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DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL


APELAÇÃO CÍVEL
PROCESSO Nº 0019952-85.2018.8.19.0209
APELANTE: JOÃO FABIO FERNANDES MATOS E OUTRO
APELADO: GAFISA SPE 113 EMPREENDIMENTOS
IMOBILIÁRIOS LTDA. ("SPE 113")
RELATOR: DES. WAGNER CINELLI DE PAULA FREITAS

Apelações cíveis. Ação de obrigação de fazer c/c


pretensão indenizatória por danos material e
moral. Promessa de compra e venda de unidade
imobiliária. Quitação do preço. Hipoteca não
baixada. Sentença de parcial procedência.
Ilegalidade do óbice registral criado ao
comprador. Acerto da sentença nesse tocante.
Dano moral configurado. Quantum indenizatório
fixado com modicidade, a comportar majoração.
Dano material que, devidamente comprovado
nos autos, também deve ser reconhecido.
Redistribuição dos ônus sucumbenciais que, por
conseguinte, encerra medida impositiva.
Sentença que se reforma em parte. Recursos
conhecidos, desprovido o primeiro e provido o
segundo.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível, estando as
partes acima nomeadas.

ACORDAM os Desembargadores que compõem a Décima Sétima


Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por
unanimidade de votos, em conhecer dos recursos, negar provimento ao
primeiro e dar provimento ao segundo, na forma do voto do relator.

WAGNER CINELLI DE PAULA FREITAS:15410 Assinado em 28/07/2021 20:32:32


Local: GAB. DES WAGNER CINELLI DE PAULA FREITAS
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VOTO
Relatório nos autos.

O recurso é tempestivo e guarda os demais requisitos de


admissibilidade, de forma a trazer o seu conhecimento.

Consoante relatado, trata-se de apelação cível interposta de sentença


prolatada em ação em que a parte autora alega ter adquirido imóvel da ré que
se encontrava hipotecado pela Caixa Econômica Federal, tendo a empresa
demandada assumido no contrato a obrigação de levantar o gravame após a
quitação integral dos débitos contraídos pela parte autora, obrigação que,
segundo os demandantes, não teria sido cumprida. Foram formulados pleitos
de condenação da ré a providenciar a lavratura da escritura definitiva e de
indenização por danos material e moral.

Ante a sentença de parcial procedência, ambas as partes se insurgiram.


Enquanto a ré sustenta inexistir dano moral indenizável, a parte autora
postula pela majoração da referida verba indenizatória, bem como pelo
reconhecimento de dano material na hipótese e pela redistribuição dos ônus
sucumbenciais.

Passa-se à análise conjunta dos apelos.

A presente relação jurídica está subsumida às normas e princípios do


Código de Defesa do Consumidor, visto que as partes autora e ré inserem-se
nos conceitos de consumidor e prestador de serviços bancários, na forma dos
artigos 2º e 3º do CDC, respectivamente.

Tornou-se fato incontroverso nos autos a quitação do imóvel pelos


adquirentes, sendo certo que o conjunto probatório constante do processo
atesta as alegações autorais nesse sentido. Também restou induvidosa a
obrigação da ré de proceder à baixa do gravame hipotecário constante do
imóvel, já que se limitou a contestação de fls. 374/384 à alegação de
inexistência de prejuízo ou de danos à parte autora.

Diante desses fatos, forçoso é reconhecer que a inércia da parte ré, uma
vez pago o preço do bem em sua integralidade e decorrido o lapso temporal
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para a providência estabelecida em contrato, impôs aos autores óbice


indevido ao pleno exercício da propriedade, forçando-os a aguardar longos
anos para o cancelamento do gravame hipotecário.

Por essa razão, assiste-lhes razão ao requerem a fixação de prazo para


cumprimento da obrigação de fazer, consistente na lavratura da escritura
definitiva, razão pela qual deve a sentença ser reformada nesse sentido.

Quanto à pretensão indenizatória, não há como se falar em mero


inadimplemento contratual como pretende fazer crer a parte ré, mas em
inegável ocorrência de dano moral in re ipsa, já que frustrada a legítima
expectativa de todos os aspectos de uso e gozo do imóvel pelos adquirentes.
Assim, correta a sentença ao conceder aos autores o direito à indenização por
dano moral, ficando afastada por completo a pretensão recursal aviada pela
parte ré.

No que concerne ao quantum indenizatório arbitrado, faz-se necessária a


observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sendo,
portanto, recomendável que a fixação seja feita com moderação e atendendo
às peculiaridades do caso concreto.

Assim, aplicando-se os critérios acima, verifica-se que a quantificação


praticada na sentença, R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para ambos os autores,
apresenta-se de baixo valor, pelo que é majorado para R$ 10.000,00 (dez mil
reais) para cada demandante, de forma a melhor se adequar aos princípios
incidentes no caso em análise.

Nesse sentido:

0009065-42.2018.8.19.0209 - APELAÇÃO
1ª Ementa
Des(a). ANTONIO CARLOS ARRABIDA PAES -
Julgamento: 24/02/2021 - VIGÉSIMA TERCEIRA
CÂMARA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE
FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS C/C PEDIDO DE TUTELA
PROVISÓRIA. CONTRATO DE COMPRA E
VENDA DE IMÓVEL. BAIXA NA HIPOTECA.
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DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE
PROVIDENCIAR O CANCELAMENTO DO
GRAVAME. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO
PLEITO DE BAIXA NA HIPOTECA, BEM COMO
CONDENANDO A RÉ A PAGAR AO AUTOR A
QUANTIA DE R$2.000,00 (DOIS MIL REAIS) A
TÍTULO DE DANO MORAL. RECURSO
EXCLUSIVO DO AUTOR VISANDO A
MAJORAÇÃO DO DANO MORAL PARA R$
10.000,00 (DEZ MIL REAIS). DESCABIMENTO.
INCIDÊNCIA DO TEOR DA SÚMULA Nº 343
DESTE TJRJ. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO
DESPROVIDO.

0255360-64.2019.8.19.0001 - APELAÇÃO
1ª Ementa
Des(a). MAURÍCIO CALDAS LOPES -
Julgamento: 09/06/2021 - DÉCIMA OITAVA
CÂMARA CÍVEL
Ação de obrigação de fazer intentada ao escopo de
compelir os réus à exclusão da hipoteca do registro
dos imóveis descritos na petição inicial, sem
prejuízo da composição dos danos morais ditos
suportados. Sentença de procedência. Apelação.
Preliminar de ilegitimidade passiva que se rejeita
por isso que, embora afirme o banco apelante que o
gravame hipotecário fora firmado exclusivamente
com a incorporadora (SPE 7), é ele o responsável
pelo cancelamento do ônus que recai sobre o
imóvel. Mérito. Documentos anexados aos autos,
notadamente o contrato de compra e venda do
imóvel acostado aos índices eletrônicos 20 e 33, a
testemunharem a obrigação assumida pela
outorgante-vendedora quanto à liberação total de
quaisquer ônus ou hipotecas incidentes sobre as
unidades objeto do instrumento contratual, e de
conclusão do registro, no prazo de 180 (cento e
oitenta) dias a contar da lavratura da escritura de
compra e venda, firmada em 10/09/2013. Baixa
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nunca efetivada. Danos de índole extrapatrimonial


caracterizados. Quantum indenizatório adequado e
proporcional, considerado o lapso decorrido desde a
escritura, de quase oito anos, as três fracassadas
tentativas, porquanto fixados para os dois autores na
proporção de R$ 10.000,00 (dez mil reais), para
cada um deles, com juros de mora da citação e
correção monetária do arbitramento. Não
provimento do recurso do 1° réu, não conhecido o
do 2°, prejudicado o agravo interno por este
interposto.

0032295-16.2018.8.19.0209 - APELAÇÃO
1ª Ementa
Des(a). SIRLEY ABREU BIONDI - Julgamento:
26/04/2021 - DÉCIMA TERCEIRA CÂMARA
CÍVEL
Ação de obrigação de fazer c/c indenizatória. Pedido
de baixa na hipoteca de imóvel. Incorporadora e
instituição financeira no polo passivo. Sentença de
procedência. Inconformismo da 1ª ré - SPE
PECTUS - através do presente apelo. Incidência do
CDC. Prova inconteste nos autos, apontando que o
adquirente/autor/apelado quitou o preço do imóvel
na data da lavratura da escritura, bem como pagou
todas as despesas vinculadas à escritura, ao ITBI e
ao registro, conforme escritura de compra e venda e
certidão de prenotação, na qual consta exigência
vinculada à manutenção de gravame hipotecário. Em
direção oposta, a 1ª ré/apelante ( SPE PECTUS ) ,
manteve-se inerte quanto à baixa da hipoteca do
empreendimento que gravava o imóvel. Verificação
de que em momento algum a apelante foi intimada
para o cumprimento da decisão judicial.
Imprescindibilidade da efetiva comunicação
processual, para dar início à contagem da multa.
Exigibilidade da multa diária que é condicionada à
efetiva intimação da parte ré. Necessidade de
regularização do imóvel quitado, amparada por lei,
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não tendo sido apresentada prova de inadimplência,


tampouco a existência de saldo devedor.
Solidariedade entre os litisconsortes passivos.
Decisão única. Recurso de apelação interposto por
um dos réus que ao outro demandado, que não
recorreu, aproveita. Dano moral in re ipsa,
quantificado em R$ 10.000,00. Desvio do tempo útil
da consumidora. Todos que participam da cadeia de
consumo - e a apelante é uma dessas personagens,
respondendo solidariamente pelos danos causados
aos consumidores. PROVIMENTO PARCIAL DO
RECURSO.

O dano material, de igual forma, restou devidamente comprovado nos


autos, consoante a planilha descritiva de fls. 212, a qual reporta
criteriosamente aos documentos comprobatórios das despesas suportadas
pelos demandantes.

Trata-se de despesas relativas à documentação coligida pelos autores


com o objetivo de lavrar a escritura definitiva de compra e venda, a qual
somente não foi ultimada em razão da inércia das rés em providenciar o
levantamento do gravame hipotecário.

Logo, pelo princípio da reparação integral, insculpido nos arts. 186 e


927 do Código Civil, impõe-se reconhecer o dever da ré de indenizar os
autores pelo dano material suportado por estes.

Via de consequência, também deve ser acolhido o pleito de


redistribuição do ônus da sucumbência, face o decaimento integral da ré
quanto à pretensão autoral, na forma do art. 85 do CPC.

Ante o exposto, voto no sentido de CONHECER DOS RECURSOS,


NEGAR PROVIMENTO AO PRIMEIRO E DAR PROVIMENTO AO
SEGUNDO, para, reformando-se parcialmente a sentença, estabelecer o
prazo de 30 dias, a contar deste julgamento, para que a ré proceda à lavratura
da escritura definitiva, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais),
limitada a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). O recurso dos autores é
provido, ainda, para se majorar a indenização por dano moral para R$
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10.000,00 (dez mil reais) para cada autor, corrigidos desta data e acrescidos
de juros moratórios de 1% ao mês a contar da citação; bem como para se
condenar a ré a restituir aos autores o valor de R$ 426,97 (quatrocentos e
vinte e seis reais e noventa e sete centavos), corregido monetariamente e
acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação.

Face a alteração na sucumbência, fica a parte ré condenada ao


pagamento integral das custas processuais, bem como a pagar à parte autora,
a título de honorários advocatícios, o valor correspondente a 15% do valor da
condenação, já inclusa a majoração decorrente do desprovimento da apelação
interposta pela ré, nos termos do art. 85, § 11, do CPC.

Rio de Janeiro, 27 de julho de 2021.

WAGNER CINELLI
DESEMBARGADOR
RELATOR

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