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Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

Processo: 1406/16.9T8ACB-A.C1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: ROSA RIBEIRO COELHO
Descritores: LIVRANÇA
OBRIGAÇÃO CAMBIÁRIA
PRESCRIÇÃO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
REQUERIMENTO EXECUTIVO
PROPOSITURA DA ACÇÃO
PROPOSITURA DA AÇÃO
AGENTE DE EXECUÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
REQUISITOS
PACTO DE PREENCHIMENTO
AVALISTA
LIVRANÇA EM BRANCO
Data do Acordão: 11-07-2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCILAMENTE A REVISTA E BAIXA DOS AUTOS À RELAÇÃO
Área Temática:
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / TEMPO E REPERCUSSÃO NAS
RELAÇÕES JURÍDICAS / PRESCRIÇÃO / INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE EXECUÇÃO / EXECUÇÃO PARA
PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA / PROCESSO ORDINÁRIO / FASE
INTRODUTÓRIA.
Doutrina:
- Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, Letra de Câmbio, Volume III, 1966, p. 124;
- Lebre de Freitas, A Ação Executiva à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 6.ª edição, p.
98.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 323.º, N.º 1.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 724.º, N.º 6.
LEI UNIFORME SOBRE LETRAS E LIVRANÇAS (LULL): - ARTIGOS 17.º E 71.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

- DE 19-06-2018, PROCESSO N.º 23817/14.OTBVNG-A.P1.S1;


- DE 03-07-2018, PROCESSO N.º 1965/13.8TBCLD-A.C1.S1;
- DE 24-01-2019, PROCESSO N.º 524/13.0TBTND-A.C1.S1, IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I – A Lei Uniforme sobre Letras e Livranças (LULL), cujo art. 71º
pressupõe a possibilidade de a interrupção da prescrição atuar, abstém-
se de definir o seu regime.
II – Cabe aos Estados subscritores da Convenção Estabelecendo uma
Lei Uniforme em Matéria de Letras e Livranças, assinada em Genebra
em 7.6.1930, regulamentar no seu direito interno esta matéria, como
resulta do primeiro parágrafo do art. 17º do Anexo II à LULL.
III – Nos termos do nº 1 do art. 323º do CC, a interrupção da prescrição
dá-se com a citação ou notificação judicial de qualquer ato que
exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito; mas,
visto o seu nº 2, a prescrição tem-se como interrompida logo que
decorram cinco dias se aquelas diligências não tiverem ainda sido
feitas, por causa não imputável ao requerente, uma vez decorrido esse
prazo depois do respetivo requerimento.
IV – Para este efeito conta a data em que o requerimento executivo foi
apresentado em tribunal, e não a data do pagamento da quantia devida
ao agente de execução, nos termos do nº 6 do art. 724º do CPC.
V – Os requisitos de certeza, exigibilidade e liquidez que a obrigação
exequenda deve apresentar são avaliados em face do título; se a análise
do título não evidenciar a sua verificação, terá o exequente de requerer
as diligências necessárias para os alcançar.
VI – Há livrança se a subscritora a entrega ao respetivo promissário
com autorização para a preencher através de convénio escrito ou verbal
que ambas tenham firmado, ficando, nesse caso, os avalistas vinculados
a esse acordo de preenchimento.
VII – Não existindo este acordo de preenchimento, há uma livrança
incompleta, e não uma livrança em branco.

VIII – No caso referido em VII não é sequer convocável o disposto no


art. 17º da LULL, cuja aplicação pressupõe a existência de um título de
crédito válido.
Decisão Texto Integral: ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
2ª SECÇÃO CÍVEL

    I - Em execução para pagamento de quantia que a Caixa AA, S.A.,


move a BB, CC e DD para haver deles o pagamento de € 190.000,00 –
valor inscrito em livrança subscrita por EE, Lda. e avalizada pelos
executados -, acrescidos de juros vencidos no valor de € 23.517,10 e
dos vincendos à taxa de 4%, vieram os executados opor-se, em
embargos de executados, pedindo a sua absolvição do pedido.
        
Alegaram, em síntese nossa, que:
- os valores aqui reclamados são diferentes dos que a aqui exequente
reclamou no processo de insolvência movido contra a subscritora, pelo
que os embargantes não têm para com a exequente a dívida aqui
versada;
- não foram interpelados;
- em 2012 a exequente e a subscritora acordaram um empréstimo que
deu lugar a uma livrança posteriormente objeto de reformas, que
novaram a obrigação inicial;
- a presente execução foi instaurada mais de três anos após a data
inscrita na livrança dada à execução como sendo a do seu vencimento –
2.6.2013.
      Na contestação a exequente defendeu a improcedência dos
embargos.
      Foi proferido saneador-sentença que, considerando prescrita a
obrigação dos executados, julgou procedente a oposição e declarou
extinta a execução.
       A exequente apelou contra esta decisão, tendo a Relação de
Coimbra proferido acórdão que, na procedência do recurso, revogou o
despacho saneador, julgando improcedente a oposição à execução e
determinando o prosseguimento da execução.
       Os embargantes interpuseram o presente recurso de revista contra
este aresto, tendo apresentado alegações onde formulam as conclusões
que passamos a transcrever:
1 – Vem o presente recurso interposto do douto Acórdão da 3 .a Secção
Cível do Tribunal da Relação de Coimbra que decidiu julgar procedente
o recurso interposto pela Exequente Caixa AA, S.A. e, em
consequência, revogar "...o despacho saneador recorrido com valor de
sentença, sendo o mesmo substituído por despacho com valor idêntico
que julga totalmente improcedente a oposição deduzida pelos
Executados, determinando- se o prosseguimento da execução. ";
2 - A sentença proferida pelo Tribunal a quo decidiu pela procedência
da exceção perentória extintiva da prescrição porquanto considerou,
sumariamente, que: "(...) Todavia, e aqui se encontra a nota distintiva
face à posição assumida pela exequente na contestação, importa
considerar que a apresentação do r. e., nos termos expressos do actual
CPC, apenas se considera ter ocorrido na data dos pagamentos
referidos no art. 724. °, n. ° 6, do CPC, e não na data da mera
expedição electrónica do r.e., ou seja, a execução não se considera
instaurada em 25/05/2016 (data do r.e.) mas apenas, segundo resulta
objectivamente do sistema Citius, em 01/06/2016, data em que consta a
menção electrónica da comprovação do "pagamento fase 1" e o
processo surgiu electronicamente - arts. 2.°, n.°s 5 e 7, e 47.°. n.° 1,
alínea a), da Portaria n.°282/2013, de 29/08.
Trata-se de uma excepção à regra do art. 259. °, n. ° 1, do CPC, e
conforme referem Paulo Ramos Faria/Ana Luísa Loureiro, Primeiras
Notas ao Novo Código de Processo Civil, Vol. 77, Almedina, 2014, pág.
238, "importa ter presente que, como se retira do confronto com as
restantes disposições do Código, em especial da vertida no número
seguinte, a norma comentada dispõe sobre um ónus — também previsto
no art. 721.°, n.°s 2 e 3 — que afeta os direitos subjectivos
(substantivos ou adjetivos) exercidos pelo credor".
Portanto, não se considerando apresentado o r.e. até que ocorram os
ditos pagamentos, ou seja, não se iniciando a instância, sem que o
legislador ressalve qualquer outro efeito decorrente na mera submissão
do formulário electrónico do requerimento executivo no sistema
informático, afigura-se, com o devido respeito, que tal regime tem
inevitáveis consequências quanto à não interrupção da prescrição nos
termos do art. 323. °, n. ° 2, do CC — assim, Virgínio da Costa Ribeiro
e Sérgio Rebelo, A acção executiva anotada e comentada, 2." Ed.,
Almedina, 2016, páz.210.(...)
Assim, no caso concreto, o prazo de três anos a contar desde a data de
vencimento da livrança terminou a 02/06/2016 {às 24 horas deste dia)
- art. 279. °, alínea c), do CC (cfr„ quanto aos prazos, embora numa
questão concreta diversa, o AUJ do STJ de 18/04/2012, disponível em
www.dgsi.pt), o que significa que quando decorreram os cincos dias
contados desde a data em que o requerimento executivo se considera
efectivamente apresentado e constituída a instância executiva - ou seja,
desde 01/06/2016 - nenhum prazo de prescrição se encontrava em
curso que pudesse ser interrompido, tendo já decorrido na sua
integralidade o aludido prazo de três anos desde a data do vencimento.
Consequentemente, entende-se que a obrigação cambiária dos ora
executados/opoentes (avalistas) está prescrita. (...) ".
3 - Inconformada a Recorrida interpôs recurso de apelação para o
Venerando Tribunal da Relação de Coimbra alegando que o
requerimento executivo foi enviado via CITIUS no dia 25.05.2016 com
a referência 22764297, e no local destinado ao "Pagamento dos
honorários da Fase 1 ao Agente de Execução, constam os seguintes
dizeres: Agente de Execução: FF Cédula: 2…, Entidade: 2…7,
Referencia: 60…0, Montante Fase 1: 156,83 €, Data limite de
pagamento: 04-06-2016. Alega ter requerido a citação urgente e que
não obstante constar do sistema CITIUS que o pagamento da fase 1
ocorreu em 01.06.2016, a verdade e que o pagamento foi efectuado em
27.05.2016, pelo que, nos termos da citada norma o requerimento
executivo terá de se considerar apresentado em 27.05.20 16. A livrança
tem como data de vencimento 02.06.2013, pelo que o prazo de 3 anos
terminaria (terminou) em 02.06.2016 e que considerando-se
interrompida a prescrição em 01.06.2016, improcede a invocada
exceção;
4 - O Tribunal da Relação de Coimbra proferiu Acórdão a revogar a
decisão de l.a instância, tendo considerado que inexistia prescrição,
conforme resulta do facto que aditou aos factos provados, pese embora
a data da comprovação efectuada no Citius seja a mencionada na
decisão recorrida, o pagamento efectuado pela Exequente ocorreu em
25.5.2006, conforme comprovado pelos documentos juntos aos autos;
5 - Mais apreciou o Venerando Tribunal os restantes fundamentos da
oposição deduzida pelos embargantes, ora Recorrentes nos termos do
disposto no artigo 665°, n.° 2 do CPC, tendo julgado improcedentes
todos os fundamentos da oposição deduzida pelos Executados,
decretando a mesma a improcedente, prosseguindo a instância
executiva;
6 - Os Recorrentes não se conformando agora com a solução dada pelo
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra vêm dela interpor o
presente recurso, especificamente no que respeita: i) à questão da
existência da prescrição do título cambiário, tal como o Tribunal a quo
tinha doutamente decidido de modo afirmativo; ii) a certeza, liquidez e
exigibilidade da obrigação exequenda; iii) do preenchimento abusivo
do titulo cambiário - a livrança e, iv) da falta de interpelação dos
Recorrentes para um eventual pagamento da divida, executada nos
presentes autos;
7 - Entendem os Recorrentes que atenta a decisão ora recorrida o
Venerando Tribunal da Relação de Coimbra violou a lei substantiva, ao
interpretar erradamente a matéria de facto e a matéria de direito a ela
aplicável, violou e errou na aplicação da lei de processo, bem como,
não especificou, no humilde entendimento dos Recorrentes os
fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, tendo, em
consequências, violado o disposto na alínea a), b) e c) do n.° 1 do artigo
674.° e a alínea b) do n.° 1 do artigo 615.°, todos do CPC;
8 - No que respeita à prescrição do título cambiário o requerimento
executivo dos autos foi remetido no dia 25.05.2016 via citius, mas
apenas se considera apresentado na sequência do pagamento dos
honorários de fase 1 ao Agente de Execução, conforme disposto no n.°
6 do artigo 724.° do CPC, os quais foram pagos em 01.06.2016, pelo
que, consequentemente, sendo a data de vencimento aposta na livrança
o dia 02.06.2013, a prescrição da mesma ocorreria no dia 02.06.2016, o
que significa que quando decorreram os cinco dias contados desde a
data em que o requerimento executivo se considera efetivamente
apresentado e constituída a instância - 01.06.2016 -, já nenhum prazo
de prescrição se encontrava a decorrer que pudesse ser interrompido,
tendo já decorrido na integralidade o prazo dos três anos desde a data
de vencimento da livrança, estando, em consequência, a mesma
prescrita;
9 - Os elementos que a Recorrida alegou constarem do Doc. 1 junto às
alegações, que constitui o requerimento executivo, no alegado campo
destinado ao "Pagamento dos honorários da Fase 1 ao Agente de
Execução, inexiste, apenas se encontrando junto como Doc. 2 às
alegações um documento que constitui um comprovativo de operação
de pagamento da Caixa AA e-banking;
10 - Não se pode fazer corresponder o documento 2 junto às alegações
da Recorrente para a Relação de Coimbra como sendo, sem margem de
qualquer dúvida alguma, o pagamento que foi efetuado ao Agente de
Execução dos autos dos seus honorários de fase 1, porquanto da sua
análise em nada é referenciado o presente processo, não se podendo
olvidar que, sendo a Recorrente uma litigante em massa, decerto
diariamente, vários são os requerimentos executivos que faz dar entrada
em Tribunal, pelo que, não se pode subsumir que o documento 2 das
suas alegações é o pagamento feito ao Agente de Execução no presente
processo. Poderá até respeitar tal comprovativo a outro processo
qualquer que não o presente;
11 - A data de autuação do processo no sistema informativo citius é de
01.06.2016, e logo imediatamente após a sua entrada em Tribunal
foram os mandatários das partes, em especial da Exequente, notificados
do despacho com a certificação citius de 04-06-2016 (N/Referência:
82003684), que decidiu "(...) Ora, sendo hoje dia 03/06/2016,
considera-se que a requerida citação urgente, no contexto invocado
(cujo mérito não cabe apreciar nesta sede), mostra-se assim
injustificada, pois a referida data já foi ultrapassada (em rigor, um
prazo de três anos, contados desde a data do vencimento da livrança,
terminaria a 02/06/2016 - art. 279.°, alínea c), do CC - mas tal data
está igualmente ultrapassada e, portanto, torna-se agora indiferente
para a citação);
12 - Sendo que a mandatária da Exequente recebeu tal despacho pelo
sistema informático Citius, sendo a sua certificação de elaboração em
04-06-2016, e apesar de o ter recebido, nada fez, reclamando ou
recorrendo dele;
13 - A par disto a Exma. Senhora Doutora Juiz Desembargadora
Relatora do processo proferiu o Mui Douto despacho de fls. 110, no
sentido do Agente de Execução ser notificado para informar o processo
a que corresponde o documento junto a fls. 94, juntando também os
documentos comprovativos da data em que lhe foram pagos os
honorários devidos pela instauração da execução, tendo este a fls. 112
junto requerimento a referir que tal documento corresponde ao
montante devido pela instauração da presente execução, porém,
estranhamente não junta nenhum documento comprovativo dessa
conciliação, o que deveria ter feito, atento o facto de mais uma vez se
diga, a Recorrente ser litigante em massa e dezenas de processos darem
entrada no Tribunal diariamente. De seguida o Agente de Execução
anexa faturas a fls.l13 a 115 que se encontram com as datas de
01.06.2016, todas elas, data correspondente à data de autuação do
citius;
14 - O mês de Maio tem 31 dias, então se seguíssemos a
posição/raciocínio da Recorrente e a mera informação não vinculativa
do Agente de Execução (aliás nomeado pela Exequente por ser de seu
conhecimento), como é que pode um documento alegadamente pago
em 27.05.2016, ter dado azo à emissão de faturas em 01.06.2016, e
igualmente à data de autuação do processo no citius em 01.06.2016,
quando é de conhecimento público que quando um mandatário envia
uma peça processual pelo sistema informático citius e cria um novo
processo, no dia imediatamente seguinte o mesmo está criado e aparece
no sistema citius, ou seja, quer-se com isto dizer que, a ser verdade que
a Recorrente tivesse pago ao Agente de Execução em 27.05.2016 (pelas
15:31:27), então imediatamente no dia seguinte, o processo teria sido
imediatamente autuado, o que não sucedeu, só tendo vindo a ocorrer
dias depois em 01.06.2016, data que corresponde, aliás, e a bem da
verdade, à data de emissão das Faturas/Recibo do Agente de Execução,
não resultando também destes documentos a dita referência de
pagamento, nem sequer a data do efetivo pagamento feito pela
Exequente;
15 - Os documentos juntos pelo Agente de execução não constituem
documento autênticos, o qual nos termos do disposto no n.° 2 do artigo
363.° do CC só pode ser exarado, "...com as formalidades legais, pelas
autoridades públicas nos limites da sua competência ou, dentro do
círculo de actividade que lhe é atribuído, pelo notário ou outro oficial
público provido de fé pública; todos os outos documentos são
particulares", pelo que, não tendo os documentos apresentados pelo
Agente de Execução sido autenticados - após a conformação das partes
-, perante notário, nos termos prescritos nas leis notariais, não podia o
Tribunal da Relação de Coimbra ter assumida sem qualquer margem de
dúvida que os mesmos estavam aceites pelos ora Recorrentes, o que
rejeitam, pelo que sempre deveriam os Exmos. Juízes Desembargadores
ter posto em crise a autenticidade de tais documentos, até por
contraponto à posição dos Recorrentes no seu requerimento de resposta
ao despacho da Exma. Juíza Desembargadora com a referência
7910093 de 06.03.2018, remetido pelos Recorrentes por correio em
14.03.2018. Ou seja, no sendo os documentos apresentados pelo Agente
de Execução documentos aceites pelos Recorrentes, nem sequer
emitidos por autoridade oficial para o efeito, deveriam ter sido
afastados, e sido mantida a sentença do Tribunal a quo;
16 - Poderia o Tribunal da Relação de Coimbra ter requerido ao
Recorrente - a AA - ou ao Agente de Execução um documento que, de
facto fosse emitido pela entidade que tinha as informações necessárias
e certas demonstrando que aquele alegado documento de pagamento
dos honorários de fase um (que nunca foi junto aos autos até ao
momento que que a Recorrente apresentou o seu recurso) tinha
efetivamente sido pago no dia 27.05.2016, como seja a SIBS ou o
Banco que promoveu a transação. Não tendo sucedido tal situação e
tendo os Recorrentes colocado em crise os documentos juntos pelo
Agente de Execução, que se diga que não se encontram assinados por
aquele, nem deles consta o selo branco do AE, deveriam ter sido
promovidas mais diligências probatórias, fosse pelo Tribunal da
Relação de Coimbra, ou mandasse este o processo baixar à 1.a instância
para a realização da audiência de discussão e julgamento para a
apreciação e prova testemunhal de tal situação, o que não ocorreu;
17 - Daí que entendam os Recorrentes que no campo dos factos
provados no artigo 3.°, aliás aditado nos termos do disposto no artigo
652.° do CPC, tal situação tenha de ser agora revista e alterada,
devendo passar a constar antes que "0 requerimento executivo tem data
de 25/05/2016 e consta do sistema informático Citius na menção da
comprovação do "pagamento fase 1" em 01/06/2016";
18 - A Recorrente não juntou extratos bancários/declaração bancária ou
quaisquer elementos adicionais comprovativos do pagamento dos
honorários de fase 1 - para além daquela mera declaração posta em
crise pelos Recorrentes, pelo que, deverá ser mantida a decisão do
Tribunal de 1ª instância;
19 - No caso sub judice ocorreu a prescrição extintiva do direito da
Recorrida de intentar a presente ação executiva, pelo facto de, mesmo
admitindo a hipótese de ter havido interrupção da prescrição no quinto
dia posterior ao da propositura da ação, ou seja, a 30.05.2016, terem
decorrido mais de três anos (prazo a que se refere o artigo 70.° da
LULL) entre esta última data e a data da citação que o ocorreu em
18.07.2106, pelo menos quanto à Executada CC;
20 - A interrupção da prescrição não resultou de "citação, notificação
ou acto equiparado" - nos termos (conjugadamente) do n.° 1 do art.
323.° e do n.° 1 do art. 327.° CC -, mas de uma outra e distinta
fattispecie, nomeadamente a descrita no n.° 2 do art. 323.° CC, do
decurso do prazo dos cinco dias contados da data de interposição da
acão executiva com pedido de citação dos executados e não tendo
ocorrido a "citação, notificação ou acto equiparado" previsto(a) no n.° 1
do art. 327.° CC, mas antes uma outra distinta factualidade, a Recorrida
não beneficia do mesmo modo do efeito interruptivo estatuído na
segunda parte deste preceito;
21 - A regra, nesta matéria, é a de que não basta, para interromper a
prescrição, a mera introdução do feito em juízo; indispensável é
também que a ação seja proposta de tal modo que o devedor venha a
tomar efetivo conhecimento da reclamação do direito que é exercida,
tendo o credor de atuar como tal e dirigir tal atuação ao devedor que
desta há-de tomar conhecimento - pois à partida o que interrompe a
prescrição não é a propositura da acão mas a efetiva citação do réu;
22 - A introdução do feito em juízo com pedido de citação do réu ou
executado - aqui Recorrentes - apenas interrompe o prazo prescricional
de 3 anos, prazo esse que se reinicia 5 dias após a propositura da ação -
carecendo outro entendimento de expressa e inequívoca previsão legal:
é necessário destarte que a citação do réu ou executado (ou notificação
judicial ou qualquer outro acto judicial que leve ao efetivo
conhecimento do réu a reclamação do direito pelo seu titular) ocorra
num prazo de três anos a contar do termo do prazo dos 5 dias
posteriores à propositura da ação;
23 - Cumpre ao titular do direito que o pretenda reclamar em juízo um
mínimo de diligência no que respeita ao andamento da lide, mormente
no que toca aos actos processuais que foram ou não sendo praticados, e
não adotar uma postura totalmente passiva como se a partir daquele
momento (propositura da ação) já nada fosse com ele;
24 - No caso sub judice constata-se que a Recorrida foi de uma
passividade e incúria gritantes - a sua conduta não poderá deixar de ser
considerada negligente, pois, só cinco dias antes da prescrição decidiu
interpor a ação com citação urgente, querendo com tal conduta obstar à
prescrição, o que como vimos não pode suceder. Mesmo no caso dos
prazos prescricionais mais curtos - como o que ora nos ocupa - o titular
do crédito que pretenda reclamá-lo em juízo dispõe de 3 anos, a partir
da data do respetivo vencimento, quer para propor a ação, quer para
possibilitar a citação efetiva do réu ou executado - aqui Recorrentes;
25 - Finalmente, tenha-se presente que a LULL é um instrumento de
direito internacional, nomeadamente um tratado regularmente assinado
e ratificado pelo Estado português, e que por isso goza de uma força
jurídica superior à lei ordinária, no caso ao Código Civil. A
interpretação defendida pelo Tribunal a quo é em rigor ab-rogatória do
disposto no artigo 70.° da LULL, pois à custa da letra da norma referida
acaba por esvaziar de conteúdo o prazo prescricional ali fixado. Ao
invés, o entendimento dos supracitados preceitos do Código Civil
sustentado pelos Recorrentes é o que preserva (ou o que mais preserva)
o prazo prescricional consagrado no referido tratado;
26 - As questões inerentes à certeza, liquidez e exigibilidade da
obrigação exequenda dos presentes autos e a análise do preenchimento
abusivo da livrança que serviu de título executivo encontram-se
intimamente relacionados, pelo que, os Recorrentes no âmbito do
presente recurso irão reportar-se a ambas as questões, sendo imperioso
ter presente que o Tribunal da Relação de Coimbra debruça-se sobre as
questões que não foram alvo de apreciação pelo Tribunal a quo,
porquanto este apenas analisou e decidiu de imediato pela existência da
exceção perentória extintiva da prescrição, pelo que, ao abrigo do
disposto no n.° 2 do artigo 665.° do CPC passou o Venerando Tribunal
a apreciar das demais questões suscitadas pelos Recorrentes em sede de
embargos de Executados, tendo decidido julgar todas elas
improcedentes, o que os Recorrentes não se conformam, pelo que,
passam a deduzir as seguintes alegações, por considerarem que houve
errou na sua apreciação;
27 - Os Recorrentes alegaram em sede de embargos que a divida era
inexigível por a Recorrida pretender ressarcir-se de valores que
peticionava em dois processos correlacionados - de insolvência e nos
presentes autos de execução -, dos quais emergiam valores
completamente dispares, não só no capital, como nos juros e despesas.
Considerou o Venerando Tribunal que "O facto de o credor poder
eventualmente ter reclamado ao subscritor da mesma livrança um
valor superior ou inferior àquele cujo pagamento é aqui peticionado
aos avalistas em nada interfere com a existência e o montante da
obrigação exequenda, pelo que se julga improcedente este fundamento
da oposição deduzida pelos Executados.”;
28 - Depois quanto ao preenchimento abusivo da livrança, os
Recorrentes alegaram que apesar de terem assinado a livrança
apresentada como título executivo, não preencheram, porém, o
conteúdo da mesma, nem tão-pouco autorizaram o seu preenchimento,
pois não subscreveram qualquer pacto de preenchimento da dita
livrança. Considerou o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra
analisa (sic) superficialmente a livrança em causa nos autos, e que por
ter a menção de "Dou o meu aval ao subscritor" e se encontrar assinada,
tal é suficiente para a sua execução sem que o seu portador tenha de
interpelar os signatários, ora Recorrentes;
29 - Mais acrescentou que "A falta de autorização para o
preenchimento da livrança e a inexistência de um qualquer pacto de
preenchimento só poderão relevar no sentido de poderem caracterizar
uma livrança incompleta ou de integrarem uma situação de falta de
consciência de emissão de uma declaração negocial4 se a assinatura
da livrança ocorrer quando esta ainda não se encontre preenchida -
livrança em branco." e continua dizendo que "Contudo, os Executados,
na oposição que deduziram, limitaram-se a alegar que apenas
assinaram a livrança apresentada como titulo executivo, não tendo
preenchido o conteúdo da mesma, sem que tenham alegado que quando
a assinaram a mesma se encontrava por preencher, não contendo,
designadamente, a expressão "dou o meu aval ao subscritor", pelo que,
podendo essa expressão, assim como o demais conteúdo da livrança,
ser preenchido por pessoa diversa dos Executados, a alegação dos
Executados em nada obsta a existência e exigibilidade do credito
cambiário cuja cobrança o Exequente pretende. Por este motivo
improcede também este fundamento da oposição deduzida pelos
Executados";
30 - Entendem os Recorrentes que não andou bem o Venerando
Tribunal ao decidir como decidiu porquanto, compulsada a petição
inicial dos Recorrentes, estes invocam expressamente nos artigos 27.° a
29.° e 41.° da P.I. (sic) Ora, se os Recorrentes alegaram que o
preenchimento das livranças foi abusivo, na ótica do bom pai de família
que sustenta o ordenamento jurídico português, é bom de se concluir
que quando assinaram a livrança a mesma encontrava-se em branco;
31 - Também compulsado o Doc. 1 da contestação da Recorrida
verifica-se que este é apenas composto por uma "proposta de desconto
de letras/financiamento por livrança", nada mais que isso, nela não
constando qualquer livrança, sequer preenchida, em anexo ou
autorização para o seu preenchimento, pois a proposta até poderia não
ser aceite pela Recorrida ou ser novamente reformada. Além do mais
deste documento de Doc. 1 não consta qualquer pacto de
preenchimento da livrança;
32 - Inexistindo pacto de preenchimento assinado, in casu, impunha-se
que a Recorrida tivesse interpelado os avalistas e ora Recorrentes sobre
os elementos a preencher na livrança - data de vencimento e montante
da livrança - a sua exigibilidade;
33 - O Tribunal da Relação não considerou ou analisou a questão do
pacto de preenchimento pois que como se disse apenas referiu que os
Recorrentes não tinham alegado que a livrança não estava preenchia
quando a assinaram, o que como vimos, não corresponde à verdade.
Além do mais ao decidir como decidiu, não permitiu aos Recorrentes a
possibilidade de provar a violação do pacto de preenchimento da
livrança dada à execução, nos termos do artigo 342º, nº 2, do CC,
mediante por exemplo a realização da audiência de discussão e
julgamento com prova testemunhal a produzir - sem prejuízo de no
entendimento dos Recorrentes a prova documental junta aos autos ser
suficiente para decisão diversa da tomada pelo Tribunal da Relação de
Coimbra;
34 - Como aos Recorrentes não foi remetida, individualmente, qualquer
comunicação de incumprimento ou de resolução contratual e onde lhe
fossem indicados os valores alegadamente em divida, a alegada data de
vencimento e o preenchimento da presente livrança, torna-se evidente
que os Recorrentes ao terem posto em causa os valores apostos na
livrança nos seus embargos impugnaram a divida, pelo que, no humilde
entendimento dos Recorrentes, encontrando-se estes na esfera das
relações imediatas, não pode lograr a decisão recorrida;
35 - Do supra mencionado Doc. um da contestação da Recorrida, não
constam condições gerais ou eventual campo destinado exclusivamente
à autorização de preenchimento da livrança e a Recorrida nem sequer
faz prova documental de ter interpelado os Recorrentes, os quais
entendem ser manifesto o abuso de preenchimento da livrança, não
podendo esta utilizar qualquer documento, que denomina "Pacto de
Preenchimento de Livrança", e muito menos utilizar a livrança dos
autos;
36 - Os Recorrentes expressamente colocam em crise os valores
peticionados neste processo, atento o facto de serem completamente
díspares com o valor que foi reclamado pela Recorrida no processo de
insolvência da empresa EE, aliás empresa devedora originária da
livrança. Portanto a inexigibilidade do título executivo foi chamado à
colação, não aceitando os Recorrentes os valores que se encontram
especificados no requerimento executivo o que explicitaram de forma
discriminada nos seus embargos;
37 - Colocando os Recorrentes em causa o montante da obrigação
exequenda o argumento utilizado pelo Venerando Tribunal não pode
proceder porquanto não pode uma qualquer portadora de uma livrança
peticionar num processo de execução um valor, que depois no processo
de insolvência da devedora originária é distinto;
38 - Pode a Recorrida ver-se paga do valor aqui reclamado nos autos de
insolvência e devido a tal facto poder receber dos dois lados: via
insolvência e neste processo, pelos avalistas. Assim, tendo os
Recorrentes alegado expressamente a inexigibilidade da divida
exequenda deveria o Venerando Tribunal ter tomado decisão diversa da
tomada, aliás, com uma falta de fundamentação evidente;
39 - Veja-se a este respeito os Acórdãos do Supremo Tribunal de
Justiça, no âmbito do processo 779/14.2TBEVR-B.E1.S1, 2a Secção,
em que foi relator o Exmo. Sr. Juiz Conselheiro Tomé Gomes, Processo
9197/13.9YYLSB-A.L1.S1, 6a Secção, em que foi relator o Exmo. Sr.
Juiz Conselheiro Fonseca Ramos, Processo 60/10.6TBMTS.P1.S1, Ia
Secção, em que foi relator o Exmo. Sr. Juiz Conselheiro Garcia Calejo,
Processo 03A2113, Ia Secção, em que foi relator o Exmo. Sr. Juiz
Conselheiro Moreira Alves, Processo 1213-A/2001.L1.S1, 2a Secção,
em que foi relator o Exmo. Sr. Juiz Conselheiro Serra Baptista, todos
em www.dgsi.pt;
40 - Por fim, decidiu o Tribunal da Relação de Coimbra quanto à
questão alegada da falta de interpelação que "Os Executados são
avalistas do subscritor da livrança dada a execução. O dador do aval é
responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada - art.°
32° aplicável ex vi do art ° 77° da L. U.L.L. - podendo o portador da
livrança accionar os avalistas, sem previamente interpelá-los,
reclamando o pagamento do valor da livrança e dos juros de mora
desde a data do vencimento da mesma - art. °47° e 48°, aplicáveis ex vi
do art. ° 77° da L. U.L.L. -, pelo que também improcede este
fundamento da oposição ";
41 - Ao abrigo do princípio da liberdade contratual previsto no artigo
405.° do CC, encontram-se fixadas regras específicas quanto ao
cumprimento e incumprimento contratual, devendo ambas as partes
cumprir escrupulosamente o acordado, sob pena de responsabilidade
contratual;
42 - Não resulta do Doc. 1 da contestação qualquer especificação
relativamente a mora, incumprimento contratual, interpelações, pactos
de preenchimento de livrança, autorizações para tal e notificações ás
partes, onde se incluem os Recorrentes. A Recorrida limitou-se a
interpor a presente ação executiva, alegando um incumprimento da
devedora originária, o EE, sem que contudo tenha interpelado esta e/ou
os Recorrentes, sendo que - e esta é a questão primordial -, a relação
existente entre as partes, Recorrida e Recorrentes se mantenha ainda
nas relações imediatas;
43 - Nem tão-pouco do Doc. 1 da contestação consta qualquer data para
o vencimento da obrigação ali referida, pelo que se torna evidente que
não foi fixada qualquer data de vencimento das alegadas prestações em
falta;
44 - Conforme o disposto no artigo 406°, n.° 1 do CC "O contrato deve
ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por
mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei", o
que não sucedeu, pois cabia à Recorrida comunicar aos Recorrentes o
incumprimento, os valores em divida, a data de vencimento da divida e
o preenchimento da livrança, o que não fez;
45 - O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação e
responde pelo prejuízo que causa ao credor, incumbindo ao devedor a
prova de que a falta de cumprimento não procede de culpa sua - artigos
798.° e 799.° ambos do CC;
46 - O devedor considera-se constituído em mora, quando por causa
que lhe seja imputável, a prestação ainda possível, não foi efetuada no
tempo devido - artigo 804.° do CC. A simples mora constitui o devedor
na obrigação de reparar os danos causados ao credor, sendo que, na
obrigação pecuniária, a indemnização corresponde aos juros (legais) a
contar do dia da constituição em mora - artigo 806.° do CC;
47 - Neste quadro normativo, é manifesto que o Acórdão recorrido, na
parte em que condenou os Recorrentes a pagar à Recorrida a
importância peticionada merece censura, não podendo ser-lhes
imputável um eventual incumprimento pelo pagamento da reforma da
livrança, quando nunca foram notificados do incumprimento e/ou
resolução contratual, pelo que, existe assim, no humilde entendimento
dos Recorrentes um manifesto erro de julgamento de facto e de direito
do Venerando Tribunal pois o mesmo tinha ao seu alcance todos os
elementos que permitiam a análise mais detalhada do processo e
decisão diversa, tendo-se bastado apenas e tão só com a alegação da
existência de uma livrança assinada pelos Recorrentes e como tal, não
podiam estes alegar o que fosse quanto à mesma;
48 - Quanto à resolubilidade da reforma em causa, basta verificar-se a
partes (artigo 432.° n.°l do Código Civil). Assim, esta situação acaba
por estar interligada com as questões acima analisadas, porquanto ao ter
sido feita prova, no humilde entendimento dos Recorrentes, da
inexistência de qualquer interpelação dirigida a estes no sentido de
pagar quantia determinada, em momento determinado,
consequentemente, existe uma inexigibilidade da obrigação exequenda:
a obrigação cartular por falta de interpelação prévia dos Recorrentes;
49 - A obrigação cambiária é inválida e ineficaz, porquanto entendem
os Recorrentes terem alegado factos conducentes ao preenchimento
abusivo da livrança, pois foi uma livrança subscrita e avalizada em
branco, não foram os mesmos interpelados fosse do que fosse, e
encontrando-se a questão no âmbito das relações imediatas (artigos 10.°
e 77.°, II, da LULL), a livrança não tem efeito jurídico. Se o avalista do
subscritor de uma livrança em branco, tendo intervindo no pacto de
preenchimento, tem, previamente, à instauração da execução, de ser
informado pelo exequente/tomador, acerca dos termos em que vai ser
completado o preenchimento do título cambiário, ante o incumprimento
do contrato que constitui a relação fundamental, e não o foi, então,
importaria acautelar a qualidade de garantes dos Recorridos, o que
passaria, se tivesse havido atuação de boa-fé - art. 762°, n°2, do Código
Civil - pela informação acerca do incumprimento dos pagamentos pela
devedora originária, pelo que, não tendo havido interpelação para
cumprir como garantes, antes do preenchimento do título, a exigência
para que cumpram, enquanto avalistas, não tem fundamento legal;
50 - O douto Acórdão recorrido interpretou e aplicou erradamente a
Lei, designadamente o disposto nos artigos 405.°, 406.°, 432.°, 798.° e
799.°, 804.°, 806.°, 762.° todos do CC e artigos 10.° e 77.° da LULL
que assim violou, pelo que, deve o douto aresto de fls... ser substituído
por outro que julgue totalmente improcedente a ação e, em
consequência, absolva os Recorrentes na totalidade do pedido contra si
formulados;
51 - Em virtude de tudo o supra alegado, deverá, pois, ser revogado o
Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, pois violou -
para além das normas referidas em 50. Supra -, também por erradas
interpretação e aplicação, os seguintes normativos: artigos 10.°, 17.° a
contrario 70.° da LULL, artigos 323.°, n.°s 1 e 2, e artigo 327.°, n.° 1,
363, n.° 2, 805.° todos do Código Civil e bem assim, o disposto no
artigo 610.°, 713.°, alínea a) do n.° 6 do artigo 724.° todos do CPC,
acrescentando a tais vícios a violação da lei substantiva, ao interpretar
erradamente a matéria de facto e a matéria de direito a ela aplicável,
violado e errado na aplicação da lei de processo, bem como, não
especificou, no humilde entendimento dos Recorrentes os fundamentos
de facto e de direito que justificam a decisão, tendo, em consequências,
violado o disposto na alínea a), b) e c) do n.° 1 do artigo 674.° e a
alínea b) do n.° 1 do artigo 615.°, todos do CPC.

         Não foram apresentadas contra-alegações.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo questões sujeitas à nossa


apreciação as enunciadas pelos recorrentes nas suas conclusões, visto
serem estas, como é sabido, que delimitam o objeto do recurso,
naturalmente ressalvadas as questões que são de conhecimento
oficioso.
         Está, assim, em causa saber se:
 - o acórdão impugnado padece da nulidade que os recorrentes lhe
atribuem;
- está prescrita a obrigação exequenda;
- a obrigação exequenda não é exigível;
- se o preenchimento da livrança ocorreu sem que houvesse pacto a
convencioná-lo.

   II - No acórdão recorrido descrevem-se como provados os seguintes


factos:
 1.º Nos autos de execução apensos foi apresentado como título
executivo um documento onde se inscreve a expressão “no seu
vencimento pagarei(emos) por esta única via de livrança à Caixa
AA…”, com “importância” de 190.000 €, data de “emissão” a
05/04/2013 e de “vencimento” a 02/06/2013, assinada pelos
executados/opoentes no verso após a expressão “Dou o meu aval…”,
sendo “subscritor” a sociedade EE, Lda.
2.º Consta no requerimento executivo, entre o mais, o seguinte:
1 - A exequente é dona e legítima portadora duma livrança subscrita,
em 05.04.2013, pela EE, Lda. e avalizada pelos executados BB, CC e
DD, no valor de € 190.000,00, com data de vencimento a 02.06.2013,
conforme Doc. n.º 1, que se junta e se dá por integralmente
reproduzido.
2 - A subscritora foi declarada insolvente por sentença proferida, em
06.01.2014, no âmbito do processo com o n.º 1905/13.4TYLSB, o qual
corre termos na Comarca de Lisboa, Lisboa – Instância Central – …
Secção Comércio – J….
3 - Os executados, enquanto avalistas, são solidariamente responsáveis
pelo pagamento da livrança, nos termos conjugados dos arts. 77º e 32º
da LULL.
4 - Nem na data de vencimento, nem posteriormente, os executados
procederam ao pagamento do valor em dívida.
5 - A livrança vence juros à taxa legal de 4%, desde a data do seu
vencimento até efectivo e integral pagamento.
6 - Portanto, a obrigação é certa, exigível e líquida.
7 - O tribunal é territorialmente competente, nos termos do disposto no
art. 89º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
8 - O crédito em causa e respetivos juros, vencidos e vincendos, estão
consubstanciados em título executivo, nos termos do disposto no art.
703º, nº1, c) e nº2.
3.º O requerimento executivo tem data de 25/05/2016 e consta no
sistema informático Citius a menção da comprovação do “pagamento
fase 1” em 01/06/2016, tendo no entanto o pagamento sido efectuado
em 27.5.2016 – a parte final do facto foi aditada nos termos do art.º
652º do C. P. Civil (sic).
4.º Os executados CC e DD foram citados para a execução em
18/07/2016 e o executado BB em 30/08/2016.
5.º A sociedade “EE” foi declarada insolvente no processo n.º
1905/13.4TYLSB.
6.º A exequente, por carta registada com data de 07/02/2014,
apresentou reclamação de créditos no âmbito do processo de
insolvência da sociedade “EE”, subsequente a PER, no qual igualmente
havia apresentado reclamação de créditos, abrangendo o “crédito”
resultante do documento referido em 1.º, nos termos constantes a fls.
48v. e que aqui se dão por reproduzidos.
  III – Apreciando as questões de que nos cabe conhecer:

Da nulidade atribuída ao acórdão:


Esta questão é suscitada na conclusão 7ª que tem o seguinte teor:
“Entendem os Recorrentes que atenta a decisão ora recorrida o
Venerando Tribunal da Relação de Coimbra violou a lei substantiva, ao
interpretar erradamente a matéria de facto e a matéria de direito a ela
aplicável, violou e errou na aplicação da lei de processo, bem como,
não especificou, no humilde entendimento dos Recorrentes os
fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, tendo, em
consequências, violado o disposto na alínea a), b) e c) do n.° 1 do
artigo 674.° e a alínea b) do n.° 1 do artigo 615.°, todos do CPC.”
    Importa começar por salientar que não faz o menor sentido imputar
ao acórdão recorrido a violação do disposto nas als. a), b) e c) do nº 1
do art. 674º do CPC[1], uma vez que estas alíneas, contendo a
enunciação dos fundamentos que podem permitir a interposição do
recurso de revista, não constituem normas que coubesse à Relação
aplicar no acórdão em que julgou a apelação, não sendo, por isso,
concebível que haja violado tais comandos legais.

      Resta, para análise, neste ponto, a questão de saber se o acórdão


sofre da nulidade que os recorrentes lhe atribuem, a falta de
especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, vício
que, como referem, se reconduz à al. b) do nº 1 do art. 615º, “ex vi” art.
666º, nº 1 do mesmo diploma.

A violação do dever de motivação, instituído no art. 154º, nº 1, gera,


nos termos do citado art. 615º, nº 1, b), a nulidade da decisão.
 “A exigência de motivação é perfeitamente compreensível. Importa
que a parte vencida conheça as razões por que o foi, para que possa
atacá-las no recurso que interpuser. (…) A decisão é um resultado, é a
conclusão de um raciocínio; não se compreende que se enuncie
unicamente o resultado ou a conclusão, omitindo-se as premissas de
que ela emerge.”[2]
Importa, no entanto, ter presente que é corrente e unânime o
entendimento segundo o qual só a falta absoluta de fundamentação de
facto ou de direito gera a nulidade em causa, com o que se não pode
confundir a fundamentação medíocre ou insuficiente que, repercutindo-
se no mérito da decisão, podendo comprometê-lo, não produz nulidade.
[3]
Vejamos, então, o que no caso dos autos se passou.
    A Relação do Coimbra pronunciou-se no sentido da inexistência
desta nulidade a viciar o seu acórdão, por entender que “(…) todas as
decisões nele contidas se encontram fundamentadas.”
    Buscando na parte das alegações dos recorrentes que precede as
conclusões elaboradas, encontramos, explicitando a arguição desta
nulidade, a mesma frase “(…) não especificou, no humilde
entendimento dos Recorrentes os fundamentos de facto e de direito que
justificam a decisão, tendo, em consequências, violado o disposto na
alínea a), b) e c) do n.° 1 do artigo 674.° e a alínea b) do n.° 1 do
artigo 615.°, todos do CPC.” – reproduzida nos seus pontos 11º, 58º e
86º, a par da argumentação que desenvolvem a propósito das questões
que aí estão versando, a saber: a) a prescrição da obrigação exequenda,
por um lado; b) a certeza, liquidez e exigibilidade da obrigação
exequenda e o preenchimento abusivo do título.
    Ora, a leitura do acórdão recorrido mostra, de forma evidente, que
nele se fez constar a fundamentação de facto, constituída pela descrição
dos factos julgados como provados e, bem assim, a fundamentação de
direito, integrada por considerações de natureza jurídica, produzidas ao
longo de quatro páginas – fls. 141-145 – a propósito das questões de
natureza jurídica acabadas de mencionar em a) e b).
     O que está em causa é, pois, a discordância dos recorrentes em
relação à fundamentação e decisão do acórdão recorrido e não a falta de
fundamentação que possa gerar a nulidade do acórdão.
Tal vício não existe, pois.

         Da prescrição:
   É matéria que os recorrentes versam nas conclusões 8ª a 25º, estando
em causa saber se se verifica a prescrição da dívida dos executados,
acionada pela exequente, embargada e ora recorrida.
  Começam os recorrentes por defender que o requerimento executivo
só pode ter-se como apresentado em 1.6.2016 por ser essa a data em
que foram pagos os honorários devidos ao agente de execução, como
impõe o nº 6 do art. 724º; e, prosseguem sustentando que, constando da
livrança dada à execução a data de 2.6.2013 como sendo a do seu
vencimento, isso levará à conclusão de que o prazo de cinco dias
referido no nº 2 do art. 323º do CC se mostra findo depois de três anos
decorridos sobre esta última data, o que excluiria a possibilidade de ter
ocorrido em tempo a interrupção da prescrição.
    Esta tese foi acolhida na decisão da 1ª instância, mas o acórdão
recorrido seguiu em sentido oposto.
Qual destas duas posições é de acompanhar?
Como resulta do disposto nos arts. 70º e 77º da LULL, as ações contra
o subscritor de uma livrança prescrevem em três anos a contar do seu
vencimento.
E no seu art. 71º, onde se determina que a interrupção da prescrição só
produz efeito em relação à pessoa a quem é dirigida, pressupõe-se a
possibilidade de tal interrupção atuar, abstendo-se a LULL de definir o
seu regime.
Cabe aos Estados subscritores da Convenção Estabelecendo uma Lei
Uniforme em Matéria de Letras e Livranças, assinada em Genebra em
7.6.1930, regulamentar no seu direito interno esta matéria; é o que
resulta do primeiro parágrafo do art. 17º do Anexo II à LULL, onde se
lê: “A cada uma das Altas Partes Contratantes compete determinar na
sua legislação nacional as causas de interrupção e de suspensão da
prescrição das acções relativas a letras que os seus tribunais são
chamados a decidir.”
E, desta feita, somos remetidos para o disposto nos arts. 323º e segs. do
CC, a propósito de cuja aplicação às letras e livranças se escreveu no
sumário do acórdão deste STJ de 10.04.1980[4]:
“I – Como direito interno português (artigo 1 do Decreto - Lei n.
26556, de 30 de Abril de 1936) a Lei Uniforme relativa a letras e
livranças enquadra-se no nosso direito comercial, de que o direito civil
é subsidiário.
II – Daí que a interrupção da prescrição nestes títulos cambiários
(arts. 71 e 77 da Lei Uniforme) à falta de outras disposições haja de
regular-se pelas disposições respetivas do Código Civil.”
Também no acórdão do STJ de 17.4.1986 se escreveu: “É que esta
matéria, não prevista na Lei Uniforme, é regulada pelas leis dos países
signatários da Convenção de Genebra, de 7 de Junho de 1930 (Decreto
nº 26556, de 30 de Abril de 1936), enquadrando-se, por isso, no nosso
direito comercial, de que o direito civil é subsidiário (artigo 3º do
Código Comercial).”[5].
A aplicação do regime da prescrição constante do CC a estes títulos de
crédito é unanimemente aceite por este STJ, como o demonstram, a
título de exemplo, os seus recentes acórdãos de 19.06.2018[6] e de
3.07.2018[7].
Pode, assim, afirmar-se a sem razão da tese exposta pelos recorrentes
na sua conclusão 25ª.

Ocorrendo interrupção da prescrição, fica inutilizado todo o tempo


decorrido anteriormente e desencadeia-se, a partir do ato interruptivo, o
decurso de novo prazo prescricional, como flui do estatuído no art. 326º
do CC.
Nos termos do nº 1 do art. 323º do mesmo diploma, a interrupção dá-se,
em princípio, com a citação ou notificação judicial de qualquer ato que
exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito.
Porém, a efetivação daquelas diligências pode ser dispensada nos
termos do subsequente nº 2 que estabelece: “Se a citação ou
notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido
requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição
por interrompida logo que decorram os cinco dias.”
O requerimento executivo foi apresentado, como consta do facto
provado descrito sob o nº 3, em 25.5.2016.
É a partir desta data que se inicia o decurso daqueles cinco dias, sendo
irrelevante, para este efeito, a data em que a exequente procedeu ao
pagamento da quantia a que se refere a al. a) do nº 6 do art. 724º.
Não refere o Código Civil, para efeitos de interrupção da prescrição, a
necessidade de instauração de qualquer ação, seja declarativa, seja
executiva; o que releva é a prática de um ato que evidencie a intenção
de exercer o direito, sendo para nós evidente que esse ato é aquele pelo
qual o credor desencadeia o mecanismo judicial adequado a esse
exercício, ou seja, a apresentação em juízo do respetivo requerimento.
E não pode ser determinante, no tocante à eficácia do ato no plano
substantivo, a especial configuração que lhe seja dada no plano do
direito processual, assente que é em motivos específicos do setor.
Neste sentido decidiu já o STJ no seu acórdão de 24.1.2019[8], aí se
escrevendo: “Trata-se de questão que não é consensual no seio da
doutrina. Assim, enquanto Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo[9]
e Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro[10], defendem que a
norma do citado art. 724º, nº 6, al. a) afeta os direitos subjetivos
(substantivos ou adjetivos) exercidos pelo credor, podendo a
circunstância de não se considerar apresentado o requerimento
executivo, por falta de pagamento da quantia inicialmente devida ao
agente de execução, relevar designadamente para efeito de interrupção
da prescrição, nos termos do art. 323º, nº2 do C. Civil, já Lebre de
Freitas[11], sustenta a tese de que aquela norma releva «para o efeito
do prosseguimento do processo», mas «não no que respeita aos efeitos
substantivos dela derivados, diretamente (como acontece com a
caducidade) ou indiretamente (como é o caso da interrupção da
prescrição)[12]. Quanto a nós, propendermos por sufragar este último
entendimento, na medida em se reconhece estar perante um norma
assente no princípio enunciado no art. 721º, nº1 do CPC, segundo o
qual os honorários devidos ao agente de execução e o reembolso das
despesas por ele efetuadas são suportadas pelo exequente, e, por isso,
destinada a garantir o sistema de responsabilidade pelo pagamento ao
agente de execução. Com efeito, desenvolvendo-se a atividade do
agente de execução em proveito do exequente, é natural que seja este a
disponibilizar e a assegurar os meios financeiros próprios para levar a
cabo os atos de que seja incumbido no âmbito do processo de
execução.”
Aliás, estando aqui em causa os efeitos substantivos da propositura de
um processo judicial, nenhuma justificação haveria, na ótica da
razoabilidade das soluções legais, para que, visto o campo de aplicação
do nº 6 do mencionado art. 724º, inserido que está na regulamentação
da ação executiva e sem norma equivalente no processo declarativo,
aqueles efeitos fossem diversos, quanto à eficácia interruptiva da
prescrição, consoante estivéssemos perante ação de uma ou de outra
natureza.
Sendo, assim, de aplicar o comando do citado nº 2 do art. 323º e
considerando a data de 25.5.2016, a prescrição tem-se por interrompida
em 30 do mesmo mês, ou seja, antes da data em que, se assim não
fosse, a prescrição ocorreria.
Aqui chegados, não há que apreciar a argumentação exposta nas
conclusões 9ª a 18ª que só poderia relevar se não tivéssemos concluído
pela inexistência da prescrição.
E quanto às conclusões 19ª a 24ª poucas palavras são necessárias para
mostrar a sua improficuidade.
Os recorrentes dizem, na conclusão 22ª, que, a admitir-se ter sido
interrompida a prescrição em 30.5.2006 nos termos do nº 2 do citado
art. 323º, logo se reinicia um novo prazo prescricional, pelo que a
citação terá de ser feita até três anos após aquela interrupção.
Uma vez que aceitam na conclusão 19ª ter havido uma citação em
18.7.2016[13], portanto, quarenta e nove dias depois daquela
interrupção, e não mais de três anos depois, não se compreende como
podem afirmar a prescrição da dívida.
Também as considerações feitas quanto a uma eventual negligência da
exequente se mostram descabidas. Retoma-se aqui, igualmente, o que
já foi escrito, a propósito, no acórdão de 24.1.2019, atrás mencionado:
“E sobre a interpretação a dar à expressão «por causa não imputável
ao requerente», é jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de
Justiça que esta expressão legal deve ser interpretada em termos de
causalidade objetiva, ou seja, a conduta do requerente só exclui a
interrupção da prescrição quando tenha violado objetivamente a lei em
qualquer termo processual até à efetivação da citação[14].
Nas palavras do Acórdão do STJ, de 03.02.2011 (processo nº
1228/07.8TBAGH.L1.S1)[15], o que é essencial para a aplicação do
regime da citação «ficta» em 5 dias é que a conduta do requerente  não
haja implicado qualquer violação culposa de normas procedimentais
ou adjetivas, radicando nessa infração objetiva – e só nela – a
preclusão do benefício emergente do referido nº 2 do art. 323º.
Assim, a demora será imputável ao requerente quando se demonstre
existir um nexo objetivo de causalidade entre a conduta do requerente,
posterior ao requerimento para a citação, e o resultado de a citação ter
sido efetivada para além do quinto dia posterior à apresentação
daquele[16].
Do mesmo modo, constitui entendimento pacífico na jurisprudência
deste Supremo Tribunal que, quando a demora na citação resulta da
desconjugação dos preceitos da lei de custas, de processo e de
organização judiciária com as normas substantivas, o conflito deve
solucionar-se no sentido da prevalência destas, sem que tal
desconjugação possa imputar-se aos que requerem as citações[17].
E ainda que, sendo a ação proposta com a antecedência mínima de 5
dias em relação à consumação do prazo prescricional, nem necessita o
autor de requerer a citação antecipada para poder aproveitar do artigo
323º, nº 2 do Código Civil[18], pois, como se afirma no citado Acórdão
do STJ de 03.02.2011, o que «releva decisivamente na aplicação do
dito regime legal é o eventual cometimento pelo autor de uma
infracção a regras procedimentais a que estava vinculado e que tenham
sido causais da demora na consumação do acto de citação – e não uma
«omissão» de actos ou diligências aceleratórias – que, porventura a
terem sido adoptadas, poderiam permitir um curso mais célere do
processo na sua fase liminar mas que constituem uma faculdade e não
um dever ou ónus do autor».

Não é, pois, negligente a propositura da execução a poucos dias do


termo do prazo prescricional.

De tudo o exposto resulta que não houve prescrição da dívida dos


executados.

         Da (in)exigibilidade da obrigação exequenda:


      Nas conclusões 27ª e 36ª a 38ª os recorrentes defendem que o título
dado à execução não tem a indispensável caraterística da exigibilidade,
conclusão que extraem do facto de com base nele a exequente pedir o
pagamento de quantias diversas das que, a partir do mesmo
instrumento, pediu ao reclamar créditos no processo de insolvência da
subscritora da livrança, como decorre dos factos provados descritos sob
os nºs 1 e 6.
     O art. 713º exige que a obrigação exequenda possua os requisitos da
certeza, da exigibilidade e da liquidez, a avaliar em face do título
executivo.
Se a análise do título não evidenciar a sua verificação, terá o exequente
de requerer as diligências necessárias para os alcançar, previstas nos
subsequentes arts. 714º a 716º.
    Lebre de Freitas[19], a este propósito, escreve: “A prestação é
exigível quando a obrigação se encontra vencida ou o seu vencimento
depende, de acordo com estipulação expressa ou com a norma geral
supletiva do art. 777-1 CC, de simples interpelação ao devedor.”
     A livrança aqui em causa, certificada a fls. 102 e verso, contém a
promessa de pagamento de € 190.000,00 e menciona a data de 2.6.2013
como sendo a do seu vencimento, sendo evidente, face a isto, que, ao
ser apresentado em 25.5.2006 o requerimento executivo, a obrigação
exequenda, em face do título, estava vencida e era, por isso, exigível.
     A circunstância, invocada pelos requerentes para pôr em causa a dita
exigibilidade, de com base na mesma livrança haver sido reclamado no
processo de insolvência outro montante é, no que a este requisito diz
respeito, absolutamente irrelevante.
Não se compreende, em boa verdade, que os recorrentes possam, com
seriedade, levantar esta dúvida, uma vez que a divergência de pedidos
formulados num e noutro processo pela aqui recorrida tem uma razão
de ser patenteada na reclamação de créditos em causa, junta a pgs. 48 e
segs. dos autos com a contestação dos embargos, nomeadamente nos
seus arts. 7º a 11º, dos quais consta que aí se reclamavam dois créditos,
um emergente da livrança e outro emergente de uma conta à ordem.
    Soçobra, pois, a argumentação dos recorrentes tendente a demonstrar
a inexigibilidade da obrigação exequenda.

         Do pacto de preenchimento:


   Nas conclusões 30ª a 35ª os recorrentes, criticando o acórdão,
sustentam que a livrança dada à execução apenas foi por eles assinada e
preenchida pela exequente sem que tal estivesse legitimado por um
pacto de preenchimento.
    A este respeito nenhuma factualidade se encontra apurada, pelo que
importa, desde já, analisar com atenção a matéria que foi alegada pelas
partes neste âmbito.
    No requerimento inicial de oposição por embargos os embargantes,
aqui recorrentes, alegaram, no art. 27º, que apenas assinaram a livrança,
tendo sido escritos pela exequente, aqui recorrida, os demais elementos
que dela constam; e no art. 28º disseram também que esse
preenchimento foi abusivo porque eles, avalistas, não subscreveram
qualquer pacto de preenchimento.
  Remataram o tema afirmando que a exequente “não tinha poderes,
nem estava autorizada a preencher qualquer dado da livrança, pelo
que o título dado à execução é nulo (…)” – art. 29º da p. i..
         Contestando, disse, por seu lado, a exequente que:
- a livrança foi emitida nos termos constantes da proposta para desconto
então junta como doc. nº 1, que se encontra a fls. 47 – art. 48º;
- com este documento foi entregue aquela livrança, já totalmente
preenchida e assinada, tendo prazo certo de vencimento – arts. 49º e 51º
.
        
Trata-se de matéria que as instâncias não averiguaram.
    A 1ª instância julgou procedente a exceção de prescrição, com o que
prejudicada ficou a apreciação dessa matéria.
Já o Tribunal da Relação, tendo considerado como inexistente essa
exceção, passou a apreciar as questões que a 1ª instância não chegara a
analisar. Mas, quanto à argumentação relativa à falta de autorização
para o preenchimento da livrança e à inexistência de um pacto de
preenchimento, considerou que estas questões apenas relevariam se a
assinatura da livrança tivesse sido aposta quando o título ainda não
estava preenchido, isto é, se se tratasse de uma livrança em branco. E
de seguida escreveu-se no acórdão recorrido: «(…) os Executados, na
oposição que deduziram, limitam-se a alegar que apenas assinaram a
livrança apresentada como título executivo, não tendo preenchido o
conteúdo da mesma, sem que tenham alegado que quando a assinaram
a mesma se encontrava por preencher, não contendo, designadamente,
a expressão “dou o meu aval ao subscritor”, pelo que, podendo essa
expressão, assim como o demais conteúdo da livrança, ser preenchido
por pessoa diversa dos Executados, a alegação dos Executados em
nada obsta à existência e exigibilidade do crédito cambiário cuja
cobrança o Exequente pretende.» (sublinhado nosso)
     Entendemos, porém, que esta não terá sido a mais correta maneira
de interpretar o que consta da petição de embargos.
     De facto, os recorrentes não alegaram aí, de forma expressa, que as
suas assinaturas foram apostas na livrança quando esta estava ainda por
preencher.
       Porém, o que alegaram no art. 28º - “Não tendo os avalistas
subscrito qualquer pacto de preenchimento das livranças, o
preenchimento das mesmas pela exequente é abusivo.” –, apenas tem
sentido lógico se pressupusermos que lhe está subjacente a existência
de uma livrança em branco.
        
Trata-se de matéria controvertida, porque foi contrariada pelo que a
exequente alegou ao contestar os embargos, conforme acima
mencionámos.
Resta então saber se é caso de, lançando mão do mecanismo previsto
no art. 682º, nº 3, ordenar a ampliação da decisão de facto. Esta,
naturalmente, só se justificará se, num juízo de prognose, os factos
alegados pelos embargantes, uma vez demonstrados, puderem, à luz do
direito aplicável, levar à procedência da oposição.
Vejamos então.
A demonstrar-se que a livrança foi, como dizem, entregue em branco e
que, enquanto avalistas, não preencheram qualquer pacto de
preenchimento, isso em nada releva para excluir a sua responsabilidade.
Com efeito, a ter sido como dizem, tal circunstancialismo não exclui,
naturalmente, que a subscritora da livrança cuja obrigação os
embargantes avalizaram, e a quem coube a sua entrega à ora exequente,
a tenha autorizado a preenchê-la, através de convénio escrito ou verbal
que ambas tenham firmado, ficando, nesse caso, os avalistas vinculados
a esse acordo de preenchimento.[20]
É a entrega do título e essa autorização de preenchimento que
transformam a letra e a livrança incompletas em títulos de crédito em
branco.
Nas palavras de Ferrer Correia[21] “A letra subscrita nestes termos
(aquela a que falta alguns dos requisitos indicados no art. 1º da LULL)
deve ser entregue pelo subscritor ao credor; enquanto não for
negociada não pode haver, como sabemos, obrigação cambiária. Mas
não basta a entrega da letra: é necessário que o subscritor dê ao
credor autorização para a preencher. Sem isso estaremos em face de
uma letra incompleta, não de uma letra em branco.”
Porém, como acima assinalámos já, os embargantes, aqui recorrentes,
alegaram também no art. 29º da p. i., que a exequente “não tinha
poderes, nem estava autorizada a preencher qualquer dado da livrança
pelo que o título dado à execução é nulo (…)”.
Pode esta alegação ser apenas um mero desenvolvimento do que antes
haviam afirmado no art. 28º, mas é de admitir, a nosso ver, que com ela
os embargantes, indo mais além, tenham querido significar - na linha
do que sustentam nas conclusões 30ª a 35ª -, que essa autorização de
preenchimento, por parte da subscritora da livrança, nunca teve lugar, o
que, a demonstrar-se, levaria à incompletude do título.
Ora, a tratar-se de livrança incompleta, e não de livrança em branco,
nem sequer seria convocável o disposto no art. 17º da LULL, não
havendo, nesse medida, que averiguar se a defesa dos recorrentes se
encontra, ou não, no âmbito das relações imediatas; este preceito
pressupõe, para ser aplicado, a existência de um título de crédito válido.
Impõe-se, nesta conformidade, a ampliação da decisão de facto quanto
à sobredita matéria controvertida, o que se determinará de seguida, ao
abrigo do nº 3 do art. 682º.
IV – Pelo exposto, nega-se, em parte, a revista:
- julgando-se improcedente a arguição de nulidade do acórdão recorrido
e da exceção de prescrição invocada pelos recorrentes;
- e determina-se que os autos voltem à Relação de Coimbra para que aí,
se possível com intervenção dos mesmos Exmos. Desembargadores, se
providencie pela ampliação da decisão de facto nos termos acima
indicados.
      Metade das custas desta revista será suportada pelos recorrentes,
sendo a responsabilidade pelo restante definida a final.
Lisboa, 11.07.2019
Rosa Maria M. C. Ribeiro Coelho (Relatora)
Catarina Serra
Bernardo Domingos
________
[1] Diploma a que respeitam as normas de ora em diante referidas sem menção de diferente
proveniência.
[2] Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 2º, págs. 172 e 173.
[3] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 140; Lebre de Freitas,
Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, 2ª edição, vol. 2º, pág. 703 e
Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I,
pg. 737.
[4] Relator Cons. Hernani Lencastre, acessível em www.dgsi.pt
[5] BMJ nº 356, pág. 412, citado por Abel Delgado, Lei Uniforme sobre Letras e Livranças
Anotada, 6ª edição, pág. 354.
[6] Relator Cons. Fonseca Ramos, Proc. 23817/14.OTBVNG-A.P1.S1
[7] Relatora Cons. Paula Boularot, Proc. 1965/13.8TBCLD-A.C1.S1
[8] Relatora Cons. Rosa Tching, proc. nº 524/13.0TBTND-A.C1.S1, e no qual interveio como
adjunta a ora relatora, acessível em www.dgsi.pt
“[9] In, “ A Ação Executiva Anotada e Comentada”, Almedina 2015, pág. 226.”
“[10] In, “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil Os Artigos da Reforma, Vol. II,
Almedina 2014, pág. 238.” 
“[11] In, “A Ação Executiva À Luz do Código de Processo Civil de 2013”, 6ª Ed., Coimbra
Editora, pág. 184.”
“[12] No mesmo sentido parece posicionar-se Rui Pinto quando afirma, in, “A Ação Executiva”,
AAFDL Editora, Lisboa/2018, págs 89 e 90, que se trata «manifestamente, de um modo indireto de
lidar com a questão, mas que é de constitucionalidade duvidosa, em face do direito de ação
garantido pelo art. 20º, nº1 da CRP».”
[13] Só podem, como é óbvio, referir-se ao ano de 2016, embora hajam escrito, com manifesto
lapso, “2106”.
“[14] Neste sentido, cfr., entre muitos outros, os Acórdãos do STJ, de 09.02.1995, in, BMJ, nº 444,
pág. 570; de 04.03.2010 (processo nº 1472/04.OTVPRT-C.S1); de 03.02.2011 (processo nº
1228/07.8TBAGH.L1.S1); de 23.01.2014 (processo nº 8021/04.8YYLSB-A.L1.S1); de 29.11.2016
(processo nº 448/11.5TBSSB-A.E1.S1) e de 03.07.2018 (processo nº 1965/13.8TBCLD-A.C1.S1),
acessíveis acessível na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj.”
“[15] Acessível na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj.”
“[16] Cfr, entre outros, os Acórdãos do STJ de 08/07/1980, in BMJ, nº 299, pág. 294; de
27/07/1982, in BMJ, nº 319, pág. 265; de 05/05/1987, in BMJ, nº 367, pág. 507; e de 04/11/1992,
in BMJ, nº 421, pág. 262.”
“[17] Cfr, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 17.061998 (processo nº 457/98); de 10.02.1981
(processo nº 068766), acessíveis na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj.”
“[18] Cfr., entre outros, os Acórdãos do STJ de 10/01/2006 (processo nº 3298/05), in Sumários dos
Acórdãos do STJ – Janeiro 2006; de 03.02.2011 (processo nº 1228/07.8TBAGH.L1.S1), acessíveis
na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj.”
[19] A Ação Executiva à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 6ª edição, pág. 98.
[20] Cfr., entre outros, o acórdão deste STJ de 13.11.2018, relator Cons. Paulo Sá, Proc. nº
2272/05.5YYLSB-B.L1 e demais arestos nele mencionados.
[21] Lições de Direito Comercial, Letra de Câmbio, vol. III, 1966, pág. 124

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