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Administrativo
2º Semestre
Os regulamentos administrativos constituem, nas palavras de Vieira de Andrade, "o nível inferior do
ordenamento jurídico administrativo", sendo os níveis superiores sucessivamente ocupados pelas normas
e princípios constitucionais, pelas normas de direito internacional e de direito comunitário, e pela lei
ordinária. Os regulamentos são, pois, uma fonte, mas uma fonte secundária, de Direito Administrativo.
Na medida em que se trata de uma norma jurídica, o regulamento pode ser imposto mediante a
ameaça de coação e a sua violação leva, em geral, à aplicação de sanções, sejam elas de natureza
penal, administrativa ou disciplinar.
2. Do ponto de vista orgânico, o regulamento é, em regra, ditado por um órgão de uma pessoa coletiva
pública integrante da Administração Pública.
Mas não só. Sendo o poder regulamentar um poder característico da função administrativa e sendo
esta função, por vezes, exercida quer por pessoas coletivas públicas que não integram a Administração
(por exemplo, o Parlamento) quer por entes de Direito Privado – também essas outras entidades
podem exercer, a título excecional, poderes regulamentares.
3. Do ponto de vista funcional, o regulamento é emanado no exercício do poder administrativo.
Este aspeto é sobretudo relevante naqueles casos em que o órgão considerado não é exclusivamente
órgão da Administração – como sucede com o Governo e com as assembleias legislativas regionais que,
para além de órgãos administrativos, são também órgãos políticos e legislativos respetivamente.
Espécies de regulamentos
No âmbito relação dos regulamentos administrativos face à lei, é possível efetuar uma distinção entre:
Se uma lei estabelece que os alunos economicamente desfavorecidos poderão beneficiar de bolsas de estudo a
conceder pelos Serviços Sociais da Universidade, nos termos que estes, mediante regulamento, venham a definir. É
evidente que esta só poderá ter efetiva aplicação aos casos concretos da vida real com a elaboração de um
regulamento complementar, que estabeleça, por exemplo, as condições em que os interessados podem usufruir de
tais benefícios, o montante da bolsa a atribuir, o elenco dos documentos que hão-de acompanhar o pedido da bolsa.
Os regulamentos complementares ou de execução podem, por sua vez, ser espontâneos ou devidos.
No primeiro caso, a lei nada diz quanto à necessidade da sua complementarização. Contudo, se a
Administração o entender adequado e para tanto dispuser de competência, poderá editar um
regulamento execução.
É o caso dos regulamentos que as autarquias locais e as Regiões Autónomas podem elaborar no âmbito da
prossecução das suas atribuições, competência regulamentar essa com assento constitucional (artigo 241º e artigo
227º, d) CRP).
Estes preceitos, para além de terem vindo consagrar a distinção entre estas duas espécies de
regulamentos, formularam exigências formais importantes em relação a cada uma delas:
Exige-se, para a validade de qualquer regulamento complementar, que ele indique expressamente
a lei que visa regulamentar.
Exige-se, para a validade de qualquer regulamento independente, que ele indique expressamente
a lei ou as leis que atribuem especificamente competência (subjetiva e objetiva) para a emissão
do regulamento, ou seja, as leis de habilitação.
1. Regulamentos de organização – são aqueles que procedem à distribuição das funções pelos vários
departamentos e unidades de uma pessoa coletiva pública, bem como à repartição de tarefas pelos
diversos agentes que aí trabalham. Versam, pois, sobre a organização da "máquina administrativa".
2. Regulamentos de funcionamento – são aqueles que disciplinam a vida quotidiana dos serviços
públicos. Os regulamentos que procedem em particular à fixação das regras de expediente
denominam-se regulamentos procedimentais.
3. Regulamentos de polícia – são aqueles que impõem limitações à liberdade individual com vista a
evitar que, em consequência da conduta perigosa dos indivíduos, se produzam danos sociais.
É o caso dos regulamentos de trânsito, dos regulamentos sobre a instalação e funcionamento de indústrias
insalubres e dos os regulamentos sobre a utilização de material elétrico.
1. Regulamentos gerais – são aqueles que se destinam a vigorar em todo o território continental.
2. Regulamentos locais – são aqueles que têm o seu domínio de aplicação limitado a uma dada
circunscrição territorial.
É o caso dos regulamentos regionais, aplicáveis nas Regiões Autónomas, ou no âmbito das autarquias
locais, os regulamentos autárquicos.
1. Regulamentos internos – são aqueles que produzem os seus efeitos jurídicos unicamente no interior
da esfera jurídica da pessoa coletiva pública de que emanam.
2. Regulamentos externos – são aqueles que produzem efeitos jurídicos em relação a outros sujeitos de
Direito diferentes, isto é, em relação a outras pessoas coletivas públicas ou em relação a particulares.
As diferenças entre regulamentos externos e internos revelam-se, desde logo, quanto ao seu fundamento:
Há também diferenças de regime: ao contrário do que acontece com os regulamentos externos, cujo
regime está estabelecido no CPA, os regulamentos internos não são judicialmente impugnáveis (não
podem ser objeto de ação judicial, nem relevam como padrões jurídicos autónomos de controlo pelo juiz),
nem vale para eles o princípio da inderrogabilidade singular (admitem-se decisões concretas divergentes
da regulação interna anterior, devidamente justificadas).
É isso que acontece, por exemplo, com os regulamentos que proíbem (obrigação incondicional de abstenção ou de
renúncia a comportamento) ou impõem (obrigação de comportamento ativo vinculado) condutas específicas a
pessoas determinadas ou determináveis, bem como os que determinam ou modificam um determinado estatuto (de
pessoas ou coisas) ou os que fixam o custo de um bem ou serviço (tarifas, taxas, propinas).
Procedimento regulamentar
1. Os regulamentos administrativos são aprovados com base num projeto, acompanhado de uma nota
justificativa fundamentada, que deve incluir uma ponderação dos custos e benefícios das medidas
projetadas (artigo 99º CPA).
No Diário da República, dos regulamentos do Governo e das Regiões (artigo 119º, 1, h).
E em boletim autárquico ou em edital (5 dias, no máximo), dos regulamentos das autarquias locais
(artigo 119º, 3 CRP e artigo 91º Lei nº 169/99).
3. Embora se trate de um aspeto formal, impõe-se a indicação expressa da lei habilitadora, seja da lei que
o regulamento visa executar, seja, nos casos dos regulamentos autónomos e independentes, da lei (ou
da norma) que autoriza a respetiva emissão (artigo 112º, 7 CRP e 136º, 2 e 3 CPA).
Os regulamentos regionais mais importantes assumem a forma mais solene de decretos regulamentares
regionais (artigo 233º, 1 CRP).
Os regulamentos das autarquias locais não têm forma típica, mas os regulamentos locais de polícia
adotam tradicionalmente a forma de posturas (frequentemente compiladas em códigos de posturas
municipais).
A atividade regulamentar está sujeita aos princípios gerais que regem a atividade administrativa.
Desde logo, ao princípio da legalidade: além do primado da lei e da precedência da lei, revestem especial
importância em sede de regulamentos o princípio constitucional da reserva parlamentar e o consequente
imperativo de densidade legal acrescida. Nas matérias reservadas ao Parlamento, admitem-se os
regulamentos executivos, mas são inadmissíveis regulamentos independentes do Governo, e só em
determinada medida serão admissíveis regulamentos independentes autónomos. Também valem os
princípios substanciais da juridicidade, designadamente os princípios da igualdade e da
proporcionalidade, que são válidos para todos os regulamentos.
Há um conjunto de regras, proposições e princípios especiais, definidos pela doutrina e pela jurisprudência,
e que agora constam em grande medida do CPA (artigos 137º a 147º), constituindo um regime normativo
próprio dos regulamentos externos (distinto do regime dos atos legislativos):
A caducidade do regulamento como efeito da revogação da lei que visa executar, salvo na parte ou na
medida em que ele seja compatível com a nova lei e enquanto não houver nova regulamentação (para
evitar o vazio normativo – artigo 145º).
A regra da irretroatividade dos regulamentos desfavoráveis (artigo 141º) – com algumas compressões
naturais: regulamentos de leis retroativas, regulamentos necessários à execução de leis.
A regra da inderrogabilidade singular (artigo 142º, 2): os regulamentos não obrigam só os particulares,
mas também a própria Administração que os elaborou, de modo que nenhuma autoridade
administrativa pode deixar de o cumprir nos casos concretos, enquanto ele se mantiver em vigor.
o No caso dos regulamentos que sejam imediatamente operativos, mediante fiscalização abstrata
(declaração de ilegalidade com força obrigatória geral) a qual, no entanto, é limitada, visto que não
é admissível quando esteja em causa apenas a inconstitucionalidade do regulamento (cujo
conhecimento é reservado ao Tribunal Constitucional, a pedido de entidades competentes para
requerer a fiscalização abstrata de normas jurídicas, nos termos do artigo 281º da Constituição) –
nesses casos admite-se apenas a impugnação e fiscalização concreta (desaplicação).
Os eventuais conflitos na aplicação de regulamentos são resolvidos, em primeira linha, se for caso disso,
pelas regras aplicáveis à relação entre normas gerais e normas especiais (preferência de aplicação da
norma especial, ainda que anterior).
No que respeita a regulamentos provenientes de órgãos colocados entre si numa relação de hierarquia ou
de superintendência, os regulamentos da autoria dos órgãos subalternos ou superintendidos não podem
contrariar os regulamentos emanados pelos superiores ou superintendentes sobre matéria que seja de
atribuição e competência comum. Por sua vez, os regulamentos da autoria dos delegados têm de respeitar
os regulamentos emanados pelo delegante, salvo se a delegação incluir a competência regulamentar.
Este preceito não deve, porém, ser interpretado no sentido de estabelecer uma relação de subordinação
abstrata, hierárquica e automática entre regulamentos, com a consequência da invalidade das normas
subordinadas.
Por um lado, a supremacia há-de consistir em uma mera prevalência (“preferência aplicativa”) dos
regulamentos preferidos. Por outro lado, a prevalência dos regulamentos governamentais só é admissível
relativamente às matérias de interesse nacional e na medida em que a lei determine a existência de tutela
normativa do Governo ou dos governos regionais, tutela que não se presume.
Assim, se não for possível a aplicação cumulativa das normas nacionais e autárquicas devem valer as
normas autárquicas enquanto normas especiais, salvo se a preferência das normas governamentais se
impuser, seja perante a deficiência da regulamentação local, seja pela necessidade imperiosa de assegurar
uma realização uniforme do interesse nacional.
A invalidade é invocável a todo o tempo, mas está sujeita a um prazo e à oficiosidade a arguição das
ilegalidades formais e procedimentais, salvo nos casos de preterição absoluta de forma legal ou preterição
de consulta pública obrigatória (artigo 144º).