí-
cios e os erros, atendam aos pedidos com rapidez e respondam com
prontidão e exatidão às exigências dos clientes. Isso significa que a
maior produtividade, a economia no custo de uso ou menores custos,
a qualidade mais adequada de produtos e serviços, a administra-
ção da rede de suprimentos, a manutenção do equilíbrio correto
da qualidade, a proteção da estrutura de custos dos clientes e a
melhoria na competitividade são, portanto, os resultados imediatos
proporcionados pelas novas técnicas gerenciais, que rapidamente se
traduzem em retorno para todas as partes interessadas.

Os desafios dos negócios são eternos e árduos. Existe uma história


que conta que Albert Einstein um dia entregou à sua secretária uma
prova a ser distribuída entre seus alunos de pós-graduação. A secretá-
ria passou os olhos pelo papel e questionou: “Mas, professor Einstein,
essas são as mesmas perguntas do ano passado. Será que os alunos
já não sabem as respostas?” Einstein respondeu: “As perguntas são as
mesmas, mas as respostas são diferentes.”

O que é verdade em física também é verdade nos negócios. A velocida-


de do mundo dos negócios exige respostas diferentes, tanto para os
compradores como para os fornecedores. Quais são os valores que o
fornecedor agregou para o seu cliente no decorrer do contrato de
fornecimento ou serviços?

Quando um fornecedor sabe como incorporar valor ao negócio do


A N EXO 2

cliente, ele deixa de ser simplesmente um fornecedor comum. Na


verdade, fornecedores que não compartilham com os clientes seus
28 1

conhecimentos sobre a cadeia de suprimentos ou sobre o seu conheci-


mento sobre os serviços pelos quais foi contratado, correm o risco de
serem substituídos por outros que o fazem.

Os fornecedores precisam estar preparados para oferecer algo dife-


renciado aos seus clientes: a transação em si cede espaço para a força
da organização virtual, cujo eixo é a relação contratual entre as
partes, e não a operação específica. As empresas que adotarem polí-
ticas predadoras contra seus clientes terão dificuldades no futuro,
porque estarão promovendo o desequilíbrio do mercado e se distan-
ciando dos próprios consumidores. Não haverá crescimento sustenta-
do em cima de premissas falsas que rompem o princípio da cidadania e
abalam a economia regional.
QUANDO, ENTÃO, DEVEMOS
TROCAR UM FORNECEDOR?
Um fornecedor deverá ser substituído quando, durante o período de
fornecimento ou durante a prestação de serviço, não estiver agre-
gando nenhum valor ao cliente, ou seja, quando o fornecedor não
possuir nenhum plano ou não demonstrar que pode ajudar seu clien-
te a reduzir os custos.

ALGUNS SINAIS
• problemas não são combatidos à medida que ocorrem,
não há nenhuma preocupação do fornecedor com a reso-
lução dos problemas;

• problemas só são combatidos quando ocorrem, e não há

A N EXO 2
um plano de ação para bloquear as causas;

• a avaliação do fornecedor é sempre baixa;

28 2
• os empregados dos fornecedores estão sempre
descontentes;

• o gerente da empresa contratada não procura o geren-


te da empresa contratante, apenas quando é ele chamado;

• a empresa contratada não apresenta nenhuma sugestão


de melhoria no decorrer da prestação de serviços;

• não há visita pós-venda, o fornecedor não aparece para


ver a performance do material fornecido;

• a rotatividade de pessoal na contratada é muito alta;

• o gerente da empresa contratante gasta muito tempo


gerenciando a empresa contratada.
COMO QUANTIFICAR A SUBJETIVIDADE
Podemos quantificar a subjetividade usando um modelo formado
por três componentes principais: Metas, Características do Parceiro e
Instrumentos Gerenciais e Operacionais.

METAS CARACTERÍSTICAS
DO PARCEIRO
-
GANHOS
DESEJADOS DECISÃO
DE FORMAR
PARCERIA
A N EXO 2
28 3

METAS GERAM
ExPECTATIVAS
INSTRUMENTOS
GERENCIAIS E
OPERACIONAIS

FEEDBACk
PARA AJUSTAR AVALIAÇÃO DOS
A PARCERIA RESULTADOS
As Metas (ou ganhos desejados) são as razões que levam clientes e
fornecedores à parceria, e podem ser de diversas naturezas, como
buscar maior eficiência na utilização de um ativo (veículos, armazéns,
etc.), melhorar os indicadores de serviço ao cliente (disponibilidade
de produto, prazo de entrega de acordo com a necessidade do cliente,
percentual de pedidos corretos, etc.), obter vantagens competitivas
por focar as “competências-chave” do negócio ou estabilizar receitas
e despesas (fluxo de caixa, estoques consignados) por meio de contra-
tos de médio e longo prazos.

Uma questão crucial que deve ser colocada é como avaliar se as metas
de uma empresa (por exemplo, reduzir estoques, melhorar níveis de
serviço, etc.) são suficientes para a formação de uma parceria com seus
fornecedores. Devemos notar que as metas para a formação de parce-
rias, geralmente, são diferentes entre os diversos membros da cadeia
de suprimentos.

A N EXO 2
Algumas referências de avaliação devem ser utilizadas para medir a
intensidade das diversas categorias de metas suficientes para iniciar
ou manter o processo de parceria:

28 4
1o Eficiência de custos e ativos

Qual é a probabilidade de que esse relacionamento reduza


substancialmente os custos da cadeia ou melhore o padrão
de utilização de ativos, como os custos administrativos e de
compras, os custos de transportes e os custos de embalagem
e movimentação?

2o Serviço ao cliente

Qual é a probabilidade de que esse relacionamento melho-


re substancialmente os níveis de serviços ao cliente, como
a disponibilidade de estoque, o menor tempo de ciclo e as
entregas pontuais?
3o Vantagem competitiva

Qual é a probabilidade de que esse relacionamento propor-


cione alguma vantagem competitiva, como foco no negócio,
entrada em novos mercados e economia de escala?

4o Estabilidade de receita e lucros

Qual é a probabilidade de que esse relacionamento propor-


cione um aumento ou uma estabilidade na receita (lucro),
como a previsibilidade de compras e os preços com base em
remuneração mínima?

Uma vez avaliada a probabilidade de as metas transforma-


rem-se em reais benefícios futuros, resta avaliar se o parcei-
ro possui as características adequadas para a formação da
parceria ou a sua continuação. Essa etapa é a mais crítica do
A N EXO 2

processo de análise, pois as características do parceiro não


podem ser mudadas ou desenvolvidas a curto prazo, o que
28 5

compromete a possibilidade de sucesso no futuro caso seja


feita uma escolha equivocada do parceiro.
As características do parceiro refletem diversos aspectos, como suas
atitudes gerenciais com relação ao grau de compatibilidade de objeti-
vos, valores e filosofia empresarial; o treinamento de seu pessoal e a
capacidade de trabalhar em equipe; o padrão de convivência no que diz
respeito à flexibilidade na fixação de objetivos comuns, na disponibili-
zação de informações e no compartilhamento de riscos e benefícios; a
competência operacional; a filosofia empresarial, refletida na capaci-
dade de planejar conjuntamente; e a imagem da empresa no mercado:

1o Atitudes gerenciais

Qual é a probabilidade de que nesse relacionamento haja uma


compatibilidade nas atitudes gerenciais das duas empresas em
situações como um treinamento, um trabalho em grupo e uma
troca de capacitação técnica?

2o Padrão de convivência

A N EXO 2
Qual é a probabilidade de que nesse relacionamento seja
possível estabelecer um padrão de convivência harmonioso no

28 6
que diz respeito à fixação de objetivos comuns, à disponibili-
zação de informações e à divisão de custos e benefícios?

3o Filosofia empresarial

Qual é a probabilidade de que nesse relacionamento os parcei-


ros apresentem o mesmo perfil de risco em relação a questões
como a estratégia de crescimento, os investimentos e a inova-
ção de produtos/processos?

4o Estrutura/Imagem

Qual é a probabilidade de que nesse relacionamento haja


sinergia entre as empresas nas seguintes áreas: tamanho
relativo, solidez financeira e sofisticação tecnológica?
Os instrumentos gerenciais e operacionais são ferramentas desen-
volvidas em conjunto para lidar com diversas questões presentes a
curto e longo prazos do relacionamento. A definição de indicadores
de desempenho de instrumentos operacionais, a política para a troca
de informações, a política de investimentos e o grau de formalização
contratual constituem exemplos de instrumentos gerenciais, que
visam a coordenação e o controle da parceira, tanto no dia a dia das
operações, como no estabelecimento de diretrizes gerais do relaciona-
mento. São eles:

• estabelecimento de procedimentos e métodos relativos


ao projeto da operação em si: envolve questões como o
recebimento, a expedição, as embalagens e a distribuição
física de materiais;

• definição de indicadores de desempenho: envolve a


A N EXO 2

elaboração de indicadores de produtividade, de qualida-


de, de utilização e de níveis de serviços (SLA, SLM), além da
28 7

definição de parâmetros associados aos níveis de desem-


penho superiores ou inferiores;

• política para a troca de informações: apoia-se na defi-


nição de quais informações serão trocadas, nos níveis
hierárquicos envolvidos, na rotina e no tipo de sistema;

• formalização contratual: reflete o nível de detalha-


mento do contrato, com a estipulação de barreiras à
saída, de cláusulas de exclusividade, de penalidades e de
horizontes de renovação;

• política de investimentos: envolve a aquisição e a


operação de ativos dedicados à parceria (veículos, equipa-
mentos, sistemas), além de treinamento e capacitação de
recursos humanos.
Logicamente, não adianta só o fornecedor conhecer o seu cliente, é
preciso que o cliente também conheça o seu fornecedor. Numa relação
de parceria, é fundamental conhecer melhor os fornecedores; veri-
ficar o que é possível fazer juntos para manter a relação e se eles
também estão crescendo por causa dessa relação; observar onde existe
uma oportunidade de ajuda mútua e como é possível diminuir todos
os custos; e, numa grande aliança, chegar a resultados que agreguem
valor para ambas as empresas.

QUAIS OS CUSTOS A SEREM EVITADOS


Devem-se evitar todos os custos para certificar se o produto ou o
serviço é de qualidade. O fornecedor deverá oferecer o material ou
o serviço dentro da especificação contratada. Qualquer custo para
a verificação deverá ser considerado e, sempre que possível, deve-se
medir esse custo. Assim, será mais fácil tomar uma decisão em relação

A N EXO 2
a manter um fornecedor ou trocá-lo por outro, o que poderá fazer
com que a empresa contratante gaste mais do que a própria diferença

28 8
de preço existente numa coleta ou concorrência.

1o Custo de prevenção

O custo de prevenção é representado por todas as atividades


empreendidas para prevenir defeitos no design, mais desen-
volvimento, compras, mão de obra, e outros aspectos do início
da criação de um produto ou serviço. Incluem-se as medidas
preventivas e os cálculos realizados no decorrer do ciclo do
negócio, bem como:

• Os estudos de design;

• A qualificação do produto;
• A verificação dos desenhos;

• A orientação da engenharia de qualidade;

• O exame de especificação;

• A auditoria da qualidade;

• A inspeção de material;

• A reavaliação de fornecedores.

2o Custo de avaliação

Tratam-se dos custos em que se incorre durante as inspeções,


testes e outras avaliações planejadas com a finalidade de se
determinar se o hardware, o software, ou os serviços estão de
acordo com os requisitos. Todos os documentos que descrevem
a conformidade do produto ou serviço são relevantes, como:
A N EXO 2

• A inspeção e o teste de protótipo;

• A análise para a verificação da conformidade do


28 9

produto ou serviço;

• A vigilância do fornecimento;

• A inspeção e o teste de entrada;

• O processo de controle da aceitação;

• A inspeção de embalagens.

3o Custos das falhas

Os custos das falhas estão associados aos elementos que,


segundo se verificou, não estão de acordo com os requisitos,
inclusive no desempenho, assim como a avaliação, a disposição
e os aspectos dos negócios com o consumidor de tais falhas.
Aí se incluem todo o material e a mão de obra envolvidos na
operação. Ocasionalmente, pode-se incluir a perda de credibili-
dade junto ao cliente, bem como:

• O replanejamento;

• O pedido de mudança da engenharia;

• O pedido de mudança do setor de compras;

• O custo de ação corretiva;

• A repetição de trabalho;

• A sucata;

• A garantia;

• O serviço após serviço;

• O risco do produto.

A N EXO 2
Um bom fornecedor toma medidas seguras para que seus produtos e
serviços sejam entregues ao cliente através de um sistema gerencial
que não compactua com repetição de tarefas, reparos, desperdícios ou

290
inadaptação de qualquer espécie.

CUIDADOS A SEREM TOMADOS


A globalização lançou na arena uma maior quantidade de concorren-
tes em busca dos mesmos clientes. Obviamente, o aumento da oferta
transferiu os consumidores para a cabine de comando. À medida que
os indivíduos e as empresas são pressionados para reduzir despesas
e custos, a indolência de acomodar-se com os mesmos fornecedores
transformou-se em um desperdício insuportável. Assim, os clientes
passaram a procurar alternativas, a comparar ofertas e a ficar com as
melhores opções.
Hoje, a rapidez das mudanças tecnológicas encurtou drasticamente o
ciclo de vida e o tempo de fabricação de um produto. Mal se lança um
novo produto, logo, ele fica obsoleto ou é copiado pelos concorrentes.
O resultado disso são as muitas ofertas semelhantes que dificultam
a diferenciação entre os produtos, o que faz com que os clientes
(compradores) fiquem investidos de poderes ainda maiores.

Entretanto, as áreas de suprimentos sofrem a cada renovação de


contrato ou a cada repactuação de preços para retirar as famosas
“gorduras” colocadas pelos fornecedores mais tradicionais; gastam
horas, dias e, às vezes, meses com pesquisa, levantamentos de merca-
do, comparações, viagens e reuniões intermináveis para se chegar a
um acordo. Isso tudo sem considerar as especificações complexas de
certas propostas, em que se gasta um enorme esforço para identificar
os produtos que atendam às necessidades da empresa. Além disso, os
processos de entrega de produtos e serviços com erros obrigam os
clientes a conferir todo o fornecimento. E, não menos importante,
A N EXO 2

na área de serviços, os clientes são obrigados a manter gestores de


contratos para acompanhar se os serviços estão sendo executados
291

corretamente.

Onde está a preocupação do fornecedor para facilitar ao máximo a


vida do cliente? Por que os clientes ainda têm de ligar para saber sobre
o andamento dos pedidos colocados?

Para tratar uma doença, é preciso diagnosticá-la primeiro. Você já


utilizou alguma vez uma das seguintes frases com seus fornecedores?
• É difícil relacionar com tantas
pessoas diferentes em sua empresa;
• Vocês são inflexíveis;
• Vocês são reativos e despreparados,
demonstram surpresa quando os
clientes lhes pedem alguma coisa;
• Vocês nos dão muito trabalho nas
repactuações de preços;
• Já liguei muitas vezes para o
atendimento a clientes e não
resolveram nada.

A N EXO 2
Se você já utilizou, está na hora de rever alguma coisa na sua relação

292
com seus fornecedores atuais.

CONCLUSÃO
Nos tempos atuais, o grande desafio das empresas é tornar-se a melhor
fornecedora para o seu cliente. É preciso qualidade, agilidade, flexi-
bilidade, atendimento personalizado, além da geração de valores aos
negócios. No mundo dos negócios, algumas coisas nunca mudam:

para gerar valor para os investidores e acionistas, é preciso primeiro


criar valor para o cliente, mais do que isso, é preciso estabelecer
relacionamentos inovadores e duradouros, baseados na conduta
empresarial socialmente responsável, o que é fundamental para a
construção da excelência.
Fontes: TheMix, Antenna, Fjalla One
Papel: Pólen Soft 80g/m2
Impressão: Gráfica O Lutador
Tiragem: 500 exemplares

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