AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0031128-56.2019.8.16.0000, DE CAMBARÁ
– VARA CÍVEL
NPU: 0000971-32.2019.8.16.0055 (PROCESSO DE ORIGEM)
AGRAVANTE: LOTEADORA ASSAÍ S.S. LTDA
AGRAVADO: CARLOS DADONA
RELATOR: DES. VITOR ROBERTO SILVA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. REVISIONAL DE CONTRATO DE COMPRA E
VENDA DE IMÓVEL URBANO EM LOTEAMENTO. TUTELA ANTECIPADA CONCEDIDA PARA OPORTUNIZAR O PAGAMENTO DO VALOR INCONTROVERSO E IMPOSSIBILITAR A INSERÇÃO DO NOME DA PARTE EM CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. REQUISITOS PREENCHIDOS. DIFICULDADE DE QUITAÇÃO DO EMPRÉSTIMO E RISCO DE RETOMADA DO BEM. POSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO DOS JUROS QUANDO ABUSIVOS. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº
0031128-56.2019.8.16.0000, de Cambará – Vara Cível, em que é agravante Loteadora Assaí S.S. Ltda. e é agravado Carlos Dadona.
Cuida-se de agravo de instrumento interposto contra a decisão proferida em
ação revisional de contrato c/c repetição de indébito e indenização por danos morais, por meio da qual foi deferida a tutela antecipada para o fim de determinar que os requeridos se abstenham, até o trânsito em julgado do processo, de efetuar os reajustes previstos na cláusula quarta e seus parágrafos e de inserir o nome do requerente em quaisquer cadastros de proteção ao crédito, bem como de possibilitar ao requerente, durante esse período, efetuar o pagamento apenas da parcela incontroversa, ou seja, do valor constante na formação do contrato, que é de R$ 361,12 (mov. 1.6).
Alega a agravante, em síntese, que: a) o negócio realizado não envolveu a
captação de numerário ou obtenção de empréstimo em instituição bancária integrante do Sistema Financeiro de Habitação, mas consistiu em autofinanciamento de terreno pela agravante, de modo que não se sujeita ao regramento daquelas operações para venda de unidades residenciais edificadas; b) não estão presentes os requisitos autorizadores para a concessão da medida liminar; c) o contrato firmado e suas condições sempre tiveram prévia ciência do agravado; d) os aumentos previstos no contrato tem como finalidade atualizar monetariamente o valor da parcela com o fim de fazer frente aos impactos da inflação e para manter o poder econômico da moeda e juros compensatórios em razão do preço ajustado a ser pago em 170 prestações mensais; e) não há que se falar em qualquer ilegalidade, abusividade ou irregularidade; f) a inclusão dos referidos juros possui previsão legal, como o artigo 1º §3º, do Decreto nº 22.626/1933, artigo 316 do Código Civil e artigo 52 do Código de Defesa do Consumidor; g) o princípio da informação foi devidamente cumprido; h) a medida pode se tornar irreversível; e, i) a probabilidade do direito está calcada na clara evidência de que não existe comprovação de qualquer abusividade ou ilegalidade no contrato e o “periculum in mora” encontra-se no fato de que a manutenção da suspensão da exigibilidade dos valores na forma estabelecida no contrato resultará em evidente prejuízo ao seu direito quanto ao recebimento do preço de forma integral no prazo ajustado para o seu pagamento. Ao final, pugnaram pela concessão de efeito suspensivo e, no mérito, pelo provimento do recurso. (mov. 1.1)
O pedido de efeito suspensivo foi indeferido (mov. 5.1) e foi apresentada
resposta ao recurso (mov. 14.1).
É o relatório.
Firmado contrato de compromisso de compra e venda de imóvel urbano em
loteamento, ainda que as cláusulas contratuais tenham sido previamente informadas ao consumidor, é possível a sua revisão, conforme entendimento sedimentado na jurisprudência:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - CONTRATO BANCÁRIO -
ARRENDAMENTO MERCANTIL - FINANCIAMENTO DE VEÍCULO - REVISÃO DE CONTRATO QUITADO (EXTINTO) - POSSIBILIDADE - SÚMULA N. 286/STJ - PROVA DO ERRO - DESNECESSIDADE - RETORNO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM PARA QUE PROSSIGA NA REVISÃO CONTRATUAL - RECURSO IMPROVIDO. (AgRg nos EDcl no Ag 891.396/SP, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, julgado em 15/03/2011, DJe 30/03/2011)
AGRAVO REGIMENTAL. REVISÃO DE CONTRATOS EXTINTOS PELO PAGAMENTO. SÚMULA
286/STJ. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. POSSIBILIDADE. 1.- "Ambas as Turmas integrantes da Segunda Seção desta Corte Superior já manifestaram o entendimento segundo o qual a possibilidade de revisão de contratos bancários permitida pela Súmula 286/STJ se estende também a situações de extinção contratual decorrentes de quitação (AgRg no AgRg no REsp 933.221/RS, Relatora Min.ª MARIA ISABEL GALLOTTI, DJe 16.11.2010). 2.- Em relação à compensação e à repetição do indébito, este Superior Tribunal entende não se fazer necessária, quando se trata de contratos como o dos autos, a prova do erro no pagamento, já que não se há de falar em pagamento voluntário, pois os valores das prestações são fixados unilateralmente pela própria instituição financeira credora. 3.- O recurso não trouxe nenhum argumento capaz de modificar a conclusão do julgado, a qual se mantém por seus próprios fundamentos. 4.- Agravo Regimental improvido. (AgRg no AREsp 16.420/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, julgado em 15/09/2011, DJe 03/10/2011)
E, ao contrário do que foi afirmado pela agravante, estão presentes os
requisitos para o deferimento da tutela antecipada.
O perigo na demora consiste na dificuldade de quitação total do empréstimo
e na retomada do bem.
Com relação à verossimilhança das alegações, são relevantes as razões do
agravado, pois a jurisprudência admite limitar a taxa de juros quando caracterizada a relação de consumo e quando ficar demonstrada sua abusividade.
No caso, o requerente alegou que o contrato estabeleceu o pagamento do
saldo devedor em 179 prestações mensais e sucessivas no valor de R$ 361,12 cada uma, ao passo que cláusula quarta estaria provocando um aumento exagerado no valor das prestações, uma vez que seu valor já está em R$ 479,07.
E mais: da análise do extrato juntado pela agravante em sua contestação
(mov. 19.8) é possível verificar que as parcelas com vencimento em maio de 2019 já passaram para R$ 561,43.
Essa acentuada diferença entre o valor inicial e o atual da parcela –
variação de cerca de 50% em cerca de 3 anos – em cotejo com a inflação do período destitui de credibilidade a alegação de que os aumentos do valor da parcela tem como finalidade corrigir monetariamente o montante da prestação.
Logo, essa acentuada variação do valor da parcela possibilita a concessão
da tutela antecipada.
Ademais, a possibilidade de pagamento apenas da parcela incontroversa
não causa prejuízo ao credor.
Na verdade, além de demonstrar a boa-fé do devedor, liberando-o
parcialmente de sua dívida, o depósito também garante ao credor o pagamento parcial de seu crédito.
É certo, porém, que se ao final a pretensão for improcedente, arcará o autor
com todos os efeitos da mora.
Nessas condições, voto no sentido de conhecer e negar provimento ao
recurso.
Nessa conformidade:
ACORDAMos integrantes da Décima Oitava Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.
Presidiu o julgamento o Senhor Desembargador Marcelo Gobbo Dalla Dea,
com voto, e acompanhou o voto do Relator o Senhor Juiz Substituto em 2º Grau Fábio André Santos Muniz. Curitiba, 27 de março de 2020.