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19/09/22, 16:36 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça


Processo: 1242/05.8TBBCL-Y.G1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: BARATEIRO MARTINS
Descritores: CASO JULGADO MATERIAL
AUTORIDADE DO CASO JULGADO
RECONVENÇÃO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
PRINCÍPIO DA PRECLUSÃO
RÉU
TAXA DE JUSTIÇA
FALTA DE PAGAMENTO
DESENTRANHAMENTO
DECISÕES CONTRADITÓRIAS
CUMPRIMENTO DEFEITUOSO
EXCEÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO
CONTRATO DE EMPREITADA
INSOLVÊNCIA
VERIFICAÇÃO ULTERIOR DE CRÉDITOS
Data do Acordão: 09-03-2021
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA (COMÉRCIO)
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I - Quando os mesmos factos defensivos integram exceções, permitindo
obter a improcedência da ação e a absolvição do pedido, e ao mesmo
tempo são também fonte de contra direitos, coloca-se o problema de
saber se o demandado tem o ónus ou a mera faculdade de os fazer valer
através de reconvenção.
II - E a resposta estará em saber se há a possibilidade de haver
contraditoriedade entre o resultado favorável do primeiro processo e o
resultado favorável do processo autónomo que venha a ser intentado,
uma vez que existindo tal possibilidade de contraditoriedade, não
poderá um pedido (idêntico ao que seria o pedido da reconvenção) ser
formulado, mais tarde, através de ação autónoma, ou seja, em tal
hipótese, o demandado no primeiro processo necessita de reconvir para
afastar o risco de preclusão do seu contra direito.
III - Assim, sempre que o caso julgado favorável ao autor seja
suscetível de, depois, impedir a invocação de factos defensivos e a
dedução dos correspondentes pedidos pelo réu através de uma ação
independente - por as decisões favoráveis dos dois processos serem
contrastantes - a reconvenção (a invocação de tais factos defensivos e a
dedução dos correspondentes pedidos) acaba por revestir natureza
necessária, ou seja, a dedução da reconvenção, na primeira ação, é um
autêntico ónus para o réu.
IV - Intentando-se ação a pedir o preço decorrente da devida execução
dum contrato de empreitada, não pode o réu (dono da obra) “guardar”
para uma segunda lide a invocação do facto defensivo do cumprimento
defeituoso da empreitada e só aí, na segunda lide, peticionar os contra
direitos decorrentes de tal facto defensivo, uma vez que, tendo desfecho
favorável o primeiro processo, ficará impedido de alegar contra direitos
e de formular pedidos que afetem, na prática, o direito reconhecido pela
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primeira sentença.
V - Não tendo o réu reconvindo no primeiro processo, viu precludidos
tais direitos, efeito preclusivo que resulta da autoridade do caso julgado
da sentença que julgou favorável (ao respetivo autor) a primeira ação,
verificando-se no segundo processo, em que vem formular tais pedidos,
a exceção de caso julgado, na vertente de autoridade do caso julgado
(havendo que acatar a decisão antes proferida e obstar a que a relação
jurídica definida na anterior decisão possa ser aqui de novo decidida e
destruída ou diminuída).
VI - Autoridade do caso julgado que não depende da verificação da
tríplice identidade prevista no art. 581.º, n.º 1, do CPC, não
prescindindo, porém, da identidade de sujeitos e que, em termos de
objetos processuais, haja conexão entre o objeto decidido e o a decidir
e que o resultado favorável do segundo processo represente uma
decisão que contraste com a decisão da antes proferida.
Decisão Texto Integral:

Processo n.º 1242/05.8TBBCL-Y.G1.S1


Acordam na 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça
I – Relatório
AA, com os sinais dos autos, veio, por apenso aos autos de insolvência
de «Construções Meira & Rodrigues, Lda.» intentar ação para
verificação ulterior de créditos contra a Massa Insolvente, a Devedora e
os Credores, pedindo o reconhecimento e graduação dum crédito sobre
a Massa Insolvente no montante de € 152.500,00 com os respetivos
juros legais até integral pagamento.
Alegou, em resumo, ter celebrado, em 05/11/2002, um contrato de
empreitada com a ora insolvente, relativo à “arte de pedreiro para a
continuação da construção de um edifício, composto por duas fases,
pertencente ao Reclamante”, contrato que, segundo o reclamante, foi
executado pela empreiteira/insolvente com os inúmeros defeitos que
identifica, para além de não ter executado os inúmeros trabalhos
contratados que também identifica, tendo abandonado a obra sem a
concluir e sem a entregar; tendo faturado trabalhos não incluídos no
que estava contratado e procedido ao envio das faturas sem o parecer
do técnico responsável pela obra, como estava estipulado no contrato
de empreitada; razões pelas quais “tem direito a exigir a eliminação
dos vícios e defeitos da obra, bem como a conclusão dos trabalhos em
falta”[1] e sendo impossível “a eliminação desses vícios e defeitos e a
conclusão da obra por culpa imputável à insolvente (…) tem direito a
peticionar (…) a quantia necessária para que possa mandar reparar
esses vícios e defeitos e concluir os trabalhos em falta por
terceiros”[2].
Assim, invoca ser credor da insolvente das seguintes indemnizações:

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€ 37.500,00, decorrente do atraso na conclusão e entrega da obra, na


medida em que no contrato foi convencionada uma indemnização de €
2.500,00 por cada mês ou fração de mora na conclusão e entrega, após
o prazo fixado no contrato para a conclusão da obra;
€ 15.000,00, de danos não patrimoniais, uma vez que é uma pessoa
doente e sofreu enormes preocupações, aborrecimentos e constante
nervosismo por causa do incumprimento do contrato por parte da
insolvente; e
€ 100.000,00, “porquanto dada a situação de insolvência ser
impossível a eliminação dos vícios e defeitos e a conclusão dos
trabalhos em falta pela insolvente (…), nomeadamente por falta de
alvará de construtor emitido pelo IMOPPI”, sendo os € 100.000,00 a
quantia que o reclamante “terá de suportar com as despesas com a
apresentação de novo licenciamento e com honorários de técnico
especializado que irá apresentar os respetivos projetos e acompanhar a
execução da obra, bem como a quantia necessária para mandar
reparar os vícios e defeitos e concluir os trabalhos em falta por
terceiros”.
A R. «Massa Insolvente de Construções Meira & Rodrigues, Lda.»
contestou, invocando a litispendência, uma vez que num anterior
processo (apenso atualmente ao processo de insolvência, onde passou a
ter o n.º 1242/05.......-K), em que a insolvente, como A., pedia do aqui
Reclamante o pagamento do preço em falta do contrato de empreitada,
o aqui Reclamante (e lá Réu), deduziu contestação/reconvenção[3], não
sendo “a ação agora proposta mais do que a repetição de tudo quanto
ali alegou”, razão pela qual pede que seja absolvida da instância; ou,
subsidiariamente, que a instância seja suspensa até à decisão final de tal
processo intentado pela insolvente contra o A. (e em que este deduziu
reconvenção).
O A. respondeu, sustentando/concordando que deve ser suspensa a
instância até à prolação de sentença no primitivo processo pendente
entre as partes (e invocando que deduziu reclamação de créditos por o
CIRE ter “um entendimento muito restrito no que se reporta aos prazos
de reclamação de créditos”) e pugnando pela improcedência da
exceção de litispendência deduzida.
Foi proferido despacho, em 29/03/2007, a declarar suspensa a instância
até que fosse proferida decisão no aludido processo (apenso K.)
Verificado o trânsito em julgado da sentença proferida em tal apenso K,
foi ordenada a notificação das partes para se pronunciarem “sobre a
eventual verificação da autoridade de caso julgado nos presentes
autos”, por despacho proferido em 19/6/2019.
As partes nada disseram.
Dispensada a realização de audiência prévia, a Exma. Juíza proferiu
saneador-sentença em 22//7/2019, com o seguinte teor:

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“(…) no caso dos autos a causa de pedir é a mesma que a formulada


no apenso K, embora aí apenas fosse Autora a sociedade insolvente e
Réu o aqui A, AA, e na presente ação os RR sejam não apenas a
sociedade insolvente, como a massa insolvente constituída com os bens
apreendidos à insolvente e todos os credores da insolvência.
E o pedido também não é exatamente o mesmo pois na presente ação
pede-se uma quantia substancialmente superior à pedida na ação do
apenso K.
Mas a causa de pedir é indubitavelmente a mesma: o trabalho de
empreitada executado e não pago relativo a trabalho de pedreiro na
construção do prédio descrito na CRP ... registado sob o nº ....45.
Pelo que se verifica nos presentes autos a impossibilidade de decidir a
mesma por se verificar a exceção de verificação da autoridade do caso
julgado que impede que o tribunal conheça novamente da mesma
causa de pedir, correndo o risco de proferir julgamento diverso, assim
prejudicando o prestígio dos tribunais.
Pelo exposto, declaro verificada a exceção de autoridade de caso
julgado, que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e
determina a absolvição da instância – artigos 577º, al i) e 580º, nº 2
CPC ex vi artigo 17º CIRE.”
Inconformado, dela interpôs o Reclamante recurso de apelação para o
Tribunal da Relação ...., visando a sua revogação e a substituição por
outra que decidisse pelo prosseguimento dos autos.
Em acórdão proferido em 23/1/2020, o TR......julgou improcedente a
apelação e confirmou a decisão recorrida, ainda que com
fundamentação não coincidente, e absolveu da instância por efeito da
“preclusão processual” em face da anterior (do apenso K) decisão
transitada em julgado.
Ainda inconformado, interpõe o A. recurso de revista tendente à
revogação do acórdão do TR......, finalizando as suas alegações com as
seguintes Conclusões:
“1. Por Douto Acórdão proferido em 23 de Janeiro de 2020 pela ...
Secção Cível do Tribunal da Relação ....., foi declarado improcedente o
Recurso de Apelação apresentado pelo Recorrente naquele Tribunal e
foi confirmada decisão proferida em 1ª Instância, mas com
fundamentação essencialmente diferente daquela que suportava a
decisão recorrida.
2. Daquele Acórdão recorre o Recorrente, por dele não concordar,
sendo somente uma a questão de direito que o Recorrente pretende, por
intermédio do presente recurso, ver reapreciada e correctamente
julgada pelo Tribunal a quo, a saber, se nos presentes autos está em
causa o princípio da preclusão e quais os seus efeitos.

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3. Para dar como verificada aquela excepção, muito influenciou os


Venerandos Desembargadores uma “exposição feita em Coimbra, em
Fevereiro de 2016, intitulada “Preclusão e Caso Julgado”, entende o
Recorrente que aquela exposição não é aplicável ao que sucede no
caso dos autos.
4. Daquela exposição, tal como ela é referida no Douto Acórdão ora
em crise (pág. 30), a preclusão pode resultar de um ónus temporal,
consagrado no artigo 573º nº 1 do CPC, mas também pode resultar de
um ónus espacial, desenvolvido no artigo 564º al. c) do mesmo diploma
legal.
5. Mas o Recorrente, com a interposição da Petição Inicial que
originou os presentes autos (Apenso Y do Processo n.º 1242/05....), não
pretendeu defender-se daquilo que foi alegado, e dado como provado,
no processo anterior (Apenso K do mesmo Processo n.º 1242/05....).
6. O que o Recorrente pretende que seja objecto de discussão nos
presentes autos é uma outra questão jurídica, nomeadamente, a
existência, e quantificação, de um outro crédito, que o Recorrente
entende que lhe é devido pela empresa Construções Meira &
Rodrigues, Lda., que no Apenso K foi Autora (e entretanto declarada
Insolvente).
7. Esse crédito pode ser apreciado, e vir a ser dado como provado, sem
que tal ofenda ou esvazie o já decidido no outro Apenso.
8. Conforme resulta da Petição Inicial que deu origem ao presente
Apenso, o Recorrente pretende provar que aquela empresa terá
incumprido com as obrigações que assumiu para com o Recorrente,
nomeadamente o levantamento da licença camarária e a entrega de
pareceres favoráveis do responsável técnico da obra, pretende provar
que a obra por realizada padece de vícios e defeitos que devem ser
corrigidos, e pretende ainda demonstrar que a actuação daquela
empresa gerou danos ao Recorrente passíveis de serem ressarcidos.
9. Desde já se levanta a questão, que não foi ainda respondida pelo
Tribunal de 1ª Instância nem pelo Tribunal da Relação, de como
poderão os factos alegados na Petição Inicial que dá origem aos
presentes autos deixarem de ser apreciados porque, no entendimento
daqueles Tribunais, já deveriam ter sido apresentados aquando do
prazo para apresentar Contestação no Apenso K, quando aqueles
Tribunais se escusaram a apreciar quando é que tais factos
aconteceram, isto é, não é ainda possível responder (sem que tal
matéria esteja sujeita a produção de prova e audiência de julgamento)
se todos os factos ora alegados neste Apenso (iniciado em 2007)
poderiam já ter sido alegados numa eventual Contestação /
Reconvenção a apresentar no Apenso que se iniciou em 2003.
10. A este respeito, note-se que a Petição Inicial que origina o Apenso
K data de Setembro de 2003 e, da Petição Inicial que origina o Apenso

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Y encontram-se alegados factos de Outubro de 2003 (vide artigo 56º da


petição inicial).
11. Por outro lado, não está em causa nos presentes autos o disposto
no artigo 573º nº 1) do CPC, pois o Recorrente não pretende impugnar
os factos aí alegados ou invocar excepções que pudessem colocar em
crise o aí decidido.
12. Também não está em causa o disposto no artigo 564º al. c) do
CPC, pois o Recorrente não pretende que com os presentes autos seja
apreciada a mesma questão jurídica decidida naquele Apenso (a
existência de um crédito a favor da Construções Meira & Rodrigues,
Lda.)
13. Em suma, o que está em causa nos presentes autos é determinar a
verificação, reconhecimento e graduação de um crédito que o
Recorrente invoca deter sobre a Construções Meira & Rodrigues, Lda.,
14. Que se sustenta em outros factos, que não foram objecto de
discussão no Apenso K, que gerarão ou não outros danos, que não
foram apreciados naquele Apenso, e que se fundamenta,
necessariamente, em outras obrigações que não aquelas apreciadas
naquele Apenso.
15. É certo que, de acordo com o ónus de concentração ou
exaustividade consagrado no artigo 573º, nº 1 do CPC o Réu fica
impossibilitado de alegar posteriormente à Contestação qualquer meio
de defesa que pudesse aí invocar.
16. Mas, tal só opera relativamente à matéria de defesa, e já não à
matéria que o Réu poderia utilizar em Reconvenção, para que também
a ele lhe possa ser reconhecido um crédito.
17.Sendo legalmente admissível a Reconvenção naquele Apenso K, que
se iniciou em Setembro de 2003, a falta de exercício do direito de
reconvir (seja porque a Reconvenção não foi apresentada, seja porque
veio a ser desentranhada), apenas com o propósito de lhe ver
reconhecido um crédito a seu favor, não pode impedir o aí Réu, e ora
Recorrente, de propor posteriormente uma acção autónoma para fazer
valer o seu pretenso direito material, como veio a fazer através do
presente Apenso, apresentado em Janeiro de 2007.
18. Até porque, numa interpretação literal, a Reconvenção tem
natureza facultativa, conforme se denota da letra do artigo 266º, nº 1
do Código de Processo Civil, a qual inculca a ideia de que a este,
demandado em determinada acção, assiste a liberdade de optar entre
aproveitar a mesma instância processual para formular uma pretensão
contra o autor ou fazer valer essa pretensão através da propositura de
uma ação autónoma.
19. Note-se que, o dono da obra pode intentar uma outra acção
judicial contra o empreiteiro por a obra por si realizada padecer de
vícios e defeitos, ou por não ter sido obtida a licença camarária por
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culpa sua, até porque, os vícios e defeitos podem vir a ser conhecidos
já após ter decorrido o prazo de apresentação da Contestação /
Reconvenção daquela primeira acção judicial.
20. Já numa interpretação mais restritiva do mesmo artigo, a
reconvenção será obrigatória quando o pedido do réu emerge do facto
jurídico que serve de fundamento à acção, ou quando o pedido do réu
tende a conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito jurídico que o
autor se propõe obter, sob pena de preclusão do direito do réu.
21. Sucede que, no caso em apreço, o Recorrente não pretende que seja
apreciada a mesma questão jurídica decidida naquele Apenso K e
pugna, não pelo mesmo efeito jurídico que a Construções Meira &
Rodrigues, Lda. obteve naquela Apenso K mas sim, o reconhecimento
de um crédito a seu favor.
22. Os actos constitutivos do direito que o Recorrente apresentou nesta
Petição que originou os presentes autos poderiam ou não ter sido
anteriormente alegados na Reconvenção que apresentou no Apenso K,
mas, com o desentranhamento de tal peça processual, a mesma
necessariamente não pôde ser apreciada nem pôde produzir qualquer
efeito, isto é, não foi objecto de decisão de mérito.
23. E, se tais factos não puderam ser apreciados naquele Apenso K,
forçosamente devem ser apreciados no presente Apenso, através do
prosseguimento dos autos, pois o que aqui está em causa é o
reconhecimento de um crédito, e não um “ataque” ao alegado e dado
como provado naquele Apenso K.
24. Em síntese, o que a Recorrente pretende é sim o reconhecimento de
um crédito, decorrente de um incumprimento contratual e de actos
geradores de responsabilidade por parte da Construções Meira &
Rodrigues, Lda., absolutamente distintos daqueles que foram alegados,
e dados como provados, no Apenso K.
25. Decidiu mal o Tribunal ad quem quando concluiu que o aqui
Recorrente na acção anterior, não deduziu qualquer facto em sua
defesa, e que a alegação de todos os factos feita na sua petição inicial
desta acção (apenso Y), está precludida.
26. Isto porque, o Recorrente pretende fazer valer, com os presentes
autos, uma pretensão própria e autónoma, que poderia, mas não tem
necessariamente de ser invocada em sede de reconvenção.
27. O princípio da preclusão só deve, pois, operar relativamente à
matéria defensional, e, em matéria convencional, quanto muito,
quando o reconvinte queira conseguir, em seu benefício, o mesmo
efeito jurídico que o autor se propõe obter.
28. Através da presente acção, o que o ora Recorrente pretende é que
lhe seja reconhecido, e quantificado, um crédito.

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29. Daqui resulta que, com o prosseguimento dos presentes autos que
culmine numa decisão que conheça do mérito da causa, não corre este
Tribunal o risco de esvaziar a Decisão anteriormente proferida no
Apenso K.
30. Resulta que, nas duas causas em confronto, em cada um dos dois
Apensos acima mencionados, estamos em face de duas providências
jurisdicionais distintas, que apenas têm em comum o facto de ambos
darem como assente a existência do contrato de empreitada celebrado
entre o Recorrente e a Construções Meira & Rodrigues, Lda.
31. De facto, o crédito invocado pela Construções Meira & Rodrigues,
Lda., que lhe foi reconhecido na Sentença aí proferida, não
compromete nem é incompatível com o reconhecimento do crédito
pretendido pela Recorrente, através da Petição de Verificação Ulterior
de Créditos que originou o presente Apenso.
32. Até porque, do incumprimento contratual por parte de um dos
contraentes não resulta necessariamente a verificação do cumprimento
contratual de forma integral por parte do outro contraente, pois que,
podendo ambos incumprirem com o contrato de empreitada no qual
são contraentes.
33. Em suma, pode o dono da obra, Réu no Apenso K, ter incumprido
com o que estava obrigado por força daquele contrato de empreitada,
mas pode também o empreiteiro autor dessa obra, a empresa
Construções Meira & Rodrigues, Lda., ter também ele incumprido com
o que se obrigou naquele contrato de empreitada, até porque, as
obrigações que decorrem para um e para o outro, atenta a qualidade
que cada um assumiu naquele contrato, são distintas.
34. E, por força do incumprimento de um e de outro, são geradas
responsabilidades distintas para cada um deles, que podem coexistir
na mesma realidade.
35. Por último, deve o Tribunal procurar a justiça material, em
detrimento da justiça formal.
36. A Contestação / Reconvenção que o Recorrente apresentou naquele
Apenso K foi desentranhada por, ao fim de anos, se ter concluído que o
Recorrente não beneficiava de apoio judiciário aquando da
apresentação daquela peça processual.
37. A Sentença proferida naquele Apenso é sentença de condenação de
preceito, pois não conheceu do mérito da causa.
38. É manifestamente injusto e desproporcionado que, por não ter o
Recorrente deduzido Reconvenção naquele Apenso, pelas razões
elencadas, não o possa invocar os factos subjacentes a um pedido de
indemnização de incumprimento contratual ao contraente faltoso.
39. Ao decidir como decidiu, o Acórdão recorrido violou a lei quanto
aos artigos 564º al. c), 573º n 1, 577º, al. i), 576º nº 2, 580º nº 2 e 278º
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nº 1 al e) do Código de Processo Civil, pelo que deve ser proferida


Decisão de revogação do Acórdão recorrido e o prosseguimento dos
autos.”
Não houve contra-alegações das partes Recorridas.
Foram colhidos os vistos legais.
Mantém-se a regularidade da instância e nada obsta ao conhecimento
da revista.
Efetivamente, a revista foi interposta no enquadramento do art. 671º/1
do CPC, ou seja, dum Acórdão da Relação que pôs termo ao processo,
absolvendo da instância todos s RR.
E à sua admissibilidade não obsta o impedimento da “dupla
conformidade decisória” prevista no art. 671º/3 do CPC, uma vez que,
embora as decisões das Instâncias sejam idênticas (absolvição da
instância, com base na verificação da exceção do caso julgado, na
vertente de autoridade de caso julgado), o certo é que as
fundamentações não são no essencial coincidentes.
*
II - Fundamentação
II – De facto
Os factos pertinentes são os que já emergem do relatório precedente,
importando acrescentar que:
 - A «Construções Meira & Rodrigues, Lda.» intentou ação declarativa
de condenação sob a forma de processo ordinário contra AA (que
constitui o apenso K), pedindo que este fosse condenado a pagar à
Autora as quantias de € 62.959,00 a título de capital em dívida, de €
3.567,66 de juros de mora vencidos, e de € 30.865,74 a título de
indemnização devida por outros danos que entendeu ser o Réu
responsável por ter faltado ao pagamento da obra, tal como
contratualizado no contrato de empreitada, num total de € 97.392,40, a
que acresciam juros vincendos até efetivo e integral pagamento;
 - Apresentou como causa de pedir o mesmo contrato de empreitada
celebrado com aqui Reclamante e, em particular, o não pagamento dos
trabalhos de pedreiro na construção do mesmo prédio, o que levara à
interrupção da execução da obra; tais trabalhos, entre serviços
contratados e trabalhos extras/alterações, envolveram a quantia de
102.469,00 €, pelo que, depois dos pagamentos feitos, o Réu devia
ainda a quantia de 62.959,00 €;
 - Nesse Apenso K foi apresentada uma Contestação e Reconvenção
por parte do ali réu e aqui Reclamante, sendo que essa peça foi objeto
de desentranhamento por falta de pagamento da taxa de justiça devida,
uma vez verificada a falta de benefício de apoio judiciário (art. 570.º/ 6
CPC) – cfr. despacho proferido em 28/1/2019;
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 - Por despacho proferido em 12/3/2019, foi decretado que “os autos


prosseguem como se o réu fosse revel” e “consideraram-se confessados
os factos articulados pelo A. – art. 567º, nº1 CPC”.
 - Foi proferida sentença em tal Apenso K, em 24/4/2019, na qual foi
condenado o Réu, por adesão aos fundamentos alegados pelo Autor na
petição inicial (art. 567º, 3, CPC), a pagar à «Construções Meira &
Rodrigues, Lda» as quantias de € 62.959,00 a título de capital em
dívida, de € 3.567,66 de juros de mora vencidos e de juros à taxa legal,
desde a citação até efetivo e integral pagamento, de € 30.865,74 a título
de indemnização, a que acrescem juros à taxa legal, desde a citação até
efetivo e integral pagamento.
*
II – B – De Direito
As Instâncias consideraram verificada a exceção de caso julgado – mais
exatamente, que o caso julgado material formado pela sentença
proferida em anterior processo (o Apenso K referido nos factos) tem
autoridade de caso julgado[4] – e absolveram os RR. da instância,
traduzindo-se assim o objeto da presente revista na questão de saber se
se verifica ou não tal exceção de (autoridade do) caso julgado (e sendo
esta a única questão sob discussão).
O caso julgado, é sabido, pode ser formal ou material, sendo aquele (o
formal) formado por decisões que incidem sobre aspetos processuais e
tendo um valor intraprocessual (cfr. art. 620.º do CPC); e se sendo este
(o material) formado por decisões que incidem sobre o mérito e sendo
suscetível de valer (para além do seu valor intraprocessual) num
processo distinto daquele em que foi proferida a decisão transitada (cfr.
art. 619.º/1 do CPC).
Como é evidente, foi este último – o caso julgado material – que foi
considerado verificado e está em causa a sua eficácia fora do processo
(Apenso K) onde foi proferida a anterior decisão transitada.
Debrucemo-nos, pois, sobre a figura do caso julgado material:
Visa-se com tal caso julgado evitar que um órgão jurisdicional contrarie
numa decisão posterior o sentido duma decisão de mérito anterior ou
repita numa decisão de mérito posterior o conteúdo da decisão anterior,
exigindo-se assim aos tribunais que respeitem a decisão antes proferida,
não julgando a questão de novo.
Mas, uma vez que a finalidade dum processo não se esgota na definição
do direito/justiça do caso concreto, tendo também em vista conferir
certeza/segurança jurídicas e paz social, essenciais à vida em
sociedade, também está em causa no caso julgado a “impossibilidade”
da parte vencida, proferida uma decisão, esgotada a possibilidade de
interpor recurso ordinário de tal decisão (cfr. art. 628.º do CPC), poder
suscitar nova e sucessivamente a questão antes decidida.

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E diz-se que há caso julgado quando se repete uma causa, sendo que há
a “repetição da causa” quando há identidade de sujeitos, do pedido e
também da causa de pedir (cfr. art. 581.º/1 do CPC).
Identidade de sujeitos que reside no facto de as partes serem as mesmas
nas duas ações sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
Identidade da causa de pedir que existe quando a pretensão deduzida
nas duas ações procede do mesmo facto jurídico, identidade que tem de
ser procurada na questão fundamental levantada nas duas ações, uma
vez que, tendo a nossa lei adotado a chamada teoria da substanciação,
se exige sempre a indicação do título ou facto jurídico em que se baseia
o direito do autor.
Identidade do pedido que tem de ser apreciada não só em relação ao
que se pede nas duas ações mas também em relação ao que se alega a
respeito da questão fundamental que comanda o pedido das ações.
E se, quanto à identidade de sujeitos, nenhumas especiais dificuldades
normalmente se suscitam, não é sempre com a mesma facilidade que se
percebe a identidade nos elementos objetivos (causa de pedir e pedido).
Assim, a propósito dos limites objetivos do caso julgado, desde há
muito que a conceção/sistema restrito do caso julgado se foi impondo
quer na doutrina quer na jurisprudência, ou seja, hoje, não é sustentável
dizer que qualquer fundamento fica pelo trânsito em julgado
indiscutível (sistema amplo do caso julgado), devendo antes ser dito,
como regra, que só a decisão tem foros de indiscutibilidade, sendo tudo
o mais (todos os seus fundamentos) discutível (sistema restrito).
Porém, o que se diz como regra (só ter a sentença força de caso julgado
na parte decisória e não nos motivos) é algo que não tem uma rigidez
absoluta, distinguindo-se, tendo como ponto de partida tal regra
(própria dum sistema restritivo puro), hipóteses em que os fundamentos
têm força de caso julgado e hipóteses em que não têm[5].
Verdadeiramente, hoje, em termos de limites objetivos do caso julgado,
impera a ideia pragmática do “in medio virtus”[6]: o sistema restritivo
adotado acaba por ser apenas “pseudo-restritivo” ou, mais exatamente,
um sistema intermédio.
Efetivamente, de modos diversas e com mais ou menos nuances (de
linguagem), diz-se repetidamente que a decisão e fundamentos
constituem um todo único; que toda a decisão é a conclusão de certos
pressupostos (de facto e de direito), pelo que o respetivo caso julgado
se encontra sempre referenciado a certos fundamentos; que reconhecer
que a decisão está abrangida pelo caso julgado não significa que ela
valha com esse valor, por si mesma e independentemente dos
respetivos fundamentos; enfim, que não é a decisão, enquanto
conclusão do silogismo judiciário que adquire o valor de caso julgado,
mas o próprio silogismo no seu todo; que o caso julgado incide sobre a

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decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge esses


fundamentos enquanto pressupostos dessa decisão[7].
 “Em regra, o caso julgado não se estende aos fundamentos de facto da
decisão; mais exatamente, os fundamentos não adquirem valor de caso
julgado quando são autonomizados da respetiva decisão judicial; não
são vinculativos quando desligados da respetiva decisão. Mas valem
(os fundamentos) enquanto fundamentos da decisão e em conjunto com
esta[8]”.
Enfim, repetindo, os pressupostos da decisão (de facto e de direito[9])
estão cobertos pelo caso julgado enquanto pressupostos da decisão –
caso julgado relativo – ou seja, a força de caso julgado alarga-se aos
pressupostos enquanto tais[10]: o que está em causa no caso julgado é o
raciocínio como um todo e não cada um dos seus elementos; e só o
raciocínio como um todo faz caso julgado.
Mas mais – e relacionado com esta ideia dos fundamentos, enquanto tal
(ligados ao decidido), poderem adquirir valor de res judicata – o caso
julgado também possui um valor enunciativo, ou seja, a eficácia do
caso julgado exclui toda a situação contraditória ou incompatível com
aquela que ficou definida na decisão transitada, ficando afastado todo o
efeito incompatível, isto é, todo aquele efeito que seja excluído pelo
que foi definido na decisão transitada.
Mais ainda, os fundamentos podem possuir um valor próprio de caso
julgado sempre que haja que respeitar e observar certas conexões entre
o objeto decidido e um outro objeto; conexões que podem ser,
designadamente, de prejudicialidade, o que significa, por ex., que, se
numa compra e venda o comprador obtém a redução do preço
atendendo aos defeitos da coisa, não pode questionar a validade do
contrato em ação em que o vendedor requeira que ele lhe pague a
quantia em dívida.
E ainda e acima de tudo o que resulta do que é normalmente chamado
de “efeito preclusivo”, que designa o efeito da sentença segundo o qual
não se pode formular a mesma solicitação processual no futuro com
base em factos não supervenientes ao momento do encerramento da
discussão em 1.ª instância (art. 611.º/1 do CPC)[11].
Podendo referir-se, neste ponto, que “o âmbito da preclusão é
substancialmente distinto para o autor e para o réu. Quanto ao autor, a
preclusão é definida exclusivamente pelo caso julgado: só ficam
precludidos os factos que se referem ao objeto apreciado e decidido na
sentença transitada. Assim, não está abrangida por essa preclusão a
invocação de uma outra causa de pedir para o mesmo pedido, pelo que
o autor não está impedido de obter a procedência da ação com base
numa distinta causa de pedir. (…). Quanto ao âmbito da preclusão que
afeta o réu, há que considerar que lhe incumbe o ónus de apresentar
toda a defesa na contestação (art. 498.º/1)[12], pelo que a preclusão
que o atinge é independente do caso julgado: ficam precludidos todos
os factos que podiam ter sido invocados como fundamento dessa
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contestação, tenham ou não qualquer relação com a defesa


apresentada e, por isso, com aquela que foi apreciada pelo
tribunal.”[13]
O que significa – é o sentido do efeito preclusivo para um réu – que os
factos defensivos e os contra-direitos que um réu possa fazer valer – e
não fez – são ininvocáveis numa nova ação, uma vez que o caso
julgado abrange aquilo que foi objeto de controvérsia e ainda os
assuntos que o réu tinha o ónus de trazer à colação, estando neste
último caso todos os meios de defesa do réu; e que a indiscutibilidade
duma questão, o seu carácter de res judicata, pode resultar tanto duma
investigação judicial, como do não cumprimento dum ónus que acarrete
consigo por força da lei esse efeito preclusivo[14].
É, na síntese clássica, a regra do “tantum judicatum quantum
disputatum vel disputari debetat”.
E é chegado a este ponto da compreensão dos limites objetivos do caso
julgado – nos meandros das situações incompatíveis, de
prejudicialidade e do chamado efeito preclusivo – que emerge a
“figura” da autoridade de caso julgado e os exemplos académicos (e
jurisprudenciais) da verificação da “autoridade de caso julgado”.
Assim, o caso julgado material, como “exceção de caso julgado”, visa
prevenir, como já se referiu, a possibilidade de prolação de decisões
judiciais contraditórias com o mesmo objeto (efeito impeditivo e
função negativa); e, como “autoridade de caso julgado”, garante a
vinculação dos órgãos jurisdicionais e o acatamento pelos particulares
de uma decisão anterior (efeito vinculativo e função positiva).
Quando o objeto processual antecedente é repetido no objeto
processual subsequente, o caso julgado da decisão anterior releva como
“exceção de caso julgado” no processo posterior; quando o objeto
processual anterior funciona como condição para a apreciação do
objeto processual posterior, o caso julgado da decisão antecedente
releva como “autoridade de caso julgado” no processo instaurado em
2.º lugar[15].
Daí que a “exceção do caso julgado” pressuponha a identidade de
sujeitos, de pedido e de causa de pedir; enquanto a “autoridade do caso
julgado”, não prescindindo da identidade de sujeitos, dispense a tríplice
identidade[16], sem prejuízo do seu confinamento àquelas situações em
que a sentença reconhece, no todo ou em parte, um concreto direito do
A., assim fazendo precludir todos os meios de defesa do R., os
concretamente deduzidos e os abstratamente dedutíveis com base em
direito próprio, ou àquelas situações em que a sentença, ao reconhecer
um direito, constitui um pressuposto ou condição de julgamento de um
outro objeto ou prejudica/exclui a invocação de direitos contraditórios e
incompatíveis.
São disto bem elucidativos os exemplos académicos em que tal
“figura” se considera normalmente como verificada:
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Se uma decisão reconhece o direito de propriedade sobre uma parcela


de terreno e condena o R. à sua restituição e à demolição da construção
que na mesma efetuou, não pode o R. – por força da autoridade do caso
julgado da primeira decisão – em nova ação, ainda que com
fundamento em acessão industrial imobiliária, pedir o reconhecimento
do direito de propriedade sobre a mesma parcela de terreno: apesar de
não se verificar a “exceção de caso julgado”, atenta a diversidade da
causa de pedir, a segurança e a certeza jurídica decorrentes do trânsito
em julgado da primeira decisão obstam a que, em nova ação, se
questione o direito de propriedade e as obrigações de restituição e de
demolição reconhecidas na primeira ação com base numa realidade que
já se verificava aquando da primeira ação e que aí poderia/deveria ter
sido invocada pelo R. (quer para impedir a procedência da ação, quer
para sustentar, em sede reconvencional, o direito potestativo de acessão
imobiliária).
Se uma decisão condena no pagamento de uma indemnização, não
pode aquele que é ali condenado vir pedir, com base no enriquecimento
sem causa, a restituição da quantia paga, impedimento este que resulta,
não da “exceção de caso julgado” (face à diversidade das causas de
pedir), mas da “autoridade de caso julgado” formado pela primitiva
ação/decisão.
Se uma decisão condena no preço (duma compra e venda) duma coisa,
não pode o condenado, em posterior ação, vir invocar vício invalidante
de tal compra e venda, impedimento que também resulta da autoridade
de caso julgado formado pela primitiva ação/decisão.
Se numa ação de reivindicação se reconhece a propriedade, tal vale
como autoridade de caso julgado num processo posterior em que o
proprietário requer a condenação da contraparte no pagamento duma
indemnização pela ocupação indevida do imóvel.
Efetivamente, como se começou por referir, o caso julgado formado
sobre a decisão, além de impedir a repetição de ações, também serve
para que a parte vencedora dum processo judicial possa ficar tranquila,
razão pela qual o caso julgado trava todas aquelas ações (todas aquelas
reações extemporâneas das partes) em que, através de um ataque
colateral, se visa anular ou aniquilar qualquer efeito desfavorável
decorrente de uma sentença proferida em processo anterior.
Como era referido por Chiovenda[17], “o caso julgado é o expediente
de que o direito se serve para garantir ao vencedor o gozo do resultado
obtido através do processo”, pelo que “não é permitido que o juiz, num
processo futuro, possa vir a desconhecer ou a diminuir o bem
reconhecido pela precedente decisão transitada em julgado”.
Sendo intentado um processo que, embora não se traduza numa mera
reprodução de outro antes decidido, assente em factos defensivos não
alegados pelo réu no anterior processo (ou infrutiferamente alegados), o
tribunal deverá recusar-se a julgá-lo, absolvendo o demandado da
instância, com fundamento em os factos ora suscitados estarem
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cobertos pelo caso julgado formado pela sentença proferida no


processo anterior.
Como refere Miguel Mesquita[18], “o caso julgado funciona, portanto,
como um autêntico “escudo protetor” da sentença contra ações que
venham a ser propostas pelo autor ou pelo réu de um anterior
processo. (…) O réu fica proibido de propor uma contra-ação
independente, baseando-se em factos antes deduzidos sem êxito ou que,
podendo ter sido deduzidos em sua defesa, o não foram. (…) Aplica-se
inteiramente o clássico princípio de que o caso julgado cobre (rectius,
preclude) o deduzido e o dedutível”.
Com o caso julgado, o resultado do processo fica intangível, uma vez
que o caso julgado faz precludir não apenas o deduzido, mas também o
dedutível, ou seja, o caso julgado faz precludir, para sempre, as
alegações defensivas efetivamente apresentadas (o caso julgado cobre o
deduzido, ou seja, impede a reapreciação das questões já antes
levantadas) e, para além disto, o caso julgado preclude também os
factos que o demandado podia ter deduzido no processo, mas que,
efetivamente, acabou por omitir (a fim de que a vida social se
desenvolva o mais possível segura e pacífica).
É certo que sobre as questões não deduzidas e não discutidas não se
formou, em rigor, justamente por não terem sido deduzidas/discutidas,
caso julgado[19], mas, tendo a decisão transitado em julgado, não pode
mais ser atacada, razão pela qual não mais podem ser discutidas quer as
questões que foram discutidas e resolvidas no primeiro processo, quer
aquelas que o poderiam ter sido, mas que o não foram.
Não se trata, pois, de estender o caso julgado a motivos e a factos que
não foram deduzidos/discutidos, mas sim do caso julgado formado
sobre a decisão resistir a novos e eventuais ataques levados a cabo pela
parte vencida, suscitando questões que podia ter deduzido antes e que
não deduziu.
Sendo a isto que, a nosso ver, também conduz o que é mais
recentemente dito, numa linha argumentativa um pouco diferente, pelo
Prof Teixeira de Sousa[20], quando refere que o efeito preclusivo e a
função de estabilização habitualmente atribuída ao caso julgado é
realmente produzida pela preclusão (pela perda da prática de um ato
processual, pela parte, decorrido o prazo perentório fixado pela lei ou
pelo juiz para a sua realização).
Diz o Prof. Teixeira de Sousa que, “quando referida à alegação de
factos pelas partes, a preclusão é correlativa de um ónus de
concentração ou de exaustividade: de molde a evitar a preclusão da
alegação posterior do facto, a parte tem o ónus de alegar todos os
factos relevantes no momento adequado. Por exemplo: no processo
civil português, o réu tem o ónus de alegar na contestação que
apresente toda a defesa que queira deduzir contra o pedido formulado
pelo autor (cf. art. 573.º, n.º 1); logo, o réu tem o ónus de concentração
da sua defesa no articulado de contestação, pelo que não pode alegar
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posteriormente nenhum meio de defesa que já pudesse ter alegado na


contestação.”
Acrescentando mais à frente, que “a preclusão intraprocessual torna-
se uma preclusão extraprocessual quando o que não foi praticado num
processo anterior também não pode ser realizado num processo
posterior. (…) primeiro, verifica-se a preclusão da prática do ato num
processo pendente; depois, exatamente porque a prática do ato está
precludida nesse processo, torna-se inadmissível a prática do ato num
processo posterior. Portanto, a preclusão começa por ser
intraprocessual e transforma-se em extraprocessual quando se
pretende realizar o ato num processo posterior.
Daí que sustente que “não é o caso julgado que implica a preclusão de
um facto ou de uma ocorrência verificada até ao encerramento da
discussão em 1.ª instância (…) e que o que há de estabilização (ou de
imutabilidade) no caso julgado é o que resulta da preclusão ou, mais
em concreto, da preclusão dos factos ou das ocorrências
supervenientes verificadas até ao encerramento da discussão em 1.ª
instância, mas não alegadas em juízo até esse momento. (…) Todavia,
estando afastado que a exceção de caso julgado possa produzir a
preclusão destes factos, não está excluído que essa a exceção possa ser
um meio de realização dessa preclusão.
E que conclua que, “para que a exceção de caso julgado não possa
atuar, é necessário que seja alegado na segunda ação um facto
diferente daquele que foi invocado no primeiro processo. Ora, este
requisito não é preenchido se a alegação deste facto se encontrar
precludida, dado que, nesta hipótese, essa alegação não pode deixar de
ser considerada irrelevante. Se a invocação do facto é irrelevante, o
tribunal não pode utilizar esse facto para contrariar a decisão
transitada. Sendo assim – dir-se-á -- só resta ao tribunal a hipótese de
proferir uma decisão idêntica à decisão transitada. No entanto, é
precisamente a repetição de decisões que, nos termos do disposto no
art. 580.º n.º 2, a exceção de caso julgado visa evitar. Assim, o tribunal
deve absolver o réu da instância com base naquela exceção (cf. art.
577.º al. i), 576.º, n.º 2, e 278.º, n.º 1, al. e)).
Efetivamente, quer se diga, na síntese clássica, que o caso julgado
cobre/preclude o deduzido e o dedutível, quer se diga que a preclusão
intraprocessual (em relação aos factos não alegados) funciona como
preclusão extraprocessual noutro processo, impedindo que também
aqui possam ser utilizados factos que no primeiro processo não foram
alegados, o certo é que, em ambos os entendimentos, deve o réu ser
absolvido da instância com base na exceção do caso julgado.
É justamente este o caso dos autos.
O aqui reclamante foi demandado pela insolvente (antes desta ter sido
declarada em tal situação) – invocando esta ter “quase terminada” a
obra que se havia obrigado a realizar (no âmbito do contrato de
empreitado celebrado), obra que alegou ter “executado em
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conformidade com o projetado e combinado” e em que, segundo


alegou, deixou de trabalhar por causa dos atrasos nos pagamentos por
parte do ora reclamante – pedindo a ali A. (e aqui insolvente) que o
aqui reclamante fosse condenado a pagar-lhe o preço da obra/trabalhos
executados e os prejuízos que tal incumprimento contratual lhe causou.
O aqui reclamante contestou – deduziu contestação/reconvenção –
acabando o seu articulado por ser desentranhada por não ter pago a TJ
devida, vindo aqui, em 18/01/2007, deduzir reclamação de créditos
(nos termos do art. 146.º do CIRE), em que repete o que articulou/pediu
na contestação/reconvenção, apresentada na primeira ação entre as
partes e que foi mandada desentranhar.
Entretanto, tendo a aqui reclamante ficado, pela razão referida, sem
contestação na primeira ação, foram considerados confessados os
factos articulados pela ali A. e foi proferida sentença, em 28/01/2019, a
julgar a ação totalmente procedente, condenando o aqui reclamante no
preço (em mora) dos trabalhos executados e nos prejuízos causados,
segundo se invocou, pelo incumprimento contratual do aqui
reclamante.
Sucede que está articulado na presente reclamação de créditos (como
antes estava na contestação/reconvenção desentranhada), como resulta
do relato inicial, que a obra foi executada pela empreiteira/insolvente
com inúmeros defeitos, que há inúmeros trabalhos contratados que não
foram executados, que há atraso na conclusão e entrega da obra,
incumprimentos que terão causado enormes preocupações,
aborrecimentos e constante nervosismo ao ora reclamante; formulando-
se, em consequência, os atinentes pedidos indemnizatórios.
O que – face ao que os respetivos autores articularam e pediram em
cada uma das duas ações (no apenso K e aqui) – leva a que sejamos
colocados perante a possibilidade de serem proferidas duas decisões
contrastantes: uma que já reconheceu que o empreiteiro executou
devida e pontualmente a sua prestação contratual e que, em função
disso, lhe atribuiu o direito ao preço e a uma indemnização por
incumprimento contratual da contraparte (o aqui reclamante e dono da
obra); e outra que visa reconhecer que o empreiteiro não executou a
totalidade da obra, que a parte executada o foi com inúmeros defeitos e
atrasos, visando atribuir-lhe o direito a indemnizações por tais
incumprimentos contratuais do empreiteiro.
Decisões contrastantes, entre as mesmas partes, que – não se
verificando, como é evidente, a tríplice identidade que caracteriza a
“exceção de caso julgado” – convocam a figura da “autoridade de caso
julgado”[21], na medida em que o caso julgado formado na primeira
ação, favorável ao empreiteiro, constitui um obstáculo ao julgamento
do mérito da presente ação.
E sendo assim – é onde se pretende chegar – sendo a pretensão aqui
formulada pelo reclamante contraditória/contrastante com o pedido da
A/insolvente (na primeira ação) não podia o ora reclamante deixar de a
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ter deduzido (a pretensão aqui formulada) na primeira ação, na medida


em que, mais tarde (agora), não poderá colocar em causa, através desta
ação autónoma, o resultado favorável (à insolvente) alcançado no
primeiro processo.
A invocação do cumprimento defeituoso do empreiteiro configura,
entre outras qualificações jurídicas, uma exceção que, mercê da
utilização da faculdade que é proporcionada pelo art. 428.º do C. Civil
(exceção de não cumprimento), suspende o cumprimento da prestação
principal (pagamento do preço) do dono da obra.
Tratando-se duma exceção, tinha a factualidade materializadora do
cumprimento defeituoso (do contrato de empreitada) e da exceção de
não cumprimento do art. 428.º do C. Civil, não há qualquer dúvida, que
ser deduzida na primeira ação e não o tendo sido – na medida em que,
como referimos, a sentença faz precludir todos os meios de defesa do
R., os concretamente deduzidos e os dedutíveis – ficou precludida, para
sempre, a invocação da exceção de não cumprimento.
Mas – é o ponto – também ficou precludido, face ao que estava
invocado e pedido na primitiva ação, o exercício dos contra direitos
alicerçados no “núcleo essencial” de tal cumprimento defeituoso, ainda
que tais contra direitos se tivessem que fazer valer por reconvenção.
Quando os mesmos factos defensivos integram exceções, permitindo
obter a improcedência da ação e a absolvição do pedido, e ao mesmo
tempo são fonte de contra direitos – no caso, o invocado direito à
indemnização em dinheiro pelo custo dos trabalhos de eliminação dos
defeitos por terceiro contratado pelo dono da obra, assim como a
indemnização pela mora e pelo dano não patrimonial (colateral) sofrido
com o cumprimento defeituoso – coloca-se o problema (que é a questão
fulcral dos autos/recurso) de saber se o demandado (na primitiva ação)
tem o ónus ou a mera faculdade de os fazer valer através de
reconvenção.
E a resposta, como deflui do já referido, estará, a nosso ver, em saber se
há a possibilidade de haver contraditoriedade entre o resultado
favorável do primeiro processo e o resultado favorável do processo
autónomo que venha a ser intentado, uma vez que existindo tal
possibilidade de contraditoriedade, não poderá tal pedido (idêntico ao
do que seria o pedido da reconvenção) ser formulado, mais tarde,
através de ação autónoma, ou seja, em tal hipótese, o demandado no
primeiro processo necessita de reconvir para afastar o risco de
preclusão do seu contra direito.
O demandado no primeiro processo tem, pois, de colocar, para si
mesmo, o cenário desfavorável da decisão de tal primeiro processo e,
face ao efeito do caso julgado favorável ao autor (face ao risco da
preclusão), não pode deixar de invocar e pedir o reconhecimento dos
seus contra-direitos (ainda que alguns de tais pedidos sejam eventuais
ou subsidiários[22]).

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Terá sido isto mesmo – a colocação de tal cenário desfavorável – que


levou (e bem) o ora reclamante a apresentar, no primeiro processo, a
contestação/reconvenção de que “a reclamação agora proposta é a
repetição”, sucedendo que os factos defensivos e os contra-direitos
exercitados em tal contestação/reconvenção só não foram
discutidos/apreciados no primeiro processo por razões imputáveis ao
aqui reclamante (a contestação/reconvenção, como já se referiu, foi
desentranhada, nos termos do art. 570.º/6 do CPC, por o aqui
reclamante ter persistido no não pagamento da taxa de justiça devida),
ou seja, o objeto do primeiro processo ficou reduzido apenas e só por o
aqui reclamante, dentro da sua disponibilidade sobre o objeto do
primeiro processo, assim o ter consentido e, é sabido, assim como as
partes são responsáveis pelos meios de defesa (e contra ataque) que
invocam – princípio da autorresponsabilidade das partes – também são
elas que suportam as consequências negativas das suas omissões ou
inércias (no caso, o desentranhamento da contestação/reconvenção e a
redução do objeto do primeiro processo).
Como refere Miguel Mesquita[23], “(…) sobre o R. recai o ónus de
reconvir sempre que o caso julgado favorável ao A. seja suscetível de
obstar ao posterior exercício, através duma ação independente, de
qualquer direito incompatível com a anterior sentença.
O princípio da liberdade de reconvir não vale, efetivamente, de forma
absoluta ou irrestrita, tendo o réu sempre de jogar, no momento em que
contesta, com a probabilidade de vir a ser proferida uma sentença
favorável ao autor. Porque sobre esta se forma caso julgado material,
o réu não pode, através de uma ação, com base em factos anteriores ao
encerramento da discussão no primeiro processo, vir a afetar o teor da
sentença neste proferida (…)”
Revertendo de novo ao caso dos autos, o aqui reclamante, quando
demandado no primeiro processo para pagar o preço da empreitada,
não podia “guardar” para uma segunda lide a invocação do facto
defensivo do cumprimento defeituoso da empreiteira/insolvente[24],
para só aí, na segunda lide, peticionar os contra direitos decorrentes de
tal facto defensivo, uma vez que, tendo desfecho favorável o primeiro
processo, ficará impedido de alegar contra direitos e formular pedidos
que afetem, na prática, o direito reconhecido pela primeira
sentença[25].
Um dos direitos decorrentes do facto defensivo consistente no
cumprimento defeituoso – a já referida exceção de não cumprimento do
contrato (do art. 428.º do C. Civil) – tinha, fora de qualquer dúvida, que
ser invocado no primeiro processo, pelo que, para o reclamante poder
vir formular pedidos indemnizatórios (baseados no mesmo
cumprimento defeituoso) em processo autónomo, ter-se-ia então que
entender que se podem cindir os efeitos jurídicos de tal facto defensivo,
ou seja, que se pode articular, no primeiro processo, tal facto defensivo
para efeito duma determinada qualificação jurídica e efeito jurídico
(suspender o cumprimento/pagamento do preço ao empreiteiro)[26] e
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que, mais tarde, num processo autónomo, se pode articular o mesmo


facto defensivo (o mesmo cumprimento defeituoso) para, de novo com
base no mesmo facto, invocar um outro e diferente efeito jurídico e o
consequente pedido (no caso, os pedidos indemnizatórios que aqui
formula).
O que, no limite, nos pode colocar perante um desfecho, com todo o
respeito, pouco compreensível, na medida em que, caso não se tenha
provado, no primeiro processo, tal facto defensivo (articulado para
efeito de suspender o cumprimento/pagamento do preço ao
empreiteiro), se estará a admitir, em tal entendimento, que se pode
voltar “à carga”, em processo autónomo, com a mesma articulação (já
antes dada como não provada), com o argumento do efeito jurídico ora
invocado ter que ser deduzido por reconvenção e esta não ser
necessária (ser uma faculdade e não um ónus)[27].
É certo que o julgamento das exceções não faz, como regra, caso
julgado (cfr. art. 91.º/2 do CPC), porém, quando o possível novo
julgamento da matéria da exceção, agora como pedido autónomo,
coloque em causa a sentença definitiva anterior, deve entender-se que
há obstáculo a tal novo julgamento, ou seja, deve entender-se que as
exceções deduzidas/dedutíveis estão cobertas pelo caso julgado[28].
A reconvenção é, concorda-se, em tese, facultativa – o art. 266.º/1 do
CPC diz o “o réu pode, em reconvenção, deduzir pedidos contra o
autor” – porém, sempre que, numa concreta ação, o caso julgado
favorável ao autor seja suscetível de, depois, impedir a invocação de
factos defensivos e a dedução dos correspondentes pedidos pelo réu
através de uma ação independente – por, como se referiu, as decisões
favoráveis dos dois processos serem contrastantes – a reconvenção (a
invocação de tais factos defensivos e a dedução dos correspondentes
pedidos) acaba por revestir natureza necessária (ou seja, em tal
hipótese, a reconvenção, na primeira ação, é um autêntico ónus para o
R.)[29].
Em conclusão, não tendo reconvindo (validamente) no primeiro
processo, viu o aqui reclamante/recorrente precludidos os direitos
indemnizatórios que aqui pretende exercer, efeito preclusivo que, a
nosso ver, resulta da autoridade do caso julgado da sentença que julgou
favorável ao aqui R/empreiteiro a primeira ação (o apenso K referido
nos factos).
Verifica-se pois a exceção de caso julgado, na vertente de autoridade do
caso julgado, ou seja, há que acatar a decisão antes proferida e obstar a
que a relação jurídica definida na anterior decisão possa ser aqui de
novo decidida (e destruída ou diminuída).
Em termos objetivos, há pois entre as duas ações a conexão que
convoca a figura da autoridade do caso julgado e, em termos
subjetivos, existe total identidade.

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Efetivamente, na definição da identidade das partes há que atender,


como diz o art. 581.º/2 do CPC, à qualidade jurídica em que autor e réu
atuam, o que significa, sendo partes nestes autos (do lado passivo) a
Massa Insolvente, a Devedora/Insolvente e os Credores, que estes o são
apenas e só por força das regras processuais impostas pelo CIRE (mais
exatamente, por força do expressamente disposto no art. 146.º/1 do
CIRE), ou seja, que a sua posição jurídico-processual é exatamente a
mesma que o empreiteiro podia desempenhar e desempenhava
singularmente, antes de ser declarado insolvente, no primeiro processo
(em que – intentado antes do empreiteiro ser declarado insolvente e
apensado à insolvência, nos termos do art. 85.º/1/2.ª parte do CIRE –
terá ocorrido substituição processual, na medida em que, declarada a
insolvência, perde o devedor/insolvente a sua legitimidade processual
para todas as ações patrimoniais em que seja autor ou réu, sendo
substituído pelo Administrador de Insolvência - cfr. arts. 85.º/3 e 81.º/4,
ambos do CIRE).
Importando ainda referir que a circunstância dos credores da
insolvência apenas poderem “exercer os seus direitos em conformidade
com os preceitos do CIRE durante a pendência do processo de
insolvência” (cfr art. 90.º do CIRE) e, em consonância com isto, terem
que reclamar os seus créditos no processo de insolvência – mesmo os
credores que tenham o seu crédito reconhecido por decisão definitiva,
cfr. art. 128.º/3 do CIRE – não contende com a verificação e
funcionamento da exceção de caso julgado apreciada.
Enfim, o que ficou decidido no apenso K – mais exatamente, o que
ficou coberto pela autoridade de tal caso julgado – não pode, não
obstante o que se dispõe nos referidos art. 90.º, 128.º/3 e 173.º do
CIRE, voltar a ser aqui discutido.
Sem prejuízo de, justamente por causa de tais preceitos, o
reclamante/recorrente ter andado bem ao reclamar o seu crédito no
processo de insolvência (doutro modo, ainda que obtivesse uma decisão
a reconhecer o seu crédito, não seria pago[30]), sucedendo, é o ponto,
que, face à decisão desfavorável, para si, proferida no apenso K[31],
verifica-se a analisada exceção de caso julgado que conduz à
absolvição da instância nos presentes autos de verificação ulterior de
crédito.
Em conclusão final, improcedem as conclusões da alegação do
reclamante/recorrente.
*
III - Decisão
Nos termos expostos, decide-se negar a revista.
Custas pelo reclamante/recorrente.
*

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Lisboa, 09/03/2021
António Barateiro Martins (Relator)
Ana Paula Boularot (Tem voto de conformidade da Conselheira
Adjunta Ana Paula Boularot, que não assina nos termos e ao abrigo do
artigo 15º-A do DL 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo DL 20/2020, de
01.05)
Ricardo Costa (E tem voto de vencido do Conselheiro Adjunto Ricardo
Costa, conforme declaração de voto em anexo)
Sumário (art. 663º, nº 7, do CPC).
_____________________

Processo n.º 1242/05.8TBBCL-Y.G1.S1


Revista – Tribunal recorrido: Relação de Guimarães, 1.ª Secção

DECLARAÇÃO DE VOTO
Após inversão do Relator por vencimento do projecto de Acórdão,
votei Vencido, pelas razões que exponho.
1. Na presente revista, identifica-se a seguinte questão recursiva em
face da decisão das instâncias: a procedência da absolvição da
instância dos Réus nesta acção de verificação ulterior de créditos da
insolvência (art. 146º, 1, CIRE), tramitada por apenso (Y) ao processo
de falência/insolvência, intentada por AA contra «Construções Meira
& Rodrigues, Lda.», declarada falida/insolvente com sentença
transitada em julgado, «Massa Falida da Construções Meira &
Rodrigues, Lda.» e todos os credores da «Massa Falida», pedindo o
reconhecimento de crédito sobre a massa falida/insolvente e a
respectiva graduação no lugar devido no montante de 152.500,00 €,
com os respectivos juros legais contabilizados até integral pagamento,
fundada na preclusão extraprocessual resultante de decisão judicial
transitada em julgado num outro apenso da insolvência (K) em que
foram partes o Autor e a Ré declarada insolvente, em que esta se
apresentou como Autora em acção declarativa sob a forma de processo
ordinário (enquanto empreiteira), fundada na “autoridade de caso
julgado” da sentença proferida nesse apenso K, em que se dispôs a
condenação do Réu ao pagamento do preço correspondente aos
trabalhos realizados no âmbito da execução de contrato de empreitada e
indemnização pelo seu incumprimento/falta de pagamento. Nesta
mesma acção – e este é o busílis central da questão submetida em
revista – foi apresentada uma Contestação e Reconvenção por parte do
Réu (dono da obra), aqui Autor na acção de verificação ulterior de
créditos, sendo que essa peça foi objecto de desentranhamento por falta
de pagamento da taxa de justiça devida, uma vez verificada a falta de
benefício de apoio judiciário, e decretada a prossecução dos autos
como se o Réu fosse revel, assim como a confissão dos factos
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articulados pela Autora, sendo a condenação obtida por adesão aos


fundamentos da petição inicial.
O acórdão em que fui vencido sufragou no essencial a argumentação e
a solução do acórdão recorrido, que afirmou a excepção de (autoridade
do) caso julgado e a sua eficácia fora do processo da decisão proferida
e transitada nesse apenso K. Esse efeito do caso julgado implicou que a
não dedução de contestação/reconvenção pelo Réu naquela acção, com
decisão judicial transitada em julgado – no que respeita ao pedido e
causa de pedir constante ou a constar da reconvenção – preclude a
apreciação da presente acção de verificação insolvencial de créditos,
assumindo – não obstante o efeito processual do desentranhamento –
que os fundamentos da reconvenção desentranhada nesse processo
coincidem no essencial com o pedido e causa de pedir do Autor nos
presentes autos. A saber, o Autor (dono da obra) pede, tendo como
causa de pedir a execução de contrato de empreitada celebrado com a
agora 1.ª Ré e factos relativos ao incumprimento definitivo parcial e ao
cumprimento defeituoso/viciado e moratório na preparação e execução
do contrato – em síntese apertada: a ausência de levantamento da
licença camarária e a entrega de pareceres favoráveis do responsável
técnico da obra, a desconformidade dos trabalhos com o projecto
aprovado, os vícios e defeitos da construção, o abandono da obra e a
não aceitação da mesma –, vários quantias a título de responsabilidade
indemnizatória (patrimonial e não patrimonial). 
Vejamos, com o devido respeito pela decisão maioritária, por que não
será essa a melhor aplicação do direito pertinente. Fazemo-lo com
desenvolvimento para o melhor esclarecimento da posição constante do
projecto de acórdão vencido, uma vez que estamos perante uma
questão jurídica delicada e complexa, à qual correspondem diversos
passos, que passo a enunciar e a sustentar.

2. A questão recursiva de base contende com a produção de efeitos


preclusivos resultantes de um caso julgado anterior, que se espoletam
em nome da segurança e certeza jurídicas.
Sendo certa a preclusão dos fundamentos de defesa, por impugnação
e/ou por excepção, que, em regra, se devem concentrar no momento e
no prazo da contestação, exceptuados os incidentes que se tramitem em
separado (art. 573º, 1 e 2, do CPC), tal implica que, em princípio, os
fundamentos que não foram alegados no exercício desse ónus
processual de defesa ficam cobertos pela autoridade de caso julgado
constituído pela decisão transitada e por via dela.
Esta asserção do princípio da preclusão, associado ao princípio da
eventualidade[1], é, por exemplo, salientado pela voz de RUI PINTO
para o caso julgado positivo (procedência da acção/pedido): “para o réu
vencido a condenação no pedido determina a preclusão de
alegabilidade futura tanto dos fundamentos de defesa deduzidos, como
dos fundamentos de defesa que poderia ter deduzido. E, também
quanto ao réu, essa “preclusão” resulta de dois mecanismos processuais
distintos. Efetivamente, o princípio da concentração da defesa na
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contestação (cf. artigo 573.º), incluindo na defesa superveniente (como


se deduz da conjugação dos artigos 588.º, n.º 1, e 729.º, al. g)),
determina a preclusão de toda a defesa que não haja oportunamente
feito valer contra a concreta causa de pedir invocada pelo autor. Assim,
o réu que perdeu não pode, depois, na oposição à execução (cf. artigos
729.º, al. g), a contrario, e 860.º, n.º 3.º) invocar as exceções que não
usara, como, por ex., a nulidade do contrato invocado pelo autor, para
se negar ao pagamento. Mas, por outro lado, tampouco o pode fazer em
(i) ação autónoma ou em (ii) reconvenção, porque lhe vai ser oposta a
autoridade de caso julgado, decorrente da vinculação positiva externa
ao caso julgado assente no artigo 619.º, em sede de objetos em relação
de prejudicialidade”[2].
O ponto é decifrar se esta consequência dos efeitos preclusivos
derivado do trânsito em julgado também se alarga à reconvenção e aos
seus fundamentos, a deduzir e a alegar pelo Réu na contestação (art.
583º do CPC). Por outras palavras: se o ónus de concentração do art.
573º, 1, do CPC vale igualmente para a reconvenção, de tal modo que,
sendo deduzida ou não sendo deduzida quando o poderia ter sido, não
mais os respectivos fundamentos poderão ser usados em acção
autónoma posterior e eventualmente concorrente com a acção em que
transite em julgado a respectiva decisão.
A linha de partida para uma resposta credível não pode deixar de tomar
em conta que a reconvenção tem como regra um carácter facultativo
(art. 266º, 1, do CPC). Se o pedido do Réu corresponde a uma
pretensão autónoma e distinta contra o autor (reconvindo), que se cruza
com a pretensão deste, está na sua esfera volitiva o poder de optar entre
fazer valer essa pretensão em reconvenção ou em pedido separado.
Além disso, como destaca MARIA JOSÉ CAPELO, “o fim pretendido
com a dedução de uma reconvenção não é a absolvição do pedido
formulado pelo autor, mas antes se almeja a satisfação de um direito
próprio”[3], tendo em conta que “transcende a simples improcedência
da pretensão do autor e os corolários dela decorrentes”[4], e, por tudo
isso, corresponde ao exercício da “liberdade de decisão sobre a
instauração do processo” e “sobre a conformação do seu objeto”,
enquanto reflexos essenciais do princípio do dispositivo e, nesta
medida, da disponibilidade da tutela jurisdicional (da instância em si
mesmo e da conformação da própria instância: v. art. 3º, 1, do CPC)[5].
Sem prejuízo, não podemos ignorar que uma das previsões de
admissibilidade legal da reconvenção apresenta uma feição
verdadeiramente endógena no cruzamento do pedido do autor:
referimo-nos àquela em que o réu pretende conseguir em seu benefício
o mesmo efeito jurídico visado pelo autor na acção, intentando lograr,
como refere a doutrina encabeçada por ANTUNES VARELA, a
reversão – ou inversão – de sinal desse benefício[6]. Neste
circunstancialismo substancial e processual – e só neste – julgamos
que é de exigir “secundum legem” algo mais ao réu potencialmente
reconvinte.
Na verdade, as mesmas razões do ónus de concentração da defesa
implicam que – nas palavras de MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA – se,

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“a partir da citação, o demandado tem o ónus de apresentar na acção


pendente todos os fundamentos para uma decisão incompatível com a
que é requerida pelo autor”, há, atenta a “conexão objectiva com o
objecto definido pelo autor (cfr. art. 274.º, n.º 2, al. c), do CPC” [= art.
266º, 2, d), do CPC 2013: «Quando o pedido do réu tende a conseguir,
em sem benefício, o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe
obter.»]) para os elementos a constar da reconvenção, verdadeiramente
um “ónus de deduzir o pedido reconvencional na acção pendente, sob
pena de preclusão da dedução do mesmo pedido em processo
posterior”, “sempre que o réu reconvinte queira conseguir, em sem
beneficio, o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe obter”, ou
seja, “o reconhecimento para si do direito de que o autor alega ser
titular”[7]. Nestas circunstâncias, a que alude no presente a transcrita
al. d) do art. 266º, 2, do CPC, de reconvenção necessária ou
compulsiva – agora seguindo o pensamento de MIGUEL MESQUITA
–, “a faculdade de reconvir transforma-se num ónus”, na medida em
que o réu “necessita de reconvir para afastar o risco da futura
preclusão do direito, por força do caso julgado que venha a constituir-
se sobre a decisão favorável ao autor”, sempre que o réu deseja “obter,
em seu benefício, o mesmo efeito que o autor se propõe alcançar (…),
sob pena de – por efeito do caso julgado formado sobre uma sentença
favorável ao autor – ver, para sempre, o seu direito precludido”[8]-[9].
Só neste caso, portanto – a que PAULA COSTA E SILVA já antes
chamara de reconvenção dependente, pois o seu julgamento,
“atendendo às conexões substanciais entre o pedido do autor e o pedido
do réu, seria inviável perante a solução dada à pretensão do autor”[10]
–, se poderá adiantar que a reconvenção, no seu pedido e causa(s) de
pedir, feita ou susceptível de ser feita, produz o efeito processual futuro
de aquela acção estabilizar o mesmo efeito jurídico material que nela
pode ser litigida e decidida e, por isso, inibir – ou seja, precludir – que
um pedido abrangido por esse ónus possa ser formulado fora do
processo em curso numa outra acção. Nessa hipótese geral, é de
sustentar que os fundamentos desse pedido reconvencional ainda
revestem carácter de defesa, por conduzirem a uma alternativa
contraditória ou incompatível com o pedido e a causa de pedir
configurados pelo autor[11] e, por tal razão, não estão verdadeiramente
dotados de autonomia enquanto base de pretensão jurídica (na medida
em que materialmente se absorvem em factos impeditivos,
modificativos ou extintivos apostos à pretensão do autor)[12]. É nesta
circunstância que se produz o risco de produzir decisões contraditórias
ou incompatíveis em acções futuras sobre o efeito jurídico já atribuído
judicialmente em acção anterior. Para o prevenir, justifica-se que se
exija ao réu que vá desde logo a jogo, faça o seu contra-ataque, e lute
pelo mesmo resultado que o autor pretende sobre a factualidade
submetida por si a juízo – uma vez que ainda estaremos, na dogmática
de LEBRE DE FREITAS, e se bem compreendo o seu alcance
dogmático-normativo, perante uma identidade do pedido referida a
situações contraditórias[13].
Aqui não haverá preclusão que surpreenda mais tarde o réu na primeira

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das acções, que deseje ser autor e discutir a sua pretensão, atendendo
acima de tudo ao comando do art. 564º, c), do CPC: «Além de outros,
especialmente prescritos na lei, a citação produz os seguintes efeitos:
(…) Inibe o réu de propor contra o autor ação destinada à apreciação
da mesma questão jurídica». Razão esta que afasta uma ampliação
contra legem da concentração da defesa ao pedido reconvencional, pois
é a própria lei que impõe ao réu que avance com a reconvenção sob
pena de não poder reapreciar a pretensão coincidente com o autor,
emergente dos factos que basearam a acção precedente – seja em sede
de litispendência, seja em sede de caso julgado, de acordo com o
definido pelo art. 580º, 1, do CPC, e tendo por fim «evitar que o
tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir
uma decisão anterior» (n.º 2 do art. 580º do CPC). 
Fora deste caso – e dos casos expressamente previstos na lei de
reconvenção com sanção preclusiva[14] –, a regra da facultatividade
da reconvenção (ou da liberdade da dedução da reconvenção) impõe-
se nas restantes alíneas do art. 266º, 2, do CPC e exclui a produção de
qualquer efeito do caso julgado material em favor do autor,
relativamente aos direitos que poderiam ter sido peticionados em sede
de reconvenção correspondente a anteriores acções[15].
Aliás, se configurarmos em termos de equiparação processual e
substancial a falta de reconvenção à improcedência do pedido
reconvencional, se fosse julgado (caso julgado negativo, referente à
injunção que o tribunal decreta em relação ao pedido, limitada pela
respectiva causa de pedir)[16], chegaremos à conclusão, por maioria de
razão, que, fora dessas situações de verdadeiro ónus, ao réu reconvinte
– ou potencialmente reconvinte – não pode ficar vedada a colocação do
pedido facultativo em falta, num primeiro momento, em outra acção,
num segundo momento, se não houve apreciação do pedido nem
colocação ao seu serviço da causa ou causas de pedir (mesmo que em
parte concorrentes com a causa de pedir do autor). Na verdade, se não
há efectiva contradição ou incompatibilidade da reconvenção, que
poderia ter sido feita e não foi – mesmo se por causa imputável ao
reconvinte[17] –, com o julgado relativo ao efeito jurídico dos factos
alegados pelo autor, não há efeito externo desse caso julgado que, no
âmbito dos seus limites objectivos, possa ser invocado para paralisar o
pedido feito em acção ulterior por “repetição de causa” (art. 580º, 1,
CPC). Não havendo estatuição sobre a pretensão que poderia ter sido
feita em sede de reconvenção, nada obsta à prolação de uma nova
decisão útil em outra nova acção, pois é o próprio art. 621º do CPC que
condiciona que «a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e
termos em que julga»[18].
3. Aplicados os critérios adoptados à acção de verificação ulterior de
créditos instaurada pelo Autor AA contra a insolvente, a massa
insolvente e credores da insolvência, entendo que não há razão para se
ver na falta de reconvenção – como efeito processual do seu
desentranhamento por falta de pagamento da taxa de justiça devida – na
anterior acção de condenação de AA, réu-potencial reconvinte, a
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omissão de um ónus de dedução de pedido que precluda a formulação


desse pedido neste apenso insolvencial. Na verdade, sendo cumulativa
a causa de pedir de base assente na celebração e execução do contrato
de empreitada (v. art. 266º, 2, a), CPC: reconvenção admissível
«quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de
fundamento à ação ou à defesa»)[19], o certo é que os direitos
indemnizatórios que terão sido invocados (mas desentranhados) em
sede de pedido reconvencional pelo Réu, agora e aqui Autor, não
aspirariam ao mesmo efeito jurídico (incidente a título principal sobre
o pagamento do preço da empreitada, recorde-se, na acção intentada
antes) que agora se discute na verificação de direitos creditícios em
sede de insolvência.
Na verdade, os incumprimentos a que se referem os efeitos jurídicos
subjacentes a cada um dos pedidos em disputa respeitam a um elenco
obrigacional respeitante a partes distintas no sinalagma da empreitada,
tendo em conta as prestações devidas como dono da obra (o referido
AA) e como empreiteiro (a sociedade «Construções Meira &
Rodrigues, Lda.», depois declarada falida/insolvente). E, por isso, os
pedidos a fazer em sede reconvencional na acção precedente não têm a
aptidão de consumir em termos absolutos e completos de alternativa ou
contrariedade os pedidos (e o regime jurídico aplicável) reivindicados
pelo autor nesse apenso[20], ainda que pudessem vir a ser objecto de
compensação entre as partes, numa lógica de créditos e contra-créditos
na relação entre dono da obra e empreiteiro (o que é uma questão a
jusante da determinação dos direitos de cada uma das partes: v. art.
266º, 2, c), CPC)[21].
4. A este propósito, merece uma particular atenção o excerto que se
apreende com significado no acórdão que fez vencimento:
“Sucede que está articulado na presente reclamação de créditos (como
antes estava na contestação/reconvenção desentranhada), como resulta
do relato inicial, que a obra foi executada pela empreiteira/insolvente
com inúmeros defeitos, que há inúmeros trabalhos contratados que não
foram executados, que há atraso na conclusão e entrega da obra,
incumprimentos que terão causado enormes preocupações,
aborrecimentos e constante nervosismo ao ora reclamante;
formulando-se, em consequência, os atinentes pedidos indemnizatórios.
O que – face ao que os respetivos autores articularam e pediram em
cada uma das duas ações (no apenso K e aqui) – leva a que sejamos
colocados perante a possibilidade de serem proferidas duas decisões
contrastantes: uma que já reconheceu que o empreiteiro executou
devida e pontualmente a sua prestação contratual e que, em função
disso, lhe atribuiu o direito ao preço e a uma indemnização por
incumprimento contratual da contraparte (o aqui reclamante e dono da
obra); e outra que visa reconhecer que o empreiteiro não executou a
totalidade da obra, que a parte executada o foi com inúmeros defeitos e
atrasos, visando atribuir-lhe o direito a indemnizações por tais
incumprimentos contratuais do empreiteiro.
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(…)
E sendo assim – é onde se pretende chegar – sendo a pretensão aqui
formulada pelo reclamante contraditória/contrastante com o pedido da
A/insolvente (na primeira ação) não podia o ora reclamante deixar de
a ter deduzido (a pretensão aqui formulada) na primeira ação, na
medida em que, mais tarde (agora), não poderá colocar em causa,
através desta ação autónoma, o resultado favorável (à insolvente)
alcançado no primeiro processo.
A invocação do cumprimento defeituoso do empreiteiro configura,
entre outras qualificações jurídicas, uma exceção que, mercê da
utilização da faculdade que é proporcionada pelo art. 428.º do C. Civil
(exceção de não cumprimento), suspende o cumprimento da prestação
principal (pagamento do preço) do dono da obra.
Tratando-se duma exceção, tinha a factualidade materializadora do
cumprimento defeituoso (do contrato de empreitada) e da exceção de
não cumprimento do art. 428.º do C. Civil, não há qualquer dúvida,
que ser deduzida na primeira ação e não o tendo sido – na medida em
que, como referimos, a sentença faz precludir todos os meios de defesa
do R., os concretamente deduzidos e os dedutíveis – ficou precludida,
para sempre, a invocação da exceção de não cumprimento.
Mas – é o ponto – também ficou precludido, face ao que estava
invocado e pedido na primitiva ação, o exercício dos contra direitos
alicerçados no “núcleo essencial” de tal cumprimento defeituoso,
ainda que tais contra direitos se tivessem que fazer valer por
reconvenção.”
Pois bem – em acrescento ao que já se aludiu.
Se aquilo que se indica como razão da identidade dos julgados se refere
à alegação exigível de excepções peremptórias defensivas (de natureza
extintiva, modificativa ou impeditiva do pedido) que deveriam estar no
quadro factual articulado na contestação, nomeadamente o art. 428º, 1,
do CCiv. (em conjugação com o art. 576º, 3, do CPC), tendo em vista
atacar o efeito jurídico pretendido pelo autor – recorde-se: pagamento
do preço da empreitada e responsabilidade indemnizatória pela falta
tempestiva do pagamento –, então estamos domiciliados fora do objeto
e âmbito do que é de sindicar em sede de ónus de reconvir; antes nos
encontramos no âmbito do que é preclusivo pela aplicação do art.
573º, 1, do CPC para a defesa enquanto réu. Ao invés, o que se discute
aqui e agora para o efeito preclusivo a atingir pela força do caso
julgado perante o réu reconvinte, posterior autor na presente acção
subsequente, é apenas e só, mas diferentemente, controlar o efeito
jurídico pretendido e obtido anteriormente pelo autor na acção
anterior e confrontá-lo com as pretensões, deduzidas ou dedutíveis, em
benefício do reconvinte nessa acção, transmutadas em pedidos por ele
feito na acção posterior, aquela que agora se aprecia e julga, na nova e
ulterior posição de autor, à luz do art. 266º, 2, d), do CPC. E não ao
abrigo de qualquer outras das hipóteses das alíneas a), b) e c), do art.
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266º, onde vigora a liberdade de reconvenção, sob pena de esta se


torpedear sem remédio.
Por outro lado, é crucial destacar que, nesse âmbito do art. 266º, 1 e 2,
do CPC, a prevenção da contrariedade ou da incompatibilidade que a
sanção decorrente da inobservância do ónus de reconvir visa obter
apenas se verifica para os casos em que se sujeita posteriormente ao
tribunal a reapreciação ou reexame da mesma factualidade, para dela
retirar efeito contrário ou incompatível com a decisão julgada
anteriormente e transitada, colocando em cheque o que se tornou
indiscutível por decisão transitada em julgado[22]. Julgo que – como
já resulta do anteriormente defendido para a delimitação legal do ónus
de reconvir – esta indissociabilidade entre factos/causa de pedir e
pedido/efeito jurídico (arts. 5º,1, 581º, 3 e 4, CPC) é claramente fulcral
para a posição a tomar.
No caso até se concede que poderá haver comunhão factual – quanto à
causa de pedir assente no contrato de empreitada e a alguns factos
“defensivos” que se poderiam colocar perante a pretensão original da
empreiteira, entretanto insolvente –, desde logo porque alguns factos
que se aproveitam para a defesa serão também sustento para uma
pretensão diversa contra o autor, estando no campo de aplicação
privilegiado do art. 266º, 2, als. a) e c) do CPC. Mas creio que é
manifesto que essa comunhão, para o que nos interessa e no domínio da
liberdade de reconvenção, não afecta a autonomia dos pressupostos
factuais que sustentam os pedidos indemnizatórios feitos na lide
correspondente à acção de verificação ulterior de créditos na
insolvência da sociedade empreiteira. Se assim é, voltando à doutrina
de MARIA JOSÉ CAPELO, o critério de prevenção de contrariedade,
com ou sem variação factual, actua, em torno da identidade do pedido
“em sentido amplo”, no exacto e preciso desiderato de buscar “a
verificação de um nexo de prejudicialidade entre as duas causas que
justifique um efeito vinculativo do caso julgado”[23]. Assim, este nexo
de prejudicialidade, ao nível dos factos parcialmente coincidentes e
uma vez levantada essa coincidência, não poderá conduzir – como
conduziu neste acórdão – a uma (em rigor) improcedência “de plano”
e sem mais da acção em sede insolvencial por força de um caso
julgado anterior, uma vez que os factos alegados pelo agora autor na
acção enquanto dono da obra são, ademais e decisivamente, agregados
para e em nome de efeitos jurídicos diversos do almejado e
concretizado pelo autor empreiteiro no processo ulterior. Sem que, com
isso, se vislumbre que os pedidos indemnizatórios agora feitos
coloquem em crise (por outras palavras: tornem incompatível) o
resultado jurídico obtido pelo autor na primeira acção: a condenação
ao pagamento de prestação devida pela empreitada e de crédito
indemnizatório relacionado.
4. Em nome da fortaleza de tal conclusão, não podemos menosprezar as
disposições insertas no «alcance do caso julgado» que o art. 621º do
CPC impõe: «A sentença constitui caso julgado nos precisos limites e

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termos em que julga: se a parte decaiu por não estar verificada uma
condição, por não ter decorrido um prazo ou por não ter sido praticado
determinado facto, a sentença não obsta a que o pedido se renove
quando a condição se verifique, o prazo se preencha ou o facto se
pratique». Ora: se a reconvenção de que tratamos na acção do apenso K
não chegou a ser considerada, por desentranhamento, em virtude da
falta de pagamento da taxa de justiça devida, não choca ver tal facto
como uma  condição (mesmo que imprópria) não verificada, cominada
com a sanção do art. 570º, 6, do CPC, como facto responsável pelo
decaimento do pedido reconvencional e, por isso, facto promotor da
renovação do pedido em outra acção, nos termos – como já realçado –
desse mesmo art. 621º do CPC.
Ainda para mais quando, por tal efeito processual da falta de
contestação, o réu potencialmente reconvinte foi considerado revel e o
julgamento foi feito por adesão ao pedido do autor – agora e aqui Réu
–, sem que tenha sido judicialmente discutida a eventual pretensão do
réu potencialmente reconvinte, nem – aliás – as excepções que poderia
invocar (com a submissão ao regime do art. 91º, 2, do CPC). Nesse
alcance, há que sublinhar a inoponibilidade da falta de reconvenção
nessa acção, uma vez que a respectiva pretensão e os factos que a
poderiam substanciar não integraram o objecto da anterior acção cuja
decisão faria de caso julgado vinculativo[24]. Em termos simples, nem
sequer o que agora se preclude chegou a ser apreciado, verificado e
julgado anteriormente por um tribunal.

5. Não esqueçamos ainda que a preclusão extraprocessual do pedido e


dos fundamentos da reconvenção não invocados nessa mesma acção
(apenso K)[25] funcionaria processualmente no segundo processo
através da “autoridade de caso julgado” e do seu efeito positivo externo.
Sublinhe-se.
A figura do caso julgado impede que uma decisão posterior contrarie
uma decisão já transitada em julgado, quando exista sobreposição do
objecto decisório e as duas decisões apreciem o mesmo problema
essencial, mesmo quando algum dos três requisitos do art. 581º do CPC
não seja integralmente coincidente ou não se verifiquem em
cumulação. Aqui, a autoridade de caso julgado, enquanto efeito e
incidência do caso julgado material, visa garantir a vinculação dos
órgãos jurisdicionais e o acatamento pelos particulares de uma decisão
judicial transitada, na circunstância de se verificar diversidade entre
objectos processuais e funcionar o objecto processual anterior como
condição prejudicial dependente para a apreciação do objecto
processual posterior (efeito vinculativo à não repetição e à não
contradição da decisão anterior em processo subsequente com diverso
objecto). Por outro lado, postula ainda esta perspectiva o efeito positivo
(e normativo) do caso julgado: a decisão revestida de autoridade,
associada à sua imposição externa, é, em função da “consumpção
prejudicial” ou de “concurso material” entre os objectos processuais,
um pressuposto ou uma premissa da causa subsequente, de tal forma

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que é um antecedente na apreciação da nova causa no sentido da


prevalência do sentido decisório da primeira decisão, conduzindo, por
isso, à inadmissibilidade da acção subsequente, actuando na sindicação
da decisão de mérito da causa (respeitando, em particular, à causa de
pedir ou a uma excepção peremptória).[26] Para tal resultado, é
insuperável, como condição subjectiva da sua força vinculativa, no
confronto dos processos conexos, que as decisões abranjam as mesmas
pessoas, sob o ponto de vista da qualidade física e intervenção
processual, assim como aquelas que sejam os mesmos sujeitos do ponto
de vista da sua qualidade jurídica (art. 581º, 2, CPC: identidade dos
sujeitos abrangidos)[27].
Em resumo: estando em averiguação a vinculação de uma decisão
posterior a uma decisão já transitada em razão de uma relação de
prejudicialidade (em termos de dependência ou concurso: repetição ou
contradição, a afastar[28]) entre os respectivos objectos processuais,
essa vinculação – com a consequente improcedência do pedido
subsequente e afectado pelo caso julgado da primeira decisão – fica
necessitada de condições objectivas (negativa e positiva) e subjectiva.
Enquanto condição objectiva positiva[29], a “existência de uma relação
entre os objetos processuais de dois processos de tal ordem que a
desconsideração do teor da primeira decisão redundaria na prolação
de efeitos que seriam lógica ou juridicamente incompatíveis com esse
teor”, o que faz com que “a consideração do teor da sentença já
transitada em julgado poderá determinar o sentido da posterior decisão
de mérito, seja para a procedência, seja para a improcedência”[30], não
se verifica no caso concreto, quando a inexistência de reconvenção, que
não se afigura como ónus sujeito a consequência preclusiva, reconduz
a acção com decisão transitada em julgado apenas ao objecto
configurado pelo autor e levado ao dispositivo decisório de
condenação do réu. Logo, não é de ver a decisão anterior em sede de
condenação do réu, agora autor, a determinar que se exclua a
pretensão creditícia perante o anterior autor, agora réu insolvente, em
sede insolvencial e enquanto credor – ainda que potencial e a
reconhecer – da insolvência.
Neste quadro, importa ainda reter que a preclusão afirmada pelo
acórdão recorrido ocorre no processo de insolvência, cuja
especificidade, em conjunto com a dinâmica jusnormativa e racional da
reclamação, verificação e graduação de créditos que nele se promove
(arts. 128º e ss do CIRE), não pode ser de todo ignorada. Bastará referir
desde logo o art. 128º, 1 e 5 (anterior n.º 3), do CIRE, que impõe que os
credores da insolvência reclamem imperativamente a verificação dos
seus créditos, mesmo que tais credores tenham o seu crédito
reconhecido por sentença transitada em julgado, se nele quiserem obter
pagamento.
Assim é, desde logo, porque o art. 90º do CIRE impõe que, na
pendência do processo de insolvência, os credores da insolvência só
podem exercer os seus direitos em conformidade com o disposto no
CIRE.
Assim é, por sua vez, porque os créditos sobre a insolvência só podem

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ser pagos se «estiverem verificados por sentença transitada em


julgado» (art. 173º do CIRE).
Assim sendo, qualquer sentença produzida em acção (declarativa ou
executiva) intentada pelos ou contra os insolventes fora do cosmos
processual da insolvência não faz caso julgado relativamente à
reclamação, verificação e graduação de créditos no processo de
insolvência referido a esses insolventes[31], uma vez que os objectos
processuais não se sobrepõem, por uma banda, e os credores
envolvidos e interessados no processo insolvencial estão para além e
munidos de um interesse e título distinto dos credores que possam ser
qualificados como concorrentes – como seria o Réu potencialmente
reconvinte, aqui e agora Autor – em acções que possam ser vistas como
dependentes ou prejudiciais.
De facto, o concurso de credores no âmbito do processo de insolvência
tem por fim essencial a liquidação de todo o património do devedor
insolvente em benefício da generalidade dos seus credores, sendo
prioritária a verificação dos créditos e, para tal desiderato, atribuída
legitimidade a cada credor concorrente para impugnar os créditos dos
demais concorrentes que sejam susceptíveis de conflituar com o crédito
daquele, nos termos dos arts. 130º, 1, e 146º, 1, do CIRE[32],
conduzindo-se no final a uma sentença constitutiva da verificação e
graduação dos créditos (arts. 130º, 3, 140º, 1 e 2, CIRE, em conjunto
com a possibilidade de verificação ulterior de créditos aberta pelo art.
146º, 1, do CIRE), para a qual contribuem – ou podem contribuir – um
conjunto de terceiros – os credores reclamantes – que não coincidem
com as partes da acção declarativa alegadamente constitutiva de caso
julgado. Pelo que também falece a condição subjectiva que se exige
para que vingue a autoridade de caso julgado da decisão transitada fora
do seu objecto processual: seja na perspectiva de a sentença anterior
não vincular reflexamente e ser oposta aos restantes credores
reclamantes no processo de insolvência[33], seja na inexistência do
poder – que mais se colocaria no caso em concreto – de esses outros
terceiros credores reclamantes poderem opor a uma dessas partes da
causa julgada, enquanto credor reclamante concorrente no processo de
insolvência – como pretende ser o Autor na acção prévia de verificação
do seu crédito –, aquela decisão transitada em julgado, por não
estarmos perante sujeitos idênticos aos da acção decidida (a não ser
que, em particular, assim fosse por “mecanismos de extensão do caso
julgado a terceiros, por força da lei [arts. 622º do CPC; arts. 522º, 531º,
538º, 2, 635º, 717º, 2, do CCiv.]”[34], o que não se regista; e sendo de
recusar uma eventual extensão do caso julgado anterior por vontade de
um credor terceiro, por ser incompatível com a referida especificidade
do processo insolvencial, que privilegia o par conditio creditorum).

É com base em todas estas razões que, atendendo à interpretação e


aplicação dos arts. 580º, 1 e 2, 619º, 1, e 621º do CPC, assim como ao
regime aplicável e pertinente do CIRE, não entendo que fosse de
manter o acórdão recorrido.
Assim, e salvaguardada a devida consideração, julgaria procedente a
revista e ordenaria a prossecução dos autos na instância própria.
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O Relator Vencido
(Ricardo Costa)
_____________________

[1] V. FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA, Direito processual civil, Volume I, 2.ª ed.,
Almedina, Coimbra, 2017, págs. 97-99.

[2] “Exceção e autoridade de caso julgado – algumas notas provisórias”, Julgar online, 2018, pág.
42.

Na mesma linha, v., entre outros, MARIA FRANÇA GOUVEIA, A causa de pedir na acção
declarativa, Almedina, Coimbra, 2004, págs. 399 e ss, 495-497 (“o efeito preclusivo abrangerá
todas as excepções peremptórias que poderiam ter sido alegadas para impedir o reconhecimento da
pretensão”), MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, “Preclusão e caso julgado”, Blog do IPPC, 2016,
https://blogippc.blogspot.com/2016/05/paper-199.html, págs. 2-3, FRANCISCO FERREIRA DE
ALMEIDA, Direito processual civil, Volume II, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2019, págs. 718-719.
Elucidativo e exemplar, v. o Ac. do STJ de 6/12/2016, processo n.º 1129/09.5TBVRL-H.G1.S2,
Rel. FONSECA RAMOS, in www.dgsi.pt.
[3] “Ónus de reconvir e caso julgado – Supremo Tribunal de Justiça, Acórdão de 5-9-2017”, RLJ
n.º 4024, Ano 150º, 2020, pág. 54.
[4] ANTUNES VARELA/J. MIGUEL BEZERRA/SAMPAIO E NORA, Manual de processo civil,
2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 323.
[5] JOSÉ LEBRE DE FREITAS, Introdução ao processo civil. Conceito e princípios gerais à luz
do novo Código, 4.ª ed., Gestlegal, Coimbra, 2017, págs. 158-159.
[6] ANTUNES VARELA/J. MIGUEL BEZERRA/SAMPAIO E NORA, Manual de processo civil
cit., pág. 329.
[7] “Preclusão e ‘contrário contraditório’ – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de
10.10.2012”, CDP n.º 41, 2013, págs. 26-27, sublinhado nosso; o processualista expressamente
exclui do âmbito do ónus de reconvir as situações de direito a benfeitorias e o da compensação,
disciplinados no art. 274º, 2, b), do CPC 1961 e agora acolhidos nas als. b) e c) (este com mais
explicitação) do art. 266º, 2, do CPC 2013, na sequência, aliás, do que expressara em “As formas
de composição da acção”, Estudos sobre o novo processo civil, 2.ª ed., Lex, Lisboa, 1997, pág.
284.
[8] Reconvenção e excepção no processo civil [O dilema da escolha entre a reconvenção e a
excepção e o problema da falta de exercício do direito de reconvir], Almedina, Coimbra, 2009,
págs. 421-422, 439 e ss, 458 e ss, 482. Favoráveis: ABRANTES GERALDES/PAULO
PIMENTA/LUÍS PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil anotado, Vol. I, Parte geral e
processo de declaração, Artigos 1.º a 702.º, Almedina, Coimbra, 2018, sub art. 266º, págs. 307-
308.
[9] Na jurisprudência do STJ, v., para a admissão do ónus de reconvenção, os Acs. de 10/10/2012,
processo n.º 1999/11.7TBGMR.G1.S1, Rel. ABRANTES GERALDES, 5/9/2017, processo n.º
6509/16.7T8PRT.P1.S1, Rel. JÚLIO GOMES, sempre in www.dgsi.pt, e de 6/2/2020, processo n.º
428.17.7T8FLG.A.P1.S1, Rel. JOÃO BERNARDO, in
https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2020:428.17.7T8FLG.A.P1.S1/.
[10] Dessa forma levando, na tese da processualista, a um “caso julgado implícito”, que atinge os
“pedidos que estejam numa relação de implicação necessária e em que a apreciação de uma das
pretensões determine inexoravelmente um certo juízo quanto à outra” – v. “A natureza processual
da tutela do terceiro adquirente de boa fé e a título oneroso. Excepção, reconvenção e eficácia
preclusiva do caso julgado”, O Direito, 2009, Ano 141.º, I, págs. 234, 236-237.

[11] Para este critério de delimitação do ónus de reconvir, sendo este aceite, v. o Ac. do STJ de
30/11/2017, processo n.º 3074/16.9T8STR.S1, Rel. ROSA TCHING, in www.dgsi.pt.
[12] Para este outro critério auxiliar, v. o Ac. do STJ de 10/10/2012, cit. nt. (9).
[13] “Um polvo chamado autoridade de caso julgado”, loc. cit., págs. 709-710, para quem nessa
situação se afigura certa a ideia de ónus de reconvir.
[14] V. FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA, Direito processual civil, Volume II cit., págs.
168-169, MARIA JOSÉ CAPELO, “Ónus de reconvir e caso julgado”, loc. cit., págs. 56-57.
[15] V. MIGUEL MESQUITA, Reconvenção e excepção no processo civil… cit., págs. 477 e ss; na
jurisprudência superior, atente-se no Ac. do STJ de 13/7/2017, processo n.º 6471/12.5TBVNG-
B.P1.S1, Rel. TOMÉ GOMES, in https://www.stj.pt/wp-
content/uploads/2018/01/Civel_2017_07.pdf, pág. 47, ponto III. do Sumário.

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[16] V. RUI PINTO, “Exceção e autoridade de caso julgado…”, loc. cit., págs. 43-44, em especial:
“Ao autor vencido não está vedado que repita o mesmo pedido, mas com diferentes causas de
pedir: o que transitou foi que pelo primeiro e concreto fundamento o autor não tem o direito que
alega, mas não transitou que ele não possa ter direito por qualquer outro fundamento fáctico não
deduzido. Por ex.: pedido o despejo de locado com fundamento em causa resolutiva do artigo
1083.º, n.º 2, al. a), CC, se o tribunal não decretar o despejo, é óbvio que o autor pode repetir o
pedido fundado noutros factos que consubstanciem outra causa resolutiva. Mas, não se poderá opor
ao autor um ónus de concentração de todos os fundamentos na dedução de um pedido, evitando-se
a multiplicação de ações por outros tantos fundamentos? A resposta é negativa: nada na lei
portuguesa o determina, nem constitui má fé processual, salvo quando redunda efetivamente
nalguma das categorias do artigo 542.º.”; em complemento, v. CASTRO MENDES, Limites
objectivos do caso julgado em processo civil, Edições Ática, Lisboa, 1974, págs. 176 e ss,
ANTUNES VARELA/J. MIGUEL BEZERRA/SAMPAIO E NORA, Manual de processo civil cit.,
págs. 710 e ss, 714 e ss, MARIANA FRANÇA GOUVEIRA, A causa de pedir… cit., págs. 499 e
ss, FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA, Direito processual civil, volume II cit., págs. 712 e
ss. Na jurisprudência recente, v. o Ac. do STJ de 8/10/2019, processo n.º 998/17.0TBVRL.G1.S1,
Rel. MARIA JOÃO TOMÉ, in www.dgsi.pt.
[17] Pois essa imputabilidade não será de censurar à luz da liberdade de reconvenção padronizada
no art. 266º, 1, do CPC.
[18] FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA, últ. ob. cit., págs. 715-716, 721.
[19] Sobre esta “identidade da causa de pedir”, essencialmente definida “através do facto principal
comum a ambas as contra-pretensões”, v. MARIANA FRANÇA GOUVEIA, A causa de pedir…
cit., pág. 270.
[20] Sobre o ponto, MIGUEL MESQUITA, Reconvenção e excepção no processo civil… cit., págs.
446 e ss.
[21] Ainda, desenvolvidamente, MIGUEL MESQUITA, Reconvenção e excepção no processo
civil… cit., págs. 460 e ss: “o caso julgado constituído sobre a sentença condenatória apenas afasta
o poder de operar, por via da compensação, a extinção do crédito do autor”, ou seja, perdendo o réu
“o poder de extinguir, com base no artigo 847.º do C.C., o crédito do autor”, sobrevivendo contudo
o crédito não compensado “à falta de invocação da compensação e contra o seu exercício através
de uma acção independente é incorrecto levantar o obstáculo do caso julgado”. Antes, v. CASTRO
MENDES, Limites objectivos… cit., págs. 192 e ss.
[22] Neste sentido, v. MARIA JOSÉ CAPELO, “Ónus de reconvir e caso julgado”, loc. cit., pág.
62; antes, v. o discurso de MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, “Preclusão e ‘contrário
contraditório’”, loc. cit., págs. 27-28.
[23] “Ónus de reconvir e caso julgado”, loc. cit., pág. 62.
[24] Para este ponto, v., elucidativamente, PAULA COSTA E SILVA, “A natureza processual da
tutela…”, loc. cit., págs. 235-236.
[25] Sobre o conceito, veja-se a afinação dogmática de MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA,
“Preclusão e caso julgado”, loc. cit., pág. 4: “a preclusão intraprocessual e a preclusão
extraprocessual não são duas modalidades alternativas da preclusão (no sentido de que a preclusão
é intraprocessual ou extraprocessual), mas duas manifestações sucessivas de uma mesma
preclusão: primeiro, verifica-se a preclusão da prática do acto num processo pendente; depois,
exactamente porque a prática do acto está precludida nesse processo, torna-se inadmissível a
prática do acto num outro processo. Portanto, a preclusão começa por ser intraprocessual e
transforma-se em extraprocessual quando se pretende realizar o acto num outro processo”.
[26] V. fundamentalmente (que seguimos na terminologia dogmática) MIGUEL TEIXEIRA DE
SOUSA, “O objecto da sentença e o caso julgado material (Estudo sobre a funcionalidade
processual)”, BMJ n.º 325, 1983, págs. 159-160, 171 e ss, em esp. 171-172, 175, 178-179, ID.,
“Prejudicialidade e limites objectivos do caso julgado”, RDES, 1977, págs. 305-308, ID.,
“Preclusão e ‘contrário contraditório’”, loc. cit., págs. 24-25, 28-29; LEBRE DE FREITAS,
“Providência cautelar: desistência do pedido, repetição e caso julgado”, Estudos sobre direito civil
e processo civil, Coimbra Editora, Coimbra, 2002, págs. 494-496, ID., “Um polvo chamado
autoridade de caso julgado”, ROA, 2019, págs. 691-693, 700-702; RUI PINTO, “Exceção e
autoridade de caso julgado…”, loc. cit., págs. 4-7, 17-19, 25 e ss (“efeito positivo externo”);
FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA, Direito processual civil, Volume II cit., págs. 719 e ss. 

[27] V., com jurisprudência relevante, RUI PINTO, “Exceção e autoridade de caso julgado…”, loc.
cit., págs. 25 e ss (em conjugação com as págs. 10-12 [“estão abrangidos pelos efeitos do caso
julgado não somente os concretos titulares do direito ou bem litigioso que eram partes na causa à
data do trânsito em julgado da sentença (…), como, ainda, os seus transmissários ou sucessores
posteriores ao trânsito em julgado.”], 20-21); LEBRE DE FREITAS, “Um polvo chamado
autoridade de caso julgado”, loc. cit., pág. 700.
[28] V. MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, “Preclusão e caso julgado”, loc. cit., págs. 18-19 (o
caso julgado “destina-se a garantir que sobre uma questão há apenas uma decisão do tribunal” e,

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por isso, a sua doutrina “talvez devesse antes ser construída tomando como base a exclusão de uma
nova pronúncia do tribunal sobre a mesma questão ou sobre uma questão diferente, acentuando,
portanto, não tanto o carácter imutável da decisão proferida, mas mais o seu carácter único e
exaustivo”); JOSÉ LEBRE DE FREITAS, “Um polvo chamado autoridade de caso julgado”, loc.
cit., págs. 700-701.

[29] Não interessa abordar a condição objectiva “negativa”, em que a autoridade de caso julgado
opera em simetria com a exceção de caso julgado, “em qualquer configuração de uma causa que
não seja a de identidade com causa anterior; ou seja, supõe uma não repetição de causas. Se
houvesse uma repetição de causas, haveria, ipso facto, exceção de caso julgado” (RUI PINTO,
“Exceção e autoridade de caso julgado…”, loc. cit., pág. 26).
[30] RUI PINTO, “Exceção e autoridade de caso julgado…”, loc. cit., pág. 27.

[31] Para esta conclusão, no confronto de sentença de verificação de créditos reclamados, proferida
em apenso de “concurso de credores” à acção executiva (arts. 788º e ss do CPC), uma vez
declarados insolventes os executados, para efeitos de não se constituir como caso julgado material
nem dispor de autoridade de caso julgado relativamente à impugnação e verificação desses créditos
(como insolvenciais) no incidente de reclamação, verificação e graduação de créditos relativo ao
processo de insolvência, decisiva para o julgamento feito, v. o Ac. do STJ de 15/12/2020, processo
n.º 100/13.7TBVCD-B.P1.S1, Rel. RICARDO COSTA, in www.dgsi.pt.
[32] Aproveitamos aqui o Ac. do STJ de 27/9/2018, processo n.º 10248/16.0T8PRT.P1.S1, Rel.
TOMÉ GOMES, in www.dgsi.pt.

[33] V. RUI PINTO, “Exceção e autoridade de caso julgado…”, loc. cit., págs. 28-30.
[34] Sobre o ponto, v. ainda RUI PINTO, “Exceção e autoridade de caso julgado…”, loc. cit., págs.
30 e ss.

__________________________________________________

[1] Art. 92.º da PI


[2] Art. 93.º da PI
[3] Mandada desentranhar, por despacho proferido em data posterior a tal contestação da Massa.
[4] Com fundamentações não coincidentes, como já se referiu, porém, ambas concluíram pela
autoridade de caso julgado.

[5] A dificuldade – como refere o Prof. Castro Mendes, in Limites Objetivos do Caso Julgado em
Processo Civil, pág. 121 e ss. – está “em estabelecer a distinção em bases científicas sem empurrar
a questão para uma casuísmo necessariamente arbitrário”.

[6] Efetivamente, a conceção/sistema restrito (da sentença só ter força de caso julgado na parte
decisiva e não nos fundamentos) leva a conclusões duvidosas e em última análise insatisfatórias
(como resulta dos inúmeros exemplos citados por Castro Mendes, obra citada, pág. 143).

[7] Seguimos de perto Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, pág. 578.
[8] Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, pág. 579/80.
[9] Aliás, a distinção – entre “factos” e “direito” – já encerra um modo hábil de entender o que são
“factos”, uma vez que, no processo, só assume a qualidade de “facto” o quid a que o “direito”
reconhece tal qualidade, ou seja, não há “factos” sem “direito”, o mesmo é dizer só há “factos de
direito”.

[10] O Prof. Antunes Varela – Manual de Processo, 1.ª ed., pág. 693 e ss. – parece ser um pouco
mais restritivo, na medida em que apenas diz que “é a resposta dada na sentença à pretensão do
A., delimitada em função da causa de pedir, que a lei pretende que seja respeitada através da força
e autoridade do caso julgado”; e que “a força do caso julgado não se estende, por conseguinte,
aos fundamentos da sentença, que no corpo desta se situam entre o relatório e a decisão final”;
porém, mais à frente não deixa de reconhecer que “reveste o maior interesse, para a delimitação
do caso julgado, a fixação do sentido e, sobretudo, do alcance dessa resposta contida na decisão
final”; e que “é ponto assente na doutrina que os fundamentos da sentença podem e devem ser
utilizados para fixar o sentido e alcance da decisão contida na parte final da sentença, coberta
pelo caso julgado”

[11] A sentença condenatória corresponde à situação existente no momento do encerramento da


discussão nos termos do art. 611.º/1 do CPC.

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[12] Hoje, 573.º/1 do CPC


[13] Miguel Teixeira de Sousa, obra citada, pág. 585/6.

[14] E a indiscutibilidade não pode ser posta em causa invocando argumentos, factos ou razões que
o efeito preclusivo cobriu. - Prof. Castro Mendes, obra citada, pág. 186.

[15] A exceção do caso julgado encerra a vertente negativa, em ordem a evitar a repetição de
ações; a autoridade do caso julgado traduz a vertente positiva, no sentido de imposição externa da
decisão tomada.
[16] Se a exigisse não faria diferença com a exceção de caso julgado.
[17] Citado por Miguel Mesquita, in Reconvenção e Exceção em Processo Civil, pág. 437 e 426.
[18] In obra citada, pág. 429
[19] Daí que a expressão repetidamente utilizada seja “apenas” a de estarem “cobertas pelo caso
julgado”.

[20] Em exposição intitulada “Preclusão e Caso Julgado”, abundantemente citada no Acórdão


recorrido e nas alegações recursivas, acessível na internet.
[21] Como é referido, entre outros, nos seguintes Acórdãos do STJ: de 23/11/2011 (relator Pereira
da Silva), de 10/10/2012 (relator Abrantes Geraldes), de 05/09/2017 (relator Júlio Gomes), de
06/11/2018 (relator Maria João Vaz Tomé), de 08/01/2019 (relator Roque Nogueira), de
28/03/2019 (relator Tomé Gomes) e de 11/11/2020 (relator Maria Graça Trigo), todos acessíveis in
dgsi.pt.

[22] Uma vez que o princípio da eventualidade (que tem como reflexo o princípio da preclusão) a
que o R. se encontra sujeito compreende as alegações subordinadas e o pedido reconvencional
pode ser subsidiário ou eventual.
[23] In obra citada, Pág 452/3.
[24] Bem vistas as coisas, nem “guardou”, sucedendo, isso sim, que não pagou a TJ devida pela
contestação/reconvenção então apresentada.

[25] O aqui reclamante, condenado a cumprir no primeiro processo, perde a possibilidade de vir a
afetar o conteúdo da sentença anteriormente transitada em julgado.
[26] Ou até para pedir a redução do preço, o que também pode ser feito por via de exceção.

[27] Voltar “à carga”, perdoe-se-nos a expressão, que é o que estes autos também representam, na
medida em que a presente reclamação é a repetição da contestação/reconvenção deduzida no
primeiro processo e que só ali não foi discutida/apreciada por razões imputáveis ao aqui
reclamante.
[28] Seguramente, todas as questões/exceções que condicionaram o mérito da decisão da primeira
ação.

[29] As contrapretensões do réu, intimamente conexionadas com a ação (v. g., no âmbito da relação
de liquidação dum mesmo concreto contrato), devem ser apreciadas no processo pendente.
[30] Na resposta à litispendência invocada, até referiu que reclamou por causa do “entendimento
muito restrito no que se reporta aos prazos de reclamação de créditos”, parecendo querer dizer
que apenas queria evitar não ser pago do crédito que lhe viesse a ser reconhecido no processo
pendente (o atual Apenso K).

[31] Efetivamente, é este o momento em que, a nosso ver, repete-se, ocorre o “efeito preclusivo” e
não o momento, anterior, em que o aqui reclamante ficou sem contestação/reconvenção, razão pela
qual continuamos a dizer que é o caso julgado que faz precludir os factos defensivos e os contra
direitos que o reclamante devia ter deduzido e não deduziu: basta pensar que, caso a ação do
apenso K fosse julgada improcedente, ficava o aqui reclamante “com margem de liberdade para
pôr em marcha a sua pretensão através de um processo independente” – cfr. Miguel Mesquita,
obra citada, pág, 447

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