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Poder Judiciário da União

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS


TERRITÓRIOS

Órgão 6ª Turma Cível

Processo N. APELAÇÃO CÍVEL 0715420-79.2021.8.07.0007

APELANTE(S) MARTINHA BATISTA DA SILVA

APELADO(S) CONDOMINIO EDIFICIO SAINTETIENNE-II


Relator Desembargador LEONARDO ROSCOE BESSA

Acórdão Nº 1647091

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. COBRANÇA DE DESPESAS


CONDOMINIAIS. PROPRIETÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA. TEORIA DA ASSERÇÃO.
CHAMAMENTO AO PROCESSO. OCUPANTE IRREGULAR. RESPONSABILIDADE
SOLIDÁRIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. COMPRA. DEMORA NA IMISSÃO NA
POSSE DO IMÓVEL. RESPONSABILIDADE DA PROPRIETÁRIA PELO PAGAMENTO DAS
TAXAS CONDOMINIAIS. POSSIBILIDADE DE DIREITO DE REGRESSO. SENTENÇA
MANTIDA.

1. A legitimidade é a pertinência subjetiva de uma parte para integrar a relação processual. Segundo a
teoria da asserção, a legitimidade ad causam é aferida conforme as afirmações feitas na petição
inicial.Conforme os fatos narrados pelo autor e o registro do imóvel, a apelante é a proprietária.
Portanto, é parte legítima para figurar no polo passivo. Preliminar de ilegitimidade passiva rejeitada.

2. O chamamento ao processo é modalidade de intervenção de terceiros prevista no art. 130 do Código


de Processo Civil – CPC. Nos termos do § 1º, III, é admissível o chamamento, requerido pelo réu, dos
demais devedores solidários, quando o credor exigir de um ou de alguns o pagamento da dívida
comum. Dispõe o art. 265 do Código Civil - CC que a solidariedade não se presume: resulta da lei ou
da vontade das partes.

3. O CC prevê que é dever do condômino contribuir para as despesas do condomínio na proporção das
suas frações ideais (art. 1.336, I). O condômino responsável pelo pagamento é o proprietário. Não há
no ordenamento jurídico previsão de responsabilidade solidária do ocupante irregular. Logo, não há
enquadramento às hipóteses de chamamento do processo. Preliminar de nulidade da sentença rejeitada.

4. As despesas condominiais são obrigações propter rem – obrigações reais – que aderem à coisa e
obrigam quem quer que seja seu titular. Eventual alteração subjetiva do direito real sobre o bem impõe
ao novo dono a responsabilidade imediata e automática pelas dívidas condominiais, inclusive sobre
aquelas vencidas antes da aquisição do direito. Dispõe o art. 1.345 do CC que o adquirente de unidade
responde pelos débitos do alienante em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios.
5. Na hipótese, a apelante comprou o imóvel, conforme averbado ao registro. Portanto, é responsável
pelas despesas condominiais, ainda que anteriores à compra. Todavia, para evitar o enriquecimento
ilícito, é possível que exerça direito de regresso contra terceiros (vendedor ou ocupante) pelos débitos
gerados no período em que não exerceu a posse em razão da demora na imissão.

6. Recurso conhecido e não provido. Honorários majorados.

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Desembargadores do(a) 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito


Federal e dos Territórios, LEONARDO ROSCOE BESSA - Relator, SONÍRIA ROCHA CAMPOS
D'ASSUNÇÃO - 1º Vogal e ESDRAS NEVES - 2º Vogal, sob a Presidência do Senhor
Desembargador ALFEU MACHADO, em proferir a seguinte decisão: CONHECIDO. DESPROVIDO.
UNÂNIME., de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 07 de Dezembro de 2022

Desembargador LEONARDO ROSCOE BESSA


Relator

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por MARTINHA BATISTA DA SILVA contra sentença da 4ª
Vara Cível de Taguatinga proferida nos autos da ação de conhecimento ajuizada por CONDOMÍNIO
EDIFÍCIO SAINT ETIENNE-II contra a apelante.

O juízo julgou procedente o pedido de condenação da apelante ao pagamento de dívidas condominiais


referentes ao período de julho de 2020 a agosto de 2021, além das despesas inadimplidas no curso do
processo. Condenou também a arcar com o ônus da sucumbência e fixou honorários advocatícios em
10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.

Em suas razões (ID 40709787), alega que: 1) comprou o imóvel da Caixa Econômica Federal em
setembro de 2020; 2) no período relativo à cobrança, o bem era ocupado irregularmente por terceiro; 3)
sua imissão na posse do imóvel ocorreu em 31/5/2022; 4) os débitos anteriores a essa data devem ser
cobrados do ocupante irregular ou da Caixa Econômica; 5) o ocupante do imóvel deve ser chamado a
integrar a lide, por ser devedor solidário; 6) é parte ilegítima para figurar no polo passivo.

Requer, ao final, o provimento do recurso para que seja declarada a nulidade da sentença e seja
chamado ao processo o ocupante irregular. Ainda, o reconhecimento de sua ilegitimidade passiva. No
mérito, sejam julgados improcedentes os pedidos do autor e seja invertido o ônus da sucumbência.

Preparo recolhido (ID 40709789).


Contrarrazões apresentadas (ID 40709795).

É o relatório.

VOTOS

O Senhor Desembargador LEONARDO ROSCOE BESSA - Relator

1. CONHECIMENTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

2. PRELIMINARES

2.1 LEGITIMIDADE PASSIVA

A apelante sustenta ser parte ilegítima para figurar no polo passivo.

A legitimidade é a pertinência subjetiva de uma parte para integrar a relação processual. Segundo a
teoria da asserção, a legitimidade ad causam é aferida conforme as afirmações feitas na petição
inicial.

Os fatos narrados pelo autor indicam que a apelante é proprietária do apartamento que gerou a dívida.
No registro do imóvel, consta que a apelante o comprou da Caixa Econômica Federal (ID 40709299).
Portanto, à luz da narrativa da petição inicial, a apelante – por ser proprietária – é parte legítima para
figurar no polo passivo.

Consigne-se, ilustrativamente, julgado deste Tribunal de Justiça sobre o assunto:

“APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE


REJEITADA. TAXAS CONDOMINIAIS. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. PENDENTE. DÉBITOS
ANTERIORES. INEXISTÊNCIA DE PROVA DE IMISSÃO NA POSSE DO ADQUIRENTE.
RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL. OBSERVÂNCIA DO ART. 1.345 DO
CÓDIGO CIVIL. 1. Preliminar de ilegitimidade passiva. No que concerne a alegação de
ilegitimidade passiva, sabe-se que, consoante a teoria da asserção, esta deve ser analisada de
acordo com a narrativa fática contida na petição inicial. A legitimidade não deve ser caracterizada
com base no direito material discutido em juízo, mas nos elementos da lide, de forma que a
legitimidade ativa cabe ao titular do interesse sustentado na pretensão, assim como a legitimidade
passiva, àqueles que resistem ou se opõem à pretensão. Preliminar rejeitada. 2. A parte
embargante/apelante é proprietária do imóvel de matrícula 302547, situado em Condomínio e,
por isso, deve responder pelo rateio das despesas condominiais. Isso é o suficiente para aferir
sua legitimidade para figurar na relação processual. (...) (Acórdão 1386870,
07020148220218070009, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 5ª Turma Cível, data de julgamento:
24/11/2021, publicado no DJE: 30/11/2021.)” – grifou-se

Rejeito a preliminar.
2.2 CHAMAMENTO AO PROCESSO

O chamamento ao processo é modalidade de intervenção de terceiros prevista no art. 130 do Código


de Processo Civil – CPC.

Nos termos do § 1º, III, é admissível o chamamento, requerido pelo réu, dos demais devedores
solidários, quando o credor exigir de um ou de alguns o pagamento da dívida comum. Além disso,
podem ser chamados o afiançado, na ação em que o fiador for réu (I) e os demais fiadores, na ação
proposta contra um ou alguns deles (II).

De acordo com o art. 264 do Código Civil – CC, há solidariedade quando na mesma obrigação
concorre mais de um devedor, cada um obrigado à dívida toda. Dispõe o art. 265 do CC que a
solidariedade não se presume: resulta da lei ou da vontade das partes.

O CC prevê que é dever do condômino contribuir para as despesas do condomínio na proporção das
suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção (art. 1.336, I). O condômino
responsável pelas despesas é o proprietário. Há hipóteses em que o ordenamento jurídico prevê,
expressamente, a responsabilidade solidária de terceiros pelo pagamento de tais despesas, a exemplo
do locatário (art. 22, X, da Lei nº 8.245/91).

A apelante afirma que, quando comprou o imóvel da Caixa Econômica, em outubro de 2020, o
ocupante nele já residia. Não há no ordenamento jurídico previsão de responsabilidade solidária de
ocupante irregular. Por isso, não há enquadramento às hipóteses de chamamento do processo.

Rejeito, também, a preliminar.

3. MÉRITO

Cinge-se a controvérsia em definir se a apelante é responsável pelo pagamento da dívida cobrada.

As despesas condominiais são obrigações propter rem – obrigações reais – que aderem à coisa e
obrigam quem quer que seja seu titular. Eventual alteração subjetiva do direito real sobre o bem impõe
ao novo dono a responsabilidade imediata e automática pelas dívidas condominiais, inclusive sobre
aquelas vencidas antes da aquisição do direito.

Dispõe o art. 1.345 do CC que: “o adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante em
relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios”. Logo, o proprietário é o responsável pelo
pagamento, ainda que não exerça a posse direta do bem.

Registre-se julgado do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema:

“PROCESSUAL CIVIL. ENCARGOS CONDOMINIAIS. OBRIGAÇÃO PROPTER REM.


RESPONSABILIDADE DO ATUAL PROPRIETÁRIO. RELAÇÃO JURÍDICA MATERIAL COM
O IMÓVEL. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. NÃO VERIFICADA. ANÁLISE DA
DIVERGÊNCIA PREJUDICADA. DESPROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. (... ) III - No que trata da alegação de violação do
art. 12, § 2°, da Lei n. 4.591/1964, sem razão o ente federado recorrente, encontrando-se o aresto
vergastado em sintonia com o entendimento firmado nesta Corte Superior, ‘de que, em razão da
natureza propter rem dos encargos condominiais, a obrigação de seu pagamento alcança os
novos titulares do imóvel, sem prejuízo, evidentemente, de eventual ação regressiva’ (AgInt no
AREsp n. 1.015.212/RJ, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe de 2/8/2018). IV -
Desse modo, em se tratando de obrigação propter rem, o pagamento de taxas condominiais deve
ser exigido daquele que consta na matrícula do imóvel como seu proprietário, ainda que não
esteja imitido na posse da propriedade. Nesse sentido: AgInt no AREsp n. 1.347.829/SP, relator
Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 10/12/2019, DJe 19/12/2019; AgRg no REsp n.
1.370.434/RJ, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 6/11/2014, DJe
14/11/2014 e AgInt no AREsp n. 856.485/RJ, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado
em 7/12/2020, DJe 1º/2/2021. (...) VI - Agravo interno improvido. (AgInt no AREsp n. 1.868.464/MS,
relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 3/10/2022, DJe de 5/10/2022.)” –
grifou-se

Na hipótese, a apelante comprou o imóvel, conforme averbado ao registro (ID 40709299). Portanto, é
responsável pelas despesas condominiais, ainda que anteriores à compra. Todavia, para evitar o
enriquecimento ilícito, é possível o exercício do direito de regresso contra terceiros (vendedor ou
ocupante, conforme o caso) pelos débitos gerados no período em que não exerceu a posse.

Consignem-se, ilustrativamente, julgados deste Tribunal de Justiça no mesmo sentido:

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REGRESSO. PRELIMINAR DE INOVAÇÃO RECURSAL.


ACOLHIDA. IMÓVEL ADQUIRIDO EM LEILÃO. DESPESAS CONDOMINIAIS.
RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO ORIGINAL. PERMANÊNCIA IRREGULAR NO
IMÓVEL. INÉRCIA DO ARREMATANTE. AUSÊNCIA DE PROVAS. DIREITO DE REGRESSO.
LEGÍTIMO. SENTENÇA MANTIDA. (...) 3. Não se desconhece o entendimento de que, em face da
natureza propter rem da obrigação de pagar as cotas de condomínio, o adquirente de imóvel em
hasta pública responde pelo débito condominial incidente sobre o bem arrematado, ainda que
anterior à arrematação; todavia, é assegurado ao arrematante o direito de regresso em face do
ex-proprietário. 4. O proprietário originário que permanece irregularmente na posse do imóvel após a
arrematação do bem em leilão é responsável pelo pagamento das despesas condominiais até a efetiva
desocupação (art. 27, § 8º, da Lei 9.514/1997). (...) 7. Legítimo o direito de regresso do autor/apelado
na cobrança das taxas condominiais do réu/apelante, razão por que deve ser mantida inalterada a r.
sentença. 8. Preliminar de inovação recursal acolhida. Recurso conhecido em parte e improvido.
(Acórdão 1416536, 07077015920208070014, Relator: GISLENE PINHEIRO, 7ª Turma Cível, data de
julgamento: 20/4/2022, publicado no DJE: 3/5/2022.)” – grifou-se

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESPESAS CONDOMINIAIS.


LEGITIMIDADE PASSIVA DO ADQUIRENTE. INADIMPLEMENTO. OBRIGAÇÃO PROPTER
REM. RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO. 1. O proprietário do imóvel é parte legítima
para a ação que tem por objeto o pagamento das taxas condominiais respectivas. 2. O
adquirente da unidade imobiliária, por se qualificar como proprietário, assume
instantaneamente a condição de devedor das taxas condominiais vencidas e vincendas, sem
prejuízo do exercício de eventual direito de regresso em face do alienante. 3. Recurso conhecido e
desprovido. (Acórdão 1086461, 07099469020178070000, Relator: SILVA LEMOS, 5ª Turma Cível,
data de julgamento: 4/4/2018, publicado no DJE: 16/4/2018.)” – grifou-se

Pelas razões expostas, a sentença deve ser mantida.

4. DISPOSITIVO

CONHEÇO do recurso e NEGO-LHE provimento.

Nos termos do art. 85, § 11, do CPC, majoro os honorários de sucumbência para 12% sobre o valor da
condenação.

É como voto.

A Senhora Desembargadora SONÍRIA ROCHA CAMPOS D'ASSUNÇÃO - 1º Vogal


Com o relator
O Senhor Desembargador ESDRAS NEVES - 2º Vogal
Com o relator

DECISÃO

CONHECIDO. DESPROVIDO. UNÂNIME.

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