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Unidade 4 – Ação
1. Conceito
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“Desta maneira a ação, como atividade dirigida a apresentar ao juiz uma proposta de providência, não é
somente própria do ator; também o demandado, mesmo quando se limite a pedir a rejeição da demanda
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contrária, vem, em substância, solicitar ao juiz que pronuncie uma sentença de declaração negativa de mera
certeza, isto é, uma providência diferente da pedida pelo ator, e favorável a ele como demandado”
(CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil, vol. 1, p. 193).
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
Esta teoria data de uma época em que o direito processual ainda não
gozava da autonomia hoje indiscutível, sendo considerado mera derivação do
direito civil. Daí a expressão imanentista, que deriva do latim immanente,
isto é, inseparável.
Herança do direito romano, essa teoria foi desenvolvida por Savigny e
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ação seria parte integrante do próprio direito substancial numa fase ativa e
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
2
Cf. LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de direito processual civil, vol. 1, p. 149.
3
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“Encarava-se a ação como um elemento do próprio direito deduzido em juízo, como um poder, inerente ao
direito mesmo, de reagir contra a violação, como o direito mesmo em sua tendência a atuar. Confundiam-se,
pois, duas entidades, dois direitos absolutamente distintos entre si” (CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de
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“Havia, pois, grande condicionamento da ação ao direito material. Segundo o próprio Wach, consistindo a
ação, num direito concreto à tutela jurídica, a apreciação da existência ou inexistência do direito de ação
somente seria feita na oportunidade da sentença. Só então, é que o juiz diria se existia ou não a ação; sendo
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procedente a ação, concederia tutela jurídica; caso contrário, negaria a tutela e a ação não teria
verdadeiramente existido” (ALVIM, Arruda. Tratado de direito processual civil, vol. 1, p. 371).
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CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, vol. 1, p. 24.
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“com seu próprio exercício exaure-se a ação, sem que o adversário nada
possa fazer, quer para impedi-la, quer para satisfazê-la. Sua natureza é
privada ou pública, consoante a vontade da lei, cuja atuação determina, seja
de natureza privada ou pública”11.
Afirmava também que ação e obrigação são dois direitos subjetivos
distintos, que somente juntos e unidos preenchem plenamente a vontade
concreta da lei, sendo que a ação não se confunde com a obrigação, pois é
um direito autônomo que surge e pode desaparecer independentemente da
obrigação12.
A ação não seria um direito subjetivo público, pois é dirigido contra o
adversário e não contra o Estado. Já que o titular do direito material não
pode sujeitar o adversário à atuação de força da lei, tem o direito de dirigir-
se ao Estado para que o faça.
Percebendo que pela teoria do direito potestativo a ação continuaria
sendo um direito concreto, porque sua existência estaria condicionada à do
direito material, não foi difícil ser refutada pela doutrina moderna, como
apresentado nos tópicos anteriores, até porque a ação deve ser
compreendida como o direito a uma prestação jurisdicional, dirigida contra o
Estado e não contra o réu13.
11
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, vol. 1, p. 24.
12
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, vol. 1, p. 25.
13
O próprio Chiovenda admite ser concretista ao afirmar que baseou sua tese na parte substancial da teoria de
Wach para definir a ação como direito potestativo (op. cit., p. 24). Porém, Calamadrei defende que a teoria
formulada por Chiovenda é a mais adequada historicamente ao processo civil regulado pelo Código Italiano,
que não definiu ação, deixando a cargo da doutrina o ofício de conceituá-la (op. cit., p. 206).
14
Alguns autores apontam também o húngaro Alexander Plósz como um dos criadores da teoria, que teria
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todos seriam titulares do mesmo, o que significa dizer que todos teriam o direito de provocar a atuação do
Estado-juiz, a fim de que se exerça a função jurisdicional” (CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito
processual civil, vol. 1, p. 115).
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16
COUTURE, Eduardo Juan. Estúdios de derecho procesal civil, vol. 1, p. 34.
17
CARNELUTTI, Francesco. Instituciones del proceso civil, vol. 1, p. 316.
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18
LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de direito processual civil, p. 150-151.
19
LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de direito processual civil, p. 150.
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2. Condições da ação
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CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil, vol. 1, p. 66. Para ele, seriam condições da
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ação: a existência de uma vontade de lei que assegurasse a alguém um bem, obrigando o réu a uma prestação;
a qualidade, isto é, a identidade da pessoa do autor com a pessoa favorecida pela lei e da pessoa do réu com a
pessoa obrigada; e o interesse em conseguir o bem por obra dos órgãos públicos.
21
Página
CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil, vol. 1, p. 206-219. Para o autor, seriam requisitos constitutivos
da ação: a relação entre o fato e a norma; a legitimação para atuar ou para contradizer; e o interesse
processual.
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próprio, direito que não lhe pertence, que podemos denominar legitimação
extraordinária, em contraposição à legitimação ordinária, contida na regra
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geral.
Sabemos, por exemplo, que cabe ao Estado o exercício do ius puniendi,
por isso mesmo a ação penal deverá ser promovida, em regra, pelo Ministério
Público. Porém, o ofendido ou quem o represente, poderá promover ações
nos casos previstos em lei, como veremos. O ofendido, neste caso, é um
substituto processual, que atua no polo ativo em substituição ao órgão
estatal que possui legitimação ordinária.
O mesmo pode ser dito da atuação dos sindicatos, cooperativas,
associações de classe, entidades estudantis, quando estão em juízo
defendendo direito que não lhes pertença, mas a seus associados. Outros
exemplos clássicos: o habeas corpus impetrado em favor de terceiro, onde há
defesa do alheio direito à liberdade (art. 654, CPP) e a ação popular, que
pode ser promovida por qualquer cidadão para anular ato lesivo ao
patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade
administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural (art.
5º, LXXIII, CF).
Fenômeno diverso é o da representação processual, que surge para
permitir a algumas pessoas o concreto exercício do direito de ação ou de
defesa, pois sendo dotadas de certa incapacidade, devem ser ladeadas por
figuras capazes de lhes suprir a deficiência. Daí, o menor estará apto a atuar
como autor ou réu, em demandas cíveis e trabalhistas, se estiver
acompanhado de seus pais, tutores ou curadores; o Município, por seu
prefeito ou procurador; a massa falida, pelo síndico; o espólio, pelo
inventariante; o condomínio, pelo administrador ou síndico; as pessoas
jurídicas, por quem os estatutos designarem ou por seus diretores, na
omissão estatutária; o ofendido menor, por seus pais, tutores, curadores ou
curador especial, para promoção de ação penal privada; e assim por diante.
Na substituição processual o substituto atua em lugar do substituído,
defendendo direito alheio em nome próprio, sendo considerado parte. Na
representação processual, o representante atua ao lado do representado,
defendendo direito alheio em nome alheio, continuando o representado como
parte. Exemplificando: se o Ministério Público promover ação de alimentos
em favor de Pedro, menor impúbere, em face de seu pai, o autor é o órgão
ministerial, enquanto o menor é o substituído. Se ação da mesma natureza
for proposta pelo menor, devidamente acompanhado de sua mãe, por
exemplo, Pedro será autor e a genitora, mera representante processual.
proteção de seu direito via tutela jurisdicional, não o faz para que seja um
direito a serviço da abusividade, da intolerância e da deslealdade. Ao
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22
Cf. SILVA, Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil, vol. 1, p. 107.
23
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, vol. 2, p. 302-303.
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ele não seja vedado. O divórcio, por exemplo, não poderia ser concedido
antes da Lei nº 6.515/77, que o criou no direito brasileiro. Assim como não
pode o Estado conceder um pedido de cobrança de dívida de jogo, nem
condenar alguém pela prática de conduta não prevista na legislação como
crime (art. 1º, CP).
Fique claro que o juiz deve verificar se o ordenamento lhe permite
conceder o que o autor pretende. Reconhecer que o pedido é juridicamente
possível, não implica em sua imediata procedência, que ocorrerá levando-se
em consideração fatores de ordem fática e jurídica. Aliás, o pedido deve ser
apreciado extensivamente, levando-se em consideração não só aquilo que se
pede como providência imediata do Estado (condenar, declarar ou
constituir), mas também os fatos que justificam a pretensão do autor. Numa
ação penal em que se pretenda a condenação do acusado por uma conduta
não tipificada, o pedido de condenação penal é juridicamente possível. Mas,
se levarmos em consideração os elementos justificadores da pretensão,
veremos que aquele pedido não pode ser acolhido.
Devemos nos lembrar também que o direito brasileiro permite ao juiz
utilizar-se de outras fontes do direito (analogia, costumes e princípios gerais
do direito) para corrigir omissões da lei (art. 4º, LICC). Isso tem implicação
imediata na condição da ação em estudo, pois não se exigirá do autor a
elaboração de pedido expressamente acolhido pelo ordenamento, pois poderá
o juiz concedê-lo, desde que não seja vedado.
No processo civil e trabalhista esta situação é mais evidente, mas no
processo penal também pode ser verificada. Por exemplo, permite-se a
realização de aborto quando a gravidez advém de estupro ou quando há risco
de vida para a gestante (art. 128, CP). Contudo, há decisões judiciais
permitindo o aborto em caso de fetos anencéfalos (gerados sem cérebro),
porque os magistrados entendem, por analogia, que estas hipóteses têm os
mesmos fundamentos do permissivo do Código Penal, isto é, uma gravidez
indesejada e de risco. Também há decisões negando a realização do aborto,
aduzindo que o rol de possibilidades contidos na legislação penal não pode
ser ampliado. Qual decisão está correta? Do ponto de vista processual,
ambas. Do ponto de vista ideológico, a resposta fica para o leitor.
processo.
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3.1 Partes
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Por hora podemos apresentar a definição que o Código de Processo Civil dá para os dois fenômenos
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processuais (art. 301, § 3º): há litispendência, quando se repete a ação, que está em curso; há coisa julgada,
quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso.
25
CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil, vol. 1, p. 229.
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É comum na doutrina qualificar o réu como sujeito passivo da ação, mas por pura questão didática, pois a
ação não é proposta contra ele, que irá apenas sujeitar-se aos efeitos dela. O verdadeiro sujeito passivo é o
Estado, para quem se pede a atuação jurisdicional contra o réu.
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3.3. Pedido
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Cf. SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil, vol. 1, p. 160.
28
Cf. ALVIM, José Eduardo Carreira. Elementos de teoria geral do processo, p. 130.
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Toda vez que alguém aciona o Estado, invocando seu direito de ação,
apresenta ao órgão julgador uma pretensão, que poderá revelar ou não um
conflito. Essa pretensão, se presentes as condições da ação, será analisada
pelo juiz que a concederá ou não através da sentença, que é o provimento
pelo qual encerra seu ofício, entregando a prestação jurisdicional.
A mais genérica classificação das ações apontada pela doutrina toma
em consideração o provimento jurisdicional pretendido, ou seja, dependendo
do que se pretende do Estado, do tipo de tutela jurisdicional desejada, a
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29
Cf. ROCHA, José de Albuquerque. Teoria geral do processo, p. 210.
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merecer prosperar, ainda que em parte30. Daí não ser adequado falarmos em
ações julgadas parcialmente improcedentes.
Numa ação penal, se o juiz acolhe na totalidade a pretensão do
Ministério Público, deve condenar o réu, julgando a ação procedente. Se
entende que o acusado não praticou o crime descrito na denúncia, agiu sob
os auspícios de uma das excludentes de ilicitude ou não há provas
suficientes para condenação, julga a ação improcedente. Agora, se o acusado
foi denunciado pela prática de vários crimes e for condenado por alguns
deles, a ação será julgada parcialmente procedente. É o que ocorre também
na desclassificação do crime, em que o juiz condena por um fato diverso
daquele pretendido pelo órgão acusador.
Ainda é possível dividirmos as ações de conhecimento em ações
declaratórias (ou meramente declaratórias), constitutivas e condenatórias.
As ações declaratórias são aquelas em que a pretensão restringe-se à
declaração da existência ou inexistência de relação jurídica entre autor e
réu: ação declaratória positiva e ação declaratória negativa, respectivamente.
Tem por finalidade obter do Estado uma sentença em que uma situação
jurídica antes incerta e controvertida seja reconhecida, por declaração, de
maneira definitiva.
Estas ações têm lugar no processo civil e trabalhista em virtude do art.
4º, I, CPC. Por exemplo: no processo civil, o autor pode promover ação
visando a declaração da existência de uma sociedade de fato; no processo do
trabalho, o empregador pode pleitear a declaração de inexistência de vínculo
empregatício31. Embora não seja admissível a propositura de ações desta
natureza para a declaração de simples fato que não se configure relação
jurídica, temos uma exceção, que permite a mera declaração de
autenticidade ou falsidade de um documento (art. 4º, II, CPC).
O correto é chamar estas ações de meramente declaratórias, pois toda e
qualquer sentença que aplica o direito ao caso concreto termina por declarar
algo. Até quando julga a ação improcedente, o juiz declara que o autor não
possui o direito alegado. Daí ser correto dizer que o que se obtém nestas
ações é a mera declaração da existência ou inexistência de relação jurídica,
da falsidade ou autenticidade de um documento. Quando uma ação
constitutiva ou condenatória é julgada procedente, há uma declaração
seguida de um comando diferenciado, um algo a mais capaz de distingui-las
das meramente declaratórias, como se vê adiante.
Na esfera processual penal também há exemplos de ações declaratórias,
apesar da relutância de alguns autores em admiti-las. O problema é que não
30
118
“O juízo contido na sentença consistirá em acolher ou rejeitar o pedido formulado pelo autor (ou em acolhê-
lo numa parte e rejeitá-lo em outra) e isso, com base no acertamento da situação jurídica existente entre as
partes; em outras palavras, o juiz formula na sentença, em forma positiva ou negativa, a regra jurídica concreta
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que disciplina o caso que constituiu o objeto do processo” (LIEBMAN, Enrico Tullio, op. cit., p. 164).
31
São ainda exemplos para o processo civil: ação de investigação de paternidade, ação de usucapião e a
consignação em pagamento.
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
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119
“Também nas ações constitutivas provoca-se uma decisão em que há, antes de tudo, a declaração de certeza
da subsistência das condições predeterminadas em lei para que possa produzir-se a mudança ou alteração
jurídica; e a isto se acrescenta a própria mutação em que se consubstancia o seu efeito constitutivo”
Página
meramente declaratórias.
Outra característica particular destas ações é a capacidade de
produzirem títulos executivos judiciais, ou seja, a sentença de procedência da
ação será um documento cujo conteúdo indica que o réu foi vencido e é
devedor de uma obrigação. Esta, desde que não cumprida voluntariamente,
poderá ser exigida em juízo, bastando para tanto a promoção de uma ação
de execução, nosso próximo assunto35. Assim, também possuem efeito ex
nunc, pois seus efeitos se operam para o futuro.
No processo civil, toda ação que possa redundar em sentença que
condene a uma prestação de dar, fazer ou não-fazer, deve ser considerada
condenatória. Assim por exemplo, é a ação de alimentos e a de cobrança. No
processo do trabalho a ação condenatória mais comum é aquela em que o
empregador é obrigado a pagar determinada quantia em dinheiro ao
empregado, correspondente aos seus direitos. Mas também há condenações
em outras obrigações, como a que obriga o empregador a reintegrar o
empregado estável no emprego (fazer) ou aquela em que o empregador é
condenado a não transferir o trabalhador para outra localidade ou não
proceder a um desconto salarial (não-fazer). No campo processual penal,
toda ação que vise a apuração da prática de delito e consequente aplicação
de sanção, deve ser classificada como condenatória.
35
120
“Em que difere a sentença condenatória da declaratória? Antes de tudo, nos efeitos: a sentença
condenatória, além de declarar a relação controvertida, tem eficácia executiva, isto é, vale como título
executivo; em outras palavras, ela permite que a pessoa indicada como credor peça a execução forçada contra
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o condenado. Quer dizer, então, que a sentença tem duplo efeito: ela declara a existência do direito a uma
prestação e o seu inadimplemento, conferindo ao titular do direito uma nova ação, a ação executiva”
(LIEBMAN, Enrico Tullio, op. cit., p. 182-183).
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
36
LIEBMAN, Enrico Tullio, op. cit., p. 204.
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
autor aquilo que somente a ação cognitiva ou executiva podem, não lhe
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Cf. LIEBMAN, Enrico Tullio, op. cit. (nota 3), p. 216. Para outros, essas ações receberiam nome de ações
assecuratórias, que proveriam com urgência a manutenção do status quo, assegurando a futura satisfação de
um possível direito depois de sua declaração (Cf. CHIOVENDA, Giuseppe, op. cit., p. 35).
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
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Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo cautelar, p. 72.
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Esta ideia é completada pelo artigo seguinte: “As medidas cautelares conservam a sua eficácia no prazo do
artigo antecedente e na pendência do processo principal; mas podem, a qualquer tempo, ser revogadas ou
modificadas”.
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
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Alguém pode alegar que no processo penal não há ações propriamente ditas, além daquelas previstas no art.
100, CP. É um equívoco, pois toda vez que alguém se dirige ao Estado, no exercício do seu direito de invocar a
prestação jurisdicional, estará exercendo o direito de ação, ainda que se trate do Ministério Público, do
querelante ou da autoridade policial, legitimados para o nosso exemplo.
41
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado das ações, tomo 1, p. 131-132. Ainda completa: “Não há
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nenhuma ação, nenhuma sentença, que seja pura” (op. cit., p. 137).
42
Esta ação tem cabimento nas hipóteses do art. 934, do Código de Processo Civil. O cumprimento da ordem
judicial vem disciplinada pelo art. 938: “Deferido o embargo, o oficial de justiça, encarregado de seu
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cumprimento, lavrará auto circunstanciado, descrevendo o estado em que se encontra a obra; e, ato contínuo,
intimará o construtor e os operários a que não continuem a obra sob pena de desobediência e citará o
proprietário a contestar em 5 (cinco) dias a ação”.
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
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Exemplificando: o § 5º, do art. 461, diz que para efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado
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prático equivalente (relativos às obrigações de fazer ou não fazer), poderá o juiz determinar as medidas
necessárias, tais como impor multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas,
desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial. Já o
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§ 2º, do art. 461-A, que cuida das obrigações de entrega de coisa, diz que se a obrigação não for cumprida no
prazo estabelecido na sentença, será expedido mandado de busca e apreensão (móveis) ou imissão na posse
(imóveis) em favor do credor.
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
44
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, vol. 1, p. 274.
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
outros casos.
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45
BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal, vol. 1, p. 652-655.
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
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No processo do trabalho é comum a utilização sinônima dos termos dissídio trabalhista e reclamação
trabalhista a significar ação trabalhista.
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
pessoas47.
Embora seja este um critério próprio do processo do trabalho, nada
impede que uma ação trabalhista individual possa ser considerada de
conhecimento (condenatória, declaratória ou constitutiva), executiva ou
cautelar, como visto em tópico anterior.
O mesmo ocorre com as ações coletivas, que também podem receber
classificação segundo aqueles critérios tradicionais, mas apenas serão
constitutivas ou declaratórias. Nas primeiras, o objetivo é a criação de novas
condições de trabalho para a categoria; nas segundas, busca-se a declaração
de existência ou inexistência de uma relação jurídica. Como se vê, não há
dissídio coletivo de natureza condenatória, porque a sentença em tais ações
apenas cria ou interpreta certa norma jurídica, que posteriormente será
objeto de ação individual para cumprimento da determinação judicial48.
Há processualistas que dispensam um tratamento ainda mais
particular para os dissídios coletivos, utilizando como critério o tipo de
pretensão deduzida em juízo, dividindo-os em:
a) dissídios coletivos de natureza econômica – têm por objeto a criação
de novas condições de trabalho ou a modificação das já existentes. Nesses
casos a sentença proferida ocupa o lugar da convenção coletiva não ajustada
entre os litigantes.
b) dissídios coletivos de natureza jurídica ou de direito – têm por objeto a
interpretação de uma norma legal, de uma convenção ou de uma sentença
normativa, para declarar seu conteúdo ou determinar sua correta aplicação.
Por fim, merece destaque uma questão importante envolvendo a
classificação das ações trabalhistas em individuais e coletivas. É que os
autores que a utilizam sempre fazem menção à substituição processual, ou
seja, a legitimação extraordinária para quem, não sendo titular do direito
material em lide, possa promover a ação substituindo o verdadeiro titular.
No direito brasileiro tal função é exercida pelos sindicatos, aos quais não se
pode imputar, em todos os casos em que estejam litigando, o rótulo de
substitutos processuais.
A maior confusão apontada pela doutrina veio justamente com a
redação do art. 8º, III, da Constituição Federal, que determinou: “ao
sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da
categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas.” Tal dispositivo
gerou interpretações apressadas de parte da doutrina, que entendeu haver
em tal mandamento uma autorização para que os sindicatos substituíssem
processualmente, de forma generalizada, todos os integrantes da categoria,
associados ou não49.
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5. Das exceções
Deixamos claro no início do capítulo, que tanto autor quanto réu têm
direito à prestação jurisdicional. Isto é, enquanto o autor pode dirigir-se ao
Estado pleiteando uma decisão favorável, no pleno exercício do seu direito de
ação, o réu também poderá fazê-lo para se defender, o que fará exercendo
seu direito de exceção. Evidenciávamos, naquele momento, a ideia da
bilateralidade da ação e bilateralidade do processo.
O termo exceção tem sua origem na exceptio do processo formulário
(Roma)50, que tem significado amplo de defesa (ou defesa lato sensu), sendo
capaz de qualificar qualquer providência do demandado em excepcionar, no
sentido de contradizer as alegações do autor. Assim como a ação, a exceção é
um poder jurídico processual: pelo primeiro o autor pleiteia algo perante a
jurisdição; pelo segundo, o réu pleiteia que seja liberado da ameaça
produzida pela ação. Percebe o leitor a ideia de dialeticidade, ou seja, do
diálogo proporcionado pelo contraditório e sua efetivação completa com o
exercício, pelo réu, do direito à ampla defesa51. Lembrando o que foi dito no
130
50
Este período vai do ano 149 a.C. até o século III da Era Cristã. Nele, toda ação deveria prosperar e redundar
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princípio da igualdade dos indivíduos perante a lei. A diferença fundamental que existe entre ação e exceção,
entre ataque e defesa, é que o autor cria o processo porque o deseja, enquanto que o demandado enfrenta o
litígio, mesmo que não o queira” (COUTURE, Eduardo Juan. Introdução ao estudo do processo civil, p. 23).
52
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As possibilidades foram apresentadas para fins didáticos. Em situação real, o réu não poderá arguir todas as
matérias mencionadas, porque algumas delas são incompatíveis. Imagine o absurdo de alegar negativa de
autoria e legítima defesa ao mesmo tempo.
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
afirmar que esta defesa opera-se em dois momentos, cuja separação dá-se
por uma linha muito tênue. Num primeiro momento, o réu confirma, aceita
as razões formuladas pelo autor para, num segundo momento, apresentar
efetivamente sua defesa. Por exemplo, se numa ação de cobrança ou numa
reclamação trabalhista o réu alega pagamento parcial, é porque concordou
com o fato de existir entre ele e o autor um determinado negócio jurídico; se
no processo penal o réu alega que o crime prescreveu, é porque concorda
com a ocorrência fática narrada pelo autor; e assim por diante53.
Para terminar, quatro observações:
1) A doutrina costuma dizer que algumas das matérias argüíveis por
meio de exceção podem ser reconhecidas de ofício pelo juiz, embora possam
ser alvo de exceção. São questões de ordem pública a que denominamos
objeções;
2) Quando afirmamos que as exceções são defesas lato sensu, o fizemos
para designar toda e qualquer defesa apresentada pelo réu. Mas a legislação
processual utiliza o termo exceção para indicar defesas com rito próprio,
apresentadas como incidentes inseridos em meio ao procedimento em curso:
são as exceções rituais. O Código de Processo Civil admite exceção ritual de
incompetência relativa, suspeição e impedimento (arts. 304 a 314); o Código
de Processo Penal amplia o rol, admitindo exceção de suspeição,
incompetência de juízo, litispendência, ilegitimidade de parte e coisa julgada
(arts. 95 a 111); e a Consolidação das Leis do Trabalho imprimiu rito próprio
apenas à suspeição e à incompetência (arts. 799 a 802).
3) Ao tratarmos do interesse de agir, mencionamos (em nota) que a ação
é inominada, ou seja, não se prende ao nome dado pelo autor ao acionar a
jurisdição, sendo o direito à prestação jurisdicional, embora na prática seja
comum a indicar um nomem juris à ação, pois o próprio legislador por vezes
assim procede54. O mesmo pode ser dito para as exceções, pois ao longo do
processo tem o réu o direito de deduzir qualquer defesa que tiver e que não
esteja assim tipificada. O enquadramento das exceções de incompetência
relativa, por exemplo, significa apenas que nenhuma defesa se admitirá
segundo as regras inerentes a esses procedimentos. Explicando, não se
poderá alegar incompetência absoluta ou qualquer outra matéria, utilizando-
se a via da exceção de incompetência relativa, bem como não se arguirá
litispendência através de exceção de impedimento etc.
4) Essa qualificação das defesas do réu como exceções vem do direito
romano, em que o réu excepcionava para defender-se, pois as ações
deveriam prosperar salvo (exeptio) se existisse algo a impedir a prolação de
53
132
Por isso não podemos concordar com a definição formulada por Liebman – de que a exceção seria a
afirmação por parte do réu da existência de um fato impeditivo, modificativo ou extintivo, com o intuito de
obter a rejeição da ação – porque não consegue abranger todas as situações práticas que acabamos de
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133
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MESQUITA, Gil Ferreira de. Princípios do contraditório e da ampla defesa no processo civil brasileiro, p.
181.
Lições de Teoria Geral do Processo – Gil Ferreira de Mesquita
Referências bibliográficas
1989. t.1.
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