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ESTADO DO RIO DE JANEIRO

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA
SEXTA CÂMARA CÍVEL

Apelação Cível n° 0009149-58.2009.8.19.0209


Apelante: PATRIMÓVEL CONSULTORIA IMOBILIÁRIA S/A
Apelado: LUIZ ALBERTO DO NASCIMENTO DINIZ

Relatora: DES. TERESA DE ANDRADE CASTRO NEVES

ACÓRDÃO

AGRAVO RETIDO. APELAÇÃO. AÇÃO DE COBRANÇA.


LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL. MULTA CONDOMINIAL.
DESPESA RELATIVA AO CONSUMO DE ENERGIA
ELÉTRICA. DEVER DO CONDÔMINO. RESSARCIMENTO
AO PROPRIETÁRIO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
1 – Agravo retido rechaçado. O Juiz é o destinatário das
provas, cabendo-lhe deferir as diligências imprescindíveis à
solução do feito, nos moldes do art. 130 do CPC; 2 - Cobrança
da multa infracional não se encontra expressamente
designada no instrumento de rescisão, que se refere
especificamente às cotas condominiais, sendo diversa a sua
natureza. Enquanto a primeira tem caráter propter rem, a
segunda ostenta natureza pessoal. Não obstante, determina o
art. 1.336, §2º do C.C, competir ao condômino o pagamento
da multa prevista em convenção condominial, como ocorreu
no caso concreto. Infrações que se configuraram pelo
estacionamento irregular, bem como em decorrência do
excesso de barulho e obra fora do horário permitido, em
desacordo à Convenção Condominial, quando da efetiva
ocupação do imóvel objeto do contrato de locação; 3 - Ainda
que a notificação não tenha sido recebida pelo representante
legal, mas por funcionário da ré, aplica-se a Teoria da
Aparência, considerando-se válida a notificação da pessoa
jurídica, visto que recebida em sua sede, sem qualquer
ressalva quanto à inexistência de poderes de representação.
Aplicação por analogia, a Súmula nº 118 desta E. Corte; 4 –

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Assinado por TERESA DE ANDRADE CASTRO NEVES:000014583


Data: 23/08/2012 14:37:11. Local: GAB. DES(A). TERESA DE ANDRADE CASTRO NEVES
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Eventual questionamento acerca de sua legitimidade,


insurgindo-se o Apelante em face das causas que justificaram
a sua fixação, deverá ser oposto ao próprio condomínio, parte
estranha na demanda. Autor que devidamente comprovou o
seu pagamento, em decorrência do contrato de locação não
residencial havido entre ambos, e que figura como parte
legítima para responder junto àquele condomínio por tais
despesas; 5 - Acertado o entendimento do juiz sentenciante
que determinou o pagamento de parte do valor pleiteado,
relativo à fatura de energia elétrica, vez que corresponde a
período em que o imóvel ainda encontrava-se ocupado pelo
Apelante; 6 - Pretensão do Autor fundamenta-se,
principalmente, nos princípios da confiança, bem como da
boa-fé objetiva, típicos das relações negociais, tendo em vista
que o Apelante deu azo às despesas quando da efetiva
utilização do imóvel, objeto de locação não residencial, pelo
que não poderá agora querer eximir-se de tais cobranças.
Vedação ao enriquecimento ilícito do Apelante, na forma do
art. 884 do C.C. Manutenção da r. sentença. Negado
provimento ao agravo retido e ao recurso de apelação.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível n.º 0009149-


58.2009.8.19.0209, em que figura como Apelante PATRIMÓVEL
CONSULTORIA IMOBILIÁRIA S/A e Apelado LUIZ ALBERTO DO
NASCIMENTO DINIZ.

ACORDAM, por unanimidade, os Desembargadores que compõem a


Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, EM
CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO E AO
RECURSO DE APELAÇÃO, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

RELATÓRIO

Trata-se de ação de cobrança proposta por LUIZ ALBERTO DO


NASCIMENTO DINIZ em face de PATRIMÓVEL CONSULTORIA IMOBILIÁRIA
S/A, fundada em rescisão de contrato de locação não residencial, perante a

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qual restou a Ré inadimplente, deixando de proceder com o pagamento das


cotas condominiais referentes a outubro de 2006 e abril de 2008, no valor de
R$5.117,10 (cinco mil cento e dezessete reais e dez centavos), com origem no
cometimento de infrações condominiais por seus funcionários, bem como dos
débitos relativos ao consumo de energia elétrica, referente ao mês de fevereiro
de 2009, no valor de R$ 228,39 (duzentos e vinte e oito reais e trinta e nove
centavos), e, ainda, dos valores referentes aos honorários advocatícios
contratuais, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

A sentença de fls. 191/193 julgou procedente em parte os pedidos, na


forma do art. 269, inciso I do CPC, condenando a Ré ao pagamento do valor de
R$ 5.117,10 (cinco mil cento e dezessete reais e dez centavos), a título de
reembolso de multas por infração da convenção condominial, bem como ao
pagamento proporcional relativo à fatura de energia elétrica do mês de
fevereiro de 2009, até a data da desocupação (09/02/2009), devendo ser
ambos os valores acrescidos de correção monetária e de juros de mora a partir
do desembolso. Condenada a Ré ao pagamento das custas processuais e dos
honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor da condenação.

Opostos embargos de declaração pela parte Ré, os quais foram


rejeitados às fls. 201.

Irresignada, a Ré apresentou recurso de apelação às fls. 202/209,


reiterando as razões do agravo retido, onde sustenta ser descabido o
deferimento de produção de prova documental superveniente pelo Autor, tendo
em vista que tais documentos - o comprovante de pagamento das multas e de
sua respectiva notificação – já se encontravam em seu poder quando da
propositura da demanda, não se enquadrando no art. 397 do CPC, violando os
princípios da ampla defesa e da isonomia. Quanto às razões de apelação,
alega, em síntese, que houve o cumprimento de todos os termos da rescisão
do contrato de locação, que se consubstanciam no pagamento da quantia
referente ao aluguel proporcional, das cotas condominiais em aberto, bem

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como do IPTU proporcional ao período. Assevera que as multas infracionais


que lhe são cobradas não correspondem à taxa condominial, sendo diversa a
sua natureza, e não encontrando previsão nos termos do distrato, tal como o
valor relativo à fatura de energia elétrica, que, inclusive, refere-se a período em
que o imóvel já encontrava-se desocupado pela ora Recorrente. Acrescenta
que não há comprovação nos autos da regular notificação em relação às
multas, não restando demonstrado o nexo causal entre estas e o cometimento
de infração pela Ré. Requer, por fim, o provimento do agravo retido e do
recurso de apelação, para que seja reformada a sentença, e, caso assim não
se entenda, visa seja tão somente excluída a multa referente ao ano de 2006.

Instada a se manifestar, a parte Apelada apresentou contrarrazões às


fls. 212/221.

É o relatório.

VOTO

O recurso interposto é tempestivo e guarda os demais requisitos de


admissibilidade, de forma a trazer o seu conhecimento.

Inicialmente, conheço do agravo retido interposto às fls. 226/230 dos


autos, tendo em vista o que dispõe o artigo 523, do Código de Processo Civil.

Sustenta o Agravante ser descabido o deferimento de produção de


prova documental superveniente pelo Autor, ora Agravado, tendo em vista que
referem-se a documentos - comprovante de pagamento das multas e sua
respectiva notificação – que já se encontravam em seu poder quando da
propositura da demanda, violando os princípios da ampla defesa e da
isonomia.

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Nesse particular, destaco que o juiz, no curso da lide, tem amplo poder
instrutório, sendo permitida uma atuação livre e independente na fase
probatória, sempre atrelada aos parâmetros legais. Nessa direção, deve o
magistrado deferir a produção de provas que julgue necessárias, mormente de
entender insuficientes as provas constantes nos autos para a solução da lide.

Outrossim, no caso concreto, não houve violação da ampla defesa. Ao


contrário, esta foi garantida através da juntada da prova complementar
documental nos autos do processo, sem que isto importasse, contudo, prejuízo
à parte contrária, a qual foi igualmente assegurado o seu exercício. Ratifico, o
Juiz é o destinatário das provas, cabendo-lhe deferir as diligências
imprescindíveis à solução do feito, nos moldes do art. 130 do CPC.

Ademais, acrescento tratar-se de prova documental de caráter


meramente complementar, uma vez que o Autor Agravado se desincumbiu de
seu ônus, trazendo aos autos elementos probatórios de fato constitutivo de seu
direito. Por tudo isto, deve ser rechaçado o agravo retido, passando-se à
análise do recurso de apelação.

Pois bem, trata-se de ação de cobrança fundada em rescisão de


contrato de locação não residencial celebrado entre as partes, nos termos da
qual restou pactuado o pagamento do aluguel proporcional, das cotas
condominiais em aberto, bem como do IPTU proporcional ao período.

A presente controvérsia reside, especificamente, quanto ao pagamento


de cota condominial, no valor total de R$ 5.117,10 (cinco mil cento e dezessete
reais e dez centavos), com origem no cometimento de infrações condominiais
por funcionários da Ré, ora Apelante, bem como nos débitos relativos ao
consumo de energia elétrica, referente ao mês de fevereiro de 2009, no valor
de R$ 228,39 (duzentos e vinte e oito reais e trinta e nove centavos).

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Argumenta o Apelante, em síntese, ter havido o cumprimento de todos


os termos do distrato celebrado entre as partes, sendo descabida a cobrança
em referência, vez que não se encontra devidamente abrangida pelo
instrumento em referência. Destaco os termos da rescisão de fls. 25/26:

“Fica ressalvado o direito do LOCADOR em receber o aluguel


proporcional no valor de R$ 9.072,24 (nove mil, setenta e
dois reais e vinte e quatro centavos), referente ao período de
16/01/2009 até a presente data.
(...)
No que se refere à quitação das cotas condominiais em
aberto, fica ressalvado que o LOCATÁRIO deverá quitar e
comprovar para o LOCADOR na data de 09/02/2009, sob
pena de permanecer vigendo a locação e continuarem devidos
os alugueis mensais.
(...)
Com referência ao IPTU do exercício de 2009 deverá ser pago
o valor de R$ 2.870,91 (dois mil oitocentos e setenta reais e
noventa e um centavos) referente ao mês de janeiro/2009 e
R$ 861,27 (oitocentos e sessenta e um reais e vinte e sete
centavos) proporcional ao mês de fevereiro/2009, totalizando
R$ 3.732,18 (três mil setecentos e trinta e dois reais e dezoito
centavos) (...).” (grifo acrescido)

Decerto, conforme as alegações do Apelante, a cobrança da multa


infracional não se encontra expressamente designada no instrumento de
rescisão, que se refere especificamente às cotas condominiais, sendo diversa a
sua natureza. Todavia, ainda assim, entendo que merece guarida a pretensão
do Autor Apelado.

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De fato, existe distinção entre a natureza da cota condominial


propriamente dita, que se destina à manutenção do Condomínio em si, e a
multa infracional, a qual, por sua vez, tem o caráter punitivo, por
descumprimento das normas previstas em convenção condominial ou
regimento interno. Enquanto a primeira tem caráter propter rem, a segunda
ostenta natureza pessoal.

Não obstante, determina o art. 1.336, §2º do C.C, competir ao


condômino o pagamento da multa prevista em convenção condominial, tal qual
como ocorreu no caso concreto. Destaco:

Art. 1.336. São deveres do condômino:


I - contribuir para as despesas do condomínio na
proporção das suas frações ideais, salvo disposição em
contrário na convenção; (Redação dada pela Lei nº 10.931,
de 2004)
II - não realizar obras que comprometam a segurança da
edificação;
III - não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e
esquadrias externas;
IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a
edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao
sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos
bons costumes.
§ 1o O condômino que não pagar a sua contribuição ficará
sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo
previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois
por cento sobre o débito.
§ 2o O condômino, que não cumprir qualquer dos
deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a
multa prevista no ato constitutivo ou na convenção,
não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de

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suas contribuições mensais, independentemente das


perdas e danos que se apurarem; não havendo
disposição expressa, caberá à assembléia geral, por
dois terços no mínimo dos condôminos restantes,
deliberar sobre a cobrança da multa. (grifo acrescido)

Verifica-se às fls. 27/30 que tais infrações ocorreram em razão do


estacionamento irregular, em violação ao Cap. XII, alínea “j” e alínea “i”, bem
como em decorrência do excesso de barulho e obra fora do horário permitido,
infringindo igualmente o item 3, alínea “c”, do Manual de Obras do Condomínio.

Extrai-se através dos elementos constantes nos autos que as multas em


destaque referem-se ao cometimento de infração condominial por funcionários
da Ré, as quais se deram quando da efetiva ocupação do imóvel objeto do
contrato de locação, em desacordo à Convenção Condominial de fls. 153/190.

Saliento, inclusive, que a alegação quanto a irregularidade de notificação


não se presta para a Apelante eximir-se de sua responsabilidade pelo
ressarcimento dos valores correspondentes a multa infracional, pois ainda que
a notificação não tenha sido recebida pelo representante legal, mas por
funcionário da ré, aplica-se a Teoria da Aparência, considerando-se válida a
notificação da pessoa jurídica, visto que recebida em sua sede, sem qualquer
ressalva quanto à inexistência de poderes de representação.

Quanto a este entendimento, deve ser aplicada, por analogia, a Súmula


nº 118 desta E. Corte:

“A citação postal comprovadamente entregue à pessoa física,


bem como assim na sede ou filial da pessoa jurídica, faz
presumir o conhecimento e validade do ato.”

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Não obstante, mesmo que inexistente a sua devida notificação, subsiste


a pretensão do Autor quanto ao ressarcimento destes valores, os quais
comprovou o pagamento às fls. 138/144, sob pena de ensejar o enriquecimento
ilícito do Apelante, na forma do art. 884 do C.C.

Assevero que eventual questionamento acerca de sua legitimidade,


insurgindo-se o Apelante em face das causas que justificaram a sua fixação,
deverá ser oposto ao próprio condomínio, parte estranha na demanda, não
sendo aqui a sua mera irresignação argumento hábil a afastar a obrigação de
ressarcimento ao Autor, que devidamente comprovou o seu pagamento, em
decorrência do contrato de locação não residencial havido entre ambos, e que
figura como parte legítima para responder junto àquele condomínio por tais
despesas.

No mesmo passo, entendo acertado o entendimento do juiz sentenciante


que determinou o pagamento de parte do valor pleiteado, relativo à fatura de
energia elétrica, vez que corresponde a período em que o imóvel ainda
encontrava-se ocupado pelo Apelante.

Conforme a fatura de fls. 31/32, a medição anterior se deu em


17/01/2009, pelo que deve o Apelante ser responsabilizado pelo consumo
havido até 09/02/2009, quando de fato houve o distrato e o recebimento das
chaves pelo Autor, ora Recorrido.

Por fim, destaco que a pretensão do Autor fundamenta-se,


principalmente, nos princípios da confiança, bem como da boa-fé objetiva,
típicos das relações negociais, tendo em vista que o Apelante deu azo às
despesas quando da efetiva utilização do imóvel, objeto de locação não
residencial, pelo que não poderá agora querer eximir-se de tais cobranças.

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Por esses fundamentos, conheço dos recursos para NEGAR


PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO E À APELAÇÃO, mantendo
integralmente a r. sentença.

Rio de Janeiro, 22 de agosto de 2012.

TERESA DE ANDRADE CASTRO NEVES


Desembargadora Relatora

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