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12/09/23, 23:37 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

Acórdãos TRE Acórdão do Tribunal da Relação de


Évora
Processo: 614/13.9TBPTM.E1
Relator: JOSÉ MANUEL GALO TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: DOAÇÃO
REVOGAÇÃO
Data do Acordão: 20-10-2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: CONFIRMADA
Sumário:
No caso de uma doação em que ficou consignado que
era efectuada com o encargo para os donatários de
prestarem à Autora «(...) durante toda a sua vida,
todos os cuidados médicos, prestando-lhe toda a
assistência medicamentosa, de conforto, higiene
diários e alimentação, bem como quaisquer outros
relacionados com o seu bem-estar” (...) - sob pena de
resolução na eventualidade do incumprimento do
encargo», não cumpre o encargo a donatária que
negligencia a prestação diária dos cuidados que havia
assumido perante a autora, isolando-a relativamente
às poucas relações que mantinha com uma vizinha e
familiares, cujo marido, com conhecimento da Ré,
ameaça a autora de agressões físicas e que, a partir de
certa altura, deixam de lhe prestar quaisquer apoio ou
assistência, quer com alimentação, medicamentos e
companhia, deixando de a visitar, deixando de
contactar a Autora.
Decisão Texto Integral:
Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de
Évora:
I – Relatório:
AA e BB interpuseram recurso da sentença proferida
na acção proposta por CC contra os recorrentes e DD.
*
A Autora deduziu os seguintes pedidos[1]:
a) Seja decretada a resolução, por incumprimento de
encargo, do contrato de doação celebrado em
09/11/2011, objecto dos autos, entre a Autora e os
Réus casal, com a consequente restituição e entrega
imediata à Autora da nua propriedade:
i) da fracção autónoma designada pela letra Q,
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correspondente ao segundo andar, apartamento 201,


destinada a habitação, e do direito a 1/57 indivisos da
fracção autónoma designada pela letra A,
correspondente à cave, destinada a garagem, ambas
do prédio urbano sito em São Sebastião, inscrito na
matriz predial respectiva sob o artigo 13570 e
descrito na conservatória do Registo Predial com o
nº4278/19920921.
ii) E da propriedade plena do prédio urbano,
destinado a habitação, sito na Rua das Escadinhas
inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo
1016º e descrito na conservatória do Registo Predial
sob o nº1202/19960422 e consequentemente,
ordenar-se o cancelamento definitivo das seguintes
inscrições:
iii) Apresentação nº1266, de 14/11/2011,
correspondente à descrição predial do prédio urbano
descrito sob o nº4278/19920921-A.
iv) Apresentação nº1266, de 14/11/2011,
correspondente à descrição predial do prédio urbano
descrito sob o nº4278/19920921-Q.
v) Apresentação nº1266, de 14/11/2011,
correspondente à descrição predial nº1202/19960422.
2) Os Réus sejam condenados a restituir à Autora as
quantias de que a desapossaram, por enriquecimento
sem causa, no valor global de €410.498,13
(quatrocentos e dez mil e quatrocentos e noventa e
oito euros e treze cêntimos), acrescido de juros de
mora à taxa legal, desde a data da citação até efectivo
e integral pagamento,
3) Os Réus sejam condenados a pagar à Autora, a
título de danos não patrimoniais, a quantia de
€25.000 (vinte e cinco mil euros), acrescida de juros
de mora, à taxa legal, desde a data da citação até
integral e efectivo pagamento.
*
Os Réus contestaram a acção, impugnando a versão
apresentada pela Autora e afirmando, em síntese, que
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todos os bens lhes foram doados de livre e


espontânea vontade.
*
A Autora apresentou terceiro articulado.
*
A sentença recorrida decidiu:
a) Decretar a resolução do contrato de doação
celebrado a 9 de Novembro de 2011, (fls. 115) entre a
autora e os réus casal (AA e BB), por incumprimento
de encargos, com a consequente restituição e entrega
imediata à autora da nua propriedade dos imóveis
correspondentes às fracções “Q” e “A” do prédio
descrito na Conservatória do Registo Predial sob o
n.º4278 e também posse do prédio descrito na
Conservatória do Registo Predial sob o n.º 1202 e
determinar o cancelamento das respectivas inscrições
registrais, a saber
i) Apresentação nº1266, de 14/11/2011,
correspondente à descrição predial sob o n.º 4278-A,
da Conservatória do Registo Predial;
ii) Apresentação nº1266, de 14/11/2011,
correspondente à descrição predial sob o n.º4278-Q,
da Conservatória do Registo Predial;
iii) Apresentação nº1266, de 14/11/2011,
correspondente à descrição predial sob o nº1202, da
Conservatória do Registo Predial.
b) Declarar a nulidade dos actos de disposição das
quantias pecuniárias de €349.998,13, €30.000 e
€30.000 por parte da autora e condeno os réus casal
(AA e BB) a restituir à autora o montante de
€409.998,13 (quatrocentos e nove mil, novecentos e
noventa e oito euros e treze cêntimos), acrescido de
juros de mora à taxa legal, desde 20 de Fevereiro de
2013 até efectivo e integral pagamento; e
c) Condenar os mesmos réus a pagar à autora, a título
de danos não patrimoniais, a quantia de € 1.000 (mil
euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde
sentença até integral e efectivo pagamento.
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d) Absolver do pedido o réu DD.


*
A recorrente não se conformou com a referida
decisão e apresentou as seguintes alegações[2]:
1– Vários pontos foram ignorados pelo Tribunal a
quo, de acordo com as regras da livre apreciação da
prova. Na verdade,
2– Estamos diante de um caso atípico referente a uma
pessoa com larga idade, sem familiares próximos e
com um acervo patrimonial bem apetecível, tanto
para quem dele beneficia como para qualquer outra
pessoa!!![3]
3 – Em termos criminais, (situação que foi analisada
em momento anterior ao dos presentes autos), apesar
dos fortes indícios que recaiam sobre os RR. de terem
praticado qualquer tipo de crime contra a ora Autora,
o que é certo é que os mesmos nem sequer acusados
foram vindo o processo crime a ser arquivado por
falta de fundamento legal e por inexistência de
indícios.
4 – Ora, a Meritíssima juiz a quo motivou a sentença
tendo por base o princípio da livre apreciação de
prova e a admissão por acordo dos documentos juntos
aos autos.
5 – Os RR. aceitaram que as quantias monetárias
objecto dos presentes autos foram transferidas do
acervo patrimonial da autora para o Património dos
RR.
6 – Todavia a Autora, quando dispôs do seu
património em favor dos ora RR., quer através de
doação, quer através de outorga de procuração para
confiar poderes aos mesmos, tomou as devidas
precauções legais, no sentido de deixar bem claro que
a sua vontade estava livre e esclarecida e se traduzia
na disposição do património em favor dos RR, nos
termos em que foi feita sendo na presença de
profissionais dignos, com habilitação para o efeito,
nomeadamente advogados e notários.
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7 – Todos os movimentos e idas dos RR casal ao


Banco foram na presença da Autora e que os RR
também não negam que tinham o seu consentimento
para o efeito.
8 – A Meritíssima Juiz do Tribunal a quo diz na
motivação da sua sentença que as primeiras
testemunhas que foram ouvidas foram factuais e que
as mesmas, não deixando de tecer considerações
baseadas na sua experiência, o que as levou a
comunicar à polícia o comportamento considerado
estranho, porque pouco habitual, tendo em conta o
perfil de cliente que se encaixava na autora.
9 – Conforme resulta do depoimento da testemunha
EECD (Sessão de 02/03/2015) Minuto 00:00:01 a
00:21:20 e do depoimento da testemunha FF Sessão
de 02/03/2015 CD – Minuto 00:00:01 a 00:09:25.
10 – Todavia, a testemunha FF, quando perguntada se
seria um procedimento normal da parte do banco,
considerando o tipo de montante que estava em
causa, e considerando o que estaria em causa ser a
vontade da D. DD livre e esclarecida, a mesma
responde que foram tomadas todas as cautelas, que
não competia ao banco fazer juízos de valor e que o
parecer do Departamento jurídico foi no sentido de
dever ser feita a transferência e que essa transferência
efectivamente foi feita.
11 – Pelo que, andou muito mal a Meritíssima Juiz a
quo na análise do depoimento destas testemunhas, ao
considerar que as mesmas foram fundamentais para a
condenação dos RR., salvo o devido respeito e
melhor opinião.
12 – Apesar de todas as suspeitas recaídas sobre a
vontade da Autora, o que é certo é que se o Banco
procedeu à transferência do montante para a conta
dos RR., e se o fez foi porque as duvidas quanto à
vontade da Autora ser livre e esclarecida estavam
sanadas.
13 – Pelo facto de estarmos na presença de uma
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cliente com a idade que tem a Autora, o Banco, uma


vez que a cliente não tem parentes, tem de tomar
todas as medidas necessárias, por forma a aferir se a
sua vontade na disposição do património está livre e
esclarecida.
14 – Apesar de o Banco considerar que havia “algo
estranho" e de ter feito comunicação dos fatos
considerados estranhos às entidades competentes, o
que é certo é que, acatou a ordem da Cliente, por
estarem esgotados todos os mecanismos de
desconfiança que podiam por em causa a
credibilidade e verosimilhança da sua vontade”.
15 – Mesmo as entidades policiais e judiciárias que
tomaram conta do caso, nos vários tribunais do país
não encontraram qualquer fato, na conduta dos
autores que alguma vez viesse a consubstanciar a
prática de crime.
16 – Portanto, não nos podemos conformar com o
entendimento da Meritíssima Juiz a quo quando diz
que estas testemunhas são factuais.
17 – Por outro lado, se a Autora estivesse na vizinha
Espanha, teria praticado o mesmo tipo de ato sem
levantar qualquer suspeita do seu comportamento,
bastando, para o efeito mencionar que queria levantar
ou transferir o dinheiro.
18 – Por outro lado, deveria a Meritíssima Juiz a quo,
salvo o devido respeito e melhor opinião ter
considerado que, no caso em apreço, a Autora não
tinha quaisquer familiares e que foi a Autora quem,
solicitou, desde o início os serviços da Ré AA.
19 – O facto de a Autora ter tido largos anos o seu
património financeiro intocável e nos últimos tempos
de convivência com o RR., ora Apelantes ter vindo a
diminuir o mesmo em benefício dos RR., em nada
justifica e prova que os RR. tivessem coagido a
Autora a entregar-lhe qualquer quantia.
20– Afinal estamos diante de uma pessoa idosa, sem
familiares próximos!!
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21 – Foi a Autora que convidou a Ré, conforme ficou


provado, a deixar o seu trabalho, ao acaso,
considerando que a conhecia de pequenina, para vir
para sua casa tomar conta de si, prestando-lhe todos
os cuidados.....
22 – E conforme resulta dos Autos, a Autora foi
aconselhada pela sua Advogada, Dra. GG a começar
a dispor do seu património;
23 – Por outro lado, ainda na sua motivação
menciona ainda a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo
que seria de dar maior credibilidade aos depoimentos
das testemunhas HH e II, porquanto as mesmas se
referiam ao período em que a Autora vivia com os
Réus e ao período logo a pós a rotura e que
concluíram que o ambiente que a Autora vivia e a
convivência não era a mais amigável, a ponto de
causar temor na autora e nessas circunstâncias ter
agido na disposição do seu património financeiro.
24 – Contudo, apesar de as referidas testemunhas
terem mencionado ao tribunal que tinham
conhecimento de causa relativamente ao período em
que a Autora vivia com os Réus e ao período logo
após a sua rotura, não merecem esses depoimentos
maior credibilidade só por essa razão, e como tal, não
podemos concordar com o entendimento da
Meritíssima Juiz a quo.
25 – Nesta perspectiva de análise, tanta credibilidade
mereciam as testemunhas da Autora como as da Ré,
mas não é suficiente a razão invocada para sustentar a
credibilidade das testemunhas.
26 – Ouvindo o depoimento da testemunha HH, que
infra se transcreve Bernardo Sessão de 02/03/2015
CD – Minuto 00:00:01 a 00:14:17 e o depoimento da
testemunha JJ, poderemos analisar uma série de
contradições nos depoimentos destas duas
testemunhas.
27 – A testemunha HH diz ao Tribunal que se cruzava
no prédio com a Autora chegando a ir algumas vezes
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a casa desta; descreveu a Autora como sendo uma


pessoa simpática e faladora tendo sido só a partir de
determinada altura é que a mesma deixou de falar aos
vizinhos tendo ainda acrescentado que era o casal que
virava a senhora para que esta não falasse às pessoas.
28 – Por outro lado temos a testemunha JJ a informar
o Tribunal que se cruzava com a Autora que
acompanhava a “Velhota” e que esta nunca lhe dirigia
a palavra.
29 – A testemunha HH disse ao Tribunal que várias
vezes quando estendia a roupa, ouviu gritos e
ameaças de um homem a dizer que ainda partia as
pernas à Autora. Disse que chegou a ver a Autora a
chorar da sua janela.
30 – Do depoimento destas duas testemunhas
resultam sérias contradições que o Tribunal a quo ao
invés de ter dado mais credibilidade a uma
testemunha em sede da outra, deveria ter ficado com
dúvidas relativamente à forma como as coisas
ocorreram.
31 – Seria de dar mais credibilidade à testemunha da
Autora por ser a mesma testemunha desta, pelo facto
de a mesma ser operadora de Loja e a testemunha dos
Réus se encontrar numa situação de desemprego????
32 – Que critério foi considerado pelo Tribunal;
apenas porque a testemunha HH vivenciou dois
momentos temporais da relação entre a Autora e aos
Réus????
33 – E que a testemunha dos Réus é bem clara
quando diz que da casa da D. HH, a mesma não
conseguia ver a Autora à janela!!!!!!!!!
34 – Todos nós sabemos que as testemunhas são os
olhos e os ouvidos da Justiça!!!!!
35 – Mas muitas das vezes sabemos o quão
manipuladas as mesmas são para virem ao tribunal
dizer “as suas próprias verdades”.
36 – Na sua grande maioria, as testemunhas
descreveram a Autora como uma pessoa pouco
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amigável e desconfiada até, tendo, na própria


fundamentação da Meritíssima Juiz a quo ficado bem
claro que até a prima da Autora confirmou que a
mesma era até uma pessoa desconfiada e bem assim
como outras testemunhas também confirmaram ao
tribunal essa característica por partes da Autora!!!
37 – Pelo menos um ponto estas testemunhas tiveram
em comum, que foi a de o Réu Mário não ser visto no
prédio.
38 – Nesta conformidade, não nos poderemos
conformar com o entendimento da Meritíssima Juiz
do Tribunal a quo, salvo o devido respeito e melhor
opinião na apreciação da prova, pelo que a sentença é
nula.
39 – Pelo exposto, sentença ora recorrida é
insuficiente no que respeita à apreciação e
concretização da matéria de fato considerada
provada,
40 – Porque o Tribunal a quo, na sentença, deveria
fazer referência quanto à prova que sustentou a sua
fundamentação e concretizou a sua razão de ciência,
dando por não provado e fundamental o depoimento
das testemunhas HH e II, ao contrário do que fez,
salvo o devido respeito!
41 – Porque os depoimentos destas testemunhas
quando comparados com o que foi dito pelas
restantes entram em contradição e geram dúvidas.
42 – Não devendo o depoimento das testemunhas
“mais credíveis” para o Tribunal a quo ter sido
considerado fundamental para o apuramento da
verdade atentas as discrepâncias existentes nos
mesmos e considerando os interesses em causa para
todas as partes envolventes!!
43 – Afinal estamos diante de uma senhora idosa,
sozinha (sem familiares) e com um acervo monetário
de fazer inveja a qualquer pessoa.
44 – Por exemplo, no que à testemunha II se refere,
outro depoimento não seria esperado por parte da
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mesma, considerando que esta actualmente ocupa as


funções da Ré AA.
45 – Certamente se estivesse em causa prestar
cuidados a uma pessoa idosa sem património, seria
muito difícil encontrar alguém que lhe prestasse os
cuidados necessários.
46 – Bem sabemos que infelizmente o nosso país está
repleto de casos de abandono e maus tratos a idosos,
todavia, não podemos trazer essa realidade para o
caso dos autos!!!!
47 – Por isso, a nosso ver o depoimento desta
testemunha não deveria ser valorado, até mesmo
porque veio a ser contrariado por outras testemunhas
que vieram dizer que os Réus tratavam bem da autora
e até a levavam a passear e à missa!
48 – Vejamos o depoimento de Inácia da LL, Sessão
de 02/03/2015, CD – Minuto 00:00:01 a 00:22:21.
49 – Se analisarmos com detalhe o depoimento desta
testemunha, facilmente conseguimos perceber que a
mesma não se coíbe de tecer juízos de valor e
conclusões relativamente à forma como a D. CC teria
sido tratada no passado que a mesma não
acompanhou, no entanto quando confrontada se
alguma vez tentou perceber e se tentou conversar
com essas pessoas nem sequer queria saber das
mesmas; Temia os RR, mas não precisava o que
temia, via e ouvia muitas vezes a D. AA a bater à
porta da Autora, mas nunca quis saber o porquê.
50 – Já diz o velho ditado “Quem não deve, não
teme”.
51 – Ainda mais confuso está o entendimento da
Meritíssima Juiz a quo, salvo o devido respeito e
melhor opinião, quando diz que “ Ficou claro, a fls.
25 da douta sentença segundo parágrafo, “ porém,
que a relação se deteriorou rapidamente, não sendo
possível que a actuação foi determinante para o início
da rotura: Por um lado, a autora comunica à prima
que não gostava que o réu marido estivesse em sua
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casa, o que é verosímil tendo em conta que estava há


muito tempo a viver sozinha; por outro lado
assistimos a disposições patrimoniais da autora em
benefício dos Réus logo em Novembro de 2011, com
a doação e o testamento (com cautelas que protegiam
a posição da autora como o usufruto, a reversão ou a
condição em que ouve a intervenção da advogada) e
se seguiram a diligências por iniciativa dos Réus
Casal com vista a outras disposições através de
transferências de saldos bancários, sem que a posição
da autora fosse de alguma forma acautelada”.
52 – Do que resulta escrito no parágrafo antecedente,
estamos na presença de um entendimento que foi o da
Meritíssima Juiz do Tribunal a quo que afirma que
ficou claro que a relação entre a Autora e os Réus se
deteriorou rapidamente.
53 – Todavia, salvo o devido respeito e melhor
opinião, quer da prova que foi feita, quer do que
resulta escrito, não podemos concluir essa clareza.
54 – Não conseguimos encontrar suporte para esse
entendimento!
55 – Na verdade somos da opinião que houve um
desentendimento a dada altura entre a Autora e os
Réus, mas desencadeado por quem????
56 – Na verdade, somos do entendimento que, se em
Novembro de 2011, a autora dispôs do seu
património a favor dos Réus, foi porque quis e porque
estava devidamente informada para o efeito até
mesmo porque solicitou os serviços da sua advogada
para o fazer, com as devidas cautelas legais já
anteriormente mencionadas.
57 – Por outro lado, apesar de a procuração que foi
feita em favor do Réu não ter sido elaborada com o
conhecimento da Ilustre Advogada da Autora, o que é
certo é que a mesma foi elaborada por um Notário,
que ficou ciente que a vontade da A., à data era livre
e esclarecida.
58 – Tendo sido com base nessa procuração que o R.
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BB, e sempre na companhia da A., se dirigia às


instituições bancárias.
59 – Com base no que supra se menciona, somos do
entendimento que a Meritíssima Juiz do Tribunal a
quo julgou mal e condenou pior.
60 – Efectivamente, ao arrepio da racionalidade de
um homem médio, como temos vindo a constatar a
douta sentença recorrida dá por provados factos que
não foram provados nos presentes autos, sem que
tivesse sido produzida qualquer prova nesse sentido,
prova essa coerente em sede de audiência de
julgamento, no sentido de concretizar cientificamente
e concretamente a sua decisão. E decide valorando
erradamente a mesma prova produzida.
61 – Pelo que, não consta na douta sentença
recorrida, nenhuma referência à prova em que se
sustentou a sua decisão, nem podia sido feito essa
referência, porque também não se produziu nos
presentes autos conforme se decidiu.
62 – E ainda concluiu pior a Meritíssima Juiz do
Tribunal a quo, salvo o devido respeito e melhor
opinião, que a autora não dispôs de forma
completamente livre e esclarecida dos € 300.000,00
que tinha no Banco MM.
63 – Mas depois diz mais, “ é verdade que o “Banco
MM” terá aceite transferir aquela quantia após
parecer do departamento jurídico (depoimento de FF)
e a PSP também decidiu não intervir”....
64 – Então para que serve o departamento jurídico de
um Banco????
65 – Salvo o devido respeito e melhor opinião, não
deveria a Meritíssima juiz retirar dos presentes factos
as conclusões que retirou, mas antes deveria ter
analisado como qualquer homem médio colocado na
mesma posição.
66 – O banco, apesar das dúvidas que teve, (afinal as
instituições bancárias nunca gostam de perder os seus
clientes), tomou as devidas providências no sentido
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de saber se a transferência deveria ser feita e estava a


ser solicitada sem isenções, acaba por transferir, o
montante solicitado pela cliente por ter concluído que
era essa a sua intenção!!! Ou então o Banco também
tem de ser penalmente responsável por estar a
consentir na prática pelos Réus de um crime!!!!
67 – A PSP, apesar de a Meritíssima Juiz a quo
desconhecer quais as diligencias que foram tomadas,
e do grau de profundidade das mesmas, o que e certo
é que o procedimento criminal que teve inicio veio a
ser arquivado, talvez porque os agentes de autoridade
decidiram não intervir, sem mais!!!!!
68 – Estamos certos de que não é um processo crime
que temos em frente para julgar, no entanto, para a
boa decisão da causa, não deve ser ignorado de forma
alguma a forma como o procedimento criminal
desencadeado terminou.
69 – Da conjugação da prova que foi feita em
audiência e da documentação que foi junta aos autos
muitas dúvidas ressaltam da forma como os fatos
terão ocorrido.
70 – Ao mesmo tempo, também não nos podemos
conformar com o entendimento da Meritíssima Juiz
do Tribunal a quo, salvo o devido respeito e melhor
opinião, quando a mesma conclui que foram
detectadas condutas atribuídas ao Réu marido,
compatíveis com o estado posterior em que várias
testemunhas encontram a autora.... A fls. 26 da Douta
sentença, a Mmª Juiz do Tribunal a quo escreve que
essas condutas que foram atribuídas ao Réu marido
São: A prima diz que telefona para a Autora,
atendendo uma voz masculina que diz que não mora
ali nenhuma Elísia...”
71 – Como pode a Meritíssima Juiz concluir que a
voz masculina que supostamente dizia que não
morava ali nenhuma AA era a do Réu BB???? Em
momento algum se provou ser do Réu aquela voz;
72 – Nenhuma das testemunhas inquiridas mencionou
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ter reconhecido a sua voz, pelo que este entendimento


não poderá ser valorado, nos moldes em que foi!!
73 – Retomando ao discurso da Meritíssima Juiz do
Tribunal a quo onde continua o que vem mencionado
no artigo antes deste último... fls. 26... “a testemunha
NN que responde a um pedido de ajuda da Autora
quando abordada por quem seguia na carrinha da
propriedade do Réu, na manhã do dia 1 de Janeiro....
74 – Passamos a citar o depoimento desta
testemunha, a qual nos causou algumas reservas no
seu depoimento, quanto à isenção do seu depoimento,
Sessão de 02/03/2015CD – Minuto 00:00:01 a
00:10:19 Depoimento de NN e Sessão de 02/03/201
CD – Minuto 00:00:01 a 00:02:54.
75 – Efectivamente, disse a testemunha ao tribunal
que tem a profissão de segurança profissional, e que
por acaso naquela dia um de Janeiro àquela hora,
portanto às sete da noite, que em pleno Inverno, que é
noite serrada, estava na bomba de gasolina
identificada nos autos no seu depoimento, e por
acaso, ouviu uns gritos quando estava a fumar um
cigarro com o irmão que soavam “ ajudem-me,
ajudem-me, dá-me o dinheiro, dá-me o dinheiro, mas
que não consegui ver o que se estava a passar; mas
mesmo sendo de noite e estando a carrinha atrás das
Bombas de gasolina da Repsol, conseguiu a
testemunha ver que dentro da mesma estavam duas
pessoas, não se sabe é se eram duas mais a Autora se
uma mais a Autora;
76 – A Autora, segundo o depoimento desta
testemunha, terá sido empurrada de uma carrinha
mercedes branca, que por acaso a testemunha
apontou, enquanto o seu irmão se dirigiu à
testemunha;
77 – A lesada tinha cerca de setenta oitenta anos e
quando projectada da carrinha nada lhe aconteceu,
apenas se referiu às dores que tinha nos braços por ter
sido apertada pelas pessoas que costumavam tratar
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dela e que lhe ameaçavam querer o seu dinheiro.


78 – Então após um episódio desta natureza, com
uma idosa a ser mal tratada no meio da Rua o Sr.
Segurança, não chama a Policia porque a senhora
sentia medo?????
79 – Então porque a Autora sentia medo, o Autor
prontificou-se a chamar o pai de uma pessoa com 80
anos ou o irmão, nunca tendo pensado no
marido!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
80 – Quer dizer a Autora em pleno Inverno às sete da
noite tem medo das ameaças das pessoas que a
transportavam, e não receia que dois estranhos a
levem a casa àquela hora???????????
81 – O senhor segurança dirigiu-se junto da Autora e
perguntou se a mesma precisava de ajuda, e veja-se
que quando perguntado pela matrícula da carrinha, o
mesmo ainda tinha a sua matrícula gravada no
telemóvel.... e pediu à Meritíssima Juiz do Tribunal a
quo para ir à rua ver a matrícula, vindo-se a concluir
que era a carrinha do Réu...
82 – Há dias felizes, no dia certo, há hora certa e as
pessoas certas!!!!! É muita sorte e
coincidência!!!!!!!!!!
83 – “Engraçado, sem graça nenhuma”, que esta dita
testemunha depôs em processo cível, mas em crime
nem sequer houve a necessidade de ser chamada.
84 – Salvo o devido respeito e melhor opinião, não
nos podemos conformar com o entendimento da
Meritíssima Juiz a quo, quando valora o depoimento
desta testemunha, considerando ainda que a senhora
se negou a ir ao hospital com medo!!!!!!!!!!!!
85 – Quanto às conclusões tiradas pela Meritíssima
juiz a quo quanto ao depoimento da Dra. GG, quanto
às condutas atribuídas ao Réu, as mesmas não
permitem tirar as conclusões que foram tiradas
porque não foram isentas e foram muito confusas!!!
86 – No que concerne à testemunha OO, médico
psiquiatra, podemos também concluir que o seu
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depoimento não foi imparcial e isento, conforme


resultou do seu depoimento sessão de 02/03/2015CD
minuto 00:00:01 a 00:33:57.
87 – Em primeiro lugar foi dito pelo Sr. Dr. OO que a
autora não era sua paciente, que o mesmo apenas
actuou na qualidade de examinador.
88 – Do que resulta do seu depoimento, a testemunha
conheceu os Réus especialmente a D. AA das
consultas de psiquiatria que a D. CC frequentava e
que a D. AA a acompanhava, e que esteve presente no
Cartório Notarial para um testamento.
89 – O Relatório de exame que foi junto aos autos,
data do mês de Abril de 2013, sendo que a Ré deixou
de acompanhar a Autora em Agosto de 2012,
praticamente um ano antes daquele em que o mesmo
foi realizado.
90 – Portanto no ano de 2012, ou mesmo que tivesse
sido um mês depois do convívio dos Réus com a
Autora, descreveu a testemunha que a Autora
apresentava um quadro clínico de bastante mau
associado ao convívio com o RR.
91 – A testemunha frisa, muito certa de si que as
observações que a D. CC aponta no seu depoimento
não são de delírio, não são alucinações, não são
simulação, bastando alguém de direito se debruçar
sobre o assunto, afirmou mais a testemunha que as
avaliações psicológicas que ela foi submetida não só
para este processo como também para outros
denotam que a autora não estava sujeita a alterações
psicológicas.
92 – Ainda menciona a testemunha que o relatório
feito em 2011, por altura em que foi feita a doação
não teve nada a ver com o presente.
93 – Salvo o devido respeito e melhor opinião há
alguns pontos que devem se analisados no
depoimento da testemunha em questão:
94– Afinal a testemunha examinou quatro vezes em
quase oitenta anos de vida que a testemunha tem e
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conclui mesmo a Autora invocando entidades


supremas que a mesma não tem algum problema de
demência ainda que associado à idade???
95 – Disse a testemunha que o relatório de 2011 nada
tem a ver com o último, mas também aí o
comportamento da Autora seria de colocar em
questão e deveria ter sido ponderado para efeitos de
análise da personalidade da mesma, senão vejamos,
como é que uma pessoa que não vê outra há muitos
anos, afirma que essa pessoa é a indicada para cuidar
de si, e para dispor dos seus bens e conforme disse
num dos relatórios feitos que tinha uma familiar em
quem não confiava mas que mesmo sem convivência
com os Réus dispõe do seu património em seu
favor????
96 – Temos que considerar que quando começou a
fazer exames de personalidade à Autora esta já tinha
idade avançada com a sua personalidade, maneira de
agir, vincada, sem nunca ter tido conhecimento de
causa da personalidade da Autora.
97 – Não cremos com esta afirmação dizer que somos
contra os psiquiatras, de forma alguma, mas para se
puder tirar conclusões de que um ato lesivo afectou
determinada personalidade, teremos com isso que
conhecer essa personalidade num todo, o que não
aconteceu com o Dr. Testemunha em causa.
98 – A testemunha afirma sem mais que houve um
nexo de causalidade entre o quadro clínico e as
agressões, mas as agressões onde foram provadas????
99 – Como pode a testemunha afirmar ao tribunal,
tendo estado em análise com a pessoa tão poucas
vezes e afirmar que foi a partir de determinado
momento, que a Autora começa a ficar em estado
depressivo??
100 – Destarte, parece-nos que uma pessoa com 80
anos quase tem queixas de dores físicas, tem
angústias, estados depressivos até causados por
motivos de idade, alterações de sono, e também de
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memória.
101 – Pelo que não podemos de qualquer maneira
aceitar o que foi concluído por esta testemunha.
102 – Por outro lado, já tinha passado um ano, desde
a convivência dos Réus com a Autora e só depois é
que o relatório de danos foi elaborado e um ano
nestas idades faz toda a diferença e não permite
concluir que num ano haja este nexo de causalidade,
salvo o devido respeito e melhor opinião.
103 – Por isso, podemos concluir que as condutas que
foram atribuídas ao Réu não foram de qualquer
maneira provadas em sede dos presentes autos.
104 – Nesta conformidade, não poderia o depoimento
da testemunha Inácia ser valorado nos moldes em que
foi, sendo a sentença nula também no que se reporta a
este ponto.
105 – Por outro lado, também não concordamos com
o entendimento da Meritíssima juiz do Tribunal a quo
no que concerne às conclusões extraídas das
testemunhas vizinhas, que apresentaram ao tribunal
uma versão no sentido de não haver relação de
conflito com a Autora e os Réus, porquanto a
justificação que a mesma apresentou para
fundamentar a sua posição foi a de que essas mesmas
testemunhas não tinham uma boa relação com a
Autora.
106 – Mas se analisarmos o depoimento dessas
testemunhas facilmente se extraí que a D. CC não
tinha um relacionamento bom com ninguém, e que
era uma pessoa que não era dada com as pessoas,
sendo a Ré AA a escolhida para cuidar de si, pessoa
com quem a mesma não tinha lidação apenas
conhecia.
107 – Por mera cautela se transcreveu o depoimento
das testemunhas PP, Sessão de 05/03/2015,CD –
Minuto 00:00:01 a 00:13 e depoimento de QQ.
108 – Se as testemunhas vizinhas não tinham uma
boa relação com a Autora, então pela mesma ordem
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de ideias, a testemunha Inácia não deveria ter sido


valorada em virtude a mesma não ter uma boa relação
com os Réus.
109 – Sustenta ainda a Meritíssima Juiz do Tribunal a
quo, que as testemunhas RR e SS podem não ter- se
apercebido da deteorização da Relação já que apenas
conviviam com a Autora em Alturas festivas, como
bailes, passeios ou convívios o que poderia contrastar
com o dia-a-dia.
110 – Como é óbvio, não partilhamos o mesmo
entendimento e foi transcrito o depoimento da
testemunha TT, por Videoconferência no CD Minuto
00:01 a 00:26:51, o qual foi bem claro quanto à
forma como a Autora se expressava em Relação aos
Réus no sentido como a Autora pretendia dispor o seu
património e de como a Autora se sentia grata pelo
convívio e cuidados que os réus Marido e Mulher lhe
proporcionavam e prestavam, e que foram ignorados
pela Meritíssima Juiz a quo.
111 – E por isso achamos que também quanto a estas
testemunhas que a nosso ver foram bastante claras,
não andou bem a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo,
e se efectivamente ficou com algum tipo de dúvidas
quanto à forma como os factos se passaram, não
deveria ter concluído pela condenação dos Réus.
112 – No que concerne às testemunhas UU, VV, QQ
e XX, as mesmas referiram-se de modo bem claro
quanto às características dos Réus, as quais foram
nitidamente desconsideradas pela Meritíssima Juiz do
Tribunal a quo.
113 – Destarte, também não conseguimos entender
como é que, a forma de valoração das características
apontadas pelas testemunhas às pessoas dos Réus foi
totalmente desconsiderada pela Meritíssima Juiz a
quo e que por mera cautela se passou a transcrever o
depoimento da testemunha ZZ.
114 – Porque as referidas testemunhas descreveram
de forma bem clara as características dos Réus
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enquanto pessoas, tendo estado também a depor o


casal que assume a qualidade de entidade patronal do
Réu Mário, há mais de vinte anos confiando no
mesmo a execução de tarefas que não confia a mais
ninguém.
115 – Segundo o entendimento da Meritíssima Juiz
do Tribunal a quo, se os RR fossem honestos,
humildes e prestáveis, essas características levadas
até às últimas consequências, não teriam aceite senão
as doações e o testamento!!!
116 – Não poderemos concordar com este
entendimento, salvo o devido respeito, porque
qualquer homem médio teria aceite como os RR
fizeram.
117 – Por esta ordem de ideias a testemunha Inácia
não deveria ser valorada.
118 – É que, por mais que a referida senhora exerça
as suas funções com humildade e rigidez, também
não há nenhuma regra que no contexto dos presentes
autos, não nos levasse a crer que a mesma fosse
depor a favor dos Réus, sem antes tentar junto dos
réus aferir o que se teria passado!!
119 – É que por esta ordem de ideias, se a Ré AA
alguma vez pretendeu enriquecer, poderemos
concluir que a mesma esperança teria a testemunha
Inácia, por conhecer a vulnerabilidade da autora e a
ausência de parentela.
120 – É bem claro o entendimento confuso e pouco
fundamentado da meritíssima Juiz a quo ao longo da
sua sentença!!!
121 – No enquadramento jurídico fundamentou a
meritíssima Juiz do Tribunal a quo a sua decisão de
acordo com o preceituado no artigo 608º do C.P.C.
122 – Todavia, a fundamentação utilizada pela
Meritíssima Juiz do Tribunal a quo é que não nos
parece ter andado bem, porque no seu entendimento,
não resultaram dúvidas que, a autora efectivamente
quis doar aos Réus BB e AA, parte do seu
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património, concentrando o cerne da discussão


apenas em saber se os Réus casal a quem foi imposto
o encargo violaram-no ou não, e na afirmativa se a
autora tem o direito de resolução propriamente dita.
123 – Mencionou a Meritíssima Juiz a quo o que vem
disposto nos artigos 965º e 966º do Código Civil, e
no ponto 3 do enquadramento jurídico diz que o
incumprimento de encargos só pode justificar um
pedido de resolução se assim tiver ficado
convencionado, como exige o artigo 966º do Código
Civil.
124 – Considerou a Meritíssima Juiz a quo que ficou
demonstrado que na escritura de doação ficou
estipulado que a mesma era “efectuada” com o
encargo para os donatários de lhe prestar a ela
doadora durante toda a sua vida, todos os cuidados
médicos, prestando-lhe toda a assistência
medicamentosa, de conforto, higiene diários e
alimentação, bem como quaisquer outros
relacionados com o seu bem-estar, sob pena de
resolução deste contrato por eventual incumprimento.
125 – Quanto a este ponto supra mencionado, não
temos dúvidas!!!
126 – Agora quanto ao facto de a Meritíssima Juiz a
quo ter considerado que ficou demonstrado que “a
prestação de cuidados por parte da Ré e do marido
decorreu de Agosto de Agosto de 2011 até Janeiro de
2012 até Janeiro de 2012, sendo que neste período
desenvolveram acções susceptíveis de comprometer o
bem-estar da autora/ doadora, já que tiveram a
iniciativa que conduziu a que a mesma dispusesse de
quantias elevadas depositadas a seu favor, tentaram
isolar a Autora de familiares e vizinhos, deixando de
lhe prestar assistência quando instados pela advogada
da autora a devolver-lhe as quantias em dinheiro que
haviam beneficiado de mais de €300.000,00.
127 – Efectivamente, da prova que foi feita em
audiência não se pode concluir que o que foi
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concluído neste parágrafo antecedente pela


Meritíssima juiz a quo, porque essa prova não foi
clara, nem directa, nem foi feita prova nesse sentido.
128 – Não foram presenciados por ninguém os maus
tratos à Autora, a não ser pela testemunha NN de cujo
depoimento apresentamos supra as nossas reservas,
por isso não poderia a Meritíssima Juiz a quo ter
retirado estas conclusões, salvo o devido respeito,
sendo a sentença nula também nesta parte por falta de
fundamentação.
129 – Por isso também não podemos aceitar que
tivesse sido concluído pela Meritíssima juiz a quo
que a factualidade foi suficiente para sustentar que os
donatários deixaram de cumprir o encargo que tinha
carácter duradouro.
130 – Na verdade, os RR. quiseram efectivamente
tratar a doadora como acordaram na doação, tendo
feito tudo ao seu alcance para cumprirem o acordado.
131 – A Autora, sem qualquer fundamento, pôs a Ré
AA fora de casa.
132 – Continuou a Ré a tentar perceber o motivo pelo
qual a Autora procedeu daquela maneira; Tentando
inúmeras vezes ir a sua casa para conversar
pessoalmente com a mesma, porém como ficou claro
e isso sim foi claro, a Autora mesmo acompanhada da
D. II nunca quis abrir a porta ou não lhe deixaram, só
tendo conseguido fazer quando a D. II por uma
ocasião de uma alergia foi ao SAP A Autora, depois
de expulsar de casa a Ré AA, nunca mais quis que a
mesma voltasse de onde havia saído, teria sido a
Autora ou alguém ????
133 – Apesar dos maus tratos alegados, os RR. nunca
tiveram conhecimento de a Autora ter sido
hospitalizada ou estar doentes e, de qualquer forma,
esta não lhes abriam a porta.
134 – Com base no nosso entendimento andou mal e
julgou ainda pior a Meritíssima Juiz a quo quando
concluiu que a previsão normativa estava preenchida
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e que por isso os Réus deveriam restituir à Autora os


bens que receberam.
135 – A Autora pediu os Réus fossem condenados a
restituir à autora quantias de que a desapossaram com
base no enriquecimento sem causa, todavia, a
Meritíssima Juiz a quo, ao abrigo ao disposto no
artigo 5º, nº3, do C.P.C., fundamentou a sua posição
de não estarmos diante de uma situação de
enriquecimento sem causa mas de usura, justificando
que não obstante o arquivamento quanto ao crime de
usura.
136 – Como seria esperado não nos podemos
conformar com este entendimento porque se os Réus
em sede criminal, não foram acusados sequer de
crime de usura, viria agora em termos civis
considerar – se que a figura da usura se
verificou???????? É uma decisão muito contraditória.
137 – Mas depois conclui a Meritíssima juiz a quo
que se o negócio não puder ser anulado por usura,
deveria ser considerado nulo por ser ofensivo dos
bons costumes justificando a sua conclusão no fato de
os RR. Se terem aproveitado da sua situação
individual, mesmo que patrimonialmente fosse
desafogada. Concluiu que a conduta dos réus que
actuaram em conjugação de esforços, porque casados
sob o regime de Comunhão geral o que ainda fere
mais os elementares princípios de respeito que
merecem as pessoas mais velhas na nossa sociedade.
138 – Mas na nossa opinião não foi feita qualquer
prova quanto a negócio ofensivo dos bons costumes
até mesmo porque conforme se menciona infra, não
foi feita qualquer prova em sede de julgamento e de
documentos que os Réus tivessem atuado da forma
como lhes é imputada
139 – Por isso o negócio não pode ser considerado
nulo.
140 – Por outro lado, apesar de a Autora apresentar
alguns danos na sua saúde, o que é certo é que o nexo
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de causalidade entre esses danos não foi provado.


141 – A presente sentença ora recorrida é insuficiente
no que respeita à apreciação e concretização da
matéria de fato considerada provada.
142 – Nos termos e para os efeitos do disposto no
artigo 615º, alíneas b) e c), do C.P.C., vide acórdão
RL., de 16.06.2004: BTE, 2.ª Série, nº 1-2 3/2006,
página 296, publicado no C.P.C. anotado do Dr.
Abílio Neto, pág. 919”.
143 – Não devendo o depoimento das testemunhas
“mais credíveis” para o Tribunal ser considerado
fundamental para o apuramento da verdade e como
tal ter sido a decisão fundamentada com base nos
mesmos, atentas as discrepâncias existentes nos
mesmos e considerando os interesses em causa para
todas as partes envolventes.
144 – De acordo com o disposto no artigo 280º, nº2,
do Código Civil "nulo o negócio contrário à ordem
pública, ou ofensivo dos bons costumes” vide
Acórdão STJ, 10-5-2000, 497.
145 – Não é, em nosso entendimento, imoral ou
ofensivo dos bons costumes, alguém dirigir-se a um
banco, à vista de quem quer ver e solicitar a
transferência de valores monetários da conta de uma
pessoa idosa que conforme tinha ficado provado
estava em boas condições psicológicas de dispor, que
se apresenta na presença do Banco, e que após todas
as diligencias tomadas pelo Banco, considerações à
parte, o banco acata a ordem de transferência por ter
chegado à conclusão que a vontade da cliente era
livre e esclarecida, estando nós na presença de uma
idosa sem familiares e com um acervo patrimonial,
mesmo após essas transferências bastante avultado.
146 – Por isso as transferências monetárias feitas aos
réus marido e mulher não podem, só com base neste
fundamento serem consideradas nulas.
147 – Não ficaram demonstrados quaisquer
elementos que a autora tivesse sido sujeita à coacção
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moral, nos termos e para os efeitos do disposto no


artigo 255º do Código Civil,
148 – Pelo que se deverá concluir pelo provimento da
douta apelação, em virtude da Sentença Recorrida
violar o disposto no artigo 615º, alíneas b) e c), do
Código Processo Civil e todos os preceitos legais que
se fizeram menção nem se ter verificado o disposto
no artigo 280º, nº2, do C.P.P.
*
Houve lugar a resposta.
*
Foram observados os vistos legais.
*
II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das
alegações de recurso que se define o seu objecto e se
delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem
(artigo 635º, nº4 e 639º, nº1, do NCPC), sem prejuízo
das questões cujo conhecimento oficioso se imponha
(artigo 608º, nº2, ex vi do artigo 663º, nº2, do
NCPC). Acresce que os recursos não visam criar
decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito
delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
*
Apesar da sua exagerada extensão[4], analisadas as
alegações de recurso, o thema decidendum está
circunscrito à apreciação de:
i) nulidade por falta de motivação da sentença nos
termos do disposto no artigo 615º, nº1, als. b) e c), do
Código de Processo Civil.
ii) Erro na avaliação da matéria de facto.
iii) Vício na fundamentação da matéria de facto.
iv) Erro de julgamento na subsunção jurídica
realizada, tendo em consideração os factos apurados,
quanto ao preenchimento dos pressupostos da
resolução do contrato de doação, do instituto dos
negócios usurários e da indemnização por factos
ilícitos.
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*
III – Dos factos apurados:
3.1 – Factualidade provada:
[Aproximação entre as partes]
1) CC, solteira, nasceu a 3 de Fevereiro de 1936 e
tem 1,46m de altura – fls. 47 e 49 –, com alguma
fragilidade físico-motora, necessitando, por isso, de
acompanhamento frequente de terceiros e de apoio
para o desempenho das tarefas do quotidiano, não
tendo qualquer suporte familiar próximo da sua área
de residência habitual, residindo sozinha, sem ter
descendentes ou irmãos sobrevivos, sendo pessoa de
fortes convicções religiosas.
2) A ré é sobrinha de uma cunhada da autora, cuja
infância a autora acompanhou porquanto a ré foi
criada com essa tia.
3) Em 2011, numa paragem de autocarro sita em
Silves, a autora encontrou a ré e pretendeu
aprofundar o contacto, na expectativa de usufruir da
companhia e da amizade da ré, estendendo,
concomitantemente, tal ensejo ao restante agregado
familiar da mesma, a saber, os restantes réus.
[Situação patrimonial das partes]
4) Ao tempo, a ré trabalhava no supermercado, e
auferia a quantia mensal de €500/mês.
5) DD, réu filho, trabalhava, à data do reencontro
com a autora, na mesma cadeia de distribuição
alimentar, sendo remunerado pela quantia
aproximada de €500/mês, tendo entretanto ficado
desempregado – acordo e fls. 334.
6) BB, réu marido, é tractorista na Quinta.
7) A autora era proprietária de:
- Prédio urbano, destinado a habitação, sito na Rua
das Escadinhas, descrito na Conservatória do Registo
Predial sob o nº 1202/19960422, e inscrito na
respectiva matriz predial sob o artigo 1016º, com o
valor patrimonial tributário, em 2013, de €19.080,00
– fls. 56 e 174, 58/59.
www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/d2bc9eb76a4d3a8d80258059003b295b?OpenDocument 26/76
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– Fracção autónoma designada pela letra «Q»,


correspondente ao segundo andar, apartamento 201,
destinada a habitação, do prédio urbano situado em S.
Sebastião, e descrito na Conservatória do Registo
Predial com o nº 4278/19920921, inscrito na matriz
predial respectiva sob o artigo nº 13570, como valor
patrimonial tributário, em 2013, de €109.664,27 – fls.
60, 64 e 192.
- Direito a 1/57 indivisos, de fracção autónoma «A»,
correspondente à cave, destinada a garagem, do
prédio urbano situado em S. Sebastião, descrito na
Conservatória do Registo Predial com o
nº4278/19920921, inscrito na matriz predial
respectiva sob o artigo nº13570º, como valor
patrimonial tributário, em 2011, de €10.247,76 – fls.
176.
8) O seu património era ainda constituído por
depósitos bancários e aplicações:
No dia 17 de maio de 2005, a autora efectuará
depósito de €400.000 no Banco AAA” – fls. 52.
No dia 9 de Junho de 2009, a autora tinha depósito a
prazo, em conta por si titulada junto do Banco
“BBB”, sob o n.º 8- 3969529.000.001, no valor de
€800.000 e depósito à ordem no valor de € 1.326,62 –
fls. 50.
«Portfólio» financeiro onde se encontrava ainda uma
conta a prazo no “Banco MM”, no valor de €350.000.
No dia 31 de agosto de 2009, a autora era titular de
€1.205.992,50 no “Banco AAA”, sendo €746,22 à
ordem e o restante a prazo ou aplicado em
instrumentos e seguros financeiros – fls. 53.
A 19 de Abril de 2011, a autora era titular de uma
conta bancária no Banco AAA, sob o n.º0648-
066585400, Balcão Gestor n.º0648, sob o n.º de
Cliente 25146425, e apresentava saldo à ordem
contabilístico de €960.281,09 – fls. 78.
E, a 25 de Julho de 2011, a mesma conta apresentava
um saldo à ordem de €117.123,38 – fls. 79.
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[Relação entre as partes]


9) A partir da data do reencontro da ré com a autora,
as mesmas passaram a ter contactos frequentes, quer
pessoalmente, quer pelo telefone.
10) A autora, dado necessitar de assistência
permanente, convidou a ré esposa para trabalhar na
sua residência, para cuidar de si, convite que foi
aceite pela R. esposa, tendo a ré AA aceite
desempenhar tais funções a partir de agosto de 2011,
fazendo a lida da casa, dando-lhe os medicamentos,
indo às compras, acompanhando-a ao médico,
levando-a passear e a pernoitar na casa da autora
onde também passou a estar o réu marido, com a
contrapartida de € 650/mês de remuneração, pagando
ainda a autora os respectivos descontos obrigatórios a
efectuar perante a Segurança Social.
11) Elísia Jacinto acabou por depositar a sua integral
confiança nos réus casal, que começaram a tomar
conhecimento da sua situação financeira,
nomeadamente, depósito bancário de €800.000 no
“Banco BBB”. A documentação atinente a este
depósito fora enviada para a morada da autora e
encontrava-se junto dos demais papéis da autora,
incluindo demais correspondência de instituições
bancárias, atinente aos diversos investimentos e
pacotes financeiros que contratara – fls. 50 (“extracto
integrado trimestral” do “Banco BBB”) e 53
(“extracto global” da “CGD”).
12) Em Setembro de 2011, deslocaram-se os réus
casal na companhia da autora à Instituição bancária
“Banco BBB”, com o intuito de esta proceder ao
levantamento da quantia de €435.000. Esse
levantamento não veio a mostrar-se possível, de
imediato, porquanto a gerente do balcão, em virtude
de se estar a falar de quantia avultadíssima, e por
forma a puder averiguar se a vontade da titular da
conta, mais precisamente a autora, se encontrava livre
e esclarecida, declarou que para a autora proceder ao
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levantamento da referida quantia, teria de aguardar


uma autorização de Lisboa. Todo o dinheiro que
existia na referida conta bancária ter sido levantado
pela co-titular da referida conta, a sua prima CCC,
factos estes que foram alvo de investigação, no
âmbito do processo crime.
13) Ainda em meados de Setembro de 2011, os réus
casal solicitaram à autora que esta lhes oferecesse
uma viatura automóvel, ao que esta acedeu, tendo
entregue àqueles a 27/09/2011, um cheque com o n.º
1728509400, no montante de EUR. 30.000,00 (trinta
mil euros), sacado da conta da autora, sob o n.º 0648-
066585400, do Banco AAA – quantia que aqui não é
reclamada.
14) O réu marido, com esse montante, adquiriu um
veículo ligeiro de Marca Mercedes, de cor branca, de
matrícula 00-HB-00 – fls. 720.
[Procuração]
15) No dia 19 de Setembro de 2011, a autora
constituiu o réu marido seu bastante procurador com
poderes especiais, declarando tal no Cartório Notarial
de DDD, Licenciada, nos termos e poderes que
seguidamente se descrevem – fls. 120:
– Com poderes para prometer vender e comprar, pelo
preço, cláusulas e condições que entendesse
convenientes, quaisquer prédios urbanos, rústicos
e/ou mistos, sitos nos concelhos podendo pagar
preços e dos mesmos receber quitação, outorgar e
assinar a competente escritura e/ou documentos
particulares, nomeadamente contrato promessa de
compra e venda.
– Com poderes para prometer vender e vender pelo
preço, cláusulas e condições que entender
convenientes, quaisquer prédios urbanos, rústicos
e/ou mistos, sitos nos concelhos, podendo receber
preços e dos mesmos dar quitação, outorgar e assinar
a competente escritura e/ou documentos particulares,
nomeadamente contrato promessa de compra e
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venda.
– Com poderes para representar a A. em quaisquer
Repartições Públicas.
– Com poderes para a representar junto de qualquer
Banco, ou entidade bancária e contrair quaisquer
empréstimos, ou por mútuo ou aberturas de crédito,
sem limite de valor, estipulando o prazo, o juro e
demais cláusulas, nos termos e condições que
entender, a confessar devedora e hipotecar, para
resgate/reembolso das importâncias seguras ao abrigo
dos contratos de seguro por si celebrados.
– Com poderes para representar a A. junto da
Segurança Social.
– Com poderes para a representar junto da assembleia
de condóminos do prédio onde esta reside.
– Com poderes para fazer negócio consigo próprio
e/ou em representação de terceiros.
[Testamento]
16) A 9 de Novembro de 2011, a autora testou, junto
do Cartório Notarial de EEE, Licenciada instituindo
como seus únicos e universais herdeiros os réus casal
– fls. 85 –, sendo desejo da autora que estes
mandassem rezar trinta missas pela sua alma, sob
promessa dos réus casal à autora de que iriam cuidar
da mesma, prestando-lhe assistência, até ao momento
da sua morte. Revogou assim, o testamento
outorgado no mesmo Cartório Notarial a 08/10/2010,
o qual anulou o legado a favor da sua prima CCC –
fls. 89.
[Doação]
17) Mediante escritura de doação celebrada a
09/11/2011, no Cartório Notarial de EEE, licenciada,
a autora declarou doar a AA e BB casados sob o
regime de comunhão geral de bens, os seguintes bens
– fls. 115:
- O prédio urbano descrito na Conservatória do
Registo Predial sob o nº1202;
– Fracção autónoma designada pela letra «Q» do
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prédio urbano descrito na Conservatória do Registo


Predial com o nº4278;
- Direito a 1/57 indivisos, de fracção autónoma «A»,
do prédio urbano descrito na Conservatória do
Registo Predial com o nº 4278.
18) Por forma a salvaguardar a posição da autora
(que a sua vontade de doar se encontrava isenta de
qualquer coacção) e por forma a provar que a autora
tinha a sua vontade livre e esclarecida, intervieram no
ato como testemunhas dois peritos médicos,
nomeadamente o Dr. OO e Dra. FFF.
19) Esta doação foi efectuada com o encargo para os
donatários de prestarem à A., “ (...) durante toda a sua
vida, todos os cuidados médicos, prestando-lhe toda a
assistência medicamentosa, de conforto, higiene
diários e alimentação, bem como quaisquer outros
relacionados com o seu bem-estar” (...) - sob pena de
resolução na eventualidade do incumprimento do
encargo – fls. 117, linha 20.
20) Para todas as doações ficou estabelecida uma
cláusula de reversão, para o caso de os donatários não
sobrevivessem à autora – fls. 117, linha 16.
21) As fracções autónomas designadas pelas letras
«Q» e «A» foram doadas com reserva de usufruto
vitalício a favor da autora – fls. 117, linha 13.
[Relação entre as partes (continuação)]
22) A dada altura, já depois de 9 de Novembro de
2011, a relação entre os réus casal e a autora começou
a deteriorar-se, negligenciando a ré a prestação diária
dos cuidados que havia assumido perante a autora,
isolando-a relativamente às poucas relações que
mantinha com a vizinha HH, com a prima que vivia
em Portimão e com a sua filha, residente no Montijo.
23) Os réus casal apresentavam-se perante a
comunidade vizinha da autora e nas instituições como
primos da mesma, bem como perante as repartições
bancárias onde se dirigiam.
24) O réu marido, com conhecimento da ré, chegou a
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ameaçar a autora de agressões físicas.


25) Os bens doados e os valores transferidos não
corresponderam a prestação de serviços de apoio e de
assistência por parte dos réus casal.
26) No mês de Outubro de 2011, os réus casal
conduziram a autora ao Balcão do Banco MM, com o
propósito de a autora efectuar a mobilização dos seus
fundos de que era titular numa conta a prazo, no
montante de €350.000, para uma conta titulada
exclusivamente em nome dos réus casal, também na
referida instituição bancária, tendo a gestora de conta
que atendeu autora, acompanhada dos réus casal, EE,
se apercebido de imediato que a autora estava
indecisa, hesitante, confusa e baralhada, em efectuar
tal operação bancária, tendo manifestado insegurança
quando lhe foi comunicado que perderia os juros
devido à mobilização antecipada dos fundos a
transferir – fls. 123 – e que eram os réus casal quem
respondia às perguntas feitas pela funcionária, pelo
que protelou tal operação, comunicando de imediato
tal fato à gerente do balcão, FF que reportou a
situação à PSP – fls. 123 – que, por sua vez, fez
“aditamento” no âmbito do processo crime em curso
– fls. 124.
27) Também CCC , prima da autora, apresentou
“denúncia da prática de crime” contra os réus casal, a
qual deu entrada nos serviços do Ministério Público
de Montijo em 14 de Dezembro de 2011 – fls. 128.
28) O processo n.º355/12.4TAPTM em que CC
figurava como denunciante veio a ser arquivado – fls.
246.
29) Também foi proferido despacho de arquivamento
pelo Ministério Público no âmbito do processo
n.º2494/11.0TAPTM – fls. 251.
30) Em 13/12/2011, os réus casal persuadiram ainda
autora a colocar em conta à ordem, sob o n.º 0648-
066585400, do Banco AAA, o montante de €50.000
montante esse que se encontrava previamente em
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aplicações financeiras da autora (depósito a prazo a 3


meses) – fls. 80 - tendo a autora acabado por entregar
aos réus casal, dois cheques titulados pela mesma
instituição bancária: um no montante de € 30 000,
sob o n.º 3437655000, em 29/12/2011, quantia que
receberam e não restituíram à autora; e outro, no
mesmo montante, sob o n.º 2537655001, em
18/01/2012, quantia que receberam e não restituíram
à autora.
31) A autora também emitiu cheque a favor do réu
DD, sob o número 4337654999, em 28/12/2011, no
valor de €500, quantia que recebeu e não restituiu à
autora.
32) A 6 de Janeiro de 2012, a autora acabou por
transferir o montante de €349.998,13, para os réus
casal, mediante transferência bancária para conta-
conjunta da titularidade destes, aberta na mesma
instituição, sob o NIB 00700000066553059 (fls. 141-
145), sendo certo que nessa data, o saldo da conta
bancária dos réus casal era de zero euros – fls. 143.
33) No dia 30 de Janeiro de 2012, os réus casal
fizeram levantar da referida conta-conjunta, que eram
únicos titulares, o montante de €345.000, por meio do
cheque com o n.º00174174 – fls. 143.
34) O 31 de Janeiro de 2012, essa conta do “Banco
AAA” apresentava €3. 445,11 de saldo – fls. 81; a
28.09.2012, apresentava como saldo bancário na sua
conta da CGD a quantia de €3,54 – fls. 82.
35) Nessa conta é depositada a pensão de €274,79 –
fls. 82.
36) Com os dinheiros entregues os réus casal
adquiram, por compra, em 05/01/2012, e pelo preço
declarado de €35.000, o prédio rústico, descrito na
Conservatória do Registo Predial sob o n.º2719, e
inscrito na respectiva matriz sob o Art.º 90º da Secção
C, aquisição registada pela Ap. 2462, de 13 de
Janeiro de 2012 – fls. 151.
[Conflito entre as partes]
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37) Quando a Dra. GG teve conhecimento da


transferência de €345.000, convocou os réus casal
para uma reunião no seu gabinete, tendo advertido
que se os mesmos não devolvessem a referida quantia
à autora que a mesma encetaria um processo criminal
contra os mesmos.
38) Os réus casal não aceitaram nem aceitam
devolver o dinheiro de que beneficiaram, a pretexto
de o mesmo lhes ter sido dado pela autora, na sua
perspectiva, de sua livre e espontânea vontade.
39) Após terem sido chamados para reunião com
advogada e instados a devolver as quantias em
dinheiro, os réus deixaram de lhe prestar quaisquer
apoio ou assistência, quer com alimentação,
medicamentos e companhia, deixando de a visitar,
deixando de contactar a autora.
40) Os réus nunca declararam às Finanças as quantias
pecuniárias recebidas da autora e não pagaram o
respectivo imposto de selo.
41) No dia 27 de Janeiro de 2012, junto do Cartório
Notarial de EEE, Licenciado, a autora revogou o
testamento outorgado no mesmo Cartório Notarial a
09/11/2012, em que instituíra como únicos e
universais herdeiros os réus casal – fls. 147.
42) No dia 8 de Fevereiro de 2012, no Cartório
Notarial de HHH, Licenciada, a autora revogou a
procuração feita a favor do R. esposo – fls. 149.
43) A relação da autora com os réus casal determinou
o enfraquecimento físico e mental daquela, perdendo
acentuado peso e ficando profundamente abalada
psicologicamente, tendo por isso, sofrido de
perturbações no sono, tensão muscular, dificuldade
de concentração, agitação, nervosismo, tensão
interior e dificuldade em controlar a preocupação,
tudo como consequência da conduta dos réus casal.
44) Em agosto de 2012, a autora contratou terceira
pessoa para lhe prestar assistência e companhia, II, à
qual incumbe executar as tarefas de higiene corporal,
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confecção de refeições, arrumação e pequenas


limpezas, supervisão da medicação, tratamento de
roupas, acompanhamento nas deslocações ao exterior,
aquisição de bens e serviços, preparação de lista de
compras, pagamento de contas, marcação de
consultas e exames médicos, planeamento de visitas,
passeios e viagens, organização do correio,
organização de agenda, escrita, leitura e expedição de
cartas, assistência na compra de vestuário,
organização dos serviços de lavandaria, supervisionar
entregas ao domicílio, supervisionar manutenção
doméstica, e, em geral, a organização das tarefas
pessoais da autora, pernoitando na residência da
autora ou esta em casa de II.
*
3.2 – Factualidade não provada[5]:
Ficou por demonstrar que:
- A ré tivesse tido sérias dificuldades financeiras e
sociais durante a infância e que tal fosse do
conhecimento da autora.
- Logo no contacto inicial, os réus tivessem atuado
com a intenção de se tornarem indispensáveis à
autora.
- A dada altura a autora tenha dito aos réus que os
seus parentes eram oportunistas e que a queriam
roubar pelo que seria melhor, aos poucos, o seu
património, ao invés de ficar para o Estado ir
passando para os mesmos réus.
- Fosse por a ré afirmar comunicar com o espírito da
falecida mãe da autora, III, e que fosse a pretexto da
vontade que comunicava à ré que a autora tivesse
disposto o seu património a favor dos réus.
- A autora tenha entregue aos réus casal todas as
quantias monetárias que amealhava em casa.
- A autora se tenha deslocado ao “Banco BBB” com
os réus casal com a intenção de proceder a
transferência a benefício do mesmo casal para os
ajudar a comprar um terreno.
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- Todas a transferências de capital para as contas dos


réus casal tenham sido feitas por incentivo e
iniciativa da Dra. GG, ao tempo, mandatária da
autora.
- Os €500 transferidos para a conta do réu DD tenha
sido um presente de Natal que a autora deu ao
mesmo.
- O réu DD tenha adquirido com o dinheiro
pertencente à autora uma viatura automóvel, de
marca Honda, , um imóvel no Montijo e diversos
investimentos financeiros em diversas instituições
bancárias e financeiras.
- Os €30.000 transferidos em 29/12/2011 (fls. 81)
tenham tido por finalidade para o réu marido comprar
um carro.
- Os restantes €30.000 transferidos em 18/01/2012
tenham sido doados à ré em virtude de o réu já ter
recebido 30 mil euros.
- O réu DD tenha beneficiado da quantia de cerca de
€349.000.
- No balcão do “Banco MM”, a autora tivesse
solicitado a presença da sua mandatária à altura, a
saber, GG, advogada, com imediata recusa do réu
marido.
- Os réus casal tenham concretizado as ameaças de
agressões físicas sobre a autora.
- Os réus tenham ameaçado que matariam a autora,
dizendo que mandariam colocar fogo na habitação ou
que iriam pagar a um “brasileiro” para a matar.
- Os réus casal tenham dito à autora que tinham
contratado um «brasileiro» para a vigiar.
- Os réus casal manietassem a autora para não falar
aos vizinhos.
- Os réus tenham deixado de poder prestar cuidados
de alimentação, assistência medicamentosa, e de
acompanhar a autora, em virtude de terem recebido
ordens da advogada GG e do Procurador do
Ministério Público para não o fazer.
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- Os réus casal tivessem continuado a tentar contactar


com a autora para lhe fazerem ver que a mesma
estaria a ser mal aconselhada e que os mesmos não
lhe estavam a fazer mal nenhum.
*
IV – Fundamentação:
4.1– Nulidade por falta de motivação da sentença
nos termos do disposto no artigo 615º, nº1, al. b)
do Código de Processo Civil.
As decisões proferidas sobre qualquer pedido
controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no
processo são sempre fundamentadas (artigo 154º, nº1,
do Código de Processo Civil, como corolário da
injunção constitucional precipitada no artigo 205º da
Constituição da República Portuguesa).
É nula a sentença quando não especifique os
fundamentos de facto e de direitos que justificam a
decisão (artigo 615º, nº1, al. b), do Código de
Processo Civil).
Seguindo em absoluto a lição de Alberto dos Reis,
«há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de
motivação da motivação deficiente, medíocre ou
errada. O que a lei considera nulidade é a falta
absoluta de motivação; a insuficiência ou a
mediocridade da motivação é espécie diferente,
afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco
de ser revogada ou alterada em recurso, mas não
produz nulidade.
Por falta absoluta de motivação deve entender-se a
ausência total de fundamentos de direito e de
facto»[6]. No mesmo sentido se posicionam Antunes
Varela[7] e Lebre de Freitas[8].
A falta de fundamentação só é causa de nulidade
quando for absoluta e «o dever de fundamentação da
sentença final não se confunde com o dever de
motivação previsto no artigo 653º, nº2, do Código de
Processo Civil» (versão anterior do CPC)[9].
No caso em apreço, estão devidamente especificados
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os fundamentos de facto e de direitos que motivaram


a decisão recorrida, inexistindo assim, sem cuidar da
bondade e validade dos mesmos, uma situação de
falta absoluta de fundamentação.
Em face do exposto, julga-se improcedente a
invocada nulidade.
*
4.2 – Nulidade por violação do disposto no artigo
615º, nº1, al. c) do Código de Processo Civil:
É nula a sentença quando os fundamentos estejam em
oposição com a decisão ou quando ocorra alguma
ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível
(artigo 615º, nº1, al. c), do Código de Processo Civil).
A este propósito, Alberto dos Reis refere «dois tipos
de sentença viciada: a sentença injusta e a sentença
nula. A primeira enferma de erro de julgamento; a
segunda enferma de erro de actividade (erro de
construção ou formação»[10].
Entre os fundamentos e a decisão não pode haver
contradição lógica: se, na fundamentação da
sentença, o julgador seguir determinada linha de
raciocínio, apontando para determinada conclusão e,
em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou
divergente, a oposição será causa de nulidade da
sentença. Esta oposição não se confunde com o erro
na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito
menos, com o erro na interpretação desta: quando,
embora mal, o juiz entende que dos factos apurados
resulta determinada consequência jurídica e este seu
entendimento é expresso na fundamentação, ou dela
decorre, encontramo-nos perante o erro de
julgamento e não perante oposição geradora de
nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na
fundamentação aponta para determinada
consequência jurídica e na conclusão é tirada outra
consequência, ainda que esta seja a juridicamente
correcta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os
fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na
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contradição entre o pedido e a causa de pedir,


geradora de ineptidão da petição inicial[11].
Na concepção de Antunes Varela «não se inclui entre
as nulidades da sentença o chamado erro de
julgamento, a injustiça da decisão, a não
conformidade dela com o direito substantivo
aplicável, o erro de construção do silogismo
judiciário»[12].
Está sedimentada na doutrina e na jurisprudência a
ideia de esta nulidade se verifica quando existe um
vício real no raciocínio do julgador, na medida em
que a fundamentação aponta num sentido e a decisão
segue direcção distinta.
A nossa lei impõe que o silogismo da decisão se ache
correctamente estruturado por forma a que a
conclusão extraída corresponda às premissas de que
ele emerge e a desconformidade não está no conteúdo
destas mas no processo lógico desenvolvido. E essa
oposição não se confunde com o erro na subsunção
dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o
erro na interpretação desta, pois quando, embora mal,
o juiz entende que dos factos apurados resulta
determinada consequência jurídica e este seu
entendimento é expresso na fundamentação ou dela
decorre, encontramo-nos perante o erro de
julgamento. Se, ao invés, ocorrer a assinalada
desconformidade, a decisão é nula por contradição
entre a fundamentação lavrada e o segmento
decisório[13] [14].
Em síntese, a nulidade da sentença, por oposição
entre os fundamentos e a decisão, só acontece quando
aqueles conduzirem a uma decisão diferente.
Analisada a estrutura da decisão e as conexões
existentes entre os motivos de facto e de direito a que
faz apelo e o veredicto final verifica-se que existe
uma lógica na arquitectura da sentença e, dessa
forma, a invocada nulidade não se verifica.
Aliás, no emaranhado de factos, considerações e
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conclusões tiradas pelos recorrentes parece


incontroverso que os mesmos não colocam em causa
o erro de construção do silogismo judiciário mas
antes se dirigem claramente à injustiça do decidido,
embora tenham invocado a aludida nulidade.
Se a interpretação e a relevância que a sentença deu a
certos factos e se a conclusão que deles se extraiu
foram, ou não, as mais correctas, é questão que tem a
ver com o mérito da decisão e com um eventual erro
de julgamento, mas que nada tem a ver com a
construção lógica da sentença que se mostra
correctamente formulada.
Assim sendo, também carece de fundamento a
arguição efectuada ao abrigo do disposto na alínea c)
do nº1 do artigo 615º do Código de Processo Civil.
*
4.3 – Erro na avaliação da matéria de facto:
Diz a exposição de motivos da Lei nº41/2013, de 26
de Junho [Novo Código de Processo Civil] que «se
cuidou de reforçar os poderes da 2ª instância em sede
de reapreciação da matéria de facto impugnada. Para
além de manter os poderes cassatórios – que lhe
permitem anular a decisão recorrida, se esta não se
encontrar devidamente fundamentada ou se mostrar
que é insuficiente, obscura ou contraditória –, são
substancialmente incrementados os poderes e deveres
que lhe são conferidos quando procede à reapreciação
da matéria de facto, com vista a permitir-lhe alcançar
a verdade material».
Porém, este reforço de poderes e deveres não é
unidireccional. Na verdade, a lei ao mesmo tempo
impõe novas regras das condições de exercício do
direito de recurso. Assim, os recorrentes têm agora o
dever de modelar a peça de interposição de recurso
com a seguinte estrutura: (i) especificação dos
concretos pontos de facto que consideram
incorrectamente julgados, (ii) indicar os concretos
meios probatórios constantes do processo que
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impõem decisão diferente, (iii) adiantar qual deve ser


proferida sobre as questões de facto impugnadas e
(iv) mencionar com exactidão as passagens da
gravação em que funda o seu recurso[15].
Actualmente, nos termos do nº1 do artigo 640º do
Código de Processo Civil, quando seja impugnada a
decisão sobre a matéria de facto deve o recorrente
obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os
concretos pontos de facto que considera
incorrectamente julgados, os concretos meios
probatórios constantes do processo ou de registo ou
gravação nele realizada que imponham decisão sobre
os pontos da matéria de facto impugnados diversa da
recorrida e a decisão que, no seu entender, deve ser
proferida sobre as questões de facto impugnadas.
A reapreciação dos meios de prova pelo Tribunal da
Relação destinar-se-á a diligenciar a correcção de
eventuais erros de julgamento na decisão sobre a
matéria de facto. Assim, dispõe a al. a) do número 2
do mesmo artigo 640º do Código de Processo Civil
que quando os meios probatórios invocados como
fundamento do erro na apreciação das provas tenham
sido gravados, incumbe ao recorrente indicar com
exactidão as passagens da gravação em que funda o
seu recurso – e proceder, se assim o entender, à
transcrição de quaisquer excertos – sob pena de
imediata rejeição do recurso nessa parte.
Diz-nos, a este propósito, Abrantes Geraldes[16] que
relativamente «a pontos da decisão da matéria de
facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte,
em provas gravadas, para além da especificação
obrigatória dos meios de prova em que o recorrente
se baseia, cumpre ao recorrente indicar com
exactidão as passagens da gravação relevantes e
proceder, se assim o entender, à transcrição dos
excertos que considere oportunos». Bem como que a
rejeição total ou parcial do recurso respeitante à
impugnação da matéria de facto deve verificar-se na
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situação de «falta de indicação exacta das passagens


da gravação em que o recorrente se funda».
Abrantes Geraldes[17] sublinha ainda que a rejeição
do recurso respeitante à impugnação da matéria de
facto deve verificar-se quando ocorre a «falta de
indicação exacta das passagens da gravação em que o
recorrente se funda» e a «falta de posição expressa
sobre o resultado pretendido relativamente a cada
segmento da impugnação e acrescentando que «as
referidas exigências devem ser apreciadas à luz de
um critério de rigor».
Sendo certo que a alínea a) do nº 2 do art. 640º do
Código de Processo Civil expressamente diz
incumbir ao recorrente «sob pena de imediata
rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com
exactidão as passagens da gravação em que se funda
o seu recurso». Actualmente, é a própria lei que
estabelece deste modo uma concreta cominação para
quem não cumpra o ónus em referência.
Os recorrentes pretendem a alteração da factualidade
inscrita na sentença. Porém, tanto na motivação como
nas conclusões de recurso, o articulado apresentado
não cumpre integralmente as exigências legais. Aliás,
em abono da verdade, limita-se a atacar a matéria
apurada com base em considerações genéricas e
inconclusivas. Os recorrentes executam a transcrição
de alguns depoimentos e apenas parcialmente fazem
menção às passagens exactas onde se situam esses
contributos probatórios mas não cumprem
minimamente os requisitos impostos por lei. Na
realidade, na interpretação que fazem do julgamento
de facto os requerentes nem sequer indicam os pontos
de facto que consideram incorrectamente julgados,
não propõem em que sentido a prova deveria ser
julgada e tampouco fazem referência ao substrato
probatório em que se apoiam para alterar a decisão
tomada.
A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça[18]
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estabilizou na interpretação que «a inobservância


deste ónus de alegação, quanto à impugnação da
decisão sobre a matéria de facto, implica, como
expressamente se prevê, no art. 640º, n°1, do NCPC,
a rejeição do recurso, que é imediata, como se
acentua na al. a), do n.º2, desse artigo.
Nesta sede, foi propósito deliberado do legislador não
instituir qualquer convite ao aperfeiçoamento da
alegação a dirigir ao apelante. A lei é a este respeito
imperativa, ao cominar a imediata rejeição do
recurso, nessa parte, para a falta de incumprimento
pelo recorrente do referido ónus processual (art.
640.º, n.º 2)».
Ou noutra formulação, para que a Relação conheça
da impugnação da matéria de facto é imperioso que o
recorrente, nas conclusões da sua alegação, indique
os concretos pontos de facto incorrectamente
julgados, bem como a decisão a proferir sobre
aqueles concretos pontos de facto, conforme impõe o
artigo 640º, nº 1, alíneas a) e c) do CPC. Não tendo o
recorrente cumprido o ónus de indicar a decisão a
proferir sobre os concretos pontos de facto
impugnados, bem andou a Relação em não conhecer
da impugnação da matéria de facto, não sendo de
mandar completar as conclusões face à cominação
estabelecido naquele nº 1 para quem não os
cumpre[19].
Mais se afirma correntemente que a imposição
daquele ónus ao recorrente não viola o direito de
acesso aos tribunais, não obrigando a Constituição da
República Portuguesa ao legislador ordinário que
garanta aos interessados o acesso ao recurso de forma
ilimitada, além de que sobre estes incidem também
condicionalismos que estão vinculados a cumprir.
Deste modo, rejeita-se a impugnação da decisão da
primeira instância quanto à matéria de facto nos
termos em que foi deduzida pelos apelantes.
*
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4.4 – Vício na fundamentação da matéria de facto:


Seguindo a mesma linha e forma de contestação, os
recorrentes alegam que a decisão de facto não se
encontra fundamentada.
A apelada sustenta que o exame crítico das provas
operado na sentença em recurso resulta inteiramente
lógico, racional e inteligível, permitindo alcançar as
razões que levaram o tribunal a quo a julgar. Por
conseguinte, opina que a matéria pretensamente
impugnada não merece ser modificada.
As decisões dos tribunais que não sejam de mero
expediente são fundamentadas na forma prevista na
lei, por imposição da Lei Fundamental.
A fundamentação das decisões encerra uma tríplice
função. Na primeira está ao serviço da eficácia do
sistema de justiça, através do convencimento dos
destinatários, da comunidade jurídica em geral e da
própria sociedade. Numa zona intermédia, a
fundamentação autoriza que as partes e os tribunais
de recurso procedam ao reexame lógico e racional
das razões que lhe subjazem, ao potenciar quem,
assim, se reconstitua o percurso lógico percorrido,
alicerçado em elementos de prova antecedentes e
explicitados no texto da decisão. Ou seja, nesta
vertente o julgador revela o raciocínio lógico do
tribunal relativamente à sua própria decisão. Numa
derradeira dimensão, a fundamentação é um factor de
legitimação do poder jurisdicional, contribuindo para
a congruência entre o exercício desse poder e a base
sobre a qual repousa o dever de dizer o direito no
caso concreto (iuris dicere)[20].
Para cumprir a exigência constitucional, a
fundamentação há-de ser expressa, clara e coerente e
suficiente. Ou seja, não deve ser deixada ao
destinatário a descoberta das razões da decisão; os
motivos não podem ser obscuros ou de difícil
compreensão, nem padecer de vícios lógicos; a
fundamentação deve ser adequada à importância e
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circunstância da decisão.
A fundamentação da decisão deve, pois, permitir o
exercício esclarecido do direito ao recurso e
assegurar a transparência e a reflexão decisória,
convencendo e não impondo.
O princípio da livre apreciação das provas para a
formação da convicção do julgador implica que, na
fase de ponderação, decorra um processo lógico-
racional que conduza a uma conclusão lógica, sensata
e prudente. Só que esse processo, insondável e
íntimo, não tem de ser transposto para a motivação,
que se limita a elencar criticamente as provas
consideradas credíveis[21] [22].
A prova há-de ser sempre apreciada segundo critérios
de valoração racional e lógica do julgador,
pressupondo o recurso a conhecimentos de ordem
geral das pessoas normalmente inseridas na sociedade
do seu tempo, a observância das regras da
experiência e dos critérios da lógica, tudo se
resolvendo, afinal, na formação de juízos e
raciocínios que, tendo subjacentes as ditas regras,
conduzam a determinadas convicções reflectidas na
decisão de pontos de facto sob avaliação. Deve, ela,
ainda ser considerada globalmente, conjugando todos
os elementos disponíveis e atendíveis[23].
Embora referindo-se à jurisdição penal, tem aqui
aplicabilidade a afirmação que «o sistema de livre
apreciação da prova deve definir-se pelo seu
significado positivo que se traduz na valoração
racional e crítica que permita ao julgador objectivar a
apreciação dos factos e assegurar pelo seu conteúdo
as garantias procedimentais concedidas pela lei
fundamental. É de salientar que os destinatários da
decisão não são apenas os sujeitos processuais mas a
própria sociedade»[24].
Após refutarem parte do conteúdo e da convicção do
julgador relativamente a parte das prestações
probatórias produzidas em audiência, na sua
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conclusão 120 os recorrentes afirmam que «é bem


claro o entendimento confuso e pouco
fundamentado da Meritíssima Juiz a quo ao longo
da sentença», reportando-se também à motivação
sobre a matéria de facto.
Está exarado na sentença que «a convicção do
tribunal quanto à factualidade dada como
provada resultou da conjugação da posição das
partes (admissão por acordo), da apreciação feita
dos documentos juntos» e, acrescentando nós, da
prova testemunhal produzida.
A documentação apreciada na sentença [fls. 742 a
743 verso] serviu e bem para julgar provados os
factos integrados nesses documentos, que,
designadamente, foram decisivos para a prova do
nascimento da Autora, da celebração da escritura
pública, da outorga do testamento e da sua posterior
revogação, da propriedade, da inscrição e do registo
dos imóveis doados e da prova do cumprimento das
obrigações fiscais inerentes às transmissões
ocorridas, da emissão da procuração a favor de um
dos Réus e da sua posterior revogação, da titularidade
das contas e dos fluxos financeiros entre as contas
dos interessados, da movimentação dos extractos de
conta, das contas abertas em nome dos Réus
recorrentes, dos rendimentos auferidos pelos Réus
recorrentes, do estado de saúde da Autora, da
aquisição de um veículo automóvel em nome do Réu
marido, da situação profissional do BB, entre outros.
Relativamente à contestada interpretação e valoração
dos registos testemunhais recolhidos, a sentença
expressa o seguinte:
«EE, bancária e gestora de conta de CC, afirmou
que a autora visitou a agência do então “Banco
MM”, pedindo transferência de quantias da sua
conta para a conta dos acompanhantes, que
diziam ser primos. Não era normal a autora ir à
agência, lembrando-se de que à data da abertura
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da conta, havia sido acompanhada por uma


familiar que referira não haver outros familiares.
Além disso, reteve que no contacto com a autora,
quando fazia perguntas quem respondia eram os
ditos primos. Alguns dias mais tarde, receberam
no banco a informação de que havia sido entregue
denúncia por extorsão. Acompanhou a situação
com cuidado nas várias visitas que se verificaram
todos os 15 dias/3 semanas: foi aberta conta em
nome dos acompanhantes, os réus casal; informou
de que haveria perda de juros pela mobilização
antecipada do depósito; a autora aparentava estar
bem mas achou estranho aquele comportamento.
Confirmou a transferência de fls. 141 e o
levantamento noutra agência através de um
cheque dirigido a outra pessoa.
FF, gerente bancária da dependência onde a
autora tinha conta, afirmou tê-la visto apenas uma
vez, tendo acompanhado a situação através de EE.
Soube da queixa apresentada no Montijo e por
isso tentaram acautelar a situação, retardando a
transferência, comunicando à polícia, pedindo
parecer ao departamento jurídico até que
acabaram por concretizá-la.
HH, operadora de loja, foi vizinha da autora
durante algum tempo, quando a mesma foi residir
para o edifício: cruzavam-se no prédio e chegou ir
algumas vezes a sua casa. Descreveu a autora
como uma pessoa simpática e faladora, sendo que
a partir de certa altura deixou de falar aos
vizinhos, concluindo que era o casal que a
acompanhava que a virava para ela não ver as
pessoas. Várias vezes, quando estendia a roupa,
ouviu gritos e ameaças de um homem a dizer que
ainda lhe partia as pernas. Foi a sua casa e
apercebeu-se de que estava com medo, ninguém
atendendo depois os seus telefonemas, até que um
dia foi a autora que foi até sua casa, descalça a
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pedir ajuda, dizendo que lhe batiam e que a


ameaçavam. Chegou a ver a autora a chorar à
janela.
II que há três anos cuida da autora referiu que
começou por ir para a sua casa em
fevereiro/Março de 2012 mas “era um
desassossego completo”: não comia, não dormia,
tinha de usar fraldas, chorava e estava muito
debilitada. Batiam-lhe à porta a várias horas do
dia e da noite, chegando a ter ouvido um
telefonema onde um homem a ameaçava que lhe ia
bater. Relatou o que a autora lhe contara e que
teria sido o casal que a obrigara a levantar o
dinheiro, sob pretexto de ser essa a vontade da
mãe, já falecida e que fazia aparições.
NN, formador de segurança privada, afirmou ter
conhecido a autora num dia de janeiro em 2011 ou
2012, quando pelas 7 horas e ouviu uma senhora a
gritar “ajudem-me, ajudem-me”. Estava uma
carrinha mercedes branca e chegou a tirar a
matrícula que anotou no telemóvel (00-HB-00),
reacção que atribuiu às funções que exerce, tendo
ainda dado o contacto à autora. Antes gritou “Ei!”
e as pessoas arrancaram. Acompanhou a autora a
casa a pedido, embora tivesse negado querer ir ao
hospital ou que se chamasse a polícia.
CCC, professora do ensino secundário,
apresentou-se como prima da autora, explicando
que é a sua mãe que é prima direita da autora,
ambas residentes. Descreveu a autora como uma
pessoa de muito baixa estatura e muito magra,
tendo trabalhado no campo toda a vida e
residindo sozinha. Tentou acompanhá-la já que os
seus pais eram mais velhos e de fraca instrução.
Então, a dada altura a mãe perguntou-lhe se podia
ajudar a prima relativamente a questões de saúde
e contas bancárias. Passou a receber a
correspondência dos bancos, primeiro no Montijo,
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onde reside, e depois na morada dos pais (até à


altura em que a autora disse que ia buscar a
documentação); também redistribuiu o dinheiro
que tinha no “Banco AAA” por quatro
instituições: além do “AAA”, “JJJ”, “BBB” e
“MMM”.
Crê que em 2011, falou com a prima sobre poder
ter alguém que a acompanhasse até que um dia ela
telefonou-lhe a dizer que já tinha encontrado: a
autora começou por queixar-se por a ré levar para
sua casa o marido; no primeiro/segundo mês
ainda chegaram a visitar os pais com a
regularidade habitual, mas depois deixou de
atender telefonemas ou, quando atendia, percebia
que havia alguém a dar indicações do que seria
para dizer.
Entretanto, ligaram-lhe do “BBB” a dizer que
havia um casal que estaria a tentar levantar o
dinheiro da autora. Deslocou-se e o réu BB
pareceu-lhe agressivo, ouvindo-o dizer “ a
mãezinha não vai gostar”, fazendo referência à
mãe de CC. Dirigiu-se à PJ e à PSP pedir ajuda. A
PSP ainda foi duas vezes a casa da autora mas
ninguém lhe abriu a porta. Foi também sozinha.
Nessa ocasião, abriram-lhe a porta mas não
entrou. Visitou a advogada da prima. Apresentou
depois denúncia no Montijo. Fez telefonemas para
o telefone fixo da tia que foram atendidos e de
onde respondia uma voz masculina a dizer que
não morava ali a D. CC.
OO, médico psiquiatra, afirmou ter consultado a
autora em algumas ocasiões, nunca tendo sido sua
paciente: em Outubro/Novembro de 2011, na
altura em que a autora fez o testamento e doação
dos prédios, tendo concluído que aqueles actos
terão sido feitos de livre vontade com o objetivo de
vir a ser apoiada na velhice; em Setembro de 2012
e em Março/Abril de 2013 de onde resultou o
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relatório de onde consta a referência a grande


sofrimento psicológico, angústia e ansiedade e
auto-estima muito baixa, com grandes sentimentos
de insegurança, após ter sido sujeita a situações
graves com os réus casal em que os mesmos a
impediam de contactar com pessoas e de sair,
atormentando-a com referências ao espírito da
mãe para lhes ceder os seus bens. A testemunha
referiu-se ao facto de ter estado sozinha durante
as sessões e de aqueles relatos não corresponderem
a delírios ou simulações (excluindo alterações
psico-patológicas que tivessem alterado o estado
de consciência) mas a um estado de sofrimento
real, compatível com algo de muito grave e de
forma repetida que, estima, manter-se-á para o
resto da vida.
RR, conviveu com os réus casal e com a autora,
tendo ouvido dizer-lhes várias vezes “aquilo que
eu tenho é tudo para vocês” e pareceu-lhe muito
satisfeita, pela companhia ser bem tratada pelo
casal e por passear (tendo acompanhado o casal a
Fátima e a Espanha) ou frequentando bailes ao
fim-de-semana, indo à missa ao domingo.
Entretanto, soube que a D. CC mudou a
fechadura da porta de casa impedindo assim que o
casal ali voltasse a entrar, desconhecendo as
razões. A autora chegou a pedir-lhe que guardasse
ouro seu alegando que tinha medo que alguém lho
tirasse. Recebeu as coisas mas exigiu que a mesma
autora escrevesse num papel as coisas que lhe
entregava para depois vir a dizer que não lhe
queria entregar os bens.
TT, amigo de infância do réu BB, afirmou ter
visitado a casa da autora e acompanhar o casal e a
autora quando saíam, o que acontecia muitas
vezes, tendo chegado a ir a Fátima e ao Alentejo.
Disse não saber outros pormenores sobre
pagamentos ou doações, embora tivesse ficado
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com a ideia de que não havia quaisquer problemas


de falta de dinheiro e que a autora afirmava que
eles seriam os seus filhos. Desconhece as razões
por que as relações se deterioram. Ouviu o
aborrecimento da ré uma vez que se teria
desempregado e que entretanto ficara sem
trabalho. No entanto, confirmou que era o réu BB
quem pagava as despesas e que o casal adquiriu
um terreno e uma carrinha, desconhecendo a
origem do dinheiro que terão usado nas compras.
JJ, empregada de limpeza desempregada, vizinha
da autora no edifício, cruzava-se com a ré AA que
acompanhava a “velhota” a qual nunca lhe dirigia
a palavra. Nunca ouviu barulhos à noite e disse
que a vizinha HH nunca poderia ver a casa da
autora. Também disse que nunca entrara na casa
de D. CC e que não viu que vivesse algum homem
na mesma casa.
UU, reformado, disse ter trabalhado com a ré na
cozinha durante um ano, em 2005 e tê-la como
pessoa honesta, humilde, prestável, assim como o
filho e o marido, embora se vejam de vez em
quando e sem regularidade.
VV descreveu os réus casal como seus
empregados, sendo o réu BB tractorista há mais
de 20 anos, boa pessoa e fiel, qualificativos que
usou para descrever também a ré AA. Todavia,
nunca ouviu falar que esta estivesse a tratar de
uma senhora, revelando, assim, desconhecer
totalmente o relacionamento entre o casal e a
autora que também não conhece.
ZZ, doméstica, conhece autora e ré, revelando
uma maior proximidade com esta, descrevendo-a
como pessoa com muitos amigos, ao contrário da
autora, conflituosa e desconfiada. Conhece a
autora como pessoa com muito dinheiro devido a
fazendas da família que foram vendidas.
PP, vizinha da autora, reconheceu estar de
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relações cortadas com a mesma há 4 anos, por


espalhar que “punha homens em casa”, tendo por
isso perdido o trabalho. Chegou a dizer que as
vizinhas iam a sua casa e que lhe tiravam coisas.
Morava em frente ao apartamento da autora,
nunca tendo ouvido barulhos ou se apercebido de
que alguém a tratasse mal.
QQ foi colega de escola e trabalhou com a ré no e
conhece a autora e família, achando ser uma
pessoa conflituosa. Sobre a situação patrimonial
da autora reconheceu que toda a gente sabia que
tinha terrenos.
LLL, empregada de limpeza amiga da ré disse
saber que esta trabalhava no e que saiu para ir
tratar de uma senhora. Tem-na como boa pessoa,
incapaz de fazer mal a alguém. Quanto ao réu
BBafirmou conhecê-lo desde os 5 anos, toda a
gente gostando dele.
XX, amiga da ré AA e família, trabalhou com a
mesma nunca a tendo visto na companhia da
autora.
Por último, a apreciação do depoimento da
testemunha GGé realizada de forma exaustiva e
prolonga-se entre as folhas 746 e 748 verso, que, pela
sua extensão, não se reproduz.
É a soma destes elementos de prova e a
fundamentação analisada que encaminhou a
Meritíssima Juíza para a fixação dos factos provados
e não provados.
Como se pode extrair daquilo que se acaba de
transcrever a Mmª Juiz «a quo» faz uma
exteriorização dos fundamentos da decisão judicial e
o juízo efectuado em primeira instância foi realizado
de acordo com as regras da experiência, da lógica, da
racionalidade, da probabilidade e da racionalidade.
O núcleo essencial mínimo de motivação demanda
que esta seja objectiva e clara e, bem assim, se
estruture num raciocínio suficientemente abrangente
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em relação à apreciação dos problemas fundamentais


e necessários à justa decisão da lide[25].
Efectivamente, o exame crítico consiste na
enumeração das razões de ciência reveladas ou
extraídas das provas administradas, a razão de
determinada opção relevante por um ou por outro dos
meios de prova, os motivos da credibilidade dos
depoimentos, o valor de documentos e exames que o
tribunal privilegiou na formação da convicção, em
ordem a que os destinatários (e um homem médio
suposto pela ordem jurídica exterior ao processo com
a experiência razoável da vida e das coisas) fiquem
cientes da lógica do raciocínio seguido pelo tribunal e
das razões da sua convicção[26].
E a sentença recorrida contém todos os elementos
necessários à compreensão do sentido da decisão e o
tribunal indicou os fundamentos suficientes para que
através das regras da ciência, da lógica e da
experiência necessários se efective o controlo da
razoabilidade da convicção que incidiu sobre o
julgamento do facto e a leitura daquela decisão é
inequivocamente susceptível de convencer terceiros
da correcção da mesma.
Deste modo, falece assim a razão aos recorrentes
quando afirmam que a decisão sobre a matéria de
facto se encontra viciada e não respeita os ditames
impostos pelo ordenamento jurídico nacional.
*
4.5 – Erro de julgamento na subsunção jurídica
realizada, tendo em consideração os factos
apurados, quanto ao preenchimento dos
pressupostos da resolução do contrato de doação:
O Tribunal «a quo» declarou a resolução do contrato
de doação celebrado, a 9 de Novembro de 2011, entre
a Autora e os Réus AA e BB, por incumprimento,
com a consequente restituição e entrega imediata à
autora da nua propriedade dos imóveis doados aos
réus.
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Os recorrentes referem que «estamos diante de um


caso atípico referente a uma pessoa com larga
idade, sem familiares próximos e com um acervo
patrimonial bem apetecível, tanto para quem dele
beneficia como para qualquer outra pessoa». A
partir desta asserção montam uma estratégia
processual que aponta para a iniquidade do decidido a
propósito da resolução da doação e, assim, no
enquadramento lógico em que se movem, pugnam
pela revogação da decisão do Tribunal «a quo»
devido a erro de direito.
Invocam ainda que a doadora tinha a sua vontade
livre e esclarecida. Porém, essa motivação carece de
interesse para a justa solução da causa, uma vez que a
resolução operada não se fundamenta em qualquer
problema relacionado com as capacidades
psiquiátricas da Autora nem se fundamenta em
qualquer comportamento coactivo dos donatários.
*
A resolução é a destruição da relação contratual
operada por um dos contraentes com base num facto
posterior à celebração do contrato e tem efeitos
retroactivos[27]. A resolução caracteriza-se ainda por
ser normalmente de exercício vinculado (e não
discricionário), no sentido de que só pode ocorrer se
se verificar um fundamento legal ou convencional
que autorize o seu exercício (artigo 432º, nº1, do
Código Civil). Assim, se ocorrer esse fundamento, o
contrato pode ser resolvido. Se não ocorrer, a sua
resolução não é permitida (artigo 406º, nº1, do
Código Civil). O fundamento legal mais comum para
a resolução do comodato é o incumprimento da outra
parte (artigo 801º, nº2, do Código Civil). No entanto,
é ainda admissível a resolução com base na justa
causa e um dos efeitos desta é a eficácia retroactiva, o
que determina, a par da extinção do contrato, o
surgimento de obrigações de restituição.
Doação é o contrato pelo qual uma pessoa, por
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espírito de liberalidade e à custa do seu património,


dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito,
ou assume uma obrigação, em benefício do outro
contraente (artigo 940º, nº1, do Código Civil).
São três os requisitos exigidos no artigo 940º para
que exista uma doação:
a) Disposição gratuita de certos bens ou direitos, ou
assunção de uma dívida, em benefício do donatário,
ou seja, a atribuição patrimonial sem correctivo;
b) Diminuição do património do doador,
c) Espírito de liberalidade[28].
A doação de coisas móveis só é válida se for
celebrada por escritura pública e na hipótese vertente
foi respeitada a forma legalmente imposta (artigo
947º, nº 1, do Código Civil).
A sentença recorrida faz a seguinte contextualização
para permitir a compreensão daquilo que se discute:
«CC, pessoa só, sem familiares próximos, e de
idade avançada, convivia com os réus havia cerca
de 4 meses, sendo a mulher, AA, quem da mesma
cuidava, em troco de uma retribuição de €
650/mês. Sentindo-se grata pela relação que
mantinha decidiu dispor do seu património
imobiliário, salvaguardando a sua posição
enquanto vivesse, o que se compreende, já que a
autora foi acompanhada de advogada: foi assim
estabelecida a reserva de usufruto no que respeita
à fracção “Q” e “A” do apartamento onde vivia
(cfr. o disposto no art. 958.º do Código Civil), o
direito de reversão caso não lhe sobrevivessem
(cfr. o art. 960.º do mesmo código) e o encargo de
assistência (cláusula modal a que se refere o art.
963.º do código em referência)».
Afirmando explicitamente que as doações podem ser
oneradas com encargos, o artigo 963º, nº1, [do
Código Civil] quer precisamente realçar o facto de a
atribuição donativa não deixar de ser liberalidade
pelo facto do donatário assumir a obrigação de
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realizar certa prestação[29] [30].


Conforme salienta Dias Marques[31] a doação modal
tem lugar «quando a doação é acompanhada de um
encargo (também chamado ónus ou modo) que onera
o donatário (artsº 963º a 965º)».
Seguindo de perto a jurisprudência do Supremo
Tribunal de Justiça[32], o modo ou encargo consiste
numa restrição imposta ao beneficiário da
liberalidade que o obriga à realização de determinada
prestação no interesse do autor da liberalidade, de
terceiro, ou do próprio beneficiário.
Ora, no caso concreto em apreço, a prestação dos
réus era determinada e correspondia a um dever de
assistência, conforme se extrai dos pontos 17) a 21)
dos factos provados. No caso da doação ficou
consignado que era efectuada com o encargo para os
donatários de prestarem à Autora «(...) durante toda
a sua vida, todos os cuidados médicos, prestando-
lhe toda a assistência medicamentosa, de conforto,
higiene diários e alimentação, bem como
quaisquer outros relacionados com o seu bem-
estar” (...) - sob pena de resolução na
eventualidade do incumprimento do encargo».
No fundo, tratava-se de cuidar e tratar
convenientemente da Autora na alimentação, higiene,
saúde e na doença e assumir o bem-estar desta, sob
pena de resolução dessa doação. O direito potestativo
de resolução é, normalmente, de exercício
condicionado à existência de um fundamento previsto
na lei ou no contrato (artigo 432º do Código Civil).
Face à disciplina contida na parte final do artigo 966º
do Código Civil, a resolução da doação só tem lugar
quando as partes no contrato de doação previram essa
forma da cessação do contrato[33]. Isto é, a resolução
do contrato de doação, apesar de se fundar no não
cumprimento de encargos e de ter previsão legal,
aproximando-se da resolução legal por
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incumprimento, deverá estar estipulada, expressa ou


implicitamente, no contrato de doação[34] [35]. Ou
na acepção de Maria do Rosário Palma Ramalho[36]
não basta o animus do doador, sendo necessário o
acordo das partes.
O critério da determinação era objectivo e estava
perfeitamente definido, permitindo aos Réus – aqui
recorrentes – controlar a sua prestação: assistência à
Autora nos termos acima indicados.
Dispõe o artº 965.º do Código Civil (cumprimento
dos encargos) que na doação modal, tanto o doador,
ou os seus herdeiros, como quaisquer interessados
têm legitimidade para exigir do donatário, ou dos
seus herdeiros, o cumprimento dos encargos.
Aquilo que aqui importa decifrar é se os Réus AA e
BB a quem foi imposto o encargo o violaram
injustificadamente, caso em que a Autora tem direito
de resolução da dita doação.
Está demonstrado que, a dada altura, já depois de 9
de Novembro de 2011, a relação entre os Réus casal
e a Autora começou a deteriorar-se, negligenciando
a Ré a prestação diária dos cuidados que havia
assumido perante a autora, isolando-a relativamente
às poucas relações que mantinha com a vizinha HH,
com a prima que vivia em Portimão e com a sua
filha, residente no Montijo [facto 22)].
Ficou ainda assente que o Réu marido, com
conhecimento da Ré, chegou a ameaçar a autora de
agressões físicas [facto 24)].
Foi considerado provado que, após terem sido
chamados para reunião com advogada e instados a
devolver as quantias em dinheiro, os Réus deixaram
de lhe prestar quaisquer apoio ou assistência, quer
com alimentação, medicamentos e companhia,
deixando de a visitar, deixando de contactar a
Autora [facto 39)].
A relação da Autora com os Réus casal determinou o
enfraquecimento físico e mental daquela, perdendo
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acentuado peso e ficando profundamente abalada


psicologicamente, tendo por isso, sofrido de
perturbações no sono, tensão muscular, dificuldade
de concentração, agitação, nervosismo, tensão
interior e dificuldade em controlar a preocupação,
tudo como consequência da conduta dos Réus casal
[facto 43)].
Não contando com a transferência patrimonial de
dinheiro [de valor aproximado a €410.000,00
(quatrocentos e dez mil euros)], estamos a falar de
uma doação de bens imobiliários de montante
consideravelmente alto [cerca de €140.000 (cento e
quarenta mil euros), atendendo somente ao valor
patrimonial tributável dos imóveis] e, por
conseguinte, o cumprimento da cláusula modal
implicava um particular desvelo na satisfação dos
encargos de acompanhamento, vigilância e cuidado
estabelecidos contratualmente.
Acolitada no conspecto factual apurado é lícito
concluir que a cláusula modal não foi cumprida com
culpa exclusiva dos Réus recorrentes. Como
apropriadamente consta da decisão impugnada «a
prestação de cuidados por parte da ré e do réu
marido decorreu de agosto de 2011 até Janeiro de
2012, sendo que já neste período desenvolveram
acções susceptíveis de comprometer o bem-estar
da autora/doadora, já que tiveram a iniciativa
que conduziu a que a mesma dispusesse de
quantias elevadas depositadas a seu favor,
tentaram isolar a autora de familiares e vizinhos,
deixando de lhe prestar assistência quando
instados pela advogada da autora a devolver-lhe
as quantias em dinheiro de que haviam
beneficiado de mais de €300 000.
Esta factualidade é suficiente para concluir que
os donatários deixaram de cumprir o encargo
que tinha um carácter duradouro. Uma vez que o
contrato conferia o direito de resolução “fundado
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no não cumprimento de encargos”, é de julgar


preenchida a previsão normativa e concluir como
pretendido pela autora noa alínea a) do
petitório».
No plano jurisprudencial existe uma sintonia
absoluta com aquilo acaba de ser expresso, tanto ao
nível da caracterização da cláusula modal, como das
consequências do incumprimento e da necessidade
de expressa previsão da faculdade de resolver o
contrato de doação[37].
Como decorre dos invocados artigos 433º e 434º do
Código Civil que a resolução tem efeito retroactivo,
significando isto que, face ao enquadramento fáctico
de suporte, os donatários devem restituir à autora os
bens que receberam.
Os bens doados não corresponderam a uma efectiva
e completa prestação de serviços de apoio e de
assistência por parte dos recorrentes, os quais eram
pressuposto modal para a manutenção da doação e
na escritura do negócio jurídico foi expressamente
prevista a faculdade de resolução contratual.
Como a obrigação a cargo do beneficiário da
liberalidade[38] foi incumprida culposa, a sentença
do Tribunal «a quo» revela-se acertada.
*
4.6 – Da anulabilidade do negócio de doação de
bens monetários:
A Autora pediu ainda que os Réus fossem
condenados a restituir-lhe as quantias de que a
desapossaram, por enriquecimento sem causa, no
valor global de €410.498,13, acrescido de juros de
mora à taxa legal, desde a data da citação até
efectivo e integral pagamento.
Ficou demonstrado que a Autora procedeu à
transferência a favor dos recorrentes das quantias de
€500 (28 de Dezembro de 2011), €30.000 (29 de
Dezembro de 2011), €349 998,13 (6 de Janeiro de
2012) e €30.000 (18 de Janeiro de 2012).
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Estes actos de disposição não foram acompanhados


de uma cláusula modal, a exemplo do que aconteceu
com a doação de bens imobiliários, posto que está
fora de causa a possibilidade de resolução contratual
nos termos expostos no capítulo anterior.
A Autora arquitectou a presente acção através do
recurso ao instituto do enriquecimento sem causa,
deduzindo os respectivos factos de suporte e
concluindo pelo pedido de restituição que é típico de
situações de nulidade ou anulabilidade
expressamente previstas na legislação civil.
O princípio geral do enriquecimento sem causa
consta no artigo 473º do Código Civil, segundo o
qual «aquele que, sem justa causa, justificativa,
enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir
aquilo com que injustamente se locuptou» (artigo
473º, nº1, do Código Civil).
A obrigação de restituir, por enriquecimento sem
causa, tem de modo especial por objecto o que for
indevidamente recebido, ou o que for recebido por
virtude de uma causa que deixou de existir ou em
vista de um efeito que não se verificou (artigo 473º,
nº2, do Código Civil).
São elementos constitutivos do instituto em
apreciação o enriquecimento de um património e o
correlativo empobrecimento de outro decorrentes do
mesmo facto e a ausência de causa justificativa para
a correspondente deslocação patrimonial verificada.
Dada a sua natureza subsidiária[39], a causa de pedir
do enriquecimento sem causa cede perante os
elementos constitutivos do incumprimento
contratual derivada da responsabilidade civil
obrigacional.
Menezes Leitão[40] refere que os pressupostos
constitutivos do enriquecimento sem causa são: a
existência de um enriquecimento, a obtenção desse
enriquecimento à custa de outrem e a ausência de
causa justificativa para o enriquecimento. No plano
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jurisprudencial existe uma sintonia absoluta com


esta doutrina[41].
Para que a acção de enriquecimento sem causa
proceda não basta que não se prove a existência de
uma causa justificativa de atribuição patrimonial; é
antes necessário que se prove a falta de causa de
deslocação patrimonial, nos termos da regra geral
sobre o ónus probandi estatuída no artigo 342º do
Código Civil, por essa carência justificativa ser facto
constitutivo de quem requer a restituição do
indevido[42].
O enriquecimento de alguém somente será injusto,
dando por isso lugar à restituição dos valores
recebidos, quando a entrega desses valores não seja
determinada por uma causa justificativa[43].
No caso que nos ocupa é inquestionável que se
verificou uma transferência bancária originária das
contas da Autora para as dos Réus. É evidente que
ocorreu uma situação de enriquecimento dos Réus e
um correspondente empobrecimento da Autora. No
entanto, existe uma causa justificativa que se
traduziu na doação desse capital e, assim, a situação
em discussão não merece guarida no instituto do
enriquecimento causa. Todavia, o Tribunal «a quo»
considerou que havia lugar a um enriquecimento
injusto.
Entendeu a sentença recorrida que «a autora estava
numa situação de clara dependência de que os
réus casal se aproveitaram, acompanhando-a às
instituições bancárias, mesmo quando eram
apresentadas algumas resistências à
concretização das transferências, como a de
€349.998,13, aceitando essas quantias no
curtíssimo espaço de tempo em que com ela
conviviam [agosto de 2011 a Janeiro de 2012] e já
depois de terem beneficiado de outras quantias (€
30 000 em 27 de Setembro de 2011 para comprar
o Mercedes cuja restituição a autora não
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reclama) e de figurarem como beneficiários do


testamento de 9 de Novembro de 2011 e
donatários na doação com a mesma data, além de
o réu marido beneficiar de procuração com
extensos poderes desde Setembro de 2011».
Em função deste quadro de fragilidade e de
dependência, após ter afastado o cenário da coacção
moral, considerou que a hipótese jurisdicional se
enquadrava na esfera de protecção dos negócios
usurários.
É anulável, por usura, o negócio jurídico, quando
alguém, explorando a situação de necessidade,
inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental
ou fraqueza de carácter de outrem, obtiver deste,
para si ou para terceiro, a promessa ou a concessão
de benefícios excessivos ou injustificados (artigo
282º, nº1, do Código Civil).
O objectivo dos artigos 282º e seguintes do Código
Civil é, por conseguinte, fazendo uso das palavras
de Heinrich Höerster[44], «a protecção de pessoas
caracterizadas ou afectadas de certas situações de
inferioridade contra quem pretenda daí tirar
benefícios excessivos e injustificados. Deste modo a
finalidade dos artigos 282º ss é a de um correctivo
material de índole social».

Pedro Eiró[45] explica que a «usura, como princípio


geral invalidante do negócio jurídico, não é
concebível sem o lesado se encontrar numa posição
que justifique a sua protecção pelo ordenamento
jurídico. Essa posição pode genericamente ser
designada por «situação de inferioridade».
Se esta situação se não verificar, não é possível a
«exploração» que irá causar a obtenção ou promessa
de benefícios excessivos ou injustificados».

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O requisito exploração implica necessariamente


momentos subjectivos, a saber, a consciência das
situações tipificadas no artigo e a consciência da
causalidade entre essas situações e os benefícios
recebidos, embora, na prática, este segundo
momento (causalidade) resulte, muitas vezes, de
uma prova por presunções»[46].

Portanto, exige-se, como requisito da anulabilidade


ou modificação do negócio, a consciência da
situação de necessidade, inexperiência, dependência,
ou deficiência psíquica de alguém, mas não basta a
verificação dum daqueles estados, sendo necessário
que haja a consciência de que se está a tirar proveito
da inferioridade de outrem para alcançar um
benefício manifestamente excessivo ou injustificado,
em proveito próprio ou de terceiro, ficando esta
determinação entregue ao prudente arbítrio do
julgador e só verificados todos estes requisitos pode
o negócio ser havido como usurário[47].

Para Karl Larenz[48] esta «exploração é o


aproveitamento consciente de dada situação». E,
para tanto, é suficiente que o usurário tenha
consciência contemporânea dessa inferioridade do
declarante, irrelevando se teve ou não intenção de
dela abusar.
No conceito de usura à face do actual direito
positivo português patenteiam-se as seguintes
dimensões: (1) o desequilíbrio ou desproporção no
seio do negócio; (2) a situação de fraqueza do
lesado, (3) a exploração reprovável pelo
usurário[49].
É necessário que esse aproveitamento seja
censurável, seja contrário às regras da boa-fé, ainda
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que se não verifique a intenção de explorar. Só deste


modo se pode valorar negativamente o negócio
celebrado. Só assim se justifica a intervenção do
Direito. Isto é, a conduta do aproveitador tem que
ser merecedora de um juízo de reprovação por parte
do ordenamento jurídico.
A circunstância de ter sido arquivado um processo
crime por se ter entendido que a conduta dos Réus
recorrentes não se enquadrava no crime de usura não
tem qualquer significado para a justa resolução deste
caso. Na realidade, os elementos constitutivos do
crime de usura não se confundem com as exigências
precipitadas no Código Civil para o accionamento
do instituto dos negócios usurários.
Ao mesmo tempo, a decisão recorrida faz
igualmente apelo à disciplina inscrita no número 2
do artigo 280º, nº2, do Código Civil. Este preceito
prescreve que «é nulo o negócio contrário à ordem
pública ou ofensivo dos bons costumes».
Sob este prisma, a ordem pública corresponde ao
conjunto dos princípios fundamentais e estruturais
da ordem jurídica, mormente com assento
constitucional. Diferentemente, os bons costumes
são geralmente identificados com a moral social,
moral pública ou moral dominante. É uma cláusula
de recepção, através da qual a ordem pública recebe
no seu seio “o conjunto de regras éticas aceites pelas
pessoas honestas, correctas, de boa-fé, num dado
ambiente e num certo momento”[50]. Segundo esta
visão, a remissão para os bons costumes seria o
meio utilizado pelo legislador para justificar normas
de índole moral[51].
No preenchimento do conceito de bons costumes,
Larenz[52] afirma que se está perante «uma pauta
carecida de valoração» cuja densificação deve ser
concretizada com recurso à Constituição e aos
princípios nela consagrados.
Na visão da Meritíssima Juíza «a quo» essa
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realidade é traduzida na seguinte equação de facto


«tendo em conta o aproveitamento dos réus casal
da situação de uma pessoa de 75 anos de idade a
quem, em termos sociais, é devido respeito e
consideração e não aproveitamento da sua
situação individual, mesmo que a patrimonial
fosse desafogada. A conduta dos réus casal, que
actuaram em conjugação, sendo além disso,
casados sob o regime de comunhão geral, fere os
mais elementares princípios de respeito que, na
nossa sociedade, merecem as pessoas mais velhas
que vivem só e sem suporte social ou familiar».
Como resultado desta asserção, a sentença recorrida
condena na restituição das quantias doadas por
negócio informal, ao abrigo do artigo 289º do
Código Civil, acrescidas de juros legais, contados a
partir 20 de Fevereiro de 2013, até integral e
efectivo pagamento [Portaria n.º291/2003, de 8 de
Abril].
Adianta ainda que «já que quanto ao réu filho (além
da transferência de 500 de que beneficiou) nada de
específico se apurou» e assim o mesmo foi
absolvido do pedido.
Efectivamente, como se revela na decisão
impugnada, o juiz não está sujeito às alegações das
partes no tocante à indagação, interpretação e
aplicação das regras de direito (primeira parte do
artigo 644º do Código de Processo Civil).
Tanto na determinação (indagação), como na
interpretação e na aplicação do direito, o juiz não
está sujeito às alegações das partes (la court sait le
droit; da mihi factum dabo tibi ius). Ter os
movimentos livres na aplicação do Direito significa,
além do mais, que o juiz não se encontra adstrito à
qualificação jurídica dos factos efectuada pelas
partes[53].
Esta é uma decorrência do princípio constitucional
da legalidade do conteúdo da decisão, que busca o
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seu fundamento genético na tradição romana e tem a


sua proclamação primária no brocado latino jura
novit curia. Configura assim mandamento
incontestável que o Tribunal não está condicionado
pelas alegações das partes no domínio da indagação,
interpretação e aplicação das normas jurídicas.
Neste horizonte importa salientar que, não obstante
a restituição não ocorrer por via do accionamento do
instituto do enriquecimento sem causa, por ser
idêntico o resultado, o pedido formulado pela autora
é procedente, ainda que ao abrigo de outra norma
jurídica. Toda a factualidade que serve este desígnio
consta da petição inicial e é bastante para realizar o
silogismo judiciário integrativo e a causa de
pedir[54] está estruturada na ideia da
desproporcionalidade entre os bens doados e o
comportamento adoptado pelos donatários.
A terminar, é no seio do negócio usurário em
associação com o princípio da boa-fé que este
Tribunal de recurso fundamenta a decisão de
confirmação da decisão recorrida.
Na situação vertente existe claramente uma situação
injusta que demanda um comportamento correctivo
da parte dos Tribunais em ordem a proteger um
contraente manifestamente colocado numa posição
de debilidade jurídica em função das suas
características, sendo que esse aproveitamento se
traduzia numa soma de transferências de verbas de
valor final manifestamente elevado, ocorrida num
curto período de tempo, efectuada no pressuposto
que os beneficiários da mesma correspondiam no
plano da afectividade, do acompanhamento e da
satisfação das necessidades básicas da doadora, o
que acabou por não acontecer.
Assim, é à luz do paradigma avançado por Barbas
Homem que se impõe a anulação deste negócio. Diz
o autor que «a validade de uma noção mínima de
injustiça como limite absoluto de validade do
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direito, mesmo quando se apresenta expressa por


outros vocábulos, como arbitrariedade,
irrazoabilidade, irracionalidade,
desproporcionalidade»[55].
A par do princípio da restituição do enriquecimento
injustificado, Luís Menezes Leitão[56] fala da boa-
fé que se concretiza «assim em regras impostas do
exterior que as partes devem observar na actuação
do vínculo obrigacional, podendo servir para
complementação do regime legal das obrigações,
através de uma valoração a efectuar pelo julgador.
Nalguns casos, ela estabelece o único regime
aplicável, por ausência de outras regras, levando ao
desenvolvimento de novos institutos jurídicos,
noutros casos, ela surge como um correctivo de
outras normas cuja aplicação no caso concreto
atentaria contra vectores fundamentais do sistema
jurídico».
Inspirado na magistral tese de Menezes
Cordeiro[57], Luís Menezes Leitão sintetiza esta
obra, dizendo que a boa fé se estrutura em dois
postulados essenciais: a tutela da confiança e a
primazia da materialidade subjacente. Afirma que
quanto à tutela da confiança, «a sua protecção
através do princípio da boa-fé significa exigir-se no
quadro de um sistema móvel um conjunto de
pressupostos para que a confiança tenha tutela
jurídica. Seriam assim exigíveis:
– Uma situação de confiança, traduzida na boa fé
subjectiva;
– Uma justificação para essa confiança, consistente
no facto de a confiança ser fundada em elementos
razoáveis;
– Um investimento de confiança, consistente no
facto de a destruição da situação de confiança gerar
prejuízos graves para o confiante, em virtude de ele
ter desenvolvido actividades jurídicas em virtude
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dessa situação;
– A imputação da situação de confiança criada a
outrem, levando a que este possa ser considerado
responsável pela situação.
Quanto à primazia da materialidade subjacente, ela
consiste em avaliar as condutas não apenas pela
conformidade com os comandos jurídicos, mas
também de acordo com as suas consequências
materiais para efeitos de adequada tutela dos valores
em jogo. Este princípio realiza-se de acordo com os
seguintes vectores:
– a conformidade material das condutas;
– a idoneidade valorativa;
– o equilíbrio no exercício das posições»[58].
Todos estes pressupostos e vectores estão presentes
na situação em análise e é claro que a tutela da boa
fé é atingida com o comportamento descrito na
sentença recorrida.
É, pois, como já se referiu, na intercepção do
instituto do negócio usurário com a cláusula da boa
fé que deve ser solucionada a questão judicanda. A
propósito da decisão segundo princípios de justiça, a
qual parece razoavelmente prevalecer no
pensamento implícito da primeira instância, Manuel
de Andrade[59] advoga que «o juiz há-de escolher,
entre as várias soluções possíveis, aquela mesma
que editaria se tivesse de legislar».
Atendendo ao teor da factualidade acima transcrita,
avaliada a partir das regras da boa-fé, é possível
concluir que estes elementos se encontram presentes
a partir do funcionamento de presunções judiciais
viabilizando assim o juízo efectuado em primeira
instância.
*
4.7 – Da condenação no pagamento de
indemnização:
Referem os recorrentes que «apesar da Autora
apresentar alguns danos na sua saúde, o que é
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certo é que o nexo de causalidade entre esses


danos não foi provado».
Neste domínio, a sentença recorrida considerou
assentes relevantes os seguintes factos:
a) A dada altura, já depois de 9 de Novembro de
2011, a relação entre os Réus casal e a Autora
começou a deteriorar-se, negligenciando a Ré a
prestação diária dos cuidados que havia assumido
perante a Autora, isolando-a relativamente às poucas
relações que mantinha com a vizinha HH, com a
prima e com a sua filha, residente no Montijo [ponto
22) dos factos provados].
b) O Réu marido, com conhecimento da Ré, chegou
a ameaçar a Autora de agressões físicas [ponto 24)
dos factos provados].
c) Após terem sido chamados para reunião com
advogada e instados a devolver as quantias em
dinheiro, os Réus deixaram de lhe prestar quaisquer
apoio ou assistência, quer com alimentação,
medicamentos e companhia, deixando de a visitar,
deixando de contactar a Autora [ponto 39 dos factos
provados].
d) A relação da Autora com os Réus casal
determinou o enfraquecimento físico e mental
daquela, perdendo acentuado peso e ficando
profundamente abalada psicologicamente, tendo por
isso, sofrido de perturbações no sono, tensão
muscular, dificuldade de concentração, agitação,
nervosismo, tensão interior e dificuldade em
controlar a preocupação, tudo como consequência da
conduta dos Réus casal [ponto 43) dos factos
provados].
Reza a sentença recorrida que «não há dúvida que
tais danos (cfr. factualidade em 2.1. (22, 24, 39 e
43) sofridos pela autora são indemnizáveis, de
harmonia com o disposto no art. 496.º, n.º 1, do
Cód. Civil, pois revestem a gravidade suficiente
para merecerem a tutela do direito.
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Há, assim, necessidade de fixar uma quantia


compensatória, nos termos do já citado art. 496.º,
n.ºs 1 e 3, 1.ª parte. No que concerne ao art. 494.º
para que aquele último remete, há que considerar
a aplicação dos critérios aí referidos, a situação
económica do agente, pessoas de modesta
situação económica, embora seja de ponderar
também que os réus casal manifestaram a
intenção de não restituir as quantias, sendo que
deixaram de assistir a autora além de a ameaçar.
Em face do exposto, fixo a indemnização por tais
danos em €1. 000, com juros contados desde a
sentença».
*
São vários os pressupostos da responsabilidade civil
por actos ilícitos, como se extrai do artigo 483º, nº1,
do Código Civil:
a) o facto do agente ("um facto dominável ou
controlável pela vontade, um comportamento ou
uma forma da conduta humana"[60]- que se pode
traduzir numa acção ou omissão);
b) a ilicitude (ou antijuridicidade) que pode revestir
a modalidade de violação de direito alheio (direito
subjectivo) e a violação de uma disposição legal
destinada a proteger interesses alheios;
c) o nexo de imputação do facto ao lesante ou culpa
do agente, em sentido amplo, o que significa que a
sua conduta merece a reprovação ou censura do
direito e que pode revestir a forma de dolo ou
negligência;
d) o dano ou prejuízo;
e) o nexo de causalidade entre o facto praticado pelo
agente e o dano sofrido pela vítima.
A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal,
pela diligência de um bom pai de família, em face
das circunstâncias de cada caso (artigo 487º, nº2, do
Código Civil).
Vem-se entendendo que, provindo a lesão de um
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facto ilícito, seja de acolher e seguir a formulação


negativa, segundo a qual o facto que actuou como
condição do dano só não deverá ser considerado
causa adequada do mesmo se, dada a natureza geral
e em face das regras de experiência comum, se
mostrar indiferente para a verificação dano.
Causalidade adequada essa que se refere – e não
apenas ao facto ou dano isoladamente considerado –
a todo o processo factual que, em concreto,
conduziu ao dano[61].
Da análise da matéria fáctica assente resulta que
todos os referidos pressupostos impulsionadores da
reparação fundada na responsabilidade civil por
factos ilícitos se encontram preenchidos.
Ensina Gomes da Silva[62] que «elementos
fundamentais da responsabilidade são o dano e a
relação em que ele se encontra com o responsável.
(...) A responsabilidade é, por conseguinte, a
obrigação nascida de um prejuízo e tem por objecto
a reparação deste. O intuito com que a lei o
estabelece não é o de intimar os indivíduos nem o de
reprimir os factos ilícitos: é apenas o de satisfazer a
justiça comutativa, reparando danos causados. O
prejuízo, por conseguinte, é o fulcro de toda a
responsabilidade».
Na lição de Pereira Coelho [63] «por dano pode
entender-se (...) o prejuízo real que o lesado sofreu
in natura, em forma de destruição, subtracção ou
deterioração de um certo bem corpóreo ou ideal».
Assim, defende-se que dano é «todo o prejuízo,
desvantagem ou perda que é causada nos bens
jurídicos, de carácter patrimonial ou não, de
outrem»[64].
Prescreve o artigo 496º do Código Civil:
«1- Na fixação da indemnização deve atender-se aos
danos não patrimoniais que, pela sua gravidade,
mereçam a tutela do direito.
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(…)
3- O montante da indemnização será fixado
equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em
qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo
494º; no caso de morte, podem ser atendidos não só
os danos não patrimoniais sofridos pela vítima,
como os sofridos pelas pessoas com direito a
indemnização nos termos do número anterior».
Os interesses cuja lesão desencadeia um dano não
patrimonial são infungíveis, não podem ser
reintegrados mesmo por equivalente. Mas é
possível, em certa medida, compensá-los mediante
satisfações derivadas da utilização do dinheiro. Não
se trata, portanto, de atribuir ao lesado «um preço de
dor» ou «um preço de sangue», mas de lhe
proporcionar uma satisfação, em virtude da aptidão
do dinheiro para propiciar a realização de uma
ampla gama de interesses, na qual se podem incluir
mesmo esses interesses de ordem refinadamente
ideal[65] [66].
O montante da indemnização será fixado
equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em
qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo
494º (primeira parte do nº3 do artigo 496º do Código
Civil).
Almeida e Costa entende «que os danos não
patrimoniais, embora insusceptíveis de uma
verdadeira e própria reparação ou indemnização,
porque inavaliáveis pecuniariamente, podem ser, em
todo o caso, de algum modo compensados. E mais
vale proporcionar à vítima essa satisfação do que
deixá-la sem qualquer amparo»[67] [68] [69] [70].
Em conformidade com princípios de razoabilidade e
justiça do caso concreto[71], o bom senso determina
que os danos morais sofridos pela Autora sejam
dignos de protecção legal.
Conforme faz notar Pessoa Jorge[72], «na generosa
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formulação do artigo 496º do Código Civil, que


confia ao legislador a tarefa de determinar o que é
equitativo e justo em cada caso, no que
fundamentalmente releva, não o rigor algébrico de
quem faz a adição de custas, despesas, ou de ganhos
(como acontece no cálculo da maior parte dos danos
de natureza patrimonial), mas, antes, o desiderato
de, prudentemente, dar alguma correspondência
compensatória ou satisfatória entre uma maior ou
menor quantia de dinheiro a arbitrar ao lesado e a
importância dos valores de natureza não patrimonial
em que ele se viu afectado».
*
Extractados os factos, enunciados os fundamentos
de direito e feita a conciliação entre o regime legal e
os danos apurados, a sentença recorrida não merece
censura por ter condenado, parcimoniosamente, os
Réus recorrentes no pagamento de uma
indemnização no valor de €1.000 (mil euros), por
violação de direitos não patrimoniais da Autora.
*
V – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o
quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico
envolvente, decide-se julgar improcedente o recurso
interposto, confirmando-se a douta sentença
recorrida.
Custas a cargo dos apelantes ao abrigo do disposto
no artigo 527º do Código de Processo Civil.
Notifique.
*
(acto processado e revisto pelo signatário nos termos
e ao abrigo do disposto no artigo 138º, nº5, do
Código de Processo Civil).
*
Évora, 20/10/2016
José Manuel Galo Tomé de Carvalho

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Mário Branco Coelho


Isabel de Matos Peixoto Imaginário
__________________________________________________
[1] O pedido inicial foi corrigido e ampliado por requerimento presente a fls. 169-170 dos autos.
[2] Após despacho proferido pelo Tribunal da Relação de Évora (fls. 920-921) em que foram
convidados a apresentar conclusões concisas e que sintetizem o teor da sua motivação por forma
definir claramente as exactas questões que pretendem submeter a apreciação deste tribunal, sob
pena de não se conhecer do recurso. Em desrespeito claro às exigências expressas pelo artigo 639º
do Código de Processo Civil e sem cuidarem de corresponder ao convite formulado, os recorrentes
que havia apresentado 182 conclusões reduziram a sua proposição para 148 pontos. Ainda assim,
foi admitido o recurso.
[3] O texto encontrava-se em maiúsculas, assim como outros pontos das alegações apresentadas.
Para uniformizar o estilo gráfico do presente acórdão foi formatado. O mesmo sucedeu com as
partes sublinhadas.
[4] O recorrente deve terminar as suas alegações de recurso com conclusões sintéticas (onde
indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida), in Acórdão do
Supremo Tribunal de Justiça de 18/06/2013, in www.dgsi.pt.
[5] Considerou-se que os restantes artigos dos articulados continham matéria conclusiva ou de
direito, repetida ou irrelevante tendo em conta o objecto do processo.
[6] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil (Anotado), Vol. V, Coimbra Editora, Coimbra 1984,
pág. 140.
[7] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª Edição –
Revista e Actualizada, Coimbra Editora, Coimbra 1985, pág. 687.
[8] Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II,
Coimbra Editora, pág. 670.
[9] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/05/2007, in www.dgsi.pt.
[10] Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, Coimbra 1984, pág. 122.
[11] Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Coimbra Editora, Coimbra 2001,
pág. 670.
[12] Antunes Varela, Miguel Bezerra, Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição revista
e actualizada, Coimbra Editora, Coimbra 1985, pág. 686.
[13] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/02/2005, in www.dgsi.pt.
[14] No mesmo sentido, Acórdão da Relação de Lisboa de 09/07/2014, in www.dgsi.pt.
[15] No presente caso e na generalidade, os recorrentes apenas aludem ao início e termo de alguns
testemunhos mas ignoram a actual obrigação de mencionar com exactidão as passagens.
[16] Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 3ª edição, 2016, págs. 136-145.
[17] Obra e local citados.
[18] Acórdão de 14/07/2016, in www.dgsi.pt.

[19] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07/07/2016, in www.dgsi.pt


[20] José Manuel Tomé de Carvalho, Breves palavras sobre a fundamentação da matéria de facto
no âmbito da decisão final penal no ordenamento jurídico português, Julgar 21, Setembro-
Dezembro 2013, pág. 85-86.

[21] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29/06/2010, in www.dgsi.pt.


[22] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/09/2010, in www.dgsi.pt com a seguinte
conclusão «a fundamentação da sua convicção quanto aos factos, sujeita à regra da livre
apreciação, o julgador deve limitar-se a indicar os elementos que permitam convencer da bondade
da sua razão de ciência, não tendo de exaurir, e deixar expostos, todos os eventos processuais não
anómalos, nem tecer considerações sobre a “impressão” que lhe causou o depoimento de uma
testemunha contraditada».
[23] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11/07/2006, in www.dgsi.pt.
[24] José Manuel Tomé de Carvalho, Breves palavras sobre a fundamentação da matéria de facto
no âmbito da decisão final penal no ordenamento jurídico português, Julgar 21, Setembro-
Dezembro 2013, pág. 84.
[25] José Manuel Tomé de Carvalho, obra citada, pág. 83.
[26] José Manuel Tomé de Carvalho, obra citada, pág. 84.
[27] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. II, 7ª edição, Almedina, pág. 277.
[28] Pires de Lima e Antunes Varela, vol. II, 4ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora,
Coimbra 2011, pág. 237.
[29] Pires de Lima e Antunes Varela, vol. II, 4ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora,
Coimbra 2011, pág. 269.
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12/09/23, 23:38 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

[30] No mesmo sentido, Vaz Serra, in Boletim do Ministério da Justiça, nº91, pág. 83 a 102.
[31] Noções Elementares de Direito Civil, 7ª edição, Lisboa 1992, pág. 249.
[32] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01/07/2010, in www.dgsi.pt.
[33] Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 7ª edição, Coimbra Editora, Coimbra 1992, págs.
579-582.
[34] Pedro Romano Martinez, Da cessação do Contrato, 2ª edição, Almedina, Coimbra 2006, pág.
294.
[35] Não lhes basta provar que “a cláusula modal foi causa impulsiva da doação, isto é, que o
doador a não teria feito se soubesse que o inadimplemento teria lugar; é necessário que o direito de
resolução lhe seja conferido pelo contrato e, portanto, corresponda a uma vontade real susceptível
de desentranhar a sua eficácia em sede” como refere Mota Pinto, in Teoria Geral do Direito Civil,
3ª edição, pág. 583.
[36] Sobre a doação modal, O Direito, Ano 122º (1990), III/IV, pág. 703.
[37] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/02/1999, in CJ STJ VII-III-94-97, acórdão do
Supremo Tribunal de Justiça de 12/03/2013, in www.dgsi.pt, acórdão do Supremo Tribunal de
Justiça de 09/12/2014, in www.dgsi.pt, acórdão da Relação de Lisboa de 26/03/98, in CJ XXIII-II-
113, acórdão da Relação do Porto de 08/07/2010, in www.dgsi.pt, e Acórdãos da Relação de
Guimarães de 12/07/2011, 09/02/2012 e 04/03/2013, todos in www.dgsi.pt.
[38] Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, Tomo I, 2009, pág. 733.
[39] Luís Menezes Leitão, O Enriquecimento sem causa no Código Civil de 1966, Comemorações
dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da reforma de 1977, Das Obrigações, Vol. III, Coimbra
Editora, Coimbra 2007, pág. 37, afirma que «a evolução dogmática no enriquecimento sem causa
tem abandonado assim o modelo tradicional de referência vaga à cláusula geral da proibição do
enriquecimento injustificado, temperada com a invocação do princípio da subsidiariedade, para
assentar na construção de categorias típicas do instituto, que suscitam problemas jurídicos
próprios».
[40] Direito das Obrigações, vol. I, 5ª edição, pág. 401.
[41] Por todos ver: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/07/2015, in www.dgsi.pt.
[42] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15/12/1977, in BMJ 272-196.
[43] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27/10/1976, in CJ 1976-III-810.
[44] A Parte Geral do Código Civil Português, Teoria Geral do Direito Civil, Almedina, Coimbra
2000, pág. 556-557.
[45] Do Negócio Usurário, Almedina, Coimbra 1990, pág. 25.
[46] Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª edição, pág. 533-534.
[47] Pires de Lima e Antunes Varela, Vol. I, 4ª Edição revista e actualizada (com a colaboração de
Henrique Mesquita, Coimbra Editora, Coimbra 2010, pág. 261.
[48] Derecho Civil,- Parte General, trad. espanhola, 1978, pág. 621.
[49] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22/11/2012, in www.dgsi.pt.
[50] Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, por Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto,
Coimbra Editora, Coimbra 2012, pág. 559.
[51] Elsa Vaz Sequeira, Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora,
Lisboa 2014, pág. 694.
[52] Metodologia da ciência do Direito, 3ª edição (tradução José lamego), Fundação Calouste
Gulbenkian 1997, págs. 597-598.
[53] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 1984, pág. 659.
[54] A pretensão formulada (a tutela jurídica pretendida), a qual, convergindo com a causa de pedir,
representa o direito afirmado pela parte, afirmado como concreta realidade e não categoria
abstracta, isto é serão os factos constitutivos do direito invocado e não as normas jurídicas
pressupostas que individualizam (concretizam) o direito pretendido. Nesse sentido, a causa de pedir
são os factos alegados pelo autor como factos constitutivos e o objecto do processo mantém-se,
mesmo que a qualificação jurídica seja alterada (Remédio Marques, Acção Declarativa à Face do
Código Revisto, Coimbra Editora, Coimbra 2007, págs. 677-678).

[55] Pedro Barbas Homem, O Justo e o Injusto, AAFDL, Lisboa 2001, pág. 141.
[56] Direito das Obrigações, Vol. I, 5ª edição, Almedina, Coimbra 2006, pág. 56.
[57] Da Boa Fé no Direito Civil, 2 volumes, Almedina, Coimbra 1984.
[58] Obra e local citados, pág. 58.
[59] Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, Edição Arménio Amado, Coimbra 1978, pág.
101.
[60] Antunes Varela, "Das Obrigações em Geral", 4ª edição, vol. I, pág. 447.
[61] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/06/2006, in CJ STJ XIV-II-120.
[62] O dever de prestar e o dever de indemnizar, I, pág. 245
[63] O Problema da Causa Virtual na Responsabilidade Civil, pág. 250.
[64] Vaz Serra, BMJ 84-8.
[65] Mota Pinto, Teoria Geral, 3ª Ed., pág. 115.
www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/d2bc9eb76a4d3a8d80258059003b295b?OpenDocument 75/76
12/09/23, 23:38 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

[66] Sobre a vida, a morte e a sua indemnização veja-se o estudo de Leite Campos, no BMJ 365,
pág. 5 e seguintes.
[67] Almeida e Costa, Direito das Obrigações, 6ª Ed., pág. 502.
[68] Pessoa Jorge, Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil, pág. 374 e seguintes.
[69] Pinto Monteiro, Sobre a reparação de danos morais, in Revista Portuguesa do Dano Corporal,
ano 1, nº1, Coimbra, 1992, pág. 17 e seguintes.
[70] Vaz Serra, Reparação do dano não patrimonial, BMJ 83-69.
[71] Armando Braga, A Reparação do Dano Corporal na Responsabilidade Civil Extracontratual,
pág. 229.
[72] Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil, pág. 376.

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