Você está na página 1de 71

2021/2022

2.º SEMESTRE

SEBENTA PRÁTICA DE

D I R E
I T O
ADMINISTRATIVO
André Rosa

Carolina Medeiros

Duarte Nogueira
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

APONTAMENTOS SEMANAIS DE DIREITO


ADMINISTRATIVO - PRÁTICAS

Aula de dia 02/03

Regulamento Administrativo
Quanto a esta figura, pode ser definida como uma norma jurídica, geral e abstrata, adotada
pela Administração Pública no exercício de poderes jurídico-administrativos. O
regulamento administrativo está sujeito aos princípios gerais da atividade administrativa,
nomeadamente ao princípio da legalidade (precedência, primazia e reserva de lei).
- Reserva de lei – algumas matérias cuja regulamentação apenas poderá ser feita por lei;
- Precedência de lei – o poder regulamentar baseia-se sempre numa lei prévia;
- Primazia de lei – a lei prevalece sobre os regulamentos. É hierarquicamente superior.
Nenhum regulamento pode revogar uma lei.

No que toca a esta relação com a lei, podemos chegar às seguintes espécies de
regulamentos:

• Regulamentos executivos: todos aqueles que visam suprir as deficiências da lei,


precisando e pormenorizando-a, assegurando assim uma execução conveniente da
lei;
• Regulamentos complementares: todos aqueles que desenvolvem ou aprofundam
a disciplina normativa prevista na lei;
• Regulamentos de desenvolvimento/integrativos: todos aqueles que visam adaptar
o quadro legal geral a situações especiais não expressamente previstas na lei;
• Regulamentos delegados/autorizados: aqueles em que a Administração Pública é
autorizada a substituir-se ao legislador;
• Regulamentos independentes: aqueles que introduzem uma disciplina
materialmente inovadora. É dada uma certa discricionariedade ao poder
regulamentar, que apenas existe nesta categoria de regulamentos;
• Regulamentos autónomos: todos os que são adotados por um órgão que integre
uma pessoa coletiva pública que constitua uma forma de administração autónoma
(atende-se ao órgão competente nesta classificação). Por ex.: todos os
regulamentos adotados pelos órgãos das autarquias locais. Um regulamento
autónomo não é necessariamente independente, embora tal seja frequente.

Definição legal de regulamento administrativo – artigo 135º CPA. São normas gerais
e abstratas, no exercício de poderes jurídico-administrativos, com vista à produção de
efeitos jurídicos externos.
Os regulamentos administrativos podem ter eficácia interna (dentro da pessoa coletiva
que os emanou) ou externa (os seus efeitos jurídicos fazem-se sentir fora da pessoa

André Rosa 1
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

coletiva que os emanou). Se podemos distinguir, dentro dos regulamentos, os que têm
eficácia interna e externa, como se explica a definição legal do artigo 135º do CPA?
Tem-se entendido que este artigo não ajuda a delimitar a qualificação do regulamento
administrativo. Tem uma função apenas de delimitar o âmbito de aplicação objetivo
do CPA. As normas do CPA que tenham por objeto específico regulamentos
administrativos apenas se aplicarão aos regulamentos administrativos com eficácia
externa.

No artigo 267º/5 da CRP, retiramos uma exigência constitucional de procedimentalização


da atividade administrativa. Isto significa que a prática de atos, regulamentos e contratos
administrativos tem sempre de ser antecedida de um procedimento. Esta exigência é
densificada pelas normas do CPA relativas ao procedimento administrativo.
O procedimento administrativo que diz respeito ao regulamento é o procedimento
regulamentar, previsto nos artigos 97º e ss. do CPA. Importa saber se este procedimento
se aplica a todos os regulamentos ou apenas aos regulamentos administrativos com
eficácia externa.
Entende-se que, se apenas aplicássemos estas disposições aos regulamentos
administrativos externos, haveria uma inconstitucionalidade por omissão (267º nº5 CRP).
Por isso, entende-se que estas disposições se aplicam a todos os regulamentos
administrativos.

Dentro dos regulamentos administrativos com eficácia externa, distinguem-se 2


tipos de normas regulamentares:
• Normas regulamentares imediatamente operativas: os seus efeitos jurídicos
desencadeiam-se direta e imediatamente nas esferas jurídicas dos destinatários,
sem necessidade de ato administrativo ou decisão judicial (ex.: normas
regulamentares que indiquem uma proibição);
• Normas regulamentares mediatamente operativas: os seus efeitos jurídicos apenas
mediatamente se fazem sentir nas esferas jurídicas dos destinatários. É necessário
um ato administrativo ou decisão judicial que desencadeie essa produção de
efeitos (ex.: norma regulamentar que preveja os requisitos para a atribuição de um
subsídio).
Esta distinção é importante, porque os pedidos de impugnação judicial das normas
regulamentares diferem caso sejam imediatamente ou mediatamente operativas.

Procedimento regulamentar comum


3 Grandes fases do procedimento regulamentar comum:
1. Fase preparatória (4 subfases):
Ø Iniciativa – artigos 97º e 98º CPA.
§ 97º: o procedimento inicia-se com a prática de um ato pelo órgão
competente. É uma competência oficiosa, não obstante poder ser
praticada na consequência de uma petição apresentada por um
particular;

André Rosa 2
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

§ 98º: o início do procedimento deve ser publicitado na internet, no


site oficial da entidade pública.
Ø Instrução – nesta fase, vai-se, em primeiro lugar, atender aos interesses
públicos e privados envolvidos; em segundo lugar, pondera-se os custos e
benefícios das medidas apresentadas; por último, elabora-se um projeto de
regulamento administrativo, com justificação das medidas adotadas
(artigo 99º CPA);
Ø Preparação (artigos 100º e 101º CPA).
§ 100º: audiência dos interessados. Tem lugar quando as disposições
regulamentares afetem, direta e imediatamente, direitos ou
interesses legalmente protegidos dos cidadãos. No artigo 100º/3,
alíneas a), b) e d), pode não haver a audiência dos interessados. Na
alínea c), não é possível, porque o nº de interessados é
incompatível com a realização da audiência (é substituída pela
consulta pública, do art. 101º CPA);
§ 101º: possibilidade de realizar consulta pública, realizada quando
o nº elevado de interessados torne impossível a realização da
audiência, ou devido à natureza da matéria em causa. Se houver
consulta pública, deve ser mencionada no preâmbulo do
regulamento (nº3). Há uma publicação em DRE do projeto de
regulamento.
Ø Elaboração do projeto final do regulamento administrativo – pode ou não
conter as sugestões dos interessados.
2. Fase constitutiva – destina-se à aprovação do regulamento administrativo. Pode
ser da competência de um órgão colegial (aqui, atende-se às regras do
funcionamento dos órgãos colegiais) ou singular. O ato de aprovação é um mero
ato instrumental, não administrativo (não tem autonomia). Se o órgão com
competência para elaborar o regulamento for diferente do órgão com competência
para aprovar, e este último recusar, então o ato de recusa corresponde a um
verdadeiro ato administrativo.
3. Fase integrativa de eficácia (artigos 139º e ss. CPA):
Ø 139º: publicação em DRE e no site institucional da entidade em causa;
Ø 140º: os regulamentos administrativos entram em vigor na data neles
estabelecida. Caso tal não seja o caso, entram em vigor 5 dias após a
publicação;
Ø 141º: proibição da eficácia retroativa dos regulamentos que impõem
deveres, encargos, ónus, sanções, etc. Do nº2 retiramos que os efeitos dos
regulamentos não podem reportar-se a data anterior para a qual reporta a
lei habilitante.
Ø 142º nº2: apenas se aplica aos regulamentos administrativos com eficácia
externa. Daí retiramos o princípio de que os regulamentos podem ser
modificados, alterados ou suspensos através de outros regulamentos, e não
através de atos administrativos (apenas no que diz respeito aos
regulamentos com eficácia externa).

André Rosa 3
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Art. 147º: garantias administrativas no respeitante aos regulamentos administrativos com


eficácia externa.
Art. 189º/2 - as impugnações administrativas não têm eficácia suspensiva.
Art. 190º - a impugnação administrativa facultativa suspende os prazos para a imposição
de ações nos tribunais administrativos.

Caso Prático nº1


Qualifique as hipóteses colocadas considerando as formas de atividade administrativa que
conhece:

1. Contrato de arrendamento social sujeito ao regime da renda apoiada, previsto


na Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro;

Contrato administrativo – acordo plurilateral de vontades, que pressupõe a existência de


2 ou mais contraentes, um dos quais, pelo menos, deverá ser público. Sujeita-se a um
regime de Direito Administrativo, criando, modificando ou extinguindo uma relação
jurídica. Em princípio, os contratos de arrendamento são de Direito privado,
disciplinando-se pelo Código Civil. O contrato de arrendamento social é uma exceção
(disciplina-se não pelo Código de Contratos Públicos, mas por este regime especial). A
grande diferença é que, no contrato de arrendamento social, o arrendatário está numa
situação de especial carência económica, sendo-lhe atribuída uma posição vantajosa na
celebração destes contratos, sujeitos ao regime do arrendamento apoiado (Lei nº81/2014,
de 19 de dezembro – determina em que condições é possível ter acesso a este regime).

2. Declaração que esclarece, após pedido do interessado, que “de acordo com os
registos o contribuinte não tem dívidas fiscais”;

Ato meramente declarativo. Não é um ato administrativo. É uma decisão individual e


concreta, mas não produz efeitos jurídicos inovadores. Limita-se a constatar uma situação
já existente.

3. Nos termos do artigo 11.º do Código das Expropriações, “a entidade


interessada, antes de requerer a declaração de utilidade pública, deve diligenciar
no sentido de adquirir os bens por via de Direito Privado, salvo nos casos
previstos no artigo 15.º, e nas situações em que, jurídica ou materialmente, não é
possível a aquisição por essa via”.

Temos um procedimento administrativo geral (CPA), e procedimentos especiais. O


procedimento expropriativo é especial, previsto no Código das Expropriações, aplicando-
se este a título principal e o CPA a título subsidiário.

André Rosa 4
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Se não for possível um contrato de compra e venda, previsto no CC, parte-se para a
expropriação por utilidade pública, que consta do Código das Expropriações. Esta
expropriação é um ato administrativo.

4. Norma de uma postura municipal que prevê uma proibição de circulação


rodoviária;

Regulamento administrativo autónomo (emanado por um órgão de uma autarquia local).


Norma geral e abstrata, emanada por um órgão da Administração Pública no exercício de
funções jurídico-administrativas. Tem eficácia externa, pois produz efeitos para além do
órgão que o emanou.
É uma norma regulamentar imediatamente operativa, pois consiste numa proibição. O
efeito proibitivo desencadeia-se na esfera jurídica de todos os destinatários de modo
direto e imediato.

5. A entidade concessionária da atividade de fiscalização das contraordenações


previstas no artigo 71.º do Código da Estrada, levantou um auto de
contraordenação por falta de pagamento da taxa de estacionamento devida;

O ato que aplica a coima ao particular é um verdadeiro ato administrativo. É uma decisão
unilateral, produtora de efeitos jurídicos externos e inovadores numa situação individual
e concreta.
O facto de ter sido praticado por uma entidade concessionária não tem relevância. Não
são só os órgãos da Administração Pública que podem praticar atos administrativos.
Também o podem fazer as entidades privadas, desde que exerçam funções jurídico-
administrativas.

6. O delegante remeteu oficiosamente ao delegado, nos termos do artigo 41.º do


CPA, um requerimento que implica o exercício das competências que lhe tinham
sido delegadas;

Um particular elabora um requerimento, dirigido a um determinado órgão, mas esse


órgão, nesse momento, não tem competência para decidir pois a competência está
delegada noutro órgão.
Artigo 41º CPA – expressão do princípio da colaboração, previsto no artigo 11º. Sempre
que um órgão da Administração Pública receber um requerimento, dirigido a si, mas
relativamente ao qual não tem competência para decidir, deve remeter o requerimento
para o órgão competente. Este ato não configura um ato administrativo, porque não
produz efeitos jurídicos externos. É um mero ato jurídico interno.

André Rosa 5
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

7. “Por falta de apresentação da declaração de aceitação do conteúdo do caderno


de encargos, considere-se a sociedade “Construções Silva, S.A.” excluída do
concurso público tendente à celebração de um contrato de empreitada de obras
públicas.”;

Duas figuras:
Contrato de empreitada de obras públicas: contrato administrativo sujeito à disciplina do
Código do Contrato Público. A prática do contrato administrativo deve ser antecedida por
um procedimento administrativo, que se designa por procedimento pré-contratual. Este
inicia-se sempre com o ato pelo qual o órgão competente decide contratar. Isto significa
que a entidade pública decidiu que a celebração do contrato seria a via mais adequada
para a satisfação do interesse público. O procedimento termina sempre com a prática de
um ato administrativo, que pode ser:
- Ato de adjudicação – ato administrativo pelo qual se atribui a celebração do contrato ao
candidato graduado em 1º lugar;
- Ato de não adjudicação – pode ser praticado quando houver perda de interesse em
contratar, ou quando nenhum dos candidatos apresentar uma proposta vantajosa do ponto
de vista da prossecução do interesse público.

Ao longo do procedimento podem ser praticados vários atos, alguns administrativos,


outros não.

- Ato de exclusão do candidato ao procedimento – é um verdadeiro ato administrativo.


Decisão individual e concreta que produz efeitos jurídicos externos no ordenamento
jurídico. Hoje, há uma coincidência entre atos administrativos para efeitos procedimentais
e processuais, do que decorrem consequências:
- Todos os atos administrativos são judicialmente impugnáveis;
- Há outros atos jurídicos que, embora não administrativos, são suscetíveis de
impugnação contenciosa (ex.: pareceres vinculativos).

André Rosa 6
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

APONTAMENTOS SEMANAIS DE DIREITO


ADMINISTRATIVO - PRÁTICAS
Aula de 9/03

Caso prático nº1

8. Parecer vinculativo favorável da Agência Portuguesa do Ambiente à


construção em zona abrangida pelo Programa do Proteção da Orla Costeira;

Pareceres vinculativos – meros atos jurídicos. Podemos distinguir entre pareceres


obrigatórios e facultativos, consoante sejam ou não exigidos por lei, e entre vinculativos
ou não vinculativos, consoante o órgão com competência decisória tenha ou não de seguir
o sentido do parecer, aquando da prática do respetivo ato administrativo.
Os pareceres vêm previstos nos artigos 91º e ss. do CPA.
91º - em regra, os pareceres são obrigatórios e não vinculativos. Apenas o são quando
expressamente previsto na lei. Quando for adotado um ato administrativo que viole um
parecer vinculativo, é anulável.
A importância de qualificar o parecer enquanto administrativo reside no facto de estes,
mesmo não podendo ser qualificados como atos administrativos, serem suscetíveis de
impugnação contenciosa. O particular pode impugnar o próprio parecer vinculativo, ou
pode esperar que seja adotado o ato administrativo que o parecer vincule para agir perante
os tribunais.

9. Remoção de uma autocaravana estacionada num terreno do domínio público


municipal;

Operação material da Administração Pública. A atividade da Administração Pública pode


ser jurídica ou não jurídica. Este é um exemplo de uma operação não jurídica. Não
desencadeia efeitos jurídicos, não obstante poder ser juridicamente relevante (não
confundir com o ato que ordena a remoção da autocaravana, que é um verdadeiro ato
jurídico, e em regra será também administrativo).

10. Notificação de um ato administrativo;

Ato instrumental. Mero ato jurídico na modalidade de ato instrumental.


A propósito da notificação, coloca-se a questão de saber se é um requisito de eficácia do
ato administrativo. Em regra, não o será (artigo 165º CPA), ou seja, o ato administrativo
produz os seus efeitos a partir do momento em que é praticado.

André Rosa 1
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Artigo 160º CPA – exceção, relativa aos atos administrativos de conteúdo desfavorável
para os particulares. Só produzem efeitos depois de os particulares afetados serem
notificados.
Todos os atos administrativos devem ser notificados (artigo 114º/1 CPA).
114º/2 CPA – elementos que devem constar do ato de notificação.
É importante saber a partir de que momento foi feita a notificação, pois os prazos para a
impugnação contenciosa começam a contar a partir dessa mesma data (artigo 159º nº2
CPTA).
Artigo 60º CPTA – hipóteses de notificações deficientes (nº1 – se da notificação não
resultar o sentido da decisão, os prazos para a impugnação contenciosa não começam a
contar. Apenas começam quando a situação seja regularizada).
Pode acontecer que o ato de notificação não faça referência ao autor, à data ou aos
fundamentos. Nestas situações, o prazo para a impugnação contenciosa começa a contar,
mas interrompe-se. É diferente falar em interrupção e suspensão. No caso da interrupção
do prazo, uma vez retomada a contagem, o período decorrido não é contabilizado.
Começa a contar do 0, ao contrário do que acontece na suspensão.
Artigo 112º CPA – modalidades de notificação (ex.: notificação eletrónica – 112º/1 c) +
112º/2 – é necessário o consentimento prévio do interessado para haver notificação
eletrónica).
Artigo 113º CPA – a notificação presume-se efetuada no terceiro dia útil posterior ao
registo ou no 1º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil.

11. Indeferimento de um pedido de atribuição de subsídio;

Atos administrativos de conteúdo positivo vs. atos administrativos de conteúdo negativo


vs. atos administrativos de conteúdo ambivalente:
- […] de conteúdo positivo: atos administrativos que provocam uma alteração na esfera
jurídica do destinatário, independentemente de ser uma alteração favorável ou
desfavorável ao destinatário (exemplos: ato administrativo de conteúdo positivo e
favorável: ato através do qual se atribui um subsídio a um particular / ato administrativo
de conteúdo positivo e desfavorável: ato pelo qual se ordena a remoção de uma
autocaravana).
- […] de conteúdo negativo: recusam introduzir alterações na esfera jurídica dos
destinatários. Entre nós, o único exemplo é o ato de indeferimento;
- […] de conteúdo ambivalente: afetam, simultaneamente, os seus destinatários e
terceiros. Introduzem uma alteração na esfera jurídica dos destinatários e,
simultaneamente, recusam uma alteração na esfera jurídica de terceiros. Entre nós, apenas
existe o ato de adjudicação (ato administrativo através do qual se atribui a celebração de
um contrato ao candidato graduado em 1º lugar, num concurso público).
É importante não confundir atos de conteúdo negativo e atos desfavoráveis para os
destinatários.
Neste caso, temos um ato administrativo de conteúdo negativo.

André Rosa 2
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

12. Falta de decisão, no prazo previsto no n.º 1 do artigo 128.º do CPA, de


requerimento no qual se solicita a prorrogação do período de estágio;

Pressupostos dos requerimentos dirigidos à Administração Pública (artigo 13º CPA):


- É necessário que resulte do requerimento uma solicitação do interessado;
- Deve dirigir-se ao órgão competente, sem prejuízo do artigo 41º do CPA;
- O requerimento deve envolver o exercício de poderes jurídico-administrativos;
- Tem de ser apresentado dentro do prazo;
- Deve não ter sido elaborado um requerimento pelo mesmo autor e pelo mesmo motivo
nos 2 anos anteriores.
Se preenchidos todos estes requisitos, a Administração Pública fica obrigada a decidir
sobre o requerimento. O prazo regra é de 60 dias, de acordo com o artigo 128º/1 do CPA.
Se não for tomada uma decisão nesse prazo, forma-se um silêncio administrativo. É uma
omissão ilegal (artigo 129º CPA). Contudo, há situações em que se atribui a este silêncio
administrativo a formação de um deferimento tácito (artigo 130º CPA), excecionalmente.
A omissão ilegal é suscetível de ser impugnada contenciosamente. Neste caso, trata-se de
uma omissão ilegal.

13. Regimento de um órgão colegial;

Regulamento administrativo interno, apenas produz efeitos jurídicos dentro do âmbito da


própria pessoa coletiva da qual emanam.
Existindo este regulamento relativo ao funcionamento do órgão colegial, o CPA apenas
se aplica a título subsidiário.

14. Regulamento que disciplina a vida quotidiana de uma instituição de ensino


superior dirigido à prestação de serviços de formação especializada, prevendo
procedimento internos de organização de cursos de formação contínua e os
regimes de avaliação dos estudantes inscritos.

Regulamento administrativo com eficácia interna e externa (regulamento híbrido).


A distinção entre regulamentos com eficácia externa e interna é importante, no sentido
em que são desencadeados efeitos jurídicos diferentes.
Artigo 135º CPA – delimita o âmbito de aplicação objetivo do CPA, aos regulamentos
com eficácia externa. Quando às normas do CPA que tenham especificamente por objeto
regulamentos administrativos, apenas se aplicam aos regulamentos externos.
Aos regulamentos com eficácia interna aplicam-se as disposições relativas aos princípios
da atividade administrativa e todas as demais disposições que não tenham por objeto
específico o procedimento administrativo

André Rosa 3
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Artigos 97º e ss. CPA – resultam daqui inconvenientes. Cingir a aplicação destas normas
aos regulamentos externos seria inconstitucional.
Artigo 136º/4 – referência aos regulamentos com eficácia interna.
Para contornar a inconstitucionalidade por omissão, aplicam-se analogicamente as
disposições do CPA relativas aos regulamentos administrativos com eficácia externa aos
regulamentos com eficácia interna.

Caso prático n.º 2

Comente a seguinte afirmação no que seja indispensável para justificar a sua


concordância ou discordância:
Os regulamentos administrativos são sempre suscetíveis de impugnação
administrativa e contenciosa.

Distinção entre regulamentos internos e externos, quanto à eficácia (já realizada na


questão anterior).
Dentro dos regulamento administrativos externos, podemos ainda distinguir 3 espécies:
- Regulamentos de polícia – impõem limitações à liberdade individual, com vista a evitar
que, em consequência de uma conduta duvidosa dos indivíduos, se produzam danos
sociais (ex.: regulamento de trânsito);
- Regulamentos institucionais – visam disciplinar comportamentos dos utentes de um
serviço público. Estes administrados, por serem utentes de um serviço público, estão
sujeitos a uma especial forma de subordinação à Administração Pública, encontrando-se
em relações especiais de poder. Admitem-se certas limitações de direitos mais intensas
do que as que são impostas à generalidade dos cidadãos;
- Regulamentos de organização e funcionamento – aplicam-se aos funcionários, na
qualidade de cidadãos, que estejam numa relação jurídica de emprego com a
Administração Pública. Disciplinam os direitos e deveres recíprocos das partes.

Outra distinção dos regulamentos externos:


- Regulamentos imediatamente operativos – desencadeiam, direta e imediatamente, a
produção de efeitos na esfera jurídica do destinatário sem necessidade da prática de um
ato administrativo ou de decisão judicial.
- Regulamentos mediatamente operativos - apenas mediatamente produzem efeitos na
esfera jurídica dos destinatários. Requerem a prática de um ato administrativo ou de uma
decisão judicial.

A distinção entre regulamentos internos externos é importante porque certas disposições


apenas se aplicam aos externos:

André Rosa 4
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

- Tramitação do procedimento regulamentar (artigo 97º ss. CPA): já foi discutida a


questão de isto constituir uma inconstitucionalidade por omissão, pelo que se estende
também aos regulamentos com eficácia interna;
- Princípio da inderrogabilidade singular (artigo 148º/2 CPA): prevê que não podem os
regulamentos administrativos ser derrogados por atos administrativos. Apenas o podem
ser por outros regulamentos. Este princípio apenas se aplica aos regulamentos com
eficácia externa;
- Impugnação administrativa e contenciosa: ambas apenas poderão ter lugar caso o
regulamento administrativo tenha eficácia externa. Quando falamos na impugnação
administrativa, referimo-nos às formas de reação perante a Administração Pública:
reclamação (ao órgão que praticou o regulamento) e recurso (órgão distinto), enquanto a
impugnação contenciosa refere-se às formas de reação perante os tribunais
administrativos.

Quanto aos regulamentos externos, os particulares podem reagir de 2 formas:


- Impugnação administrativa (artigos 147º CPA + 189º/2 e 190º CPA). Tem um carácter
facultativo. Suspende-se o prazo de reação junto dos tribunais administrativos;
- Impugnação contenciosa (72º ss. CPTA). Aqui, importa ter em conta a divisão entre os
regulamentos imediatamente e mediatamente operativos, porque apesar de serem ambos
impugnáveis contenciosamente, os pedidos são diferentes:
• Imediatamente operativas: impugnáveis a título principal (a norma é declarada
inválida ou inconstitucional);
• Mediatamente operativas: impugnáveis apenas a título incidental (a norma apenas
é desaplicada no caso concreto).

A forma de salvaguardar a legalidade dos regulamentos com eficácia interna é a


declaração de ilegalidade (artigos 143º e 144º CPA). Esta declaração não é um mecanismo
de salvaguarda de ilegalidade exclusivo dos regulamentos internos, podendo aplicar-se
também aos regulamentos externos. Todavia, quanto aos regulamentos internos, é a única
via possível. Será a própria Administração Pública a declarar, oficiosamente, a ilegalidade
das normas regulamentares, e não tem discricionariedade para tal – tem um verdadeiro
dever de reposição da legalidade.

A propósito dos atos administrativos, podemos dizer que padecem de vícios materiais,
formais ou orgânicos. A esses vícios, associamos consequências jurídicas:
- Invalidade:
• Nulidade;
• Anulabilidade;
• Inexistência.
- Irregularidade;

André Rosa 5
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

- Ineficácia.

Quanto aos regulamentos administrativos, não falamos em vícios, mas em ilegalidades,


que podem ser materiais, formais ou orgânicas. Determinar o tipo de ilegalidade em
presença, no que respeita aos regulamentos administrativos, é importante não para
determinar a consequência jurídica, mas o prazo para invocação da ilegalidade (artigo
144º CPA) - 2 espécies de ilegalidades:
- Ilegalidade simples: fundamento na violação de uma norma regulamentar
hierarquicamente superior ou de uma norma legal sem valor reforçado;
- Ilegalidade reforçada: fundamento na violação de uma norma legal de valor reforçado.

Nota: pode existir uma concorrência de competências entre os tribunais administrativos


e o Tribunal Constitucional quanto à apreciação de ilegalidade e inconstitucionalidade de
normas.
O artigo 281º da CRP prevê a fiscalização sucessiva abstrata, com fundamento na
ilegalidade/inconstitucionalidade de normas, que permite que estas sejam declaradas com
força obrigatória e geral.
Os artigos 78º ss. do CPTA preveem a possibilidade de os tribunais administrativos
fiscalizarem a legalidade e constitucionalidade das normas regulamentares.
Articulação: só é competência do Tribunal Constitucional declarar a
inconstitucionalidade/ilegalidade de normas quando haja um pedido de declaração com
força obrigatória e geral.

Caso prático n.º 3 – 4 etapas para resolver cada questão:


1. Identificar o parâmetro a que a norma regulamentar deve obediência (norma
regulamentar, lei, etc.);
2. Verificar se existe obediência ou desobediência a esse parâmetro;
3. Identificar o tipo de ilegalidade em presença;
4. Determinar o prazo para impugnação da invalidade.

Identifique os vícios, quando existam:

1. Norma do PDM que viola o disposto no Programa de Ordenamento do


Território;

2. Regulamento de avaliação dos discentes que não foi sujeito a consulta


pública;

3. Regulamento municipal que define as zonas de estacionamento proibido


sem que do mesmo conste qualquer preâmbulo;

4. Regulamento municipal que não foi aprovado pelo órgão competente.

André Rosa 6
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

André Rosa 7
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

APONTAMENTOS SEMANAIS DE DIREITO ADMINISTRATIVO


– AULAS PRÁTICAS
Aula de 17/03
Caso Prático n.º 3
4 etapas para resolver cada questão:
1. Identificar o parâmetro a que a norma regulamentar deve obediência (norma regulamentar, lei, etc.);
2. Verificar se existe obediência ou desobediência a esse parâmetro;
3. Identificar o tipo de ilegalidade em presença;
4. Determinar o prazo para impugnação da invalidade.

Identifique os vícios, quando existam:

1. Norma do PDM que viola o disposto no Programa de Ordenamento do Território;

Ambos são instrumentos de gestão territorial. O PDM é um regulamento administrativo com


eficácia externa, enquanto o POT é um regulamento com eficácia interna e externa.
Ou seja, neste caso uma norma regulamentar devia obediência a outra norma regulamentar.
O PDM tem de ser conforme com o POT, nos termos do artigo 27º do RJIOT.
O CPA, no 143º nº2, diz que são ilegais normas regulamentares que violem normas especiais-
temos aqui uma ilegalidade.
Tipo de ilegalidade em presença – não nos é dito qual a norma violada, pelo que não sabemos se é
uma ilegalidade orgânica, material ou formal. Assim, também não sabemos o prazo para invocar
essa ilegalidade, nos termos do CPA

2. Regulamento de avaliação dos discentes que não foi sujeito a consulta pública;

O regulamento de avaliação dos discentes é um regulamento administrativo com eficácia externa.


Para saber se esse regulamento tinha de ser submetido a consulta pública, temos de olhar para a
tramitação do procedimento regulamentar comum.
O nosso CPA, no que respeita aos regulamentos administrativos, prevê um procedimento
regulamentar (97º ss.). Este procedimento aplica-se aos regulamentos administrativos com eficácia
externa (135º CPA), mas, para suprir uma eventual inconstitucionalidade por omissão, também se
aplicam aos regulamentos com eficácia interna e aos híbridos. Aqui, esse problema nem se coloca.
Fases do procedimento regulamentar:
§ Fase preparatória:
- Iniciativa oficiosa
- Instrução (99º CPA) – ponderam-se os vários interesses coenvolvidos, e elabora-se um projeto
de regulamento, com uma nota justificativa das medidas adotadas
- Participação (100º e 101º) – através da audiência dos interessados (sempre que existir um
grupo de pessoas cujos direitos e interesses legalmente protegidos sejam diretamente afetados

1
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

por disposições do regulamento. Pode ser escrita ou oral, e há situações em que pode nem
sequer ter lugar) ou da consulta pública (casos em que existe um elevado número de
interessados, ou quando a natureza da matéria o exija. É necessário que haja publicação do
projeto de regulamento no DRE, e no sítio institucional da entidade competente. Depois, abre-
se um prazo de 30 dias para que todos os interessados possam apresentar propostas de
alteração do projeto de regulamento).
- Elaboração do projeto final de regulamento administrativo
§ Fase constitutiva – aprovação do regulamento administrativo;
§ Fase integrativa de eficácia – o regulamento é publicado e inicia a produção de efeitos.

Aqui, temos um regulamento que deveria ter sido sujeito a consulta pública (elevado nº de
interessados), e não o foi. Logo, o regulamento viola uma norma legal (100º nº3 c. e 101º CPA).
Estamos por isso perante uma ilegalidade formal/procedimental.
144º CPA – o prazo para invocação da ilegalidade.
144º nº1 – ilegalidades materiais e orgânicas (podem ser invocadas a todo o tempo).
144º nº2 – ilegalidades formais/procedimentais (a ilegalidade pode ser invocada no prazo de 6
meses. Há situações em que se afasta este prazo e a ilegalidade pode ser invocada a todo o tempo –
inconstitucionalidade, preterição da forma legal, preterição da consulta pública).

Neste caso, aplica-se o 144º nº2. Como o fundamento da ilegalidade foi a preterição da consulta
pública, a ilegalidade pode ser invocada a todo o tempo.

3. Regulamento municipal que define as zonas de estacionamento proibido sem que do mesmo conste
qualquer preâmbulo;

É um regulamento de uma autarquia local, uma PC pública que integra uma forma de administração
autónoma – regulamento autónomo (não confundir com regulamentos independentes, apesar de
grande parte dos regulamentos autónomos serem independentes).
Os órgãos autárquicos podem elaborar regulamentos:
- No âmbito das competências próprias ou exclusivas (241º CRP). Aqui, estamos perante um
regulamento independente;
- Ao abrigo de uma autorização legal. Aqui, trata-se de um mero regulamento que complementa
ou executa uma lei.
Estes regulamento sujeitam-se aos princípios da atividade administrativa (subprincípio da reserva
de lei). Há alguns regulamentos das AL que podem levantar questões, do ponto de vista da
compatibilização com o princípio da reserva de lei:
- Regulamentos em matéria de DLG – de acordo com o 165º b. da CRP, existe uma reserva
relativa da AR quanto à possibilidade de legislar relativamente a esta matéria, o que é
confirmado pelo artigo 18º nº2 e 3 da CRP. Todavia, a doutrina portuguesa entende que não
existe uma proibição de as AL regulamentarem nesta matéria. Isto significa que podem, de facto,
elaborar regulamentos sobre direitos fundamentais, desde que o façam ao abrigo de uma
autorização legislativa, ou de um decreto-lei autorizado pela AR, desde que limitem os seus
termos e não impliquem restrições acrescidas;

2
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

- Regulamentos em matéria tributária – podem criar regulamentos através dos quais introduzem
taxas. O regime geral das taxas é competência da AR. Quanto aos impostos, esta possibilidade
não existe. É uma reserva relativa da AR;
- Regulamentos em matéria sancionatória (criação de contraordenações) – o regime geral das
contraordenações prevê que a criação das contraordenações obedece ao princípio da legalidade.
Contudo, entende-se este princípio em sentido amplo em matéria contraordenacional, em bloco e
não em concreto. Logo, existe esta possibilidade.

Quanto à questão convocada – os regulamentos administrativos não têm de ter um preâmbulo. A


sua ausência não configura qualquer ilegalidade. Têm sim de prever, aquando da tramitação do
procedimento regulamentar, é uma nota justificativa com a justificação das medidas adotadas (199º
CPA). Só existiria ilegalidade se faltasse essa nota justificativa, que seria uma ilegalidade formal. O
prazo para a invocação desta ilegalidade seria, de acordo com o 144º nº2, de 6 meses (não se
verificando qualquer das exceções elencadas no mesmo artigo).

4. Regulamento municipal que não foi aprovado pelo órgão competente.

Novamente um regulamento autónomo.


Em matéria de aprovação dos regulamentos autónomos, temos 2 órgãos abstratamente competentes:
- AM
- CM
Como não sabemos o objeto do regulamento, não conseguimos definir qual o órgão competente.
Como o enunciado diz que foi aprovado por um órgão incompetente, estamos perante uma
ilegalidade orgânica.
144º nº1 – a ilegalidade poderia ser invocada a todo o tempo.

Caso prático nº4


Qualifique os seguintes atos administrativos, considerando a tipologia de atos administrativos
lecionada:

6 critérios a ter em conta nas respostas


- Atos primários – incidem pela primeira vez sobre uma situação da vida
- Atos secundários – incidem sobre um ato administrativo anterior (revogação/anulação, p.e.)
- Critério do autor
- Decisões (órgão singular)
- Deliberações (órgão colegial)

Critério dos destinatários


- Atos singulares (destinatário individualizado)
- Atos coletivos (órgão colegial)
- Atos plurais (ato que constitui, na verdade, um feixe de atos, embora apenas exista um
formalmente. Existem tantos atos quanto os seus destinatários)

3
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

- Atos gerais (conjunto inorgânico de pessoas, aplicados num determinado local, e esgotam de
imediato a sua produção de efeitos)

Critério do conteúdo
- Atos de conteúdo positivo (introduzem uma alteração na esfera jurídica do destinatário)
- Atos de conteúdo negativo (recusam a introdução de uma alteração na esfera jurídica do
destinatário)
- Atos de conteúdo ambivalente (afetam os destinatários e terceiros, introduzindo uma alteração na
esfera jurídica dos destinatários, e recusando essa alteração na esfera jurídica de terceiros).

Critério dos efeitos jurídicos


- Atos favoráveis (conferem situações de vantagem)
- Atos desfavoráveis (conferem situações de desvantagem)

Critério da relação jurídica


- Atos bipolares (referem-se a uma relação jurídica da qual apenas são parte o órgão competente e
o interessado, e que apenas afetam o interessado)
- Atos multipolares (adotados no seio de uma relação multipolar, afetando também terceiros)

1. Ato que aplica uma sanção disciplinar a trabalhador com um vínculo de emprego público.

- Ato primário (regula pela primeira vez uma situação da vida);


- Não é dito por quem foi adotado o ato, pelo que não sabemos se é uma deliberação ou uma
decisão;
- Ato singular (destinatário individualizado);
- Conteúdo positivo (alteração na esfera jurídica do destinatário);
- Ato desfavorável (mais especificamente, um ato impositivo);
- Ato bipolar.

2. Ato que indefere um pedido de atribuição de uma subvenção pública.

- Ato primário (incide sobre um pedido, e não um ato administrativo);


- Não sabemos se é uma decisão ou uma deliberação;
- Ato singular;
- Ato de conteúdo negativo (indeferimento) para Freitas do Amaral. Para Vieira de Andrade, é um
ato que confere uma situação de desvantagem (em sede de exame, convém fazer referência a
ambas as perspetivas);
- Ato bipolar.

3. Ato que determina a cobrança de uma quantia certa.

- Ato primário;
- Quanto ao autor, não sabemos;
- Ato singular;

4
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

- Ato de conteúdo positivo;


- Ato desfavorável (impositivo);
- Ato bipolar.

4. Licença de uso e porte de arma ilegal.

- Ato primário;
- Quanto ao autor, depende novamente;
- Ato singular;
- Ato de conteúdo positivo;
- Ato favorável (autorização entre a AP e um particular – autorização constitutiva. A diferença
para a permissiva é que o direito se constitui ex novo na esfera jurídica do destinatário. Na
permissiva, o direito já existe e o autorizado passa a poder exercê-lo);
- Ato bipolar

Caso prático n.º 5


Suponha que Ana Leonor requereu, em 20 de fevereiro de 2017, junto dos serviços de segurança social da
sua área de residência, a concessão de pedido de proteção jurídica ao abrigo do Regime de Acesso ao Direito
e aos Tribunais, aprovado pela Lei n.º 34/2004, de 29 de julho. No entanto, em 20 de julho do mesmo ano,
ainda não tinha sido notificada de qualquer decisão quanto ao seu pedido. Quid iuris? considerando que nos
termos do artigo 25.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho: “1 - O prazo para a conclusão do procedimento
administrativo e decisão sobre o pedido de protecção jurídica é de 30 dias, é contínuo, não se suspende
durante as férias judiciais e, se terminar em dia em que os serviços da segurança social estejam encerrados,
transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte. 2 - Decorrido o prazo referido no número anterior sem
que tenha sido proferida uma decisão, considera-se tacitamente deferido e concedido o pedido de protecção
jurídica”

Um interessado elabora um requerimento à AP no qual requer a concessão de um pedido de


proteção jurídica. Decorreu o prazo para a AP decidir, sem que o particular tenha sido notificado da
decisão. A AP poderia ter deferido ou indeferido o pedido.
Quando o interessado dirige este procedimento à AP, dá-se início a um procedimento
administrativo, que culminará numa decisão de deferimento ou indeferimento (102º CPA).
É necessário que exista um dever de decidir por parte da AP. Requisitos a cumprir pelo
requerimento para que exista este dever (13º CPA):
- o requerimento deve envolver o exercício da função administrativa (102º CPA);
- o requerimento deve ser compreensível, e dele deve resultar uma solicitação;
- deve dirigir-se ao órgão competente, sem prejuízo do disposto no 41º CPA (remessa oficiosa);
- deve ser apresentado dentro do prazo;
- não deve ter sido apresentado um requerimento pelo mesmo autor, com o mesmo pedido e
fundamentos, nos 2 anos anteriores.
Reunidos estes pressupostos, o órgão administrativo tem o dever de decidir, dentro do prazo para o
efeito. No final do procedimento, adota-se um ato administrativo de deferimento ou indeferimento.

5
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Em princípio, este requerimento deve ser elaborado por escrito (102º nº1), apenas o podendo ser
oralmente nos casos expressamente previstos na lei.
128º - prazo geral para a decisão num procedimento administrativo (60 dias, com possibilidade de
ser prorrogado até 90 dias). Este artigo é derrogado quando exista um prazo especial (25º nº1 da lei
34/2004 – 30 dias).
128º nº3 – o prazo começa a contar desde a entrada do requerimento no serviço competente.
87º CPA – regra geral da contagem de prazos. Estes só se contam em dias úteis, suspendendo-se em
dias não úteis (finais de semana e feriados). Caso o prazo termine num dia não útil, transfere-se para
o dia útil seguinte. Pode ser afastada por norma especial (25º nº1 da lei 34/2004 – o prazo conta-se
de forma contínua, sem suspensões). Logo, o prazo de 30 dias contou-se continuamente.

Notificação – ato jurídico através do qual se dá conhecimento ao interessado de que foi praticado
um ato administrativo. A situação descrita no caso (a falta de notificação do particular) é um
silêncio administrativo, que pode ser entendido de 2 formas:
- Omissão ilegal;
- Formação de um deferimento tácito.

A regra é a de que o silêncio administrativo consubstancia uma omissão ilegal (199º CPA), mas a
formação de uma omissão ilegal não impede a possibilidade de ser praticado um ato expresso de
deferimento ou indeferimento, e o interessado pode reagir a essa omissão ilegal:
- Junto da AP, através dos mecanismos de impugnação administrativa (reclamação e recurso - 184º
nº1 b. e nº2 CPA);
- Junto dos tribunais administrativos, elaborando um pedido de condenação da AP à prática do ato
legalmente devido (37º nº1 b. e 67º nº1 a. CPTA).
Se a omissão ilegal é a regra, o deferimento tácito apenas se forma nos casos expressamente
previstos na lei.
25º nº2 da lei 34/2004 - a ausência de notificação decorrido o prazo de 30 dias consubstancia um
deferimento tácito. Afasta-se assim a regra do CPA.
O deferimento tácito não preclude a possibilidade de a AP praticar um ato administrativo expresso,
o que não é desejável (seria contrário ao princípio da boa-fé):
- A AP pode atuar em conformidade com o deferimento tácito (situação ideal);
- Pode depois praticar um ato expresso;
- Pode ter decidido e não notificado o interessado (também aqui se forma um deferimento tácito).

Em relação ao deferimento tácito, existem possibilidades de reação do interessado, para garantir que
não será depois praticado um ato expresso pela AP:
- Junto da AP, formulando um pedido de reconhecimento da formação de um deferimento tácito,
dirigido ao órgão com competência decisória;
- Junto dos tribunais administrativos, formulando um pedido de reconhecimento, por sentença, dos
efeitos associados ao deferimento tácito (37º nº1 f. CPTA).

6
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

APONTAMENTOS SEMANAIS DE DIREITO


ADMINISTRATIVO - PRÁTICA

Aula de 23/03
Procedimento administrativo – a prática de qualquer ato jurídico tem de ser precedida
por um procedimento administrativo, atos e formalidades tendentes à formação e
execução da vontade dos órgãos da Administração Pública. A Constituição exige a
procedimentalização da atividade administrativa, concretizada no CPA por um conjunto
de disposições respeitantes ao procedimento administrativo comum:
- Procedimento administrativo tendente à prática de um ato administrativo
primário;
- Dirigido à emissão de normas regulamentares (que, como já foi visto, se aplicam
às normas regulamentares com eficácia interna e externa);
- Respeitante às garantias administrativas;
- Respeitante à anulação e revogação;
- Dirigido à execução de atos administrativos.

A par do CPA, existem procedimentos administrativos especiais, aos quais se aplica, em


1ª linha, legislação especial, e o CPA apenas a título subsidiário:
- Procedimento disciplinar de um trabalhador com vínculo de emprego público (LGTFP);
- Procedimento tendente à emissão de uma licença de construção (RJUE);
- Procedimento tributário (LGT e Código do Imposto em causa);

O procedimento administrativo tem uma importância inegável, permitindo o


desenvolvimento da Administração Pública, esclarecendo a vontade desta e assegurando
a tomada de decisões úteis, justas e oportunas. Salvaguarda interesses e direitos dos
particulares, evita a burocratização e aproxima os serviços, assegurando a participação
dos interessados nas decisões que lhes digam respeito.
Aplicam-se 2 núcleos de princípios:
● Princípios gerais da atividade administrativa (legalidade, prossecução do interesse
público, justiça e razoabilidade, etc.);
● Deveres e princípios procedimentais, que se aplicam aos trâmites procedimentais
e que se dirigem aos sujeitos procedimentais. Cumpre esclarecer 2 questões:
1. Saber quem são os sujeitos procedimentais;
2. Quais são os concretos princípios procedimentais.

1ª questão: os sujeitos procedimentais são:


● Os interessados (artigo 68º CPA);
● Responsável pela direção do procedimento (artigo 65º CPA) – conduz o
procedimento durante toda a fase preparatória, e todas as subfases incluídas na

1
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

mesma. Finda esta fase, elabora um relatório (artigo 126º CPA), que deve ser
enviado para o órgão com competência decisória, que passa a dirigir o
procedimento administrativo (é o que acontece no procedimento tendente à prática
de um ato administrativo primário);
● Órgão com competência decisória (artigo 36º CPA, ainda que exista a
possibilidade de delegação;
● Órgãos com competência consultiva (artigo 91º ss. CPA).

2ª questão:
● Princípio da boa administração (artigos 5º e 59º CPA) – tem uma vertente
material, mas aqui olharemos para ele na sua dimensão procedimental. Exige que
a Administração Pública se paute por critérios de eficiência, economicidade e
celeridade;

● Administração eletrónica (artigo 14º CPA) – está relacionada com a


informatização da Administração Pública, que surge no contexto da sociedade da
informação, e visa dar resposta a exigências de eficiência e eficácia da mesma,
bem como exigências de simplificação e redução dos custos. Assegura um acesso
facilitado, por parte dos interessados, a informações disponibilizadas em portais
da internet por parte das entidades públicas. Satisfazem-se exigências de
transparência. A informatização da Administração Pública verifica-se quanto a 3
aspetos:
1. A nível da sua organização interna;
2. A um nível interadministrativo, assegurando a troca de informações entre
administrações;
3. Nas relações entre a Administração Pública e os particulares.

A Administração Pública deve assegurar a disponibilização de vias de acesso


alternativas, impedindo a discriminação entre cidadãos com e sem acesso a
recursos informáticos. Este princípio está concretizado em várias disposições do
CPA (artigo 61º - processamento do procedimento administrativo deve ser feito,
preferencialmente, por meios eletrónicos / artigo 62º - possibilidade de ser
iniciado um procedimento administrativo através do balcão eletrónico / artigo 63º
- ao longo do procedimento, as comunicações entre a Administração Pública e os
particulares devem ser feitas por fax, telefone ou correio eletrónico, desde que
haja o prévio consentimento do interessado. A própria notificação também pode
ser feita por via eletrónica – artigos 112º nº1 c., nº2 / 113º nº5 – se a notificação
for feita eletronicamente, apenas é eficaz a partir do momento em que o
interessado acede ao correio eletrónico).
Artigo 88º/1 – prazos que podem ser objeto de dilação; 88º/5 – não o podem ser
quando versem sobre atos praticados por meios eletrónicos.

2
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

● Colaboração com os particulares (artigo 11º CPA) – os órgãos da Administração


Pública devem atuar em colaboração com os particulares, prestando-lhes
informações que forem recolhidas.
Artigo 41º CPA – remessa oficiosa; é uma concretização deste princípio.
Artigo 116º/2 CPA – outra concretização.
Este princípio deve ser lido em conjugação com o princípio da administração
aberta.

● Princípio da administração aberta – relacionado com o direito à informação dos


cidadãos (268º CRP), que é um direito fundamental de natureza análoga aos
direitos, liberdades e garantias, sujeitando-se ao regime do artigo17º da CRP.
2 partes:
Artigo 268º/1 – direito à informação procedimental. É um direito titulado por
quem seja interessado no procedimento. O seu exercício pressupõe a existência
de um procedimento administrativo em curso, e o seu regime está nos artigos 82º-
85º CPA. Verifica-se não só quanto às resoluções finais, mas acompanha todo o
andamento do procedimento. Compreende 3 direitos:
1. Direito dos interessados à informação (82º CPA);
2. Direito à consulta do processo;
3. Direito à passagem de certidões.
4.
Artigo 268º/2 – direito à informação não procedimental. É um direito que pode
ser exercido por qualquer cidadão, independentemente de ser ou não interessado
num procedimento ou numa decisão da Administração Pública. O seu exercício
pressupõe um procedimento administrativo extinto. O seu regime jurídico está
previsto em legislação especial (Lei nº 26/2016).

Ambos os direitos suprarreferidos podem implicar o acesso a dados pessoais.


Quanto tal aconteça, estes direitos podem ser limitados em ordem à salvaguarda
destes dados pessoais.

● Princípio da participação (artigo 12º CPA) – Devem os órgãos da Administração


Pública assegurar a participação dos interessados em decisões que lhes digam
respeito, por meio da realização de audiência (artigo 267º/2 e 4 da CRP– princípio
da democracia participativa).
2 funções:
1. Função subjetiva – garantia de que se vão evitar decisões surpresa, e que
o interessado pode tomar parte no procedimento que lhe diga respeito,
podendo fazer valer as suas pretensões;
2. Função objetiva – assegura que a Administração Pública toma uma boa
decisão, consensual, e conforme com o bloco de legalidade.
A audiência realiza-se no procedimento administrativo tendente à prática de um
ato administrativo primário (121º-124º CPA) e no tendente à emissão de normas
regulamentares (100º CPA).

3
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

● Princípio da adequação procedimental (artigos 56º e 57º CPA) – introduz


flexibilização no procedimento administrativo, admitindo acordos
endoprocedimentais. Estes acordos são celebrados pelo responsável pela direção
do procedimento e pelo interessado, incluído ou excluindo certos atos ou
formalidades.
2 limites:
1. Têm de ser compatíveis com ordens jurídicas injuntivas;
2. Devem ser reduzidos a escrito, e conter uma fundamentação das opções
tomadas.

● Princípio do inquisitório (58º CPA) – visa assegurar que a Administração Pública


adota uma posição ativa ao longo do procedimento administrativo, que se verifica
em 2 possibilidades:
1. Ser de iniciativa oficiosa;
2. Nos casos em que a iniciativa partiu do particular, deve a Administração
Pública proceder a todas as diligências necessárias para a preparação de
uma decisão legal e justa, mesmo que verse sobre matérias não
mencionadas pelo interessado.
Concretização deste princípio:
Artigo 115º/1 CPA – dever de a Administração Pública averiguar, oficiosamente,
todos os factos cujo conhecimento seja necessário à adoção de uma decisão legal
e justa, dentro do prazo razoável, recorrendo a todos os meios de prova admitidos;

Artigo 116º/1 – possibilidade de averiguação oficiosa por parte do responsável


pela direção do procedimento, mesmo quando o ónus da prova cabia aos
interessados;

Artigo 160º/2 – os interessados devem assegurar a realização das diligências


necessárias, e abster-se de recorrer a diligências inúteis e a expedientes dilatórios.

● Princípio da boa-fé procedimental

● Princípio da gratuitidade (artigo 15º CPA) – em regra, o acesso à Administração


Pública é gratuito. Há casos, todavia, em que a lei exige o pagamento de certas
taxas e despesas procedimentais. Quando assim seja, a falta de pagamento
constitui uma causa de extinção do procedimento (artigo 133º CPA).

● Princípio da decisão (artigo 13º CPA) – nos casos em que o procedimento é


iniciado pelos interessados, este deve apresentar um requerimento que reúna uma
série de pressupostos, já abordados em aula anterior. Uma vez observados todos
os requisitos, o órgão competente fica vinculado a um dever de decidir, e deve
fazê-lo dentro do prazo que dispõe para o efeito (128º CPA – 60 dias, podendo ser
4
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

prorrogado até 90 dias. Este prazo só se afasta quando disposição especial preveja
um caso distinto). Em matéria de contagem de prazos, o artigo 87º CPA prevê que
os prazos se suspendem em fins de semana e feriados e, se o prazo terminar em
dia não-útil, transfere-se para o dia útil seguinte.
Se a Administração Pública não tomar a decisão, incorre em silêncio
administrativo, que se pode consubstanciar numa omissão legal (129º CPA), ou
num deferimento tácito, quanto tal esteja legalmente previsto.

Caso prático n.º 6

Considere o seguinte Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte2:


Processo: 01993/08.5BEPRT Secção: 1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acórdão: 02-04-2009 Sumário: “I. A distinção entre informação
procedimental e não procedimental assenta no tipo de informação que está em
causa, na qualidade de quem a solicita e no distinto objectivo que se pretende
atingir com a sua tutela. II. O direito à informação tem natureza procedimental
quando a informação pretendida está contida em factos, actos ou documentos de
um concreto procedimento em curso. III. O referido direito tem natureza não
procedimental quando se trata de acesso a documentos administrativos contidos
em procedimentos já findos ou a arquivos ou registos administrativos, neste caso,
mesmo que se encontre em curso um procedimento”. IV. As duas modalidades de
informação cumprem objetivos distintos: enquanto a informação procedimental
visa a tutela de interesses e posições subjetivas diretas daqueles que intervêm (ou
podem intervir) num procedimento, a informação não procedimental visa
proteger o interesse mais objetivo da transparência administrativa (cfr., entre
outros, Acs. deste TCAN de 22/06/2006 - Proc. n.º 00028/06.7BEPNF, de
16/10/2008 - Proc. n.º 00319/08.2BEPNF).

1. Toda a atividade da Administração Pública é sujeita a um procedimento


administrativo prévio?

A atividade da Administração Pública pode traduzir-se na prática de atos jurídicos ou não


jurídicos. Os atos jurídicos desencadeiam a produção de efeitos jurídicos, enquanto que
os não jurídicos, embora não desencadeiem esses efeitos, podem ter relevância jurídica.
Em princípio, apenas a prática de atos jurídicos deve ser precedida de um procedimento
administrativo.
A exigência constitucional de procedimentalização da atividade administrativa (artigo
267º/5 CRP) é concretizada pelo artigo 97º do CPA. A par do procedimento comum,
previsto no CPA, existem procedimentos administrativos especiais, aos quais se aplica,
em 1ª linha, a respetiva legislação especial, e apenas a título subsidiário o CPA (artigo
2º/5 CPA).
5
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

2. Quando é que se pode considerar extinto um procedimento administrativo?

Em regra, o procedimento termina com a tomada da decisão final (artigo 93º CPA).
Contudo, pode não terminar com a decisão final. Há casos em que termina o prazo para
decidir sem que o particular seja notificado de qualquer decisão, casos em que se forma
um silêncio administrativo, silêncio este que pode ser uma omissão ilegal (artigo 129º
CPA), ou um deferimento tácito, apenas quanto tal seja expressamente previsto em norma
legal ou regulamentar.
Outras situações – pode também extinguir-se através de desistência ou renúncia (artigo
131º CPA), que pressupõem que o interessado elabore um requerimento dirigido à
Administração Pública, onde peça a extinção do procedimento, por renúncia ou
desistência. O órgão competente deve apreciar o requerimento e decidir, à luz do interesse
público, se deve ou não ser extinto o procedimento. A desistência apenas pode ter lugar
quando o procedimento tenha sido iniciado pelo interessado, enquanto que a renúncia
pode ter lugar independentemente da iniciativa.
Deserção (artigo 132º CPA) – se o procedimento estiver parado por mais de 6 meses, por
causa imputável ao interessado, deve ser declarado deserto, a menos que o interesse
público exija a sua continuidade.
Pode a lei exigir o pagamento de taxas e despesas procedimentais. Quando assim seja, a
falta de pagamento constitui uma causa de extinção do procedimento (artigo 133º CPA),
salvo em causa de comprovada insuficiência económica.
Pode ser extinto por inutilidade ou quando o fim pelo qual esse procedimento tenha
iniciado se torna impossível.

3. Quem são os interessados num procedimento administrativo?

Corresponde a uma das 4 categorias dos sujeitos do procedimento administrativo, prevista


no artigo 68º do CPA. São as entidades que podem dar início a um procedimento
administrativo.

2 tipos:
- Interessados que atuam em prosseguimento de interesses difusos (artigo 68º/1, 2 e 3,
última parte);
- Interessados que atuam em defesa de interesses próprios e diretos (artigo 68º/1 e nº1, 1ª
parte).
Podem ser pessoas singulares ou coletivas; saber que é interessado no procedimento é
importante para efeitos do direito à informação procedimental, previsto no artigo 268º da
CRP, que apenas pode ser exercido pelos interessados no procedimento.

6
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

4. A distinção entre informação procedimental e informação não procedimental tem


relevância no que se refere ao regime jurídico aplicável?

A informação procedimental está prevista no artigo 268º/1 da CRP. O exercício deste


direito pressupõe um procedimento administrativo em curso, e está limitado aos
interessados no procedimento. Quanto à informação não procedimental, está no nº2 do
268º CRP, pressupõe um procedimento administrativo extinto, e pode ser exercido por
qualquer pessoa, não necessitando de invocar qualquer interesse legítimo.
O direito à informação procedimental é regulado nos artigos 82º e ss. CPA (direito dos
interessados à informação, direito à consulta do processo e direito à passagem de
certidões).
O direito à informação procedimental está regulado na Lei nº26/2016.
Ambos os direitos podem ser limitados com vista à salvaguarda de dados pessoais.

7
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

APONTAMENTOS SEMANAIS DE DIREITO ADMINISTRATIVO


– AULAS PRÁTICAS
Aula de 30/03
Artigo 152º CPA - especificidade ao nível do dever de fundamentação. Os atos desfavoráveis são
sujeitos a este dever.
Artigo 114º CPA – os atos administrativos devem ser notificados aos seus destinatários (remissão
para o artigo 60º do CPTA). Uma coisa é os atos administrativos terem de ser notificados, outra é
saber se essa notificação é requisito de eficácia (articulação com o artigo 160º do CPA).
Artigo 160º CPA – os atos desfavoráveis dependem da notificação dos respetivos destinatários para
efeitos de eficácia (ex.: uma coima não pode ser aplicada sem que o destinatário tenha
conhecimento da mesma, e tenha possibilidade de recorrer da decisão).
Artigo 124º CPA – em certos casos, a audiência dos interessados pode ser dispensada. Um dos
motivos é o ato, no projeto de decisão, produzir efeitos desfavoráveis ao destinatário.

Princípios e deveres procedimentais: regem o procedimento administrativo e impõem-se aos seus


sujeitos (artigo 68º CPA – interessados, responsável pela direção do procedimento administrativo,
órgão com competência para a tomada de decisão, órgão com competência consultiva.)

Pareceres – não são atos administrativos, mas sim atos jurídicos instrumentais ou preparatórios.
São geralmente solicitados durante a fase de instrução. Os pareceres podem ser vinculativos ou não
vinculativos.
Se o parecer não é vinculativo, e o responsável pela direção do procedimento administrativo não o
seguir, não há nenhum vício subjacente, a não ser que não tenha sido uma escolha devidamente
fundamentada (artigo 152º/1 c) CPA – quando não se segue um parecer não vinculativo, deve essa
escolha ser fundamentada, sob pena de vício formal cuja consequência jurídica é a anulabilidade do
ato administrativo, nos termos do artigo 163º/1 do CPA).

O responsável pela direção do procedimento administrativo termina quando se chega à fase da


tomada de decisão, e com a elaboração de um relatório.

Fase da audiência prévia – parecer vinculativo desfavorável para um dos interessados.

Artigo 51º/3 CPTA – de todos os atos administrativos substantivos ou procedimentais, é possível


recorrer, nos termos dos artigos 51º e seguintes do CPTA. O contrário já não acontece. Alguns atos
administrativos, para efeitos do 51º do CPTA, não o são para efeitos do 148º do CPA. Esta
discrepância refere-se aos pareceres vinculativos, porque estes não são atos administrativos, mas
sim atos jurídicos preparatórios ou instrumentais.
Em nome da possibilidade de uma tutela preventiva, o artigo 51º/3 1ª parte do CPTA diz que os
pareceres vinculativos, para este efeito, são tratados como atos administrativos, permitindo aos
interessados a reação contenciosa contra os pareceres administrativos. Tal só é possível enquanto

1
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

não for emitido o verdadeiro ato administrativo. A partir daí, já só pode ser impugnado o ato
administrativo.
O não reagir contra o parecer vinculativo não invalida a possibilidade de reação contra o ato
administrativo.
Esta possibilidade de reação preventiva serve não só os interessados, mas também o próprio órgão
com competência decisória. Para os interessados, é algo indiferente se o ato administrativo é legal
ou ilegal, o que interessa é que seja favorável. Para o órgão com competência decisória, o que
interessa é que o ato administrativo seja legal, e não que seja favorável ou desfavorável para os
interessados. Logo, esta possibilidade de recorrer de um parecer vinculativo também é importante
para o órgão com competência decisória.

Princípio não referido na última aula: princípio da transparência.

Dever de informação – por parte da Administração Pública. Tem correspondência a dois direitos
fundamentais com natureza análoga a direitos, liberdades e garantias:
- Direito à informação procedimental (artigos 82º-85º CPA, artigo 268º/1 CRP);
- Direito à informação não procedimental (concretização do princípio da administração aberta,
previsto no artigo 17º CPA).

Situação hipotética – ficamos em 2º lugar num concurso público e queremos compreender o porquê
de não termos ficado em 1º. Pedimos a consulta dos documentos que instruíram o concurso público,
nomeadamente o currículo da pessoa que ficou em 1º lugar. Esta é uma situação de conflito com o
direito à proteção dos dados pessoais.
Para remediar este conflito, apenas se proporciona a informação que satisfaz as necessidades
invocadas, omitindo-se todas as informações irrelevantes que constam do currículo. Aplica-se o
princípio da proporcionalidade e da finalidade legítima.

Direito à informação não procedimental – acesso de qualquer cidadão a documentos sobre


procedimentos administrativos já extintos. Não é necessário que haja um interesse legítimo, nem é
necessário mencionar a existência de uma finalidade. Se a entidade administrativa concluir que os
documentos têm dados pessoais, devem solicitar a quem pediu esses documentos a informação
necessária para que seja possível fazer um juízo de ponderação, em função do qual poderá ser
permitido um acesso parcial aos documentos, ou impedir-se esse acesso.
A recusa, para ser legítima, tem de se fundar na lei.

Há um mecanismo de reação previsto nos artigos 104º e seguintes do CPTA, tanto para o direito à
informação procedimental como não procedimental.

Tramitação processual – aquilo que cada uma das partes no processo tem de fazer, como o tem de
fazer e em que prazos.
Urgente (mais simples e célere) e não urgente.
2
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Artigos 104º e 109º e seguintes CPTA – processos urgentes com tramitação simplificada e
acelerada. Os prazos são reduzidos para metade. Se o tribunal considerar que o pedido de
informação é procedente, a sentença vai condenar a entidade administrativa a facultar a informação
ao interessado, dentro de um determinado prazo.

Artigo 108º CPTA – este mecanismo vale quer estejamos perante uma recusa de acesso a
informação procedimental ou não procedimental.
A entidade administrativa não cumpre o prazo – se isso acontecer, apenas é necessário que o
interessado leve ao tribunal o conhecimento desse incumprimento. O tribunal condenará o
funcionário responsável (que tem na sua posse os documentos em questão) a pagar, diariamente,
uma sanção pecuniária compulsória, até que sejam finalmente facultados os documentos relativos
ao procedimento administrativo em questão. É um mecanismo muito eficaz.

Mecanismo específico para os casos de recusa face ao exercício de um direito à informação não
procedimental – queixa junto da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA).
Tem um efeito interruptivo relativamente ao prazo de reação junto dos tribunais. Passados 5 dias, a
decisão sobre a queixa é notificada. O prazo, que estava interrompido, retoma a contagem do zero
até aos 10 dias para recorrer aos tribunais.

Caso prático n.º 7


A Escola Básica Integrada 1,2,3/JI, Vasco da Gama, em Lisboa, pediu à Comissão de Acesso aos
Documentos Administrativos (CADA) que emitisse Parecer sobre a situação seguinte: “No dia 2 de Agosto
deu entrada na nossa escola um pedido de informação de um Encarregado de Educação onde é solicitada a
consulta dos processos de todos os alunos que tiveram lugar na escola, para que possa atestar da veracidade
de todos os elementos entregues, a fim de poder verificar se as crianças admitidas a frequentar a escola “se
encontram em todos os elementos que lhes garantam a prioridade” relativamente às suas filhas. Os elementos
que integram o processo individual de um aluno. São os seguintes: a) “Toda a informação identificativa dos
alunos, encarregado de educação e pais”; b) “Fotocópias de documentos identificativos, bilhetes de
identidade, cartão de utente, boletim de vacinas”; c) “Fotocópias de documentos comprovativos de morada”;
d) “Documentos informativos de situação de necessidades educativas especiais, relatórios médicos,
informação hospitalar e psicológica”; e) “Fotocópia de registo biográfico do aluno”, que, segundo
comunicou o estabelecimento de ensino, é documento que se prende com as classificações obtidas pelo
discente; f) “Informações pedagógicas”, que, ao que informou a Escola, se reportam aos planos e medidas,
eventualmente existentes, para a recuperação do aluno”.

Comente.

Neste caso prático: perspetiva de um titular do direito da proteção de dados e facultação abusiva de
informação a interessados.
A única coisa que a escola poderia facultar seria o comprovativo de morada.
O mecanismo de tutela a ser acionado é a responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos.
O que faz um ato de gestão pública são as normas que o regulam substantivamente. A decisão da
escola de facultar esta informação deveria ser regulada por normas de Direito Administrativo, pelo
3
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

que é um ato de gestão pública – responsabilidade extracontratual por facto ilícito decorrente de um
ato de gestão pública (Lei nº67/2007).
Por se tratar de um ato de gestão pública, ilícito, o enquadramento é dado pela Lei nº67/2007
(pressupostos: facto, dano, ilicitude, culpa, nexo de causalidade). Na Lei nº67/2007, encontra-se
uma figura que o Código Civil não prevê, para efeitos de culpa, que é o funcionamento anormal dos
serviços. No Direito Administrativo, se não for possível identificar o concreto agente, não deixa de
haver responsabilidade extracontratual, pois existe esta figura que preenche automaticamente a
culpa com um funcionamento anormal dos serviços, permitindo continuar o raciocínio.

4
André Rosa
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

APONTAMENTOS SEMANAIS DE DIREITO


ADMINISTRATIVO - PRÁTICO

Aula de 06.03.22
Análise do esquema disponibilizado no Sigarra.

Matéria do Procedimento Administrativo Comum tendente à prática


de um ato administrativo primário

Na 1ª pág., temos a enumeração das fases que compõem o processo administrativo,


podemos encontrar de outra maneira, mas materialmente é o mesmo:
> 1.ª Fase preparatória:
o Fase inicial;
o Fase instrutória;
o Fase da audiência dos interessados;
o Fase da preparação direta da decisão.
> 2.ª Fase constitutiva ou decisória;
> 3.ª Fase integrativa de eficácia ou complementar.

No que respeita à forma como o procedimento administrativo começa de iniciativa


externa ou iniciativa interna (2ª pág.):
> Procedimento administrativo iniciado a pedido de interessados (cfr. artigo 68.º,
n.º 1 CPA) através da apresentação de requerimento inicial, nos termos dos artigos
102.º a 109.º CPA.
Estes interessados, à partida, serão pessoas coletivas privadas ou pessoas singulares,
mas não necessariamente. Podemos estar perante um procedimento administrativo
iniciado por outras pessoas coletivas públicas.
O facto de ser um processo administrativo com iniciativa a pedido de um interessado
transporta para a figura do requerimento (art.º. 102º CPA). Não é qualquer pedido que é
dirigido à Administração Pública que pode ser considerado requisito. É necessário um
conjunto de elementos – artigo 102º.
Pode acontecer que assim não seja. Em nome do Princípio da Colaboração, a
Administração Pública (art.º 108º CPA) contacta com os interessados, procurando suprir
essas deficiências. Não rejeita logo. Quando não acontece, há possibilidade de rejeição
liminar. Nem sequer se dá início ao procedimento administrativo propriamente dito,
porque a falta desse elemento é tão essencial que leva a que liminarmente e antes de se
iniciar qualquer procedimento, esse requerimento seja rejeitado.
Como se articula com o dever de decisão? Olhamos para o artigo 102º CPA, mas também
para o artigo 13º CPA (fazer remissão para 129º e 130º CPA). Fala-se em dever de
decisão, quando apresentado requerimento pelos interessados – iniciativa externa. Para
que se imponha ao órgão de competência decisória, é necessário requerimento em que é
aposta pelo interessado uma pretensão que implique do órgão de competência decisória

Carolina Medeiros 1
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

o exercício de competência jurídico-administrativa, que tenha sido apresentado dentro do


prazo (quando existe), sob pena de o requerimento ser rejeitado liminarmente.
Para que haja dever de decisão, também é importante o requisito do art.º 13 CPA – que
não tenha havido quanto a esta mesma questão apresentada pelo mesmo interessado,
decisão sobre o pedido há menos de 2 anos, salvo alterações legislativas ou dos
pressupostos de facto. O facto de já ter havido um pedido idêntico apresentado pelos
mesmos interessados há menos de 2 anos é fundamento para que não haja lugar a decisão,
mesmo que se verifiquem os requisitos todos.

+ Pedido legível com identificação de quem o apresenta.

Verificados estes requisitos, considera se que o órgão de competência decisória está


sujeito a dever de decisão – dá início ao procedimento administrativo.

Os procedimentos administrativos de iniciativa externa (por particulares ou outras


pessoas coletivas públicas) têm a ver com o prazo de conclusão1. Havendo um dever de
decisão, num procedimento de iniciativa externa: se passa o prazo do artigo 128/1º CPA
e não sou notificado de nada, nem tenho conhecimento pela consulta do procedimento
que já foi praticado ato administrativo, como posso interpretar este silêncio?

Artigo 130º CPA – a formação do deferimento tácito é excecional, pois depende de norma
especial que o preveja. O art.º 130 faz uma remissão para normas especiais que prevejam
formação de deferimento tácito em situações de silêncio administrativo. No caso prático,
a lei de acesso ao direito é uma norma especial que prevê para aquele caso concreto a
formação de deferimento tácito.

Se apresentamos um requerimento dando início ao procedimento administrativo, pois


preenchidos os artigos 102º e 128º CPA, é iniciado o procedimento administrativo que se
deve concluir no prazo do artigo 128º/1. Termina esse prazo, temos silêncio
administrativo. Vamos ver se há norma especial que associa aquele silencio em particular
à formação do deferimento tácito. Se existir norma especial que associa esse efeito de
deferimento ao silêncio, nesse caso, forma-se deferimento tácito. Se não existir essa
norma especial, há lugar a omissão ilegal.
A partir daqui, se tenho deferimento tácito, é porque há a norma especial naquele caso. O
facto de existir deferimento tácito é preclusivo de um deferimento expresso? Se for algo
que implique da Administração Pública o reconhecimento do deferimento, se esse
deferimento implicar que a Administração Pública faça algo, há necessidade de contrapor
a formação de deferimento tácito à Administração Pública que ficou silenciosa, não
cumprindo dever de decisão.

1
NOTA: Este prazo está desatualizada no doc. do sigarra - art. 128º/1 CPA – os prazos de iniciativa externa
devem estar concluídos em 60 dias com possibilidade de prorrogação por 90 dias. Os prazos, nos termos
do art.º 87º CPA, contam-se em dias úteis.

Carolina Medeiros 2
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Apresento requerimento a solicitar apoio judiciário, faço requerimento, passa o prazo.


A formação de deferimento tácito (mal, mas o legislador não lhe associa esse efeito) não
preclude a possibilidade de indeferimento expresso. O interessado confia na confirmação
de deferimento tácito, mas é preciso uma atuação por parte da entidade administrativa
requerida.
Esta figura serve de alguma coisa? Sim; estando associada à reclusão, o afastamento da
possibilidade de indeferimento expresso. No limite, pode criar apenas falsas expectativas
ao interessado sem que sequer possa invocar o Princípio da Confiança Legítima. Como a
lei deixa em aberto a possibilidade de indeferimento expresso, a Administração Pública
não faz nada para que a lei o permita.
Prejuízos que resultem do incumprimento do prazo – figura da responsabilidade civil
extracontratual por factos ilícitos. Em teoria, pode funcionar. Basta verificar os 5
pressupostos. Na prática dos Tribunais, o problema está em o lesado conseguir provar
que, por causa do atraso na tomada daquela decisão, aconteceram aqueles prejuízos, que
não aconteceriam se não houvesse aqueles atrasos.

Formação de omissão ilegal – outra alternativa ao deferimento tácito. A pretensão do


interessado ficou por satisfazer, pois não foi decidida. Os mecanismos de reação podem
passar pela utilização de garantias administrativas (art.º 184º CPA e ss.). É possível
apresentar qualquer um dos recursos face a omissões ilegais de atos administrativos e não
só.
Utilização dos mecanismos de garantia, que têm algumas vantagens: não é preciso
advogado para fazer uso destes mecanismos. Forma mais célere, gratuita, em principio;
face às garantias contenciosas, passa pelo facto de quando fazemos uso de garantia
administrativa, a Administração ou entidade administrativa à qual apresentamos
reclamação ou recuso administrativo vai apreciar não só a legalidade do ato ou omisso
mas também a sua conveniência e oportunidade, coisa que os Tribunais não fazem.
A Administração Pública fiscaliza-se em si mesma. Não saímos do âmbito da função
administrativa. É preciso aplicar não só legalidade, mas também mérito. Art. 185º/3 CPA
– amplitude de controlo mais significativa em comparação com o que é feito pelos
Tribunais, em função do princípio da separação de poderes.

Figura da interrupção de prazos


Vantagem: se fizer uso das garantias administrativas (reclamação ou recurso), vou
suspender o prazo de acesso aos Tribunais, até que tenha uma decisão sobre a minha
reclamação ou recurso, ou termino o prazo para haver a decisão - o que acontecer
primeiro. Verificado esse evento que faz cessar essa suspensão, então retoma a contagem
para apresentar pedido junto dos Tribunais, não a partir do 0 (seria do 0, se fosse uma
interrupção), mas retoma até ao momento da apresentação da reclamação ou recurso.

● Mecanismos de garantia contenciosa

Carolina Medeiros 3
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

O pedido para reagir contra uma omissão ilegal é o pedido de condenação à prática de ato
legalmente devido – ideia de quando em causa esteja a prática de ato administrativo ou a
sua falta, temos 2 pedidos possíveis: pedido de impugnação ou condenação à prática de
ato legalmente devido.

- Impugnação: pedimos aos Tribunais Administrativos que extingam os efeitos


administrativos e de facto do ato administrativo praticado com fundamento na
anulabilidade desse ato administrativo. Temos ato administrativo desfavorável que
entendemos que é ilegal. Se os Tribunais Administrativos concordarem, consideram
procedente o pedido de impugnação, declarando nulo ou inexistente, extinguindo os
efeitos administrativos e efeitos de facto.
Efeito diferente, é o que se consegue com o pedido de condenação à prática de ato
legalmente devido: se o Tribunal der razão, condena a Administração Pública à prática
de ato administrativo. Em face de uma omissão ilegal, pede-se aos Tribunais não uma
impugnação de omissão ilegal, porque não se quer a extinção dos efeitos jurídicos, mas
sim uma condenação da entidade administrativa que cometeu a omissão ilegal
(condenação desta entidade à prática de ato administrativo). A esse propósito, vejamos o
art.º 71º do CPTA – refere, no caso do juiz considerar procedente, em que termos o
Tribunal pode condenar a entidade administrativa.

O legislador distinguiu o ato administrativo em falta consoante seja: totalmente


vinculado; tenha elementos discricionários; ou, apesar de ter elementos discricionários,
haja em redução de discricionariedade a 0. Isto, porque, no caso do ato administrativo a
praticar ser totalmente vinculado e no caso de o ato administrativo a praticar conter
elementos discricionários, mas haver redução a 0, sendo procedente o pedido de
condenação à prática de ato legalmente devido, o Tribunal condena a entidade
administrativa demandada à prática de ato administrativo com determinado conteúdo e
sentido. O Tribunal diz à entidade administrativa qual o ato administrativo que tem de
praticar. Pode fazê-lo sem violar o princípio da separação de poderes, porque é totalmente
vinculado à redução a 0 (por exemplo, quando a decisão está sujeita a parecer vinculativo
de uma entidade especializada na matéria).

Quando o ato administrativo contém elementos discricionários, mas não há redução da


discricionariedade a 0. Sendo o pedido procedente, o Tribunal só pode, sob pena de
violação do P. da separação de poderes, condenar a entidade administrativa à prática de
um ato administrativo cujo sentido e conteúdo será a entidade administrativa a definir.
Ideia de que a Administração Pública não atua no prazo que devia - não é por causa disso
que tem de preencher as pretensões dos interessados.
Resulta de autoiniciativa – partir da iniciativa do próprio órgão de competência decisória.
É necessário notificar os interessados – art.º 110 CPA. Também há um prazo para

Carolina Medeiros 4
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

conclusão dos procedimentos administrativos de iniciativa interna, previsto no art.º


128º/62 CPA.

Passada esta fase, o próximo passo a tomar é procedente à delegação obrigatória do art.º
55º CPA.
CPA 2015 prevê figura do responsável pelo procedimento. Garantir imparcialidade do
órgão com competência decisória que não tenha contacto direto com factos e interesses -
art.º 126º CPA - apenas tem contacto com o relatório.
Temos um órgão responsável por um conjunto de fases e uma competência decisória, que
toma a decisão e garante que produza os seus efeitos.
Garantia de uma maior celeridade do procedimento administrativo, porque temos alguém
identificado que é responsável pelas fases de instrução, audiência previa…e apresentação
do relatório ao órgão de competência decisória de modo a que esteja concluído num
determinado prazo.

Do ponto de vista da tutela da legalidade há um duplo controlo: responsável pelo


ato administrativo que elabora o relatório; órgão de competência decisória que olha para
o relatório numa perspetiva crítica e se perceber que há uma ilegalidade ao longo do
procedimento, não segue o proposto no relatório. Contacta o responsável pelo
procedimento administrativo de modo a que a ilegalidade seja emendada.

O responsável pelo procedimento administrativo – art.º 55 CPA – beneficia de delegação


obrigatória. A delegação é obrigatória e as competências cujo exercício se delega são
definidas pelo legislador.
O responsável pelo procedimento administrativo é que dirige as próximas fases.

Fase de instrução
Não basta invocação do facto, é necessário que seja produzida prova e se conclua para o
facto ser produzido.
Neste processo, são admitidas a prova documental, prova testemunhal e prova pericial.
Tarefa desempenhada pelo responsável pelo procedimento administrativo e órgão de

2
Não é o que esta indicado no documento facultado no sigarra. Prazo atual: 120 dias. O art.º é o mesmo,
mas o prazo é diferente.

Carolina Medeiros 5
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

competência decisória. É uma tarefa de apreciação dos factos e das provas muito
semelhante à levada a cabo pelo juiz no Tribunal. Não há aqui discricionariedade por
parte da Administração Pública. A apreciação da prova na fase de instrução não
corresponde a exercício de poder de discricionariedade, é a mesma coisa que o juiz faz
no processo judicial. Está em causa formar convicção segura quanto a verdade dos factos.
Não corresponde a exercício de discricionariedade, porque estamos a apurar a verdade
destes factos, fazendo uso das provas.

Nesta fase, impõe-se à Administração Pública uma atitude procedimental ativa. Os


interessados devem colaborar e esta colaboração é no sentido de fazer chegar ao
procedimento todos os factos relevantes e não contribuir com factos falsos com intuito
único de uma tomada de decisão errada. A Administração Pública não tem de contar com
isso, se o legislador impõe, independentemente da atitude dos interessados, que averigue
e produza ela a pratica necessária para a melhor decisão.
Por exemplo: prossecução do interesse público determinado. A fase de instrução é
orientada pelo princípio do inquisitório para espelhar a busca da verdade material. A
verdade do procedimento administrativo não é diferente da vontade real. O procedimento
administrativo serve para resolver problemas concretos. Impõe-se essa tarefa da
Administração Pública de averiguação da verdade dos factos e estabelecimento dos factos
verdadeiros que servirão à tomada de decisão. À fase de instrução segue-se a fase de
audiência previa dos interessados.
Esta fase dirige-se a evitar decisões surpresa e trazer ao procedimento administrativo os
interessados garantindo uma participação constitutiva.

A fase de audiência previa é uma fase que se inicia com notificação dos interessados para
audiência prévia - art.º 122 CPA - e pode ser dispensada nos termos do art.º 124º CPA.
Pode ser dispensada, mas de forma fundamentada. Não posso dispensar a audiência
prévia por não ter havido audiência prévia. Para ser legítima, tem de ser fundamentada,
sob pena de haver arbitrariedade da Administração Pública.

NOTA: Na folha do sigarra, refere-se o vício que resulta da falta de audiência prévia e
diferentes consequências associadas ao mesmo (quando não é realizada audiência e
deveria ter sido). Aqui, ocorre um vício formal, cuja consequência jurídica regra é a
anulabilidade. Não é um direito fundamental. Não significa que não possa existir
doutrina que defenda que é um direito fundamental. Mas a jurisprudência constante dos
Tribunais, vai no sentido de entender que não é direito fundamental a não ser em 2 casos:

Carolina Medeiros 6
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Posso ter vicio formal de preterição ou porque 1) não realizei audiência prévia ou porque
2) dispensei-a sem motivo nenhum (fundamentei a dispensa, mas não tem qualquer
enquadramento legal) ou porque 3) a dispensei sem fundamentar. Qualquer um destes
casos equivale a falta de audiência prévia e tem consequência de anulabilidade e, se
assim não é, é nulidade:
Audiência prévia preterida em procedimentos contraordenacionais e disciplinares –
nestes 2 casos, o direito é conferido pelo legislador como fundamental. Ao ser realizada,
há lugar a violação – al. d) do nº2 do artigo 161º CPA.

Fase de preparação da decisão - elaboração de relatório dirigido ao órgão de


competência decisória. Este terá em consideração o relatório para (fase constitutiva)
praticar o ato administrativo.
Art. 151º CPA – a forma do ato administrativo é forma escrita. O ato administrativo
concretiza-se em texto escrito que contém um conjunto de elementos concretizados neste
artigo. Alguns desse elementos são essenciais para que o ato administrativo exista
juridicamente como ato administrativo. A nulidade depende de uma norma especial que
preveja, para aquele caso, nulidade.

Casos de inexistência jurídica - pode haver norma legal. Em Direito Administrativo, não
há situação em que exista norma expressa à preterição de uma formalidade ou regra.

A preterição do autor do ato administrativo que não indica quem é o autor do destinatário
do ato administrativo e a não identificação do conteúdo e sentido do ato administrativo:
articulando com o art.º 155 CPA, nº2 – a doutrina entende que os elementos cuja falta
comporta inexistência jurídica de ato administrativo são os do art.º 155º/2 CPA, porque
só se considera que se praticou ato administrativo quando estes elementos estejam lá. A
falta de indicação do conteúdo destinatário e sentido do ato administrativo conduz à
inexistência jurídica do ato administrativo.

Uma vez praticado o ato administrativo por escrito e com os elementos que a lei exige,
chegamos à fase integrativa.
Há atos administrativos sujeitos a publicação obrigatória, mas todos os atos
administrativos devem ser notificados. A notificação de atos administrativos deve conter
elementos previstos no art.º 114º CPA.

Carolina Medeiros 7
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Quanto à forma de atos de notificação: art.º 112º/1 CPA – carta registada…


A notificação deve ser realizada sempre, há sempre lugar a esta, mas só constitui requisito
de eficácia nos atos administrativos desfavoráveis – art.º 160º CPA.
Os atos administrativos: só são recetícios; só dependem de notificação para produzir
efeitos jurídicos ou só são oponíveis à pessoa do seu destinatário3, a partir de notificação,
quando os seus efeitos jurídicos são desfavoráveis - art.º 160º CPA.

Posso apor cláusulas acessórias em atos administrativos: art.º 149º CPA.


Condição e termo: posso apor num ato administrativo um termo inicial e um final ou
uma condição suspensiva ou resolutiva.
A aposição destas cláusulas acessórias que condiciona a produção dos seus efeitos está
sujeita a determinados requisitos do art.º 149º CPA – fundamental, relevante para o ato
administrativo a praticar a apreciação quanto à sua adequação e necessidade por parte da
entidade administrativa, sob pena de se ter essa cláusula acessória como não lida. Se não
cumprir estes requisitos, condena-se que o ato administrativo não tem cláusula acessória.
Em vez de se considerar que o ato administrativo, por causa disso, é anulável, considera-
se que não tem cláusula acessória. O problema é nesta e não no ato administrativo.
Articulação com vícios e sanções associadas a esses do ato administrativo.

Esquema no sigarra com sindicação dos principais vícios e sanções jurídicas


associadas.
Quando falamos de vícios de ato administrativo, temos de distinguir os vícios
invalidantes e os vícios não invalidantes, ou seja, os que afetam a validade do ato
administrativo e os que não afetam a validade do ato administrativo, respetivamente.
Nos vícios invalidantes, distinguimos os vícios existentes em função do tipo de
norma violada:
• Se em causa estiver violação de norma de uma competência que diga que é o órgão
x, mas não é verdade, foi o órgão y – vicio orgânico.
• Se a norma violada for material, estabeleça requisitos relativos ao conteúdo e
sentido do ato administrativo a praticar ou elementos que projetem esse conteúdo
e sentido – vício material.
• Se se violar uma norma procedimental que estabelece trâmites procedimentais –
vicio formal.
É preciso identificar o tipo de norma violado. Em função disto, temos um vício orgânico,
formal ou material - associado a esse vício, temos uma consequência jurídica ou sanção:
invalidade. São vícios, invalidades que podem configurar-se em:
o Anulabilidade (regra – art.º 163º CPA);
o Nulidade: é consensual a existência de anulabilidade por determinação legal
expressa. Nas situações em que o legislador, numa norma, culmina com nulidade
um determinado vicio, a sanção jurídica é a nulidade. Mas, a doutrina entende que

3
As expressões sublinhadas são sinónimas.

Carolina Medeiros 8
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

para além da nulidade, (art.º 161º, 36º e outras normas especiais que preveem
nulidade), por determinação legal, também há nulidade por natureza – vícios tão
graves que, embora aos quais o legislador não tivesse associado nulidade,
entende-se que por se reportar à razão de ser do ato administrativo, deve ser
associada à nulidade e não anulabilidade).
o Situações de inexistência jurídica: não temos uma norma especial, temos sim
uma conclusão a que a doutrina e jurisprudência chegaram. Articulação dos
artigos 150º e 155º/2 CPA - há elementos do ato administrativo que, se não
presentes, conduzem à inexistência do ato administrativo como tal.

Vícios não invalidantes:


São aqueles que não afetam a validade jurídica do ato administrativo. Reportam-se à
ineficácia em que em causa está a violação de normas que estabelecem requisitos de
eficácia de produção de efeitos – figura da irregularidade. Temos exemplos de
irregularidade no art.º 48º CPA. Não se retira nada dessa irregularidade, porque o ato é
válido e eficaz. Declarar ou intentar recurso é perda de tempo. Não há consequência
jurídica que se extraída da irregularidade.
É importante determinar se em causa está um ato administrativo nulo, anulável, ou
inexistente pois os seus regimes são diferentes.
Um ato administrativo anulável produz efeitos jurídicos e, de facto, até ao momento em
que é anulado. Havendo um prazo para a sua anulação, no caso da nulidade e da
inexistência jurídica, não há lugar à produção de efeitos jurídicos, mas pode haver lugar
à produção de efeitos de facto. Em regra, não há prazo para pedir a declaração de nulidade.
Quando temos um ato administrativo nulo, não temos efeitos jurídicos, mas podemos
ter efeitos de facto.
Soluções do legislador:
1) Reconhecer efeitos putativos aos efeitos de facto – as pessoas estão de boa fé, não
se devia deixar chegar a esse ponto, mas reconhece-se esses efeitos.
2) O interesse público sobrepõe-se a essa condição – repor a situação que existiria se
o ato administrativo não tivesse sido realizado e indemnizar os 3º de boa fé.
3) Alterar o padrão de legalidade, por forma a que o ato nulo seja válido.

Carolina Medeiros 9
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

APONTAMENTOS SEMANAIS DE DIREITO


ADMINISTRATIVO - PRÁTICA
Aula de 20.04.22
CORREÇÃO DA MINI-FICHA

Nota prévia: a correção da ficha foi feita, maioritariamente, com base nas respostas dos
alunos presentes nesta aula prática, que a Sra. Professora Juliana considerou corretas.
1. Distinga sucintamente entre:

a) Remoção de veículo estacionado em espaço reservado a pessoas com deficiência


e parecer não vinculativo;

Resposta: estamos perante dois exemplos de figuras que são “afins”1 aos atos
administrativos. A remoção de um veículo estacionado em espaço reservado a pessoas
com deficiência não passa de uma atividade material e informal da Administração
Pública, em específico, uma atividade não jurídica – muito embora tenha relevância para
o Direito.
Por outro lado, os pareceres são atos jurídicos (mas não são atos administrativos). Estes
estão previstos no artigo 91° do CPA, podendo ser classificados como obrigatórios ou
facultativos e vinculativos ou não vinculativos.
Tratando-se de um parecer não vinculativo, então este não deve ser seguido pelo órgão
competente para decidir. Contudo, devemos referir que, por mais que o parecer não seja
vinculativo, o órgão com competência decisória tem o dever de fundamentação da razão
de não o ter seguido, conforme consagra a alínea c) do número 1 do artigo 152° do CPA,
sob pena de invalidade formal, traduzindo-se numa anulabilidade, prevista no número 1
do artigo 163° CPA. – David Silva
b) Atos administrativos e contratos administrativos;

Atos administrativos são atos unilaterais jurídicos que provêm de estruturas decisórias
que exercem poderes administrativos de autoridade que visam definir o direito aplicável
a uma situação individual e concreta, produzindo efeitos jurídicos externos e inovadores,
sem necessidade de assentimento dos seus destinatários. As consequências jurídicas que
decorrem da qualificação de um ato como administrativo são: 1. A possibilidade de
execução prévia; 2. A possibilidade dos atos, mesmo os ilegais e desde que não sejam
nulos ou inexistentes, adquirirem força e estabilidade de um caso decidido, tornando-se
insuscetíveis de impugnação administrativa pelo decurso do tempo; 3. Possibilidade da
Administração Pública, unilateralmente, revogar ou anular atos administrativos.
Contratos administrativos são acordos plurilaterais ou multilaterais, são negócios
jurídicos que resultam de um encontro de vontades entre dois ou mais contraentes. Para
um contrato ser considerado administrativo, pelo menos um dos contraentes tem de ser

1
A Professora Juliana, por questões de logística, alterava esta palavra, pois dá a entender que são figuras
idênticas aos atos administrativos, o que não são.

Carolina Medeiros 1
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

uma entidade pública e é-lhe aplicável o regime substantivo do Direito Administrativo


que vai criar, modificar ou extinguir uma relação administrativa.

Nota da Sra. Professora quanto aos contratos: um dos contraentes tem de ser uma pessoa
pública, podemos ter contraentes que não são pessoas coletivas públicas, podendo
abranger o conceito de pessoas públicas e assim enquadrar uma pessoa privada que
satisfaz as características de pessoa coletiva pública.
Dentro dos contratos, podemos ter contratos sujeitos ao Direito Privado (contratos não
administrativos, sem prejuízo de lhe serem também aplicados os princípios gerais da
atividade administrativa, art. 202°/2 CPA) e contratos públicos (regime substantivo é do
Direito Administrativo, que pode estar previsto ou no Código dos Contratos Públicos ou
em legislação especial - art. 200° CPA, depende do tipo de contrato e prestação que
constitui o objeto do tipo do contrato: se está sujeito a concorrência, está sujeito ao
Código. Ex: contrato de aquisição de serviços de organização de eventos culturais, sujeito
a concorrência. Ex: contrato de trabalho de funções publicas, aplica-se lei especial).
---
Contratos – acordos plurilaterais
Em relação à contratação publica, podemos ter contraentes públicos que não são pessoas
coletivas publicas, organismo de Direito Público – a possibilidade de pessoas coletivas
privadas poderem assumir a posição de pessoas coletivas públicas em matéria de
contratação.
Uma da partes do contrato tem de ser um contraente público, mas não tem de ser pessoa
coletiva pública, pode ser pessoa coletiva privada que preenche os requisitos de que a lei
faz depender.
Pelo menos uma das partes é um contraente publico. Podemos ter contratos públicos
sujeitos ao Direito Privado ou contratos não administrativos e contratos administrativos.
Temos dentro dos contratos públicos (sujeitos a regime de Direito Privado) contratos
administrativos que são negócios jurídicos plurilaterais ou bilaterais em que um dos
sujeitos é contraente publico mas cujo regime é de Direito Administrativo (que pode estar
previsto ou no Código dos Contratos Públicos ou em legislação especial – art. 20 CPA.
Depende do tipo de contrato e da prestação que constitui objeto do contrato.
Se estiver sujeito a concorrência, está sujeito ao Código – o seu objeto consiste na
realização de uma prestação sujeita a concorrência. Ex. Contrato de aquisição de serviços
de organização de eventos culturais.
Se não estiver sujeito a concorrência, não está sujeito ao Código – contratos
administrativos cujo regime jurídico substantivo de Direito Administrativo é o de
legislação administrativa especial: contrato de trabalho e funções públicas, sujeitos à lei
geral do trabalho e funções publicas.
Contrato de arrendamento ao abrigo do regime jurídico das rendas de apoio social.

Carolina Medeiros 2
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

c) Postura municipal de trânsito e circular

Postura
A postura municipal é um regulamento independente (são aqueles que introduzem uma
disciplina materialmente inovatória; o órgão com competência regulamentar é investido
com competência discricionária; esta discricionariedade só existe nesta categoria de
regulamentos, não existindo nas demais espécies) e um regulamento autónomo
(atendemos ao órgão com competência regulamentar, são adotados por um órgão que
integra uma pessoa coletiva pública e constitui uma forma de Administração Autónoma).
A definição jurídica legal resulta do artigo 135º CPA. Os regulamentos administrativos
distinguem-se dos atos administrativos, pela característica da generalidade e abstração.
Os regulamentos são gerais e abstratos, tendo um número de destinatários e de situações
indetermináveis. Na parte final do artigo 135º CPA diz que os regulamentos
administrativos visam produzir efeitos jurídicos externos. O regulamento administrativo,
quanto à sua eficácia, pode ser interno (os efeitos jurídicos apenas fazem sentido no seio
da pessoa coletiva que os emana) e externo (os regulamentos cujos efeitos jurídicos se
fazem sentir para fora da pessoa coletiva que os emanou).

Circular
Regulamentos com normas com eficácia interna, não produzem efeitos externos.
O artigo 135º CPA tem, diferentemente, uma função de delimitar o âmbito de aplicação
objetiva do CPA, isto significa que este conceito dado pelo CPA de regulamento
administrativo limita-se aos regulamentos administrativos com eficácia externa,
decorrendo daqui que as normas do CPA que tenham como objeto regulamentos
administrativos só se vão aplicar aos regulamentos administrativos com eficácia externa.
O CPA aplica-se aos regulamentos administrativos de eficácia interna, mas apenas quanto
às normas respeitantes aos Princípios Gerais da Atividade Administrativa, e todas as
demais normas que não tenham por objeto apenas os regulamentos administrativos.
No artigo 217º/5 CRP retiramos uma exigência constitucional de procedimentalização da
atividade administrativa. A prática de atos jurídicos, tem sempre de ser antecedida de um
procedimento administrativo. Esta exigência constitucional é concretizada através do
CPA, sem prejuízo de existirem procedimentos administrativos especiais.
O Procedimento Administrativo que respeita ao regulamento é o procedimento
regulamentar e está previsto nos artigos 97º e ss CPA. Este procedimento vai se aplicar a
todos os regulamentos ou apenas aos Regulamentos Administrativos com eficácia
externa. Tem se entendido que, se apenas aplicássemos o procedimento regulamentar aos
regulamentos administrativos com eficácia externa, haveria uma inconstitucionalidade
por omissão, e portanto seria violado o artigo 267º CRP. Tem se entendido então que as
noções respeitantes ao procedimento regulamentar se aplicam quer aos regulamentos
administrativos com eficácia externa, quer aos regulamentos administrativos com eficácia
interna.
Dentro dos regulamentos administrativos com eficácia externa distinguem-se dois tipos
de normas regulamentares:

Carolina Medeiros 3
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

× Normas regulamentares imediatamente operativas - os seus efeitos jurídicos


desencadeiam direta e imediatamente na esfera jurídica dos destinatários, sem
necessidade da prática de um ato administrativo ou decisão judicial que desencadeie
essa produção de efeitos.
× Normas regulamentares mediatamente operativas - é preciso um ato administrativo
ou decisão judicial que desencadeie a produção dos efeitos jurídicos; os efeitos
jurídicos só mediatamente se fazem produzir na esfera jurídica dos destinatários.
Diana Reis
Artigo 135º CPA, parte final – os regulamentos administrativos podem ser, quanto à
eficácia, internos ou externos.
O artigo 135º CPA dá-nos uma noção de regulamento administrativo.
Se o artigo 135º só prevê uma noção de regulamento administrativo para efeitos de
aplicação do CPA, as normas do CPA só são aplicáveis a normas regulamentares com
eficácia externa. Há uma inconstitucionalidade por omissão.
Temos um ato jurídico, regulamento interno, que não tem nenhum procedimento previsto.

Artigo 184º e ss. CPA – remissão para o artigo 147º CPA.


Há duas interpretações possíveis:
a) Interpretação colada ao texto do CPA – só podemos usar contra normas com
eficácia externa (135º CPA);
b) Interpretação mais criativa – Ana Raquel Moniz defende a possibilidade de, como
temos um problema de garantia de legalidade, fazer uso das garantias
administrativas contra normas regulamentares com eficácia interna.

d) Responsável pelo procedimento administrativo e órgão com competência


decisória

Independentemente de o procedimento ser de iniciativa oficiosa ou de heteroiniciativa,


havendo lugar a procedimento administrativo, a sua tramitação está a cargo do
responsável pelo procedimento, a quem o órgão decisor deve delegar, salvo as
exceções enunciadas no artigo 55º/2 CPA.
Há lugar, então, a uma delegação obrigatória no responsável pela direção do
procedimento, previsto no artigo 55º CPA. Esta previsão é um dos passos mais
importantes pela celeridade e para garantir a imparcialidade do órgão com competência
decisória. Pode ser aberto um procedimento disciplinar para averiguar se houve o
cumprimento do dever e nenhum impedimento para não cumprir o prazo. As garantias
dos artigos 69º e ss. CPA valem para o responsável de direção do procedimento como
para o órgão de competência decisória.
O responsável pela direção do procedimento está previsto no artigo 55º CPA;
O órgão com competência decisória está previsto no artigo 36º CPA, ainda que exista a
possibilidade de delegação nos termos dos artigos 44º e ss. CPA;
O procedimento administrativo é essencialmente dirigido por dois sujeitos
procedimentais – o responsável pela direção do procedimento conduz o procedimento

Carolina Medeiros 4
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

administrativo até determinado momento; depois, será o órgão com competência


decisória a conduzir o que restar do procedimento administrativo. Concretamente, o
responsável pela direção do procedimento conduz o procedimento administrativo durante
toda a fase preparatória (iniciativa, instrução e uma fase de audiência dos interessados);
finda este fase, o responsável pela direção do procedimento elabora um relatório, nos
termos do artigo 126º CPA, que deve ser enviado para o órgão com competência
decisória, e a partir deste momento, quem dirige o procedimento administrativo é o órgão
com competência decisória – Diana Reis

e) Anulação e revogação
● Anulação: ato administrativo secundário que tem em vista a extinção dos efeitos
jurídicos de um ato jurídico anulável, extraindo consequências dessa
anulabilidade. Um ato anulado é um ato anulável que foi objeto de anulação.
● Revogação: é um ato administrativo, dirige-se à extinção de efeitos jurídicos de
outro ato administrativo, mas o fundamento é a falta de mérito ou oportunidade
do ato administrativo revogado. Art 165º CPA.

São ambos atos administrativos secundários.


Artigo 165.º
Revogação e anulação administrativas

1 - A revogação é o ato administrativo que determina a cessação dos efeitos de outro


ato, por razões de mérito, conveniência ou oportunidade.
2 - A anulação administrativa é o ato administrativo que determina a destruição dos
efeitos de outro ato, com fundamento em invalidade.

f) Anulabilidade e anulação

Anulabilidade – é um vício invalidante. Há um ato jurídico desconforme com uma norma


legal ou regulamentar e essa desconformidade tem associada uma sanção jurídica que é a
invalidade. Constitui a sanção jurídica regra no Direito Administrativo. O regime está
previsto no art. 163º CPA.
Diferente é a anulação: ato administrativo secundário que tem em vista a extinção dos
efeitos jurídicos de um ato jurídico anulável extraindo consequências dessa anulabilidade.
Um ato anulado é um ato anulável que foi objeto de anulação.
Anulabilidade – 2 aspetos olhando para o artigo 163º CPA:
Um ato anulável produz efeitos jurídicos e de facto até ao momento em que é objeto de
anulação ou anulado. Para haver a anulação, a qual pode ser feita pela Administração
Pública ou pelos Tribunais, é preciso que seja observado o prazo previsto na lei. Há um
prazo para anulação. Se eu não anular nesse prazo, eu deixo de o poder fazer. Apesar de
ser anulável, deixa de poder ser anulado. Não se convalida, continua inválido mas já não
posso extrair consequências jurídicas dessa anulabilidade. Consolida-se na ordem jurídica
e continua a produzir efeitos jurídicos e efeitos de facto sem que eu possa fazer algo em

Carolina Medeiros 5
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

relação a isso, em matéria de anulação, sem prejuízo da possibilidade de poder intentar


ação de responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos.
Há sempre prazo, independentemente do caso. Esse prazo tem de ser respeitado e se não
anular dentro daquele prazo deixo de poder anular e o ato produz efeitos sem problema,
apesar de ser anulável.
Se for um ato administrativo nulo, peço uma declaração de nulidade; se for anulável, peço
que seja anulado ou a sua anulação; se for um ato administrativo inexistente
juridicamente, peço declaração de inexistência jurídica.
NOTA: o nº5 do artigo 163º CPA é diferente do artigo 164º CPA.
Princípio do aproveitamento do ato administrativo – 163º/5 CPA.
Este princípio:
• Dirige-se quer à Administração Pública, quer aos Tribunais.
• Só é suscetível de funcionar perante atos administrativos anuláveis.
• Com este princípio, não se sana a anulabilidade. Daí a distinção com os
mecanismos previstos no artigo 164º CPA.
Não se torna válido um ato administrativo inválido, mas sim reconhece-se a invalidade,
porque se verificam determinados requisitos, opta-se por não extrair consequências
jurídicas da anulabilidade.
Imaginemos que nos é atribuído um subsídio e este ato administrativo que decide atribuir
o subsídio é anulável por um vicio de forma ou orgânico ou material, porque devia ter
sido solicitado parecer obrigatório e não foi. Esse ato administrativo é anulável. A
entidade administrativa responsável por essa atribuição de subsídio pondera anular ou não
esse ato administrativo. A avaliação que faz é: se tivesse solicitado parecer obrigatório,
sabendo que este não é vinculativo, teria concedido na mesma um subsídio deste valor?
Se não tivesse incorrido no vício que incorri, o ato administrativo praticado tinha o mesmo
conteúdo e sentido? Se chegar a essa conclusão, não faz sentido anular. Com a anulação
extingue-se os efeitos jurídicos do ato administrativo e obriga-se a Administração Pública
a praticar um novo ato administrativo sem vício. Dar início a novo procedimento, etc.
Se se conclui que o ato administrativo com o vício tem o mesmo conteúdo e sentido que
teria com o vício, para que é que vou anular? Neste princípio de aproveitamento do ato
administrativo, faz-se este juízo de ponderação pelos Tribunais ou pela Administração
Pública. Tentar perceber se o ato administrativo anulável com o vício tem o mesmo
conteúdo e sentido do que sem o vício.
Reconhece-se que o ato é anulável, reconhece-se o vício, mas opta-se por não anular, ao
abrigo deste princípio.
Faz sentido numa lógica de eficiência e eficácia e não se aplica se o ato for nulo ou
inexistente juridicamente.

Carolina Medeiros 6
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

g) Procedimento administrativo comum e procedimentos administrativos


especiais

A prática de qualquer ato jurídico tem de ser antecedida de um ato administrativo


(conjunto de atos e formalidades para a formação, execução e manifestação da vontade
dos órgãos da Administração Pública).
O procedimento administrativo permite o desenvolvimento da atividade administrativa,
esclarece a vontade da Administração Pública, assegura a tomada de decisões justas, úteis
e oportunas, salvaguarda direitos subjetivos e interesses legítimos dos particulares, evita
a burocratização e aproxima os serviços e assegura a participação dos interessados nas
decisões que lhes digam respeito neste contexto. O CPA prevê 5 procedimentos:
• O procedimento administrativo tendente à prática de atos administrativos
primários;
• O procedimento administrativo dirigido à emissão de normas regulamentares;
• O procedimento administrativo respeitante às garantias administrativas;
• O procedimento administrativo respeitante à anulação e revogação;
• O procedimento administrativo dirigido à execução de atos administrativos.
A par destes, existem procedimentos administrativos especiais previstos em legislação
especial e, a título subsidiário, aplica-se o CPA (ART. 2º/5 CPA) - neste contexto,
destacam-se o procedimento disciplinar de trabalhador com vínculo de emprego público;
o procedimento administrativo tendente à emissão de uma licença de construção; o
procedimento tributário; aquisição de nacionalidade, etc. – Catarina Loureiro

2. Considere as seguintes situações:

a) Uma norma regulamentar que define o horário de trabalho dos funcionários


de um instituto público

Regulamento administrativo com eficácia interna e, como tal, insuscetível de impugnação


contenciosa. A definição legal plasmada no artigo 135.º do CPA prevê somente os
regulamentos externos e apenas define o âmbito de aplicação do CPA. Assim sendo, as
disposições do CPA respeitantes a normas regulamentares apenas se aplicariam aos
regulamentos externos. Desta forma, gerar-se-ia uma inconstitucionalidade por omissão.
Esta inconstitucionalidade evita-se através da aplicação das disposições regulamentares
do CPA, de igual forma, aos regulamentos internos. Alguns autores entendem que as
garantias administrativas (184.º e ss.) poder-se-ão aplicar não só aos regulamentos
externos, como também aos regulamentos internos. Estando vedada a possibilidade de
impugnação contenciosa, poder-se-á recorrer aos mecanismos de garantia administrativa
no âmbito dos regulamentos internos.
Normas regulamentares com eficácia interna – dever de obediência a normas legais.
São aplicáveis os Princípios Gerais da Atividade Administrativa.
Obrigação de conformidade + disposição do art. 135º e ss. CPA.

Carolina Medeiros 7
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Artigo 136º/4 CPA

Habilitação legal

1 - A emissão de regulamentos depende sempre de lei habilitante.


2 - Os regulamentos devem indicar expressamente as leis que visam regulamentar ou,
no caso de regulamentos independentes, as leis que definem a competência subjetiva
e objetiva para a sua emissão.
3 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se independentes os
regulamentos que visam introduzir uma disciplina jurídica inovadora no âmbito das
atribuições das entidades que os emitam.
4 - Embora não tenham natureza regulamentar para efeitos do disposto no presente
capítulo, carecem de lei habilitante quaisquer comunicações dos órgãos da
Administração Pública que enunciem de modo orientador padrões de conduta na
vida em sociedade com, entre outras, as denominações de «diretiva»,
«recomendação», «instruções», «código de conduta» ou «manual de boas
práticas».

Referencia a norma regulamentar com eficácia interna

b) Um ato administrativo que aplica uma sanção disciplinar a um funcionário


público sem que este tenha sido ouvido

O direito a audiência previa não é direito fundamental, a menos que a CRP configure
como tal. Fá-lo em 2 casos.
Ato administrativo primário, singular, com conteúdo positivo, com efeitos jurídicos
desfavoráveis e bipolar. Aplica-se o procedimento disciplinar de um trabalhador com um
vínculo de emprego público, ao qual se aplica em primeira linha a Lei Geral do Trabalho
em funções públicas, e a título subsidiário o CPA; artigos 161º/1/d) CPA+ 269º/3 CPA –
Diana Reis

3. Imagine que a Universidade do Porto decidiu instaurar um procedimento


disciplinar a um funcionário seu, com um vínculo laboral de Direito
privado, por, alegadamente, faltar injustificáveis ao trabalho.
As regras que disciplinam o procedimento disciplinar são determinadas pela
natureza jurídica do ente ou pela natureza jurídica do vínculo? Justifique.

A UP é uma pessoa coletiva pública que tem a forma de fundação pública de Direito
Privado. Apesar disto, o seu regime quase nada tem de Direito Privado. É um regime
essencialmente de Direito Público e o Direito Privado surge na gestão de recursos
humanos e na gestão financeira e patrimonial.
Uma entidade pública, pessoa coletiva pública, que tem um trabalhador seu com vínculo
de Direito Privado. Foi intentado um procedimento disciplinar. Aplica-se o CC ou Lei

Carolina Medeiros 8
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Geral do Trabalho e Funções Públicas? Se se disser CC, tem se em consideração o vínculo


com a UP.
O que determina o regime jurídico aplicável é o vínculo do trabalhador e não a natureza
jurídica da entidade. Portanto, se o trabalhador tem vínculo de Direito Privado, o
procedimento disciplinar que lhe é instaurado será regido pelo Código Civil.
3. Considere as seguintes definições:
“Artigo 148º CPA
Conceito de ato administrativo
Para efeitos do disposto no presente Código, consideram-se atos administrativos as
decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos
jurídicos externos numa situação individual e concreta.”
“Artigo 51.º CPTA
Atos impugnáveis
1 - Ainda que não ponham termo a um procedimento, são impugnáveis todas as decisões
que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos
externos numa situação individual e concreta, incluindo as proferidas por autoridades não
integradas na Administração Pública e por entidades privadas que atuem no exercício de
poderes jurídico-administrativos.
2 - São designadamente impugnáveis:
a) As decisões tomadas no âmbito de procedimentos administrativos sobre questões que
não possam ser de novo apreciadas em momento subsequente do mesmo procedimento;
b) As decisões tomadas em relação a outros órgãos da mesma pessoa coletiva, passíveis
de comprometer as condições do exercício de competências legalmente conferidas aos
segundos para a prossecução de interesses pelos quais esses órgãos sejam diretamente
responsáveis.
3 - Os atos impugnáveis de harmonia com o disposto nos números anteriores que não
ponham termo a um procedimento só podem ser impugnados durante a pendência do
mesmo, sem prejuízo da faculdade de impugnação do ato final com fundamento em
ilegalidades cometidas durante o procedimento, salvo quando essas ilegalidades digam
respeito a ato que tenha determinado a exclusão do interessado do procedimento ou a ato
que lei especial submeta a um ónus de impugnação autónoma.
(…)”

São totalmente coincidentes?


Artigo 148º CPA – conceito de ato administrativo para efeitos substantivos. Para efeitos
de aplicação do regime substantivo, o legislador associa qualidades de um ato jurídico
como ato administrativo. Disciplina o procedimento do ato administrativo, os requisitos
de validade do ato administrativos, os elementos essenciais do ato administrativos, a
forma do ato administrativo, a execução do ato administrativos e também os mecanismos
de reação administrativa a usar contra um ato administrativo. Já no ato impugnável
previsto no CPTA, o legislador prevê as características do ato administrativo para efeitos
de acesso aos atos administrativos. Qual a ligação? Todos os atos administrativos para
efeitos do artigo 148º são atos administrativos impugnáveis para efeitos do artigo 51º

Carolina Medeiros 9
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

CPTA. O contrário não se verifica, porque há atos jurídicos que são tratados como atos
administrativos para efeitos do artigo 51º CPTA possibilitar o acesso aos Tribunais
Administrativos. Isso acontece com os pareceres vinculativo, o que nos leva para 2
disposições do art. 51º CPTA: nº2/b) e nº3/1ª parte.
Nº3/1ª parte – refere-se aos pareceres vinculativos, tratando-os como verdadeiros atos
administrativos. A segunda parte é aplicável a atos de exclusão de candidatos ou
concorrentes em procedimentos pré-contratuais, que são verdadeiros atos administrativos
para todos os efeitos. Para responder à pergunta, importa dizer que não são totalmente
coincidentes na medida em que o conceito do artigo 51º CPTA é ligeiramente mais amplo
que o conceito de ato administrativo previsto no artigo 148º CPA.
Art. 51º/3 CPTA:
Quanto aos pareceres vinculativos, só posso impugnar um enquanto não for praticado o
ato administrativo que surge desse parecer vinculativo. Só até esse momento se justifica
a tutela preventiva que levou o legislador a considerar esta exceção. O legislador diz que
tanto assim é, que se eu não impugnar o parecer vinculativo, não há problema, porque
não afasta da possibilidade de impugnar o ato administrativo que vier a ser aplicável.
Na 2ª parte, quanto aos atos de exclusão de candidatos, diz-se o contrário.

4. Suponha que em janeiro de 2021 foi concedida a Isabel uma licença de


construção. Por a licença de construção se reportar a uma zona de
proteção da faixa costeira, a mesma dependia de parecer prévio favorável
da Agência Portuguesa do Ambiente (APA).
Por discordar do sentido negativo do parecer concedido, o Município de
Espinho concedeu a referida licença nos exatos termos solicitamos por
Isabel.
Acresce que embora a referida licença respeite o disposto no PDM, o PDM
viola o disposto no artigo 1360º do Código Civil, de acordo com o qual:

“1. O proprietário que no seu prédio levantar edifício ou outra construção não pode abrir
nela janelas ou portas que deitem diretamente sobre o prédio vizinho sem deixar entre
este e cada uma das obras o intervalo de metro e meio.
2. Igual restrição é aplicável às varandas, terraços, eirados ou obras semelhantes,
quando sejam servidos de parapeitos de altura inferior a metro e meio em toda a sua
extensão ou parte dela.
3. Se os dois prédios forem oblíquos entre si, a distância de metro e meio conta-se
perpendicularmente do prédio para onde deitam as vistas até à construção ou edifício
novamente levantado; mas, se a obliquidade for além de quarenta e cinco graus, não tem
aplicação a restrição imposta ao proprietário”.
Que comentários esta situação lhe suscita?

A emissão de uma licença de construção é um ato administrativo primário: deliberação,


singular, conteúdo positivo com efeitos favoráveis e bipolar. A este ato administrativo é
aplicável o procedimento administrativo tendente à emissão de uma licença de
construção, ao qual se vai aplicar em primeira linha o RJUE, e a título subsidiário o CPA.

Carolina Medeiros 10
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Nos termos dos artigos 91º e 92º CPA, os pareceres são em regra obrigatórios e não
vinculativos, porém como aqui se aplica o RJUE, o parecer neste caso é vinculativo por
estar expressamente previsto na lei. O Município deveria ter obedecido ao parecer de
sentido negativo. Assim, o ato administrativo que seja oposto ao parecer, carece de um
vício formal que é a anulabilidade.
O Plano Diretor Municipal é um regulamento administrativo com eficácia externa, pelo
que se aplica o CPA. O Código Civil, não tem importância neste caso, porque os
Regulamentos Administrativos não se regem pelo Direito Privado, devendo obediência à
CRP, à lei e Princípios Gerais do Direito Administrativo, ao Direito Internacional e ao
DUE, segundo o artigo 143º CPA.
Correção: O princípio da legalidade não se aplica apenas a normas de Direito
Administrativo.
A licença é um ato administrativo autorizatório. O direito de propriedade é o direito real
por excelência e é elástico porque comporta um conjunto de faculdades que podem ser
comprimidas sem que o direito de propriedade seja afetado. Os civilistas entendem que a
faculdade de edificar está contida no direito de propriedade e o que faz a licença é eliminar
um obstáculo – autorização permissiva.
O direito de edificar está concretizado no PDM, e para os publicistas a licença é uma
autorização constitutiva. Na prática, independentemente da posição, é preciso licença
para edificar sob pena de estar a incorrer numa ilegalidade.
Neste caso, há a violação do CC cuja consequência é a nulidade (regra no Direito
Urbanístico). Quanto ao parecer vinculativo, a consequência também é a nulidade. - Diana
Reis

Carolina Medeiros 11
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

APONTAMENTOS SEMANAIS DE DIREITO


ADMINISTRATIVO - PRÁTICO
Aula 27/04/2022
Continuação da aula anterior

6. a) Qualifique, justificando, a licença concedida pela Câmara Municipal


de Espinho.

Ato administrativo que produz efeitos jurídicos favoráveis ao destinatário – autorização


permissiva (no 1º caso) ou constitutiva (no 2º caso). A doutrina diverge. O direito de
propriedade é constituído por um conjunto de faculdades.

O plano urbanismo traz a faculdade definida em abstrato de construir naquela zona, de


acordo com determinados limites, para essa faculdade abstrata transformar-se num direito
concreto.
Artigo 148º CPA – elementos de qualificação de um ato jurídico como ato administrativo.
Quanto ao tipo de ato administrativo – efeitos jurídicos favoráveis, enquadramos como
autorização permissiva ou constitutiva.
Ato administrativo primário positivo.
O facto de ser um ato deliberativo é importante por causa do regime jurídico aplicável.

b) Analise os fundamentos invocados pela associação de moradores e identifique os


vícios e correspondentes sanções.

● Argumento i) que não foram ouvidos durante o procedimento:


O critério que não permite chegar à conclusão de que a sanção associada ao vício de
preterição de audiência previa é nulidade ou anulabilidade, tem a ver com a configuração
do direito à audiência prévia. Tendencialmente, considera-se que o direito à audiência
prévia não é um direito fundamental, pois a CRP não o consagra dessa forma e da maneira
como o legislador ordinário o prevê, não permite ao intérprete chegar a essa conclusão.
Em regra, a preterição de audiência previa é relevante juridicamente, mas a consequência
jurídica associada é a anulabilidade e só assim não o é quando na CRP temos:
1. A audiência prévia no âmbito de procedimentos disciplinares – artigo 269º/3 CRP;
2. A audiência prévia, no âmbito de procedimentos contraordenacionais – artigo
32º/10 CRP.

Artigo 161º/2/d) CPA - remissão para artigos 32º/10 e 269º/3 CRP.


Fazendo um raciocínio de metodologia, a exceção não se verifica, logo a preterição de
audiência prévia é um vicio formal, cuja consequência jurídica é a anulabilidade – artigo
163º/1 CPA.

Carolina Medeiros 1
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Há situações em que a audiência prévia pode ser dispensável, sem que incorra em vicio:
Estas situações estão previstas de forma taxativa no artigo 124º CPA. A dispensa só se
pode fundar numa destas situações. Invocado uma destas situações, deve ser de forma
fundamentada.
Um dos motivos de dispensa é quando se chega à conclusão de que o ato administrativo
a praticar será totalmente favorável à pessoa do seu destinatário. Entende-se que dá para
dispensar a audiência prévia, porque a pessoa ficará satisfeita com o ato administrativo.
Para esse efeito, tem relevância perceber se o ato terá efeitos favoráveis ou desfavoráveis,
nessa perspetiva de dispensa ou não de audiência prévia, nos termos do artigo 124º CPA.
● Argumento ii) que a licença não identifica o seu destinatário:
Remissão do artigo 151º CPA para o 155º CPA, pois no art. 155 são enumerados (Mário
Almeida) aqueles que são os requisitos de existência jurídica do ato administrativo.
Elementos essenciais para que o ato administrativo exista enquanto tal e produza os
efeitos jurídicos que o ordenamento faz corresponder. Da leitura articulada destes artigos,
a doutrina e jurisprudência chegaram à conclusão de que a consequência jurídica da falta
de indicação do destinatário, autor e conteúdo e sentido do ato administrativo no seu texto
tem como consequência jurídica associada a inexistência jurídica.
● Argumento iii) que não foi respeitado o parecer vinculativo da Junta de Freguesia
da Ajuda:
O parecer é um ato jurídico preparatório. Regra geral, os pareceres são não vinculativos.
Para serem vinculativos, é necessária norma especial que atribua efeito vinculativo ao
parecer. O órgão com competência decisória, o responsável pelo procedimento
administrativo deve seguir o parecer, sob pena de o ato administrativo ser anulável.
Apesar de ser ato instrumental meramente preparatório, os pareceres vinculativos, apesar
de não serem atos administrativos para efeitos substantivos (artigo 148º CPA), são
tratados como se fossem para efeitos do art. 51/3/1ª parte CPTA - o interessado pode
impugnar o parecer vinculativo como se de um ato administrativo se tratasse enquanto
não for praticado um ato administrativo, propriamente dito. A partir desse momento passa
apenas a poder impugnar-se o ato administrativo. Esta previsão só é aplicável aos
pareceres vinculativos. Esta equiparação a atos administrativos não se coloca para
pareceres não vinculativos.
Garantias administrativas– artigos 184º e ss. CPA
Podemos fazer uso destas contra atos administrativos, omissões ilegais e normas
regulamentares com eficácia externa.
Artigo 147º CPA.
Parte da doutrina entende que as garantias administrativas também podem ser utilizadas
contra normas regulamentares com eficácia interna.

Carolina Medeiros 2
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Reclamação e recursos
Reclamação – dirigida ao autor do ato, omissão ou norma regulamentar com eficácia
externa.
É aplicável o regime comum da impugnações administrativas – artigos 184º a 190º CPA
+ regime específico dos artigos 191º e 192º CPA.
Recursos – garantias administrativas apresentadas junto de outros órgãos que não o autor
do ato administrativo, omissão ilegal ou norma regulamentar com eficácia externa.
Recursos hierárquicos – aplica-se o regime dos artigos 189º a 190º e 193º a 198º CPA.
Estes são apresentados para o imediato superior hierárquico, autor do ato, omissão ou
norma regulamentar com eficácia externa.
Recursos administrativos especiais – artigo 199º CPA – destacamos o recurso para o
delegante e o recurso tutelar.
Aos recursos administrativos especiais, aplica-se o regime geral dos artigos 184º a 190º
CPA e o regime dos recursos hierárquicos com as devidas adaptações, em tudo o que seja
compatível com o anterior.
Normas fundamentais:
● Artigo 189º e 190º CPA em articulação, no que diz respeito ao artigo 190º para o
Artigo 59º/4 e 5 CPTA.
● Artigo 185º CPA - no que diz respeito a este, nota especial para os nºs 2 e 3.
● Remissão no nº2 para o artigo 3º DL 4/2015.

Carolina Medeiros 3
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Caso prático nº9

Considere o seguinte requerimento:


Exmo. Senhor Presidente do Centro de Estágio do Conselho Distrital do
Porto da Ordem dos Advogados

BEATRIZ ANDREIA, Advogada Estagiária, titular da cédula profissional n.º 123456-


P, com domicílio profissional na Rua da Alegria, n.º 603A, 1.º andar, sala 6.1, 4100-
400 Porto, vem, nos termos e para os efeitos do disposto conjugadamente na alínea a)
do n.º 1 e nos n.ºs 2 e 3 do artigo 13.º e no n.º 3, in fine, do artigo 32.º do Regulamento
Nacional de Estágio, requerer a prorrogação do tempo de estágio pelo prazo de 6
meses, com efeitos a partir de 11 de novembro de 2018.
Pede deferimento.

A Advogada Estagiária,
Beatriz Andreia

1. Imagine que este pedido será de indeferir. Poderia dispensar a audiência dos
interessados? O indeferimento teria que ser fundamentado? Que menções
obrigatórias deverão constar do texto do ato?

Temos de tomar em consideração que este requerimento apresentado dá início a um


procedimento administrativo, considerando que da apresentação deste requerimento, nos
termos dos artigos 102º CPA e 13º CPA, resulta para o órgão de competência decisória
um dever de decidir. É necessário dar início ao procedimento administrativo, tendo em
vista a tomada dessa decisão que se consubstanciará na prática de um ato administrativo.
Sabemos que o pedido será para indeferir. Pode-se dispensar a audiência dos interessados
(art. 124º CPA)? Não, porque as situações são taxativas, estão previstas no artigo 124º
CPA. Se houvesse lugar a dispensa, esta dispensa seria injustificada, haveria preterição
ilegítima do direito de audiência prévia que acabaria na anulabilidade do ato
administrativo que decidiria este requerimento. O indeferimento teria de ser
fundamentado? Da CRP, não resulta dever de fundamentação geral, há um dever de
fundamentação a concretizar pelo legislador. O legislador constituinte não impõe que o
ordinário fundamente, quando não tem um dever. Artigo 268º/3/2ª parte CRP. É
concretizado pelo legislador ordinário no artigo 152º CPA – fazer remissão. Nos termos
da al. c)/1 deveria ter sido fundamentado. Os requisitos da fundamentação estão previstos
no artigo 153º CPA - expressa, vinculada.
À luz do homem médio, ignorando questões jurídicas que devemos aferir da insipiência
da fundamentação, considerando o ato administrativo praticado. Atendendo ao tipo de ato
administrativo praticado, a fundamentação pode ser mais ou menos complexa, longa ou

Carolina Medeiros 4
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

aprofundada. Em todo o caso, resulte claro para o destinatário do ato administrativo


considerando este parâmetro, todo o percurso cognoscível percorrido pelo responsável
pelo procedimento administrativo e pelo órgão com competência decisória até à prática
do ato administrativo. Devem constar as regras e princípios aplicáveis de forma clara e a
motivação que terá tanto mais relevância quanto mais discricionário for o ato.
Se houver lugar a preterição de dever de fundamentação ou se esta for insuficiente, temos
um vício formal por preterição de formalidade essencialmente, cuja consequência jurídica
é a anulabilidade. – al. d)/2/165º CPA. Por isto, isso permite ao órgão com competência
decisória, em momento posterior à prática do ato administrativo, sanar o vicio de falta de
fundamentação, fundamentando sucessivamente – ratificação (só é possível quando a
sanção correspondente ao vício é a anulabilidade – art. 164º CPA).
Distinção entre pp aproveitamento ato administrativo (163º/5 CPA).
Que menções obrigatórias deverão constar do texto do ato?
Redução do ato administrativo a escrito (artigo 10º CPA) e necessidade de o ato
administrativo conter os requisitos obrigatórios do artigo 151º CPA. A consequência é a
existência jurídica, nos termos do 155º CPA.

2. De que forma notificaria Beatriz Andreia e que elementos deverá conter a


notificação deste ato?

A questão está na identificação das normas especiais que qualificam certas garantias
administrativas em determinados casos como necessárias. Artigo 3º DL 4/2015 –
conjunto de expressões para se poder concluir que a garantia administrativa que preveem
é necessária.
Art. 114º/al. c) CPA - não é exigível ao destinatário, homem médio, ignorando questões
jurídicas, saber que a regra no ordenamento jurídico português é a de, p.e., recorrer ao
critério interpretativo do artigo 3º do DL, para chegar à conclusão de que o recurso é
facultativo ou necessário. Deve constar na notificação do ato administrativo, nos termos
deste artigo. E se não constar? Al. c)/ nº2.
Se o destinatário não sabia nada disto e recorreu aos Tribunais Administrativos — o juiz
chega à conclusão de que devia ter apresentado recurso hierárquico 1º, porque é
necessário.
Na notificação não está lá a indicação que exige a al. c) art. 114º. Por causa disto, o juiz
estabelece que manda suspender a instância, para o processo e dá o prazo para que o
interessado faça uso da garantia administrativa devida. O processo retoma ou não em
função da decisão tomada no recurso hierárquico. Se neste último é dada razão ao
destinatário e este fica com o problema resolvido, o problema extingue-se por inutilidade
superveniente.
Se o processo para, é apresentado recurso hierárquico que é indeferido e é conformado o
ato administrativo, o processo prossegue, tendo em consideração o ato praticado a decidir
o recurso hierárquico, pois pode conter elementos novos. O Tribunal passa a ter isso em
consideração. Cria-se uma dinâmica fundamental numa lógica de garantia efetiva da

Carolina Medeiros 5
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

posição jurídica dos destinatários – critério do homem médio, ignorando quanto a


questões jurídicas.
Remissão artigo 60º CPTA – a partir da notificação do ato administrativo começam a
contar-se prazos para fazer usos das garantias administrativas e contam-se os prazos para
acesso aos Tribunais Administrativos.
Artigo 60º/1 CPTA – se a notificação não contiver o sentido da decisão, nem sequer
começa a contar o prazo para fazer uso das garantias administrativas, nem das garantias
contenciosas porque o ato não é oponível à pessoa do seu destinatário. Não se sabe se é
desfavorável ou favorável. O elemento em falta é o sentido.
Nº2 do artigo 60º CPTA - o efeito é diferente, pois os elementos em falta são outros que
não o sentido.
Se a notificação não tiver um dos elementos a que se refere este artigo, o ato é oponível
ao destinatário e começam a contar os prazos, mas o legislador dá a possibilidade ao
destinatário de interromper a contagem, ao solicitar os elementos em falta ao órgão de
competência decisória. Se o fizer, interrompe os prazos. Se não o fizer, os prazos
prosseguem a sua contagem. Artigo 60º/2 CPTA.
Como é que se notifica? O CPA no artigo 112º dá a resposta a esta questão.
Edital, anúncio e através de contacto pessoal – formas de notificação excecionais,
limitadas a casos específicos. Prendem-se com a dificuldade de se encontrar a pessoa do
seu destinatário e com o facto de serem muitos os destinatários de um ato administrativo.
Em regra, as formas de notificação utilizadas são a via postal – carta registada e via
eletrónica.
Há presunções que o legislador prevê. A partir de determinado momento, presume-se que
a pessoa foi notificada – artigo 113º/1 (carta registada), 5 e 6 (correio eletrónico) CPA.
Notificação por via postal e notificação por via eletrónica – as presunções são diferentes.
As notificações por via eletrónica (artigo 122º/1/c)), só podem ter lugar em alguns casos
– nº2 – exigindo-se quando esteja em causa plataforma eletrónica, consentimento prévio
por parte do administrado. Este consentimento prévio tem de ser expresso? Não, pode ser
implícito, basta que o administrado tenha entrado em contacto por via de email com a
Administração Pública.

Carolina Medeiros 6
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Caso prático nº10

Imagine que António solicitou ao INFARMED - Instituto Nacional da Farmácia e do


Medicamento, IP, a emissão de licença para instalação de uma farmácia social.
António ficou profundamente surpreendido com o indeferimento do seu pedido,
atendendo que o parecer solicitado pelo órgão decisor apontava no sentido do
deferimento. Por outro lado, o INFARMED já havia deferido outros pedidos muito
semelhantes ao que apresentara.

INFARMED – instituto público – faz parte da administração indireta.


Emissão de licença para instalação de uma farmácia social – autorização constitutiva para
proceder à abertura de uma farmácia social. Ato administrativo primário, bipolar e de
conteúdo positivo, à partida. A licença foi indeferida – ato administrativo de conteúdo
negativo (ato de indeferimento), produz efeitos jurídicos desfavoráveis à pessoa do seu
destinatário.
Importa saber se o parecer era vinculativo ou não:
Se for vinculativo, artigo 51º CPTA – o órgão com competência decisória teria de ter
seguido e se não fez o ato de indeferimento tem um vicio formal de anulabilidade – 163º/1
CPA.
Se não for vinculativo, o órgão com competência decisória podia tê-lo seguido ou não.
Deveria ter fundamentado (al. c)/1/152º CPA). A consequência jurídica da falta de
fundamentação é um vicio formal, anulabilidade (artigo 163º/1 CPA).
Há uma potencial violação de um Princípio Geral da Atividade Administrativa —
princípio da igualdade.
Se o INFARMED já indeferiu pedidos semelhantes a este, mas o indeferimento neste caso
era igual, o Sr. António não poderia recorrer - não há igualdade na ilegalidade.
Vício material, consequência jurídica, à partida, é a anulabilidade.

Carolina Medeiros 7
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

APONTAMENTOS SEMANAIS DE DIREITO


ADMINISTRATIVO - PRÁTICA
Aula de 11/05/2022

Caso Prático nº11

Identifique os seguintes vícios e respetivas sanções:


1. Prática de um ato administrativo em incumprimento dos princípios gerais da
atividade administrativa;
Vício material, cuja consequência jurídica é a anulabilidade, nos termos gerais do artigo
163º/1 do CPA. Caso esse princípio seja constitucionalmente previsto, poderá o ato
administrativo ser sancionado com nulidade, nos termos da alínea d) do artigo 161º/1
CPA.

2. Ato administrativo que recusa o pedido de um particular a uma prestação a que


tem direito por lei;
O ato administrativo é desconforme com a lei. A norma violada reconhece ao
administrado uma determinada prestação que lhe foi recusada. É um exemplo clássico de
violação da lei em sentido estrito. A consequência jurídica será, à partida, a anulabilidade
(163º/1 CPA), exceto se tal direito for consagrado pela CRP como direito fundamental
[161º/2 al. d) do CPA].

3. Incerteza, ilegalidade ou impossibilidade do conteúdo ou do objeto do ato


administrativo;

O ato administrativo é nulo, de acordo com o art. 161º/2 al. c) do CPA. À partida, a
nulidade só é consequência jurídica quando seja, em concreto, associada a um
determinado vício. Tem de existir uma norma especial que a preveja, sendo a
anulabilidade a consequência jurídica regra para os vícios dos atos administrativos. Logo,
à violação da lei não podemos associar automaticamente a consequência jurídica da
nulidade.
De facto, existe um problema de ilegalidade, de violação do princípio da legalidade. É
preciso perceber, dentro disso, se existe alguma norma que especificamente determine a
nulidade para aquele caso.

4. Prática de um ato administrativo que prossegue um fim diverso daquele que a lei
impõe;
Vício material, por desvio de poder. Prosseguindo-se interesses privados, a consequência
jurídica é a nulidade (161º/2 e) CPA).

5. Prática de um ato administrativo com preterição da audiência prévia dos


interessados;

André Rosa 1
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Vício formal. Tendo em conta que é um direito fundamental, constitucionalmente


previsto, a consequência jurídica é a nulidade (161º 2 d) CPA)

6. Violação de parecer pelo ato administrativo praticado;


Se o parecer for obrigatório e não for pedido, o ato administrativo praticado é anulável
por violação de formalidade. Quando o parecer não é vinculativo, não tem de ser seguido
pelo órgão com competência decisória, resultando apenas um dever de fundamentação
(anulabilidade em caso de incumprimento deste dever). Se for vinculativo, tem de ser
seguido, sob pena de anulabilidade (nos termos gerais do 163º/1).

7. Falta ou insuficiência de fundamentação do ato administrativo praticado;


Quando exigida por lei, é vício formal, cuja consequência jurídica é a anulabilidade.
Artigo 153º CPA – tem-se em consideração o ato administrativo praticado, e as suas
circunstâncias.

8. Falta de assinatura ou de indicação do autor do ato administrativo;


Artigos 151º e 155º/2 CPA – vício material, cuja consequência jurídica é a inexistência
jurídica.
Notificação do ato administrativo é diferente do ato administrativo propriamente dito.

9. Falta de indicação do sentido, objeto ou conteúdo do ato administrativo;


Inexistência jurídica – artigo 60º/1 CPTA.

10.Prática de um ato administrativo com carência da sua forma legal;


A forma legal de um ato administrativo é, em princípio, escrita. Um vício de forma
ocasiona uma sanção de nulidade (artigo 163º/1 al. g) – preterição total da forma
legalmente exigida).

11.Prática de um ato administrativo não precedido de procedimento administrativo;


CRP – exigência de procedimentalização administrativa, acompanhada pelo CPA. É um
vício formal, cuja consequência é a nulidade (artigo 161º/2 al. l) CPA).
Em vigência de estado de sítio ou de emergência, é possível praticar atos administrativos
sem exigência de procedimento.

12.Falta de notificação do ato administrativo;


Nem sempre é condição de eficácia do ato (artigos 114º/1 e 155º/1 CPA).
Artigo 160º CPA – exceções em que o ato administrativo produz efeitos desfavoráveis,
nos quais a notificação dos destinatários se torna em requisito de eficácia.

André Rosa 2
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

13. Prática por um órgão administrativo de um ato administrativo fora das


atribuições da pessoa coletiva a que pertence;
Vício orgânico, de incompetência absoluta (artigo 161º/2 al. b) CPA). Não confundir com
a usurpação de poderes, que tem lugar quando existe a violação do princípio da separação
de poderes.
Atribuições – finalidades da pessoa coletiva.
Competências – poderes funcionais atribuídos aos órgãos da pessoa coletiva, para
prosseguir as suas atribuições.

14.Prática por um órgão administrativo de um ato da competência de outro órgão


administrativo da pessoa coletiva a que pertence;
Vício orgânico. Incompetência relativa, porque não há lugar à violação das atribuições da
pessoa coletiva. A consequência jurídica é a anulabilidade (artigo 163º/1 CPA).

15.Prática de um ato administrativo com erro sobre os pressupostos de facto, dolo


ou sob coação (física ou moral);
Erro sobre os pressupostos de facto – vício material, cuja consequência jurídica é a
anulabilidade. Pode ser um defeito na fase de instrução (estabelecimento da realidade
material, e averiguação de todos os factos relevantes para a tomada de uma decisão justa
pela Administração Pública), não tendo a Administração Pública levado a cabo todas as
diligências necessárias na averiguação dos factos e das provas apresentadas.
Coação – vício material, ao qual está associada a nulidade (artigo 161º/2 al. f) CPA).
Dolo – não está previsto no 161º, pelo que, à partida, a consequência jurídica associada é
a anulabilidade.

16.Ato administrativo que, sem violar a lei, ofenda um direito subjetivo ou um


interesse legítimo de um particular ou que ofenda a ordem pública e os bons
costumes;
Ex.: atuação da Administração Pública conforme à lei, que, ao abrigo do Regime Jurídico
da Reserva Agrícola Nacional, qualifica uma dada área como apta para atividades
agrícolas. Por causa disso, proíbe a edificação nessa área. O RJRAN permite isto, não há
qualquer violação da lei, pelo que não podemos falar de qualquer vício invalidante.
Contudo, poderá haver a violação de um direito subjetivo ou de um interesse legítimo dos
particulares. Isto tem relevância em sede de responsabilidade civil extracontratual, e não
em sede de validade do ato administrativo.
Artigo 171º RJUE – este artigo prevê a figura da expropriação pelo sacrifício. A
Administração Pública atua conforme à lei, mas dessa atuação resultam prejuízos para os
administrados, que devem ser compensados. Esta compensação não retira fundamento da
invalidade do ato administrativo.

17.Ato administrativo inconveniente ou inoportuno.


Reportamo-nos ao mérito do ato administrativo. Estes são fundamentos de revogação, e
não de anulação. Não podem ser objeto de apreciação pelos tribunais (isto em Portugal,

André Rosa 3
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

porque a falta de conveniência e oportunidade dos atos administrativos, noutros


ordenamentos jurídicos, é causa de ilegalidade).

Nota:
Regime da anulabilidade – artigo 163º CPA;
Regime da nulidade – artigo 162º CPA;
Inexistência jurídica = nulidade, quanto aos seus efeitos.

Anulabilidade
O regime dos atos anuláveis e o dos atos nulos são diferentes. O ato anulável produz
efeitos jurídicos, só pode ser impugnado dentro de um determinado prazo e dentro desse
prazo consolida-se, não podendo mais ser “atacado” pelos interessados (não se
convalida). O ato anulável é suscetível de ser emendado, por exemplo, fundamentando, a
posteriori, um ato administrativo que não teria sido fundamentado. Aqui, já se torna o ato
válido.
Artigo 173º/5 CPA – aproveitamento do ato administrativo: o ato administrativo
permanece anulável, mas opta-se por não extrair consequências jurídicas da
anulabilidade, com fundamento na irrelevância do vício.

Nulidade
O ato nulo não produz efeitos jurídicos, e a nulidade pode ser invocada a todo o tempo,
pela Administração Pública e pelos tribunais (salvo norma especial que preveja o
contrário). Os atos nulos não são suscetíveis de consolidação ou de emenda, embora
possam ser reformados ou convertidos.
A reforma e a conversão pressupõem que o conteúdo do ato é divisível, isto é, que a
nulidade apenas afeta determinados elementos do ato.

Problema – um ato nulo não produz efeitos jurídicos, e não pode ser executado. A partir
do momento em que um ato nulo é executado ou acatado pelo destinatário, o ato nulo
passa a produzir efeitos de facto, embora não produza efeitos jurídicos (ex.: licenças de
construção, quando violem o PDM, são nulas. Se o destinatário médio, ignorante quanto
a questões jurídicas, receber a licença, irá acatá-la e iniciar as obras de construção. O
problema passa por saber como o legislador atribui relevância jurídica a estes efeitos
práticos):
- Podemos, simplesmente, repor a legalidade, i.e., demolir o edificado e compensar o
proprietário de boa-fé com o pagamento de uma indemnização (ao abrigo da
responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos);
- Reconhecimento de efeitos putativos (artigo 162º/3 CPA). O administrado depositou a
sua confiança na validade da licença de construção. Não se trata de uma mera convicção
psicológica do mesmo. A ideia é acautelar a confiança destes administrados de boa-fé,
reconhecendo que o ato é nulo, mas atribuindo efeitos putativos aos efeitos fácticos
gerados ao abrigo de um ato administrativo nulo;

André Rosa 4
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

- Na opinião da Sra. Professora, esta 3ª via é uma fuga ao princípio da legalidade, e não
tem uma explicação racional. Ao invés das 2 soluções anteriores, o que os Tribunais
Administrativos têm vindo a propor à Administração Pública é a emenda do erro através
da alteração do padrão de legalidade. Permite-se que as Câmaras Municipais alterem os
planos urbanísticos, para que uma licença de construção nula deixe de o ser. Não se altera
o ato, mas sim a norma, tornando-se a norma conforme ao ato.

As garantias administrativas: reclamação e recurso

Há um regime comum, previsto nos artigos 184º-190º CPA.


- Regime específico da reclamação: artigos 191º e 192º CPA.
- Regime específico do recurso hierárquico: artigos 193º-198º CPA.
- Regime dos recursos administrativos especiais: artigo 199º.

Aspetos a destacar:
- No regime geral, há uma norma essencial, que é o artigo 185º/2 CPA, que tem de ser
articulado com o artigo 3º do DL que aprova o CPA em anexo. A utilização prévia das
garantias administrativas não constitui requisito prévio para o acesso aos Tribunais
Administrativos. Sendo a reclamação ou o recurso facultativos, o interessado tem ao seu
dispor 3 alternativas – recorrer diretamente aos tribunais, fazer uso das garantias
administrativas, ou fazer uso de ambos simultaneamente. À partida, o mais vantajoso será
fazer uso, primeiro, dos mecanismos da garantia administrativa, que são tendencialmente
gratuitos, e também não é necessário constituir advogado (artigo 11º CPTA – constituição
de advogado é uma exigência de acesso aos tribunais). Também são mecanismos mais
céleres.
Sendo o recurso às garantias administrativas facultativas, suspende-se o prazo de recurso
aos tribunais, pelo que o administrado nada perde ao recorrer primeiro a estes mecanismos
(artigo 190º/3 CPA – apenas retomam o curso com o decurso do prazo legal, ou seja
proferida decisão). Os efeitos do ato administrativo ou da norma regulamentar não se
suspendem (artigo 189º CPA). Isto quer dizer que os efeitos continuam a ser produzidos
na esfera jurídica dos administrados, exceto quando a Administração Pública decida
suspender esses efeitos (a pedido do interessado ou oficiosamente). Poderá também ser
apresentada uma providência cautelar pelo administrado (os Tribunais Administrativos
não decidem sobre a ilegalidade do ato/norma regulamentar. Apenas verificam a
existência ou não dos pressupostos para a suspensão da eficácia dos seus efeitos). Os
fundamentos apreciados pela Administração Pública são mais amplos do que os
apreciados pelos tribunais (185º/3 CPA – a reclamação e os recursos administrativos
podem ter por fundamento a ilegalidade ou o mérito, com exceção dos recursos tutelares),
o que consiste noutra vantagem a favor dos mecanismos de garantia administrativa.
Artigo 185º/2 CPA – excecionalmente, as reclamações e os recursos podem ser
necessários, quando a lei os denomina como tal. O legislador prevê um critério
interpretativo no artigo 3º no DL 4/2015, que aprova o CPA em anexo, permitindo aferir
quando estamos na presença de um recurso ou reclamação necessários.

André Rosa 5
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Artigo 225º LGTFP (Lei Geral dos Trabalhadores em Função Pública) – o trabalhador e
o participante podem interpor recurso hierárquico ou tutelar.
225º/4 – o recurso hierárquico ou tutelar suspende a eficácia do despacho ou da decisão
recorrida.

De acordo com o critério interpretativo suprarreferido, este recurso hierárquico tem


carácter necessário, de acordo com a alínea c) do nº1 do artigo 3º do DL nº4/2015. A
reclamação ou recurso necessários não suspendem o prazo de acesso aos tribunais, pois
este só começa a correr a partir do momento em que é tomada uma decisão sobre a
reclamação/recurso, ou quando termina o prazo legal para a tomada de decisão. Os efeitos
dos atos administrativos/normas regulamentares são suspensos (artigo 189º/1 CPA).

Recurso tutelar – apenas pode ter por fundamento a inconveniência ou a inoportunidade


quando a lei estabeleça uma tutela de mérito.

Poderá haver eventuais problemas de articulação entre os mecanismos de garantia


administrativa e de garantia contenciosa. Quando se opta por fazer uso de ambos ao
mesmo tempo, o CPTA estabelece formas de articulação:
- No caso de as garantias administrativas serem decididas primeiro, o processo judicial
extingue-se por inutilidade superveniente da lide, se a decisão for procedente para o
administrado;
- Se, pelo contrário, a reclamação e o recurso forem improcedentes para o administrado,
o processo judicial prossegue, tendo em conta os novos elementos trazidos pela decisão
da reclamação ou do recurso;
- Na hipótese rara de o processo judicial terminar antes da tomada de decisão no âmbito
da reclamação ou do recurso. Neste caso, o procedimento administrativo extingue-se,
independentemente de a sentença proferida pelo tribunal ser favorável ou desfavorável
para o administrado.

Para todos os recursos administrativos especiais, existe previsão legal expressa. No que
diz respeito ao recurso para o delegante/subdelegante, deve-se fazer uma interpretação
corretiva do artigo 199º/2 do CPA, com base no artigo 49º (existe uma contradição entre
estas 2 normas, que dispõem sobre o mesmo objeto de forma oposta. Enquanto o artigo
199º/2 prevê que tem de existir uma previsão legal expressa, o artigo 49º não faz depender
o recurso administrativo especial para o delegante/subdelegante de previsão legal
expressa).

Estes mecanismos de garantia administrativa, nos termos do artigo 146º CPA, podem
também ser utilizados no âmbito de normas regulamentares com eficácia externa.

Pode existir regimes especiais das garantias administrativas.

André Rosa 6
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

APONTAMENTOS SEMANAIS DE DIREITO


ADMINISTRATIVO - PRÁTICA
Aula de dia 18/05
Caso Prático n. º12

O artigo 186.º do CPA diz-nos quem tem legitimidade para reclamar ou recorrer – os
interessados diretos, os lesados por uma prática ou omissão legal de um ato administrativo
com eficácia externa.
Deste artigo é necessário, como manda o número 1.º, alínea b), remeter para o artigo 68.º
CPA, em especial para os números que se referem aos atores populares – aos cidadãos no
exercício dos seus direitos; assim como uma remissão para a Lei de Ação Popular, em
especial para o artigo 2.º deste diploma – todos os atores referidos nesta disposição são
considerados interessados para efeitos do artigo 186.º do CPA.

Todos os prazos procedimentais contam-se em dias úteis – artigo 87.º do CPA.

Segundo o artigo 191.º/3, o prazo para fazer uso de uma reclamação é de 15 dias.

Tendo em conta o artigo 193.º/3, o prazo depende:


“Quando a lei não estabeleça prazo diferente, o recurso hierárquico necessário dos
atos administrativos deve ser interposto no prazo de 30 dias e o recurso hierárquico
facultativo, no prazo de impugnação contenciosa do ato em causa”.
Ou seja, se for um recurso hierárquico necessário o prazo é de 30 dias.
Se for um recurso hierárquico facultativo dá-se uma remissão para o artigo 58.º/1 do
CPTA que dita que os atos anuláveis estão sujeitos a um prazo de 3 meses.
Para além disso, diz-nos o artigo 69.º do CPTA que:
● Se se pretender recorrer ao recurso hierárquico contra uma omissão ilegal, o
prazo é de 3 meses, segundo o artigo 69.º/1 do CPTA.
1
Duarte Nogueira
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

● Se se pretender recorrer contra um ato administrativo de conteúdo negativo ou


ambivalente, o prazo também é de 3 meses, segundo o artigo 69.º/2 do CPTA.

Depende, como o diz o artigo 197.º/4:


“No caso de ter havido incumprimento do dever de decisão, o órgão competente para
decidir o recurso pode substituir-se ao órgão omisso na prática desse ato, se a
competência não for exclusiva deste, ou ordenar a prática do ato ilegalmente omitido”.

Estando em causa um ato administrativo ou se reclama ou se recorre a recurso hierárquico.


Este pedido de reclamação ou recurso pode ser:
● Improcedente – há uma apresentação de reclamação ou recurso e a Administração
não dá razão ao particular e confirma o ato anterior praticado (dá lugar à
confirmação), mas o sujeito continua insatisfeito e por isso recorre ao tribunal.
O ato confirmativo não é um ato administrativo, ele apenas reitera o sentido, conteúdo e
fundamento do verdadeiro ato administrativo praticado, não altera nada. Por isso ao
recorrer ao tribunal, recorre-se contra o ato administrativo original. Não é o objeto de
reação contenciosa.
Para ser confirmativo tem de haver uma identidade total quanto ao conteúdo, sentido,
fundamento…do ato administrativo, se for em algo diferente já é um novo ato
administrativo, e se assim for, irá se reagir contenciosamente contra este.
● Procedente – A Administração deu razão ao particular abrindo caminho a várias
possibilidades:
o Reclamação – artigo 192.º/2 do CPA
O órgão competente pode “confirmar, revogar, anular, modificar ou substituir o ato
reclamado, ou praticar o ato ilegalmente omitido”.
Caso o sujeito continue insatisfeito, pode recorrer contenciosamente contra esse ato.
o Recurso – artigo 197.º/1 do CPA
“O órgão competente para conhecer do recurso pode, salvas as exceções previstas na
lei, confirmar ou anular o ato recorrido e, se a competência do autor do ato recorrido
não for exclusiva, pode também revogá-lo, modificá-lo ou substituí-lo, ainda que em
sentido desfavorável ao recorrente”.
2
Duarte Nogueira
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

No entanto, e como esta disposição indica, o caminho do recurso hierárquico tem uma
especificidade que o faz diferir face à reclamação.
Assim, há um requerimento que é dirigido ao superior hierárquico do ato administrativo,
mas o requerimento vai para o subalterno, pois este vai instruir o requerimento de uma
pronúncia dele sobre o que aconteceu e, só depois, o requerimento é enviado para o
superior hierárquico.
Ora, mas tendo em conta o artigo 185.º/4 CPA, o verdadeiro autor do ato não pode
modificar ou substituir o ato recorrido em sentido menos favorável ao recorrente – não
pode reformar para pior “reformato in pejus”.

Não, a alteração da fundamentação relativamente ao ato administrativo original, implica


estarmos perante um novo ato administrativo, como é falado no exercício anterior.

A Administração Pública deve encarar o destinatário tendo em contra um padrão do


cidadão médio ignorante de situações jurídicas e assim, há um conjunto de cuidados que
deve ter na notificação – o ato comunicativo, previsto no artigo 114.º do CPA.
Alínea c) do número 2 – indicação do órgão competente para apreciar a impugnação
administrativa do ato e o respetivo prazo, no caso de o ato estar sujeito a impugnação
administrativa necessária.
E se se esqueceram?
Artigo 114.º/4 – “Para efeitos do disposto na alínea c) do número 2, o reconhecimento
jurisdicional da existência de erro ou omissão na indicação do meio de impugnação
administrativa a utilizar contra o ato notificado não prejudica a utilização do referido
meio no prazo de 30 dias, a contar do trânsito em julgado da decisão jurisdicional”.
Quando um recurso ou reclamação são necessários, implica que se recorra a este antes de
recorrer aos tribunais administrativos – só é legítimo recorrer aos tribunais depois de ter
a decisão quanto à reclamação/recurso ou a partir do momento em que passa o prazo para
que haja lugar a essa decisão. A partir do momento em que se recorre a recurso ou à
reclamação começa-se a contar o prazo para recorrer aos tribunais.
Se a pessoa não souber que tenho de fazer isto primeiro, o facto de o não ter feito pode
levar à extinção do processo, por absolvição da instância por falta de um pressuposto
processual que é a interposição prévia de reclamação ou recurso hierárquico.

3
Duarte Nogueira
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Se tal possibilidade não estava na notificação a solução é a do número 4 do artigo 114.º -


em vez de o tribunal extinguir o processo, dá 30 dias ao interessado para fazer uso desse
mecanismo.

Caso prático n.º 13

Necessidade de conjugar o artigo 3.º do DL 4/2015, o artigo 185.º/2 CPA e o artigo


225.º/1 e /4 da Lei n.º 35/2014.
O artigo 185.º/2 do CPA implica uma remissão para o artigo 3.º do Decreto-Lei 4/2015
que nos diz que estamos perante um recurso necessário quando a disposição utiliza certos
termos, como por exemplo o mencionado na Lei n.º 35/2014, artigo 225.º/4 – “suspende”,
não obstante o número 1 deste artigo dizer que “o trabalhador e o participante podem
interpor recurso hierárquico ou tutelar…”.
Relativamente à segunda parte do artigo 225.º/4, que nos diz que “exceto quando o seu
autor considere que a sua não execução imediata causa grave prejuízo ao interesse
público”, é revogada tendo em conta o número 3 do artigo 3.º do DL 4/2014, que nos diz
que as impugnações administrativas necessárias têm sempre efeitos suspensivos da
eficácia do ato impugnado e o número do 4 do mesmo artigo que nos diz que “são
revogadas as disposições incompatíveis com o disposto nos números 2 e 3”.

4
Duarte Nogueira
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Caso prático n.º 14

Quando uma entidade adjudicante, ao qual seja aplicável o Código de Contratos Públicos,
queira celebrar um contrato administrativo regido pelo CCP, tem de praticar uma decisão
de contratar, em primeiro lugar.
Decisão de contratar – artigo 36.º CCP: é um ato administrativo que põe termo a um
procedimento dirigido a tentar perceber qual a melhor solução para dar resposta a um fim
de interesse público determinado, mas que ao mesmo tempo abre um novo procedimento
administrativo – pré contratual.
O tipo de procedimento pré contratual vai depender do tipo de contrato e do valor do
contrato que se decidiu contratar. Mas independentemente do tipo de procedimento, há
sempre alguns aspetos semelhantes em todos os tipos de elaboração contratual, por
exemplo, relativamente à conclusão:
● Adjudica-se – segue-se à celebração do contrato propriamente dito;
● Não adjudica (as causas de não adjudicação estão previstas no artigo 79.º CCP –
Sr. Professor Pacheco de Amorim diz que são taxativas, Sra. Professora Juliana
diz que são exemplificativas – a Sra. Professora fala da não adjudicação por
alteração das circunstâncias, por exemplo a pandemia que não está prevista nesta
disposição).

Esta deliberação da Câmara Municipal é nula pois não se observa o quórum – artigo
161.º/1/h) CPA.
O que posso fazer?
Apresentar uma reclamação.
Quanto ao recurso hierárquico, não se pode, pois não há uma relação de hierárquica, mas
sim de coordenação entre os órgãos. Mas há possibilidade de recorrer a recurso em sede
de Recursos Administrativos Especiais, como nos diz o artigo 199.º/1/c) CPA.
Os poderes de tutela são poderes de mera legalidade, nunca se podem permitir por esta
via, com fundamento no artigo 185.º/3 CPA, o que a constituição não permite, como nos
diz o número 3 do artigo 199.º a contrário.

Está em causa um vício material por violação de leis em sentido estrito cuja consequência
jurídica é a anulabilidade.

5
Duarte Nogueira
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Mas o ato foi praticado pelo delegado no exercício de poderes de delegação. Podemos
fazer uso da reclamação e em termos de recurso, fazemos uso do artigo 199.º/2 CPA:
recurso para o delegante.
Nota: necessidade de fazer uma interpretação corretiva, pois este número diz apenas “por
expressa disposição legal” e gera uma situação de antinomia/contradição interna de
normas com o que resulta do artigo 49.º do CPA – este define a relação da delegação e
um dos aspetos que a define é a possibilidade de se recorrer ao delegante ou subdelegante.
Ora este artigo 199.º/2 diz o contrário, fazendo depender de previsão expressa dessa
possibilidade.
Ora, a doutrina tem vindo a defender que o recurso para o delegante é sempre possível e
não depende de previsão legal expressa.

Em causa está um vício formal que implica a nulidade, nos termos do artigo 269.º3 da
CRP.
Estando em causa um vínculo público com o trabalhador, nos termos do artigo 225.º da
Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, está sujeita a recurso hierárquico ou tutelar
necessários.

Critérios de adjudicação são critérios da entidade adjudicante, que logo à partida, são
imutáveis, sob pena de se alterar as regras do jogo a meio e pôr em causa a imparcialidade
e a transparência – princípios fundamentais em matéria de contratação pública, e definem
o que deve ser valorizado pela entidade adjudicante para escolha da proposta.
Nesses critérios define-se se contrata:
● Com base apenas no preço – a proposta mais barata ganha;
● Com base no critério da proposta economicamente mais vantajosa, em que se
articula o preço com aspetos qualitativos da proposta que são definidos na decisão
de contratar.
Se estes critérios de adjudicação nulo não foi respeitado, o ato de adjudicação é ilegal,
nulo com base no CCP, e sendo que não há nenhuma informação adicional devemos
equacionar a aplicação de qualquer garantia administrativa.
Neste caso particular temos um regime específico de mecanismos de reação
administrativa, previsto no CCP, aplicando-se o CPA apenas subsidiariamente – ver
documento de Legislação Avulsa Relevante no sigarra.

6
Duarte Nogueira
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2021/2022

Há a possibilidade de reclamar ou apresentar recurso hierárquico, sabendo que o superior


hierárquico apenas pode, tendo em conta as competências exclusivas do subalterno,
ordenar a prática de ato em falta, pois não se pode substituir a ele.

7
Duarte Nogueira

Você também pode gostar