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Direito Penal

O Direito Penal, segundo JOSÉ FREDERICO MARQUES pode ser conceituado


como o "conjunto de normas que ligam ao crime, como fato, a pena, como
conseqüência, e disciplinam também as reações jurídicas daí derivadas, para
estabelecer a aplicabilidade das medidas de segurança e a tutela do direito de
liberdade em face do poder de punir do Estado".

A finalidade do Direito Penal é a proteção dos bens mais importantes e necessários para
a própria sobrevivência da sociedade, ou nas palavras de LUIZ RÉGIS PRADO, "o
pensamento jurídico moderno reconhece que o escopo imediato e primordial do Direito
Penal radica na proteção de bens jurídicos – essenciais ao indivíduo e à comunidade". A
pena é simplesmente uma conseqüência pelo descumprimento de um imperativo legal
(norma implícita), não consistindo, assim, na sua finalidade.

Com o Direito Penal, visa-se tutelar todos os bens que, segundo um critério político, que
varia de acordo com as mutações experimentadas pela própria sociedade, merecem fazer
parte daquele pequeno círculo que, por serem extremamente valiosos, não sob o ponto
de vista econômico, mas sim sob o enfoque político, não podem ser suficientemente
protegidos pelos demais ramos do Direito.

Sobre o Direito Penal Mínimo e necessário, leciona MUNÕZ CONDE:


"O poder punitivo do Estado deve estar regido e limitado pelo princípio da intervenção
mínima. Com isto, quero dizer que o Direito Penal somente deve intervir nos casos de
ataques muito graves aos bens jurídicos mais importantes. As perturbações mais leves
do ordenamento jurídico são objeto jurídico de outros ramos do Direito".

Com efeito, o princípio da intervenção mínima, também conhecido como ultima


ratio, orienta e limita o poder incriminador do Estado, preconizando que a
criminalização de uma conduta só se legitima se constituir meio necessário para a
proteção de determinado bem jurídico. Se outros meios de controle social revelarem-se
suficientes para a tutela desse bem, a sua criminalização será inadequada e
desnecessária.

Se para o restabelecimento da ordem jurídica violada forem suficientes medidas civis ou


administrativas, são estas que devem ser empregadas e não as penais.
Por isso, o Direito Penal deve ser a ultima ratio, isto é, deve atuar somente quando os
demais ramos do Direito revelarem-se incapazes de dar tutela devida a bens relevantes
na vida do indivíduo e da própria sociedade.
No intuito de bem interpretar o tipo penal, valiosa a lição de WELZEL:
"Na função dos tipos de apresentar o "modelo" de conduta proibida se põe de manifesto
que as formas de conduta selecionadas por ele têm, por uma parte, um caráter social,
quer dizer, são referentes à vida social, ainda, por outra parte, são precisamente
inadequados a uma vida social ordenada. Nos tipos, encontra-se patente a natureza
social e ao mesmo tempo histórica do Direito Penal: indicam as formas de conduta que
se separam gravemente dos mandamentos históricos da vida social" .

Lançado o princípio da adequação social, em síntese, o escólio de ASSIS TOLEDO:


"se o tipo delitivo é um modelo de conduta proibida, não é possível interpretá-lo, em
certas situações aparentes, como se estivesse também alcançando condutas lícitas, isto é,
socialmente aceitas e adequadas" .
Percebe-se pois, que a tipicidade necessária à caracterização do fato típico se biparte em
formal e material.

Tipicidade formal é justamente a adequação da conduta do agente ao modelo abstrato


(tipo) previsto na lei penal.

Entende-se por tipicidade material aquele critério de adequação da conduta do agente a


um tipo penal incriminador. Se interrompida aqui a definição do conceito de tipicidade
material, nada diferente da tipicidade formal. No entanto, além da necessidade de existir
um modelo abstrato que preveja com perfeição a conduta praticada pelo agente, é
preciso que, para que ocorra essa adequação, seja levada em consideração a relevância
do bem que está sendo objeto de proteção, mais ainda, que a conduta implemente um
risco socialmente proibido.

Segue-se na interpretação da lei penal pela análise do princípio da responsabilidade


pessoal, a tanto o ensinamento de ZAFFARONI:
"nunca se pode interpretar uma lei penal no sentido de que a pena transcenda da pessoa
que é autora ou partícipe do delito. A pena é uma medida de caráter estritamente
pessoal, haja vista ser uma ingerência ressocializadora sobre o condenado" .

Abordada a questão do sujeito ativo, cabível falar-se na efetiva proteção de um valor ou


bem jurídico, enunciando assim o princípio da alteridade, que proíbe a incriminação
de atitude meramente subjetiva, que não ofenda a nenhum bem jurídico.

Segundo CLAUS ROXIN: "só pode ser castigado aquele comportamento que lesione
direitos de outras pessoas e que não seja simplesmente pecaminoso ou imoral. À
conduta puramente interna, puramente individual – seja pecaminosa, imoral,
escandalosa ou diferente -, falta a lesividade que pode legitimar a intervenção penal".

Igualmente importante no entendimento da lei penal, temos o princípio da confiança


que, segundo WELZEL "consiste na realização da conduta de uma determinada forma,
na confiança de que o outro agente atuará de um modo já esperado, isto é, normal.
Baseia-se na confiança de que o comportamento das outras pessoas dar-se-á de acordo
com o que normalmente acontece".

Por derradeiro, sendo fundamental para a aplicação da lei penal, temos o princípio da
legalidade, que vem insculpido no inciso XXXIX do art. 5º da Constituição Federal,
verbis: "Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação
legal", redação semelhante àquela contida no art. 1º do Código Penal.

É o princípio da legalidade, sem dúvida, o mais importante do Direito Penal, não se fala
na existência de crime se não houver uma lei definindo-o como tal.
Tudo o que não for expressamente proibido é lícito em Direito Penal, por essa razão,
VON LISZT afirmou que o "Código Penal era a Carta Magna do delinqüente".

Em síntese, a conduta só é proibida, em termos penais, após a vigência da norma


incriminadora, norma esta que deve ser clara, vedado o emprego de termos vagos e
imprecisos, proscrita, por conseqüência a analogia in malam partem e a extra-atividade
da norma penal incriminadora.
Entre infração penal e infração civil, existe apenas um critério político de distinção,
observando-se que à infração penal está reservada uma pena que pode chegar à privação
da liberdade, ao passo que à infração tem-se como conseqüência, a obrigação de reparar
o dano ou outras sanções de natureza civil

O legislador não nos forneceu um conceito de crime, restando tal tarefa aos
doutrinadores, dentre eles, BETTIOL: "crime é todo o fato humano lesivo de um
interesse capaz de comprometer as condições de existência, de conservação e de
desenvolvimento da sociedade".

DIREITO PENAL E O SEU HISTÓRICO

ORIGENS

Por força do impulso da associação, que marca de maneira tão profunda o destino dos
homens, o que encontramos na história e na pré-história da humanidade são grupos
humanos e não indivíduos isolados, e dentro desses grupos, desde logo, normas de
comportamento social. Grupos que se formam natural e precocemente e conjunto de
normas de limitação das atividades de cada socius, dos seus interesses e apetite, no
sentido de paz social.

A esse conjunto normativo se poderia dar por extensão o nome de Direito, segundo a
velha fórmula ubi societas ibi jus, embora não apresente as notas essenciais que a
ciência moderna atribui ao jurídico e seja ainda um complexo indiferenciado, no qual só
mais tarde irão definir-se, como corpos distintos, a Moral, o Direito, a Religião,
apoiadas todas essas normas, de caráter costumeiro, anônimas, criadas e crescidas por
impulso espontâneo da consciência coletiva, na religião e na magia. Por essas normas,
ajusta-se a conduta dos socii a um padrão comum, o padrão que convém à unidade e
coesão do grupo.

Tempos Primitivos

A história do Direito Penal é a história da humanidade. Ele surge com o homem e o


acompanha através dos tempos, isso porque o crime, qual sombra sinistra, nunca delle
se afastou.
Claro é que não nos referimos ao Direito Penal como sistema orgânico de princípios, o
que é conquista da civilização e data de ontem.

A pena, em sua origem, nada mais foi que vindita, pois é mais que compreensível que
naquela criatura, dominada pelos instintos, o revide à agressão sofrida devia ser fatal,
não havendo preocupações com a proporção, nem mesmo com sua justiça. Em regra, os
historiadores consideram várias fases da pena: a vingança privada, a vingança divina, e
vingança pública e o período humanitário. Todavia, deve advertir-se que esses períodos
não se sucedem integralmente, ou melhor, advindo um, nem por isso o outro desaparece
logo, ocorrendo então, a existência concomitante dos princípios característicos de cada
um: uma fase penetra a outra e, durante tempos, esta ainda permanece ao seu lado.
- Fase da Vingança Privada – nesta fase quando um crime era cometido, ocorria a
reação da vítima, dos parentes e do grupos social, que agiam sem proporção à ofensa,
atingindo não só o ofensor como também todo o seu grupo. Se o transgressor fosse
membro da tribo, poderia ser punido com a “expulsão da paz” (banimento), que
invariavelmente levava à morte. Caso a violação fosse praticada por um elemento
estranho à tribo, a reação era a “vingança de sangue”, considerada como obrigação
religiosa e sagrada, verdadeira guerra movida pelo grupo ofendido àquele que pertencia
o ofensor, culminando, não raro, com a eliminação completa de um dos grupos.

Surge neste período a Lei do Talião, que limita a reação à ofensa a um mal idêntico
praticado (sangue por sangue, dente por dente, olho por olho). Adotado no Código de
Hamurábi (Babilônia), no Êxodo (povo hebraico) e na Lei das XII Tábuas (Roma), foi
um grande avanço na História do Direito Penal, por reduzir abrangência da pena.

- Fase da Composição – era uma forma alternativa de repressão aplicada no caso de a


morte do delinqüente ser desaconselhável, em virtude da natureza do delito, ou porque o
interesse do ofendido ou dos membros de seu grupo fosse favorável à reparação do dano
causado pela ação delituosa. Dotada também no Código de Hamurábi, pelo Pentateuco e
pelo Código de Manu, foi a composição largamente aceita pelo Direito Germânico,
sendo a origem remota das formas modernas de indenização do Direito Civil e da multa
no Direito Penal.

- Fase da Vingança Divina – a repressão tinha a finalidade de aplacar a ira da divindade


ofendida pelo crime, bem como castigar o infrator. O castigo era aplicado pelos
sacerdotes, que em quase toda a antigüidade se converteram em encarregados da justiça.
Estes imprimam penas severas cruéis e desumanas, visando especialmente a
intimidação. Legislação típica desta fase é o Código de Manu, mas esses princípios
foram adotados na Babilônia, no Egito (Cinco Livros), na China (Livro das Cinco
Penas), na Pérsia (Avesta) e pelo povo de Israel (Pentateuco).

- Fase da Vingança Pública – foi através da maior organização social que se atingiu esta
fase. No sentido de se dar maior estabilidade ao Estado, visou-se à segurança do
príncipe ou soberano pela aplicação da pena, ainda severa e cruel. Também em
obediência ao sentido religioso, o Estado justificava a proteção ao soberano que na
Grécia, por exemplo, governava em nome de Zeus, e era seu intérprete e mandatário. O
mesmo ocorreu em Roma, com a aplicação da Lei das XII Tábuas. Em fase posterior,
porém, libertou-se a pena de seu caráter religioso, transformando-se a responsabilidade
do grupo em individual (do autor do fato), impositiva contribuição ao aperfeiçoamento
de humanização dos costumes penais.

DIREITO PENAL DOS HEBREUS

Dominado profundamente pela razão religiosa é o sistema penal dos hebreus, como,
aliás, todas as manifestações da cultura nesse povo, a vida privada como a vida pública.
Mas na sua longa história podemos colher exemplos de várias transformações que foi
sofrendo a pena, desde vingança primitiva até, que encontramos nos mais antigos
costumeiros incluídos no Pentateuco, até as práticas mais apuradas dos últimos tempos.
Vemos isso no livro da Bíblia e em particular no Êxodo, no Levítico e sobretudo no
Deuteronômio e, por fim, na elaboração jurídica final do Talmud.

DIREITO PENAL GREGO

Faltam notícias seguras, de fontes jurídicas, sobre o Direito Punitivo entre os gregos. O
mais importante que sabemos nos veio da sua literatura – dos seus poetas, oradores, ou
filósofos. Na Grécia, num primeiro momento dominou a vingança privada e a pena ia
além da pessoa do delinqüente, atingindo sua família. Após surge o período religioso
onde o Estado, em nome de Júpiter, teria por fim delegar a pena, qualquer que seja ela,
substituindo-se ao ofendido.

Num período denominado histórico, a pena era baseada na moral enquanto os delitos
comuns eram castigados individualmente as ofensas de caráter religioso e político
davam margem a expiações coletivas.

Assim, vê-se que os gregos foram extraordinários na Filosofia, porém, no Direito


realizaram uma obra apenas mediana, não alcançando um alto grau de desenvolvimento.

Finalmente, os filósofos gregos trouxeram a debate uma questão geralmente ignorada


dos povos anteriores, a da razão, e fundamento do Direito de punir e da finalidade da
pena, questão que preocupou pensadores diversos e veio a ser mais detidamente
considerada no movimento iniciado por Sócrates, com o particular interesse que então
se tomou pelos problemas éticos.. Deve-se observar que não houve Ciência do Direito
na Grécia antiga.

DIREITO PENAL ROMANO

Conjunto de normas do povo romano, desde a origem de Roma até a morte de Jutiniano
em 565 a.C. É uma das fontes mais importantes do Direito Civil moderno.
Os Romanos construíram uma monumental obra jurídica, cujos institutos, práticas e
entendimentos doutrinários perduram através dos tempos, sendo ainda hoje a base dos
sistemas jurídicos modernos (Lei das XVII Tábuas).

No campo do Direito Penal evoluiu-se das fases de vingança, por meio do Talião e da
composição, bem como da vingança divina na época da realeza, Direito e Religião
separaram-se. Divide-se o delito, em Roma, em crimina pública (segurança da cidade,
parricidium), ou crimes majestatis e delicta privata (infrações consideradas menos
graves, reprimidas por particulares). Seguiu-se

a eles a criação dos crimina extraordinárias (entre as outras duas categorias) finalmente,
a pena torna-se, em regra, pública. As sanções são mitigadas, e é praticamente abolida a
pena de morte, substituídas pelo exílio e pela deportação.

Contribuiu o Direito Romano decisivamente para a evolução do direito Penal com a


criação de princípios penal sobre o erro, culpa (leve e lata), dolo (bonus e malus),
imputabilidade, coação irresistível, agravantes, legítima defesa etc.
O romanos que foram grandes juristas, não cuidavam de doutrina sistemática de
conceitos fundamentais. O seu direito era uma prática do justo em relação a fatos
cotidianos. Ars boni et aequi. Ou, como diria Spengler, “a sua jurisprudência é uma
ciência empírica dos fatos particulares.” Em oradores e filósofos, porém, encontramos,
embora sob influência de pensadores helênicos, sobretudo Platão, inteligentes tentativas
de fundamentação da pena, que atingem, às vezes, as nossas concepções mais atuais.
Seneca, toma idéias do filósofo das leis e as desenvolve, insistindo sobre o tema do
caráter preventivo, e não repressivo da pena.

DIREITO PENAL GERMÂNICO

Nos costumes germânicos primitivos, o problema penal resolvia-se pela vingança ou


pela perda da paz. Formas primárias de reação anticriminal.

O tom religioso, que certamente impregnava as primitivas reações anticriminais


germânicas, não está bem claro nas fontes. Nos primeiros tempos, dentro do grupo
gentilício (Sippe) vigoram a disciplina do chefe e a perda da paz(Friedlosigkeit), em que
o violador é posto para fora da proteção jurídica do grupo, podendo ser perseguido e
morto por qualquer um. De modo que a Friedlosigkeit se torna uma modalidade de pena
de morte, a mais velha e persistente das formas de reação anticriminal – também a mais
absurda, nas condições do Direito Penal moderno.

Entre os grupos, é a vingança de sangue(Blutrache), que se apresenta mais como um


dever do que como um direito. Depois a vingança de sangue foi superada pela
composição, voluntária a princípio e finalmente legal, e mesmo a Friedlosigkeit veio a
ser resgatada pelo pagamento de um preço de paz. Foi uma conseqüência da instituição
de um poder público, representante da vontade coletiva, e da consolidação da sua
autoridade.

O uso primitivo de resolver pela força as questões criminais não desapareceu: a prática
da vingança recrudesceu com a queda da monarquia franca, quando a influência do
Direito Romano cedeu novamente espaço aos velhos costumes germânicos, sendo
preciso para combatê-la a instituição das tréguas de Deus, do asilo religioso, das pazes
territoriais. Penetrou mesmo nas práticas do processo penal. Depois das ordálias, o juízo
de Deus acabou prevalecendo sob a forma do duelo judiciário, que reaparece, levando o
julgador a reconhecer a razão do mais forte, na realidade tomando a sorte das armas e ,
portanto, a força como prova do Direito. Era uma conseqüência, talvez, da
predominância do individualismo no Direito germânico, que levou a fazer persistir nos
regimes jurídicos sob sua influência, como o dominante no maior trecho da Idade-
Média, a vingança privada e a composição entre as partes, ou acentuando a pena
pecuniária e tomando em consideração, na apreciação do crime, mais o dano do que o
elemento subjetivo do crime.

DIREITO CANÔNICO

Na idade média, a Igreja, à proporção que crescia em domínio e poder, estendia a sua
disciplina a fatos considerados crimes de ordem a princípio meramente espiritual e
depois mista, praticados por eclesiásticos ou profanos. O conjunto dessas normas,
emanadas do poder pontifício, sobretudo do século XII, veio a construir o Direito Penal
canônico, que teve influência na prática da justiça punitiva, principalmente por decisões
eclesiásticas recebiam execução por tribunais civis e muitas daquelas normas tornaram-
se obrigatórias, com a

conquista do poder temporal pela Igreja, mesmo para a autoridade civil. Desde seu
reconhecimento pelo Império Romano em 325 d.C a Igreja começou a exercer poderosa
influência no Direito Penal.

Entre a época dos direitos romano e germânico e a do direito moderno, estendeu-se o


direito Canônico, ou o direito Penal da Igreja, com influência decisiva do cristianismo
na legislação penal.

Um dos primeiros efeitos da intervenção da Igreja em tais domínios, consistiu na


humanização das penas. A máxima “Ecclesia abhorret a sanguine”, deu origem a
instituições como o direito de asilo e as tréguas de Deus.

Assimilando o Direito Romano e adaptando este às novas condições sociais, a Igreja


contribuiu de maneira relevante para a humanização do Direito Penal embora
politicamente sua luta metódica visasse obter o predomínio do Papado sobre o poder
temporal para proteger os interesses religiosos da dominação. Proclamou-se a igualdade
entre os homens, acentuou-se o aspecto subjetivo do crime e da responsabilidade penal e
tentou-se banir as ordálias e os duelos judiciários (próprios do direito germânico).
Promoveu-se a mitigação das penas que passaram a ter como fim não só a expiação,
mas também a regeneração do criminoso pelo arrependimento e purgação da culpa, o
que levou, paradoxalmente, aos excessos da Inquisição. A jurisdição penal eclesiástica,
entretanto, era infensa à pena de morte, entregando-se o condenado ao poder civil para a
execução.

DIREITO MEDIEVAL

A queda do Império Romano no ano de 476 é vista como o início de uma nova era
histórica, esperava-se que a Idade Média trouxesse uma nova concepção punitiva,
fazendo transparecer a nova estrutura sócio-econômica e política que ia substituir aquela
vivente entre os romanos e os germânicos. Mas este período se caracterizou por ser de
intolerância, de crueldade, de guerras, ódios, perseguições e torturas que sem dúvidas
repercutiram no campo jurídico.

No período medieval, as práticas penais entrelaçaram-se e influenciaram-se


reciprocamente nos direitos romano, canônico e germânico. O direito penal, pródigo na
cominação da pena de morte, executada pelas formas mais cruéis (fogueira, afogamento,
soterramento, enforcamento etc.), visava especificamente à intimação. As sanções
penais eram desiguais, dependendo da condição social e política do réu, sendo comuns o
confisco, a mutilação, os açoites e as penas infamantes. Prescrito o sistema de
composição, o caráter público do direito penal é exclusivo, sendo exercido em defesa do
Estado e da religião.

PERÍODO HUMANITÁRIO

Tal estado de coisas suscitava na consciência comum a necessidade de modificações e


reformas no direito repressivo. É no decorrer do Iluminismo que se inicia o chamado
Período Humanitário do Direito Penal, movimento que pregou a reforma das leis e da
administração da justiça penal no fim do século XVIII. É nesse momento que o homem
moderno toma consciência crítica do problema penal como problema filosófico e
jurídico que é. Os temas em torno dos quais se desenvolve a nova ciência são,
sobretudo, os do direito de punir e da legitimidade das penas.

Césare Bonesana Beccaria, foi uma das primeiras vozes a repercutir na consciência
pública para a reforma da sistemática penal operada no fim do século XVIII,
estendendo-se até o início do século XIX, culminando com a consolidação da Escola
Clássica. Seus princípios básicos foram: a legalidade dos crimes e das penas, a
indistinção das pessoas perante a lei penal, a lei penal deveria ser tão completa e
minuciosa que ao juiz não restasse lugar para interpretações ou criações de tipos
incriminadores ou de penas não-cominadas e proporcionalidade das penas aos delitos,
propondo também um novo fundamento à justiça penal. Firmo também Beccaria muitos
dos princípios adotados pela Declaração dos Direitos do Homem, da Revolução
Francesa: 1. Os cidadãos, por viverem em sociedade, cedem apenas uma parcela de sua
liberdade e direitos. Por essa razão, não se podem aplicar penas que atinjam direitos não
cedidos, como acontece nos casos da pena de morte e das sanções cruéis.

2. Só as leis podem fixar as penas, não se permitindo ao juiz interpretá-las ou aplicar


sanções arbitrariamente.

3. As leis devem ser conhecidas pelo povo, redigidas com clareza, para que possam ser
compreendidas e obedecidas por todos os cidadãos.

4. A prisão preventiva somente se justifica diante da prova da existência do crime e de


sua autoria.

5. Devem ser admitidas em Juízo todas as provas, inclusive a palavra dos condenados
(mortos civis).

6. Não se justificam as penas de confisco, que atingem os herdeiros do condenado, e as


infamantes, que recaem sobre toda a família do criminoso.

7. Não se deve permitir o testemunho secreto, a tortura para o interrogatório e os juízos


de Deus que não levam à descoberta da verdade.

8. A pena deve ser utilizada como profilaxia social, não só para intimidar o cidadão,
mas também recuperar o delinqüente.

ESCOLAS PENAIS

Os tempos modernos viram nascer essas correntes do pensamento filosófico-jurídico em


matéria penal, chamadas escolas penais, que se formaram e distinguiram uma das
outras, como corpo de doutrina mais ou menos coerentes sobre os problemas em relação
com o fenômeno do crime e, em particular, sobre os fundamentos e objetivos do sistema
penal.

Dentre essas escolas, duas se destacaram, porque representaram posições lógica e


filosoficamente bem definidas, cada uma delas correspondendo, na realidade, a uma
distinta concepção do mundo. São a escola clássica e positiva. As outras em geral,
posições de compromisso, que participam, com maior ou menor coerência das duas
principais.

ESCOLA CLÁSSICA

A denominação clássica se deve a suas figuras representativas, não sem um certo desejo
de sarcasmo, posto que clássico é algo consagrado, o ilustre, o excelso.

César Bonesana Beccaria, no dizer de João Farias Júnior (1990), foi uma das primeiras
vozes a repercutir na consciência pública para a reforma da sistemática penal operada
no fim do século XVIII, estendendo-se até o início do século XIX, culminando com a
consolidação da Escola Clássica. Seus princípios básicos foram: a legalidade dos crimes
e das penas, a indistinção das pessoas perante a lei penal, a lei penal deveria ser tão
completa e minuciosa que ao juiz não restasse lugar para interpretações ou criações de
tipos incriminadores ou de penas não-cominadas e proporcionalidade das penas aos
delitos. Francesco Carrara, outro precursor dessa Escola, disserta que "o homem é
submetido às leis criminais, por causa de sua natureza moral; por conseguinte, ninguém
pode ser socialmente responsável por seu ato se não moralmente responsável".

O crime não é propriamente "um fato, mas uma entidade jurídica, não uma ação, mas
uma infração (Carrara, 1876).

Para Carrara, delito é a infração da lei do Estado, promulgada para proteger a segurança
dos cidadãos, resultante de um ato externo do homem, positivo ou negativo, moralmente
imputável e politicamente danoso.

Aos criminosos que agem conscientemente, cabe plena imputabilidade moral e,


portanto, inteira responsabilidade pelos seus atos. Têm eles liberdade de ação na escolha
entre o bem e o mal. Daí, naturalmente, deverem sofrer as conseqüências do que
fizerem.

O crime é uma relação jurídica entre o homem delinqüente e a lei escrita.

A pena é castigo, conseqüência lógica e razoável da ação de quem, podendo e devendo,


não quis evitar o mal feito.

A doutrina clássica preocupa-se com a legalidade e a justiça, principalmente a penal,


não conta com a pessoa do delinqüente.

ESCOLA POSITIVA

A escola foi chamada positiva, não porque aceitasse o sistema filosófico de Comte, mas
pelo seu mérito. A escola sofreu a influência de Charles Darwin, Spencer e Haeckel,
com as novas concepções da natureza e do homem.

Cesar Lombroso, médico, professor de medicina Legal da Universidade de Turim, foi o


pioneiro desta Escola. A primeira edição da obra de Lombroso foi em 1876, alterando o
rumo dos estudos penais.
O professor lastreou suas pesquisas com o aparecimento, em 1859, da obra Origem das
espécies, de Charles Darwin, donde se afirma a profunda relação do homem com os
demais animais e enfatiza a semelhança e a influência dos impulsos biológicos.
Lombroso demonstrou a necessidade de estudar a personalidade do delinqüente para
surpreender a origem biológica do delito.

Porém a grande figura da Escola Positiva foi Enrique Ferri, com seus livros Sociologia
criminal e Princípios do direito criminal, inaugurando a fase sociológica da Escola.
Pelos estudos de Ferri, as análises do crime e do criminoso passaram do plano
antropológico para o plano sociológico.
Completando os pioneiros desta Escola, citamos Rafael Garófalo, que dividiu seu livro,
Criminologia, dividido em três partes: o delito, o delinqüente e a repressão penal.

Garófalo trouxe para a Escola Positiva o conteúdo jurídico, definindo como crime
natural a ofensa feita à parte do senso moral formada pelos sentimentos altruístas de
piedade e probidade.

O método utilizado é o indutivo, da observação e da experimentação. A


responsabilidade é social. O criminoso age independentemente de sua vontade, forçado
por circunstâncias inerentes à sua estrutura físico-psíquica ou ao meio, mas prejudica e
abala a sociedade perante a qual é responsável, perigoso e temível.

A pena não é castigo ou medida aflitiva, mas defesa social.

A doutrina positivista preocupa-se com a pessoa do criminoso, buscando saber quais os


fatores que o levaram ao crime.

Com a Escola Positiva surgiu a Criminologia, que estuda os criminosos e a


criminalidade sob os mais variados ângulos, procurando-se uma explicação para o
crime.

ESCOLAS MISTAS E TENDÊNCIA CONTEMPORÂNEA

Procurando conciliar os princípios da Escola Clássica e o tecnicismo jurídico com a


Escola Positiva, surgiram escolas ecléticas, mistas, como a Terceira Escola e a Escola
Moderna Alemã. Aproveitando as idéias de clássicos e positivistas, separava-se o
Direito Penal das demais ciências penais, contribuindo de certa forma para a evolução
dos dois estudos. Referiam-se os estudiosos À causalidade do crime e não a sua
fatalidade, excluindo, portanto, o tipo criminal antropológico, e pregavam a reforma
social como dever do Estado no combate ao crime> Da moderna escola alemã resultou
grande influência no terreno das realizações práticas, como a elaboração de leis,
criando-se o instituto das medidas de segurança, o livramento condicional, o sursis etc.

Hoje, como reação ao positivismo jurídico, em que se pregava a redução do Direito ao


estudo da lei vigente, os penalistas passaram a preocupar-se com a pessoa do condenada
em uma perspectiva humanista, instituindo-se a doutrina da Nova Defesa Social. Para
esta, a sociedade apenas é defendida à medida que se proporciona a adaptação do
condenado ao convívio social.

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